Cap 3 Teorias da aprendizagem

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3 Análise do comportamento aplicada à psicopedagogia Cinthia de Azevedo Piccinato 1 Mariângela Gentil Savoia Viviane Rosalie Duarte A Análise do Comportamento Aplicada é uma abordagem da Psicologia que se baseia em uma ciência e filosofia caracterizadas por uma concepção naturalista e determinista do comportamento humano (Cannan-Oliveira, 2003). Surge com Watson em 1913, sendo conhecido por behaviorismo clássico ou metodológico. O behaviorismo metodológico caracteriza-se por ter como objeto de estudo o comportamento e utilizar métodos científicos compatíveis com os das ciências naturais. Esse behaviorismo nega o estudo da mente, pois seu objeto de estudo deve ser acessível a um ou mais observadores e adota uma concepção mecanicista, ou seja, relação de causa e efeito: S-R (estímulo – resposta). Como não explica satisfatoriamente alguns fenômenos, por questão de método científico, outros pesquisadores como Tolman e Hull reintroduziram fenômenos mentais nas explicações sobre o comportamento, surge o neo behaviorismo mediacional. Em 1932, Tolman apresenta o conceito de intencionalidade do comportamento, ou seja, o organismo se comporta para alcançar um objetivo. A idéia de intencionalidade apresentada por Tolman permite que ele seja considerado o precursor das teorias cognitivas por conta do processo S – O – R (estímulo – organismo - resposta) ao evidenciar uma posição mediacional e internalista quanto à concepção do comportamento. O ambiente é o iniciador da cadeia, mas as variáveis mediacionais são as causas do comportamento, o que é característica marcante da Terapia Cognitiva (Costa, 2002). 1 A ordem das autoras é meramente alfabética.

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Psicopedagogia : Teorias da Aprendizagem. Autoras (organizadoras) Leda Maria Codeço Barone, Lilian Cassia Bacich Martins, Marisa Irene Siqueira Castanho. Editora Casa do Psicólogo. Ano 2011.

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3Análise do comportamento aplicada à

psicopedagogia

Cinthia de Azevedo Piccinato1

Mariângela Gentil Savoia

Viviane Rosalie Duarte

A Análise do Comportamento Aplicada é uma abordagem da Psicologia que

se baseia em uma ciência e filosofia caracterizadas por uma concepção naturalista e

determinista do comportamento humano (Cannan-Oliveira, 2003). Surge com

Watson em 1913, sendo conhecido por behaviorismo clássico ou metodológico.

O behaviorismo metodológico caracteriza-se por ter como objeto de estudo o

comportamento e utilizar métodos científicos compatíveis com os das ciências

naturais. Esse behaviorismo nega o estudo da mente, pois seu objeto de estudo

deve ser acessível a um ou mais observadores e adota uma concepção mecanicista,

ou seja, relação de causa e efeito: S-R (estímulo – resposta). Como não explica

satisfatoriamente alguns fenômenos, por questão de método científico, outros

pesquisadores como Tolman e Hull reintroduziram fenômenos mentais nas

explicações sobre o comportamento, surge o neo behaviorismo mediacional. Em

1932, Tolman apresenta o conceito de intencionalidade do comportamento, ou seja,

o organismo se comporta para alcançar um objetivo. A idéia de intencionalidade

apresentada por Tolman permite que ele seja considerado o precursor das teorias

cognitivas por conta do processo S – O – R (estímulo – organismo - resposta) ao

evidenciar uma posição mediacional e internalista quanto à concepção do

comportamento. O ambiente é o iniciador da cadeia, mas as variáveis mediacionais

são as causas do comportamento, o que é característica marcante da Terapia

Cognitiva (Costa, 2002).

1 A ordem das autoras é meramente alfabética.

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Na tentativa de colocar o ambiente como determinante do comportamento e

se opondo à visão cognitivista, surge o modelo Behaviorista de Skinner, conhecido

como behaviorismo radical. Este behaviorismo se distingue dos demais por ser anti-

mentalista, ou seja, nega a existência de fenômenos que não sejam físicos. Esta

característica vai diferenciá-lo dos demais, pois o coloca dentro de uma perspectiva

monista, que significa dizer que o organismo é único e interage em sua totalidade

com o ambiente, não havendo diferença entre mente e corpo. Dito de outra forma, o

fenômeno mental é tão físico quanto o comportamental, a distinção entre mental e

comportamental está na acessibilidade. Em decorrência desta concepção, Skinner

falará em comportamento privado (cognições, sentimento) e comportamento público.

No comportamento privado a única pessoa que tem acesso é a que se comporta e o

comportamento público é observado por mais de uma pessoa. Assim, podemos

dizer que Skinner é radical (radical do termo raiz em latim) por negar a existência de

dois fenômenos distintos e não precisar de métodos diferentes para estudá-los.

(Costa, 2002)

Na Análise do Comportamento, o Behaviorismo é a base filosófica. Nesta

abordagem há duas vertentes de investigação: a Análise do Comportamento

Experimental construída a partir de pesquisas básicas, as quais propiciaram a

fundamentação teórica e conceitual da Análise do Comportamento e a Análise do

Comportamento Aplicada, tecnologia utilizada na intervenção de comportamentos

socialmente relevantes, nas áreas de saúde, organização, política e educação,

tecnologia esta advinda da pesquisa básica. Ainda, na Análise do Comportamento, o

comportamento é definido como a relação entre o organismo e ambiente (Skinner,

1938). O ambiente engloba condições externas (fora da pele) e condições internas

(dentro da pele, em que a genética também tem sua contribuição), não é um

universo indefinido, mas o ambiente que efetivamente afeta o organismo (Malerbi,

1999 e Windholz, 2002)

O paradigma utilizado por Skinner para explicá-lo consiste na tríplice

contingência S – R – C (estímulo – resposta – consequência). O indivíduo age no

ambiente e produz mudanças (consequências), que por sua vez retroagem sobre o

indivíduo, determinando a ocorrência ou não do comportamento em condições

similares no futuro. Essa definição contempla o entendimento de desenvolvimento

psicológico como mudanças progressivas nas interações entre os comportamentos e

eventos do ambiente, o que ressalta a importância de se atentar para as

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modificações nas interações (Bijou & Baer, 1980). Desta forma, o analista do

comportamento não deve se preocupar apenas com as mudanças topográficas do

comportamento, isto é, como este se apresenta, sua forma (por exemplo, brincar,

falar, escrever, ler, entre outros), mas, sim, com as mudanças que ocorrem nas

interações, o comportamento muda, novas habilidades são desenvolvidas e

refinadas porque novas interações são estabelecidas entre a criança e o seu

ambiente.

Em resumo, comportamento, como unidade de estudo da Psicologia, deve ser

compreendido como interação/relação do indivíduo com o seu ambiente, portanto,

não existe comportamento desvinculado do ambiente, assim como não existe

ambiente sem estar relacionado às ações do organismo.

A Terapia Analítico Comportamental estudará os comportamentos públicos,

bem como os privados (sentimentos, cognições e outros estados subjetivos). Os

comportamentos privados também precisam ser analisados para explicar sua

ocorrência. Como sentimentos e outros estados subjetivos são considerados

comportamentos e não causas de comportamentos públicos sua análise deve ser

realizada da mesma maneira que a do comportamento publicamente observado

(Windholz, 2002).

Assim, conforme destacamos anteriormente, para Skinner, uma formulação

para entender qualquer comportamento, seja público ou privado, deve-se especificar

a interação entre o organismo e seu ambiente, o que implica em realizar a descrição

da tríplice contingência. Contingência é a relação de dependência entre eventos e

pode também ser chamada de contingência de reforçamento. A análise da

contingência se dá a partir das seguintes informações (Skinner, 1998):

1) A ocasião que o comportamento ocorre (S)

2) O comportamento (R)

3) As consequências reforçadoras (C)

CONCEITOS BÁSICOS

Faz-se necessário apresentarmos os conceitos teóricos aos leitores que não

estão familiarizados com esta abordagem.

