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CADERNO DE ESTUDOS ESTRATÉGICOS DE LOGÍSTICA E MOBILIZAÇÃO NACIONAIS ISSN 1981-2450 v 1 n. 4 janeiro/dezembro 2013 DIVISÃO DE ASSUNTOS DE LOGÍSTICA E MOBILIZAÇÃO ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA SEGURO DE VIDA DA NAÇÃO! Rio de Janeiro

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CADERNO DE ESTUDOS ESTRATÉGICOS DE LOGÍSTICA E MOBILIZAÇÃO NACIONAIS

ISSN 1981-2450

v 1 n. 4 janeiro/dezembro 2013

DIVISÃO DE ASSUNTOS DE LOGÍSTICA E MOBILIZAÇÃO

ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA

SEGURO DE VIDA DA NAÇÃO!

Rio de Janeiro

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ISSN 1981-2450Vol. 1 n 4 janeiro/dezembro 2013

Caderno de Estudos Estratégicosde Logística e Mobilização Nacionais

Trabalhos selecionados do Curso de Logística e Mobilização Nacional

(CLMN) - 2011

Rio de Janeiro

Caderno de Estudos Estratégicos de Logística e Mobilização v. 1 n. 4 p. 1-302 jan./dez. 2013

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Caderno de Estudos Estratégicos de Logística e Mobilização Nacionais é uma publicação da Divisão de Assuntos de Logística e Mobiliação da Escola Superior de Guerra (ESG) e possui circulação de caráter nacional e internacional.

Qualquer parte dessa publicação pode ser reproduzida, desde que citada a fonte.

Os conceitos expressos neste caderno são de responsabilidade dos autores e não expressam qualquer orientação da ESG.

Esta publicação está disponível no endereço eletrônico www.esg.br, no link “Produção Intelectual”.

Impressão: Gráfica da ESG

Tiragem: 100 exemplares

Caderno de Estudos Estratégicos de Logística e Mobilização Nacionais / Escola Superior de Guerra, Divisão de Assuntos de Logística e Mobilização. - Vol. 1, n. 4 (jan./dez. 2013). Rio de Janeiro: ESG, 2007

v.: il.

AnualArtigos selecionados do Curso de Logistica e Mobilização Nacional (CLMN) 2011.

ISSN 1981-2450

1. Mobilização Nacional - Periódicos. 2. Logística - Periódicos. I. Brasil. Escola Superior de Guerra. Divisão de Assuntos de Logistica e Mobilização.

CDD: 355.28 355.411

Comando da Escola Superior de GuerraAlmirante-de-Esquadra Eduardo Bacellar

Leal Ferreira

Diretor do Curso de Logística e Mobilização Nacional

Brigadeiro do Ar Helio Severino da Silva Filho

Chefe da Divisão de Assuntos de Logística e Mobilização

Cel. Int. Ref. Aer Antonio Celente Videira

Editor ResponsávelCel. Int. Ref. Aer. Antonio Celente Videira

OrganizadorCoronel Com R1 EB Paulo Roberto Vilela

Antunes

Avaliadores de ConteúdoCel. Int. R1 Aer Ilton Agostinho de Oliveira

Cel. Ref. EB Eduardo José Andrade de Barros Moreira

RevisãoProf.ª Dr.ª Aileda de Mattos Oliveira

PadronizaçãoBibliotecária Maria de Fátima de Figuedo

LopesBibliotecária Andreia Teles Saroldi

Diagramação e Arte FinalAnério Ferreira Matos

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SUMÁRIO

Editorial 5Antonio Celente Videira

A Terra Indígena de Raposa Serra do Sol, a Orientação do Supremo Tribunal Federal e a Mobilização Nacional 7

Brenno Cruz Mascarenhas Filho

A Realização do Apoio de Transporte às Organizações Militares de Fronteira na Amazônia Ocidental e seus Reflexos para a Mobilização Nacional 23

Alberes José Quintans de Freitas

A Logística Nacional, a Defesa, a Ciência-Tecnologia e Inovação 39Erenito Alves Azeredo

Logística, Mobilização e Regulação de Transportes: Estudo de Conceitos e Perspectivas para os Jogos Olímpicos/Copa do Mundo Rio 2014/2016 52

Nauber Nunes do Nascimento

Mobilização Nacional e as Indústrias de Defesa 74Guilherme Luiz Passos Miranda Autran

A Mobilização de Bens e Serviços Sob a Ótica do Decreto-Lei Nº 4.812, de 8/10/1942 92Maria Inês da Penha Gaspar

Mobilização em Casos de Catástrofes Naturais ou Artificiais – A Identificação da Sociedade com as Atividades de Mobilização Nacional por Meio de sua Atuação em Casos de Catástrofes 112

Paulo Roberto Neves Augusto da Silva

A Indústria Brasileira de Material de Defesa e sua Contribuição para a Mobilização Nacional 131

Ilton Agostinho de Oliveira

A Segurança da Informação no Contexto Cibernético e a Mobilização Nacional 147Luiz Guilherme Sá da Silva

O Marketing e a Comunicação Social na Mobilização Nacional 163Marcelo Adahir Vieira Ferrera

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O Papel do Gerenciamento de Riscos na Logística 176Silvia Maria Pineschi Braun

Expansão da Malha Ferroviária Brasileira e Sul-Americana para o Desenvolvimento e Integração Regional, com Prioridade nas Expressões Econômica e Militar – Reflexos na Mobilização Nacional 196

Rafael Aquino dos Santos

Reflexões Econômicas sobre a Dissuasão como Elemento de Defesa Nacional 217Júlio Grevy Montenegro Osório e Alves

Serviço Civil Obrigatório: Idéias, Reflexões e Aplicações para a Mobilização 230Fernando Henrique da Conceição Sobrinho

A Tecnologia da Informação na Mobilização de Recursos Humanos 243Anderson dos Santos Bartz

O Papel do Corpo de Bombeiros Militar na Mobilização Nacional 257Carlos Alberto Rasia

A Tecnologia da Informação, Utilizada na Logística Empresarial, e a Aplicabilidade dos Sistemas Integrados de Gestão nas Fases da Função Suprimento da Logística Militar: A Utilização do RFID 274

Warlei Oliveira Gomes

Defesa Alimentar no Teatro de Operações, Combate ao Inimigo Invisível 291Mario Roberto Ziccardi de Camargo Salles

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EDITORIAL

Estamos em plena era do Conhecimento. ‘Inovação’ é a palavra de ordem em todos os segmentos produtivos, quer em produtos físicos, quer em produtos intangíveis. Criar passou a ser o recurso pelo qual uma organização, privada ou pública, compete no meio onde estão seus negócios.

O Caderno de Estudos Estratégicos de Logística e Mobilização Nacionais, em sua quarta versão, explora essa mesma linha de ação, à medida que apresenta temas oportunos em que o binômio Desenvolvimento e Defesa são explorados, dando sentido ao amalgamento sinergético entre Empresa e Forças Armadas. É uma publicação que, por trazer em seu bojo, temas palpitantes e instigantes, na linha do Estudo do Poder (Cratologia), torna-se inédita entre a literatura relativa à Logística no âmbito empresarial como no militar.

A Divisão de Assuntos de Logística e Mobilização (DALMob), da Escola Superior de Guerra (ESG), coordenadora do Curso de Logística e Mobilização Nacional (CLMN), é protagonista desse produto intelectual. Temas como “Reflexão sobre o Serviço Militar Obrigatório”; “Mobilização Nacional e Econômica, Infraestrutura”; “Integração Sul-Americana”; “Sistema de Transporte e Intermodalidade”; “Indústria de Defesa”; “Indústria Naval”; “Telecomunicações como Processo de Crescimento e Segurança”; “Papel das Agências Reguladoras na Mobilização Nacional”; “Força Auxiliares e Mobilização Nacional”, “Logística Reversa”, “Segurança Alimentar nas Operações”, “Ferramentas da Logística Empresarial aplicadas à Logística Militar”, dentre outros, caracterizam o ineditismo de um Curso que, a cada dia, se desponta como modelador de um amanhecer, por pensar gestão neste mundo dinâmico e repleto de desafios.

Com toda certeza, esta publicação anual que consolida os melhores artigos dos estagiários (alunos) do CLMN/2011, circulará nos estabelecimentos públicos e privados. Será lida por milhares de chefes, executivos e gestores, tornando-se manancial para profundas reflexões sobre a integração dos nossos meios produtivos, através da empresa e da organização militar. Esse intento é o que se busca, sendo, portanto, entendido como fator preponderante à contribuição para as melhores práticas administrativas no âmbito Nacional.

Boa leitura.

ANTONIO CELENTE VIDEIRAEditor Responsável

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A Terra Indígena de Raposa Serra do Sol, a Orientação do STF e a Mobilização Nacional

A TERRA INDÍGENA DE RAPOSA SERRA DO SOL,A ORIENTAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E

A MOBILIZAÇÃO NACIONAL

Brenno Cruz Mascarenhas Filho

Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, estagiário do Curso de Logística e Mobilização Nacional da Escola Superior de Guerra, em 2011.

Resumo

A Terra Indígena de Raposa Serra do Sol foi demarcada pela Portaria nº 534/2005, do Ministro da Justiça, e homologada por Decreto Presidencial. Com isso, a índios de diversas etnias foi atribuída a posse de 1.743.089 hectares de terras contínuas no extremo Norte do país e nas fronteiras do Brasil com Venezuela e Guiana. O Supremo Tribunal Federal (STF), em processo decorrente do ajuizamento de ação popular, se pronunciou no sentido de que foi legítima a demarcação da referida terra indígena, tendo em vista a norma do art. 231 da Constituição. Apesar das limitações e das “salvaguardas” estabelecidas pelo Portaria 534 do Ministro da Justiça e pelo STF, a demarcação de que se trata se revela deveras perigosa para a integridade territorial do Brasil. Dessa forma, a decisão do STF vulnerou a norma que elevou a soberania nacional à condição de primeiro fundamento da República (art. 1º, caput, I, da Constituição). Diante desse quadro, compete à sociedade e ao Estado brasileiro investir decididamente na preparação da mobilização nacional, de forma a desestimular qualquer iniciativa voltada para a violação de direitos nossos no concerto das nações. Palavras-chave: Ministério da Defesa; Mobilização Nacional; Estratégia Nacional de Defesa; Lei de Mobilização Nacional.

1 INTRODUÇÃO

Uma longa série de atos administrativos iniciada em 1993 (no governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso) culminou com a Portaria nº 534/2005, do Ministro de Estado da Justiça, que delimitou a Terra Indígena de Raposa Serra do Sol, e com o Decreto Presidencial (do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva) que homologou a demarcação, em abril de 2005.

Com a instituição da Terra Indígena de Raposa Serra do Sol foi reconhecida a cerca de 19.000 índios das etnias Ingarikó, Macuxi, Taurepang e Wapixana, a posse da área demarcada (Art. 1º da Portaria nº 534/05 do Ministro da Justiça).

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Brenno Cruz Mascarenhas Filho

Dessa forma, a União cumpriu o preceito do art. 231 da Constituição Federal, que a obriga a demarcar terras tradicionalmente ocupadas por índios.

Trata-se de 1.743.089 hectares (17.430,89 km²) de terras contínuas demarcadas no extremo norte do estado de Roraima, nos municípios de Normandia, Pacaraima e Uiramutã (Art. 2º da Portaria nº 534/05 do Ministro da Justiça), entre os rios Tacutu, Maú, Surumu e Miang e junto às fronteiras do Brasil com a Venezuela e a Guiana. Predominam as imensas planícies, cobertas pela vegetação de cerrado (“lavrado”, como se diz na região), mas são importantes também as áreas de florestas densas, que cobrem inclusive a parte mais setentrional da Reserva1.

Entre a década de 1970 e 2005, a atividade econômica mais importante na região foi à cultura do arroz. Em aproximadamente 100 mil hectares no Sul e no Sudoeste do que é hoje a terra indígena, fazendeiros não índios chegaram a produzir 160 mil toneladas de grãos por ano2.

A região é ainda rica em ouro, diamante e nióbio, metal leve empregado em siderurgia e nas indústrias aeronáutica e espacial, e abriga a segunda maior reserva de urânio do planeta3.

O objetivo deste trabalho é verificar se a demarcação de forma contínua da Terra Indígena de Raposa Serra do Sol, legitimada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), exacerba o risco de uma intervenção estrangeira na Amazônia, com reflexos no campo da mobilização nacional.

2 A POSIÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO QUE SE REFERE À TERRA INDÍGENA DE RAPOSA SERRA DO SOL

Apoiado politicamente por produtores de arroz, criadores de gado, por grande parte da população não indígena da região e pelo próprio estado de Roraima, o Senador Augusto Affonso Botelho Neto, recorreu ao Supremo Tribunal Federal4: Em ação popular ajuizada contra a União em maio de 2005 (ao processo foi atribuído o número 3.388/RR), o senador, como autor, e os seus assistentes, entre os quais o estado de Roraima, impugnaram a demarcação contínua da Terra Indígena de Raposa Serra do Sol, sustentando a inconstitucionalidade e a ilegalidade da mencionada Portaria do Ministro de Estado da Justiça que a homologou.

1 Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Raposa_Serra_do_Sol. Acesso em: 19 out. 2011.

2 http://pt.wikipedia.org/wiki/Raposa_Serra_do_Sol, Acesso em: 24 out. 2011.3 http://undbrasil.0org/index2.php?option=com_content&do_pdf=1&id=154, UND Brasil, Raposa

Serra do Sol – A terra onde brotam ouro, mistificação e cupidez, Acesso em 22 nov. 2011.. http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php, Âmbito Jurídico, A exploração ilegal dos

minérios na Reserva Indígena Raposa Serra do Sol, Acesso em 22 out. 2011. 4 No julgamento da Reclamação 2.833 ficou decidido que compete ao Supremo Tribunal Federal

julgar “todos os feitos processuais intimamente relacionados com a demarcação” da Terra Indígena de Raposa Serra do Sol.

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A Terra Indígena de Raposa Serra do Sol, a Orientação do STF e a Mobilização Nacional

Ao final do processo, em março de 2009, o STF, por maioria de votos, reconheceu a regularidade da demarcação contínua da Terra Indígena de Raposa Serra do Sol e a legitimidade da Portaria nº 534/2005/MJ e do Decreto Presidencial homologatório da demarcação, resultando na remoção da área dos seus ocupantes não índios (art. 5º, parágrafo único, da mencionada Portaria)5. Foram aprovadas também as “salvaguardas” indicadas no voto do Ministro Menezes Direito, que mais adiante serão ventiladas.

A base normativa fundamental da decisão do Supremo é o já mencionado art. 231 da Constituição Federal. Confira-se a redação do dispositivo:

Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.§1.º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.§2º As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das

riquezas do solo dos rios e dos lagos nelas existentes6.

O Supremo Tribunal Federal entendeu que os direitos dos índios à sua cultura e sobre as terras que ocupam são “originários” e que, portanto, a sua demarcação tem caráter declaratório, e não constitutivo. Dessa forma, e pelo que dispõe o §6º do referido art. 231 da Constituição, tais direitos se sobreporiam a eventuais direitos de posse ou de propriedade de não índios, mesmo aqueles derivados de contratos ou relacionados a registros em cartórios imobiliários.

Com essa perspectiva, a opção pela demarcação contínua das terras indígenas prevaleceu em relação ao modelo alternativo, de demarcação insular, isto é, em bolsões, que, de acordo com o Supremo Tribunal Federal, não atenderiam aos interesses das comunidades usufrutuárias.

A decisão do Supremo destaca também os seguintes aspectos: a) não há incompatibilidade jurídica entre faixa de fronteira e terras indígenas; b) a situação geográfica da Terra Indígena de Raposa Serra do Sol pode ser até considerada politicamente conveniente, porque “obriga que as instituições de Estado (Forças Armadas e Polícia

5 Acompanharam o relator, Ministro Ayres Britto, os Ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Carmen Lucia, Menezes Direito, Cezar Peluso e Eros Grau, vencidos o Ministro Joaquim Barbosa, que julgava totalmente improcedente “a ação popular”, e o Ministro Marco Aurélio Mello, que a julgava inteiramente procedente.

6 Os §§ 3.º, 4.º, 5.º, 6.º e 7.º do art. 231 da Constituição não são relevantes para o que se pretende demonstrar nesta altura do trabalho.

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Federal, principalmente) se façam também presentes com seus postos de vigilância, equipamentos, batalhões, companhias e agentes”, “sem precisar de licença de quem quer que seja para fazê-lo”7, porque enseja a criação de mecanismos de conscientização “de nossos indígenas” “contra a influência eventualmente malsã de certas organizações não-governamentais estrangeiras”8 e porque nos estimula a “reforçar neles o inato sentimento de brasilidade”, “missão favorecida pelo fato de serem os nossos índios as primeiras pessoas a revelar devoção pelo nosso País”9; c) terra (indígena) e território são conceitos inconfundíveis. “Território” constitui uma categoria jurídico-política, nele vigora “uma dada ordem jurídica soberana”10, enquanto o “substantivo ‘terras’ é termo que assume compostura nitidamente sociocultural, e não política”11, certo que “a Constituição teve o cuidado de não falar em territórios indígenas, mas, tão-só, em terras indígenas”12, para concluir que “nenhuma das comunidades indígenas brasileiras detém estatura normativa para comparecer perante a Ordem Jurídica Internacional como Nação, País, Pátria, território nacional ou povo independente”13;d) a demarcação das terras indígenas constitui manifestação de um “constitucionalismo fraternal”14; e e) foi obedecido o princípio da proporcionalidade, dados os objetivos econômicos e sociais a serem alcançados.

Mas é importante registrar que o posicionamento do Supremo não garante aos índios o usufruto irrestrito da terra, dos rios e dos lagos da região demarcada. A Terra Indígena de Raposa Serra do Sol integra o patrimônio da União pelo que estabelece o art. 20, caput, XI, da Constituição Federal. Do usufruto indígena estão excluídos o sitio ocupado pelo 6º Pelotão Especial de Fronteira, “os equipamentos e instalações públicos federais e estaduais atualmente existentes”, “o núcleo urbano atualmente existente da sede do Município de Uiramutã”, “as linhas de transmissão de energia elétrica” e “os leitos das rodovias públicas federais e estaduais atualmente existentes” (art. 4º da Portaria 534/2005 do Ministro da Justiça).

Outrossim, às Forças Armadas incumbe a defesa do território e da soberania nacionais. Deriva daí a necessidade de se compatibilizar a atividade das Forças Armadas com os direitos dos índios, especialmente na chamada “faixa de fronteira”, assim designada a faixa de até 150 quilômetros de largura ao longo das fronteiras terrestres. Pois bem, a Terra Indígena de Raposa Serra do Sol se submete à norma do art. 20, §2º, da Constituição (art. 3º da Portaria 534/2005 do Ministro da Justiça), que define a faixa de fronteira como fundamental para a defesa do território nacional e

7 Fls. 239 dos autos do “Processo 3.388/RR” do Supremo Tribunal Federal. 8 Fls. 239 dos autos do “Processo 3.388/RR” do Supremo Tribunal Federal.9 Fls. 239 dos autos do “Processo 3.388/RR” do Supremo Tribunal Federal.10 Fls. 233 dos autos do “Processo 3.388/RR” do Supremo Tribunal Federal.11 Fls. 233 dos autos do “Processo 3.388/RR” do Supremo Tribunal Federal. 12 Fls. 233 dos autos do “Processo 3.388/RR” do Supremo Tribunal Federal.13 Fls. 234 dos autos do “Processo 3.388/RR” do Supremo Tribunal Federal.14 Fls. 234 dos autos do “Processo 3.388/RR” do Supremo Tribunal Federal.

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A Terra Indígena de Raposa Serra do Sol, a Orientação do STF e a Mobilização Nacional

positiva que, para esse fim, a sua ocupação e utilização serão reguladas em lei. Embora seja em regra proibido o ingresso de não índios na área demarcada, é permitida “a ação de autoridades federais, bem como a de particulares especialmente autorizados, desde que a sua atividade não seja nociva, inconveniente ou danosa [...] aos índios” (art. 5º da Portaria 534/2005 do Ministro da Justiça).

Também quanto ao Parque Nacional do Monte Roraima, situado nos limites da Terra Indígena de Raposa Serra do Sol e administrado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, não é absoluto o direito dos índios à posse da área. Essa área se destina tanto à preservação do meio ambiente quanto ao usufruto dos índios e, dessa forma, se submete a regime jurídico de dupla afetação. Assim, têm acesso ao Parque os índios, obviamente, e, ao mesmo tempo, visitantes e pesquisadores, como se verá a seguir.

Ademais, o próprio Supremo estabeleceu certas “salvaguardas”. As mais relevantes, para o que interessa a este trabalho, passo a relacionar. “O usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos [...] não se sobrepõe ao [...] interesse público da União”, “o usufruto dos índios não abrange a exploração mercantil dos recursos hídricos e dos potenciais energéticos”, “não alcança a pesquisa e a lavra das riquezas minerais”, “não compreende a garimpagem nem a faiscação” e “não se sobrepõe aos interesses da política de defesa nacional”; serão implementados independentemente de consulta às comunidades indígenas” “a instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções militares, a expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico e o resguardo das riquezas de cunho igualmente estratégico”; fica assegurada “a atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal”; “o usufruto dos índios não impede a instalação, pela União Federal, de equipamentos públicos, redes de comunicação, estradas e vias de transporte, além das construções necessárias à prestação de serviços públicos pela União”; o usufruto dos índios na área do Parque Nacional do Monte Roraima “fica sob a responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade”, que “responderá pela administração da área”; “o trânsito de visitantes e pesquisadores não-índios é de ser admitido na área” do referido Parque Nacional; e “admitem-se o ingresso, o trânsito e a permanência de não-índios em terras indígenas não ecologicamente afetadas, observados, porém, as condições estabelecidas pela FUNAI” e os fundamentos da decisão do Supremo15.

3 A TERRA INDÍGENA DE RAPOSA SERRA DO SOL E A GEOPOLÍTICA

A decisão do Supremo Tribunal Federal relativa à Terra indígena de Raposa Serra do Sol causa indisfarçável desconforto. Com efeito, por uma série de

15 Fls. 241/243 dos autos do “Processo 3.388/RR” do Supremo Tribunal Federal.

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motivos, entre os quais a inequívoca cobiça internacional no que se refere aos recursos naturais da Amazônia, pode-se afirmar que a instituição da mencionada terra indígena, da maneira como acabou por ser demarcada, acarreta significativo prejuízo à segurança nacional. O temor não é infundado, nem se caracteriza como manifestação de um nacionalismo exacerbado ou despropositado.

Recentemente, folheei um atlas infantil produzido nos Estados Unidos da América e verifiquei que um de seus mapas não indicava as fronteiras políticas entre Brasil, Peru, Colômbia, Venezuela e Guianas na grande massa territorial do norte da América do Sul ocupada por esses países. Informava simplesmente que a região se designava como Amazônia, como se ali não se encontrassem territórios nacionais, tratamento diverso do dispensado à parte Sul da America do Sul, em que a fronteira entre os diversos países era bem evidenciada.

Em 1989, Al Gore, ex-Vice-Presidente dos Estados Unidos da América, afirmou categoricamente que “Ao contrário do que os brasileiros pensam, a Amazônia não é deles, mas de todos nós”.16

No mesmo ano, o ex-presidente da França François Mitterrand defendeu sem demonstrar constrangimento “uma soberania relativa sobre a Amazônia”.17

Mikhail Gorbachev, ex-presidente da Rússia sustentou em 1992 a conveniência de o Brasil “delegar parte de seus direitos sobre a Amazônia aos organismos internacionais competentes”.18

O ex-primeiro-ministro britânico John Major, por sua vez, seguiu a mesma linha e, em 1992 disparou: “as campanhas ecologistas internacionais sobre a região Amazônica estão deixando a fase propagandística para dar inicio a uma fase operativa, que pode [...] ensejar intervenções militares diretas sobre a região”.19

Como se vê, poderosos políticos de diferentes partes do mundo já cogitam abertamente de intervenção militar na Amazônia, o que conduz à certeza de que seus países já planejam a aventura.

Em debate em universidade norte-americana, o senador brasileiro Cristovam Buarque foi indagado sobre a internacionalização da Amazônia. O estudante que o interrogava advertiu que esperava uma resposta do humanista e não do brasileiro. A indagação, por si só, já revela a natureza dos pensamentos que passam pelas cabeças de parte expressiva da elite intelectual americana. Mas é a resposta do senador que se destaca agora:

16 Informação extraída do voto do Ministro Marco Aurélio no “Processo 3.388/RR” do Supremo Tribunal Federal.

17 Informação extraída do voto do Ministro Marco Aurélio no “Processo 3.388/RR” do Supremo Tribunal Federal.

18 Informação extraída do voto do Ministro Marco Aurélio no “Processo 3.388/RR” do Supremo Tribunal Federal.

19 Informação extraída do voto do Ministro Marco Aurélio no “Processo 3.388/RR” do Supremo Tribunal Federal.

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A Terra Indígena de Raposa Serra do Sol, a Orientação do STF e a Mobilização Nacional

De fato, como brasileiro, eu simplesmente falaria contra a internacionalização da Amazônia. Por mais que nossos governos não tenham o devido cuidado com esse patrimônio, ele é nosso. Como humanista, sentindo o risco da degradação ambiental que sofre a Amazônia, posso imaginar a sua internacionalização, como de tudo o mais que tem importância para a humanidade. Se a Amazônia, sob uma ótica humanista, deve ser internacionalizada, internacionalizemos também as reservas de petróleo do mundo inteiro. O petróleo é tão importante para o bem-estar da humanidade quanto a Amazônia para o nosso futuro. Apesar disso, os donos das reservas sentem-se no direito de aumentar ou diminuir a extração de petróleo e subir ou não o seu preço. Da mesma forma, o capital financeiro dos países ricos deveria ser internacionalizado. Se a Amazônia é uma reserva para todos os seres humanos, ela não pode ser queimada pela vontade de um dono ou de um país. Queimar a Amazônia é tão grave quanto o desemprego provocado pelas decisões arbitrárias dos especuladores globais. Não podemos deixar que as reservas financeiras sirvam para queimar países inteiros na volúpia da especulação. Antes mesmo da Amazônia, eu gostaria de ver a internacionalização de todos os grandes museus do mundo. O Louvre não deve pertencer apenas à França. Cada museu no mundo é guardião das mais belas peças produzidas pelo gênio humano. Não se pode deixar que esse patrimônio cultural, como o patrimônio natural amazônico, seja manipulado e destruído pelo gosto de um proprietário ou de um país. Não faz muito tempo, um milionário japonês decidiu enterrar com ele um quadro de um grande mestre. Antes disso, aquele quadro deveria ter sido internacionalizado. Durante este encontro, as Nações Unidas estão realizando o Fórum do Milênio, mas alguns presidentes de países tiveram dificuldades em comparecer por constrangimentos na fronteira dos EUA. Por isso, eu acho que Nova Iorque, como sede das Nações Unidas, deve ser internacionalizada. Pelo menos Manhattan deveria pertencer a toda a humanidade. Assim como Paris, Veneza, Roma, Londres, Rio de Janeiro, Brasília, Recife, cada cidade, com sua beleza específica, sua história do mundo, deveria pertencer ao mundo inteiro. Se os EUA querem internacionalizar a Amazônia, pelo risco de deixá-la nas mãos de brasileiros, internacionalizemos todos os arsenais nucleares dos EUA. Até porque eles já demonstraram que são capazes de usar essas armas, provocando uma destruição milhares de vezes maiores do que as lamentáveis queimadas feitas nas florestas do Brasil. Nos seus debates, os atuais candidatos à presidência dos EUA têm defendido a idéia de internacionalizar as reservas florestais do mundo em troca da dívida. Comecemos usando essa dívida para garantir que cada criança no mundo tenha possibilidade de ir à escola. Internacionalizemos todas as crianças, tratando-as, todas elas, não importando o país onde nasceram como patrimônio que merece cuidados do mundo inteiro. Ainda mais do que merece a Amazônia. Quando os dirigentes tratarem as crianças pobres do mundo como um patrimônio da humanidade, eles não deixarão que elas trabalhem

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Brenno Cruz Mascarenhas Filho

quando deveriam estudar; que morram quando deveriam viver. Como humanista, aceito defender a internacionalização do mundo. Mas, enquanto o mundo me tratar como brasileiro, lutarei para que

a Amazônia seja nossa. Só nossa.20

A própria decisão do Supremo de que aqui se trata, revela temor relacionado a intervenções diplomáticas e militares na Amazônia brasileira. Como se viu, prega a necessidade de se alertar os “nossos indígenas” “contra a influência eventualmente malsã de certas organizações não governamentais estrangeiras”, de se “mobilizá-los em defesa da soberania nacional” e de se “reforçar neles o inato sentimento de brasilidade”21. A orientação se afigura assaz ingênua e se manifestou depois da declaração de que a situação topográfica da Terra Indígena de Raposa Serra do Sol era até favorável do ponto de vista geopolítico, porque “obriga que as instituições de Estado (Forças Armadas e Polícia Federal, principalmente) se façam também presentes com seus opostos de vigilância, equipamentos, batalhões, companhias e agentes”22.

Lembro que, no início do século passado, em 1904, o Brasil perdeu em favor da Guiana Britânica, na época colônia inglesa, mais de 19 mil quilômetros quadrados de terra junto à face oriental do que é hoje o Estado de Roraima a partir de decisão do rei da Itália, incumbido da arbitragem da questão de fronteira, tendo o italiano argumentado que os índios Macuxi, que habitavam a região, haviam optado pela cidadania inglesa23.

De idêntico temor, relativo à segurança da Amazônia, compartilha o deputado Aldo Rebelo, do PC do B, que, em entrevista concedida ao jornal O Estado de São Paulo, em 25 de novembro de 2007, se referiu a “manifestações em favor da submissão da Amazônia a uma espécie de tutela internacional”24.

Ives Gandra Martins e Celso Ribeiro Bastos, constitucionalistas de renome, também alertaram para o problema, dando conta de que “as organizações internacionais” procuram “tratar o território como indígena, mais do que brasileiro, razão pela qual, em eventual internacionalização da Amazônia [...] os verdadeiros titulares da terra seriam os indígenas e não os brasileiros”25.

O jurista Paulo Bonavides, por sua vez, em sua Teoria do Estado, se reporta aos casos do México e da Colômbia, que se viram mutilados do que é hoje o estado

20 Informação extraída do voto do Ministro Marco Aurélio no “Processo 3.388/RR” do Supremo Tribunal Federal.

21 Fls. 239 dos autos do “Processo 3.388/RR” do Supremo Tribunal Federal.22 Fls. 239 dos autos do “Processo 3.388/RR” do Supremo Tribunal Federal.23 Área Indígena de Raposa/Serra do Sol: Visão Regional, Alcir Gursen De Miranda [et AL.], Boa Vista,

GTE/RR, 2004, p. 28.24 Informação extraída do voto do Ministro Marco Aurélio no “Processo 3.388/RR” do Supremo

Tribunal Federal.25 Informação extraída do voto do Ministro Marco Aurélio no “Processo 3.388/RR” do Supremo

Tribunal Federal.

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A Terra Indígena de Raposa Serra do Sol, a Orientação do STF e a Mobilização Nacional

norte-americano do Texas e a República do Panamá, e adverte:

Hoje nos países em desenvolvimento desconfia-se de que camuflada-mente grande parte daquelas sociedades não governamentais e mis-sões religiosas desempenham a mesma função do vilipêndio; na rota da ocupação fingem-se de zelo sacerdotal pela causa indígena ou se credenciam como cientistas do solo, da fauna e da flora. São a ponta de lança da invasão futura. [...] Não é sem razão que a demarcação das reservas indígenas, ocorrendo mediante sub-reptícia pressão internacional, em verdade não corres-ponde aos interesses do nosso índio, mas aos desígnios predatórios da cobiça imperialista, empenhada já na ocupação dissimulada do espaço amazônico e na preparação e proclamação da independência das tri-bos indígenas como nações encravadas em nosso próprio território, do qual se desmembrariam. Essa demarcação, desde muito, deixou de ser uma questão de proteção ao silvícola para se converter numa grave

ameaça à integridade nacional26.

As dificuldades de acesso à água vão causar a próxima grande guerra, alertou o Brigadeiro do Ar Roberto de Medeiros Dantas, gerente do Programa Calha Norte do Ministério da Defesa, em palestra proferida na tarde de 18 de outubro do corrente ano, no Curso de Logística e Mobilização Nacional da Escola Superior de Guerra. Grande conhecedor da Amazônia e da Terra Indígena de Raposa Serra do Sol, o Brigadeiro afirmou também que as ONG que funcionam na região trabalham no sentido de preparar terreno para a intervenção estrangeira.

De fato, a água é mais uma riqueza da Amazônia que atrai a cobiça estrangeira. Vêm escasseando dramaticamente os recursos hídricos à disposição da humanidade. “Em 2025, mais de 60% da humanidade sofrerá com a falta de água”, assegurou o Professor Gustavo Alberto Trompowsky Heck em aula ministrada no referido Curso de Logística e Mobilização Nacional, no dia 25 de outubro deste ano.

Considerando a íntima relação entre a posse por índios de grandes extensões territoriais e os movimentos ordenados para a internacionalização da Amazônia, não se pode escapar da conclusão de que a instituição da Terra Indígena de Raposa Serra do Sol inspira séria preocupação.

Com efeito, a proteção conferida às fronteiras pelo Direito Internacional é precária, já que nesse terreno nada é coercitivamente executável.

De qualquer forma, a experiência evidencia que os tratados internacionais valem pouco, se, por algum motivo, deixarem de corresponder aos interesses de países capazes de fazer prevalecer pela força o que mais lhes convêm. Frequentemente, tratando-se de tais países, quanto um interesse maior se alevanta, se pelas vias contratuais ou diplomáticas nada conseguem, iniciam imediatamente a montagem dos pretextos que sustentarão a intervenção militar.

