cap QUADRO SINOTICO III - NOCÇÕES BÃSICAS DE LOGICA CLÁSSICA

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/ -. 3571 Quadro sinótico III Noções básicas de lógica clássica Desde a Grécia antiga filosofar significa buscar a sabedoria por meio do uso metódico da razão. Aos filósofos interessa a formulação de raciocínios que cheguem a resultados verda- deiros, e não falsos. Por isso, diversos pensadores lançaram-se à tarefa de analisar as estru- turas dos raciocínios, organizando-as e classificando-as. Foi assim que nasceu a lógica. Conheça alguns de seus conceitos fundamentais. Ciência que tem por objeto determinar, por entre todas as operações intelectuais que tendem para o conhecimento do verdadeiro, as que são válidas, e as que não o são (cf. LA- IANDE, Vocabulário técnico e crítico da filosofia, v. 2, p. 41). Ou, simplesmente, ciência da forma (ou estrutura) do pensamento. Assim, a lógica preocupa-se com o aspecto formal de um raciocínio ou argumento (não com seu conteú- do), formulando regras do pensamento correto. -··--------- Divisão da lógica Devido a uma questão histórica e didática, a lógica costuma ser dividida em lógica clás- sica (ou tradicional, de origem aristotélica) e lógica moderna (ou simbólica ou matemá- tica, desenvolvida a partir do século XIX). No entanto, a lógica clássica está contida na ló- gica moderna. Expressões usadas muitas vezes como sinônimas, podendo-se fazer a seguinte distinção: Conceito -noção ou representação mental de um objeto. Termo -expressão verbal ou linguística (em palavras) de um conceito. Sócrates, homem, mulhu, t.-asa, etc Extensão e compreensão Quando examinamos um termo, devemos considerar sua: Compreensão - conjunto de predicados que um indivíduo deve possuir para ser de- signado por esse termo. Refere-se, portanto, às qualidades do ser designado.' Exemplo (c.om o termo ser humano): animal, vertebrado, bipede, racional etc. Extensão- conjunto de indivíduos aos quais se pode aplicar esse termo. Refere-se, portanto, à quantidade de seres por ele designados. (com Q termo ser humano): você, eu, Maria, Pedro, P.anlo etc. (enfim, toda a espécie, humana). Diagramas de E11ler Considerando a extensão dos termos, o matemático Euler (século XVIII) elaborou dia- gramas que revelam a existência de apenas cinco possibilidades de relacionarmos, em ter- mos lógicos, um par de termos (por exemplo: X e Y). 1. Completa igualdade entre X e Y: Todos os X são Y e lodos os Y são X. 8

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Quadro sinótico III Noções básicas de lógica clássica

Desde a Grécia antiga filosofar significa buscar a sabedoria por meio do uso metódico da razão. Aos filósofos interessa a formulação de raciocínios que cheguem a resultados verda­deiros, e não falsos. Por isso, diversos pensadores lançaram-se à tarefa de analisar as estru­turas dos raciocínios, organizando-as e classificando-as. Foi assim que nasceu a lógica.

Conheça alguns de seus conceitos fundamentais.

Ciência que tem por objeto determinar, por entre todas as operações intelectuais que tendem para o conhecimento do verdadeiro, as que são válidas, e as que não o são (cf. LA­

IANDE, Vocabulário técnico e crítico da filosofia, v. 2, p. 41). Ou, simplesmente, ciência da forma (ou estrutura) do pensamento. Assim, a lógica

preocupa-se com o aspecto formal de um raciocínio ou argumento (não com seu conteú­do), formulando regras do pensamento correto.

-··---------Divisão da lógica Devido a uma questão histórica e didática, a lógica costuma ser dividida em lógica clás­

sica (ou tradicional, de origem aristotélica) e lógica moderna (ou simbólica ou matemá­tica, desenvolvida a partir do século XIX). No entanto, a lógica clássica está contida na ló­gica moderna.

Expressões usadas muitas vezes como sinônimas, podendo-se fazer a seguinte distinção: • Conceito -noção ou representação mental de um objeto. • Termo -expressão verbal ou linguística (em palavras) de um conceito.

E.~emplo: Sócrates, mortal~ homem, mulhu, t.-asa, bola,jos~ etc

Extensão e compreensão Quando examinamos um termo, devemos considerar sua: • Compreensão - conjunto de predicados que um indivíduo deve possuir para ser de­

signado por esse termo. Refere-se, portanto, às qualidades do ser designado.' Exemplo (c.om o termo ser humano):

animal, vertebrado, mamífero~ bipede, racional etc. • Extensão- conjunto de indivíduos aos quais se pode aplicar esse termo. Refere-se,

portanto, à quantidade de seres por ele designados. E.~e.mplo (com Q termo ser humano):

você, eu, João~ Maria, Pedro, P.anlo etc. (enfim, toda a espécie, humana).