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Na análise do comportamento todo comportamento do indivíduo, seja público

ou privado, é aprendido via interação com o ambiente. Existem dois tipos de

comportamento, o comportamento respondente e o comportamento operante.

O comportamento respondente é o comportamento inato também conhecido

como comportamento reflexo. A salivação frente a um alimento e a contração pupilar

frente à luz são exemplos de comportamento respondente.

Este comportamento é determinado por um estímulo e sempre produz a

mesma resposta. O paradigma que o ilustra é o S R (estímulo incondicionado

resposta). Contudo, alguns estímulos incondicionados podem se tornar estímulos

condicionados pelo procedimento de pareamento de estímulos. Neste caso, o

comportamento respondente pode se tornar condicionado. Pavlov demonstrou que o

estímulo incondicionado (alimento) pareado com a campanhia sempre que se

apresentava o alimento, tornou a campanhia um estímulo condicionado e eliciador

de salivação. Na prática podemos observar um estímulo incondicionado tornar-se

condicionado, por exemplo, no caso de uma criança que sofreu bulliyng. Pessoas

que apresentam características físicas (cheiro, aparência, voz entre outras) similares

ao agressor, mesmo que não apresentem o mesmo comportamento, podem

desencadear as mesmas reações vivenciadas na situação abusiva fazendo com

que, no futuro, apresente receio, aversão a pessoas com aquelas características.

O comportamento operante é aquele modelado pelas suas consequências.

Neste comportamento estão envolvidas duas relações: relação entre a resposta e a

consequência e a relação entre a consequência e o(s) estímulo(s) presente(s) na

situação em que a resposta foi reforçada. Nesta última relação, a resposta só

produzirá reforço na presença de determinado(s) estímulo(s) e não de outros. O

paradigma deste comportamento é o SD R C (estímulo discriminativo

resposta consequência). A relação estabelecida não é mecânica como a que

ocorre no comportamento respondente, mas selecionista, ou seja, o indivíduo se

comporta e produz consequências; a partir destas, o comportamento poderá ou não

ocorrer novamente. As consequências produzidas pelo comportamento podem ser

reforçadoras ou punitivas.

As consequências reforçadoras são aquelas que aumentam a probabilidade

do comportamento se repetir ou ocorrer frequentemente no futuro. Há dois tipos de

reforço, o reforço positivo e o reforço negativo.

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Quando uma pessoa se comporta e essa ação é seguida pela adição,

produção ou aparecimento de algo novo, algo que não estava lá antes do ato e este

acréscimo faz com que a ocorrência do comportamento aumente no futuro,

chamamos essa consequência de reforço positivo. Por exemplo, o bebê faz uma

gracinha para os pais, estes riem e o bebê repete a ação, os pais riem novamente e

o bebê torna a repetir a ação (comportamento = bebê faz gracinha consequência

= pais riem comportamento= bebê repete a gracinha; ou comportamento = pais

riem consequência = bebê repete a gracinha comportamento = os pais riem

novamente).

Os reforçadores positivos podem ser divididos em reforçadores intrínsecos,

aqueles que são naturalmente reforçadores, e reforçadores extrínsecos. Os

reforçadores intrínsecos decorrem do comportamento do indivíduo e não necessitam

da ação de terceiros. Por exemplo, o comportamento de brincar e a criança que lê

um livro sem que este seja indicado pela escola. Estes seriam exemplos de

comportamentos em que o reforço é produzido pelo próprio comportamento. Uma

educação formal bem sucedida seria a de fazer com que os estudantes não

estudassem para tirar nota alta ou para não repetir o ano letivo, mas que eles

aprendessem a aprender. Isto significa dizer, que o comportamento de estudar o

tornaria reforçador por si mesmo, o que o controlaria seria o conhecimento e não a

nota ou a esquiva da repetência. Os reforçadores extrínsecos necessitam da

intervenção direta de outra pessoa, ou seja, as consequências são liberadas por

outro, esses reforçadores podem ser materiais ou sociais, por exemplo: dinheiro,

nota, comida, roupa, elogio, expressões faciais, entre outros.

Quando uma pessoa se comporta e essa ação é seguida pela subtração,

remoção ou eliminação de algo, fazendo com que alguma condição ou coisa que

estava lá antes do ato desapareça e essa remoção faz com que a ocorrência do

comportamento que o retirou aumente no futuro, chamamos essa consequência de

reforço negativo. Por exemplo, a criança pede para mãe um brinquedo na loja, a

mãe fala que não comprará o brinquedo, a criança insiste, novamente a mãe recusa,

a criança começa a chorar e berrar, a mãe dá o que a criança quer e a criança para

de chorar (comportamento = a mãe fala não consequência = a criança insiste

comportamento = a mãe fala não consequência = choro e berro

comportamento= mãe dá o que a criança quer consequência = término do choro).

Page 6: Cap 3   Teorias da aprendizagem

Neste exemplo, o comportamento da criança é reforçado positivamente, ganha o

brinquedo, e o comportamento da mãe é reforçado negativamente, no sentido de

que retira o estímulo choro e berro, muito provavelmente não agradável (aversivo)

para a mãe.

Um outro tipo de consequência é aquela que chamamos de punição. Uma

contingência punitiva ou aversiva é aquela em que uma ação é seguida ou pela

perda de reforçadores positivos ou ganho de reforçadores negativos. Um dos efeitos

da punição é produzir resposta de fuga e esquiva. O indivíduo, frente a uma situação

aversiva, pode se comportar para retirar, evitar ou escapar dessa situação. A

situação aversiva acontece antes que se possa evitá-la e o comportamento de fuga

permite por fim a esta situação. O comportamento de esquiva impede que uma

situação aversiva aconteça, o indivíduo não vivencia esta situação. Uma esquiva

bem sucedida torna o comportamento de fuga desnecessário.

A contingência aversiva pode produzir ansiedade, sentimento de culpa,

vergonha e raiva. A seguir são descritas duas professoras para ilustrar uma

contingência não aversiva e outra aversiva. A contingência não aversiva seria em

que está presente uma professora que responde de forma solicita às questões de

seus alunos e na contingência aversiva a professora é aquela que responde de

forma impaciente e, às vezes, ridiculariza as questões feitas. A professora solícita é

um estímulo discriminativo para os alunos perguntarem. A professora impaciente é

um estímulo discriminativo para os alunos não perguntarem ou diminuírem a

emissão deste comportamento. A contingência aversiva pode produzir nos alunos

sentimento de vergonha, medo e ansiedade. A professora é um estímulo

discriminativo para uma possível punição, neste caso, a depender da pergunta o

aluno pode ser ridicularizado na frente da classe. Em decorrência dessa história de

interação, é muito provável que os alunos deixem de fazer perguntas para se

esquivar da reação da professora.

Ao falarmos que uma situação pode ser estímulo discriminativo para a

ocorrência ou não de determinado comportamento significa afirmar que a situação

não elicia o comportamento, mas estabelece a ocasião para o comportamento

ocorrer e, assim, ser reforçado. O estímulo (antecedente ou discriminativo) que

estabelece a ocasião para a resposta ocorrer é produto de uma história específica

de reforçamento. Esta história estabelece que uma resposta foi seguida de reforço

na presença de determinado estímulo e não foi seguida de reforço na presença de

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outro estímulo. A produção de reforço não depende apenas da emissão de uma

resposta, mas também da presença de determinados estímulos. Os estímulos que

diminuem a probabilidade de um comportamento ocorrer são chamados de

estímulos delta (S∆ ou S-). Na análise do comportamento, o conceito de estímulo

discriminativo está relacionado ao que chamamos de controle de estímulo.

