Caracterização De Experiências Relatadas Por Alunos Com Deficiência Intelectual
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CARACTERIZAÇÃO DE EXPERIÊNCIAS RELATADAS POR ALUNOS COM
DEFICIÊNCIA INTELECTUAL MATRICULADOS EM SALAS DE EDUCAÇÃO
PARA JOVENS E ADULTOS ¹
Roberta Moreno Sás [email protected] (Universidade federal de São Carlos - UFSCAR.
agencia financiadora CNPq) ²
Maria Amelia Almeida [email protected] (Universidade federal de São Carlos - UFSCAR)³
Resumo
A linguagem é o que caracteriza os "seres humanos", a criatividade lingüística faz com que o
homem se destaque em meio a todos os outros animais. Nas pessoas com deficiência
intelectual o desenvolvimento da linguagem pode aparecer em uma idade mais ou menos
tardia. Essas dificuldades acabam por limitar, muitas vezes, que a pessoa com a deficiência
tenha as oportunidades de vivências e contato social que são imprescindíveis para o
desenvolvimento da linguagem. Ressalta-se que para as pessoas com deficiência intelectual, o
processo da elaboração da linguagem deve estar vinculado ao uso social dessas habilidades
respeitando as habilidades e limitações desta população. Frente ao exposto, para que seja
elaborado um programa de intervenção em grupo voltado ao trabalho de linguagem para os
jovens e adultos com deficiência intelectual, necessita-se conhecer as dificuldades e, sobretudo
as habilidades relacionadas ás experiências destes dentro e fora de casa. Para tal
conhecimento, acredita-se, que além de avaliações que podem ser realizadas, umas das fontes
para tais informações são os próprios jovens, que por terem linguagem oral podem nos relatar
sobre suas experiências. Participaram do estudo 8 jovens e adultos com deficiência
intelectual.O estudo foi realizado em uma sala de aula nas dependências da instituição
educacional. Como instrumento utilizou-se um Questionário de Caracterização aplicado aos
jovens e adultos com deficiência intelectual. Os resultados mostraram que tendo como base as
respostas dos alunos Seis entre oito participantes relataram ajudar nos serviços de casa,
entretanto as tarefas a eles designadas não exigem habilidades mais elaboradas e que
estimulem a cognição como o uso da linguagem oral ou escrita. Apesar de demonstrar vontade
de trabalhar nenhum dos participantes teve tal oportunidade o que mostra a falta de
credibilidade no potencial destes jovens. Os locais de passeio dos alunos se restringem a
praça, igreja e casa de parentes e nenhum deles relatou que encontra com os amigos em
locais diferentes á escola, o que mostra a restrição destes á situações de socialização.
Palavras-chave: Linguagem oral. Deficiência intelectual. Jovens e Adultos.
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1. INTRODUÇÃO
Sabe-se que a linguagem é concebida em três dimensões: como representação do
mundo e do pensamento, como instrumento de comunicação e como forma de ação
ou interação (Koch, 2003). O homem conversa, lê, escreve, participa em diálogos e
assim constrói-se socialmente pela linguagem. Geraldi (1984, p. 43) sintetiza: "a
linguagem é uma forma de interação: mais do que possibilitar a transmissão de
informação de um emissor a um receptor, a linguagem é vista como um lugar de
interação humana: através dela o sujeito que fala pratica ações que não conseguiria
praticar a não ser falando".
As situações do dia a dia são importantes para o desenvolvimento cognitivo, social e
afetivo, por esse motivo as pessoas não podem ser privadas das mesmas, pelo
contrário, as pessoas devem receber diversas oportunidades de exploração da
realidade para que ela possa assimilá-la e reconstruí-la internamente com seus
próprios recursos. Para que o se humano tenha um pleno desenvolvimento da
linguagem são de grande importância as vivências.
Os distúrbios de linguagem e de fala que podem acometer as pessoas com
desenvolvimento normal também podem ser observados na criança com deficiência
intelectual. (Brauner, & Brauner, 1989). Nas pessoas com deficiência intelectual o
desenvolvimento da linguagem pode aparecer em uma idade mais ou menos tardia, e
algumas podem apresentar dificuldades em habilidades de comunicação (MEC, 1995).