26 Paulo Bonavides. Teoria do Estado, 7ª ed, São Paulo, Malheiros, 2008, p. 392.

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Brenno Cruz Mascarenhas Filho

Os exemplos recentes da precariedade da proteção conferida pelo direito e pelos tratados internacionais não são poucos. Basta lembrar a tortura, oficialmente admitida nas prisões americanas de Guantânamo, na ilha de Cuba, e de Abu Ghraib, no Iraque, a morte de Osama Bin Laden no Paquistão pelo exército americano, do enforcamento de Sadam Hussein quatro dias depois de sua condenação por tribunal, constituído sob a tutela das forças de ocupação do Iraque, sem observância do devido processo legal, e a execução no Iêmen do americano Anwar al-Awlaki, quadro da al-Qaeda, fulminado por um petardo lançado de avião não tripulado e teleguiado por agentes dos Estados Unidos. Os Estados Unidos da América dispõem de grande quantidade de armas de destruição em massa e, ainda assim, invadiram o Iraque por supostamente possuir armas dessa natureza.

Nessas condições, a demarcação de forma contínua de enormes extensões territoriais e a sua atribuição com exclusividade a indígenas facilitam a construção do pretexto que poderá legitimar as investidas das maiores potências militares do planeta. Atribuir amplas extensões de terra a etnias indígenas dotadas de lideranças políticas (governo) é imaginar uma desculpa de que, mesmo sem relação com a realidade, poderá servir para justificar a intervenção militar no Brasil. No que diz respeito à Terra Indígena de Raposa Serra do Sol, torna-se óbvia a facilidade de se enxergar ali uma nação que ocupa um território e é dotada de governo. Mesmo que algum sofisma se torne necessário, não será difícil arrematar o raciocínio com a conclusão que essa suposta nação tem direito à autodeterminação.

Enfim, a ameaça é real e não pode ser ignorada. Nota: o Brasil concorreu com o seu voto para a proclamação da Declaração da

ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas, que estabelece que os povos indígenas sejam livres e iguais a todos os demais povos (art. 2º) e que os povos indígenas têm direito à autodeterminação e, em consequência, determinam livremente a sua condição jurídica (art. 3º).

Deve-se convir que os conceitos, as ressalvas e as “salvaguardas” fixados no processo que legitimou a demarcação contínua da Reserva de Raposa Serra do Sol são insuficientes para deter eventual iniciativa mais arrojada de potência estrangeira no sentido de ofender a nossa integridade territorial. Adianta pouco diferenciar “terra” de “território”, como fez o Supremo, ou mesmo diferenciar “etnia” de “nação”.

4 APRECIAÇÃO CRÍTICA DA DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

A despeito do notável saber jurídico dos ministros integrantes do Supremo Tribunal Federal, a sua decisão a que se vem referindo não foi a melhor. Como se viu, a ameaça estrangeira à soberania nacional no que concerne às terras indígenas e à própria Amazônia é uma realidade flagrante. A par disso, o art. 20, §2º, da Constituição Federal, estabelece que a faixa de fronteira (faixa de até 150

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A Terra Indígena de Raposa Serra do Sol, a Orientação do STF e a Mobilização Nacional

quilômetros de largura ao longo das fronteiras terrestres) é “fundamental para defesa do território nacional”.

O Art. 91, §1.º, III, da Constituição Federal, por sua vez, é claro no sentido de que o Conselho de Defesa Nacional é órgão de consulta do Presidente da República nos assuntos relacionados com a soberania nacional e que compete a esse Conselho “propor os critérios e condições de utilização de áreas indispensáveis à segurança do território nacional e opinar sobre seu efetivo uso, especialmente na faixa de fronteira”. Ora, a Terra Indígena de Raposa Serra do Sol é contígua às fronteiras do Brasil com a Venezuela e a Guiana, parte dela se situa na faixa de fronteira e, no processo administrativo que resultou na sua demarcação, o Conselho de Defesa Nacional não foi ouvido. Abordando esse aspecto do processo de demarcação, o Ministro Marco Aurélio, em seu voto, concluiu, acertadamente que é “formalidade essencial a audição do Conselho de Defesa Nacional” e que, portanto, “há de julgar-se procedente o pedido formulado, atentando o Supremo para a responsabilidade que possui”.

Por outro lado, a soberania nacional é o primeiro “fundamento” da República Federativa do Brasil, pelo que dispõe o art. 1º, caput, I, da Constituição. Atente-se para o aspecto topológico: trata-se do primeiro inciso do primeiro artigo da Constituição. Curiosamente, o capítulo dedicado aos índios, composto de dois artigos, é o último da Constituição. Entre um fundamento da República e o direito indígena às ”terras que tradicionalmente ocupam” deve prevalecer o primeiro. Observe-se que, à luz dos elementos de geopolítica acima mencionados, a Terra Indígena de Raposa Serra do Sol, tal como se constituiu, é absolutamente incompatível com a segurança da integridade territorial do Brasil e, consequentemente, com a soberania nacional.

Merecem destaque também as observações do Professor Denis Lerrer Rosenfield, da Faculdade de Filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Em artigo publicado em 16 de março de 2009 no jornal O Estado de São Paulo, ele afirma:

O Brasil é uma unidade federativa, não uma comunidade de nações. O processo histórico que conduziu a esse arcabouço constitucional, construído com muita dor e luta, não pode ser levianamente questionado por movimentos sociais, por ONGs nacionais e estrangeiras e organizações políticas que procuram redesenhar o País. Surge aí a idéia e, pior, a pretensão de formação de nações indígenas, com direito à autodeterminação e ao autogoverno. Os mais engajados, como o CIMI, vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), e ONGs internacionais, já falam de reconhecimento internacional dessas nações em organismos internacionais. Advogam para que o País reconheça a Declaração dos Povos Indígenas, que sinaliza para esse caminho. A soberania nacional ficaria inviabilizada, com o País não podendo mais explorar livremente seus recursos minerais e hídricos. Inclusive a atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal estaria comprometida.

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Note-se a pertinência das observações do professor. “Comunidade de nações” é algo previsto na Constituição do Brasil, é um objetivo nacional a ser alcançado no âmbito dos “povos da América Latina”. É o que estabelece o Art. 4º, parágrafo único, da Constituição, dedicado aos princípios concernentes às relações internacionais: “A Republica Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações”. Em suma, o Brasil se constitui de um único povo. Assim, não será com os índios brasileiros que o Brasil procurará formar uma “comunidade de nações”. Uma “comunidade de nações” o Brasil criará com os “povos da América Latina”.

É certo ainda que os direitos dos índios relativos às “terras que tradicionalmente ocupam” foram proclamados pela Constituição promulgada em 5 de outubro de 1988 (em seu Art. 231, caput). Consolidou-se o entendimento de que a Constituição não visou a reparar as injustiças perpetradas historicamente contra os índios, de que nada atribui aos índios direitos sobre as terras que ocupavam em tempos imemoriais e de que as terras que os índios tradicionalmente ocupam são aquelas que ocupavam em 5 de outubro de 1988. O verbete n.º 650 da Súmula do Supremo Tribunal Federal ratifica esse entendimento, positivando que “Os incisos I e XI do Art. 20, da Constituição Federal não alcançam terras de aldeamentos extintos, ainda que ocupadas por indígenas em passado remoto”. Impunha-se, dessa forma, apurar que espaço físico estava de fato sob a posse dos índios na aludida data no extremo norte do estado de Roraima. Como isso não foi feito, o Ministro Marco Aurélio, com razão, apontou a nulidade do processo administrativo que levou à demarcação da Terra Indígena de Raposa Serra do Sol e consignou que os atos de transferência de posse que se seguiram não favorecem “os interesses maiores da nacionalidade, harmonizando-se, isto sim, com as diversas sinalizações internacionais de cunho separatista”. Note-se que os produtores de arroz chegaram à região no início da década de 1970, quando compraram terras de antigos fazendeiros na borda Sul da Terra Indígena de Raposa Serra do Sol e chegaram a produzir cerca de 160 mil toneladas de grãos por ano, em aproximadamente 100 mil hectares27 e, muito importante, dadas as regras atinentes ao direito de ampla defesa consubstanciadas nos incisos LIV e LV do art. 5.º da Constituição, titulares de direitos relativos às terras abrangidas pela Portaria 534/2005 do Ministro da Justiça não foram convocados para se manifestar no processo administrativo que as demarcou.

Finalmente, o princípio da proporcionalidade. Os cerca de 19.000 indígenas de Raposa Serra do Sol ocupam mais de 17.000 km², isto é, quase 15 vezes a extensão territorial da cidade do Rio de Janeiro, cujos 6.323.037 habitantes dispõem de 1.180 km². Para justificar ocupação tão rarefeita, era indispensável que um laudo antropológico consistente, assinado por pelo menos dois especialistas, instruísse

27 http://pt.wikipedia.org/wiki/Raposa_Serra_do_Sol, Acesso em: 19 out. 2011.

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A Terra Indígena de Raposa Serra do Sol, a Orientação do STF e a Mobilização Nacional

o processo administrativo de demarcação e, ademais, que esse documento fosse submetido à apreciação detida do mais amplo espectro de interessados. Mas nada disso foi feito. Vale registrar que, em 1996, o então Ministro da Justiça Nelson Jobim, referindo-se à Terra Indígena de Raposa Serra do Sol e ao seu processo de demarcação, observou formalmente, mediante despacho, que “o levantamento antropológico de 1993 [...] não contém fundamento específico algum que demonstre ser essa parte da área indispensável à preservação indígena”28 e que comissão da Câmara dos Deputados, também tendo em vista o processo administrativo de demarcação da reserva indígena em pauta, fez constar de relatório seu que “peças centrais” do laudo antropológico foram elaboradas “por entidades ligadas à defesa dos direito indígenas”, o que “compromete a sua isenção, em prejuízo dos princípios da impessoalidade e da razoabilidade da atuação da Administração Pública”29.

5 A TERRA INDÍGENA DE RAPOSA SERRA DO SOL E A MOBILIZAÇÃO NACIONAL

O General Augusto Heleno, na condição de Comandante Militar da Amazônia, sem se referir especificamente à Terra Indígena de Raposa Serra do Sol, mas refletindo sobre a política nacional de demarcação de terras indígenas, afirmou que “A melhor maneira de evitar uma ofensiva militar na Amazônia é manter uma força de dissuasão na floresta”30.

Tem razão o general. Diante do quadro apresentado, cumpre colocar o Poder Nacional a serviço da nossa integridade territorial e da soberania nacional e, mais do que isso, aumentar “a capacidade que tem o conjunto de homens e meios que constituem a Nação para alcançar e manter os Objetivos Nacionais, em conformidade com a Vontade Nacional”31.

E a vontade nacional é aquela expressa na Constituição, que estabelece como fundamento (e objetivo) do Estado brasileiro a manutenção da soberania nacional.

Em suma, sabendo que a preparação para a mobilização nacional para fins de defesa não é algo que se faz da noite para o dia, aos brasileiros e ao Estado brasileiro compete, desde já, imediatamente, direcionar o Poder Nacional para a preparação dessa mobilização.

Para tanto, a base jurídica é bastante satisfatória. A Constituição Federal atribui respectivamente à União e ao Presidente da República competência privativa para legislar sobre defesa territorial e mobilização nacional (art. 22, XXVIII) e para decretar a mobilização nacional (art. 84, XIX).

28 Área Indígena Raposa/Serra do Sol Visão Regional, Alcir Gursen De Miranda [Et al.], Boa Vista, GTE/RR, 2004, p. 59.

29 Informação extraída do voto do Ministro Marco Aurélio no “Processo 3.388/RR” do Supremo Tribunal Federal.

30 http://pt.wikipedia.org/wiki/Raposa_Serra_do_Sol, Acesso em: 19 out. 2011.31 Manual básico. Rio de Janeiro: Escola Superior de Guerra Volume I, 2009, p. 31.

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Brenno Cruz Mascarenhas Filho

Na senda aberta pela Constituição, foi promulgada a Lei 11.631/2007, que “dispõe sobre a Mobilização Nacional” e “cria o Sistema Nacional de Mobilização – SINAMOB” (Art. 1º). O Art. 3.º dessa lei impõe que, em tempos de paz, “de modo contínuo, metódico e permanente”, se realizem ações estratégicas que viabilizem a execução da mobilização nacional. Como se infere da análise do dispositivo legal, trata-se da preparação da mobilização nacional, algo que se deve executar com antecedência e de maneira contínua, para permitir que se leve a efeito a “mobilização nacional” nas melhores condições possíveis. O Art. 2.º, I, da Lei 11.631/2007, por sua vez, define “mobilização nacional” como “o conjunto de atividades planejadas, orientadas e empreendidas pelo Estado, complementando a Logística Nacional, destinadas a capacitar o País a realizar ações estratégicas, no campo da Defesa Nacional, diante de agressão estrangeira”.

A Estratégia Nacional de Defesa (END), por sua vez, aprovada pelo Presidente da República32, pretende modernizar e fortalecer a estrutura nacional de defesa, tudo de maneira sistemática, reorganizando as forças armadas, dando consistência à indústria de material bélico e compondo o efetivo das três forças.

Fica claro que a END depende decisivamente da estratégia nacional de desenvolvimento, na medida em que esta condiciona o Poder Nacional e, portanto, não pode ser levada a cabo sem o envolvimento da sociedade brasileira.

Com essa perspectiva, verifico que os investimentos do Brasil em defesa não alcançam 2% do PIB, percentual significativamente inferior aos cerca de 3% investidos por nossos vizinhos Equador, Chile e Colômbia33.

É fundamental atentar para a importância do desenvolvimento da tecnologia. Em situação de crise, notadamente de conflito armado, somente se poderá alcançar um grau razoável de certeza quanto ao fornecimento do equipamento necessário, se o país dispuser de tecnologia capaz de permitir a sua produção com os próprios recursos. Felizmente, parece que já se disse adeus ao modelo “caixa preta” que prevaleceu até décadas atrás, pelo qual se adquiria o equipamento no exterior sem se esboçar qualquer movimento no sentido de adquirir também o conhecimento que permitiu a sua produção.

Igualmente importantes são os investimentos em infraestrutura logística, para também, nesse terreno, o Brasil libertar-se da dependência externa, e em inteligência, para que nenhum movimento hostil aos interesses da nação não a surpreenda.

No que diz respeito à Amazônia, em geral, e à Terra Indígena de Raposa Serra do Sol, em particular, o Poder Público e a sociedade brasileira devem adotar as providências necessárias para melhorar as condições logísticas na região, e no caso de mobilização, possa contar com as melhores condições de intervenção militar.

32 Mediante o Decreto 6.703/2008.33 FLORES, Mario Cesar. “Segurança internacional na América do Sul (e o Brasil nela)”. In Política

Externa, p.69.

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A Terra Indígena de Raposa Serra do Sol, a Orientação do STF e a Mobilização Nacional

No tocante à Região Norte do país, chama a atenção o Programa Calha Norte, subordinado ao Ministério da Defesa, que abrange integral ou parcialmente os Estados do Para, do Amapá, de Roraima, do Amazonas, do Acre e de Rondônia. As ações desenvolvidas no âmbito do Programa Calha Norte visam a contribuir para a manutenção da soberania nacional e da integridade territorial na região e para a promoção do desenvolvimento regional e, portanto, se situam no terreno da preparação da mobilização nacional.

O Brasil é pacífico. Por tradição e por força dos princípios constitucionais de “defesa da paz” e de “solução pacífica dos conflitos” que consagrou (art. 4.º, VI e VII, da Constituição). Dessa forma, porque se quer a paz, tem que haver o preparo para a guerra. O poder militar do Brasil tem que estar à altura do poder nacional, das suas riquezas naturais, em terra e no mar, e da posição que quer ocupar no campo das relações internacionais.

5 CONCLUSÃO

Como se pretendeu demonstrar, são reais e não se afiguram remotas as ameaças militares à integridade territorial do Brasil. Chamam a atenção os movimentos, mais ou menos velados, que objetivam a internacionalização da Amazônia, movimentos esses capitaneados pelos países centrais da América do Norte e da Europa.

Não obstante, o Supremo Tribunal Federal, pela decisão proferida no “Processo 3.388/2005”, legitimou a portaria ministerial relativa à demarcação da Terra Indígena de Raposa Serra do Sol e consagrou o direito originário dos índios da região à posse dessa terra e à reprodução de sua cultura. Prevaleceu, portanto, a demarcação contínua das terras indígenas e a sua extensão inclusive à chamada faixa de fronteira.

Essa decisão, a despeito das salvaguardas estabelecidas, acima aludidas, fragiliza de maneira significativa o sistema de defesa nacional, porque, como se viu, fornece ao inimigo pretexto de que necessita para justificar eventual intervenção.

Ressalto que não se trata de deixar de fazer algo, apenas para não desagradar os circunstantes, países interessados em dispor das riquezas naturais da Amazônia, o que caracterizaria alienação de soberania, pois estar-se-ia conduzindo, de acordo com uma pauta de prioridades elaborada à revelia das instâncias nacionais de poder. Trata-se, reitera-se, de aplicar o direito pátrio e demarcar as terras indígenas brasileiras, de acordo com os princípios constitucionais mais relevantes.

Com esse viés, mais acertado e conveniente teria sido atribuir aos índios, obedecendo ao preceito constitucional, à posse de terras descontínuas e fora da chamada faixa de fronteira.

Agora, todavia, com o trânsito em julgado da decisão do Supremo Tribunal Federal no “Processo 3.388/RR”, a transformação da feição da Terra Indígena de

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Brenno Cruz Mascarenhas Filho

Raposa Serra do Sol se torna politicamente difícil, porque depende de emenda constitucional ou da instituição de nova assembléia constituinte.

Enquanto isso não se viabiliza, cumpre preparar com empenho a mobilização nacional, proporcionando ao país uma pujante e consistente estrutura de defesa, tanto para fins de dissuasão como para fins de efetivo emprego das forças armadas, certo que, como se sabe, defender o status quo é quase sempre mais fácil do que, diante do fato consumado, reverter à situação.

De qualquer forma, na paz ou, eventualmente, na guerra, o Brasil verá que seus filhos não fogem à luta.

REFERÊNCIAS

ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA, Manual básico: Assuntos específicos. Rio de Janeiro: ESG, 2009.

ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA (Brasil). Manual básico: assuntos específicos. Rio de Janeiro, 2009.

FREGAPANI, Gélio. Amazônia: A grande cobiça internacional. Brasília: Thesaurus, 2000.

A LOGÍSTICA na Amazônia. 12. RM. Manaus: Comando do Exército, [19---]. Disponível em: http://www.guialog.com.br/ARTIGOS325.htm. Acesso em: 29 ago. 2011.

MATTOS, Luis Carlos Gomes. A Amazônia. In: SEMINÁRIO DE SEGURANÇA DA AMAZÕNIA, 2010, Ponta Negra, Manaus. Painel... Ponta Negra, Manaus: [s..n.], 2010. Disponível em: http://www.sae.gov.br/seminarioamazonia/?page_id=84. Acesso em: 29 ago. 2011.

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23Caderno de Estudos Estratégicos de Log. e Mob. Nac., v.1, n.4, p. 23-38, jan./dez. 2012

A Realização do Apoio de Transp. às Org. Mil. de Front. na Amaz. Ocid. e seus Reflexos para a Mob. Nac.

A REALIZAÇÃO DO APOIO DE TRANSPORTE ÀS ORGANIZAÇÕES MILITARES DE FRONTEIRA NA

AMAZÔNIA OCIDENTAL E SEUS REFLEXOS PARA A MOBILIZAÇÃO NACIONAL.

Alberes José Quintans de FreitasTenente-Coronel do Exército Brasileiro, estagiário do Curso de Logística e Mobilização Nacional da Escola Superior de Guerra, em 2011.

Resumo

A Amazônia representa um dos focos de maior interesse para a defesa. O Brasil será vigilante na reafirmação incondicional de sua soberania sobre a Amazônia brasileira. Na Amazônia, em especial na sua porção ocidental, o desafio da selva e o isolamento da área impõem restrições à logística, em especial à sua função ‘transporte’. Na Amazônia Ocidental, o apoio de transporte às Organizações Militares de Fronteira enfrenta vários óbices que dificultam e/ou impedem a sua realização. Naquela região, a logística é realizada em tempo de paz como se fosse numa situação real de combate. Daí surge como reflexo, a necessidade de uma maior Mobilização Nacional para se complementar a Logística Nacional, de forma a atender o emprego das Operações de Defesa da Amazônia. Dessa forma, o presente artigo tem o objetivo de identificar os principais óbices para a realização do apoio de transporte às Organizações Militares de Fronteira (OM Fron), do Exército Brasileiro (EB), na Amazônia Ocidental (Amz Oc) e seus reflexos para a Mobilização Nacional (Mob Nac).

Palavras-chave: Óbices; Amazônia Ocidental; Organização Militar de Fronteira; Apoio de Transporte; Mobilização Nacional.

1 INTRODUÇÃO

1.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A doutrina militar atribui grande importância às atividades logísticas, dentre as quais se destaca a função ‘transporte’. Todas as demais funções logísticas militar (recursos humanos, saúde, suprimento, manutenção, engenharia, salvamento) dependem dos transportes em sua implantação ou na sua execução.

A função logística transporte é ditada, principalmente, pelos meios de transportes e pelas condições das vias de transporte e interferem diretamente no seu planejamento.

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24 Caderno de Estudos Estratégicos de Log. e Mob. Nac., v.1, n.4, p. 23-38, jan./dez. 2012

Alberes José Quintans de Freitas

Na Amazônia Ocidental (Amz Oc), o desafio da selva e o isolamento da área impõem restrições à logística, em especial à sua função transporte.

A 12ª Região Militar (12ª RM), “Região Mendonça Furtado”, é o Grande Co-, “Região Mendonça Furtado”, é o Grande Co- “Região Mendonça Furtado”, é o Grande Co-, é o Grande Co- é o Grande Co-mando Logístico responsável pelo apoio logístico às Organizações Militares (OM) localizadas na Amazônia Ocidental.

A logística na Amazônia é realizada em tempo de paz como se fosse numa situação real de combate. O planejamento e a execução do transporte, naquela região, são, sem dúvida, as funções logísticas mais críticas realizadas por aquele Grande Comando.

O transporte na Amazônia Ocidental deve ser tratado de forma diferenciada, por ser uma região com grande vazio demográfico e econômico, pela precariedade das suas vias de transportes e pela dispersão das Organizações Militares em toda a sua extensão, o que, às vezes, impede ou dificulta a realização de tão importante função logística.

Este trabalho tomou como base, para estudo, a função logística transporte na Amazônia Ocidental, formulando o seguinte problema: Quais são os principais óbices existentes para o apoio de transporte às Organizações Militares de Fronteira (OM Fron) do Exército Brasileiro (EB), na Amazônia Ocidental?

Do problema surge o objetivo que é apontar os principais óbices para a realização do apoio de transporte às Organizações Militares de Fronteira do Exército Brasileiro, na Amazônia Ocidental e seus reflexos para a Mobilização Nacional (Mob Nac).

A conclusão deste trabalho permitirá identificar esses óbices e, dessa forma, apresentar uma contribuição para o aperfeiçoamento dos transportes em apoio às Organizações Militares, na Amazônia Ocidental, para o fortalecimento do Poder Nacional e facilitação da tomada de medidas necessárias a uma necessidade de Mobilização Nacional.

O trabalho será limitado ao apoio de transporte às Organizações Militares de Fronteira, do Exército Brasileiro, na Região da Amazônia Ocidental.

Este artigo valeu-se de uma pesquisa de natureza teórica e se utilizou do método de raciocínio dedutivo. Para atingir os propósitos predeterminados, foram estabelecidos objetivos intermediários: descrever as características fisiográficas da Amazônia Ocidental que interferem e ou influenciam nos transportes; descrever a rede de transportes da Amazônia Ocidental de interesse das Organizações Militares de Fronteira, do Exército Brasileiro e seu reflexo para o apoio logístico; e estudar a função logística transporte, na Amazônia Ocidental.

Também, para responder ao problema levantado na pesquisa, foram estabelecidas as seguintes hipóteses: a deficiência do sistema de transportes da Amazônia Ocidental, aliada aos fatores fisiográficos, é um grande óbice para a realização do apoio de transporte às Organizações Militares de Fronteira, do Exército Brasileiro; a falta de meios de transportes adequados, somada à precariedade dos

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existentes, nas Organizações Militares de Apoio do Exército Brasileiro, dificulta a logística de transporte; e a dependência da Força Aérea Brasileira (FAB) com reduzida disponibilidade de aeronaves e horas de vôo e da 12ª Região Militar com poucos meios disponíveis de transporte, são os principais óbices ao apoio.

Do estudo destas variáveis, partiu-se para uma análise exploratória de dados, através de uma pesquisa bibliográfica, em livros, decretos, leis, periódicos e sites; e, ainda, do conhecimento profissional de militares que atuaram no ambiente operacional da Amazônia Ocidental. Os dados levantados foram analisados de forma qualitativa.

1.2 TóPICOS IMPORTANTES

Para melhor entendimento do presente artigo é necessária a compreensão de alguns conceitos que serão apresentados abaixo:

- Objetivos Nacionais (ON) resultam da identificação de necessidades, interesses e aspirações que, em determinada fase de sua evolução histórico-cultural, a Nação busca satisfazer.- Poder Nacional é a capacidade que tem o conjunto dos homens e dos meios que constituem a Nação, atuando em conformidade com a vontade nacional, para alcançar e manter os ON.- Óbices são obstáculos de toda ordem que dificultam ou impedem a conquista e a manutenção de objetivos.- Estratégia Nacional é a arte de preparar e de aplicar o Poder Nacional para, superando os óbices, alcançar e preservar os ON, de acordo com a orientação estabelecida pela Política Nacional.- Logística Nacional é o conjunto de atividades relativas à previsão e à provisão dos recursos necessários à realização das ações planejadas para a consecução da Estratégia Nacional.- Função logística transporte é o conjunto de atividades que são executadas, visando ao deslocamento de recursos humanos, materiais e animais por diversos meios, em tempo e para locais predeterminados, a fim de atender às necessidades.- Mobilização Nacional (Mob Nac) é o conjunto de atividades planejadas, empreendidas ou orientadas pelo Estado, complementando a Logística Nacional, para capacitar o Poder Nacional a realizar Ações Estratégicas de Defesa, em face da declaração de estado de guerra ou resposta à agressão armada estrangeira.- Meios de transporte são os equipamentos especiais como o avião, o trem, o navio, o automóvel etc.- Via de transporte é a estrutura física e seu balizamento, através da qual se desloca um meio de transporte.

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- Modais de transporte são caracterizados conforme a via empregada, podendo ser rodoviário, aquaviário ou hidroviário, aéreo, ferroviário e dutoviário. - Transporte Intermodal é aquele em que são empregados dois ou mais modais de transporte.- O termo “Reflexos para a Mob Nac” equivale à “consequências para a Mob Nac”.

II - CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA

2.1 DELIMITAÇãO DA ÁREA

A Amazônia Ocidental compreende os estados de Rondônia, Acre, Amazonas e Roraima. Possuí uma extensão de 2.195.000 km², o que corresponde a aproximadamente 25% do território nacional. A região faz fronteira com Guiana, Venezuela, Colômbia, Peru e Bolívia.

2.2 Principais aspectos fisiográficos que interferem nos tipos de transportes

2.2.1 Clima

É equatorial, quente e úmido. As chuvas são abundantes durante quase todo o ano, o que acarreta consequências significativas para os transportes. A construção de estradas e aeródromos é dificultada, pois o regime de trabalho não pode ser contínuo o que eleva os custos. A manutenção e conservação das estradas e aeródromos se torna onerosa devido ao desgaste excessivo. O transporte aéreo também é prejudicado pelas fortes chuvas e nebulosidades que tornam os deslocamentos das aeronaves em operações arriscadas, principalmente os pousos e as decolagens. O transporte fluvial depende do regime dos rios, determinado pelas chuvas. Sendo assim, o Rio Solimões/Amazonas atinge seu nível máximo no mês de junho e no período de setembro a dezembro, o seu nível mínimo.

2.2.2 Hidrografia

A densa e extensa rede hidrográfica, sendo o rio Amazonas o coletor das águas da maior bacia hidrográfica do planeta, impede a construção de estradas, porém facilita os transportes fluviais, desde que se respeite os regimes dos rios. Outra importante característica é a variação do leito e das margens de alguns rios, o que obriga a uma navegação cuidadosa, a utilização de equipamentos auxiliares de navegação e o emprego de peritos como condutores das embarcações. Em algumas situações, os rios de maior porte podem ser usados como pista de pouso, no caso de hidroaviões.

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2.2.3 - Vegetação

É caracterizada por densa floresta tropical, predominante em quase toda a extensão da Amazônia Ocidental. Essa vegetação, aliada ao clima e ao relevo, dificulta a construção de estradas e aeródromos, bem como o pouso e decolagem (de aeronaves).

2.2.4 - Relevo

Possuí grandes ravinas, resultantes dos cortes profundos dos cursos d’água que dificultam a construção de estradas. A existência de algumas elevações, como as do Planalto das Guianas, no alto do Rio Negro, e a pedra de Cucuí que, somadas às fortes chuvas e nebulosidades, limitam o deslocamento de aeronaves, particularmente no pouso e na decolagem.

2.2.5 - Solo

O tipo de solo que ocorre na maior parte da região é pobre, quase não possuí rochas e cascalho e sua constituição dificulta a terraplanagem, consequentemente, dificulta os trabalhos como drenagem e obras de arte em concreto. E ainda, aliado às fortes chuvas, está sujeito a erosão, aumentando o desgaste das estradas e dos aeródromos e tornando difícil a manutenção.

2.3- Principais consequências para os transportes

Destacaram-se abaixo, as principais consequências para os transportes, decorrentes dos fatores fisiográficos:

- Dificuldade de construção e da manutenção de rodovias e aeródromos;- Dependência do regime das águas dos rios para o transporte fluvial;- Dificuldade para a navegação fluvial, devido à variação das margens e dos

leitos de alguns rios;- Limitação no deslocamento de aeronaves, particularmente no pouso e na

decolagem, durante as fortes chuvas e nebulosidade;- Existência de poucas rodovias;- Deficiência dos portos e ancoradouros existentes;- Deficiência na interligação de modais; e- Necessidade de grandes deslocamentos, devido às grandes distâncias entre

os principais núcleos populacionais.Por todos os aspectos e consequências acima citados, verifica-se que a

Amazônia Ocidental é uma região com características próprias e sua utilização para Operações Militares, principalmente no campo da logística, reveste-se de grandes

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desafios. Há necessidade da adoção de Políticas voltadas para o desenvolvimento e a segurança da Amazônia, que resultem em ações estratégicas direcionadas para superar os óbices relacionados ao sistema de transportes naquela região.

3 A REDE DE TRANSPORTES DA AMAZÔNIA OCIDENTAL, DE INTERESSE DAS OM, E SEU REFLEXO NO APOIO LOGÍSTICO

3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A Amazônia Ocidental, conforme foi descrito na caracterização da área, é uma região que possui um sistema de transportes com características próprias. Os modais que se destacam e de interesse das OM são: o hidroviário, o rodoviário e o aéreo.

3.2 MODAL

3.2.1 Hidroviário

Na rede hidroviária, encontra-se o principal meio de transporte da região. A bacia Amazônica estende-se por mais de 2.400.000 km². Seus rios constituem praticamente as únicas vias de transporte. Principais Rios: Amazonas, Solimões, Juruá, Tefé, Purus, Madeira, Negro, Branco. A maior limitação é o regime de chuvas.

O rio Amazonas/Solimões permite a navegabilidade em qualquer época do ano e permite o apoio logístico a todas as Organizações Militares localizadas próximas às suas margens.

Figura 1

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O rio Negro permite o apoio logístico com embarcações maiores até a localidade de Camanaús, que fica a 22 km de São Gabriel da Cachoeira. De São Gabriel da Cachoeira até Cucuí, aproximadamente 150 km de extensão, o rio permite navegação de pequenas embarcações.

O rio Juruá permite o apoio logístico às Organizações Militares das cidades de Cruzeiro do Sul e Eirunepé. O rio é muito sinuoso o que torna as viagens longas e apresenta restrições à navegação de junho a novembro.

O rio Javari permite suprir, por pequenas embarcações, os pelotões de fronteira (PEF) localizados em Palmeira do Javari e Estirão do Equador.

O rio Iça é bastante sinuoso, permite a navegação ao longo de todo o ano, com calados máximos de 3,70 m na seca e 6,00 m na cheia, proporcionando o apoio logístico ao pelotão de fronteira de Ipiranga.

O rio Japurá possuí uma variação de nível de suas águas entre 6m e 8m, entre o período da vazante e enchente. O rio facilita o apoio logístico ao pelotão de fronteira de Vila Bittencourt.

O rio Purus proporciona o apoio logístico aos tiros de guerra de Lábrea e Boca do Acre, e também ao pelotão de fronteira de Santa Rosa do Purus.

O rio Acre permite o apoio logístico de Manaus, nos meses de dezembro a maio.

O rio Madeira permite o apoio logístico entre Manaus e Porto Velho e, dessa cidade, para o sul do País.

O rio Uaupés apresenta diversas corredeiras no trecho Iauaretê até a localidade de Querari. O rio permite o apoio logístico ao pelotão de fronteira de Iauaretê.

O rio Tiquié permite o apoio logístico ao pelotão de fronteira de Pari-Cachoeira.

O rio Mamoré permite o apoio logístico, à montante de Guajará-Mirim juntamente com o rio Guaporé, ao pelotão de fronteira de Forte Príncipe da Beira.

Do acima exposto, pode observar-se, como principal reflexo do modal fluvial, que o mesmo se constitui no meio de transporte mais importante e econômico para o apoio às Organizações Militares de Fronteira.

3.2.2 - Rodoviário

Na rede Rodoviária, destacam-se abaixo as principais vias de transporte de interesse para o apoio às Organizações Militares de Fronteira do Exército Brasileiro:

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Figura 2

A BR 364 apresenta-se como o principal eixo dos Estados do Acre e Rondônia, como apoio logístico de Porto Velho (RO) à Rio Branco (AC). De Rio Branco segue para Cruzeiro do Sul.