A análise do comportamento é uma teoria da aprendizagem e toda

construção de seu conhecimento tem como objetivo compreender o comportamento

humano. Pesquisas realizadas em laboratório descobriram que: a) a consequência é

o estímulo responsável por ensinar/instalar um comportamento; b) quando se quer

ensinar um novo comportamento deve-se começar utilizando o reforçamento

contínuo, que se caracteriza por reforçar cada vez que o comportamento ocorre; c)

quando o comportamento já foi aprendido e se quer torná-lo mais duradouro utiliza-

se o reforçamento intermitente, que se caracteriza por ora o comportamento ser

reforçado e ora não; d) um estímulo que é reforçador para uma pessoa não

necessariamente o é para outra, por isso saber se um estímulo é reforçador implica

em observar seu efeito no comportamento; e) entender uma pessoa (repertório

amplo de comportamentos) significa conhecer sua história de vida (o que a levou a

se tornar o que é) e as contingências que estão em vigor na sua vida (o que a

mantém a ser/estar).

A PSICOPEDAGOGIA COMPORTAMENTAL

Tendo em vista que a Psicopedagogia é a aplicação dos conhecimentos

psicológicos na área da Educação, podemos definir Psicopedagogia

Comportamental como a utilização da Análise do Comportamento Aplicada à área

da Educação (Marinotti, 2001). A contribuição da Terapia Analítico-Comportamental

à área da Educação é a descrição e análise das contingências de reforçamento em

que se desenvolve o processo de ensino-aprendizagem.

O papel do psicopedagogo comportamental é o de analisar as contingências

que geram dificuldades de aprendizagem e/ou escolares. Os aspectos que geram

dificuldades de aprendizagem estão relacionados ao repertório acadêmico do

indivíduo, ou seja, ausência ou falha de habilidades que são pré-requisitos para o

desenvolvimento de um novo conteúdo acadêmico, por exemplo, condições de

ensino inadequadas às características do indivíduo. Em relação às contingências

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envolvidas nas dificuldades escolares, deve-se analisar as condições nas quais o

problema ocorre, assim como as consequências que o mantém (Hubner & Marinotti,

2000). Dificuldades escolares estão relacionadas ao aprender a estudar que se

caracteriza por fazer lição, resolver exercícios, ler um texto, responder perguntas

sobre ele, permanecer concentrado na tarefa até o seu término e realizar a tarefa

antes do lazer (Regra, 2004).

A partir da análise das contingências que explicam as dificuldades de

aprendizagem e escolares o psicopedagogo comportamental deve alterar as

condições antecedentes e programar consequências reforçadoras para que ocorra:

aquisição e enriquecimento de repertório acadêmico, desenvolvimento do

funcionamento global, diminuição de comportamentos que interferem na

aprendizagem, apoio e orientação de familiares, organização do ambiente para

favorecer o desenvolvimento da autonomia, atenção e hábitos de estudo.

A intervenção do psicopedagogo comportamental não se restringe apenas a

crianças com dificuldades de aprendizagem, mas também a crianças com distúrbios

no desenvolvimento, como por exemplo, crianças com diagnóstico de transtorno

invasivo do desenvolvimento2. Neste caso, o papel do profissional será tanto o

atendimento individual com a criança e seus familiares, como a inclusão desta na

escola regular.

A intervenção psicopedagógica comportamental envolve quatro fases: 1.

Avaliação, 2. Seleção de Metas e Objetivos, 3. Planejamento de Técnicas e

Procedimentos de Intervenção, 4. Intervenção.

1. Avaliação

Antes de qualquer intervenção é necessário entender a queixa (problema)

para depois propor estratégias e técnicas para mudanças comportamentais. A

identificação dos principais fatores responsáveis pela dificuldade da criança se dá

pela avaliação psicopedagógica, cujo objetivo é o de obter um levantamento de todo

o repertório acadêmico e das variáveis que controlam o seu desempenho (sejam

ambientais ou orgânicas).

2 A categoria transtornos invasivos do desenvolvimento inclui o autismo, a síndrome de Rett, o transtorno desintegrativo da infância, e uma categoria residual denominada transtornos invasivos do desenvolvimento sem outra especificação. O termo está presente na tradução pela ArtMed dos manuais do CID-10 e do DSM-IV.

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Durante a avaliação comportamental para identificação de dificuldades de

aprendizagem, Hubner e Marinotti (2000, pg. 260) propõem investigar as seguintes

variáveis:

• Quadros neurológicos e/ou psiquiátricos;

• História de vida da criança e/ou adolescente;

• Defasagem entre o repertório individual e o nível de exigência escolar;

• Condições temporárias ou eventuais (mudança de escola ou residência,

problemas familiares específicos, bullying e etc);

• Transtornos de Aprendizagem;

• Falhas no sistema educacional.

Depois desse levantamento é possível planejar o atendimento individualizado

para aquele caso. O sucesso do atendimento dependerá da elaboração adequada

das informações obtidas na avaliação e do planejamento de estratégias de

intervenção. A característica marcante dessa abordagem é o sujeito como seu

próprio controle, ou seja, qualquer análise sobre o desempenho do indivíduo antes,

durante e após intervenção é feita comparando ele com ele mesmo.

A avaliação psicopedagógica se dá por entrevista com pais, professores e

pessoas próximas à criança que possam fornecer dados interessantes e relevantes

para as dificuldades relatadas. Caso haja possibilidade do aluno ter um quadro

neurológico ou psiquiátrico, é importante ter acesso a sua avaliação diagnóstica.

Nesse primeiro momento, são coletadas todas as informações da história de

vida do aluno, problemas familiares específicos (doença, separação, mudança de

escola ou cidade, etc.), dados sobre a escola (proposta pedagógica, número de

alunos por sala, relação com a professora) e oportunidade de estimulação oferecida

(fatores culturais e sócio-econômicos, estimulação aversiva excessiva ou

inapropriada).

Cabe ressaltar que em muitos casos é relevante realizar observação direta da

criança em diferentes contextos, como por exemplo, na escola e em casa. A partir

das observações e relato dos pais, é possível levantar hipóteses sobre as

contingências de reforçamento que a criança está inserida, identificar como ela se

relaciona com seus pais, familiares e colegas e se essas relações se baseiam em

contingências reforçadoras ou aversivas. Contingências aversivas podem causar

reações emocionais nos indivíduos, como, raiva, medo, ansiedade e ressentimento.

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Nessas condições o indivíduo pode apresentar comportamentos de fuga/esquiva e

inação teimosa (Skinner, 1975). Indivíduos que vivenciam relações pessoais

aversivas ou contingências aversivas no processo de ensino-aprendizagem podem

desenvolver reações emocionais que interferem na aprendizagem.

Para o levantamento do repertório acadêmico e cognitivo do aluno, o

psicopedagogo utiliza instrumentos de avaliação informais (jogos, materiais

elaborados pelo psicopedagogo e o material acadêmico da própria criança) que o

auxilia a identificar déficits relacionados à habilidade de seguir regras, compreender

instruções, solucionar problemas, habilidades relacionadas à área de leitura e escrita

e à área de matemática; e instrumentos de avaliação formais/padronizados, por

exemplo, escalas Wechsler de inteligência WISC-III e o Teste de Desempenho

Escolar (TDE). Lembrando que os dados fornecidos devem ser analisados em

conjunto com os outros e o resultado dos testes deve ser focado na análise

qualitativa.

2. Seleção de Metas e Objetivos

Na intervenção psicopedagógica é importante que o psicopedagogo

estabeleça os objetivos da intervenção. Como salienta Vargas (1974), os objetivos

visam a atender a três funções: ajudar o professor a selecionar experiências de

aprendizagem; comunicar o que se espera e fornecer padrões tanto ao professor

quanto ao aluno, para avaliar o progresso. A seleção de experiências de

aprendizagem só é possível se o professor e/ou psicopedagogo têm claro o que o

aluno deve fazer. Isso implica em colocar os objetivos de maneira clara, ou seja,

devem ser colocados em termos do comportamento observável do indivíduo. Se isto

não ocorrer, provavelmente o processo de instrução não proporcionará a meta

desejada. Por exemplo, em vez de querer que a criança compreenda a estrutura da

sentença, deve-se ter como objetivo que ela selecione sentenças simples e

complexas do trecho de um texto (Home, 1971).