Diagramas de E11ler Considerando a extensão dos termos, o matemático Euler (século XVIII) elaborou dia­

gramas que revelam a existência de apenas cinco possibilidades de relacionarmos, em ter­mos lógicos, um par de termos (por exemplo: X e Y).

1. Completa igualdade entre X e Y: Todos os X são Y e lodos os Y são X.

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2. X pertence a Y: Todos os X são Y, mas nem todos os Y são X.

3. Y pertence a X: Todos os Y são X, mas nem todos os X são Y.

4. Interação parcial entre X e Y: Alguns X, mas não todos, são Y e alguns Y, mas não todos, são X.

5. Completa diferenciação entre X e Y: Nenhum X é Y e nenhum Y é X.

00 Podemos utilizar esse diagrama em mais de um par de conceitos. Exemplo: X e Y, X e Z.

Assim, podemos montar um diagrama composto e verificar a validade da conclusão de um raciocínio.

Expressões usadas muitas vezes como sinõnimas, podendo-se fazer a seguinte distinção: e - processo mental pelo qual se afirma ou se nega a relação entre dois conceitos. e -expressão verbal ou linguística (em palavras) de um juízo.

Exemplo: Este livro é de filosofia.

-Proposição que afirma ou nega a relação entre dois termos, sem colocar dúvida ou con-

dição. É formada por sujeito, verbo de ligação e predicado, na forma S é P. Exemplo: Sócrates é mortal.

De acordo com sua compreensão, a proposição categórica pode ser: • .Af"Cm<:tiva- enuncia que o predicado pertence ao sujeito.

Exemplo: O ser humano é racional. • -enuncia que o predicado não pertence ao sujeito.

Exemplo: O ser humano não é quadrúpede. De acordo com sua extensão, a proposição categórica pode ser:

-afirma ou nega algo referente à extensão total do sujeito. Exemplo: Todos os seres humanos são mortais (ou)

Nenhum ser humano é mortaL

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- afirma ou nega algo referente a uma parcela da extensão do sujeito . Exemplo: Alguns seres humanos são filósofos (ou)

Alguns seres humanos não -~~~Ji,lóso~os.

Proposições

{

universal: X é Y. ·· · afirmativas

particular: Algum X é Y.

negativas {

universal: Nenhum X é Y.

particular: Algum X não é Y.

Observação: em lógica, a palavra algum deve ser entendida como pelo menos um.

Expressões usadas muitas vezes como sinônimas, podendo-se fazer a seguinte distinção: • J.a.cfocf:::üc - processo mental que consiste em coordenar dois ou mais juízos anteceden­

tes, em busca de um juízo novo. • -expressão verbal ou linguística (em palavras) de um raciocínio. Exemplo:

O ser humano é racional. (1: premissa) Você é um ser humano. (2! premissa)

logo, você é racional. (conclusão) Desse modo, em um argumento temos:

• Pren:lissa- proposição que apoia (juízo antecedente) a conclusão fjuízo novo) de um argumento. • -proposição à qual se chega (juízo novo) ou que se pretende justificar pelo

argumento. é a operação intelectual (ou raciocínio) pela qual se chega a uma conclusão,

mas pode referir-se à conclusão mesma à qual se chega por essa operação.

Diferença entre verdade e validade: • - refere-se ao conteúdo afirmado ou negàdo em uma proposição, o qual pode

ser considerado verdadeiro ou falso. · • - refere-se às relações lógicas que se formam em um argumento entre as pre-

missas e a conclusão, sem importar seu conteúdo. Se essas relações são corretas, o argu­mento é válido; se são incorretas, é inválido. Vejamos um exemplo com proposições (premissas) hipotéticas (iniciadas pela conjunção se) para indicar que não sabemos se são verdadeiras ou falsas:

Se todos os seres humanos são mortais. E se Sócrates é ser humano.

logo, Sócrates é mortal. Fazendo esse exame, em termos lógicos, verificamos que ele é um argumento válido,

isto é, correto. Qualquer outro argumento que mantenha essa mesma forma lógica será igualmente válido:

Se todo Y faz parte de l. E se X faz parte de Y.

Logo. X faz parte de Z. No diagrama de Euler:

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Vejamos outro exemplo: Todos os gatos têm cinco patas.