Essas dificuldades acabam por limitar, muitas vezes, que a pessoa com a deficiência
tenha as oportunidades de vivências e contato social que são imprescindíveis para o
desenvolvimento da linguagem. Sobretudo nos jovens e adultos com deficiência
intelectual, o comprometimento das habilidades de linguagem interfere na real inclusão
da pessoa na sociedade dificultando seu convívio social e sua autonomia como ser
humano. E, como conseqüências são excluídas também de contextos profissionais e
culturais e de eventos de letramento e de comunicação e expressão oral de suas
idéias. Entretanto sabe-se que apesar de adquirirem a linguagem com maior lentidão,
com orientação podem ter melhor um desenvolvimento satisfatório. Desta forma, o
trabalho de estimulação de linguagem com o grupo de pessoas com deficiência
intelectual é de extrema importância inclusive para permitir a essas pessoas maiores
oportunidades na sociedade.
Ressalta-se que para as pessoas com DI, o processo da elaboração da linguagem
deve estar vinculado ao uso social dessas habilidades, por isso é preciso que sejam
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criadas situações de ensino e aprendizagem onde essas pessoas elaborem praticas
sociais de uso da escrita, da leitura e da linguagem oral. É uma combinação de
oralidade, leitura, escrita por meio do uso de textos, figuras, situações e vivências.
Frente ao exposto, para que seja elaborado um programa de intervenção em grupo
voltado ao trabalho de linguagem para os jovens e adultos com deficiência intelectual,
necessita-se conhecer as dificuldades e, sobretudo as habilidades relacionadas ás
experiências destes dentro e fora de casa. Para tal conhecimento, acredita-se, que
além de avaliações que podem ser realizadas, umas das fontes para tais informações
são os próprios jovens, que por terem linguagem oral podem nos relatar sobre suas
experiências.
Partindo da necessidade de trabalhar a linguagem das pessoas jovens e adultas com
deficiência intelectual e acreditando-se na colaboração dos próprios jovens, o trabalho
em questão tem como objetivo apresentar a independência dos alunos em atividades
dentro e fora de casa, se já teve experiência com algum tipo de trabalho fora de casa,
se gostaria de trabalhar fora e em que tipo de atividade.
2. MÉTODO
2.1 Participantes:
Oito alunos jovens e adultos com diagnóstico de deficiência intelectual que neste
estudos foram nomeados de P1 até P8.
2.2 Local de coleta de dados:
O estudo foi realizado em uma sala de aula nas dependências da instituição
educacional onde os alunos estão matriculados. Ressalta-se que a sala destinada a
coleta de dados apresenta boas condições: privacidade dos participantes, isenta de
ruído e boa luminosidade. A instituição está localizada em uma cidade de pequeno
porte do interior do Estado de São Paulo.
2.3 Equipamentos e Matérias:
Lápis, borracha, folha de papel A4, lápis grafite, caneta, bem como outros materiais
necessários a realização de uma pesquisa: Computador, impressora, cartuchos de
tinta, papel sulfite.
2.4 Instrumentos:
Neste estudo de caracterização foi utilizado como instrumento de coleta de dados um
“Questionário de Caracterização” aplicado aos alunos com DI. O questionário
apresentou questões referentes a independência dos alunos em atividades dentro e
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fora de casa, se já teve experiência com algum tipo de trabalho fora de casa, se
gostaria de trabalhar fora e em que tipo de atividade.