3. Planejamento de Técnicas e Procedimentos de Intervenção

O material coletado nos momentos da avaliação e da seleção de objetivos,

permite que sejam escolhidos os melhores procedimentos e técnicas de intervenção

para o caso.

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Um instrumento utilizado durante todo o processo de intervenção é a análise

funcional da dificuldade escolar ou de aprendizagem, ou seja, análise das condições

de ensino diante das quais o problema ocorre e das condições consequentes que

mantêm o problema. Esta análise busca identificar os comportamentos que devem

ser ensinados e aprendidos e as consequências que aumentam ou diminuem a

probabilidade que tais comportamentos ocorram no futuro.

Diante da possibilidade de inúmeros procedimentos e técnicas de ensino que

podem ser desenvolvidos de acordo com a necessidade de cada criança, também é

interessante saber que existem técnicas já conhecidas e testadas, que podem

facilitar o planejamento da intervenção, como por exemplo, o treino autoinstrucional

e o de solução de problemas. Estes dois treinamentos serão descritos a seguir:

a) Treino de autoinstrução

Este treinamento foi desenvolvido por Meichenbaum nos anos 60, baseado

nos trabalhos de Luria e Vygotski, onde uma das funções da linguagem para a

criança é a de guiar ou ordenar seu próprio comportamento. O reconhecimento de

que as instruções “internas” têm esta função, leva-o a descrever um procedimento

para modificar estas instruções (Santacreu, 1996).

Segundo Luria (1961) o papel da linguagem no comportamento pode-se

distinguir em três etapas: Primeira etapa - o comportamento das crianças é dirigido

por outras pessoas. Segunda etapa - as crianças guiam seu próprio comportamento

através de verbalizações em voz alta. Terceira etapa - as crianças guiam seu

próprio comportamento através de uma linguagem encoberta, ou seja, o

pensamento. Conseguimos apreender estas etapas quando da aprendizagem de um

comportamento novo, como: dirigir, cozinhar um prato novo, ler um livro, resolver

problema matemático, etc.

O treino autoinstrucional consta de cinco fases:

1ª fase - O adulto age como modelo, realizando a tarefa e falando em voz alta os

passos do que irá fazer (modelação).

2ª fase - A criança realiza a mesma tarefa sob as instruções do adulto.

3ª fase - A criança realiza a tarefa falando as instruções em voz alta.

4ª fase - A criança realiza novamente a tarefa em voz baixa (murmúrio).

5ª fase - Finalmente a criança realiza a tarefa com as instruções internalizadas

(autoinstrução encoberta - pensamento).

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Com relação às contribuições deste treino às dificuldades de aprendizagem,

alguns estudos como os de Robin, Armel e O’Leary (1987), Leon e Pepe (1983) e

Burgio, Witman e Johnson (1980) mostraram eficácia deste procedimento com

dificuldades de escrita, compreensão de leitura e cálculo e também nos

comportamentos hiperativos/impulsivos e nas questões de atenção.

b) Treinamento em solução de problemas

Esta habilidade é muito importante para os seres humanos e compreende

uma série de habilidades específicas em vez de uma única capacidade (Nezu &

Nezu, 1996). Os processos incluem:

1ª fase - Orientação para o problema;

2ª fase - Definição e formulação do problema;

3ª fase - Levantamento de alternativas;

4ª fase - Tomada de decisões;

5ª fase - Prática da solução e verificação.

O treinamento se dá em todas essas fases por meio de auxílio do

psicopedagogo à criança ou ao adulto que têm dificuldades nesta área, em cada

fase. Por exemplo, um aluno universitário que tem dificuldade de se organizar para

os estudos.

A orientação do problema pressupõe que o cliente tenha uma meta e uma

motivação para resolver este problema. O terapeuta levanta com ele as

consequências de ser reprovado: dependência de algumas matérias, atraso na

formatura, desgaste com os pais, etc.

Definição do problema: o terapeuta e o cliente fazem um levantamento das

informações a respeito dos fatos disponíveis para o problema, tais como, horários

possíveis de estudo, horários de sono, saídas com os amigos, atividades

incompatíveis que competem com o estudar, como ficar no computador, por

exemplo. Quem está envolvido no problema? Onde ocorre o problema? Por que

ocorreu este problema? O que acontecerá se o problema não for solucionado?

A partir da definição do problema a ser trabalhado é necessário fazer o

levantamento de todas as alternativas possíveis, tais como: estudar na biblioteca,

reservar um horário de estudo na agenda (fazer a agenda), dividir as matérias por

dia, fazer um contrato pessoal de não sair de casa sem ter estudado pelo menos

duas horas por dia, estudar com amigos, entre outras.

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Tomada de decisões, tendo definido as alternativas é necessário avaliar como

elas serão executadas, por exemplo, começar pela tarefa que o estudante tem mais

dificuldade, se for estudar com os amigos verificar como esse arranjo será feito,

disponibilidade do colega, estudar em conjunto facilita a concentração ou é mais fácil

a dispersão para outros assuntos?

Verificação, ao colocar as estratégias em prática é necessário verificar a sua

efetividade e as possíveis dificuldades. Se o objetivo não foi atingido será necessário

rever o problema e as alternativas para solucioná-lo.

4. Intervenção

Uma das características da intervenção psicopedagógica comportamental é

seu caráter individualizado. Os procedimentos utilizados para intervir irão variar para

cada aluno. Apesar disso, iremos discutir algumas possibilidades de intervenção

entre tantas possíveis.

a) Dificuldade de Aprendizagem em decorrência de contingências aversivas na

relação com familiares e colegas:

A dificuldade de aprendizagem que a criança pode apresentar estaria

relacionada a problemas emocionais decorrentes de contingências aversivas nas

relações. O objetivo do trabalho seria o de promover autoconhecimento, ou seja,

análise das contingências envolvidas nas relações pessoais. Junto com a criança,

analisamos como seus comportamentos afetam os outros e como os outros o

afetam, assim como, a identificação e expressão de seus sentimentos. O outro

aspecto da intervenção é o de orientação com os pais com o intuito de mudar as

relações, ou seja, propiciar contingências menos coercitivas.

b) Dificuldade de Aprendizagem em decorrência de contingências aversivas no

processo ensino-aprendizagem

A criança pode apresentar dificuldade de aprendizagem em decorrência de

uma história de fracasso escolar devido tanto à ausência de pré-requisitos no seu

repertório acadêmico quanto à inadequação do planejamento do conteúdo

acadêmico.

Neste caso a intervenção visa construir material que proporciona ao

estudante construir uma história de sucesso na realização das atividades. A

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sequência de ensino deve ser programada de acordo com as habilidades da criança,

ou seja, deve-se identificar o repertório que a criança já tem e ensinar os

comportamentos pré-requisitos que faltam para ir para o próximo conteúdo. Isto

implica em planejar as habilidades a serem desenvolvidas. Quando se faz um

planejamento no qual se especifica os objetivos de maneira descritiva e direta, fica

claro saber o que é pré-requisito para cada comportamento a ser ensinado.

O planejamento do conteúdo a ser ensinado, a sequência de como será

trabalhado, a mudança do material de estudo da criança, são as condições

antecedentes da tríplice contingência que o psicopedagogo deverá programar.

Essas mudanças têm o objetivo de evitar comportamentos de fuga/esquiva da

criança na realização das atividades acadêmicas e propiciar uma nova história de

aprendizagem, na qual o sucesso passará a fazer parte.