A BR 319 liga Manaus a Porto Velho, e desta cidade para Humaitá.A BR 425 liga a BR 364 na altura de Abunã-RO à Guajará-Mirim-RO. Permite o

apoio logístico de Porto Velho à Organização Militar localizada em Guajará-Mirim.A BR 317 permite o apoio logístico de Rio Branco à Companhia Especial de

Fronteira em Brasiléia e ao pelotão de fronteira de Assis-Brasil.A BR 174 permite o apoio logístico de Manaus às Organizações Militares de

Boa Vista e ao pelotão de fronteira localizado no marco BV-8.A BR 401 permite o apoio logístico de Boa Vista aos pelotões de fronteira de

Bonfim e Normandia.A estrada que liga São Gabriel da Cachoeira à Cucuí, permite o apoio logístico

ao pelotão de fronteira localizado naquela área.Como reflexo ao apoio logístico às Organizações Militares da Fronteira do

Exército Brasileiro, o transporte rodoviário tem se tornado um meio importante de complemento ao transporte fluvial.

3.2.3 - Aeroviário

Na rede aeroviária, pode-se dizer que o transporte aéreo constitui-se num importante complemento do transporte fluvial, sendo, às vezes, o único meio para algumas Organizações Militares de Fronteira.

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A existência de aeroportos e terminais domésticos nas capitais e em algumas das cidades do interior possibilita o transporte aéreo de carga e passageiros pelas principais companhias aéreas nacionais e regionais.

Nos pelotões de fronteira, também existem pistas de pouso que facilitam o apoio logístico pela FAB. O transporte aéreo para determinados Pelotões de Fronteira é o único meio possível, fazendo com que se estabeleça uma grande dependência desses Pelotões às aeronaves da FAB.

4 APOIO DE TRANSPORTE ÀS ORGANIZAÇÕES MILITARES DE FRONTEIRA E OS PRINCIPAIS ÓBICES EXISTENTES

4.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A 12.ª Região Militar (12.ª RM), ‘Região Mendonça Furtado’, é parte integrante do Comando Militar da Amazônia (CMA) e se localiza na cidade de Manaus.

Na condição de Grande Comando Logístico, é responsável pelo apoio logístico às Organizações Militares do CMA na Amazônia Ocidental. Dentro da sua área de responsabilidade, a 12.ª RM apoia 61 Organizações Militares, sendo 25 de Fronteira.

Figura 3

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Para realizar o apoio, na Amazônia Ocidental, devem-se levar em consideração as peculiaridades da área, principalmente a hidrografia, o clima e os meios de transporte.

Dessas peculiaridades, surgem diversos obstáculos, tais como: a precariedade da malha rodoviária; o imenso vazio demográfico; a navegação condicionada ao regime das águas dos rios; as grandes distâncias que separam os núcleos populacionais; o limitado número de aeródromos e pistas de pouso para as aeronaves e a falta e limitação de portos e ancoradouros.

É importante também destacar as seguintes particularidades logísticas, na Amazônia Ocidental, para a realização dos transportes: a adoção de métodos, processos e técnicas especiais nas atividades do transporte; as dificuldades para manter o apoio, devido à imensidão da área; o planejamento centralizado e a execução descentralizada e flexível, decorrentes dos meios de transportes e das grandes distâncias; e a necessidade de se manter, nas Organizações Militares de Fronteira, elevados níveis de estoque de suprimentos.

Na Amazônia, também se deve levar em consideração que durante a realização de qualquer atividade de transporte, é o momento em que se realiza também o patrulhamento de áreas isoladas e, nessas ocasiões, muitas vezes pode-se obter o levantamento de informações importantes, junto aos nativos e ribeirinhos, para a realização de operações militares futuras.

É também uma das formas pela qual o Exército Brasileiro se faz presente na Amazônia e participa ativamente da integração daquela região ao restante do País. Dessa forma, a atividade de transporte na Amazônia Ocidental deve ter um planejamento detalhado e uma execução precisa e eficiente, pois, naquela região, a atividade de transporte vai muito além de uma função logística, nela o Exército Brasileiro mantém a constante defesa do território nacional.

4.2 - Meios de transporte utilizados

4.2.1 - Hidroviário

A Amazônia Ocidental, pela sua grande malha hidrográfica, torna o transporte fluvial como o principal meio empregado e, consequentemente, obriga que grande parte dos meios de transporte existentes seja voltada para as aquavias.

O apoio às Organizações Militares de Fronteira é realizado pelo Centro de Embarcações do Comando Militar da Amazônia (CECMA). O regime dos rios e as grandes distâncias são os maiores problemas enfrentados pelo transporte fluvial. Abaixo as distâncias percorridas pelas embarcações do CECMA a partir de Manaus.

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Tabela 1

Localidade Distância Tempo (Ida e volta)

São Gabriel da Cachoeira - AM 1.037 km 16 dias

Barcelos - AM 485 km 08 dias

Porto Velho - RO 21 dias 1.000 km 14 dias

Tefé – AM 631 km 10 dias

Tabatinga - AM 1.756 km 14 dias

Cruzeiro do Sul - AC 4.350 km 45 dias

Este Centro possui diversos tipos de embarcações táticas e logísticas,

destacando-se, para o transporte de suprimentos, as balsas de 40, 100, 150, 200 e

250 toneladas e seus empurradores. Para o transporte de pessoal, o CECMA conta

com embarcações do tipo regional, lanchas rápidas e táticas, como segue:

- Embarcações de carga com capacidade total de transporte de 1.280 ton.;

- Embarcações de transporte de pessoal com capacidade total de transporte

de 278 passageiros e 140 ton. de carga; e

- Embarcações de emprego tático capacidade total de transporte de

passageiros.

A 12.ª Região Militar realiza o planejamento dos transportes aquaviários

e coordena as ações das Organizações Militares de Apoio do CECMA e de outros

usuários do sistema de transporte fluvial regional.

O CECMA, além de realizar, com as suas embarcações, o transporte fluvial

para apoiar as Organizações Militares da Fronteira, também realiza a capacitação

de militares para a operação e manutenção de embarcações.

O apoio se dá trimestralmente, quando de Manaus partem embarcações

conduzindo suprimentos de todas as classes, principalmente equipamentos

pesados, viaturas, embarcações, material de construção, gêneros alimentícios, óleos,

combustíveis e outros, com destino a Tefé, São Gabriel da Cachoeira, Tabatinga, Boa

Vista, Cruzeiro do Sul, Porto Velho e Rio Branco.

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Figura 4

Os principais óbices para o apoio de transporte fluvial às Organizações Militares da Fronteira, na Amazônia Ocidental, são: o regime das águas dos rios e as grandes distâncias a serem percorridas; a falta de modernos portos, ancoradouros e sistema de carregamento de cargas; e a falta de meios de transportes adequados das Organizações Militares, principalmente, para o transporte de combustível.

4.2.2 - Aeroviário

Para o apoio às Organizações Militares de Fronteira, empregam-se os meios disponíveis da Força Aérea Brasileira (FAB) e, excepcionalmente, os do 4º Batalhão de Aviação do Exército, com sede em Manaus.

Por intermédio do Plano de Apoio à Amazônia (PAA) e do Plano de Missões Conjuntas (PMC), o CMA, a 12ª RM e a FAB desencadeiam, bimestralmente, um planejamento para o transporte aéreo, com a finalidade de apoiar as sedes das Brigadas e seus respectivos Pelotões de Fronteira (PEF). Partindo de Manaus, aeronaves C105A (Amazonas) ou C98 (Caravan), e de acordo com o tipo de pista de pouso, apoiam os Pelotões de Fronteira, principalmente aqueles em que o meio aéreo é a única forma de apoio.

O suporte aéreo se torna imprescindível, quando se trata de uma evacuação de emergência nos PEF, bem como no transporte de frigorificados. É também indicada a sua utilização em situações, como: operações militares que exijam

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deslocamentos longos e rápidos; interdição das vias terrestres e aquáticas; e isolamento de tropas.

Os principais óbices ao apoio de transporte aéreo às Organizações Militares de Fronteira, na Amazônia Ocidental são: as condições climáticas adversas que influem nos meios aéreos e nas pistas de pouso, impedindo o pouso e a decolagem de aeronaves e a reduzida disponibilidade de aeronaves e horas de vôo, da FAB, tendo em vista que ela apoia, também, na Amazônia Ocidental, diversos outros órgãos da Administração Pública Federal e Estadual.

4.2.3 - Rodoviário

Para efeito de apoio logístico na Amazônia Ocidental, o transporte rodoviário é um importante meio e complemento ao hidroviário.

São utilizadas as viaturas de transporte de carga geral e de frigorificados, do 12.º Depósito de Suprimentos e das Bases Logísticas.

Basicamente, o transporte rodoviário é utilizado no apoio às Organizações Militares de Boa Vista, através da BR 174, e de lá para os Pelotões de Fronteira (PEF) de Pacaraima, Bonfim e Normandia. Ainda, nas ramificações existentes entre: São Gabriel da Cachoeira e Cucuí (AM); Porto Velho e Guajará-Mirim (RO); Porto Velho e Humaitá (RO); Porto Velho e Rio Branco (AC); e nas ligações rodoviárias entre Rio Branco e Plácido de Castro, Brasiléia e Assis Brasil (AC).

Os principais óbices para o apoio de transporte rodoviário às Organizações Militares de Fronteira, na Amazônia Ocidental, são: falta de uma malha rodoviária; dificuldade de construção e manutenção das rodovias e estradas existentes, em função dos fatores fisiográficos e a precariedade dos meios de transportes disponíveis nas Organizações Militares.

5 ÓBICES PARA O APOIO DE TRANSPORTE ÀS ORGANIZAÇÕES MILITARES DE FRONTEIRA E SEUS REFLEXOS PARA A MOBILIZAÇÃO NACIONAL

A importância estratégica da Amazônia é um fato incontestável. Países do primeiro mundo há muito, reconheceram esta evidência, pois sobre a região lançaram suas vistas e seus interesses. As pressões sobre a soberania brasileira, na área, manifestam-se por bandeiras, como: o da preservação ambiental, a da sobrevivência dos índios e o combate ao narcotráfico.

No entanto, observa-se que alguns governantes do passado não estabeleceram Políticas de Governo e/ou de Estado que dessem a devida importância àquela vasta região. Poucas são as atividades socioeconômicas ou projetos que promovam o desenvolvimento e a consequente integração da Amazônia ao restante do País.

A Amazônia Ocidental é uma região com uma grande extensão territorial, faz fronteira com diversos países e possuí uma limitada rede de transportes. As Forças

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Armadas, em especial o Exército, não têm como estar presente em todos os pontos ao mesmo tempo. Nesse caso, a mobilidade é um fator mais do que estratégico, é vital.

Em 2008, o Governo aprovou e sancionou a Estratégia Nacional de Defesa (END). Nela se estabeleceu orientação estratégica para a Amazônia, em circunstância de paz e de guerra. Na paz, para monitorar as fronteiras e a soberania sobre a Amazônia. Na guerra, mobilizar rapidamente recursos físicos e humanos para impedir ameaças àquela região. Ainda, o governo propõe fortalecer a presença militar na Amazônia, desenvolver ações socioeconômicas na área e ampliar a cooperação com os países vizinhos.

Para fazer face às hipóteses de emprego na Amazônia Ocidental, há necessidade de, desde já, o Poder Nacional empreender ações estratégicas que visem a deixar o País em condições de realizar, de forma imediata, uma Mobilização Nacional (Mob Nac).

O preparo da Mobilização Nacional consiste na realização de ações estratégicas que viabilizem a sua execução, sendo desenvolvido desde a situação de normalidade, de modo contínuo, metódico e permanente. Porém, verifica-se que na região da Amazônia Ocidental esse preparo é deficiente devido aos óbices existentes pela peculiaridade da área, principalmente os que estão relacionados ao sistema de transportes: a dependência do regime das águas dos rios e as grandes distâncias a serem percorridas; a falta de modernos portos, ancoradouros e sistema de carregamento de cargas; a falta de uma malha rodoviária; a dificuldade de construção e manutenção das rodovias e estradas existentes, em função dos fatores fisiográficos; a falta de meios de transportes adequados das Organizações Militares, principalmente, para o transporte de combustível; as condições climáticas adversas que intervêm nos meios aéreos e nas pistas de pouso, impedindo o pouso e a decolagem de aeronaves; e a reduzida disponibilidade de aeronaves e horas de vôo da FAB.

Como na END prevê em suas diretrizes uma maior prioridade para a região Amazônica e o desenvolvimento da mobilidade para o aumento da capacidade de responder prontamente a qualquer ameaça ou agressão; e, ainda, por se encontrar na Amz Oc o sistema de transportes prejudicado pelos diversos fatores já citados; sendo as operações logísticas dificultadas, principalmente a função logística transporte, que é de fundamental importância para uma imediata concentração de meios e pessoal, e para a realização de eficientes Operações Militares de Defesa; pode-se afirmar que, como reflexo, será necessária uma maior Mob Nac para se complementar a Logística Nacional, no caso de necessidade de emprego na defesa da Amazônia.

Como consequência, ainda há necessidade de capacitar o Poder Nacional, para que este desenvolva as atividades de preparo da Mobilização Nacional, através da adoção de medidas, tais como: melhorar as condições de navegação das aquavias, principalmente através da sinalização e da drenagem de alguns

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A Realização do Apoio de Transp. às Org. Mil. de Front. na Amaz. Ocid. e seus Reflexos para a Mob. Nac.

rios; construção de portos e ancoradouros em locais estratégicos e melhoria das condições dos existentes; cadastramento dos meios de transporte disponíveis, tanto públicos quanto privados; realização de adestramento de atividades de Mobilização Nacional; construção de rodovias e melhoria das existentes; construção de pistas de pouso em locais estratégicos e melhoria das existentes; e a aquisição de meios de transporte para as Forças Armadas, com o objetivo de aumentar a sua mobilidade.

Enquanto não se executam as ações estratégicas necessárias para melhorar o sistema de transportes da Amazônia, o País só poderá contar, no momento, caso necessite realizar uma imediata e eficiente Mobilização Nacional na Amazônia Ocidental, do sistema de transportes atual que vem atendendo às Organizações Militares de Fronteira e à população local.

6 CONCLUSÃO

Do estudo feito na atual forma de apoio de transporte às Organizações Militares de Fronteira da Amazônia Ocidental, fica claro que o principal meio de transporte utilizado é o fluvial, e que durante a realização do mesmo são executadas operações militares que proporcionam a segurança e a defesa de toda a área percorrida. Consequentemente, ainda proporcionam o desenvolvimento e a integração da região ao restante do País, uma vez que o comboio militar muitas vezes é a única presença do Estado naquela região.

Foi observado que, em algumas situações, é importante e necessária a realização da complementação dos meios fluviais, principalmente, com o aéreo e o rodoviário, de forma a atenuar ou eliminar os óbices existentes e assegurar o contínuo e eficiente apoio de transporte às Organizações Militares de Fronteira.

Foram identificados como óbices para o apoio de transporte: a dependência do regime das águas dos rios e as grandes distâncias a serem percorridas; a falta de modernos portos, ancoradouros e sistema de carregamento de cargas; a falta de uma malha rodoviária; a dificuldade de construção e manutenção das rodovias e estradas existentes, em função dos fatores fisiográficos; a falta de meios de transportes adequados das Organizações Militares, principalmente, para o transporte de combustível; as condições climáticas adversas que influem nos meios aéreos e nas pistas de pouso, impedindo o pouso e a decolagem de aeronaves; e a reduzida disponibilidade de aeronaves e horas de vôo, da FAB.

Como reflexo, os mesmos óbices impõem a necessidade de uma maior Mob Nac para se complementar a Logística Nacional, no caso de emprego da defesa da Amz, incluindo, ainda, a adoção urgente de medidas estratégicas, tais como: melhoria das condições de navegação das aquavias, principalmente através da sinalização e da drenagem de alguns rios; construção de portos e ancoradouros em locais estratégicos e melhoria das condições dos existentes; cadastramento dos meios de transporte disponíveis, tanto públicos como privados; realização

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de adestramento de atividades de Mobilização Nacional; construção de rodovias e melhoria das existentes; construção de pistas de pouso em locais estratégicos e melhoria das existentes; e a aquisição de meios de transporte para as Forças Armadas, com o objetivo de aumentar a sua mobilidade.

Por fim, este trabalho alerta sobre as dificuldades encontradas para a realização da função logística transporte na Amazônia Ocidental, tendo como reflexo uma maior necessidade de Mobilização Nacional para se complementar a Logística Nacional naquela região. É importante ter em mente que não se pode separar defesa de desenvolvimento, e para que o Exército Brasileiro execute uma eficiente atuação na defesa da Amazônia, é necessário que aquela região tenha seu processo de desenvolvimento acelerado e se integre realmente ao restante do País. Só assim, pode-se contar com uma eficaz Logística e Mobilização Nacional para atender uma eventual necessidade de defesa da nossa Amazônia.

Referências

ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA (Brasil). Manual básico: assuntos específicos. Rio de

Janeiro, 2009.

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A Logística Nacional, a Defesa, a Ciência-Tecnologia e Inovação

A LOGÍSTICA NACIONAL, A DEFESA,A CIÊNCIA-TECNOLOGIA E INOVAÇÃO

Erenito Alves AzeredoMajor Bombeiro Militar do Estado de Minas Gerais, estagiário do Curso de Logística e Mobilização Nacional da Escola Superior de Guerra, em 2011.

Resumo

O propósito deste trabalho é discorrer de forma critica sobre a Logística Nacional e sua importância na Defesa da Nação, enquanto processo organizacional de previsão e provisão dos meios necessários para consecução dos objetivos nacionais. Mostrar quais as ações previstas na Estratégia Nacional de Defesa que buscam reforçar a Logística Nacional, através do emprego da expressão do Poder Nacional na área da Ciência Tecnologia e Inovação, bem como promover a segurança e o desenvolvimento nacional pelo incentivo à Indústria Nacional de Material de Defesa.

Palavras-chave: Logística Nacional; Defesa Nacional; Ciência-Tecnologia e Inovação; Estratégia Nacional de Defesa.

1 INTRODUÇÃO“A invencibilidade está na defesa; a possibilidade de vitória, no ataque.”

(Sun Tzu)

Desde a ocorrência dos primeiros homicídios na Terra, há cerca de 20 milhões de anos, os saltos de qualidade que levaram a humanidade a um patamar mais avançado na história da evolução, sempre estiveram atrelados, de alguma forma à ciência, tecnologia e inovação. A Pré-história, período conhecido como paleolítico, pedra antiga ou pedra lascada, refere-se ao período que vai de cerca de 2,5 milhões a. C. Nessa época, pode-se destacar que o homem começou a produzir os primeiros artefatos em pedra lascada, até cerca de 10.000 a. C., e era essencialmente nômade, caçador-coletor, tendo que se deslocar, constantemente, em busca de alimentos. Foi na Pré-história que desenvolveram os primeiros instrumentos de caça feitos de madeira, osso ou pedra, e quando também o homem dominou o uso do fogo.

Outra figura simbólica que representou a inovação na humanidade, e que não se pode deixar de citar, é a invenção da roda, considerada por muitos como o maior feito de todos os tempos. Acredita-se que seus inventores foram os povos que habitavam a antiga Mesopotâmia, atual Iraque, há cerca de 5.500 anos. Tal inovação permitiu o transporte de materiais em maior quantidade em menor tempo,

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possibilitando o aparecimento de grandes civilizações e construções. Também foi fundamental para a expansão territorial e no uso em guerras e defesas.

Os dois exemplos, acima citados, podem ser considerados como inovações, pois trouxeram o ineditismo, agregando valor à sociedade, mudando seu comportamento, além de contribuir de forma significativa para aumentar a riqueza dos povos.

Ao voltarem-se os olhares para as sociedades dos séculos XVIII e XIX, constata-se que os países que fizerem a opção por investir na ciência, tecnologia e inovação assumiram papel de destaque no mundo, impondo suas idéias e por vezes, determinando o papel de outros países periféricos.

O Reino Unido, formado pela Escócia, Inglaterra, Irlanda do Norte e País de Gales, foi pioneiro na Revolução Industrial por diversos fatores dentro os quais se destacam:

Pela aplicação de uma a) política econômica liberal, desde meados do século XVIII. Antes da liberalização econômica, as atividades industriais e comerciais estavam cartelizadas pelo rígido sistema de guildas34, razão pela qual a entrada de novos competidores e a inovação tecnológica eram muito limitadas. Com a liberalização da indústria e do comércio, ocorreu um enorme progresso tecnológico e um grande aumento da produtividade em um curto espaço de tempo. O processo de enriquecimento britânico adquiriu maior impulso após a b) Revolução Inglesa35, que forneceu ao seu capitalismo a estabilidade que faltava para expandir os investimentos e ampliar os lucros.A Grã-Bretanha firmou vários acordos comerciais vantajosos com outros c) países. Um desses acordos foi o Tratado de Methuen, celebrado com a decadente monarquia absolutista portuguesa, em 1703, por meio do qual conseguiu taxas preferenciais para os seus produtos no mercado português.A Grã-Bretanha possuía grandes reservas de d) ferro e de carvão, minerais em seu subsolo, principais matérias-primas utilizadas neste período. Dispunha de mão de obra em abundância desde a Lei dos Cercamentos

34 As guildas, corporações artesanais ou corporações de ofício, eram associações de artesãos de um mesmo ramo, isto é, pessoas que desenvolviam a mesma atividade profissional que procuravam garantir os interesses de classe. Existiram, na Europa, durante a Idade Média e mesmo após. Cada cidade tinha sua própria corporação de ofício. Essas corporações tinham como finalidade proteger seus integrantes.

35 A Guerra Civil Inglesa, que aconteceu durante a Revolução Inglesa, ocorreu entre os partidários do rei Carlos I, da Inglaterra e o Parlamento, liderado por Oliver Cromwell. Começada em 1642, terminou com a condenação à morte de Carlos I em 1649.

Antes da revolução, o poder do rei era absolutista, uma vez que contestá-lo era um sacrilégio. Depois da Revolução, o poder do rei se viu reduzido, quando o rei existe e reina, mas não governa, quem governa é o Primeiro-Ministro, através do Parlamento.

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de Terras, que provocou o êxodo rural. Os trabalhadores dirigiram-se para os centros urbanos em busca de trabalho nas manufaturas.A burguesia inglesa tinha capital suficiente para financiar as fábricas, e) adquirir matérias-primas e máquinas e contratar empregados. Para ilustrar a relativa abundância do capital que existia na Inglaterra, pode se constatar que a taxa de juros no final do século XVIII era de cerca de 5% ao ano; já na China, onde praticamente não existia progresso econômico, a taxa de juros era de cerca de 30% ao ano.

O Reino Unido tem quatorze territórios, todos remanescentes do Império Britânico que era composto por domínios, colônias, protetorados, mandatos e territórios governados ou administrados pelo Reino Unido.

O Império Britânico originou-se das colônias ultramarinas e entrepostos estabelecidos pela Inglaterra no final do século XVI e início do século XVII. No seu ápice, possuía quase um quarto da superfície terrestre mundial, constituindo-se no maior império da história. Em 1922, o Império Britânico dominava cerca de 458 milhões de pessoas, um quarto da população do mundo, na época, e abrangia mais de 33.700 mil km².

Como resultado do Império, a influência britânica pode ser vista na língua, cultura e sistemas judiciários de muitas de suas ex-colônias como o Canadá, Austrália, Índia e Estados Unidos.

Na expressão militar do Poder Nacional, a Marinha Real Britânica (em inglês:Royal Navy) é o ramo naval das Forças Armadas do Reino Unido. Fundada no século XVI, é o mais antigo dos serviços e por isso é conhecida como Serviço Sênior. Desde o final do século XVII até meados do século XX, era a marinha mais poderosa do mundo, desempenhando um papel fundamental no estabelecimento do Império Britânico como a potência mundial dominante. Os investimentos na Real Marinha Britânica foram de tal monta que permitiram a expansão territorial, bem como a garantia da defesa em caso de ameaças estrangeiras da época.

Todos estes feitos do Reino Unido somente foram possíveis devido à definição de Objetivos Nacionais e na busca em satisfazê-los, em decorrência da identificação de necessidades, interesses e aspirações, parametrizadas e respeitando, à época, a recente evolução histórico-cultural da Nação.

Com a definição de Objetivos Nacionais de crescimento econômico e na esteira da expansão territorial, o Reino Unido usou a estratégia política para financiar a Revolução Industrial, proporcionando, desta forma, a ampliação dos recursos produtivos, criação e aperfeiçoamento de instituições econômicas, melhoria na repartição da renda, elevação dos padrões de consumo e ampliação das oportunidades econômicas.

Noutro viés, investiram em Ciência, Tecnologia e Inovação, surgindo nesta época as principais invenções que iriam mudar o modo produtivo do mundo: as máquinas a vapor, pelo que se pode citar: Thomas Newcomen (Dartmouth, 24

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de fevereiro de 1663 - Bunhill Fields, 1729) foi um ferreiro e mecânico inglês. É considerado o pai da máquina a vapor. Em 1712, Newcomen instalou uma máquina para drenar a água acumulada nas minas de carvão, em Staffordshire, na Grã-Bretanha, a primeira movida a vapor, patenteada em 1712. Posteriormente, em 1765, James Watt, mecânico escocês, aperfeiçoou o modelo de Newcomen. Este seu invento deflagrou a Revolução Industrial e serviu de base à mecanização de toda a indústria. Em 1814, o inglês George Stephenson revolucionou os transportes com a invenção da locomotiva a vapor.

O exemplo do Reino Unido, no aspecto da logística nacional, pode ser interpretado como a conquista e manutenção dos Objetivos Nacionais, mediante a realização de Ações Estratégicas, cujo preparo constituiu uma exigência permanente e continuada.

A intensidade das Ações Estratégicas variaria em cada Nação, de acordo com a Natureza e o grau dos óbices a serem vencidos, ou de acordo com a expressão do Poder Nacional de cada país ser mais ou menos exigida, conforme a necessidade da área a ser por ele reforçada, em determinado momento. Desta forma, é importante que todas as expressões do poder, sejam elas política, econômica, psicossocial, militar ou cientifico-tecnológica & inovação estejam com as forças equilibradas, para juntas comporem a logística nacional que será acionada a serviço do país, quando de uma mobilização nacional, ou mesmo em suas atividades correntes.

1.1 A LOGÍSTICA NACIONAL

Na Constituição Federal de 1988, o Brasil, através do legislador originário, delineou os Objetivos Nacionais, que são aqueles que a Nação busca satisfazer, em decorrência da identificação de necessidades, interesses e aspirações, em determinada fase de sua evolução histórico-cultural (Manual Básico V. I –ESG, p. 22).

Ainda de acordo com a citada publicação da Escola Superior de Guerra, os Objetivos Nacionais podem ser classificados, segundo sua natureza, como Objetivos Fundamentais que são os Objetivos Nacionais que, voltados para o atingimento dos mais elevados interesses da Nação e preservação de sua identidade, subsistem por longo tempo. A Nação Brasileira tem como Objetivos Fundamentais: Democracia, Integração Nacional, Integridade do Patrimônio Nacional, Paz Social, Progresso e Soberania.

Para que a Nação atinja os Objetivos Fundamentais usa de Planos Estratégicos que vão estabelecer e definir ações para perseguir, conquistar e manter os objetivos propostos. Ao definir as ações estratégicas surge um ponto de inflexão: como conseguir os meios necessários para cumpri-las.

Neste momento, entra em ação a Logística Nacional de Desenvolvimento e a Logística Nacional de Defesa, sendo a Logística de Desenvolvimento o conjunto

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de atividades de previsão e de provisão dos meios necessários à realização das ações decorrentes da Estratégia de Desenvolvimento, e a Logística de Defesa o conjunto de atividades de previsão e de provisão dos meios necessários à realização das ações decorrentes da Estratégia de Defesa (Manual básico .ESG, v. II, p. 104).

O filósofo e estrategista militar chinês Sun Tzu, vislumbrando a importância do apoio logístico no comando da guerra, estabeleceu que os suprimentos logísticos de intendência e armazéns deveriam, permanentemente, estarem em condições de emprego, protegidos em abrigos fora de intempéries e de acidentes imprevistos, conforme relato que segue:

Suponho que comeces a tua campanha com um exército de cem mil homens, que dispõe de dois mil carros, mil destinados à marcha e os outros reservados para o transporte de suprimentos. Ademais, transporta com cuidado tudo o que pode servir para o reparo de armas e carros. Suponho que tens víveres e munições suficientes, que a tua volta haja, em toda parte, provisões para a manutenção do exército. Suponho ainda que os artesãos e outros homens que não pertencem ao corpo dos soldados já o precederam ou marcham em teu séquito. Suponho também que os diferentes suprimentos, tanto para uso bélico quanto pessoal, estejam permanentemente ao abrigo da intempérie e de acidentes imprevistos. (In: CASSAL, tradução, 2011, p. 27.)

Com base nos conceitos expostos, pode-se entender a Logística Nacional de forma mais ampla, como sendo o conjunto de atividades relativas à previsão e à provisão dos recursos necessários à realização das ações planejadas para a consecução da Estratégia Nacional.

Tendo a Logística Nacional como principais características as atividades permanentes, ou seja, existindo tanto em situações de normalidade, em apoio às ações correntes, como em situações de ataque estrangeiro, e, ainda, em apoio às ações de emergência, requer um planejamento dinâmico e flexível para se adaptar, com presteza, às mutações decorrentes da variação da necessidade de meios para a execução das Ações Estratégicas (Manual Básico V. II - ESG, pg. 103).

Outro elemento importante a ser considerado para o fortalecimento da logística nacional é a promoção do aprimoramento da Indústria de Defesa, principalmente no desenvolvimento de produtos duais.

Marcio Ramos Teixeira, em monografia apresentada ao CAEPE-ESG/2007, esclarece que tecnologias de emprego dual são todas aquelas que podem ser empregadas seja em material de defesa, seja em materiais de uso civil em diversas áreas, tais como: na da saúde, na da educação, na industrial, na aeronáutica, na química, na ambiental e em qualquer outra área que se possa imaginar. Na verdade, o produto dual pode tanto ser oriundo da indústria de defesa e migrar para a indústria civil e vice-versa.

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2 A ESTRATÉGIA NACIONAL DE DEFESA

A Estratégia Nacional de Defesa foi aprovada pelo Decreto n.º 6.703, de 18 de dezembro de 2008, que estabelece ações estratégicas de médio e longo prazo e objetiva a modernização da estrutura nacional de defesa, atuando em três eixos estruturantes: Reorganização das Forças Armadas; Reestruturação da indústria brasileira de material de defesa; e Política de composição dos efetivos das Forças Armadas.

Ligada à Ciência, Tecnologia e Inovação a Estratégia Nacional de Defesa aponta para a reestruturação da indústria brasileira de material de defesa, tendo como propósito assegurar que os atendimentos das necessidades de equipamentos das Forças Armadas apoiem-se em tecnologias sob domínio nacional.

É plenamente desejável que a promoção da defesa parta de princípios que possam sustentar não somente a segurança interna e externa da Nação, mas também garanta o desenvolvimento do país como um todo. Neste contexto, a Estratégia Nacional de Defesa elegeu três setores de importância: o espacial, o cibernético e o nuclear.

No setor espacial, as prioridades estabelecidas foram às seguintes:a) Projetar e fabricar veículos lançadores de satélites e desenvolver tecnologias de guiamento remoto, sobretudo sistemas inerciais e tecnologias de propulsão líquida.b) Projetar e fabricar satélites, sobretudo os geoestacionários, para telecomunicações e os destinados ao sensoriamento remoto de alta resolução, multiespectral e desenvolver tecnologias de controle de atitude dos satélites.c) Desenvolver tecnologias de comunicações, comando e controle a partir de satélites, com as forças terrestres, aéreas e marítimas, inclusive submarinas, para que elas se capacitem a operar em rede e a se orientar por informações deles recebidas.d) Desenvolver tecnologia de determinação de coordenadas geográficas a partir de satélites.Já no setor cibernético, a destinação será o mais amplo espectro de usos

industriais, educativos e militares. Incluirão como partes prioritárias, as tecnologias de comunicação entre todos os contingentes das Forças Armadas, de modo a assegurar sua capacidade para atuar em rede. Contemplarão o poder de comunicação entre os contingentes das Forças e os veículos espaciais. No setor cibernético, será constituída organização encarregada de desenvolver a capacitação cibernética nos campos industrial e militar.

Desta forma, os setores espacial e cibernético permitirão, em conjunto, que a capacidade de visualizar o próprio país não dependa de tecnologia estrangeira e que as três Forças, mutuamente, possam atuar em rede, instruídas por

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monitoramento que se faça também a partir do espaço, sendo necessário, entre outros, o desenvolvimento e lançamento de satélites próprios. Como exemplo, cita-se o primeiro satélite projetado, construído e operado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o SCD-1 que completou 17 anos em órbita, no dia 09 de fevereiro de 2010. Lançado pelo foguete norte-americano Pégasus, em 1993, a expectativa era de apenas um ano de vida útil. Contudo, o SCD-1 (Satélite de Coleta de Dados) se mantém operacional e retransmitindo informações para a previsão do tempo e monitoramento das bacias hidrográficas, entre outras aplicações.

O setor nuclear tem valor estratégico que transcende, por sua própria natureza, os aspectos de desenvolvimento e defesa. O Brasil é signatário do “Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares”, contudo, pugna através de sua soberania a necessidade de utilização estritamente pacífica da energia nuclear, de modo a garantir o equilíbrio e a versatilidade da sua matriz energética.