Mimi é uma gata. Logo, Mimi tem cinco patas.

Em termos lógicos, esse argumento é considerado válido, embora a hipótese expressa em uma de suas premissas seja falsa, bem como falsa é sua conclusão.

Portanto, sempre que temos um argumento válido com premissas verdadeiras, sua con­clusão não poderá ser falsa ( cf. SALMON, Lógica, p. 3 7).

Dedução e indução Os argumentos podem ser divididos em dois tipos fundamentais:

• Dedução - argumento que se desenvolve de premissas gerais para uma conclusão parti­cular. Uma das formas mais importantes de argumento dedutivo é o silogismo. Silogismo é o argumento dedutivo composto de três partes: duas premissas e uma con­clusão. Exemplo:

Todo animal nasce, vive e morre. (l~ premissa) Ora, o tigre é um animal. (2~ premissa)

Logo, o tigre nasce, vive e morre. (conclusão) Podemos perceber que a conclusão obtida já estava de forma implícita na l ~ premissa.

Entretanto, para descobri-la ou explicitá-la, utiliza-se um juizo intermediário expresso na 2~ premissa. • Indução - argumento que, partindo de proposições particulares, procura chegar a uma

conclusão geral. Exemplo: Plantas e animais são seres vivos. (1! premissa)

Ora, observo que plantas e animais são formados por células. (2! premissa) Logo, todos os seres vivos são formados por células. (conclusão)

Nesse exemplo, embora as premissas sejam consideradas verdadeiras, a conclusão é

falsa de acordo com biólogos, pois os vírus são seres vivos que não apresentam células. Por isso, é preciso ter cuidado com o argumento indutivo. Pela observação e análise dos

fatos e fenômenos, podemos elaborar proposições particulares verdadeiras. No entanto, com base nessas proposições, as conclusões gerais a que chegamos são apenas provavel­mente verdadeiras, mas não seguramente verdadeiras, porque a conclusão extrapola as informações contidas nas proposições. Assim, essa conclusão pode ser falsa, mesmo que as proposições sejam verdadeiras.

Falácia Argumento logicamente equivocado (isto é, inválido), mas que parece correto. Exemplo:

Sofisma

Todos os gatos perfeitos possuem quatro patas. Mimi possui quatro patas.

logo, Mimi é um gato perfeito.

Falácia construída de má-fé, com a intenção de enganar. Alguns dos principais tipos de sofismas apontados por Aristóteles são: • Equívoco - emprega uma mesma palavra ou expressão em dois ou mais sentidos diver­

sos. Exemplo: Todo dono de banco é pessoa rica. Este mendigo é dono de um banco. Logo, este mendigo é pessoa rica.

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• Dar como causa o que antecedeu- estabelece como causa de um fato qualquer circuns­tância que o antecedeu no tempo. Exemplo:

Queirós tomou mel antes de pegar pneumonia. Logo, pegou pneumonia porque tomou meL

• Comparação indevida - considera apenas as semelhanças entre dois conceitos, despre­zando as diferenças que os separam. Exemplo:

O ser humano e o burro são animais. O ser humano é racional.

Logo, o burro também é racional. • Petição de principio - assume como explicação de um fato justamente aquilo que está

para ser explicado. Assim, o raciocínio gira num círculo vicioso. Exemplo: Não tenho fome porque me falta vontade de comer. Falta-me vontade de comer porque não tenho fome.

Conhecimentos evidentes e verdadeiros anteriores a qualquer demonstração, pontos de partida do conhecimento científico (o mesmo que axiomas). São três: • Principio de identidade - todo ser é idêntico a si próprio. Pode ser expresso como X é

X (tautologia). Exemplo:

Você é você. .,.

" sujeito predicado

Tautologia (do grego tauto, "o mesmo")- proposição em que o predicado é igual ao sujeito. • Principio do terceiro excluído - quando duas proposições com ô mesmo sujeito e o

mesmo predicado são contraditórias, necessariamente uma é falsa e a outra é verdadeira. Não existe uma terceira possibilidade. Pode ser expresso como X é Y ou X é não Y. Exemplo:

Este carro é azuJ. ou

Este carro não é azul. (uma é falsa e a outra verdadeira; não há uma terceira possibilidade)

• Princípio de não contradição- uma proposição e sua contradição não podem ser ver­dadeiras (ou falsas) ao mesmo tempo e no mesmo sentido. Pode ser expresso como: não (X é Y e não Y). Exemplo:

(É falso que) O círculo é redondo e não é redondo (por exemplo, quadrado).