Contingências de ensino inadequadas, ou seja, a ineficiência do método de

ensino advinda do mau planejamento produz dificuldades para a criança

acompanhar seus pares na sala de sala. Além disso, o grande número de alunos

presentes na sala diminui a possibilidade de o professor valorizar o que cada

estudante faz corretamente. Com isso, uma nova contingência aversiva é

observada. Queixas frequentes quanto ao desempenho do aluno à família, aumenta

a punição dos pais e professores e, consequentemente, aumentam os

comportamentos de esquiva do aluno. Mais uma vez, a intervenção consiste em

desenvolver repertórios adequados, tanto acadêmicos quanto sociais, fazer reunião

com pais para orientá-los a serem menos aversivos e orientar a criança quanto aos

seus hábitos de estudo (se necessário).

c) Dificuldades escolares

Regra (2004) descreve as intervenções necessárias para desenvolver

habilidades para aprender a estudar que se baseiam na definição clara do problema.

Quais os comportamentos são considerados partes desse amplo repertório? Ou,

quais são os comportamentos que o aluno deve possuir para que o estudar se torne

efetivo e prazeroso? A resposta a essa pergunta definirá o nosso objetivo e, a partir

disso, serão levantadas estratégias e alternativas para mudanças de

comportamento, diminuir e/ou eliminar dificuldades escolares e ensinar o

comportamento de aprender a estudar (hábitos de estudo adequados). As

intervenções propostas por Regra (2004) são:

Page 15: Cap 3   Teorias da aprendizagem

1ª proposta - Fazer primeiro as atividades acadêmicas e escolher algo que mais

goste para fazer imediatamente após. Se esta regra não for seguida, qualquer

atividade de lazer permanece suspensa até que sejam feitas as tarefas

combinadas;

2ª proposta - Efetuar os trabalhos acadêmicos sempre no mesmo local;

3ª proposta - Efetuar os trabalhos acadêmicos sempre que possível no mesmo

horário;

4ª proposta - Dar um pequeno intervalo entre uma etapa concluída e o início de

outra;

5ª proposta - Fazer primeiro as lições mais difíceis, mais demoradas e mais

cansativas.

Ainda de acordo com a autora, o papel do psicopedagogo será o de orientar

os pais a: fornecer informações sobre o desempenho dos filhos; caso a criança

esteja acostumada a fazer lição e estudar junto com um e/ou ambos os pais, o

psicopedagogo deve programar a retirada gradual da presença da deles nesses

momentos; estabelecer contingências reforçadoras para os comportamentos alvo,

isto é, que se quer que a criança desenvolva e ignorar os comportamentos de

esquiva às situações de estudo.

Segundo Regra (2004) a efetividade da realização das atividades acima

citadas requer que a criança tenha como pré-requisito o comportamento de seguir

regras e esteja em processo de formação de responsabilidade. O comportamento de

seguir regras deve ser ensinado à criança desde os primeiros anos de vida. Isto

requer que os pais estabeleçam contingências consistentes às regras estabelecidas.

Por exemplo, se a mãe estabelece com a criança que ela só assistirá televisão

depois que tomar banho, a mãe deve se comportar exatamente igual à contingência

descrita.

d) Dificuldades decorrentes de quadros neurológicos e/ou psiquiátricos

A metodologia comportamental e sua aplicação sistemática e controlada é a

mais eficaz na educação de crianças que apresentam um quadro específico

neurológico e/ou psiquiátrico.

No Brasil, as instituições educacionais ainda não integraram a metodologia

comportamental no seu planejamento de ensino. Assim, o atendimento que

Page 16: Cap 3   Teorias da aprendizagem

apresenta melhores resultados é aquele que consegue conciliar a prática

individualizada realizada no consultório, o monitoramento da inclusão da criança no

ensino regular, a adesão da família ao tratamento e o intercâmbio constante com as

demais terapias (como por exemplo: terapia ocupacional, fonoaudiologia,

fisioterapia, etc). Este modelo integra todas as pessoas que têm contato com a

criança, tornando o aprendizado consistente e eficiente na diminuição de

comportamentos inadequados e no aumento de comportamentos socialmente

relevantes. A intervenção comportamental para estes casos específicos tem muitos

pontos em comum com outros atendimentos já descritos.

Cada ambiente de trabalho citado, domicílio, escola e clínica possuem

características de intervenção específicas.

Na clínica, a intervenção comportamental se inicia com uma avaliação de

todo repertório comportamental da criança. Existem alguns testes específicos que

podem ajudar na avaliação inicial, como: The Assesment of Basic Language and

Learning Skills (ABLLS), Partington & Sundberg (1998) e Inventário Portage

Operacionalizado de Willians e Aielo (2001). Esta avaliação permite que o terapeuta

desenvolva programas de ensino individualizados, ou seja, direcionados para a

necessidade de cada criança.

Feita a avaliação clínica, observações em outros ambientes são importantes,

como no domicílio e escola. Estas observações complementam o que foi visto

durante a avaliação e o relato dos pais em relações às dificuldades e habilidades da

criança.

Depois desta primeira etapa é decidido o tipo de atendimento necessário para

cada caso. Para alguns são indicados atendimentos domiciliares que facilitam o

aprendizado de comportamentos de vida diária no ambiente natural.

Outra possibilidade de intervenção é o acompanhamento da inclusão da

criança na escola regular (pública ou privada). O melhor resultado nesse caso está

no treinamento de uma monitora que acompanhará a criança na sala de aula. O

ideal é encontrar monitoras que já possuem algum contato com a Análise do

Comportamento, como alunos do curso de Psicologia. Se não for possível, o

treinamento deverá ser mais extenso e completo. Além da permanência da pessoa

na sala (que pode variar de acordo com a necessidade de cada um) o responsável

pelo caso deverá fazer reuniões regulares com o professor de sala, coordenador de

Page 17: Cap 3   Teorias da aprendizagem

ensino e diretor da escola, para juntos tomarem decisões sobre programação de

ensino, práticas educacionais e progressão escolar.

ESTUDO DE CASO

Pedro3, sexo masculino, sete anos de idade, é encaminhado para intervenção

psicopedagógica com suspeita de apresentar déficit de atenção e dislexia. Pedro

está no primeiro ano do ensino fundamental, sendo que é a segunda vez que o

frequenta.

Avaliação psicopedagógica

Tendo em vista que o psicopedagogo pode ter como formação acadêmica,

por exemplo, a Pedagogia ou outras áreas afins, cabe ressaltar que alguns

instrumentos de avaliação só são permitidos para o profissional com formação em

Psicologia. Como o psicopedagogo do caso a seguir era psicólogo, pode utilizar

como instrumento de avaliação o WISC.

Material de estudo:

• Entrevistas iniciais com pais: Dados de desenvolvimento; história médica;

principais queixas dos pais.

• Visita à escola.

• Aplicação de provas psicológicas: WISC; avaliação de leitura e escrita;

avaliação do material escolar e produção acadêmica

• Observação em situações lúdicas no consultório

a) Entrevista com os pais

Pedro é filho único. Seu desenvolvimento psicomotor foi o esperado para

cada faixa etária, assim como o desenvolvimento da fala. Segundo os pais, Pedro

sempre foi uma criança agitada, imatura e inocente, não apresenta os mesmos

interesses, por brincadeiras e assuntos que as crianças de sua idade. Pedro

frequentou a mesma escola dos dois anos até os sete anos de idade e quando veio

encaminhado para intervenção estava frequentando uma nova escola.

A mãe refere que na escola antiga Pedro quase não ficava na sala. A escola

relatava que ele era muito agitado, nem sempre realizava as atividades propostas, e

3 Por questões éticas o nome e alguns dados foram alterados.

Page 18: Cap 3   Teorias da aprendizagem

gostava de ficar a maior parte do tempo fora da sala. A escola tinha como conduta

não insistir para que ficasse na sala ou fizesse as atividades, quando a professora

insistia para seguir as regras Pedro ficava agitado e gritava. Quando tinha cinco

anos a mãe o levou para uma avaliação neurológica. O médico afastou a

possibilidade de um quadro neurológico que explicasse as dificuldades observadas e

afirmou que os comportamentos apresentados por Pedro eram os esperados pela

idade. Quando Pedro completou seis anos de idade, a escola o encaminhou para a

psicopedagogia para auxiliar no processo de alfabetização. Pedro permaneceu em

atendimento psicopedagógico por seis meses.