Para o Brasil alcançar à independência tecnológica e garantir a sustentabilidade às próximas gerações, deve estrategicamente empenhar-se nos seguintes projetos:

a) Completar, no que diz respeito ao programa do submarino de propulsão nuclear, a nacionalização completa e o desenvolvimento em escala industrial do ciclo do combustível, inclusive a gaseificação e o enriquecimento.b) Desenvolver a tecnologia necessária para projetar e fabricar, para uso exclusivo no Brasil, de reatores.c) Acelerar o mapeamento, prospecção e o aproveitamento das jazidas de urânio.d) Desenvolver o potencial de projetar e construir termelétricas nucleares, com tecnologia e capacitações que acabem sob domínio nacional, ainda que desenvolvida por meio de parcerias com Estados e empresas estrangeiras. e) Empregar a energia nuclear criteriosamente, e sujeitá-la aos mais rigorosos controles de segurança e de proteção do meio-ambiente, como forma de estabilizar a matriz energética nacional, ajustando-a às variações no suprimento de energias renováveis, sobretudo a energia de origem hidrelétrica.f) Aumentar a capacidade de usar a energia nuclear em amplo espectro de atividades.É importante ressaltar que para o desenvolvimento dos setores da Ciência,

Tecnologia e Inovação a prioridade do Estado deve ser a formação de recursos humanos nas áreas de relevância. Para tanto, deve financiar programas de pesquisa e de formação universitária, bem como centros nacionais de pesquisas, aumentando as ofertas de bolsas de doutorado e pós-doutorado nas instituições internacionais pertinentes.

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III - A CIÊNCIA, TECNOLOGIA & INOVAÇÃO

Na história da humanidade, a Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) sempre ocuparam lugar de relevância nas sociedades, pois possibilitam para quem as dominam, conquistar e manter posição de destaque entre os demais. Atualmente, na economia globalizada a CT&I é também fator estratégico para o desenvolvimento e para a Defesa Nacional. De modo geral, a Expressão Cientifica, Tecnológica e Inovação engloba todas as atividades relacionadas à geração, disseminação e aplicação dos conhecimentos científicos e tecnológicos de uma sociedade.

A expressão CT&I apresenta-se de forma destacada na atualidade em relação a outras expressões do poder nacional, sobretudo porque se revela capaz de influir diretamente nas demais áreas de interesse da Defesa Nacional.

Dentro deste arcabouço teórico, podemos entender a “expressão cientifica e tecnológica”, como o motor primário do poder nacional. Sem conhecimento, puro e aplicado, sem inovação e/ou produto, processo ou serviço não terá uma “expressão econômica” forte e, na falta desta, teremos uma “expressão psicossocial” abalada, uma “expressão política” sem capacidade de definir o que deve ser feito e, finalmente, uma “expressão militar” sem ter o que segurar e defender. (BRANDãO, 2007, p. 796)

Pode-se confirmar a afirmativa acima ao se analisar os principais países de maior grau tecnológico em defesa do mundo, dentre os quais são citados: Estados Unidos, Inglaterra, França, Alemanha, Canadá, Japão, Israel e Coréia do Sul. Nota-se que estes países investiram, após a 2º Guerra Mundial, em CT&I como forma de desenvolver sua indústria interna, conjugando este esforço para aprimorar a Defesa Nacional, fator que contribuiu para mantê-los em papel de destaque e estratégico, fazendo frente a uma economia globalizada.

O Governo Federal objetivando desenvolver a Expressão CT&I do Poder Nacional editou o Decreto n.º 6.703/2008, que estabeleceu a Estratégia Nacional de Defesa (END). No campo Tecnológico, prevê a reorganização da indústria nacional de material de defesa, priorizando o desenvolvimento tecnológico.

Dentre as várias diretrizes traçadas pela Estratégia Nacional de Defesa, uma estabeleceu a prioridade ao desenvolvimento de capacitações tecnológicas independentes, com vistas a condicionar as parcerias com países e empresas estrangeiras para o desenvolvimento progressivo e de produção no País. Com vistas a atingir essa meta cita-se o programa da EMBRAER para produção do KC-390, aeronave de transporte.

Recente publicação na revista Jane`s Defence Weekly , de 03 de agosto de 2011, revela que a EMBRAER continua buscando contratar os subsistemas em relação ao KC-390, com ênfase em forte relação com a indústria americana, com uma clara estratégia de seleção de parcerias comerciais de base tecnológica.

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A Logística Nacional, a Defesa, a Ciência-Tecnologia e Inovação

Subsistemas adjudicados ao programa KC-390 - aeronave de transporte

Sistemas Empresa Tecnologia Data

Controle primário de voo

GoodrichJulho 2011

Controle eletrônico de voo

BAE SystemsJulho 2011

Componentes estruturais

Fabrica Argentina de aviones

Abril 2011

Pro FusionTM avionics package Rockwell Collins

Maio 2011

Ambiente e controle de pressão da cabine Liebherr

Junho 2011

Movimentação de carga e entrega aérea DRS

Março 2011

Autothrottle systemEsterline

Junho 2011

Trem de pouso ELEB/ Embraer Abril 2011

Motores aeronáuticos

Pratt &Whitney, Rolls Royce, Japanese

Aero Engine Corp and MTU Aero

Engines

Julho 2011

Rodas, freios, sistema de extensão e retração do trem de pouso, sistema de pouso auxiliar.

Messier-Bugatti-Dowty

Junho 2011

Fonte: Jane´s Defence Weekly, 03 ago. 2011.*As bandeiras nacionais mostram a localização do contratante ou o local onde os trabalhos

serão desenvolvidos.

Pela análise da planilha acima apresentada, observa-se que atualmente, no campo aeroespacial, a ciência e tecnologia apresentam-se no mundo com uma

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acentuada relação de interdependência tecnológica entre as Nações, aliada às parcerias para o desenvolvimento de programas multinacionais. Tais parcerias visam à inovação com base na tecnologia já conhecida e desenvolvida por determinados países, reduzindo o tempo e, por conseqüência, os custos de colocação de um produto inovador no mercado por um país isoladamente.

Outra diretriz significativa prevista na Estratégia Nacional de Defesa trata de subordinar as considerações comerciais aos imperativos estratégicos, importando em organizar o regime legal, regulatório e tributário da indústria nacional de material de defesa. Neste sentido, cita-se a Medida Provisória (MP) n.º 544, assinada pela Presidenta Dilma Rousseff, na data de 29/09/2011, instituindo regras especiais para compra e contratação de produtos e sistemas de defesa para o país. Ainda cria um regime especial de tributação (denominado RETID), desonerando empresas que produzem equipamentos de defesa de encargos fiscais. Além de diminuir o custo de produção de companhias legalmente classificadas como estratégicas, a MP estabelece incentivos ao desenvolvimento de tecnologias indispensáveis ao país. A Medida preenche uma lacuna existente na legislação, passando a ser o marco legal para as obtenções de produtos de defesa e, consequentemente, para a reorganização da base industrial de defesa brasileira.

O Governo federal, através de sites oficiais, esclarece que o Regime Especial Tributário para a Indústria de Defesa (RETID) terá como beneficiárias as empresas que obtiverem o registro do Ministério da Defesa. Poderão obter os benefícios as empresas estratégicas de defesa e também as que participem da cadeia produtiva dos chamados produtos estratégicos de defesa. A isenção contempla o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), a Contribuição para o Programa de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/Pasep) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).

Atualmente, segundo a Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados (DFPC), órgão subordinado ao Comando do Exército Brasileiro, 186 empresas estão capacitadas para se beneficiar do novo regime. Incluem-se nesse rol, tanto companhias de menor porte quanto grandes fornecedoras das Forças Armadas, a exemplo da AVIBRAS, EMBRAER, HELIBRAS, INBRA e Odebrecht Defesa.

No campo da Defesa Nacional, por vezes, países menos desenvolvidos tecnologicamente fazem a opção em adquirir material de defesa estrangeiro, com transferência de tecnologia. Neste aspecto, assevera-se que a suposta transferência de tecnologia, possa não ocorrer de modo pleno, devido às restrições e às limitações impostas pelos países detentores da tecnologia ou pela dificuldade do próprio país em recebê-la. Esse fato agrava-se, pois os países que vendem nem sempre se revelam de forma clara quanto às suas reais intenções.

Corrobora esse entendimento o professor Bautista Vidal que leva a que se reflita sobre os países menos desenvolvidos que devem buscar romper com o ciclo do colonialismo, que reserva a esses países função de fornecedores de matérias-

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A Logística Nacional, a Defesa, a Ciência-Tecnologia e Inovação

primas às nações hegemônicas, ao mesmo tempo em que cria uma dependência de produtos industrializados e tecnológicos.

No atual mundo globalizado, essa dependência apresenta-se com outra face mais requintada, porém, não menos pungente e desumana, como se vê:

A chamada “tecnologia externa” é o principal meio de condicionamento e subjugação, mediante o qual se molda e se controla a estrutura produtiva nacional para subordiná-la a interesses externos. Isso acarreta graves consequências para o desenvolvimento, especialmente em setores estratégicos, com efeitos diretos sobre a educação em geral e as universidades em especial. Essa “tecnologia” engendra novo tipo de colonialismo, que atinge profundamente a estrutura de produção, de modo subjugador, como jamais imaginou o mercantilismo colonial do século XIX, que operava por ação externa no contexto dos mercados e das alfândegas [ ].O que equivocadamente designamos como “transferência de tecnologia” não passa de aluguel a ser pago pelo uso de determinada forma de produção, que privilegia as políticas e os fatores produtivos ligados a interesse alienígenas, em detrimento dos fatores e políticas nacionais.[...].A ideologia colonialista fundamenta-se, desde o século XVI, em países dirigentes e países subjugados. É o imperativo da divisão internacional do trabalho e do saber: à colônia cabe fornecer matérias-primas, de modo cada vez mais oneroso para si, ao passo que o comando do processo fica com a metrópole. (BAUTISTA VIDAL, 2002, p. 11,12 e 13)

Os meios produtivos da Nação devem ser usados para conquistar e manter

os Objetivos Nacionais, tendo como foco garantir e promover a segurança e o desenvolvimento do país. Interesses estrangeiros não devem imperar de modo a influir nos setores estratégicos produtivos a ponto de subjugar e promover um novo tipo de colonialismo.

Um país que busca o desenvolvimento tecnológico deve priorizar os setores da sociedade responsáveis pela ciência, tecnologia e inovação. Desta forma, as universidades e os centros tecnológicos devem constar dos planos estratégicos para esse fim.

No ano de 2008, o Governo brasileiro iniciou o processo de negociação para aquisição de aviões ‘caça’. Entre as aeronaves em questão, surgiram como concorrentes ao fornecimento para o Brasil, além da Dassault, com o caça Rafale; o F-18 Super Hornet, da Boeing (EUA); e o Grinpem, do grupo sueco Saab.

O Governo brasileiro chegou a comunicar que optou pelo Rafale, levando em conta a amplitude das transferências de tecnologia propostas e das garantias oferecidas, bem como o compromisso do governo francês em adquirir unidades do KC-390, avião de carga da Embraer. Contudo, até a presente data não foi oficializada a compra por parte do Brasil. Cita-se esse caso como emblemático, no qual a

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“transferência de tecnologia” surgiu como fator decisivo à aquisição, cabendo ao governo e ao Comando da Aeronáutica resguardarem-se com as garantias de que toda a tecnologia será transferida, sem restrições, pois, dentre outras, a nação quer ter certeza que os seus aviões não serão desligados ou monitorados a distância sem o conhecimento da defesa do país.

5 CONCLUSÃO

A Ciência, Tecnologia e Inovação é a expressão do Poder Nacional que se manifesta através dos setores ligados à ciência e tecnologia do país. É a atividade que pelos seus organismos próprios, como universidades, centros de tecnologia e pesquisa, bem como, indústrias tecnológicas, são capazes de promover a geração, disseminação e inovação em vários campos de interesse da logística nacional e em prol da defesa da nação.

A CT&I deve ser utilizada pela Nação como mecanismo principal para impulsionar o Poder Nacional, à medida que interferem nas demais expressões do poder, alavancando as áreas: econômica, psicossocial, política e militar.

A Estratégia Nacional de Defesa (END) tem-se revelado como importante instrumento de planejamento, capaz de levar o Brasil a um novo patamar na segurança e desenvolvimento nacionais. Deve ser notado como Política de Estado e suas ações seguidas e mantidas conforme metas colimadas.

As indústrias nacionais de material de defesa devem receber tratamento adequado, com específica normatização fiscal e tributária, considerando a importância estratégica que assumem ao contribuir para desenvolver uma tecnologia própria, trazendo maior independência para fazer frente aos interesses estrangeiros.

A Logística Nacional é, por conseguinte, reforçada com os avanços na ciência, tecnologia e inovação, pois a provisão dos meios necessários à defesa torna-se mais acessíveis e eficientes. É bem verdade que a garantia da paz encontra-se no poder de dissuasão infligido às demais nações, que a obtenção desse poder passa por uma logística nacional de defesa bem-estruturada e permanentemente apta ao pronto emprego.

O Brasil assume, na atualidade, uma condição natural de liderança entre os países que formam a América Latina, e se pretende consolidar, a cada dia, essa conquista, deve investir em Ciência, Tecnologia e Inovação, uma vez que tal investimento se revela de importância fundamental como ação estratégica para conquistar e manter posição de destaque entre os demais.

Pelo exposto, pode-se asseverar que a invencibilidade de um país está na garantia da soberania nacional, através do processo contínuo do exercício da defesa nacional.

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A Logística Nacional, a Defesa, a Ciência-Tecnologia e Inovação

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Nauber Nunes do Nascimento

LOGÍSTICA, MOBILIZAÇÃO E REGULAÇÃO DE TRANSPORTES: ESTUDO DE CONCEITOS E

PERSPECTIVAS PARA OS JOGOS OLÍMPICOS/COPA DO MUNDO RIO 2014/2016

Nauber Nunes do NascimentoEspecialista em Transportes Terrestres da Agência Nacional de Transportes Terrestres - ANTT, estagiário do Curso de Logística e Mobilização Nacional da Escola Superior de Guerra, em 2011.

Resumo

A gestão civil e militar da logística constitui um conhecimento de imprescindível importância para a adequada implementação da mobilização, nos moldes definidos pelo ordenamento jurídico brasileiro vigente. A logística é parte integrante da mobilização e a suporta com a abrangência dada pela medida do desenvolvimento do país. O desenvolvimento das nações modernas passa necessariamente pela atuação do setor privado, posto que os governos comprometidos com a eficiência utilizam a regulação como instrumento de garantia do cumprimento dos contratos e indutor do engajamento dessas organizações em ações de mobilização. É o caso do setor de Transportes que, com a crescente inclusão do capital privado, demanda cada vez mais a adoção de instrumentos de regulação. Todos estes elementos estão presentes quando da organização de um megaevento, como está previsto ocorrer nos próximos anos no Brasil. A capacidade de mobilizar-se nessas ocasiões, pode servir como indicador da capacidade do país, na ampliação do Poder Nacional, frente a uma real situação de conflito armado.

Palavras-chave: Logística; Mobilização; Regulação; Megaeventos.

1 INTRODUÇÃO

Qualquer que seja a atividade, necessita de logística para atingir seu objetivo, supondo que seja realizada por um conjunto de pessoas que se propõe a algum objetivo possível e racional. Se esta atividade acontece no âmbito de uma organização civil, então demandará o que se chama de ‘logística empresarial’. Logística empresarial, tal como se conhece hoje, é um conceito oriundo da logística militar. Tanto o conceito de logística empresarial como o conceito de logística militar tem sofrido, com o tempo, correções e ajustes na sua concepção, sobretudo, quando de sua aplicação em realidades específicas, inclusive na realidade brasileira. O modelo e explicações correntes de ‘logística’, em grande parte retirados da literatura técnica dos Estados

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Unidos, muitas vezes não são aderentes à realidade em que vive o país. No Brasil, a logística pode até ser considerada o conjunto de todas as atividades da área “meio” das empresas. Na outra ponta, ainda há quem confunda a logística com transporte.

Estão todos certos? Estão todos errados? Não se sabe. No entanto, como em qualquer ciência social, deve-se estar atentos aos conceitos utilizados, para que se possa construir uma ideia coerente da realidade. Em se tratando de logística, obviamente, os gestores operacionais, tanto civis como militares, são obrigados a enxergar os problemas logísticos sob ângulos distintos, mas certamente concordando quanto ao seu objetivo principal: é fundamental tornar disponível os produtos e serviços no local onde são necessários, no momento em que são desejados. Esta divergência de abordagem dos gestores militares e civis da logística, com convergência de propósitos, ocorre também em relação a outros conceitos, como mobilização e regulação, por exemplo.

A mobilização, em princípio e por princípio, requer urgência, posto que a mobilização nacional só ocorra em ocasiões de extrema necessidade. A mobilização requer, também, a integração dos diversos setores da sociedade em prol do aumento da Força Nacional, complementando a capacidade já instalada. Já a regulação é uma novidade para a maioria das empresas brasileiras. Há certa dificuldade para a academia e para o setor produtivo compreender o que é regulação, posto que sua implementação ocorresse apenas na última década do século passado. E o que logística mobilização e regulação têm em comum? Este artigo busca refletir sobre esses conceitos e propor uma integração entre eles.

Assim, primeiramente serão analisadas as diferentes abordagens do conceito de ‘logística’, distinguindo-se entre ‘logística empresarial’ e ‘logística militar’. Em seguida, será abordado o termo ’mobilização’, também com sua dupla vertente, civil e militar, tratando-se de deduzir as várias implicações que a mobilização sugere aos profissionais de Defesa e à sociedade civil. Como não é possível tratar de mobilização civil sem abordar a regulação de setores privatizados importantes para o Poder Nacional, este assunto será analisado sob a ótica de seu agente, ou seja, uma agência reguladora. A ideia é discutir o papel que corresponde à Regulação, em especial à ligada aos Transportes Terrestres, no contexto da Logística e Mobilização Nacional. Por fim, o assunto será contextualizado, lançando foco na realização de um megaevento como um estudo de caso que, por maior exposição ao risco e pela existência de ameaças, há maior possibilidade teórica de mobilização.

2 DESENVOLVIMENTO 2.1 Definição de Logística

Considerando que o mais importante para se atingir um objetivo é ter bem claro o fim e dispor dos meios, então logística está perto de ser quase tudo. Assim

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que se nasce, há a percepção evidente da necessidade da logística para suprir nossas primeiras necessidades: alimento e abrigo. Ambos eram fornecidos sem problemas. Deste dia em diante, funções logísticas como transporte (nosso até a fonte de calor ou vice versa), estoque (reserva de leite materno) e informações relativas às necessidades (nosso choro), farão parte de nossas vidas, mesmo que não seja perceptível. Neste caso, sua aplicação é tão íntima à natureza humana que é quase instintiva.

Para fins de estudo, o importante é saber que a logística reúne todos os meios para atingir o fim desejado. A logística, então, assume várias formas de ser compreendida e aplicada, posto que não configure um procedimento, mas é mais bem-entendida como um processo ou um ambiente de execução das atividades de acordo com uma sequência de instruções - uma concepção taylorista36, prescritiva e normativa. Logística, então, pode ser confundida com a própria administração do negócio, posto que lance mão das principais ferramentas administrativas (planejamento, controle, coordenação, comando, organização) para que seja possível viabilizar a ação. Faz melhor logística quem muito pratica e aprende com seus erros, como um processo de melhoria contínua.

Obviamente, a primeira etapa da gestão logística, como todo primeiro passo de qualquer atividade que deseja ser bem-sucedida, é executar as ações de planejamento. O planejamento requer um esquema, um programa de previsão, um projeto, um arranjo sistemático de elementos em busca de um benefício. Quanto maior a cultura de um país ou de uma organização que favoreça o planejamento, mais eficiente será sua logística. Esta cultura deve favorecer uma contextualização realista dos problemas por meio de um coerente diagnóstico, uma clara política (definição do que fazer), uma exequível estratégia (como fazer) que favoreçam uma eficiente gestão. O segundo passo é a implementação, ou seja, a capacidade de executar os planos elaborados e verificar se sua execução foi realizada de acordo com o previsto. Neste sentido, o sucesso de uma atividade-fim não é garantia da eficácia da logística, mas uma logística ineficaz, com certeza, contribuirá para que a atividade pretendida não atinja seu objetivo.

Logística eficaz é, grosso modo, ter os recursos necessários no local certo e na hora certa. A eficácia deve ser constante, os insumos devem estar sempre disponíveis quando requeridos, e não uma vez ou outra, e sempre dentro das expectativas de quem os requereu. Logística supõe também um sistema de informações que possa dar essa certeza.

36 Frederick Winslow Taylor (1856 —1915) é considerado o “Pai da Administração Científica” por propor a utilização de métodos científicos cartesianos na administração de empresas. Seu foco era a eficiência e eficácia operacional. Trouxe contribuições em relação ao desenvolvimento da Administração Científica, que consiste em propor uma forma de alcançar resultados dividindo tarefas mais complexas em operações menores e progressivas. Para Taylor, sempre há uma melhor forma de executar determinada atividade.

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2.2 DIFERENCIAÇãO ENTRE LOGÍSTICA MILITAR E LOGÍSTICA EMPRESARIAL

É possível unificar, conceitualmente, para fins de compreensão, a concepção militar de logística e a abordagem empresarial da logística. No primeiro momento, parecem disciplinas distintas, pois enquanto a primeira é de uso eventual e de grande intensidade (batalhas e guerras devem ser ganhas o mais rapidamente possível), a logística empresarial aproxima-se dos conceitos de gestão contínua abordados anteriormente. Segundo essa intensidade, o ambiente no qual se executa as ações de logística determina a diferença de concepções. Na guerra, a falha significa perder a vida ou o território. Na empresa, significa perder mercado ou o emprego.

A logística militar reconhece a urgência das operações e não admite ausência. Se não há estradas ou pontes que viabilizem o transporte até o campo de batalha, que se construa; se não há soldados preparados, que se convoque e se treine; se o equipamento falhar, que se conserte; se houver feridos, que se cure e assim por diante. A logística empresarial, por outro lado, irá focar sua atenção no custo, viabilizando ou não suas operações em função da possibilidade de manter um nível de serviço dentro da exigência do cliente e economicamente lucrativo. É importante salientar que as concepções militar e empresarial de logística não são, de forma alguma, excludentes. Pelo contrário, a primeira inclui a segunda e a segunda, por sua vez, dá sentido econômico à primeira.

Tanto a logística militar quanto a logística empresarial devem ser estudadas por meio das funções. Funções são áreas de preocupação que todo gestor logístico deve ter no momento de realizar os planos de operação de suporte das operações. O gestor da logística militar tem mais aspectos a considerar no seu planejamento e, por esse motivo, a logística militar é mais abrangente que a logística empresarial. Considera-se no Brasil37 as seguintes funções da logística militar: engenharia, transporte, manutenção, saúde, salvamento, suprimento e pessoal. As funções (áreas de cobertura) da logística empresarial são apenas quatro: nível de serviço, transporte, estoque e informações do serviço. A logística militar é tudo, menos o combate; a logística empresarial é focada no suprimento físico de materiais ao menor custo possível. Doravante, neste texto, a logística será tratada como a concepção militar, deixando de lado a abordagem empresarial da logística. A logística militar, que é o conjunto de ações militares voltadas para a defesa, consiste, portanto, em todas as ações militares atuais. A explicação disso é que, considerando que em tempos de paz não há combate armado, todas as atividades militares, atualmente, podem ser consideradas atividades logísticas, segundo a concepção militar de logística.

37 Cada país tem uma concepção de logística militar diferente. Na prática, querem dizer a mesma coisa. Por exemplo, para a doutrina militar dos Estados Unidos (FM 100-5), as funções são: Pessoal, Armamento, Suprimento de combustível, Conserto de materiais, Movimentação e Manutenção do poder operativo do pessoal e seus sistemas de combate. (Para mais informações, vide:) http://www.almc.army.mil/alog/issues/JanFeb00/MS481.htm)

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A história dos conflitos armados, contudo, informa que quando ocorrem, não somente os militares são envolvidos, mas toda a nação. E se o conflito assim exigir, este envolvimento organizado da sociedade é chamado de mobilização.

2.3 DEFINIÇãO DE MOBILIZAÇãO

A mobilização é um instrumento de gestão, empregado para a realização de uma atividade específica que, por ser especial, requer capacidades ampliadas para fazer frente às necessidades de momento. A mobilização pode ser feita com os recursos existentes, direcionando toda a força existente para um determinado fim, unificando todos os esforços em um único foco. A outra forma de considerar uma mobilização é a gestão do aumento da capacidade operacional, por meio do incremento dos recursos disponíveis para a realização de uma tarefa, geralmente oferecida por aqueles que, embora não pertençam à organização, não têm interesse em ver os esforços da organização falharem.

De qualquer forma que se considere a mobilização, seu emprego deve ser utilizado cuidadosamente porque se supõe que outras atividades menos importantes deixem de ser realizadas em favor da concentração de energias na realização da atividade principal. Em termos militares, significa que a capacidade de fazer frente a um inimigo requer o recebimento de recursos da sociedade civil. A soma da capacidade logística instalada com a possível capacidade de mobilização informa o poder militar daquela nação. Para qualquer país, a necessidade do uso da mobilização está na razão direta do tamanho da ameaça e na razão inversa do tamanho da capacidade logística existente. Por este princípio é até mesmo possível identificar as nações que possuem maior capacidade logística (Estados Unidos, como maior expoente). Também se podem identificar as nações que possuem maior capacidade de mobilização (Israel, como maior expoente).

2.3.1 Implicações que a mobilização sugere aos profissionais de defesa e à sociedade civil

Assim, considerando o que foi exposto no item anterior, caso ocorra uma ameaça externa que exija, para fazer frente a ela, uma capacidade maior que a logística existente, a sociedade deverá ser mobilizada. Se necessário for, a população brasileira, a indústria e demais setores estarão prontos para responder, dentro de suas capacidades e de um arcabouço jurídico já bem-definido38. Mas a mobilização não está circunscrita aos militares, por contar com a sociedade civil no esforço de guerra. A sociedade também pode mobilizar as forças militares para fins civis.

38 Ver Dec. Lei 5484/2005; Dec. Lei 6703/2008; Dec. Lei 7294/2010; Dec. Lei 6592/2008 e Lei 11631/2008 que tratam do tema Mobilização, dando ao Estado Brasileiro subsídios jurídicos para realizar a Mobilização conforme estabelece a Constituição Federal.

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Este último caso é aplicável porque atualmente existem outras ameaças que estão fora do ambiente normal da contribuição militar à nação brasileira39. Citam-se, como exemplos, furacões, tornados, terremotos, enchentes, trombas d’água, manifestação de endemias ou pandemias etc. Existem, até mesmo, circunstâncias que não são propriamente uma ameaça, mas que podem demandar um esforço concentrado da sociedade para fazer frente aos objetivos, como Jogos Olímpicos, Reunião de Chefes de Estado, Copa do Mundo, Encontro Mundial da Juventude etc. Para todos estes casos, a mobilização do poder militar é imprescindível.

No caso da mobilização militar, a idéia é inversa: se a logística militar não é capaz de suportar, sozinha, o desafio que se impõe, é necessário apoio da sociedade civil. E vice-versa: se a sociedade civil não é capaz de responder a uma situação aguda, é necessária a convocação do poder militar. Nesta última, há uma nuance: lançar mão da capacidade de organização (leiam-se condições de ser mais eficiente em ambiente estressante) do militar é tão ou mais importante que a própria mão de obra militar. E na história recente do Brasil, os militares foram mais mobilizados para atender às necessidades da sociedade frente a problemas civis, que os civis mobilizados para atender às necessidades militares.40 E sempre que a força militar foi acionada, sempre correspondeu ao esperado dela, gerando um ambiente de confiança da sociedade.

Mas esta realidade de confiança da população em suas Forças Armadas no apoio às suas necessidades, aliado ao crescente desinteresse geral pelas questões de defesa, sugerem eventuais dificuldades de mobilização da sociedade, caso seja necessária. Um exemplo de dificuldade atual é o debate sobre a obrigatoriedade do alistamento militar. Perde-se a cada dia a noção de que Defesa Nacional não pode ser assunto somente de militares, mas de toda a nação. Por esse motivo, a mobilização, pelo conceito militar, é proposta em duas fases: preparo e execução. Não há adequada execução da mobilização, se não houver um adequado preparo prévio.

39 A lista, não exaustiva, considera as contribuições dos militares e contempla circunstâncias de paz e de guerra: 1. Monitoramento das fronteiras, do litoral e do território, incluindo espaço aéreo, em circunstâncias de paz com poder de polícia; 2. Penetração das fronteiras ou abordagem do litoral por uma força paramilitar com a ajuda velada ou a complacência de um Estado fronteiriço ou com engajamento aberto de Estado fronteiriço; 3. Guerra contra forças muito superiores na Amazônia; 4. Guerra em outra região do mundo, ultrapassando os limites de uma guerra regional controlada, com emprego efetivo ou potencial de armamento nuclear; 5. Participação do Brasil em Operações de Manutenção da Paz das Nações Unidas; 6. Participação em operações internas em garantia da lei e da ordem.

40 As principais mobilizações militares em face de agressões externas foram para a Guerra do Paraguai, para a força Expedicionária Brasileira na Segunda Guerra Mundial e para compor o chamado “Exército da Borracha” entre os anos 1940 e 1942. (Para mais informações, vide http://www.aarffsa.com.br/noticias/19061011.html; http://www.historia.uff.br/stricto/td/1277.pdf)

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2.3.2 Mobilização: essencialmente fase do preparo. Não há mobilização sem uma vertente econômica

O preparo da mobilização consiste em estabelecer condições possíveis para que a sua execução seja feita com o menor dispêndio de esforço possível e com a menor interferência na vida regular da sociedade. Obviamente, a eficiência do preparo da mobilização está vinculada à não necessidade de realizar sua execução. Quanto mais preparada está a nação, maior estrutura logística ela dispõe. Quanto maior estrutura logística a nação dispõe, menos necessidade terá de realizar a execução da mobilização. E quanto menor a necessidade de execução da mobilização, menor esforço deve ser empregado na preparação da mobilização, posto que, certamente, está-se tratando de país com elevado grau de desenvolvimento. Vê-se, então, que há uma relação direta entre mobilização e desenvolvimento de uma nação. Nesse caso, preparar a mobilização é, em última análise, participar ativamente do desenvolvimento.

Por exemplo, faz parte da preparação de mobilização criar e disseminar uma estratégia de defesa que tenha como protagonistas não somente as Forças Armadas, mas também a sociedade civil. Neste sentido, é fundamental promover a reorganização dos investimentos na indústria de defesa nacional, a partir das diretrizes da política de defesa, de ciência e tecnologia e de proteção da propriedade industrial. Estas políticas devem convergir para a promoção dos Objetivos Nacionais, a longo prazo, a fim de que se torne cada vez menor a dependência a empresas estrangeiras, desvinculação de fundamental importância para a construção da Base Industrial de Defesa no Brasil. É igualmente importante para o desenvolvimento socioeconômico da nação, posto que estas empresas se proponham a produzir produtos duais, ou seja, bens de consumo civil em tempos de paz que podem facilmente ser convertidos em equipamentos militares, em caso de mobilização.

Preparar a mobilização, neste caso, seria fomentar a participação do capital privado no surgimento de novas estruturas produtivas tendo, como núcleo, empresas nacionais de grande porte, contribuindo, assim, para a organização de empresas menores, além de atrair centros de pesquisa, favorecendo a formação de um ambiente propício à inovação. Como resultado, cria-se uma Base Industrial de Defesa que pode apresentar benefícios econômicos fundamentais para o País, como os ganhos em termos de balanço de pagamentos, que aparecem na forma de economia de divisas e exportação de equipamentos.

Conclui-se, portanto, que a preparação da mobilização militar nada mais é do que engajar os responsáveis pela área de defesa em um engajamento maior, em favor do desenvolvimento, porque não há como implementar uma estratégia de defesa sem crescimento econômico, inclusão social e uma busca de melhoria contínua da capacidade de gestão do Estado. Como será visto adiante, todos esses fatores estão presentes na organização de um grande evento esportivo, por exemplo.

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Historicamente, observa-se que as Forças Armadas sempre foram participantes deste esforço de desenvolvimento41, desempenhando atualmente um papel importante e essencial quando cada vez mais participa de atividades, como controle do tráfego aéreo civil, o pronto-serviço de busca e salvamento, apoio às forças auxiliares em operações de segurança interna, o levantamento cartográfico de rios navegáveis e da plataforma continental brasileira, o treinamento do pessoal da Marinha Mercante, na preparação de reservistas capacitando-os em profissões técnicas civis, o transporte aéreo de doentes e órgãos para transplante, o trabalho de navios-hospitais na Amazônia brasileira, a distribuição de alimentos a comunidades carentes, além de projetos na área aeroespacial, nuclear, cibernética, na construção de açudes, ferrovias e rodovias, e gestão do programa antártico brasileiro, entre outros.

A área de defesa tem participado de ações que visam ao desenvolvimento da nação. As Forças Armadas concentram seus esforços: a) na proteção de fronteiras, estimulando o desenvolvimento da infraestrutura das cidades limítrofes a outros Estados e o patrulhamento contra a pirataria e o tráfico de drogas; b) na redução da violência interna, criando um ambiente de ordem e justiça; c) na capacitação do conscrito para a consciência de cidadania, para o esporte, na sua capacitação através da educação e da inovação; d) na engenharia civil, construindo nos locais pelos quais a iniciativa privada não tem interesse; e) na aviação civil e na marinha mercante, pela facilitação dos transportes, reduzindo o custo Brasil. Essas ações são mais evidentes quando a nação solicita uma conjunção de esforços, como no caso da realização dos Jogos Olímpicos e da Copa do Mundo. Convém ressaltar que, embora extremamente relevantes para o desenvolvimento da nação, algumas dessas ações constituem desvio de sua função básica, enfraquecendo a capacidade de fazer valer o poder de dissuasão esperado pela força militar.