2.5 Procedimentos de coleta e análise dos dados:
Antes que fosse dado início ao estudo, o projeto de pesquisa foi submetido e aprovado
pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da UFSCar por meio do
Parecer nº 190/2009. Os participantes receberam orientações a respeito da pesquisa,
dos procedimentos a serem realizados e assinaram o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido – TCLE aceitando a participação no referido estudo. Foram agendados
horários para a aplicação individual dos questionários. Após serem respondidos os
questionários foram analisados e discutidos com base na literatura da área.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Por meio dos questionários aplicados com os jovens e adultos com deficiência
intelectual foram obtidas as informações: apesar de 6 entre 8 participantes relatarem
ajudar nos serviços de casa, as tarefas a eles designadas não diferem de atividades
simples como lavar a louça, arrumar a cama e varrer o quintal, atividades estas que
não exigem habilidades mais elaboradas e que estimulem a cognição como o uso da
linguagem oral ou escrita. Os participantes P1, P3 e P5 não vão sozinhos a padaria
ou ao supermercado, e os demais (P2, P4, P6, P7 e P8), quando saem costumam
fazê-lo para comprar pães e doces. Nenhum dos participantes já teve a experiência
de trabalhar fora de casa, e com exceção do P2, todos os demais gostariam de
trabalhar. P1 (vender salgado), P3 (ajudar o pai no sítio), P4 (jardineiro), P5 (limpeza
da escola); P6 e P8 (vender tapete) e P7 (fazer entregas da horta). Todos os serviços
almejados pelos participantes são simples e podem ser executados pelos mesmos
desde que estes estejam preparados para se comunicar. A comunicação oral é
necessária desde o momento de conseguir o emprego ate mesmo durante a
execução das atividades e no convívio com o outro. As opções de vender tapete e
entregar os produtos da horta estão relacionadas a atividades desenvolvidas pelos
alunos dentro da escola especial onde alguns ajudam na horta e outros tecem
tapetes.
Os locais de passeio dos alunos se restringem a praça, igreja e casa de parentes e
nenhum deles relatou que encontra com os amigos em locais diferentes á escola. Os
alunos P1, P3 e P5 não saem de casa sozinhos para passear.
Apenas o participante P6 já trabalho fora de casa, os demais nunca tiveram esta
experiência, e somente P2 diz que não gostaria de experienciar o trabalho fora de
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casa. Assim entende-se ser de estrita importância o envolvimento social do indivíduo
com deficiência intelectual sendo que através dos mais diversificados contatos
externos (alem da família e escola) o desenvolvimento da letramento, vocabulário e
oralidade se torna mais amplo e possível.
Neste ponto Shimazaki (2006) afirma que: É muito importante que o educador de
indivíduos com deficiência mental compreenda o papel da alfabetização e do
letramento na vida dessas pessoas. Na medida em que a sociedade se desenvolve e
as novas condições sociais vão aparecendo, surgem novas demandas, também, em
relação à leitura e à escrita. É preciso usar a escrita no cotidiano, ampliar-se a
concepção de escrita para fora do contexto escolar, envolvendo a aprendizagem social
e histórica, que pressupõe o uso das habilidades/formações oferecidas pelas escolas
em situações específicas contextualizadas. (p. 42).
Além disso, estudos como os de Almeida (2003) revelam que indivíduos com
deficiência intelectual podem ser estimulados a trabalhar fora de suas residências em
trabalhos remunerados, considerados relativamente simples, mas que por
promoverem certa independência podem elevar a auto estima destes indivíduos,
favorecer novos aprendizados, aumentar o nível de conhecimento geral e até mesmo
promover aumento de estímulos para o letramento e a oralidade, conforme também
indicam o estudo de Rubin (2005).
Entretanto, os estudos de Shimazaki (2006), que mostram que: Apesar das tentativas
de encaminhamento profissional, poucas pessoas com deficiência mental têm
conseguido inserir-se no mercado de trabalho. Além de esse mercado estar
extremamente competitivo em uma sociedade que se caracteriza pelo desemprego,
geralmente, as pessoas com essa deficiência não apresentam o requisito mínimo de
letramento necessário ao trabalho. (p. 20).
Outro ponto analisado sobre às relações de amizades e eventuais passeios para
diversão sem serem devidamente acompanhados onde poucos afirmaram ter esta
atividade inserida em sua rotina. Neste sentido Padilha (2000) indica que ter amigos,
sair sozinho com os mesmos e formar laços mais estreitos com amigos é importante
para o crescimento mental e intelectual destes indivíduos o que pode ser refletido em
seu aprendizado, seu letramento e sua oralidade.