Os pais relatam que sempre foi muito difícil fazer lição de casa com Pedro.

Essas situações sempre se caracterizaram por constantes brigas entre a mãe e o

filho. Nesses momentos, a mãe perdia a paciência e acabava batendo no filho para

que esse sentasse e fizesse a lição e, às vezes, verbalizava chamando-o de burro.

Atualmente, quando Pedro tem que fazer alguma atividade e não sabe fazer ou quer

se esquivar de realizá-la, ele frequentemente verbaliza que é burro e que nunca vai

conseguir aprender. A mãe se responsabiliza pela auto-imagem que o filho

apresenta e refere que tem mudado a postura nessas situações.

b) Visita à escola

A psicopedagoga conversou com a coordenadora e a professora. As duas

relatam que Pedro não se parece socialmente com as outras crianças, apesar de

brincar e interagir com elas. Elas referem que ele parece ser um pouco estranho,

diferente. A professora diz que, quando dá atividade para Pedro, fazer ele se recusa

e chega a falar frases de efeito como, “eu detesto os líderes, eles querem mandar

em todo mundo”. A postura desta escola difere da anterior, pois mesmo ele

apresentando irritação, agitação e falando alto essas frases, a professora o ignora e

faz com que o solicitado seja realizado. Após realizar a atividade, a professora

sempre o deixa desenhar, atividade que gosta muito. Segundo a professora, ficou

estabelecido (de forma natural) que após fazer uma lição Pedro pode desenhar. A

professora relata que, para Pedro conseguir fazer a atividade, ela precisa ficar do

seu lado e ajudá-lo, senão ele não consegue fazer. Para a professora, o repertório

acadêmico de Pedro está atrasado em relação às outras crianças (por exemplo, a

sala já está alfabetizada e começando a escrever com letra cursiva) e, além disso,

ele tem dificuldade para manter atenção durante o período necessário e acaba

Page 19: Cap 3   Teorias da aprendizagem

dispersando, ou seja, começa a brincar com o lápis e a conversar (sempre sobre

desenhos animados).

Segundo a coordenadora e a professora, existem atividades e aulas que

Pedro se recusa a fazer e, por enquanto, elas não insistem. Exemplo de aula que

Pedro se recusa a estar junto com as outras crianças são as aulas de música e

inglês.

c) Análise do material escolar

No caderno escolar de Pedro havia atividades inacabadas e algumas com

riscos. Ele usa apenas letra bastão e tem dificuldade para manter a letra do mesmo

tamanho na mesma palavra. Apesar disso, consegue escrever na linha

corretamente.

d) Resultado da aplicação de provas psicológicas

Material: Teste WISC III, jogos, desenhos de substantivos, material para

leitura e escrita (palavras simples e letras do alfabeto)

A aplicação do teste WISC III foi muito difícil, pois Pedro no início se recusava

a responder qualquer questão do teste. Verbalizava que era “burro” e que “queria

vazar”. A realização do teste foi feita em várias sessões e como o tempo de

permanência de Pedro em atividade estruturada era quase nulo, optou-se por

interromper o teste quando a terapeuta observava que ele já estava começando a

ficar irritado. Também foi combinado que depois de realizada alguma atividade do

teste, ele poderia escolher qualquer brincadeira ou jogo para fazer, mas isso só

aconteceria se, antes, ele fizesse o que a terapeuta pedisse. Pedro entrava na sala

ia até o armário, que tinha vários brinquedos e jogos. Ele escolhia qual iria brincar e

depois começava a avaliação.

A conclusão geral dessa avaliação foi a de que Pedro não apresentou déficit

cognitivo, ou seja, o quociente de inteligência foi o esperado para a sua faixa etária,

porém verificou-se baixa concentração, dificuldade de atenção em aspectos

relevantes de uma imagem, não percebeu relações temporais entre eventos, ou

seja, dificuldade em entender o que é início, meio e fim de uma história. Em relação

à habilidade de comunicação, ele faz interpretações literais de frases e expressões e

tem dificuldade para manter uma conversa. Dependendo do que a terapeuta

perguntava, Pedro respondia com informações fora do contexto, sendo muito

comum ele dizer frases que ouviu em algum desenho ou falar sobre algum desenho

que gostava. Quanto à expressividade emocional, Pedro mostrou intensidade não

Page 20: Cap 3   Teorias da aprendizagem

apropriada, por exemplo, ao se recusar a fazer qualquer atividade solicitada falava

num tom monótono e perseverativo “desculpe, eu acho que vou desistir” ou “está na

hora de encarar os fatos, eu sou burro” e quando era elogiado não recebia muito

bem ou queria ir embora ou mandava a terapeuta “calar a boca”. Pedro apresentou

memória surpreendente sobre informações do seu interesse, por exemplo, ele sabe

o nome de todos os personagens dos desenhos Transformers, Bakugan, entre

outros. Cabe ressaltar que, segundo a mãe, Pedro sempre teve mania de colecionar

bonecos de desenhos preferidos e gosta de assistir várias vezes o mesmo filme a

ponto de decorar as falas e quando conseguia, assistia novamente para repetir as

falas junto com os personagens.

Com relação ao repertório acadêmico, Pedro reconhece algumas letras do

alfabeto, não pareou figura com a respectiva palavra e não leu palavras simples

como bola, dado, luva, sino, tatu, selo, bala, pipa, mala, bolo, lobo, e quando

acertava era aleatório, pois quando essa mesma palavra era apresentada, não lia

corretamente. Pedro reconhece todas as vogais, mas quando se apresentava uma

palavra em que faltava apenas uma vogal, não completava. Por exemplo,

apresentava-se a figura de bola e embaixo a palavra escrita, mas sem a vogal “o”.

Pedro não conseguia completar a palavra. Ao apresentar os encontros vocálicos,

Pedro não os leu.

e) Observação de Pedro em situações lúdicas no consultório

Os jogos utilizados na observação foram: Detetive Junior, Lince, Lig 4, Cara a

Cara e Pizzaria Maluca. O objetivo foi o de avaliar compreensão e seguimento de

regra, planejamento (estratégia) e atenção. De maneira geral, durante a avaliação

Pedro não compreendeu o que o jogo exigia e para jogar necessitava o tempo todo

da ajuda da terapeuta. Por exemplo, no jogo Cara a Cara a terapeuta dava modelo

do que ele podia perguntar e Pedro repetia a sugestão dada, Lig4 não compreendeu

o jogo, colocava as peças em qualquer lugar aleatoriamente sem planejamento

estratégico. O jogo em que se saiu melhor, pois a única exigência é ter um pouco de

sorte foi o da Pizzaria Maluca. Contudo, foi observado que para Pedro não tinha

muita importância quem iria ganhar, ou seja, cumprir o objetivo do jogo de completar

a pizza primeiro. Para ele era mais importante os dois colocarem todos os

ingredientes nas fatias de pizza.

Page 21: Cap 3   Teorias da aprendizagem

f) Plano de tratamento

Em decorrência da sua auto-imagem negativa e da constante esquiva de

realizar atividades acadêmicas como conseqüência de uma história em que nessas

situações a contingência vigente era extremamente aversiva (mãe batia ou o

chamava de burro), os objetivos da intervenção são: alfabetizá-lo, tornar a

aprendizagem divertida e estimuladora, mudar sua auto-imagem e

consequentemente sua auto-estima, melhorar sua atenção e concentração,

desenvolver habilidades de planejamento. Para alcançar esses objetivos o eixo

central da intervenção foi o de construir uma nova contingência, dessa vez positiva,

para o processo de aprendizagem. Tornar a contingência não aversiva implica em

usar como consequência o que chamamos de reforço positivo, neste caso

específico, em que o fazer atividade e o se sair bem, neste momento, não é

reforçador por si só (reforço intrínseco) programou-se o uso de reforço arbitrário

para, no futuro, a própria situação de aprendizagem tornar-se reforçadora e este

reforço arbitrário ser retirado paulatinamente.