Tal diretriz no preparo da mobilização contribui para solucionar duas grandes dificuldades dos órgãos governamentais, e das Forças Armadas, em particular: crescente isolamento em relação à sociedade (“Afinal, para que servem as Forças Armadas?” perguntam-se muitos) e a redução contínua do orçamento. Ao adotar como diretriz ações desenvolvimentistas justifica-se a sua existência e importância das Organizações Militares no cenário pós Guerra-Fria. Neste cenário moderno, é cada vez menor a probabilidade de guerra convencional, substituída pela guerra tecnológica ou de guerra assimétrica (terrorismo). Assim, atividades de integração com os planos de desenvolvimento governamentais, abrem a possibilidade de receber parte do orçamento hoje destinado ao Ministério da Justiça, ao Ministério da Saúde, ao Ministério da Educação, dos Transportes, da Ciência e Tecnologia, dos

41 Para mais detalhes, recomenda-se a leitura do seguinte artigo: D’ARAÚJO, Maria Celina. ‘Forças armadas e desenvolvimento econômico e social’. In: XXIX International Congress of the Latin American Studies, 2010, Toronto. Área LASA 2010 Congress Paper Archive, 2010.

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Esportes etc., para a realização das atividades, emprestando a cada uma dessas ações a reserva moral típica de uma organização militar e a conduta pessoal irrepreensível que configuram a imagem clássica das Forças Armadas, de Norte a Sul do país.

A mobilização, se não for vista como um fomento ao desenvolvimento corre o risco de ser apenas uma carta de boas intenções, entre tantas existentes no Brasil, que jamais saem do papel. Por esse motivo, é altamente recomendável que os assuntos de mobilização para defesa sejam geridos por duas esferas: a) a Casa Civil que deveria ser encarregada da preparação da mobilização, posto que, por ser multidisciplinar, requer uma coordenação semelhante ao PAC42 e b) o Ministério da Defesa que ficaria encarregado da execução da mobilização.

Outra vertente da preparação da mobilização é o mapeamento dos recursos civis, que poderão ser empregados em caso de conflito armado. Tais recursos, em sua maioria, estão sob a responsabilidade de entes privados, que operam suas estruturas voltadas ao lucro, como não poderia deixar de ser numa economia de mercado. Setores como energia, saúde, telecomunicações e transporte são exemplos.

No caso do setor de transporte, não é concebível imaginar um esforço de mobilização sem contar com vias e equipamentos para os modos terrestre, marítimo, aéreo e ferroviário, hoje, praticamente todos privatizados. Neste segmento, a presença do Estado se faz por meio da regulação. Então, a regulação deve ser um instrumento efetivo da mobilização, para ser um indutor do desenvolvimento (preparação) e ser um meio para que o setor privado cumpra as determinações tendo em vista a segurança nacional (execução).

2.4 DEFINIÇãO DE REGULAÇãO A PARTIR DA APRESENTAÇãO DE UMA AGÊNCIA REGULADORA DE TRANSPORTES

Uma Agência Reguladora de Transporte é um órgão, especialmente criado para atuar, eficientemente em um ambiente privatizado, ou seja, de crescente complexidade técnica, de aumento do número de participantes, dos conflitos de interesses e que, por estas características, requer arbitragem e coordenação com outros órgãos governamentais. Cabe a ela realizar constantemente diagnóstico do setor, preocupando-se, permanentemente com a matriz de transporte de carga e passageiros, com os ofertantes e demandantes dos serviços. O setor de transporte é um setor particularmente difícil de ser regulado, de acordo com o interesse público. Sempre a iniciativa privada esteve presente neste setor e o governo tem tido muita

42 O Programa de Aceleração do Crescimento (mais conhecido como PAC) prevê investimentos totais de R$ 503,9 bilhões até 2010 (PAC 1, lançado em 2007) e R$ 1,59 trilhão (PAC 2, lançado em 2010) nas áreas de transportes, energia, cultura, meio ambiente, saúde, área social, habitação e em projetos, como Cidade Melhor, Comunidade Cidadã, Minha Casa, Minha Vida, Água e Luz para todos, entre outros.

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dificuldade em lidar com o problema regulatório central que surge nos transportes: a mistura de elementos competitivos e monopolísticos na oferta dos serviços. Como fazer para que o capital privado atue conforme os interesses da sociedade e da nação (inclusive as preocupações com a defesa), já que muitas vezes nem mesmo o empresariado brasileiro tem poder de decisão?43

Apesar de difícil a atuação do Estado nesse setor, cada vez mais os agentes públicos e privados se dão conta da importância de um disciplinamento do setor rodoviário, com a implementação de mecanismos regulatórios que permitam adequar a oferta e a demanda do transporte e que definam parâmetros operacionais mínimos, resultando na diminuição da informalidade, na melhoria das condições de segurança e do aproveitamento energético dos recursos.

Tendo em vista a existência de falhas de mercado e desvio dos objetivos sociais da concessão, autorização ou permissão do serviço ou infraestrutura pública para o lucro puro e simples, o instrumento da regulação é imprescindível. Na presença de falhas, os mercados não fornecem sinais suficientes para garantir escolhas adequadas, que levem ao equilíbrio entre ofertantes e demandantes por um lado, e que sua operação seja de elevado custo social, dissociado dos objetivos nacionais, por outro. O grande desafio para a regulamentação é encontrar o ponto ótimo que viabilize a lucratividade e, portanto, a manutenção da operação e do investimento das empresas. Assim, desonera-se o Estado para aplicar o seu orçamento em outras prioridades.

E tão importante quanto viabilizar o negócio, é o desafio para a regulamentação zelar para que as empresas reguladas alcancem parâmetros aceitáveis de bem-estar da sociedade, na forma de disponibilidade de bens e serviços de qualidade, a preços razoáveis, sempre com a atenção aos requisitos de segurança e defesa nacionais, posto que desenvolvimento e segurança andem juntos. Em outras palavras, é também desafio das agências reguladoras prepararem as empresas reguladas para as ações de mobilização nacional.

Percebe-se que, no Brasil, as maiorias dos setores empresariais alavancaram seu desenvolvimento graças ao apoio do Governo, que ora o protege, ora o subsidia. A estreita ligação desses setores com o Estado pode impedir que as

43 Por exemplo: A OHL Brasil S.A. é uma das maiores companhias do setor de concessões de rodovias do Brasil em quilômetros administrados, com 3.226 km em operação. Através de suas nove concessionárias, a OHL Brasil administra rodovias localizadas nos Estados de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Santa Catarina e Paraná. Atualmente, detém 100% do capital das seguintes concessões estaduais: Autovias, Centrovias, Intervias e Vianorte; e das concessões federais: Autopista Fernão Dias, Autopista Regis Bittencourt, Autopista Litoral Sul, Autopista Planalto Sul e Autopista Fluminense. A Companhia é uma empresa brasileira com 60,0% do seu controle detido pela OHL Concesiones, além de ser acionista majoritária da OHL Brasil, administra diversas sociedades concessionárias de rodovias na Espanha, Chile, Peru, México e Argentina. A OHL Concesiones é subsidiária integral da OHL S.A. empresa espanhola do setor de construção e concessão e uma das líderes desses setores.

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Agências Reguladoras tenham a autonomia necessária para regular o setor. E regulação é aqui entendida como a capacidade de ditar normas específicas e fiscalizar seu cumprimento. Se o Estado Brasileiro quer que as empresas privadas tenham preocupação com a Defesa Nacional, suas agências reguladoras devem adotar uma atitude independente e isenta voltada para os interesses nacionais. Preparar uma ferrovia ou uma rodovia para que possa transitar um tanque de guerra de 60 t significa custo e esta despesa tem que constar na regra da concessão e ser internalizada pela organização privada, via ação governamental mais direta e constante de fiscalização. Estas eventuais demandas por segurança têm como consequência a redução das margens de lucro das empresas, que farão pressão no Governo no sentido de transferir para a tarifa cobrada ao usuário este custo suplementar. Existe, portanto, uma grande pressão do Governo e da Sociedade sobre empresas para que melhorem seus resultados, quer seja nos aspectos econômicos, quer seja nos aspectos de segurança, em respeito ao meio ambiente ou no melhor aproveitamento dos recursos energéticos empregados. As empresas exercem por sua vez pressão para que todos estes custos sejam pagos pela própria sociedade, salvaguardando sua margem de lucro e viabilizando assim seu negócio. É neste ambiente que as Agências Reguladoras funcionam como um poder atento às diretrizes de Governo, às necessidades da Sociedade e capacidade financeira das empresas, julgando oportunos ou não os movimentos destes três entes, zelando pela harmonização dos interesses de todos, inclusive quanto aos assuntos de mobilização.

A regulação, portanto, desempenha função primordial, ao buscar reproduzir as condições de competição, para que os consumidores tenham acesso a produtos e serviços com qualidade e os níveis de preços que obteriam em um ambiente competitivo.

A ação regulatória costuma se concentrar em três pontos: preços, qualidade e condições de entrada e saída. Os principais objetivos da regulação são: a) garantir simultaneamente preços baixos e elevados níveis de produção; b) resolver as tensões entre os três entes (Governo, Sociedade e Empresas); e c) incorporar mecanismos de indução à eficiência do mercado.

O conjunto de medidas implementadas pelo órgão regulador é chamado ‘de marco regulatório’. O marco regulatório nos transportes se caracteriza por promover a concorrência onde seja possível de se reproduzir as condições de competição, de forma que os consumidores tenham acesso a produtos e serviços com qualidade e nível de preços que obteriam em um ambiente competitivo.

Por exemplo, o marco regulatório no setor rodoviário tem sido alcançado por meio da implementação de mecanismos regulatórios que permitam adequar a oferta e a demanda do transporte de carga e que definam parâmetros operacionais mínimos, resultando na diminuição da informalidade, na melhora das condições de segurança e do aproveitamento energético dos recursos.

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Cabe também às agências reguladoras a prestação de contas à sociedade (accountability), transparência do conteúdo e do processo de tomada de decisões, no que se refere à definição dos parâmetros para o setor como, por exemplo, a preocupação com a segurança nacional e a mobilização. Desta forma, se tais conceitos de Defesa não estiverem muito claros para a Agência Reguladora e para o público, não será razoável esperar que sejam implementadas obrigações para as empresas a fim de que facilitem a Mobilização, sobretudo na sua fase de execução. De fato, da análise de todo o marco regulatório da regulação de transportes terrestre atualmente vigente, não há em nenhum momento a menção às palavras “defesa” ou “mobilização”.44

Este exemplo mostra que as agências reguladoras existentes precisam aperfeiçoar seus mecanismos de relação com a sociedade. Em especial, é importante que sejam propostos para consultas, audiências e sessões públicas assuntos de relevância nacional, como defesa. As seções abertas tendem hoje a ser muito mais processos formais de autojustificação do que de interação constante e efetiva com indivíduos, entidades, associações e outros órgãos de governo (Ministério da Defesa) que não tenham interesse econômico direto na área regulada.

2.5 PAPEL QUE CORRESPONDE À REGULAÇÃO EM ESPECIAL A LIGADA AOS

TRANSPORTES TERRESTRES, NO CONTEXTO DA LOGÍSTICA E MOBILIZAÇÃO ACIONAL

A Mobilização Nacional, aplicável a um caso concreto, efetivamente deve utilizar-se da Regulação de Transporte e Logística Nacional existente, e se houver a necessidade de mobilização geral, esta necessidade torna-se mais aguda. Em locais onde cada vez é menor a presença do Estado na área de transportes, a regulação dos agentes privados se reveste de suma importância para potencializar as capacidades de logística e de mobilização.

Um dos aspectos relevantes para a mobilização na área de transportes terrestres, no que se refere à fase de preparo, e, consequentemente, ao desenvolvimento do país, é o combate a um inimigo muito poderoso que causa constantemente sério dano à sociedade: o trânsito. O trânsito brasileiro mata anualmente mais do que qualquer guerra convencional moderna. Enquanto cerca de 2500 soldados norte-americanos morreram em dois anos de ocupação no Iraque, o trânsito no Brasil matou 14 mil pessoas somente no primeiro semestre de 2011. Em 2010, cerca de 35 mil pessoas perderam a vida no trânsito nas estradas e nas cidades, considerando apenas os que morreram no local do acidente. Acrescentando a este

44 Todas as Resoluções da Agência Nacional de Transportes Terrestres que disciplinam o setor de transporte rodoviário e ferroviário de cargas e passageiros podem ser encontradas no seguinte endereço: http://www.antt.gov.br/resolucoes/resolucoes2011.asp

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quadro, a elevadíssima carga tributária45 a que toda a sociedade está submetida, então se tem uma situação intolerável de segurança pública.

Esta mobilização não é a mobilização militar, por suposto, mas sua execução poderia ser realizada utilizando o mesmo mecanismo jurídico já criado para fazer frente a uma ameaça externa. Com a coordenação do Ministério da Defesa, todas as demais áreas devem contribuir para dar combate a este inimigo urbano, mas ao mesmo tempo poderoso, que ceifa principalmente a vida daqueles na idade de maior produtividade, sem contar com os prejuízos financeiros e materiais.

Neste exemplo, a regulação da área de transportes pode criar normas e resoluções que obriguem as empresas a utilizarem seus recursos para contribuir na mobilização geral de redução do número de acidentes. Um exemplo mais recente foram os eventos naturais na serra de Teresópolis, quando na madrugada do dia 11 para o dia 12 de janeiro deste ano, choveu mais de 200 mm, o dobro do esperado para todo o mês. As principais rodovias que servem àquela região são privatizadas, o que quer dizer que está sob responsabilidade da agência reguladora, a ANTT. Sendo assim, para que as empresas concessionárias de infraestrutura rodoviária contribuam com este esforço de mobilização, é necessário que haja a previsão dessa solicitação no contrato de concessão. Assim, torna-se possível a operação conjunta com as Forças Armadas, Defesa Civil e Corpo de Bombeiros no mutirão organizado para atendimento às vítimas, sempre que houver ocorrência de catástrofe semelhante. Ressalta-se, nesse caso, o desvio de função das Forças Armadas, embora tenha sido de grande importância o seu emprego.

As Agências Reguladoras, assim como boa parte dos órgãos de gestão pública que tratam dos serviços e da infraestrutura mobilizável, devem aprender com toda a experiência de mobilização das Forças Armadas, sempre presente todas as vezes que foram solicitadas pela sociedade. Uma pronta resposta à mobilização depende de uma adequada organização da estrutura já existente. Não se alcança um nível de mobilização desejado em um ambiente de baixa organização, e os recentes fatos acontecidos no Japão comprovam46. No Brasil, não há dúvida que as Forças Armadas, que sempre estão prontas para a mobilização e em constante treinamento, são uma das instituições mais capacitadas e organizadas para dar o exemplo de como deve ser uma mobilização com ordem e eficácia. Esta performance foi recentemente

45 Principais impostos brasileiros: Incidentes sobre renda, Imposto de Renda e Contribuição Social, PIS, Cofins, IPI, ICMS, ISS, IOF, Cide, IPTU, ITCMD, ITBI, ITR, IPVA e contribuição ao INSS e afins (assim entendidas as várias contribuições para o sistema “S” acrescidas do SAT, e o salário educação), e as taxas federais, estaduais e municipais instituídas.

46 Em 11 de março de 2011, um terremoto de 8,9 graus de magnitude na escala de Richter atingiu o Japão.Em meio à tragédia, a mobilização e o comportamento da população chamou a atenção de todos. O desespero não dominou, não houve saques aos supermercados, não houve preço abusivo da água, nem brigas no recebimento dos donativos. Ao contrário, houve ordem e união de esforços. Parecia que já estariam “preparados” para situações assim. Desde a infância as pessoas recebem treinamentos para tais circunstâncias. Aprenderam a lidar com as situações adversas.

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verificada quando da realização dos Jogos Pan-Americanos e é razoável propor mobilização similar na realização dos próximos megaeventos que ocorrerão no Rio de Janeiro.

2.6 ESTUDO DE CASO: REALIZAÇÃO DE uM MEGAEVENTO NO RIO DE JANEIRO - EXPOSIÇÃO AO RISCO; POSSIBILIDADE DA MOBILIZAÇÃO

Até o momento, foi visto que logística, seja na sua concepção militar, seja na sua concepção civil, é uma componente da mobilização dos diversos setores da sociedade para fazer frente a uma ameaça. A logística instalada, por sua vez, corresponde ao grau de desenvolvimento de uma nação. Na sociedade moderna, o papel do Estado está em contínua revisão e aprimoramento. Observa-se, atualmente, uma tendência de deixar que a iniciativa privada tome conta de certos produtos e serviços e que eles sejam controlados pelo instrumento da regulação. Tais atividades econômicas são relevantes para a mobilização, mas não fazem parte das funções elementares de um país47, como a construção e conservação de estradas, prestação de serviços de telecomunicações, geração e distribuição de energia elétrica, serviços de saúde, abastecimento, combustíveis, etc. Surge daí a figura das organizações estatais que irão regular estas atividades, as agências reguladoras. Quanto maior preparação e consciência do seu papel de preparação da mobilização por parte da gestão dessas agências, maior será a possibilidade de fazer efetiva a execução desta mobilização caso seja necessário.

Não há outro caminho para uma eficiente mobilização que não seja uma integração entre os agentes responsáveis pelo desenvolvimento (leia-se: fase de preparação da mobilização). Já foi dito que a regulação, a logística e a mobilização não são fins em si mesmos. Regulação, logística e mobilização são instrumentos que os Estados organizados utilizam para atingir o desenvolvimento com segurança ou, melhor dito, cria um ambiente seguro que favoreça o crescimento. Quanto mais desenvolvido, maior capacidade de mobilização tem o país. É importante salientar que as condições que favorecem o crescimento são as mesmas que ampliam a capacidade de mobilização, a saber: uma sólida base educacional, num ambiente de oportunidades econômicas.

Mas, diriam alguns, mobilização é como um seguro; e como tal, só se sabe se realmente funciona quando se precisa dele. Como então verificar a capacidade de mobilização?

Primeiramente, deve-se preocupar com o tamanho da mobilização requerida, para imaginar, por exemplo, se a nação brasileira seria capaz ou não de atender a esta necessidade. O raciocínio seria simples: quanto maior for à ameaça e maior

47 São atividades exclusivas do Estado: poder de definir, fiscalizar o cumprimento das leis do país, de impor a justiça, de manter a ordem, de defender o país, de representá-lo no exterior, de policiar, de arrecadar impostos e de regulamentar as atividades econômicas.

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for o tempo em que a ameaça pode causar dano, maior então a necessidade de mobilização. Para fins desse artigo, as ameaças podem ser separadas em três tipos: a) ameaça externa invasora, b) ameaça interna à governança do Estado, c) ameaça interna ou externa assimétrica (terrorismo, guerrilha, violência interna).

No primeiro caso, considerando as características atuais da guerra moderna, a mobilização tende a ser de pouca valia ou necessidade. Caso o inimigo seja um outro país sul-americano, possivelmente não será necessária a mobilização, uma vez que a logística nacional disponível provavelmente já atenderia a necessidade de defesa nacional em pronta resposta. Caso o inimigo seja uma superpotência ou o conjunto de superpotências (interessadas nas riquezas da Amazônia, por exemplo), dada a assimetria de forças e a dependência tecnológica, provavelmente a mobilização seria uma demonstração de caráter e valor dos brasileiros, mas de pouca valia. Ampliar a capacidade de resposta a uma superpotência é um desafio, o mesmo desafio que o Brasil tem que superar para alcançar o status de país desenvolvido. Ambas as hipóteses possuem atualmente pouca aderência à realidade, embora possíveis.

No segundo caso, a mobilização não só é importante como tem sido permanentemente utilizada, embora, neste caso, não seja considerada como mobilização militar48:quando ocorre algum dano aos recursos materiais brasileiros e à saúde da população; quando vidas humanas, fauna, flora, reservas naturais, reservas minerais, patrimônio histórico, artístico e cultural são ameaçados por desastres naturais. Estes desastres ocorrem em um ambiente em que os próprios brasileiros (daí a ameaça interna), ou por adotarem políticas equivocadas, ou por priorizarem outros interesses que não os da sociedade, ou, ainda, por dificuldade de implementar ferramentas como o planejamento, coordenação e controle, potencializam o poder destrutivo dos fenômenos naturais49.

Nestes casos, ocorre a mobilização inversa, ou seja, a sociedade civil mobiliza as forças militares. Ao considerar o histórico dos recentes eventos que mobilizaram as Forças, afirma-se que houve sempre uma resposta pronta, eficiente e organizada. Tais ocorrências sugerem também que, por outro lado, o poder público civil ainda tem, de uma forma geral, um longo caminho a percorrer no sentido de atender com qualidade e eficácia ao que a sociedade espera nestes momentos. Por exemplo, vide a reação do Estado japonês quando do recente terremoto seguido de tsunami.

Há ainda outras ameaças internas que se encaixam neste modelo. Embora não causadas por fenômenos da natureza, trazem igual ou pior poder de destruição de vidas e de patrimônio, como, por exemplo, a ameaça no

48 Pela legislação vigente, para que haja mobilização militar, é necessário que exista uma ameaça externa de uma nação agressora. Ver Art. 2.° do Dec. N.º 6.592, de 2/10/2008 que regulamenta o disposto na Lei no 11.631 e dispõe sobre a Mobilização Nacional e cria o Sistema Nacional de Mobilização - SINAMOB.

49 Exemplo: Um terremoto de mesma intensidade no Haiti foi muito mais destrutivo do que na Itália; ambos aconteceram no mesmo ano.

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trânsito (já comentada anteriormente), as epidemias (em especial a dengue), o desmatamento e, até mesmo, a fome. Não há dúvida de que a sociedade se mobilizaria para atender a um chamado seguro e firme para focar seus esforços para combater ou minimizar qualquer uma dessas ameaças internas, face ao potencial dano que causam e face às características do povo brasileiro, tão generoso quanto intimista.50

No terceiro caso, a mobilização já existe e é atualmente uma constante nas Forças Armadas com foco na intervenção localizada e eficiente sempre que solicitada em substituição ou em apoio às Forças Auxiliares, embora constitua, como abordado anteriormente, um desvio de função. Alguns exemplos são o patrulhamento de fronteira, ocupação do Morro do Alemão no Rio de Janeiro, segurança nos dias de eleição, etc. Mas ainda há aquela ameaça que, embora não faça parte da história do Brasil, está cada vez mais em voga e sendo mais utilizadas por minorias e até mesmo por alguns governos ao redor do mundo: o terrorismo. Como seria a mobilização da sociedade brasileira nestes casos? É difícil prever. No entanto, pode-se inferir que a realização de um megaevento pode ser um bom indicador de performance. Quanto maior a capacidade de o Estado Brasileiro realizar eventos que demandem grandes esforços logísticos, maior será a possibilidade de sucesso desse Ente em efetivar a Mobilização Nacional caso seja convocada. E de certa forma, toda vez que se organiza um megaevento, já há um natural espírito de mobilização, de voluntarismo, de predisposição de todos a se sacrificarem por um único objetivo comum. E se há o envolvimento de todos, civis e militares, na realização desses eventos e se o resultado é uma organização eficiente, então pode-se supor que, caso haja uma ameaça externa assimétrica, haveria uma adequada mobilização nacional para fazer frente a ela.

Em resumo e recuperando todo o exposto anteriormente: considerando a tarefa de realizar com efetividade eventos críticos como Copa do Mundo ou Olimpíadas: a) o grau de desenvolvimento atingido é suficiente? b) o desenvolvimento do Brasil permite afirmar que o país possui a logística adequada? c) como aspecto fundamental da logística atual, atuam eficazmente as Agências Reguladoras? Se a resposta for positiva, então também pode-se afirmar que o Brasil é capaz de atingir graus importantes de mobilização contra qualquer ameaça, seja ela interna ou externa. A forma de se mobilizar para um evento (pacífico) tende a ser a mesma forma que se mobilizaria para um conflito.

É importante considerar que megaevento é uma atividade que demanda um comprometimento dos recursos em escala e escopo excepcionais, em particular com relação à construção de infraestrutura (ênfase no transporte público) e organização de espaços (por exemplo, estada e acomodação) e também em termos de operação. Por exemplo, a Olimpíada de Londres, em 2012, representa uma mobilização social

50 Conforme afirma Sérgio Buarque de Holanda em seu livro “Raízes do Brasil”.

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das organizações públicas e privadas sem precedentes, para receber um total de 26 diferentes modalidades em 31 tipos diferentes de competições em apenas 17 dias de competição, reunindo cerca de 204 nações, 10.500 atletas, 6.000 técnicos e componentes de delegações, com aproximadamente 500.000 visitantes por dia de competição. Os jogos terão o policiamento feito por 15 mil agentes públicos e 7.500 seguranças privados. A complexa interdependência da infraestrutura com as operações esportivas em curto espaço de tempo gera uma elevada exposição ao risco, quando comparado com eventos regulares ou campeonatos nacionais ou internacionais regulares. Megaeventos, além disso, são momentos em que ocorre a exposição de todos os tipos de falhas organizacionais e tecnológicas, combinada com a elevação do nível de ameaça de ações terroristas, incidentes diplomáticos, ações de transcendência geopolítica ou tensões nacionalistas e outros incidentes críticos.

Durante a sua apresentação ao COI, o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, afirmou que os eventos esportivos são veículos para chamar atenção dos problemas sociais que podem ser hospedeiros de uma eventual ameaça à boa condução desses jogos, como dito anteriormente. É uma oportunidade também para implementar meios para superar esses problemas. Os jogos são uma oportunidade de a sociedade mudar a visão e acelerar a implementação de ações de desenvolvimento, de pular etapas rumo à criação de uma logística instalada que sugere o desenvolvimento local. Aqui encaixa o relevante papel que a Regulação deve prestar. No caso, exemplos de melhoria logística (desenvolvimento) como segurança no recebimento de turistas e fortalecimento da economia local, bem como melhoria contínua da infraestrutura, via investimento privado. A preparação atual da cidade do Rio de Janeiro para a Copa do Mundo de 2014, com a construção de hotéis, vias de transporte, reforma de aeroportos, entre outros, tem caminhado neste sentido. O prefeito costuma dizer que o planejamento dos Jogos confunde-se com o planejamento da própria cidade. Se se considerar mobilização como escolha de um foco, então o Rio de Janeiro encontra-se, atualmente, em uma experiência de mobilização.

No plano da mobilização social, pode-se apontar como relevantes iniciativas: criar a mobilização da sociedade organizada, através de movimentos sociais, de representantes da classe política, de organizações não governamentais e de entidades de classe, de maneira que as forças de todos colaborem em todas as áreas de atuação, visando, como se propõe na mobilização, o alcance de maiores resultados efetivos. Ao se tratar de organização civil, é importante que sejam envidados esforços no sentido de zelar para que os tomadores públicos de decisão busquem elaborar e implementar medidas para que a maior parte da população se beneficie com a realização de um megaevento, tanto social, como economicamente, como forma de minimizar os inevitáveis impactos negativos causados, sobretudo na exposição ao risco e problemas com a segurança nacional.

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Na prática, esse desenvolvimento da logística e estratégia de segurança nos jogos raramente ocorre em compasso com as políticas públicas de segurança social, nacional e internacional. Estas políticas são geralmente fruto de uma soma de esforços históricos e políticos que geralmente são formuladas e implementadas na velocidade própria do desenvolvimento de cada nação. Até porque, a implementação desses eventos acrescenta algumas formas de ameaças que não são típicas do dia a dia da sociedade local, mas que pertencem ao microcontexto dos Jogos Olímpicos ou Copa do Mundo. Por exemplo, para casos especiais, como sequestro político, carros-bomba, manifestações nacionalistas, a nação deve estar preparada para o pior cenário possível, incluindo a detonação de bombas de alto valor destrutivo, ataque com antrax, severas mudanças climáticas e evacuação em massa da população. Todos esses eventos não têm qualquer registro histórico no Brasil. É, portanto, de fundamental importância, quando do planejamento de segurança de um megaevento, a criação de cenários de possíveis ameaças. Esta atividade é muito aderente ao conceito de mobilização militar, que depende também da construção de hipóteses de emprego para focar os seus esforços de preparação da logística nacional.

O objetivo da mobilização na construção de uma logística para esses eventos deve caminhar no sentido de implementar ações para proteger os cidadãos nacionais, atletas estrangeiros e turistas vindos de todos os cantos do mundo. Também é objetivo a segurança de fronteiras nacionais, portos e aeroportos e proteção do território da ação de grupos terroristas. Deve prevenir atividades clandestinas por meio da fiscalização constante e monitoramento de grandes grupos de estrangeiros. A grande vantagem dos formuladores de políticas de fortalecimento da logística voltados à execução desses eventos é que são dados vários anos para incrementar-se o planejamento, a fim de que as propostas sejam desenvolvidas e, geralmente, com a garantia orçamentária para que os projetos oriundos desses planos sejam executados.

A ideia da preparação da mobilização para estes eventos é permitir que os recursos disponíveis na nação fortaleçam a segurança contra o maior tipo de ameaças possível, bem como reconfigurar a dinâmica da cidade, de forma a eliminar, enfraquecer ou reduzir as causas da violência e da atividade ilegal. É importante notar que as causas de ameaças estão todas inter-relacionadas e a resposta dos planejadores de um megaevento a estes possíveis ataques se baseia sempre em alternativas que não podem tolerar o status quo após tais ameaças se tornarem realidade, o que torna todas as decisões muito complexas. O ideal, portanto, é uma mobilização para a prevenção.

A total ausência de qualquer incidente durante a realização dos Jogos Pan-Americanos realizados no Rio de Janeiro sugere a eficácia do modelo de policiamento, caracterizado por um único comando responsável por todas as unidades de policiamento e de forças especiais. É interessante notar, no entanto, que este

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modelo apenas foi utilizado durante a realização dos jogos, sendo desativado logo após o encerramento do evento. O próprio governo do Estado do Rio de Janeiro afirmou que a união de esforços entre a sociedade civil (aumento do número de ligações para o serviço ‘disque denúncia’, por exemplo) e as Forças Auxiliares de segurança resultou em excelentes resultados. Tais resultados mostram, na prática, como o poder do Estado aumenta quando a população se submete a uma política de mobilização.

Da experiência dos Jogos Pan-Americanos, os resultados foram muito positivos considerando o uso da mobilização popular. No entanto, muito mais necessita ser feito para que esses resultados sejam, não apenas eficazes no momento de emprego, mas efetivos no futuro51.

Na avaliação do COI, com referência à seleção da cidade-sede do evento de 2016, pode ser percebida esta preocupação pelos “desafios de segurança”, na qual se reitera que a escolha da cidade deve fazer parte de um projeto ambicioso de ampliação de capacidades das Forças Auxiliares, via investimento em recursos materiais, tecnologias e treinamento dos seus agentes. Para atender a este propósito, a Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça (SENASP) estabeleceu um gabinete de segurança para os megaeventos, com pessoal de todas as Forças Auxiliares trabalhando em conjunto, a fim de desenvolver os planos e as operações para a preparação do evento. Este gabinete respondeu adequadamente às demandas surgidas até o momento, com ênfase no monitoramento das ações dos jogos Pan-Americanos e dos Jogos Mundiais Militares. Em ambos os casos, constatou-se um aumento da sensação de segurança e redução das taxas oficiais de criminalidade no período.

3 CONCLUSÃO E CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao tornarem-se mais claro os conceitos, contextualizados à nossa realidade, pode-se compreendê-los e, por conseguinte, aplicá-los com mais eficácia, por já saberem os motivos pelos quais foram criados. Regulação, Logística e Mobilização não são fins em si mesmos. São instrumentos que os Estados organizados utilizam para atingir objetivos, tais como Desenvolvimento (agora com o epíteto ‘Sustentável’), Progresso e Manutenção da Paz Social e Soberania Nacional.

A Nação Brasileira está experimentando a honra de se mobilizar para sediar os Jogos Olímpicos e demais megaeventos. O sentimento geral é de que este é um crédito de confiança da comunidade internacional e, como tal, aumenta a autoestima

51 Por exemplo, em 2007, o governo federal destinou cerca de 60 milhões de dólares ao esforço de fortalecimento da polícia do Rio de Janeiro, melhorias na tecnologia, armamento e mobilidade. No entanto, os últimos resultados de estudos na área de segurança informam que seriam necessários cerca de 3,5 bilhões de reais em quatro anos para implementar todas as melhorias necessárias na área de segurança da cidade.

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dos brasileiros. O Brasil está confiante na sua crescente prosperidade, mas teme-se que as persistentes desigualdades e a violência operem em sentido contrário. Brasil e Rio de Janeiro têm muito a ganhar, economicamente e socialmente, com uma bem-sucedida edição dos Jogos Olímpicos e demais megaeventos.

Os gestores de planejamento agora têm tempo, recursos e talento ao seu lado, e a Copa do Mundo de 2014 testará seus resultados, tal como ocorreu no Pan- Americano. A utilização dos Jogos Olímpicos como uma plataforma para promover a estabilidade nas Nações emergentes corresponde ao desafio de mostrar que o Rio de Janeiro é capaz de implementar, com eficiência, uma estratégica de segurança duradouras. E para conseguir este desafio, o Brasil deve desenvolver uma abordagem que envolva a mobilização social. Esta mobilização, nas dimensões de preparação e execução, deve detalhar os papéis dos agentes públicos e dos agentes privados. Sabe-se que os agentes privados em operação no Brasil, de controle de indivíduos ou grupos estrangeiros, farão ou deixarão de fazer algo em relação à mobilização, conforme a atuação das agências reguladoras setoriais. Assim, é possível alcançar tal cooperação entre todos, que permita o Brasil fazer frente a qualquer ameaça.

As organizações militares, em Estados desenvolvidos, sempre ocupam uma posição de vanguarda, pois garantem a segurança indispensável ao desenvolvimento da nação. Na Mobilização, conceito abstrato, posto que não se tem ameaças externas prováveis, mais uma vez as Forças Armadas dão o exemplo, considerando que, nos últimos anos, Exército, Marinha e Aeronáutica têm sido mobilizados para atender emergências, apoiar segurança interna, zelar pela realização de grandes eventos internacionais no Brasil etc. Em todos os momentos em que as Forças foram chamadas pelo poder civil, para atender a fins civis, a resposta sempre foi pronta e os resultados muito positivos. O exemplo então deve ser seguido pela sociedade civil para o caso de ser chamada a mobilizar-se para fins militares.