No atual estudo, entretanto, os jovens não encontram os amigos em ambientes
diferente do ambiente escolar e, além disso, não são todos que tem oportunidade de
saírem sozinhos para passear. Estes dados corroboram com Shimazaki (2006), uma
vez que em sua pesquisa afirma a carência destes indivíduos de contato e amizades
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externas o que pode aumentar seu nível de conhecimento e desenvolvimento cultural,
quando a autora acima citada revela que indagando aos seus entrevistados, eles
responderam que: Todos tinham telefone em casa, mas somente cinco sabiam dizer o
número. Esse fato denota que, possivelmente, a maioria desses alunos não
telefonavam, nem recebiam telefonemas. Isso acontece, pois o círculo de amizades de
indivíduos com deficiência mental se restringe aos colegas da escola e, se não sabem
o número de seus telefones, não podem fornecê-lo aos colegas e nem falar com eles.
(p.90).
Os estudos de Carvalho (2006) informaram que isolamento nunca é positivo para
nenhum tipo de individuo e quando o aluno possui alguma deficiência de qualquer tipo
é altamente desfavorável o isolamento, onde laços de amizade podem e devem
estimular a aprendizagem e o desenvolvimento destes indivíduos em todas as áreas.
4. CONCLUSÕES
Após a análise dos dados obtidos por meio dos questionários aplicados aos jovens e
adultos com deficiência intelectual conclui-se:
- Seis entre oito participantes relataram ajudar nos serviços de casa, entretanto as
tarefas a eles designadas não exigem habilidades mais elaboradas e que estimulem a
cognição como o uso da linguagem oral ou escrita.
- Apesar de demonstrar vontade de trabalhar nenhum dos participantes teve tal
oportunidade o que mostra a falta de credibilidade no potencial destes jovens.
- Os locais de passeio dos alunos se restringem a praça, igreja e casa de parentes e
nenhum deles relatou que encontra com os amigos em locais diferentes á escola, o
que mostra a restrição destes á situações de socialização.
REFERÊNCIAS
Almeida, M.L.S. (2003). Sujeitos não-alfabetizados: sujeitos de direitos, necessidades
e desejos. In: SOARES, Leôncio (Org.). Aprendendo com a diferença: estudos
e pesquisas em educação de jovens e adultos. Belo Horizonte: Autêntica.
Brauner, R. A. & Brauner, F (1989). Distúrbio da fala e da linguagem dos deficientes
mentais. In: Launy, L.; Borel – Maisonny, S. Distúrbios da linguagem, da fala e
da voz na infância. 2. ed. São Paulo: Roca. 121 a 131.
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Carvalho. M.F. (2006). Educação de jovens e adultos com deficiência mental: inclusão
escolar e constituição de sujeitos. Horizontes. V.24, n.2, p.161-171.
Geraldi, J.W. (Org.) (1984). O texto na sala de aula. Cascavel: Assoeste.
Koch, I. V. (2003). A inter-ação pela linguagem. 8. ed. São Paulo: Contexto.
MEC- Ministério da Educação do Brasil. (1995). Subsídios para organização e
funcionamento de serviços de educação especial: área de deficiência mental.
Brasília, DF.
Padilha, A.M.L. (2000). Bianca : o ser simbolico : para alem dos limites da deficiencia
mental. Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Educação,
Campina. (Tese de Doutorado).
Rubin, M. H. ; Almeida, M. A. (2005). Education of young people and adults with
intellectual disabilities in brazil: evolutive analysis of portuguese language and
mathematics. In: Inclusion: Celebrating Diversity, 2005, Glasgow. Inclusion:
Celebrating Diversity. Glasgow,v. 1. p. 32-40.
Shimazaki, E.M. ( 2006). Letramento em jovens e adultos com deficiência mental.
Tese de Doutorado - Faculdade de Educação - USP, 182p; São Paulo.