Foram, então, objetivos do atendimento:

1. Proporcionar na clínica um ambiente não aversivo;

2. Aumentar a frequência de situações e atividades realizadas com sucesso

através da dosagem entre nível de dificuldade e tempo de atenção exigida

nas tarefas;

3. Apresentar um novo método de alfabetização, baseado no Método Integral

para alfabetização, criado por Oñativia (1967), mas que fosse adaptado para

as necessidades específicas de Pedro. Mais uma vez esperava-se que, com

isso, ele obtivesse êxito na realização das atividades, sem ajuda constante de

outro.

4. Orientar os professores

5. Orientar pais

6. Promover melhora de atenção, concentração, assim como ensinar o

planejamento de ações e pensamento estratégico através da utilização de

jogos e brincadeiras,

A terapeuta, junto com Pedro, elaborou uma caixa surpresa, na qual várias

miniaturas de animais marítimos e répteis foram colocadas e ele poderia escolher

Page 22: Cap 3   Teorias da aprendizagem

uma ao final das atividades relacionadas à leitura e escrita. A escolha das miniaturas

como reforço positivo se deu pelo interesse de Pedro por esses animais e sempre

eram discutidas informações sobre os animais que ele escolhia. Ao término de cada

sessão, ele selecionava uma miniatura e já deixava outra escolhida para a próxima

sessão. Essa estratégia foi a mais efetiva em motivá-lo a fazer as atividades e evitou

esquiva da situação.

O material utilizado nas sessões foi elaborado de acordo com as

necessidades individuais de ensino observadas nas avaliações. O procedimento

usado foi o de selecionar os objetivos gerais e ensinar cada pequeno passo, cada

pré-requisito, para garantir um aumento gradual de exigência e dificuldade. Pedro

apenas passava para o passo seguinte quando mostrava que havia aprendido o

anterior. Com esse procedimento é possível construir uma história de sucesso com

a criança para que ela perceba que é capaz de aprender e assim ganhar mais

autoconfiança e tornar a contingência de aprendizagem o menos aversiva possível.

A opção pelo Método Integral deve-se ao sucesso do uso deste em escolas

que atendem crianças com necessidades educacionais especiais. Além dos

resultados obtidos com esse método, ele foi selecionado pela dificuldade de Pedro

ao estruturar uma sentença (começo, meio e fim) e em compreender a leitura. Um

dos aspectos interessantes do Método Integral é que são utilizadas cartelas com

desenhos para escrever uma frase. Inicialmente, é exigido que o aluno reconheça

algumas cartelas desenho (substantivos, verbos – cor de fundo laranja, adjetivos –

cor de fundo azul, artigo – cor de fundo amarelo), depois, que forme frases utilizando

as cartelas conhecidas, e, a seguir, a criança fará o pareamento entre a figura e a

palavra correspondente. Esse procedimento é realizado com cada parte que compõe

uma frase. O pareamento entre figura e palavra é iniciado com as cartelas

substantivos, O uso da palavra integral mantém o interesse do aluno na atividade,

pois rapidamente ele se torna capaz de reconhecer palavras familiares. Quando a

criança já é capaz de reconhecer as palavras o próximo passo é ensinar as sílabas.

No caso do Pedro, foram selecionadas inicialmente palavras de seu interesse. A

seguir será apresentada uma frase escrita com cartela desenho:

As sessões de psicopedagogia ocorrem duas vezes por semana e nos outros

dias (três) uma acompanhante terapêutica (AT) vai até a casa para ajudá-lo nas

lições de casa e na organização do material e espaço físico para que o

comportamento de estudar se torne mais efetivo. A proposta de intervenção em casa

Page 23: Cap 3   Teorias da aprendizagem

teve como objetivo evitar situações aversivas tanto para a mãe quanto para Pedro.

Os resultados obtidos até o momento estão caminhando na direção dos objetivos

propostos. As verbalizações de que é burro e não consegue aprender diminuíram, o

comportamento de fugir da atividade não ocorre mais e ele fica em atividade até o

seu término. Pedro continua em processo de alfabetização, lê e escreve algumas

palavras e já forma palavras que não foram diretamente ensinadas. Em relação aos

jogos para desenvolver o planejamento de ações e estratégias, o ritmo de

aprendizagem tem sido mais lento, Pedro precisa que a terapeuta dê modelo de

como proceder.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Podemos visualizar por este relato de caso a teoria aqui exposta. É

importante notar que o processo é acompanhado por uma avaliação contínua, para

que mudanças em algum elemento da tríplice relação de contingência possam ser

incorporadas. A análise de comportamento aplicada à pedagogia, aqui denominada

de psicopedagogia comportamental, tem mostrado sua eficácia nas questões

escolares e de aprendizagem

APROFUNDANDO A TEORIA

Questões para reflexão

1) Identifique no texto a diferença entre Behaviorismo, Análise Experimental do

Comportamento e Análise Aplicada do Comportamento.

2) Dê exemplos de situações nas quais podemos utilizar o treino auto instrucional.

3) De que forma as dificuldades de aprendizagem podem ser decorrentes de

contingências aversivas na relação com familiares e colegas?

4) Nos objetivos de atendimento propostos para Pedro, qual deles está relacionado

com treino de resolução de problemas? Por quê?

5) Como deve ser realizada uma avaliação psicopedagógica comportamental?

7) Quais informações são essenciais para o planejamento da intervenção?

Atividade em grupo

Page 24: Cap 3   Teorias da aprendizagem

Reunidos em grupo, discutam as questões abaixo:

1) A intervenção psicopedagógica comportamental envolve quatro fases: 1.

Avaliação, 2. Seleção de Metas e Objetivos, 3. Planejamento de Técnicas e

Procedimentos de Intervenção, 4. Intervenção. Identifique essas fases no estudo de

caso de Pedro.

2) Pesquise reportagens recentes, veiculadas na mídia, sobre o bullying. Após

leitura e discussão, definam o termo e discutam com o grupo se o bullying pode ser

inserido nas dificuldades de aprendizagem decorrentes de contingências aversivas

no processo ensino-aprendizagem. Justifiquem e elaborem uma intervenção

psicopedagógica comportamental para lidar com o fato na instituição escolar.

Análise de texto

A ETIMOLOGIA DO ENSINAR

Em quase tudo que se faz, a pessoa instruída difere da não instruída. Três grandes metáforas foram concebidas para explicar o comportamento que as distingue.

Crescimento e desenvolvimento. Algumas vezes, o comportamento é atribuído à maturação, pois o embrião, em mínimo contato com o meio ambiente, propicia uma boa analogia. A metáfora é conveniente principalmente nos primeiros anos. Estuda-se o comportamento da criança em função do tempo; tabelas e gráficos registram o momento, nas várias idades, em que as respostas aparecem e os desempenhos típicos passam a ser tomados como normas. Os resultados podem ser usados para predizer o comportamento, mas não modificá-lo, uma vez que o tempo não pode ser manipulado. Dá-se ênfase à topografia do comportamento – sua forma ou estrutura. (...) A metáfora atribui só um modesto papel ao professor, que não pode realmente ensinar, pode apenas ajudar o aluno a aprender. Ensinar é fomentar ou cultivar a criança em crescimento (como no Jardim de Infância), dar-lhe exercícios intelectuais, ou orientá-lo no sentido horticultural de dirigir ou guiar seu crescimento.