Referências

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Guilherme Luiz Passos Miranda Autran

MOBILIZAÇÃO NACIONAL E AS INDÚSTRIAS DE DEFESA

Guilherme Luiz Passos Miranda AutranEconomista, estagiário do Curso de Logística e Mobilização Nacional da Escola Superior de Guerra, em 2011.

Resumo

A proposta deste trabalho é discorrer sobre a Indústria de Material de Defesa no Brasil e a Mobilização Nacional, buscando-se óbices e estratégias visando a justificar a indispensável e eficaz participação das indústrias nacionais no fortalecimento da defesa do Estado para uma ação imediata ante qualquer ameaça. São abordados os aspectos históricos, das origens da produção do material de defesa no país, no Brasil colonial, até os dias de hoje, com uma análise do estágio em que a indústria de defesa se encontra, assim como as políticas públicas e os instrumentos para possibilitar a revitalização da Indústria de Material de Defesa em consonância com a Estratégia Nacional de Defesa e o Sistema Nacional de Mobilização. Também será abordada a situação da Indústria de Material de Defesa em face de um cenário prospectivo de uma ação Nacional de Mobilização.

Palavras-chave: Mobilização; Defesa; Indústria.

1 INTRODUÇÃO

O Brasil, na década de 1980, ostentou o título de quinto maior exportador mundial de armamentos. Com o passar dos anos, diversos óbices: como a crise da dívida externa, a alta prioridade nos investimentos militares, a inflação galopante, a concorrência internacional decorrente da ampla disponibilidade de material bélico proveniente das antigas repúblicas soviéticas, ou decorrente da deflagração do Conflito no Golfo que fechou as portas de tradicionais compradores de nossos produtos de defesa, as empresas da nossa Base Industrial de Defesa sofreram um duro revés, culminando com a falência da ENGESA.

O desmantelamento da Indústria Nacional de Defesa (IND), a partir dos anos 1990, em função desses diversos fatores, distanciou tecnologicamente, os fabricantes nacionais de seus congêneres no exterior, enfraquecendo a expressão Científica e Tecnológica do Poder Nacional.

O Poder Nacional do Brasil “se apresenta como uma conjugação interdependente de vontades e meios, voltada para o alcance de uma finalidade”52 subdividido nas expressões política, econômica, psicossocial, militar e científica &

52 Manual básico: Elementos fundamentais. Rio de Janeiro: Escola Superior de Guerra, 2009.

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Mobilização Nacional e as Indústrias de Defesa

tecnológica, abalado, no início dos anos 1990, pelos aludidos óbices e por retração na capacidade de pesquisar novas tecnologias, apresentava enfraquecimento em todas as suas expressões.

A partir da reversão deste ciclo depressivo da economia do Brasil, com a adoção de medidas de contenção inflacionária e crescimento econômico (políticas monetária, cambial e fiscal), apresentando melhora significativa no quadro geral da economia com a queda da inflação, com a balança comercial superavitária, com as reservas internacionais e crescimento do PIB, as agendas dos governos passaram novamente a procurar fortalecer as expressões do Poder Nacional.

Assim sendo, a partir de 2005, começou a ser implantado um conjunto de leis e diretrizes que vieram regular a Mobilização Nacional e a Base Nacional de Defesa.

A Política Nacional da Indústria de Defesa (PNID), aprovada em 19 de julho de 2005, que entrou em vigor na data da publicação da Portaria Normativa do Ministério da Defesa n.º 899/MD e no Diário Oficial da União de 20 de julho de 2005, é a mais recente política setorial relacionada com a Indústria da Defesa na busca da autonomia nacional. Tem como objetivo geral o fortalecimento da Base Industrial de Defesa (BID).

A Portaria Normativa do Ministério da Defesa n.º 586/MD, de 24 de abril de 2006, descreve as ações estratégicas para a implementação da Política Nacional da Indústria de Defesa – PNID e entrou em vigor na data da publicação no Diário Oficial da União, em 25 de abril de 2006.

Considerando as diretrizes traçadas pela Política Nacional de Defesa, estabelecendo que: “o país deve ter condições de um emprego imediato de Defesa ante ameaças externas de qualquer natureza”, foi elaborada a Lei n.º 11.631, de 27/12/2007. Esta Lei dispõe sobre a Mobilização Nacional, sendo criado o Sistema Nacional de Mobilização (SINAMOB), instrumento previsto nos art. 22, inciso XXVIII e art.84, inciso XIX da Constituição Federal, que estabelece: “quais ações imediatas a empregar, de acordo com o espaço geográfico do território nacional”.

As ações de defesa não são apenas de militares, muito menos exclusivas de órgãos específicos. Pela ótica da Política Nacional de Defesa, para garantir a soberania do país no mundo de hoje, por meio de desenvolvimento pleno, há que se pensar em compromissos contínuos e interdependentes entre defesa e ciência, tecnologia e inovação.

Levando-se em conta que esta interdependência seja, de imediato, concretizada, através da Mobilização Nacional, é necessário ter uma autonomia tecnológica cada vez maior de itens de defesa, sendo essencial a participação do Governo junto às indústrias no fabrico de produtos e incentivando pesquisas científicas e desenvolvimentos tecnológicos.

A independência tecnológica só é alcançada com o sentimento determinístico do civismo, do patriotismo e da ética da população. Nenhum país pode prescindir de saber e poder fabricar os seus próprios meios de defesa.

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Guilherme Luiz Passos Miranda Autran

A Estratégia Nacional de Defesa, Decreto n.º 6.703, de 18/12/2008, preconiza o fortalecimento da Base Industrial de Defesa, voltada para o desenvolvimento de tecnologias com aplicação dual (civil e militar) sendo de grande relevância a adoção de medidas visando a facilitar a interação civil/militar no campo de P&D, principalmente no que tange ao financiamento de estudos e projetos, aos incentivos fiscais às indústrias de defesa e à criação de instrumentos que garantirão a elas a penetração de seus produtos no mercado externo.

2 HISTÓRICO

O ano de 1762 marca o início das atividades industriais no âmbito das Forças

Armadas, em território brasileiro. Naquele ano, o Vice-Rei Gomes Freire de Andrade, o Conde de Bobadela, fundou, no Rio de Janeiro, o Arsenal de Guerra da Corte ou “Casa do Trem”, com a finalidade de suprir as necessidades de defesa da Coroa, em termos de reparação de material bélico e de fundição. Em 1763, era fundado Arsenal Naval do Rio de Janeiro pelo primeiro Vice-Rei de Portugal, o Conde da Cunha, que teve como primeiro produto um navio de guerra concluído em 1767. Mas, foi com a chegada de D. João ao Brasil que as atividades industriais ganharam maior incremento. Assim, em 1808, foi inaugurada a Fábrica de Pólvora da Lagoa Rodrigo de Freitas (na altura, hoje, do Jardim Botânico). Em 1811, o Arsenal do Trem foi transformado em Arsenal de Guerra da Corte, hoje Arsenal de Guerra do Rio, com a finalidade de fabricar armas, munições e outros artigos bélicos para as Forças Armadas. Em 1828, foi criado o Arsenal de Guerra de Porto Alegre, hoje localizado em General Câmara, com o objetivo de tornar mais próximo o apoio logístico a operações militares no Sul do Brasil. Em 1863, foi criado o Laboratório Pirotécnico de Campinho, no Rio de Janeiro, com a finalidade de fabricar espoletas, cartuchos, foguetes a “congrève”, morrões, iluminativos e outros, visando a atender ao Exército e à Marinha.

A guerra da Tríplice Aliança (1865-1870) deu importante estímulo para a indústria militar. Este conflito reuniu o Brasil, a Argentina e o Uruguai em combate contra o expansionismo do Paraguai. Em face da necessidade de conseguir um meio efetivo de controle dos rios paraguaios, o Brasil se tornou a segunda nação do mundo a produzir navios de guerra blindados, no Arsenal Naval do Rio de Janeiro, tendo construído seis dessas belonaves. Este conflito armado forçou a expansão da produção, pelo Exército, de cartuchos, projéteis e pólvora.

Com a Proclamação da República em 1889, marcando o fim do regime imperial, surgiu um inusitado interesse no reequipamento do Exército e da Marinha, que após a guerra do Paraguai haviam sofrido grande desgaste. A diretriz básica era importar os armamentos necessários e estabelecer, nos arsenais, oficinas para a montagem e manutenção dos mesmos. Além disso, foi criada a Fábrica de Realengo (hoje, desativada) em 1898, destinada a produzir munição de

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Mobilização Nacional e as Indústrias de Defesa

pequeno calibre, e em 1909 a Fábrica de Piquete, primeira indústria de pólvora de base simples.

Após o destronamento do imperador, realizado por uma coalizão de diferentes forças, que incluía o Exército, os barões do café de São Paulo, alguns segmentos da oligarquia rural e as novas classes urbanas, cujo crescimento a guerra com o Paraguai tinha propiciado, é iniciado o período de quatro décadas (1890-1930) conhecido como a República Velha. No que diz respeito a economia, o período foi marcantemente, o da produção e comercialização do café.

Contrastando com a expansão havida durante a guerra na década de 1870, a indústria militar apresentou pouco progresso durante a República Velha. As dificuldades eram tanto industriais quanto políticas. A produção naval se estagnou após a formação da República, incapaz de resistir ao duplo gravame da obsolescência tecnológica e da posição política enfraquecida da Marinha.

Em face destas condições políticas e da carência de uma infraestrutura industrial – tal como a que afligia à Marinha - a dependência a fornecedores estrangeiros permaneceu como norma. Empresas da Alemanha, como a Krup, estavam entre os principais fornecedores do Exército, antes da Primeira Guerra, num elo reforçado pelo treinamento de um quadro de jovens oficiais brasileiros na Alemanha no início da década de 1900.

Na virada do século, as Forças Armadas mantinham três arsenais do Exército, três arsenais da Marinha, e três fábricas de munição (uma para cartucho e duas de pólvora). As tentativas de expansão dessa base industrial alcançaram sucesso apenas limitado. Uma moderna Fábrica de Pólvora foi construída em Piquete – SP (1908), hoje Fábrica Presidente Vargas. Paralelamente, o Exército procurou expandir sua fábrica de cartuchos em Realengo – RJ. Um Departamento de Material Bélico foi implementado em 1915, com o propósito de coordenar tais atividades, e o Exército logrou êxito em aumentar a produção das fábricas existentes.

É relevante mencionar que as compras de equipamentos para estabelecer um novo Arsenal de Guerra no Rio de Janeiro, e posteriormente incrementar a produção das fábricas existentes, foram embargadas pela falta de mão de obra especializada e por uma interrupção das importações de maquinário durante a Primeira Guerra.

Durante esse período, foram criados: o Parque de Aeroestação – em Realengo-RJ (1908); Parque de Realengo (Aeronáutica) – RJ (1920); a Companhia Brasileira de Cartuchos (CBC) – SP (1926) e o Parque de São Paulo (Campo de Marte) – SP, destinado à manutenção de aeronaves e de motores (1930).

A década de 1930 assinalou o Primeiro Ciclo Industrial Militar, um momento decisivo, de profundas transformações tanto para a política de segurança quanto para o desenvolvimento industrial no Brasil, com reflexos diretos na industrialização militar do País. A depressão global, que teve um impacto devastador nos lucros das exportações agrícolas e no comércio com o exterior, deflagrou o começo da industrialização com vistas à substituição das importações.

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Guilherme Luiz Passos Miranda Autran

O governo de Getúlio Vargas desempenhou um papel de destaque nesse processo, ao estimular a instalação de indústrias de base durante este período. Assim, foram criadas, a Fábrica do Andaraí – RJ (1932), destinada à fabricação de munição de artilharia; a Fábrica de Curitiba – PR (1933), destinada à fabricação de material hipomóvel e de engenharia; a Fábrica de Juiz de Fora – MG (1933), destinada à fabricação de artilharia; a Fábrica de Itajubá – MG (1933), destinada à fabricação de armamento leve; e o Parque Aeronáutico dos Afonsos – RJ (1933). Em 1936, foi fundada a Fábrica Brasileira de Aviões para a fabricação em série do M-7, que funcionou até 1941, tendo produzido um protótipo e vinte e seis exemplares.

Getúlio Vargas, em 1937, valendo-se do apoio militar – Marinha e Exército - declarou o Estado Novo, lançando as fundações do crescimento industrial, dirigido pelo Estado. Em 1938, foi criada a Fábrica do Galeão - RJ, onde se instalaram as Oficinas Gerais de Aviação Naval e, em 1939, surgiam a Fábrica de Material de Comunicações – RJ e a Taurus, no Rio Grande do Sul. A estabilidade imposta pelo Estado Novo e a ascendente influência política dos militares, traduzida em orçamentos cada vez maiores, propiciaram uma mudança de atitude em relação às necessidades de reequipamento das Forças Armadas.

O Exército começou a montar aviões desenhados no Brasil com motores americanos, enquanto a Marinha montava aviões de treinamento FOCKE WULF com assistência técnica da Alemanha. No final da década de 30, uma linha de montagem de aviões foi iniciada pelo Ministério dos Transportes em Lagoa Santa – MG, passando para o Ministério da Aeronáutica, quando este foi criado em 1941. A construção naval também foi retomada nos últimos anos da década; os estaleiros do Rio de Janeiro lançaram um monitor e caça-minas, e deram início à montagem de três contratorpedeiros projetados nos Estados Unidos.

A Segunda Guerra Mundial estimulou a produção doméstica de armamentos, aumentando o suporte econômico e a pressão política por uma indústria nacional que respondesse ao aumento da demanda. Em Lagoa Santa, foi iniciada a montagem de aviões produzidos nos Estados Unidos – incluindo-se aviões de treinamento Fairchild PT-19B, Vultee BT-15 e North American Texas AT-6. A Fábrica Nacional de Motores também foi instalada e a fabricação de material de defesa atingiu um novo auge.

Até então não se fabricavam, no Brasil, materiais pesados de emprego militar, como canhões, metralhadoras e viaturas blindadas, só possíveis com a implantação no país da indústria siderúrgica pesada. O engenheiro militar Edmundo de Macedo Soares soube liderar esse processo de modernização e, como assessor de Getúlio Vargas, foi o inspirador da construção da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), em 1945.

Como recompensa pela entrada na Segunda Guerra Mundial, os americanos financiaram a construção da Companhia Siderúrgica Nacional, que começou a funcionar em 1946. Cinco anos depois, gerou uma capacidade de produção de aço pesado e especializado que até então não existia.

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Mobilização Nacional e as Indústrias de Defesa

Em 1947, foram criados: a Fábrica de Artefatos da Marinha, o Arsenal da Urca e a Fábrica de Bonsucesso – RJ, a Fábrica de Torpedos e o Centro de Armamento da Marinha, em Niterói – RJ, o Parque Aeronáutico de Belém – PA e o Parque Aeronáutico de Porto Alegre – RS e o Instituto Tecnológico da Aeronáutica – em São José dos Campos – SP, em janeiro de 1950.

Cabe fazer menção ao Acordo de Assistência Militar Brasil-EUA (“Military Assistance Program”), firmado em 1952, solapando por muito tempo os planos dos militares brasileiros para o investimento na produção doméstica.

Na segunda metade dos anos 40, como decorrência natural da 2ª Guerra Mundial, germinou a consciência da importância da pesquisa e desenvolvimento (P&D) para a capacitação e autonomia na obtenção e produção de material bélico: a Força Aérea, com o atual Centro Técnico Aeroespacial, a Força Naval, com o Instituto de Pesquisas da Marinha, e a Força Terrestre, com o Centro Tecnológico do Exército. Assim, o Brasil se desdobrou para desenvolver a tecnologia militar nas décadas de 60, 70 e 80.

O final da década de 80 marcou o apogeu da Base Industrial de Defesa brasileira (BID). Naquele instante, o país atingiu a situação de 5.° exportador mundial como consequência de políticas de fomento em P&D e fomento industrial, muito bem planejadas e executadas nas décadas de 70 e 80. Naquela ocasião, mais de 90% dos meios mobilizados pelo Exército eram fabricados em território nacional.

As principais empresas de capital brasileiro, então formadas, voltadas para aprodução de material de defesa foram: Forjas Taurus S.A., IMBEL, CBC, AVIBRAS, Helibras, Mectron e ENGESA.

A Forjas Taurus S.A., fabricante de armas de fogo, produz revólveres, pistolas, carabinas, armas de pressão e armas policiais, para o mercado interno e internacional, além de equipamentos para motociclismo como capacetes e roupas de proteção contra chuva.

A IMBEL é uma empresa vinculada ao Ministério da Defesa por intermédio do Exército Brasileiro, que a ele fornece armas portáteis, munições, explosivos e equipamentos de comunicações. É também o campo de capacitação dos engenheiros formados pelo Instituto Militar de Engenharia, que adquirem em suas unidades experiência em fabricação e desenvolvimento industrial. Dadas as severas exigências de aprovação pelo Centro Tecnológico e pelo Centro de Avaliação do Exército, a qualidade de seus produtos segue os padrões internacionais consagrados.

A Companhia Brasileira de Cartuchos (CBC) é uma fábrica brasileira de munições e armas que detém praticamente o monopólio da produção de munições no Brasil. Sua composição social é do tipo Economia Mista. Tem uma linha de produção diversificada na área de munições de uso civil, policial e militar.

A AVIBRAS é uma empresa brasileira privada de engenharia, criada em 1961, e que ao longo de 45 anos, vem desenvolvendo e produzindo sistemas e materiais de alta tecnologia, atendendo às necessidades específicas de cada cliente. Pioneira

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no Brasil, no setor aeroespacial, alcançou significativo sucesso ao equipar as Forças Armadas Brasileiras e nações amigas com sistemas de armas avançados. A filosofia da Empresa foi fundamentada no desenvolvimento de novas tecnologias que hoje constituem o seu mais importante patrimônio, um acervo tecnológico de valor inestimável.

A HELIBRAS é a única fabricante brasileira de helicópteros. Responsável pela montagem, venda e pós-venda no Brasil de aeronaves do Grupo Eurocopter, maior fornecedor mundial do setor, controlado pela EADS - European Aeronautic Defence and Space Company, a empresa desenvolve tecnologia de ponta, contribuindo para o fortalecimento da indústria aeronáutica nacional. Está em atividade no Brasil desde 1979 e emprega mais de 300 profissionais. Com uma capacidade de produção de 30 aeronaves por ano, está localizada na cidade de Itajubá (MG), onde são produzidos diversos modelos que atendem aos segmentos civil, governamental e militar.

A MECTRON - Engenharia, Indústria e Comércio S.A. é uma empresa formada pela associação de engenheiros de aeronáutica, eletrônica e mecânica, tendo iniciado suas atividades em fevereiro de 1991. Desde a sua fundação, a empresa dedicou-se a projetos de alto teor tecnológico, atuando nas seguintes áreas: automação industrial, médica, aeronáutica, espacial e defesa. Atualmente, a Mectron é uma empresa brasileira com plena capacitação para o desenvolvimento e fabricação de sistemas inteligentes de defesa, tendo um quadro de funcionários distribuídos em áreas de engenharia, projeto, manufatura e administração.

Dentre as empresas que não mais existem, a que mais se destacou foi a ENGESA - Engenheiros Especializados S/A que controlava um grupo de empresas focado no setor de defesa. Os produtos mais conhecidos foram os veículos blindados EE-9 Cascavel e EE-11 Urutu, os caminhões táticos militares e blindado leve EE-T4 Ogum e o carro de combate EE-T1 Osório. O grupo também fabricava diversos outros proutos, como por exemplo: tratores, rodas, trilhos e vagões, motores, mísseis, foguetes, giroscópios, radares e possuia a única fábrica de munição pesada do Brasil.

3 FASE ATUAL

O Brasil possui uma conjuntura política e econômica de grande destaque no contexto internacional, exigindo uma nova atitude frente ao campo de defesa. Para trabalhar dentro desse novo contexto, enfoca-se o marco regulatório de 25 de julho de 2005 que aprova a Política Nacional da Indústria de Defesa – PNID. É bom dizer que o desenvolvimento da Base de Indústria de Defesa – BID exerce influência direta sobre a capacidade de um Estado melhor desempenhar a função de Defesa Nacional. Por essa razão, as políticas voltadas para o incremento da Indústria de Defesa devem estar em conformidade com a Estratégia Nacional de Defesa de um país.

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Mobilização Nacional e as Indústrias de Defesa

Relativamente ao Brasil o Decreto n.º 6.703, de 18 de dezembro de 2008, estabelece e aprova a Estratégia Nacional de Defesa organizada em três tópicos.

O primeiro diz respeito à reestruturação das Forças Armadas como medida de aprimorar o que lhe é previsto na Constituição, assim como aprimorar as suas atribuições de paz e guerra.

O segundo aborda a reorganização da Indústria Nacional de Material de Defesa, de modo a assegurar que o atendimento das necessidades de equipamento das Forças Armadas sustente-se em tecnologia sob o domínio nacional.

O último trata da composição dos efetivos das Forças Armadas, conglomerando o assunto sobre o futuro do Serviço Militar Obrigatório.

Releva destacar que uma Base de Indústria de Defesa Nacional (BID), fortemente estruturada, emancipa o país da dependência externa em suas necessidades de produtos e serviços de defesa, além de promover inúmeros benefícios econômicos.

Tais assertivas podem ser manifestadas através da geração de empregos, na área tecnológica, na criação de produtos duais e na economia de divisas.

Outro fator determinante para o desenvolvimento da Indústria de Defesa são os indicadores de inovação dos países desenvolvidos, os quais se encontram superiores à média nacional. Como se pode observar, o futuro da base de defesa tecnologicamente sólida está diretamente ligado à necessidade de serem solucionados problemas de intervalo dos orçamentos para pesquisa e desenvolvimento no Brasil, sempre considerando a ampliação do montante investido.

O orçamento para a Defesa Nacional alcança a iniciativa privada e as parcerias geoestratégicas intergovernamentais.

Tudo porque as demandas de defesa compõem um sistema que envolve atores públicos e privados, com reflexos no preparo dos meios militares, no poder dissuasório do país, na percepção que o exterior tem do país e na economia nacional.

A singularidade do orçamento de defesa transcende o binômio aumento-redução de recursos.

A instabilidade e a descontinuidade do fluxo de recursos para custeio e investimentos das Forças Armadas são práticas prejudiciais ao planejamento e a execução de projetos estratégicos concebidos em cronogramas definidos com diversos atores públicos e privados.

Essa instabilidade e descontinuidade provocam aumento de custos e levam os meios militares à obsolescência em decorrência da defasagem tecnológica, que pode ocorrer mesmo antes da conclusão dos processos de aquisição.

Por conseguinte, é necessária a fixação de um parâmetro real e factível para as despesas (custeio e investimentos).

Devem-se afastar, de forma seletiva, os contingenciamentos para proporcionar um planejamento adequado ao exercício das atribuições constitucionais das FFAA.

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Ao mesmo tempo, é necessário estabelecer mecanismos que, sem prejudicar as atividades convencionais das FFAA, propiciem ao Poder Público a alocação de recursos adicionais, para atender às demandas de ampliação da capacidade dissuasória e de desenvolvimento tecnológico do País.

A intenção consiste em estabelecer um modelo compatível com a projeção internacional do Brasil e com as demandas internas dirigidas às atividades desempenhadas pelas FFAA, a compreender o planejamento de curto, médio e longo prazos que garanta a aplicação regular de recursos.

Recursos para as despesas de pessoal e para a amortização e encargos da dívida não seriam incluídos na proposta, pois pertencem a campos específicos da Administração Pública.

A Estratégia Nacional de Defesa - END (Decreto 6.703, de 18.12.2008) contempla, como um dos seus eixos estruturantes, a obrigação de reorganizar a indústria de defesa, para poder garantir a exigível autonomia operacional requerida para o exercício das competências atribuídas às FFAA, atrelada ao desenvolvimento tecnológico nacional.

O mercado de produtos de defesa apresenta algumas singularidades, dentre as quais podem ser destacadas:

Alto valor agregado;•Fortes investimentos em pesquisa e desenvolvimento; •Longo prazo de maturação;•Comercialização restrita e altamente regulada;•Produção dependente das compras governamentais. •

Tal amplitude e características explicam a necessidade de um projeto específico voltado para consolidar a capacidade de produzir e promover equipamentos e materiais de defesa.

A Estratégia Nacional de Defesa define uma política pública norteando as ações estratégicas a serem seguidas visando o fortalecimento do poder militar, com os seus equipamentos decorrentes.

Assim sendo, poderão ser implementadas as várias ações que se seguem, sendo que algumas delas já estão em curso:

a) Fortalecimento do Poder Naval:Programa de desenvolvimento de submarinos (PROSUB)•Outros meios (construção de 6 fragatas)•Navios (patrulha oceânico e costeiro e de propósitos múltiplos) •Aviões•Helicópteros•Veículos aéreos não tripulados (VANT)•Meios de fuzileiros navais para duas divisões anfíbias (efetivos e material •

bélico). A Marinha já recebeu no serviço ativo a corveta V-34 “Barroso”, adquiriu dois

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Mobilização Nacional e as Indústrias de Defesa

navios desembarque-doca (NDD) usados, ex-Royal Navy; conclui a construção de 2 navios patrulha de 500 ton. e prepara licitação para mais 4 unidades da mesma classe. Foram adquiridas 4 unidades do helicóptero Sea Hawk SH-70, com opção para mais 2 unidades. Acordo com a França para a construção de 6 fragatas da classe FREMM e 4 submarinos da classe Scorpene. O Brasil se associou à África do Sul para o desenvolvimento conjunto do míssil ar-ar A-Darter e do veículo aéreo não tripulado Bateleur.

b) Fortalecimento do Poder Terrestre:Programa de Mobilidade Estratégica helicópteros•Programa Combatente Brasileiro (COBRA) •Veículos Aéreos Não Tripulados (VANT)• Guarani III•Programa Amazônia Protegida•Programa Sentinela da Pátria•

O Exército Brasileiro acelera o processo de desenvolvimento da família de veículos blindados de transporte sobre rodas VBTP; inicia o processo de modernização dos M-113B e está concluindo o processo de aquisição dos MBT Leopard 1A5. A obtenção de obuseiros Oto Melara de 105 mm e L-118 Light Gun e a chegada de alguns exemplares do morteiro de 120 mm, nacional revitalizam um pouco a artilharia de campanha. Há estudos para a aquisição de mísseis antiaéreos de médio alcance, que complementaria os mísseis de curto alcance Igla. Espera-se que a arma leve anticarro (ALAC) e o míssil anticarro MSS 1.2, ambos os projetos nacionais coordenados pelo CTEx, sejam em breve produzidos em larga escala.

c) Fortalecimento do Poder Aéreo:Aquisição de aeronaves de caça (F-x2)•Desenvolvimento de aeronaves de transporte/reabastecimento em vôo •

(KC-390-Embraer)Desenvolvimento e Lançamento do veículo lançador de Satélites (VLS)•Modernização do centro de lançamento de Alcântara•Veículos Aéreos Não Tripulados (VANT)•Helicópteros•

A Força Aérea reativou o Projeto FX e já anunciou os três finalistas: F-18E Super Hornet, Rafale C e Gripen NG, e aguarda a decisão final. Completou sua dotação de F-5E/F adquirindo 11 unidades usadas da Jordânia, recebeu 6 helicópteros UH-60L Black Hawk e colocou uma proposta de aquisição de mais 15 unidades. A grande novidade fica por conta da montagem no país dos helicópteros de transporte franceses EC-725 Super Cougar, com uma encomenda inicial de 51 aeronaves, sendo 17 para cada uma das três Armas; a primeira unidade chegou em 2010. A modernização dos caças leves AMX/A-1 foi aprovada e a primeira aeronave já foi entregue à Embraer. Os aviões de patrulha marítima Lockheed P-3 Orion deverão ser entregues ao serviço ativo. Foram adquiridos casulos de navegação e ataque

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Litening III e de interferência eletrônica Skyshield, pequenos lotes de mísseis ar-ar Derby e Python IV, e a FAB finaliza a compra de 12 helicópteros de ataque Mil Mi-35M russos.

A BID (Base Industrial de Defesa) é o conjunto das empresas estatais e privadas, (organizações militares e civis), que participam de uma ou mais das etapas de pesquisa, desenvolvimento, produção, distribuição e manutenção de produtos estratégicos de defesa (bens e serviços).

A ABIMDE (Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança) é uma entidade civil, sem fins lucrativos, que congrega as empresas do setor de material de emprego militar com a finalidade de patrocinar, promover e representar seus interesses e objetivos comuns, visando ao engrandecimento social e econômico do País. Atua no relacionamento entre as Indústrias e os órgãos governamentais, procurando agilizar e incentivar a comercialização, o desenvolvimento e a qualidade dos produtos brasileiros.

A missão da ABIMDE é congregar, representar e defender os interesses das empresas associadas, contribuindo para a formulação de políticas públicas, para o setor de Defesa e também a criação e manutenção de uma Base Industrial, Logística, Científica, Tecnológica & Inovação forte e saudável, voltadas para a Defesa, em consonância com os objetivos de soberania nacional e da Constituição Brasileira.

Atualmente, a ABIMDE conta com mais de cem associadas, a seguir relacionadas:

ATEM E REMER - ACUMULADORES MOURA - AEL AEROELETRÔNICA – AGRALE - AGS- AGUSTA WESTLAND- AIRCRAFT – AKAER – ANCORATEK - ARES – ARMTEC – ASU – ATECH ATMOS – ATRASORB - AVIBRAS - BAE Systems do Brasil – BCA – BERTONI – BLUEPEX - BOMBAS TRIGLAU – BOXFILE - BRASILIA MOTORS LTDA – BRASILSAT – BRASTECH – BRAVIO – CBC - CELLIER Alimentos – COLUMBUS – COMTEX – CONDOR – CONNECTION – DATAPOOL – DCNS - DGS Industrial Ltda. - DIANA PAOLUCCI I –DIGEX – DIMENSãO – DOX - DSND CONSUB – EADS - EAE Soluções Aeroespaciais –ELIMCO – EMBRAER – EMGEPRON – EMITER – ENGEFOOD - ENGEMOTORS –EQUIPAER - ESTALEIRO EISA – ESYSTECH – EUROBRAS - FAER Fazenda da Aeronáutica - FIRST WAVE – FLEXPRIN – FLIGHT - FLIR – FOCALENG - TAURUS FRIULI - FRONT RUBBER - FUNDAÇãO ATECH GARDY GEHR - GE SPI – GIGACOM GLIGIO- H2 LIFE BRASIL - HAGA TEC - HB DEFENSE - HB HOSPITALAR – HELIBRÁS - HOBECO – IACIT – IAS - IBQIDS ENGENHARIA SISTEMAS LTDA – IMBEL - INACE INBRAFILTRO – INDIOS – INFAX - ITA KRYPTUS – LARRUCE – LEAP - LEISTUNG LOGITEC – LOGSUB - MAGMEC – MASTER – MECTRON – NAVTEC - NOVA CONSTAL ODEBRECHT – OMNISYS – OPENCADD - OPTOVAC -ORBISAT - PATRULHA PERISCóPIO - PINHO & BRITO - POLY DEFENSOR – POWERPACK - PRENSAS SCHULER - PRESSTÉCNICA – RC - RENK ZANINI - RF COM - RHINO TECH - RJC RUFEX SANTOS LAB –SATURNIA - SATURNO SCHMID - SELEX-SI - SKM SOLUTIONS DESIGN – SPACECOMM – SPECTRA – SSELL- TAP - TAROB -TAURUS BLINDAGENS TECHLABOR - THYSSENKRUPP - TROPICAL - TURBOMECA - UNIMIL –

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Mobilização Nacional e as Indústrias de Defesa

UNIVERSAL – VBJ - VERTICAL DO PONTO - VISION MARINE – VITRUS – VJF - WELSER ITAGE.

Estas empresas integrantes do Complexo Industrial de Defesa têm como:Objetivos• - Recuperar e estimular o crescimento da base industrial instalada,

ampliando o fornecimento para as Forças Armadas Brasileiras, o emprego dual e as exportações.

Metas • - Investir R$ 1,4 bilhão em modernização e PD&I, assim previsto: a partir de 2010, elevar em 50% o fornecimento nacional nas compras de defesa; em 2020, elevar em 80%.

Desafios• - Aumentar os investimentos em PD&I; Promover isonomia tributária em relação aos produtos/materiais importados; Expandir a participação nos mercados interno e externo; Fortalecer a cadeia de fornecedores no Brasil.

Diante do cenário atual constata-se uma intenção nacional de tornar o segmento industrial compatível com a Estratégia Nacional de Defesa e consequente preparo para uma eventual mobilização do país.

4 CENÁRIO PROSPECTIVO (MOBILIZAÇÃO)

Um país como o Brasil, de grandes proporções continentais e incontáveis riquezas, nas suas diferentes formas, como: biodiversidade, minérios, recursos do mar (inclusive o pré-sal), possuidor das maiores reservas de água potável do mundo e enorme potencial de energia hidroelétrica (limpa), frente aos constantes interesses internacionais, por essas riquezas, deve dispor de alto poder dissuasório. demonstrado por efetivo potencial de defesa e estar provido da capacidade de promover imediata mobilização.

Um Estado que se projeta no cenário mundial desperta ambições e suscita novos interesses que podem resultar em áreas de atrito com a possibilidade de gerarem antagonismos.

Atender às necessidades surgidas por deflagração de conflito armado e despender os recursos que essa situação exige, depende, fundamentalmente, da capacidade do Poder Nacional e do Potencial Nacional Utilizável.