(...)Aquisição. As variáveis ambientais, negligenciadas pelo crescimento ou

desenvolvimento, acham lugar em uma segunda metáfora na qual o aluno adquire, do mundo que o cerca, conhecimento e habilidade. Recebe educação. O processo de aprendizagem pode ser descrito em curvas de aquisição o professor desempenha o papel ativo de transmissor. Compartilha suas experiências. Dá e o aluno recebe. O aluno aplicado capta a estrutura de fatos ou ideias. Se o aluno não for ágil, o professor o impressiona com os fatos, incute nele as ideias, ou inculca o bom gosto e o gosto de aprender.

Em versão osmótica da metáfora aquisição, o estudante absorve conhecimentos do mundo ao seu redor: sorve informação. O que o professor diz penetra. (...)

Estas manobras conceituais são necessárias porque nem o crescimento nem a aquisição retrata corretamente o intercâmbio entre o organismo e o meio ambiente. O crescimento fica confinado a uma única variável – a forma ou estrutura

Page 25: Cap 3   Teorias da aprendizagem

do comportamento – e a aquisição acrescenta uma segunda – o ambiente estimulante; mas duas variáveis ainda não são o bastante, como o demonstram as insuficiências tanto da teoria estímulo-resposta, como da teoria da informação.

Deixando de lado as dificuldades teóricas, nenhuma das duas metáforas diz ao professor o que fazer, nem lhe permite ver o que já foi feito. Ninguém literalmente cultiva o comportamento de uma criança como se cultiva um jardim, nem transmite informação como se leva um recado.

Construir. O aluno possui um dote genético que se desenvolve ou amadurece, e seu comportamento se torna cada vez mais complexo à medida que entra em contato com o mundo que o cerca; mas alguma outra coisa acontece enquanto aprende.

Toda essas três metáforas estão difundidas na nossa linguagem e é quase impossível evitá-las na discussão informal. Entretanto, qualquer análise do intercâmbio entre organismo e ambiente, feita com seriedade , deve evitar metáforas. Três são as variáveis que compõem as chamadas contingências de reforço, sob as quais há aprendizagem: (1) a ocasião em que o comportamento ocorre, (2) o próprio comportamento e (3) as consequências do comportamento. (...)

Tanto quanto aqui nos ocupa, ensinar é simplesmente arranjar contingências de reforço. Entregue a si mesmo, em dado ambiente, um estudante aprenderá, mas nem por isso terá sido ensinado. A escola da vida não é bem uma escola, não porque ninguém nela aprende, mas porque ninguém ensina. Ensinar é o ato de facilitar a aprendizagem; quem é ensinado aprende mais rapidamente do que quem não é. O ensino é, naturalmente, muito importante, porque do contrário, o comportamento não apareceria. Tudo o que hoje se ensina deve ter sido aprendido, pelo menos uma vez, por alguém que não foi ensinado, mas graças à educação já não é preciso esperar por estes eventos raros. (Skinner, 1975, p. 1-4)

Identifique, a partir do texto, quais as críticas às diferentes metáforas com as quais

se costuma entender o que é ensinar e aprender e discorra sobre a posição

apresentada por Skinner.

Sugestões de leitura:

Luna, S. V. (2005). Contribuições de Skinner para a educação. In: V. M. N. S.

Placco. (Org.), Psicologia & educação: Revendo contribuições - 3ª edição (pp. 145-

179). São Paulo: EDUC.

Sidman, M.(2003) Coerção e suas implicações. Campinas / SP: Editora Livro Pleno.

Sério, A.P., Andery, M.A., Gióia, P.S. e Micheletto, N. (2002). Controle de estímulos

e comportamento operante: uma nova introdução. São Paulo: Editora Educ.

Sidman, M. (1985) Aprendizagem-sem-erros e sua importância para o ensino do

deficiente mental. Psicologia, 11(3), 1-15.

Os textos acima são úteis para aprofundar conhecimentos sobre a abordagem

comportamental.

Page 26: Cap 3   Teorias da aprendizagem

Lipp, M. N. & Novaes, L. E. (1998). O stress. São Paulo: Ed. Contexto.

Lipp, M. N.; Souza, P. A. E.; Romano, F. S. A.& Covolan, M. A. (1991). Como

enfrentar o stress infantil. São Paulo: Ed. Ícone

A questão do stress em sala de aula é muito relevante e vem sendo discutida em

profundidade por Lipp, M. e seus colaboradores. Vemos não só aspectos relevantes

do processo de aprendizagem, mas também da história de vida dos envolvidos

neste processo. Ler sobre stress deve ser um projeto dos que pretendem conhecer

variáveis intervenientes desse contexto.

Vasconcelos, L. A. (Org.) (2006). Brincando com histórias infantis: Uma contribuição

da Análise do Comportamento para o desenvolvimento de crianças e jovens

utilização lúdico-educativa. Santo André: Esetec.

Caminha, R.M. & Caminha, M.G. (2007) A prática cognitiva na infância. São Paulo:

Roca.

Teixeira, A. M. S. (2006). Análise de contingências em Programação de Ensino

Infantil – liberdade e efetividade na Educação. Santo André: ESETec.

Carmo, J. S. & Prado, P. S. T. (Orgs.), (2010). Relações simbólicas e aprendizagem

da Matemática: Teoria e pesquisas. Santo André, SP: ESETec.

Os livros acima favorecem que o estudante possa conhecer um pouco mais

sobre a aplicação da abordagem em problemas específicos.

Sugestões de filmes:

Preciosa – Uma história de esperança. Direção: Lee Daniels (EUA/2009)

Retrata a história de uma adolescente que sofre uma série de privações em sua vida e, enviada para uma escola em que poderá lidar com essas situações, acaba encontrando uma maneira especial de distanciar-se de seus problemas.

Sociedade dos poetas mortos. Direção: Peter Weir (EUA/1989)

O filme descreve uma escola, em 1959, que, extremamente rígida, recebe um novo professor de literatura que incentiva seus alunos a pensarem.

Page 27: Cap 3   Teorias da aprendizagem

O pequeno Nicolau. Direção: Laurent Tirard (França/Bélgica – 2009)

Nicolau tem uma vida alegre e divertida com seus colegas, mas ao ouvir uma conversa entre os pais, entra em pânico, pois acredita que ganhará um novo irmão e, assim como nos contos de fadas, será abandonado na floresta.

REFERÊNCIAS

Bijou, S.W.; Baer, D.M. (1980) O desenvolvimento da criança: Uma análise comportamental. São Paulo: EPU.

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Costa, N. (2002) Terapia Analítico Comportamental: dos fundamentos filosóficos à relação com o modelo Cognitivista. Santo André: Esetec editores associados

Hubner e Marinotti (2000) Crianças com dificuldades aprendizagem. In Silvares, E.F.M. Estudo de Caso em psicologia clínica comportamental infantil, (Vol. 2, pp. 259-304), Campinas: Papirus.

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Santacreu, J. (1996) O Treinamento em Auto-instruções. In V. Caballo (org) Manual de Técnicas de Terapia e Modificação do comportamento. São Paulo: Ed. Santos.

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Williams, L.C.A & Aiello, A.L.R.(2001) O Inventário Portage Operacionalizado: Intervenção com Famílias. São Paulo: Edicon.

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Sobre as autoras

Cinthia de Azevedo Piccinato é Mestre em Análise Experimental do Comportamento pela PUC-SP. Psicóloga pela UFSCar. Atende em clínica particular.

Mariângela Gentil Savoia é Doutora em Psicologia Clínica pelo IP-USP, pesquisadora do AMBAN – Programa de Ansiedade do Hospital das Clínicas da FMUSP Coordenadora do Núcleo Conscientia de pesquisa em comportamento e saúde mental.

Viviane Rosalie Duarte é Mestre em Análise Experimental do Comportamento pela PUC-SP, coordenadora do módulo de atendimento personalizado (método ABA) do Colégio Paulicéia.