A grave crise econômica mundial deixou profundas sequelas na já combalida situação financeira de diversos países de nosso continente, que tentam agora retomar o caminho do crescimento e estabilização de suas economias. O Brasil, talvez, tenha sido, em nível global, um dos menos atingidos e que mais rapidamente conseguiu sair dela. A partir de 2011, com novos governos, Brasil, Chile e Colômbia, trazem incertezas sobre como será conduzida a defesa, já que as prioridades e interesses de um governo não são necessariamente as mesmas do governo que assume um novo mandato. No Peru, o movimento guerrilheiro Sendero Luminoso, que parecia desmobilizado, volta a promover atentados e a trazer preocupação às autoridades, que estão reforçando algumas unidades militares para fazer

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Guilherme Luiz Passos Miranda Autran

frente a esta ameaça. A Colômbia, sempre com o apoio dos Estados Unidos, está conseguindo infringir sérios danos à estrutura das FARC, eliminando seus principais líderes e desmobilizando boa parte de suas forças. Hugo Chávez continua tentando disseminar sua “revolução bolivariana”, mas apesar de conseguir conquistar fiéis seguidores como os presidentes da Bolívia e do Equador, tudo não tem passado de uma mera figura de retórica, pura ilusão de, um ditador populista.

O Brasil, com 8.514.877 km2, é o quinto país em superfície do mundo, sendo a sexta economia do globo, apresentando em 2010 um PIB de 1.797 bilhões de dólares. No que concerne ao poder militar, o nosso país é classificado como o primeiro no “ranking” da América do Sul.

Ranking do Poder Militar na América do Sul - 2009 / 2010

País Exército (pontos)

Marinha (pontos)

Força Aérea (pontos)

Efetivos / Pop. (pontos)

G.M. / PIB

(pontos)

EDN (pontos)

P.E. (pontos)

Total de

pontos Ranking

Brasil 289 139 272 10 40 35 35 820 1º

Chile 201 94 108 40 50 33 15 541 2º

Peru 199 96 106 30 30 5 15 481 3º

Colômbia 80 62 170 40 50 15 15 432 4º

Argentina 143 93 71 10 20 10 25 372 5º

Fonte: Military Power Review

4.1 A MOBILIZAÇãO NACIONAL NO CASO DE AGRESSãO ESTRANGEIRA.

O conceito de Mobilização Nacional, segundo o Ministério da Defesa:

Conjunto de atividades planejadas, orientadas e empreendidas pelo Estado, complementando a Logística Nacional, destinadas a capacitar o País a realizar ações estratégicas, no campo da Defesa Nacional, diante de agressão estrangeira.

A mobilização nacional, em havendo agressão estrangeira, é decretada pelo Presidente da República, conforme preceitua a Constituição Federal. Dispõe a nossa

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Mobilização Nacional e as Indústrias de Defesa

Carta Magna: Art. 84.

Compete privativamente ao Presidente da República: XIX - declarar guerra, no caso de agressão estrangeira, autorizado pelo Congresso Nacional ou referendado por ele, quando ocorrida no intervalo das sessões legislativas, e, nas mesmas condições, decretar, total ou parcialmente, a mobilização nacional.

4.2 FASES DA MOBILIZAÇãO

Conforme o pensamento da ESG, as atividades de mobilização devem se desenvolver, tanto em situação de normalidade como nas situações de emergência, em duas fases sucessivas: a do Preparo e a da Execução.Preparo• : “Conjunto de atividades planejadas, empreendidas ou orientadas pelo Estado, desde a situação normal, visando a facilitar a Execução da Mobilização Nacional.”Execução• :“Conjunto de atividades que, decretada a Mobilização, são empreendidas pelo Estado, de modo acelerado e compulsório, a fim de transferir meios existentes no Poder Nacional e promover a produção oportuna de meios adicionais.”

4.3 MOBILIZAÇãO E AS EXPRESSÕES DO PODER NACIONAL, SEGUNDO A ESG:

Política• – “Conjunto de atividades planejadas, empreendidas ou orientadas pelo Estado, desde a situação normal, com o propósito de adaptar o ordenamento jurídico-institucional, para fazer em face de uma situação de emergência, decorrente da declaração de Estado de Guerra ou resposta à agressão armada estrangeira” Econômica• – “Conjunto de atividades de natureza econômica, planejadas, empreendidas ou orientadas pelo Estado, desde a situação normal, visando à transformação da Economia de Paz em Economia de Guerra (nova condição operacional a que a Economia de Paz é conduzida pelo governo, mediante a utilização de instrumentos e medidas apropriados, visando a atender, oportuna e adequadamente, as necessidades da Nação, em tempo de Guerra), para fazer face à situação de emergência decorrente da declaração de estado de guerra ou resposta à agressão armada estrangeira. A Mobilização Industrial, parte da mobilização econômica, é o conjunto de atividades planejadas, empreendidas ou orientadas pelo Estado, no quadro da Mobilização Nacional, desde a situação normal, com o propósito de possibilitar a adequação da capacidade industrial da Nação ao atendimento das

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Guilherme Luiz Passos Miranda Autran

necessidades militares e civis, determinadas por uma situação de emergência decorrente da declaração de estado de guerra ou resposta à agressão armada estrangeira”Psicossocial – “Conjunto de atividades planejadas, empreendidas ou realizadas pelo Estado, desde a situação normal, com o propósito de preparar a Nação, social e psicologicamente, para fazer face a uma situação de emergência decorrente da declaração de estado de guerra ou resposta à agressão armada estrangeira”Militar – “Conjunto de atividades planejadas, empreendidas ou orientadas pelo Estado, desde a situação normal, com o propósito de preparar a Expressão Militar para a passagem da estrutura de paz para a estrutura de guerra, em face de uma situação de emergência decorrente da declaração de estado de guerra ou resposta à agressão armada estrangeira.”Científico-Tecnológica – “Conjunto de atividades planejadas, empreendidas ou orientadas pelo Estado, desde a situação normal, com o propósito de preparar a Nação, científica e tecnologicamente, para fazer face à situação de emergência, decorrente da declaração de estado de guerra ou resposta à agressão armada estrangeira”

Cabe dizer que terminados os motivos que determinaram a execução da mobilização, o país retornará à normalidade, não podendo o Estado manter os recursos do Poder Nacional voltados, prioritariamente, para a Segurança Nacional tendo que promover a desmobilização nacional.

Pode-se conceituar a desmobilização nacional, como: “O conjunto de atividades planejadas, empreendidas ou orientadas pelo Estado, visando ao retorno gradativo da Nação à situação normal, uma vez cessados ou reduzidos em sua intensidade os motivos determinantes da execução da mobilização nacional.

4.4 - O SISTEMA NACIONAL DE MOBILIZAÇãO (SINAMOB)

Os órgãos encarregados do planejamento da mobilização estão previstos para trabalhar em uma união sistêmica, chamada de Sistema Nacional de Mobilização (SINAMOB). O conceito do Sistema Nacional de Mobilização é o seguinte: “Conjunto de órgãos que, atuando de modo ordenado e integrado, objetiva planejar e realizar todas as fases da Mobilização e da Desmobilização Nacionais.”

Ressalta-se que, para se ter uma mobilização nacional efetiva, precisa-se de ter programas de mobilização e projetos inovadores, contínuos, como a participação ativa da indústria nacional, desde a concepção do projeto até a solicitação de demandas comuns (garantia de compra pelo governo) entre as três Forças Armadas, a existência da dualidade militar-civil e a ampliação da competitividade da indústria nacional.

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Mobilização Nacional e as Indústrias de Defesa

4.5 MOBILIZAÇãO MILITAR NO CASO DE AGRESSãO EXTERNA:

Neste caso, a mobilização deverá ser planejada de modo a assegurar os recursos necessários à rápida transformação estrutural das Forças Armadas, fornecendo-lhes pessoal com habilitações requeridas, para preenchimento de claros, além do material na qualidade e especificação solicitadas.

Medidas Imediatas:Convocação imediata da reserva apta;•Adequação das indústrias para a produção de material bélico;•Incremento na produção de produtos de defesa. •

Marinha:Negação do uso do mar•Utilização de submarinos convencionais e de propulsão nuclear;•Emprego de aeronaves nacionais e estrangeiras (todos os meios •disponíveis), de

ataque e de defesa;Controle de áreas marítimas;•Projetar poder em terra.•

Exército:Emprego do módulo de Brigada em todos os seus modais para a •ocupação

(mobiliar) as possíveis áreas de conflito;Utilização de tecnologias vigilância, localização e posicionamento por •satélites;Operar em guerra convencional;•Combater em guerra não convencional (estratégia da resistência).•

Força Aérea:Incrementar a vigilância aérea;•Assegurar superioridade aérea local;•Combater integrada à Marinha e ao Exército, em todo o território •nacional;Dominar as tecnologias para plataformas, sistemas de armas, cartografia, •

inteligência, operação em rede, VANT e atividades espaciais.

5 CONCLUSÃO

O fortalecimento do Poder Militar, com equipamentos decorrentes da necessidade de manter-se em estado permanente de alerta, esbarra nos óbices financeiros para a consecução desse objetivo nacional. O contingenciamento de recursos orçamentários, por exemplo, leva a que se tenha a trivial ideia de uma fatia do orçamento fixada e “blindada” com relação a remanejamentos.

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Guilherme Luiz Passos Miranda Autran

Assim sendo, livres de fatores adversos e antagonismos e com planos que prevejam com precisão os recursos econômico-financeiros necessários e suficientes à sua execução, poderão ser implementadas várias ações visando a propiciar o aumento do Poder Militar, sendo que algumas delas já estão em curso como a Estratégia Nacional de Defesa.

Com a política de incremento da Indústria Nacional de Defesa, com incentivos fiscais, segundo Medida Provisória n.º 544 de 29/09/2011, que estabelece normas especiais para as compras, será possível manter as empresas de material bélico em ritmo regular de funcionamento, assegurando o mercado de trabalho aos respectivos funcionários e permitindo o cumprimento dos cronogramas de entrega.

A produção de materiais bélicos de maior valor agregado, com início de um processo de transformação para exportação sem dependência de tecnologia externa nos componentes de seus produtos, e ainda com uma produção dual, visando a fatias de mercado de produtos civis e militares, será o grande passo para fomentar o desenvolvimento da nossa Base Industrial de Defesa.

Referências

ASSOCIAÇãO BRASILEIRA DAS INDÚSTRIAS DE MATERIAIS DE DEFESA E SEGURANÇA – ABIMDE. São Paulo, 2011. Disponível em: www.abimde.org,br

BARROS, Paulo Cesar Martins. A mobilização nacional e a indústria de material de defesa no brasil. Rio de Janeiro: ESG, 2008.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, Brasília, DF: Senado, 1988.

______. Decreto n.º 6.592, de 2 de outubro de 2008. Regulamenta a Lei 11.631, de 27 de dezembro de 2007. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_.../2008/Decreto/D6592htm.

______. Decreto nº 6.703, de 18 de dezembro de 2008. Aprova a Estratégia Nacional de Defesa, e dá outras providências. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03_.../2008/Decreto/D6703.

______. Lei nº 11.631, de 27 de dezembro de 2007. Dispõe sobre a Mobilização Nacional e cria o Sistema Nacional de Mobilização (SINAMOB). Brasília, DF. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007.../2007/lei/11631htm.

______. Medida Provisória n.º 544, de 29 de setembro de 2011. Estabelece normas especiais para as compras, as contratações de produtos, de sistemas de defesa, e

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Mobilização Nacional e as Indústrias de Defesa

de desenvolvimento de produtos e de sistemas de defesa, e dispõe sobre regras de incentivo à área estratégica de defesa e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF. Seção 1.

______. Ministério da Defesa. Livro branco de defesa nacional. Brasília, DF, 2011.

______. Portaria Normativa nº 899/MD, de 19 de julho de 2005. Aprova a política nacional da indústria de defesa. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 20 jul. 2005. Seção 1.

______. Portaria Normativa nº 586/MD, de 24 de abril de 2006. Aprova as ações estratégicas para a implementação da política nacional da indústria de defesa. Diário Oficial da União, Brasília, DF. Seção 1, p.9.

DELLAGNEZZE, René. 200 anos da indústria de defesa no Brasil - categoria: geografia e história do Brasil. Brasília, DF: Editora Universitária, 2011. Disponível em: www.defesa.ufjf.br.

ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA (Brasil). Manual básico: elementos fundamentais. Rio de Janeiro, 2009.

______. Manual básico: Assuntos específicos. Rio de Janeiro, 2009.

SILVA, Maria Aparecida da. A Capacidade industrial brasileira de material de defesa: perspectivas para uma mobilização. Rio de Janeiro: ESG, 1999.

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Maria Inês da Penha Gaspar

A MOBILIZAÇÃO DE BENS E SERVIÇOS SOB A ÓTICA DO DECRETO-LEI N.º 4.812 DE 08/10/1942

Maria Inês da Penha GasparDesembargadora do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, estagiária do Curso de Logística e Mobilização Nacional da Escola Superior de Guerra, em 2011.

Resumo

O objetivo do presente trabalho é examinar a legislação envolvendo a requisição de serviços e bens móveis e imóveis de propriedade particular, no caso de Mobilização Nacional, sob a ótica do Decreto-Lei n.º 4.812 de 08 de outubro de 1942. Procurou-se, inicialmente, apresentar o contexto histórico e a cronologia da legislação constitucional e infraconstitucional sobre o tema antes ventilado. Buscou-se, ainda, conceituar a Mobilização Nacional e a requisição de serviços e bens imóveis ou móveis dentro do Sistema Constitucional Brasileiro e da legislação infraconstitucional, comparando-se, inclusive, com o que ocorre em outros países, para uma melhor visão da questão. Por fim, procurou-se dar uma descrição genérica dos principais tipos de bens sujeitos à requisição, bem como da execução e eventuais direitos decorrentes desta. Concluiu-se que, embora o Decreto-Lei n.º 4.812 de 08/10/42 seja portador de situações que se fariam presentes até o momento, a legislação necessita de adequações à realidade atual brasileira. A metodologia aplicada consistiu, basicamente, na coleta de informações através de pesquisa realizada por meios vários, em especial, literatura disponível, legislação, sites de internet, jornais e revistas. Não houve, contudo, intenção de se esgotar o tema, merecendo ser ressalvado que a matéria comporta debates.

Palavras-chave: Mobilização Nacional; Requisição; Serviços; Bens móveis e imóveis; Decreto-Lei n.º 4.812 de 08/10/1942.

1 INTRODUÇÃO

Nos termos do artigo 2.º, I da Lei n.º 11.631/2007, considera-se mobilização nacional “o conjunto de atividades planejadas, orientadas e empreendidas pelo Estado, complementando a Logística Nacional, destinadas a capacitar o País a realizar ações estratégicas, no campo da Defesa Nacional, diante de agressão estrangeira”.

A mobilização nacional representa, assim, “o grau de aptidão que tem uma Nação para, em tempo oportuno, passar de uma situação de paz para uma de guerra, com o máximo de eficácia e o mínimo de transtornos para a vida nacional”53.

53 BRASIL. Escola Superior de Guerra. Mobilização nacional. Rio de Janeiro: ESG, 1997. NCE 70-97.

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A Mobilização de Bens e Serviços Sob a Ótica do Decreto-Lei Nº 4.812, de 8/10/1942

No Brasil, em decorrência da relativa tranquilidade no território nacional, pontuado apenas pelas Guerras da Cisplatina, do Prata, do Uruguai, e do Paraguai, todas ocorridas na região de fronteira, no período que vai da Declaração de Independência até a Segunda Guerra Mundial, tem-se que somente em 1942, com a entrada no Brasil neste conflito, começou-se efetivamente a discutir e legislar sobre mobilização nacional, aí incluído o Decreto-Lei n.º 4.812 de 8 de outubro de 1942, objeto do presente trabalho, o qual dispõe sobre a requisição de serviços e bens móveis e imóveis necessários às Forças Armadas e à defesa passiva da população.

Constatando-se, pois, que a citada Lei data de quase 70 (setenta) anos, afigura-se imperioso analisar a eventual necessidade de seu aprimoramento, mormente diante do quadro conjuntural nacional e internacional, em que despontam pressões dominantes envolvendo o domínio da Amazônia. São pressões devidas à grande importância estratégica da região por seu potencial hídrico, por sua rica biodiversidade e, ao mesmo tempo, à necessidade de se monitorar uma área de baixa densidade demográfica, de difícil acesso, cujas fronteiras encontram-se suscetíveis ao tráfico internacional de drogas e ameaças terroristas. Entre essas ameaças estão as das FARC e do ressurgimento do Sendero Luminoso, principalmente diante do novel movimento bolivariano revolucionário, fundado pelo atual Presidente da Venezuela Hugo Chávez. Além disso, há o interesse por combustíveis e bens minerais estratégicos, tais como o petróleo da camada do pré-sal e o Nióbio, elemento considerado essencial para conferir melhorias a ligas de aço utilizadas em turbinas de aviões, do qual o Brasil detém mais de 91% das reservas mundiais conhecidas.

O presente trabalho abrangerá, assim, a conceituação e aspectos históricos sobre a mobilização nacional e a requisição de serviços e bens, além da cronologia da legislação pertinente, comparando-as, ainda, com o que ocorre em outros países. Assinalar-se-á quem pode exercer a requisição dentro do Sistema Constitucional Brasileiro, bem como será apresentada uma visão genérica dos principais tipos de bens sujeitos à requisição, sua execução e eventuais direitos decorrentes do exercício desta, tecendo, em sua conclusão, algumas sugestões para elaboração de legislação atual a respeito.

2 ASPECTOS HISTÓRICOS SOBRE A MOBILIZAÇÃO NACIONAL E A REQUISIÇÃO DE SERVIÇOS E BENS PARTICULARES

Em que pese algumas ações isoladas nos séculos XVII (Rei Gustavo II Adolfo da Suécia) e XVIII (Frederico II da Prússia), apenas no início do século XIX, as nações ocidentais começaram a despender maior atenção à importância das atividades de mobilização nacional, mormente diante dos reveses sofridos pelos inúmeros conflitos armados de longa duração que assolavam a Europa, desde o século anterior, destacando-se nesse período os ensinamentos do General Gerhard Johann David

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Maria Inês da Penha Gaspar

Von Scharnhorst, do General Carl Phillip Gottlieb Von Clausewitz, do Barão Antoine-Henri Jomini e do Marechal de Campo Helmuth Karl Bernhard Graf Von Moltke.

No âmbito brasileiro, observa-se que, antes do advento da Segunda Grande Guerra, a legislação nacional apenas tangenciava a matéria envolvendo mobilização nacional, estabelecendo a Constituição Imperial de 1824, de forma singela, em seu artigo 36, II ser “privativa da Câmara dos Deputados a iniciativa sobre recrutamentos”, bem como em seu artigo 145 que “todos os brasileiros são obrigados a pegar em armas, para sustentar a independência e integridade do Império, e defendê-lo dos seus inimigos externos ou internos”.

Por sua vez, a Constituição Republicana de 1891 normatizou, em seu artigo 34, item 18, a competência privativa do Congresso Nacional para “legislar sobre a organização do Exército e da Armada”; e no item 20, do mesmo artigo, para “mobilizar e utilizar a guarda nacional ou milícia cívica, nos casos previstos pela Constituição”, prevendo em seu artigo 80, a possibilidade de declaração de estado de sítio e a consequente suspensão das garantias constitucionais, nos seguintes termos:

Art. 80 - Poder-se-á declarar em estado de sítio qualquer parte do território da União, suspendendo-se aí as garantias constitucionais por tempo determinado quando a segurança da República o exigir, em caso de agressão estrangeira, ou comoção intestina (art. 34, n.º 21). § 1º - Não se achando reunido o Congresso e correndo a Pátria iminente perigo, exercerá essa atribuição o Poder Executivo federal (art. 48, n.º 15). § 2º - Este, porém, durante o estado de sítio, restringir-se-á às medidas de repressão contra as pessoas a impor: 1º) a detenção em lugar não destinado aos réus de crimes comuns; 2º) o desterro para outros sítios do território nacional. § 3º - Logo que se reunir o Congresso, o Presidente da República lhe relatará, motivando-as, as medidas de exceção que houverem sido tomadas. § 4º - As autoridades que tenham ordenado tais medidas são responsáveis pelos abusos cometidos.

Posteriormente, o Código Civil promulgado em 1º de janeiro de 1916, dispôs expressamente, sobre a requisição da propriedade particular, na forma do artigo 80 da citada Constituição de 1891, sendo o primeiro diploma legal a estabelecer o direito do proprietário à indenização, in verbis:

Art. 591. Em caso de perigo iminente, como guerra ou comoção intestina (Constituição Federal, art. 80), poderão as autoridades competentes usar da propriedade particular até onde o bem público o exija, garantido ao proprietário o direito à indenização posterior.Parágrafo único. Nos demais casos o proprietário será previamente indenizado, e, se recusar a indenização, consignar-se-lhe-á judicialmente o valor.

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A Mobilização de Bens e Serviços Sob a Ótica do Decreto-Lei Nº 4.812, de 8/10/1942

Vale ressaltar que, a requisição, como se verá mais adiante, é uma das formas de execução da Mobilização Nacional, dentre outras, especificadas no artigo 4.º, parágrafo único e seus incisos da Lei n.º 11.631, de 27 de dezembro de 2007, e que são: a) convocação dos entes federados para integrar o esforço da Mobilização Nacional; b) a reorientação da produção, da comercialização, da distribuição e do consumo de bens e da utilização de serviços; c) a intervenção nos fatores de produção públicos e privados; e d) a convocação de civis e militares.

A Constituição de 1934 foi a primeira que, expressamente, disciplinou a requisição da propriedade particular, mantendo em seu texto (artigo 113, item 17) a previsão de indenização ulterior, nos moldes do artigo 591 do Código Civil de 1916, na forma abaixo reproduzida:

Art. 113 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, subsistência, segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes: (...)17) É garantido o direito de propriedade, que não poderá ser exercido contra o interesse social ou coletivo, na forma que a lei determinar. A desapropriação por necessidade ou utilidade pública far-se-á nos termos da lei, mediante prévia e justa indenização. Em caso de perigo iminente, como guerra ou comoção intestina, poderão as autoridades competentes usar da propriedade particular até onde o bem público o exija, ressalvado o direito à indenização ulterior.

A Constituição de 1937 nada dispôs sobre a matéria, em que pese tenha sido justamente sob a sua vigência que se deu a única Mobilização Nacional da história do País, em decorrência da entrada no Brasil na 2.ª Guerra Mundial, em 1942. Nesse diapasão, em razão da ausência de normas regulamentando a matéria, fez-se necessário uma intensa atividade legiferante por parte do Poder Executivo, por meio de Decretos-Lei, dentre estes o Decreto-Lei n.º 4.812/42, objeto de análise pelo presente trabalho, posteriormente alterado pelos Decretos-Lei n.os 5.451/43 e 5.453/43, e complementado pelos Decretos-Lei n.os 5.999/43 e 7.315-A/45.

Curiosamente, em 15.10.1945, o Decreto-Lei n.º 8.090 declarou insubsistente o Decreto-Lei n.º 4.812/42, contudo, poucos dias após, na data de 03.11.1945, foi editado o Decreto-Lei n.º 8.158, o qual revogou o Decreto-Lei n.º 8.090/45, revigorando o aludido Decreto-Lei n.º 4.812/42, que se encontra em vigor até hoje.

A Constituição de 1946 resgatou em seu artigo 5.º, XV, a competência da União para legislar sobre requisições civis e militares em tempo de guerra, bem como em seu artigo 141, §16.º, a possibilidade de as autoridades competentes se utilizarem da propriedade particular, “em caso de perigo iminente, como guerra ou comoção intestina, se assim o exigir o bem público, ficando, todavia, assegurado o direito a indenização ulterior”, dispositivos estes mantidos na Constituição de 1967, sob o manto dos artigos 8.º, XVII, alínea “g” e 150, §22.º, respectivamente.

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Maria Inês da Penha Gaspar

Em 1962, a legislação brasileira inovou ao admitir, na Lei Delegada n.º 04, de 26 de setembro, a requisição de bens e serviços também em tempo de paz, no intuito de intervir no domínio econômico, para assegurar a livre distribuição de produtos necessários ao consumo e uso do povo e às atividades agropecuárias, da pesca e indústrias do País.

Outra inovação foi trazida pela Lei n.º 4.737, promulgada em 15.07.1965, que instituiu o Código Eleitoral. Com efeito, o referido Códice previu em seu artigo 365, a requisição de serviços pessoais (por exemplo: mesários), bem como no artigo 135, §§ 2.º e 3.º, a requisição de propriedade particular para o funcionamento das mesas receptoras de votos (por exemplo: clubes, escolas privadas), restrita ao período eleitoral, distinguindo-se das demais formas de requisição por não comportar pagamento pelo uso do bem requisitado, ressalvado, outrossim, o direito à indenização a posteriori, apenas no caso de o proprietário comprovar a ocorrência de algum dano em razão da utilização de seu bem pelo Poder Público. Saliente-se, ainda, dispor o artigo 1.º da Lei n.º 6.091/74 sobre a requisição de veículos e embarcações, pertencentes à União, aos Estados, Territórios e respectivas autarquias e sociedades de economia mista, para o transporte gratuito de eleitores em zonas rurais, em dias de eleição, além de estabelecer o artigo 23, XIV do Código Eleitoral, atualmente regulamentado pela Resolução TSE n.º 21.843, de 22.06.2004, a possibilidade de o Tribunal Superior Eleitoral requisitar a força federal necessária ao cumprimento da lei, de suas próprias decisões ou das decisões dos Tribunais Regionais que o solicitarem, visando a garantir o livre exercício do voto, a normalidade da votação e da apuração dos resultados, consoante, inclusive, ocorreu no Rio de Janeiro, Alagoas e Amapá na turbulenta eleição no ano de 2008.

As fotos abaixo ilustram a atuação das Forças Armadas na “Operação Eleições 2008”:

Eleição no Amapá54 Eleição no Rio de Janeiro55 Eleição em Alagoas56

54 Disponível em <http://www.google.com.br/imgres?imgurl=http://www.jcmogi. com.br/fotos//fotos_ 031010 4619000000.jpg&imgrefurl>. Acesso em: 17 out. 2011.

55 Disponível em <http://g1.globo.com/Noticias/Rio/foto/0,,15517440-EX,00.jpg> . Acesso em: 17 out. 2011;

56 Disponível em <http://www.google.com.br/imgres?imgurl=http://www.alagoas24horas.com.br/legba/bancoDeMidia/3/3/%257B335fc0e6-b788-4cf8-a0e1-1b67e5c8dc7e%257D_exercito%2520-%2520elei%C3%A7%C3%B5es%2520018.jpg&imgrefurl=http://www.alagoas24horas.com.br/eleicao2010/>. Acesso em: 17 out. 2011;

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A Mobilização de Bens e Serviços Sob a Ótica do Decreto-Lei Nº 4.812, de 8/10/1942

De outro giro, a Lei n.º 6.439, editada em 1/09/1977, autorizou em seu artigo 25, a possibilidade de o Poder Executivo requisitar os bens e serviços essenciais à continuidade das atividades de interesse da população a cargo das entidades da Previdência e Assistência Social – SINPAS, em caso de calamidade pública, perigo público iminente ou ameaça de paralisação, assegurada ao proprietário indenização ulterior.

A atual Constituição Federal, promulgada em 5/10/1988, foi, dentre todas as que mais extensamente, dispôs sobre mobilização nacional e requisição de bens e serviços necessários para sua execução, e será devidamente analisada no próximo capítulo.

De seu turno, após séculos de inexplicável ausência, finalmente em 27/12/2007 foi editada a Lei n.º 11.631, dispondo sobre a Mobilização Nacional:

Art. 2o Para os fins desta Lei, consideram-se:I - Mobilização Nacional o conjunto de atividades planejadas, orientadas e empreendidas pelo Estado, complementando a Logística Nacional, destinadas a capacitar o País a realizar ações estratégicas, no campo da Defesa Nacional, diante de agressão estrangeira; e

Por fim, restou também previsto no artigo 15 da Lei nº 8.080, de 19.09.1990 uma nova espécie de requisição de bens e serviços particulares, restrita às ações e serviços de saúde em todo o território nacional:

Art. 15. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios exercerão, em seu âmbito administrativo, as seguintes atribuições:(...)XIII - para atendimento de necessidades coletivas, urgentes e transitórias, decorrentes de situações de perigo iminente, de calamidade pública ou de irrupção de epidemias, a autoridade competente da esfera administrativa correspondente poderá requisitar bens e serviços, tanto de pessoas naturais como de jurídicas, sendo-lhes assegurada justa indenização;

3 A REQUISIÇÃO DE BENS E SERVIÇOS NO ATUAL SISTEMA CONSTITUCIONAL BRASILEIRO E EM OUTROS PAÍSES, NA HIPÓTESE DE MOBILIZAÇÃO NACIONAL

3.1 CONCEITO

Doutrinariamente, conceitua-se a requisição, como “a utilização coativa de bens ou serviços particulares pelo Poder Público por ato de execução imediata e direta da autoridade requisitante e indenização ulterior, para atendimento de necessidades coletivas urgentes e transitórias”57.

57 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 36 ed. São Paulo: Malheiros, 2010.

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Maria Inês da Penha Gaspar

Na esteira dos ensinamentos ministrados pela professora Maria Sylvia Z. Di Pietro58, a propriedade é o direito individual que assegura a seu titular uma série de poderes, cujo conteúdo constitui objeto do direito civil (artigo 1.228 do atual Código Civil59), compreendendo os poderes de usar, gozar e dispor da coisa, de modo absoluto, exclusivo e perpétuo.

Entretanto, tais poderes não podem ser exercidos de forma ilimitada, tanto por conflitar com direitos alheios de igual natureza, quanto por existirem interesses públicos maiores, quais sejam, a necessidade ou utilidade pública e o interesse social, bem como, situação de perigo público iminente, conforme expressamente ressalvado na Constituição Federal e no artigo 1.228, §3.º, do Código Civil, incumbindo ao Poder Público exercer sua tutela, ainda que acarrete prejuízo a interesses individuais.

Nesse diapasão, para viabilizar tal destinação pública ou de interesse social à propriedade, criou-se para o Estado uma série de mecanismos que o possibilitam intervir no domínio privado e na ordem econômica, a saber: a desapropriação60, a

58 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 22 ed. São Paulo: Atlas, 2009.59 Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la

do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. § 1.º O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades

econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.

§ 2.º São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem.

§ 3.ºO proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição, em caso de perigo público iminente.

§ 4o O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante.

§ 5.º No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores.

60 Segundo Hely Lopes Meirelles, desapropriação é a mais drástica das formas de manifestação do poder de império, ou seja, da Soberania interna do Estado no exercício de seu domínio eminente sobre todos os bens existentes no território nacional. É a transferência compulsória da propriedade particular ou pública (de entidade de grau inferior para a superior) para o Poder Público ou seus delegados, por utilidade ou/e necessidade pública e, ainda, por interesse social, mediante prévia e justa indenização em dinheiro (artigo 5.º, XXIV da CF), salvo as exceções constitucionais de pagamento em títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, no caso de área urbana não edificada, subutilizada ou não utilizada (artigo 182, §4.º, III da CF), e de pagamento em títulos da dívida agrária, no caso de Reforma Agrária, por interesse social (artigo 184 da CF). Cf. op. cit. p. 632/633.

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A Mobilização de Bens e Serviços Sob a Ótica do Decreto-Lei Nº 4.812, de 8/10/1942

ocupação temporária61, a servidão administrativa62, as limitações administrativas63, o tombamento64, o parcelamento e edificação compulsórios65, bem como, a requisição, esta última objeto de análise no presente trabalho.

Observa-se, ainda, coexistirem em nossos dias atuais, a requisição civil e a requisição militar, ambas com conceituação jurídica idêntica e com os mesmos fundamentos, mas com objetivos diversos.

A requisição civil objetiva evitar danos à vida, à saúde e aos bens da coletividade, enquanto a requisição militar visa ao resguardo da segurança interna e a manutenção da Soberania Nacional. Ambas são cabíveis em tempo de paz, independentemente de qualquer nova regulamentação legal, desde que se apresente uma real situação de perigo público iminente (inundação, incêndio, sonegação de gêneros de primeira necessidade, conflito armado, comoção intestina), todavia, em tempo de guerra, as requisições, tanto civis como militares, deverão atender aos preceitos da lei federal específica, in casu, o Decreto-Lei n.º 4.812/1942.

3.2 A REQUISIÇãO DE BENS PARTICULARES E SERVIÇOS PESSOAIS NO SISTEMA CONSTITUCIONAL BRASILEIRO, NA HIPóTESE DE MOBILIZAÇãO NACIONAL

Dispõe o artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 4.812, de 8 de outubro de 1942, que:

As requisições das coisas móveis, dos serviços pessoais e da ocupação temporária de propriedade particular, que forem efetivamente necessárias à defesa e à segurança nacional, observarão as formalidades da presente lei.

61 É a utilização transitória, remunerada ou gratuita, de bens particulares pelo Poder Público, para a execução de obras, serviços ou atividades públicas ou de interesse público (artigo 5º, XXV da CF). Seu fundamento normalmente é a necessidade de local para depósito de equipamentos e materiais destinados à realização de obras e serviços públicos nas vizinhanças da propriedade particular.

62 É um ônus real de uso imposto pela Administração à propriedade particular para assegurar a realização e conservação de obras e serviços públicos ou de utilidade pública, mediante indenização dos prejuízos efetivamente suportados pelo proprietário. Detém caráter perpétuo.

63 É toda imposição geral, gratuita, unilateral e de ordem pública condicionadora do exercício de direitos ou de atividades particulares às exigências do bem-estar social. Afeta o caráter absoluto do direito de propriedade, ou seja, o atributo pelo qual o titular tem o poder de usar, gozar e dispor da coisa da maneira que melhor lhe aprouver.

64 Nas palavras de Maria Sylvia Z. Di Pietro (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22 ed. São Paulo: Atlas, 2009), implica em limitação parcial e perpétua ao direito de propriedade em benefício do interesse coletivo; afeta o caráter absoluto do direito de propriedade e acarreta ônus maior do que as limitações administrativas, porque incide sobre imóvel determinado. Visa a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional. Cf. op. cit. p. 124.

65 São medidas impostas ao proprietário que não utiliza adequadamente a sua propriedade, e atingem o caráter absoluto e perpétuo do direito de propriedade.

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Maria Inês da Penha Gaspar

Conforme anteriormente assinalado, por se tratar de uma exceção a um direito fundamental, a requisição de bens e serviços, em tempo de guerra, não se faz de forma arbitrária, por critério discricionário das autoridades. Ela é instituída pela Constituição e regulada por leis federais que a disciplinam e estabelecem o modo e forma de sua execução.

A requisição de bens e serviços encontra seu principal fundamento legal no artigo 5.º, XXV da Constituição Federal:

Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, igualdade, segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXV - no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário

indenização ulterior, se houver dano;

E se insere no Sistema Constitucional Brasileiro como uma das medidas necessárias à execução da Mobilização Nacional, nos termos do artigo 4.º, parágrafo único, inciso IV, da Lei n.º 11.631, de 27 de dezembro de 2007, representada esta como no conjunto de atividades planejadas, orientadas e empreendidas pelo Estado, complementando a Logística Nacional, destinadas a capacitar o País a realizar ações estratégicas, no campo da Defesa Nacional, diante de agressão estrangeira”, nos termos do artigo 2.º da Lei n.º 11.631, de 27 de dezembro de 2007 e do artigo 2º. do Decreto n.º 6.592, de 2 de outubro de 2008, que o regulamentou, in verbis:

Art. 2.o A Mobilização Nacional conceituada no art. 2.o da Lei n.o 11.631, de 2007, é a medida decretada pelo Presidente da República, em caso de agressão estrangeira, visando à obtenção imediata de recursos e meios para a implementação das ações que a Logística Nacional não possa suprir, segundo os procedimentos habituais, bem como de outras necessidades. §1.o São parâmetros para a qualificação da expressão agressão estrangeira, dentre outros, ameaças ou atos lesivos à soberania nacional, à integridade territorial, ao povo brasileiro ou às instituições nacionais, ainda que não signifiquem invasão ao território nacional.§ 2.o Para fins de Mobilização Nacional, entende-se como Logística Nacional o conjunto de atividades relativas à previsão e provisão dos recursos e meios necessários à realização das ações decorrentes da Estratégia Nacional de Defesa. § 3.o A Mobilização Nacional subdivide-se na fase do preparo e na da execução.

Com efeito, tem-se que, nos termos da Proposta Preliminar de Política e Diretrizes Governamentais da Mobilização Nacional, elaborada pelo Ministério da Defesa, a Mobilização Nacional constitui uma:

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A Mobilização de Bens e Serviços Sob a Ótica do Decreto-Lei Nº 4.812, de 8/10/1942

Complexa gama de atividades integradas, planejadas, orientadas e empreendidas pelo Estado com o concurso dos bens e serviços, das habilidades e do esforço de cooperação estabelecido entre o poder público, a sociedade e a iniciativa privada, para o fim de evitar, prevenir

ou reparar os efeitos decorrentes de agressão estrangeira.66

Daí, sua alta relevância para a Nação e a Federação, a atrair a competência privativa da União para legislar sobre a matéria, consoante a Carta Magna de 1988, em seu artigo 22, III e XVIII:

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: [...]III - requisições civis e militares, em caso de iminente perigo e em tempo de guerra; [...] XXVIII - defesa territorial, defesa aeroespacial, defesa marítima, defesa civil e mobilização nacional;

De seu turno, dispõe o artigo 84, XIX, da Constituição Federal competir privativamente ao Presidente da República “declarar guerra, no caso de agressão estrangeira, autorizado pelo Congresso Nacional ou referendado por ele, quando ocorrida no intervalo das sessões legislativas, e, nas mesmas condições, decretar, total ou parcialmente, a mobilização nacional”.

Determinam, ainda, os artigos 136, §1.º, II e 137 da Lei Máxima, sobre a decretação do Estado de Defesa e do Estado de Sítio, constituindo o primeiro uma modalidade mais branda do segundo, visando a preservar ou a restabelecer a ordem pública ou a paz social ameaçada por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções da natureza, enquanto o Estado de Sítio corresponde à suspensão temporária e localizada de garantias constitucionais, diante da ineficácia da decretação do Estado de Defesa, de comoção grave de repercussão nacional, ou da declaração de estado de guerra ou resposta à agressão armada estrangeira, nos seguintes termos:

Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçada por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.§ 1.º - O decreto que instituir o estado de defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as áreas a serem abrangidas e indicará, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a vigorarem, dentre as seguintes: [...]

66 BRASIL. Ministério da Defesa. Proposta preliminar de política e diretrizes governamentais da mobilização nacional. Disponível em <http://www. mobilizacaonacional.org.br/mobnac/pmn_minuta.pdf>. Acesso em: 28 set.2011.

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Maria Inês da Penha Gaspar

II - ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, na hipótese de calamidade pública, respondendo a União pelos danos e custos decorrentes.Art. 137. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de sítio nos casos de:I - comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa;II - declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira.Parágrafo único. O Presidente da República, ao solicitar autorização para decretar o estado de sítio ou sua prorrogação, relatará os motivos determinantes do pedido, devendo o Congresso Nacional decidir por maioria absoluta. [...]Art. 139. Na vigência do estado de sítio decretado com fundamento no art. 137, I, só poderão ser tomadas contra as pessoas as seguintes medidas: [...]VII - requisição de bens;

Dessa forma, constata-se que o Decreto-Lei n.º 4.812/42 destina-se à regular a requisição de bens e serviços, na hipótese de Mobilização Nacional decorrente de resposta à agressão armada estrangeira e/ou decretação de estado de guerra pelo Presidente da República, na forma do artigo 5.º, XXV da Constituição Federal.

Outrossim, uma vez evidenciada a necessidade de requisição de bens e/ou serviços para a defesa e a segurança nacional, impende definir a quem incumbe tal procedimento. Com efeito, a competência para o exercício do poder de requisitar encontra-se regulada no artigo 12 do Decreto-Lei n.º 4.812/42, constituindo ato próprio dos Ministros (atual Ministério da Defesa)67 e Comandos Militares e do Ministro da Justiça, sendo extensível, por ato do Presidente da República, a outros Ministros, Interventores e Governadores de Estado, nos termos do artigo 12, caput e §1.º do mesmo diploma legal, ou a eventual Presidente de Comissão Central de Requisições, acaso nomeado pelo Presidente República, a teor do disposto no §2.º do mesmo artigo.

3.3 A MOBILIZAÇãO NACIONAL E A REQUISIÇãO DE BENS E SERVIÇOS EM OUTROS PAÍSES

Até 27 de dezembro de 2007, data da promulgação da Lei n.º 11.631, o Brasil sequer possuía uma lei que orientasse a estratégia de defesa do País, no caso de

67 Os antigos Ministérios da Marinha, do Exército e da Aeronáutica foram transformados em Comandos do Ministério da Defesa, o qual foi oficialmente criado através da Lei Complementar n.° 97 de 10 de junho de 1999.

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A Mobilização de Bens e Serviços Sob a Ótica do Decreto-Lei Nº 4.812, de 8/10/1942

ameaça de agressão estrangeira, encontrando-se em muito defasado em relação aos demais Estados Nacionais.

Enquanto enfrentou-se uma única Mobilização Nacional na época da 2.ª Guerra Mundial, outros países, tais como Israel e Suíça, vivem em constante estado de mobilização para uma eventual agressão armada contra seu território.

Na Suíça, por exemplo, a prestação do serviço militar é obrigatória para os homens entre os 20 e os 42 anos, sendo optativo para as mulheres e os que vivam no exterior. Após o treino oficial, cada cidadão fica obrigado a um treinamento de três a quatro semanas por ano e é responsável pelo equipamento individual, da farda à arma (pistola ou fuzil de assalto). Extrai-se, ainda, dos órgãos de informação e notícias divulgadas pela internet, ser a única nação do ocidente que tem abrigos completamente fornidos de comida e suprimentos para um ano, para todos os seus cidadãos em caso de guerra, além de fortificações civis de defesa, detendo capacidade para mobilizar toda a nação em menos de quarenta e oito horas.

No que tange à requisição de bens, vale citar deterem, os cidadãos-soldados, autorização para fazerem parar veículos que estiverem passando pelas ruas e estradas e ordenar que os transportem até os pontos de mobilização.

Tal grau de preparação faz com que a Suíça não se torne um alvo atraente para invasões, tendo funcionado diversas vezes como efeito dissuasório, inclusive durante as duas grandes guerras mundiais, de modo a garantir a integridade de seu território e sua neutralidade nos conflitos, ainda que deveras atraente por suas substanciais reservas financeiras e localização estratégica.

As fotografias seguintes bem retratam o grau de preparação:

Treinamento militar feminino na Suiça68 Exército suíço69

Seguindo a mesma estratégia de defesa, há o Estado de Israel, no qual o serviço militar é obrigatório para ambos os sexos, a partir dos dezoito anos, sendo que os cidadãos do sexo masculino devem servir por um período de três anos e, após terminado, cada um é indicado para uma unidade da reserva, na qual servirá

68 Disponível em <http://www.zecamat.com.br/swiss2.jpg>. Acesso em: 17 out. 2011;69 Disponível em <http://www.en.sgwp.wp.mil.pl/plik/image/_DSC9160.jpg>. Acesso em: 17 out.

2011;

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por um período que varia entre trinta a sessenta dias e que pode ser prorrogado por mais tempo, dependendo da necessidade. Já as mulheres devem prestar o serviço militar por um período inicial de dois anos, após o que servem na reserva uma vez por ano, até os vinte e quatro anos de idade, enquanto os homens servem até os quarenta anos.

Pode-se citar, ainda, Portugal, que desde a Lei n.º 20/1995, já conta com uma legislação mais moderna em termos de Mobilização Nacional e requisição de bens, prevendo em seu artigo 37 a possibilidade de intervenção do Estado no funcionamento das empresas ou serviços requisitados, e se for o caso, até mesmo substituir, temporariamente os respectivos órgãos de gestão, dispositivo este inexistente na legislação brasileira.

4 OS SERVIÇOS E BENS SUJEITOS À REQUISIÇÃO, SUA EXECUÇÃO E DIREITOS DOS

PRESTADORES DE SERVIÇOS E PROPRIETÁRIOS

4.1 DOS SERVIÇOS E BENS SUJEITOS à REQUISIÇãO

Da análise da legislação brasileira, é possível afirmar constituir a requisição de serviços e bens um procedimento unilateral e autoexecutório, o qual se efetiva independentemente da vontade do particular. É sempre um ato de império do Poder Público, discricionário quanto ao objeto e oportunidade da medida, mas condicionado à existência de iminente perigo público e à necessidade de defesa ou segurança do País e/ou à manutenção da vida normal da população civil e dos animais úteis, no caso de mobilização nacional.

A requisição deve ser exercida de acordo com decreto a ser expedido pelo Poder Executivo Federal, nos termos do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 4.812/42, o qual deverá determinar a área em que poderá ser exercido o direito de requisição, na hipótese de não se tratar de mobilização geral, a teor do disposto no parágrafo único do mesmo artigo e reproduzido no artigo 4.º, parágrafo único, IV da Lei n.º 11.631, de 27 de dezembro de 2007.

No tocante à requisição de serviços, encontra-se esta regulamentada no artigo 5.º do referido decreto, sendo ressalvado no §1.º somente poderem ser requisitados os serviços de pessoas nacionais ou estrangeiras, maiores de dezoito anos, aí inclusos os funcionários aposentados, desde que julgados aptos em inspeção de saúde, conforme assinalado em seu §2.º.

Em relação aos bens passíveis de requisição, estabelece o artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 4.812/42 ser “permitida a requisição do que for indispensável ao aprestamento, aprovisionamento e transporte das forças armadas de terra, mar e ar, quando empenhadas em operações de guerra ou de defesa da segurança nacional”, sendo também lícito, no interesse da defesa nacional e da salvaguarda do Estado, requisitar a ocupação e utilização de empresas e instituições de fins econômicos

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ou não, que se tornarem necessários à mobilização do país, a teor do disposto no artigo 3.º do mesmo diploma legal.

Já o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 4.812/42 determina serem permitidas em todo o território nacional ou em parte dele, as requisições de tudo quanto for necessário à alimentação, abrigo/habitação e vestuário da população civil e alimentação de solípedes, gado, aves, animais úteis, bem como as de combustíveis e meios de iluminação das cidades, vilas e povoados e respectivas casas, de meios de transporte em geral, urbanos, interurbanos e interestaduais, de serviços de abastecimento d’água e tudo, enfim, quanto for útil à vida normal das populações, do indivíduo e dos animais úteis, quando se verificar aumento sem causa justificada do custo de vida ou quando houver deslocamento de populações ou de grupos de pessoas em virtude de necessidades militares.

O Decreto-Lei n.º 4.812/42 enuncia em seu artigo 15 os bens e coisas sujeitas à requisição, tais como, o alojamento e o acantonamento das tropas nas casas de residência de particulares; a utilização dos meios de atrelagem e de transporte de qualquer espécie, inclusive navios para tráfego marítimo, fluvial e lacustre; os caminhos de ferro e os aparelhos e material de transporte aéreo, tudo com seu pessoal e suas instalações e dependências; a ocupação dos hospitais com todo seu pessoal, instalações, dependências instrumentos e medicamentos; frisando, ainda, em seu item 14, ser passível de requisição tudo quanto, embora não indicado nos números acima, for necessário ao serviço de defesa da Nação e à manutenção da ordem e do moral da população civil, tendo posteriormente o artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 5.999, de 18 de novembro de 1943 acrescentado estar também sujeito à requisição tudo aquilo que, a juízo do Governo, for útil ao esforço de guerra do país ou ao esforço econômico decorrente do estado de guerra.

Dos artigos 16 a 28, o Decreto-Lei n.º 4.812/42 detalha a forma de requisição dos bens ali mencionados, excepcionando em seu artigo 29 os bens e coisas que não poderão ser objeto de requisição, a saber:

1 - os víveres destinados ao consumo da família durante um mês;2 - as forragens destinadas à alimentação dos animais durante 15 dias;3 - os materiais, mercadorias e objetos destinados ao funcionamento normal dos estabelecimentos não requisitados, durante um período de três meses;4 - os meios de transporte dos médicos, cirurgiões e parteiros, salvo caso de necessidade imprescindível;5 - os bens imóveis e moveis indispensáveis às obras de caridade e assistência;6 - os bens de qualquer natureza de uso dos agentes diplomáticos e consulares dos países que concedem igual isenção aos agentes diplomáticos e consulares do Brasil.

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Vale assinalar, por fim, ser vedada a requisição de bens integrantes do patrimônio público estadual e municipal pelo Poder Público Federal em período de normalidade, permitindo a Constituição a requisição de tais bens apenas nas hipóteses de decretação do Estado de Defesa e do Estado de Sítio, previstos em seus artigos 136, §1.º, II e 137, tendo sido a matéria, inclusive, objeto de apreciação pelo E. Supremo Tribunal Federal, no Mandado de Segurança n.º 25295/DF, Relator Min. Joaquim Barbosa, julgado em 20/04/2005, no qual concedeu-se a ordem, reconhecida a inconstitucionalidade do Decreto n.º 5.392/2005 da União, que requisitava hospitais do Município do Rio de Janeiro, em razão da decretação de estado de calamidade pública no Sistema Único de Saúde deste município.

4.2 EXECUÇãO DA REQUISIÇãO

Com relação à forma de execução das requisições, encontra-se esta disciplinada no artigo 31 do Decreto-Lei n.º 4.812/42, o qual estabelece deverem essas ser dirigidas aos Prefeitos Municipais ou à autoridade civil mais graduada da localidade e, apenas nos casos justificadamente, excepcionais e urgentes, poderá ser feita diretamente ao requisitado.

Ressalte-se incumbir aos Prefeitos ou à autoridade civil nomeada, analisar a validade da requisição e repartir os encargos entre os munícipes, de modo a adequar o pedido de acordo com os recursos de cada um, sem sobrepujar as possibilidades do local e de seus habitantes, além de serem aqueles obrigados a providenciar os meios para que a requisição seja satisfeita no lugar e dia marcados pela autoridade requisitante.

4.3 DIREITOS DOS PRESTADORES DE SERVIÇOS E PROPRIETÁRIOS

A requisição de serviços pessoais é em regra onerosa, a ensejar remuneração equivalente a que os indivíduos perceberiam exercendo funções assemelhadas (artigo 5.º, §3º do Decreto-Lei nº 4.812/42), enquanto a requisição de bens móveis e imóveis não comporta pagamento de indenização pelo uso do bem requisitado, a menos que tenha havido dano, consoante expressamente previsto no artigo 5.º, XXV da Constituição Federal.

Com efeito, o Poder Público assume a posse do bem para utilizá-lo, o qual deve ser restituído ao seu devido proprietário findado o prazo para a requisição, acaso não se trate de um bem consumível, ou seja, cujo uso consistirá na sua consunção, hipótese em que deverá ser substituído por outro de igual quantidade e qualidade, ou indenizado pelo seu justo valor, a teor do disposto no artigo 10 do decreto em tela. Por sua vez, em tendo o bem requisitado sofrido alguma avaria ou seu proprietário tenha sofrido algum prejuízo em decorrência de sua privação temporária, é facultada a indenização ulterior, todavia incumbindo ao particular

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a sua comprovação, não decorrendo da legislação qualquer presunção a seu favor.

Acrescente-se que tais pedidos de indenização deverão ser apreciados e julgados pela Comissão Central de Requisições a ser criada, na forma dos artigos 34, alínea “b” do Decreto-Lei n.º 4.812/42; 3.º do Decreto-Lei n.º 5.275, de 24 de fevereiro de 1943; e 3.º do Decreto-Lei n.º 7.315-A, de 10 de fevereiro de 1945, sendo que eventual ação judicial deverá ser ajuizada em face da União e, consequentemente, perante a Justiça Federal.

5 CONCLUSÃO

Os procedimentos afetos à Mobilização Nacional têm natureza preventiva e antecipatória, pois exigem prévio planejamento desde a normalidade das relações internacionais até a indesejável situação de crise e de beligerância que possa resultar em agressão contra a soberania do Estado brasileiro.

A legislação brasileira pertinente à Mobilização Nacional deve ter como meta, assim, capacitar o País a realizar ações estratégicas no campo da defesa, compreendendo não só a intervenção nos fatores de produção e a ocupação de bens e serviços no caso de ameaças ou de efetivos atos lesivos à soberania nacional, mas até mesmo a reorientação da produção, da comercialização, da distribuição e consumo de bens e da utilização de serviços.

Nesse diapasão, em que pese o Decreto-Lei n.º 4.812/42 ser minucioso ao especificar os bens e serviços requisitava, não só para uso militar, mas também para garantir o máximo de normalidade a população civil, especialmente no que tange à alimentação, saúde e transporte, por outro lado, não há como olvidar encontrar-se tal decreto desatualizado, em verdadeiro descompasso com a evolução da tecnologia e ao moderno conceito de guerra, bem como em relação à Lei n.º 11.631, de 27 de dezembro de 2007, instituiu o SINAMOB, e às demais leis que dizem respeito à execução da mobilização nacional, referindo-se, inclusive, a órgãos da Administração Pública não mais existentes.

O ideal, portanto, é que seja elaborada nova legislação envolvendo a requisição de bens e serviços, no caso de execução da Mobilização Nacional mais adequada à realidade atual brasileira, e que poderia observar como sugestão, os seguintes pontos abaixo descritos:

Disciplinar o funcionamento do sistema financeiro nacional na fase da •Mobilização Nacional e durante o período das requisições;Prever a requisição de serviços e bens de estrangeiros, inclusive de empresas •multinacionais, bem como regular a situação dos trabalhadores nacionais de países inimigos que prestem serviço nas empresas ou nos serviços requisitados;

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Dispor sobre eventual tributação incidente sobre os bens e serviços a ser •objeto de requisição;Elaborar e atualizar cadastros de empresas com bens requisitava;•Padronizar, em período anterior à Mobilização Nacional e requisições, as •especificações técnicas de produtos e serviços, tais como unificação da bitola dos trens, a fim de viabilizar o transporte de tropas, armamentos, suprimentos e deslocamento da população civil;Incentivar a integração entre os diversos modais no país, bem como à •utilização maior de hidrovias e ferrovias, no intuito de reduzir a dependência do meio rodoviário, possibilitando sua imediata requisição;Regulamentar direito e deveres dos cidadãos mobilizados, com parâmetros •para fixação de remuneração, regime e horário de trabalho;Dispor, especificamente, sobre a requisição de fontes produtoras de energia, •tais como refinarias e usinas termelétricas; eEstabelecer parâmetros para utilização de redes de comunicação, por exemplo, •telefonia fixa e celular, bem como satélites, equipamentos de Informática, e acesso à rede mundial de computadores;

Todavia, para que a requisição de bens e serviços, como modalidade de Mobilização Nacional, possa ser prontamente executada, é necessário, inicialmente e antes de qualquer ação, incentivar a que os particulares responsáveis por indústrias ou equipamentos considerados estratégicos sejam convidados, ainda, antes de sua instalação/construção a aderirem ao Plano Nacional de Mobilização, visando a estudar e a implementar adaptações necessárias que facilitem sua conversão ao uso militar, como por exemplo, a construção de uma terceira faixa de rolamento em uma rodovia, que permita o pouso e decolagem de aeronaves naquele trecho; uma empresa de barras de cereais que possa converter a produção para rações de emergência para combate com alimentos liofilizados e em conserva; ou até mesmo transformar uma fábrica de batons em produtora de projéteis para metralhadoras e fuzis de baixo calibre, ao trocar o plástico da embalagem por metal e a massa do batom por chumbo.

Faz-se mister, portanto, maior conscientização da sociedade na possibilidade de Mobilização Nacional, bem como na adequação/elaboração de legislação pertinente à sua execução, aí incluída a requisição de bens e serviços, merecendo ser salientado que a Mobilização Nacional exige planejamento e preparo eficiente, ainda em tempo de paz.

Por fim, cumpre assinalar a recente edição da Medida Provisória n.º 544, de 29 de setembro de 2011, a qual estabelece normas especiais para compras, contratações e desenvolvimento de produtos, sistemas de defesa, dispondo, ainda, sobre regras de incentivo a áreas estratégicas de defesa, o que acena para o

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A Mobilização de Bens e Serviços Sob a Ótica do Decreto-Lei Nº 4.812, de 8/10/1942

reaparelhamento da indústria de defesa brasileira, espinha dorsal da Mobilização Nacional.

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Paulo Roberto Neves Augusto da Silva

MOBILIZAÇÃO EM CASOS DE CATÁSTROFES NATURAIS OU ARTIFICIAIS – A IDENTIFICAÇÃO DA

SOCIEDADE COM AS ATIVIDADES DE MOBILIZAÇÃO NACIONAL POR MEIO DE SUA ATUAÇÃO EM CASOS

DE CATÁSTROFES

Paulo Roberto Neves Augusto da Silva Capitão de Mar e Guerra (IM) da Marinha do Brasil, estagiário do Curso de Logística e Mobilização Nacional da Escola Superior de Guerra, em 2011.

RESUMO

Alguns dos grandes obstáculos ao efetivo desenvolvimento da atividade ‘mobilização’ estão no comprometimento dos órgãos envolvidos em seu sistema, no reconhecimento de sua importância pelos dirigentes e pela sociedade. Decorre desse distanciamento, a escassez de recursos e estagnação das ações de implementação da mobilização nacional. O questionamento eleito para esta postura temática recai exatamente sobre a identificação social, na atualidade, com as atividades da mobilização nacional e como alcançar o comprometimento da sociedade como um todo com a mobilização. A atuação da mobilização nacional em catástrofes será capaz de alcançar esse desiderato? Em busca de tais respostas este artigo tem por objetivo apresentar as transformações dogmáticas ocorridas na mobilização nacional tendo como limitação temporal a lei de requisições de 1942, o conceito atual de mobilização e a possibilidade do incremento da identificação da sociedade com suas atividades, por meio da atuação em tempos de paz, nas catástrofes naturais e artificiais. Perscrutar-se-á ainda quanto a sua contribuição na atuação em catástrofes, para o crescimento e aperfeiçoamento tanto da atividade de mobilização nacional, como da sociedade, por meio do desenvolvimento da mentalidade de mobilização. Observa-se, portanto, neste trabalho a grande oportunidade de angariar apoio e motivação social quando da atuação em tempos de paz da mobilização em atendimento às catástrofes, analisando para tal, os dispositivos legais vigentes, os princípios que cercam os conceitos onde se insere a mobilização e o volume cada vez maior dos acontecimentos de consequências calamitosas na atualidade em níveis globais. Palavras-chave: Mobilização e sociedade; Importância da mobilização nacional; Atendimento em catástrofe.

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Mobilização em Casos de Catástrofes Naturais ou Artificiais

1 INTRODUÇÃO“O ser humano só é magnânimo no sofrimento. Partindo dessa premissa, quem sabe se as catástrofes sirvam para tocar o coração do homem e através de um mutirão engajado abra-se a janela da consciência solidária.” (Otto Lara Resende)

O problema em questão que se desvela no presente trabalho é de como, por meio da atuação da mobilização nacional em catástrofes, pode-se obter a imprescindível identificação da sociedade com as atividades da mobilização e, por conseguinte, o comprometimento social com a mobilização nacional. Essa questão necessariamente determina, para uma melhor compreensão, que se faça uma apresentação das transformações dogmáticas ocorridas ao longo de décadas, no que concerne à mobilização nacional, às transformações legislativas que regularam e regulam essa atividade em apoio às vítimas das catástrofes e às transformações havidas também nas catástrofes, em sua forma e dimensões que na atualidade atingem o mundo.

O dicionário Aurélio define ‘mobilização’ como sendo o “Conjunto de medidas governamentais e militares destinadas à defesa de um país ou à preparação dele para determinada ação militar” Segue-se a este conceito inúmeras definições em uma miríade de normas e dispositivos legais sob o mesmo entendimento, qual seja, de uma atividade voltada a ameaças externas, a ações militares, à Defesa Nacional e a guerras. Trata-se de um conceito muito mais abrangente.

Assim é que, nesta postura temática, o autor deteve-se sobre um dos conceitos mais imbricados que diz respeito à Defesa Nacional, à abrangência e ao escopo do que vem a ser mobilização, à identificação de suas atividades, bem como à sua importância junto à opinião pública.

Tomando-se, portanto, a definição do dicionário Aurélio como ponto de partida, identifica-se prima facie um dos maiores óbices enfrentados na captação do envolvimento social com a mobilização nacional e, por conseguinte, com as suas atividades de preparo, qual seja, exatamente no alcance de seu conceito, seu papel, sua abrangência e importância para o país já desde uma fase anterior a de uma situação de conflito, quando não há ameaças aparentes, no preparo e atuação em acontecimentos súbitos internos, como, por exemplo, em nossas catástrofes.

Especificamente, ainda, procura-se identificar a fundamentação legal para o desenvolvimento da atividade de mobilização em catástrofes tendo como marco as catástrofes que atingiram o mundo e o Brasil, de forma mais marcante até os dias atuais. Faz parte, ainda, deste estudo, a análise das transformações ocorridas na atividade de mobilização nacional, em catástrofes que favoreceram a identificação da sociedade e a avaliação de seu papel em catástrofes naturais e artificiais nos dias presentes.

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Paulo Roberto Neves Augusto da Silva

A avaliação dos Objetivos Nacionais, Fundamentais, Segurança Nacional e Defesa Nacional, bem como os princípios do SINAMOB em cotejo com as dimensões das catástrofes, permite a identificação de diversas atividades afins à mobilização e que têm real importância junto ao papel do Estado ante as catástrofes, sejam naturais ou artificiais.

Destarte ao ser avaliado o papel da atividade da mobilização em catástrofes naturais e artificiais, procura-se contribuir para o aperfeiçoamento da mobilização nacional.

Ainda no cerne do presente artigo, busca-se identificar os Objetivos e Diretrizes da Política de Mobilização Nacional consentâneos às atuações em catástrofes naturais e artificiais.

Tenta-se ainda buscar respostas a perguntas como, se há deficiências no reconhecimento, no comprometimento e na motivação da sociedade com as atividades de mobilização nacional, decorrentes da percepção da relevância, ou não, desta atividade no contexto nacional. No que concerne à contribuição científica deste artigo, espera-se, ao final deste trabalho, identificar qual proposta de transformações pode ser oferecida à sociedade, quando da atuação da mobilização nacional em catástrofes naturais e artificiais, ao mesmo tempo em que se objetiva, num sentido contrário, identificar a forma de se obter um maior comprometimento, uma maior percepção e motivação da sociedade com as atividades da mobilização nacional, a partir da atuação desta em acontecimentos súbitos de consequências calamitosas.

2 OS DISPOSITIVOS LEGAIS PARA A MOBILIZAÇÃO E O RESPALDO PARA SUA UTILIZAÇÃO EM CATÁSTROFES

Um dos questionamentos centrais, quando se busca a motivação social às atividades de mobilização em catástrofes, está na sua legitimidade, não só no sentido jurídico de estar apoiada em lei, mas de forma mais abrangente, como no sentido político, na qual “refere-se à necessária qualidade de tornar válida a sua atuação em face dos demais cidadãos”70 Tal questionamento, por conseguinte, passa a ser o escopo deste tópico, qual seja: a legitimidade na atuação da mobilização em catástrofes, segundo as normas vigentes.

A delimitação no tempo enseja a análise dos dispositivos legais e normativos atinentes à mobilização, que guardem alguma correspondência com a sua utilização em catástrofes, dispositivos existentes no Brasil, desde 1942, cujo marco inicial é o Decreto 4812 de 08 de outubro de 1942.

Com foco neste decreto, a União procurou ordenar as hipóteses de requisição de bens imóveis e móveis, que fossem necessários às Forças Armadas e à defesa

70 SILVA, Plácido e. Vocabulário jurídico. 15. ed. Rio de Janeiro:Forense, 1998, p. 480.

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Mobilização em Casos de Catástrofes Naturais ou Artificiais

passiva da população. Este Decreto, que permanece em vigor, segundo a análise aqui realizada,, encerra algumas questões deletérias à identificação da sociedade com as atividades de mobilização e, por conseguinte, contribuiu para a incompreensão social da atividade de mobilização, gerou desconfianças quanto à sua aplicação, mesmo em casos de catástrofes.

Muito embora tenha sido o decreto editado no cerne de um embate global, carece de alguns aperfeiçoamentos para que seja considerado útil à sociedade e, mormente que não traga insegurança jurídica na sua aplicação.

Entende-se, inicialmente, que no seu Art 2.º, permanece consentâneo com a temática aqui desenvolvida, quando estabelece uma ligação direta entre a requisição e a questões de defesa da segurança nacional71. Entende-se, também, que toda questão ligada à segurança nacional estabelece um liame à mobilização em ocasiões catástrofes, tendo em vista tratarem-se tais questões de preservação dos objetivos fundamentais, estando ai, portanto, inseridos e relacionados à democracia, à integração nacional, à integridade do patrimônio, à paz social, ao progresso e à soberania72, objetivos esses, passíveis de comprometimento, quando submetida uma determinada região do país a acontecimentos súbitos de consequências calamitosas (catástrofes).

Os itens elencados no art.15, sujeitos à mobilização, demonstram a logística embrionária que possuía o país em 1942, tratando-se de requisições de víveres e, inclusive, a ocupação temporária de propriedades, mantendo ainda em aberto em seu item 14 do Art 15 quanto à possibilidade da requisição de “tudo quanto, embora não indicado nos números acima, for necessário ao serviço de defesa da Nação e à manutenção da ordem e do moral da população civil”, causando grande insegurança social em sua operacionalização.

A idéia que este decreto encerra é de um verdadeiro confisco, tornando-se um entrave a uma autêntica e responsável atividade de mobilização, quando, ao contrário, procura-se a identificação da sociedade com as atividades de mobilização.

Há entendimentos e pareceres, atualmente, no sentido do não reconhecimento da existência de uma norma que regule a requisição em casos de mobilização, não cabendo, entretanto, no bojo deste artigo, o tratamento mais detido desta questão.

Entre todos os dispositivos que se seguiram ao longo dos anos, não se conseguiu identificar qualquer traço que apontasse para a atividade de mobilização em situações de catástrofe. O decreto referente ao serviço militar73 prevê, tão

71 Art. 2.º É permitida a requisição do que for indispensável ao aprestamento, aprovisionamento e transporte das forças armadas de terra, mar e ar, quando empenhadas em operações de guerra ou de defesa da segurança nacional.

72 Manual básico. Assuntos específicos. Rio de Janeiro: Escola Superior de Guerra, v.II, 2009, p. 23.73 Decreto N.º 57.654 de 20 jan. 1966.

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somente, a mobilização nos casos de interesse da defesa nacional, o que pode, de forma indireta, estabelecer ligação a atividade de mobilização em catástrofes.

Em ordem cronológica, a pesquisa que se fez, sobre o amparo legal às atividades de mobilização em catástrofes, em dissecção aos dispositivos de nossa Carta Magna de 1988, observa, inicialmente, nas atribuições de competência da União em seu Art.21, inciso XVIII que compete a ela “planejar e promover a defesa permanente contra as calamidades públicas, especialmente as secas e as inundações”; prosseguindo ainda em seu Art. 22, inciso XXVIII, que compete privativamente a União legislar sobre “defesa territorial, defesa aeroespacial, defesa marítima, defesa civil e mobilização nacional”;

Destaca-se, ainda, na Constituição Federal (CF), em seu Art. 136, importante papel que pode representar a decretação do estado de defesa, o que também respalda a utilização da mobilização aqui amparada constitucionalmente74

Elegeram-se, portanto, estes aspectos da CF como modais ao aproveitamento da mobilização, nas atividades de apoio às catástrofes por contarem com amparo constitucional.

A lei 8.183 de 11 de abril de 1991, que dispõe sobre a organização e o funcionamento do Conselho de Defesa Nacional (CDN), não estabelece, de forma clara, o papel deste Conselho nas orientações quanto às atividades de mobilização e tampouco na atuação em catástrofes. Entende-se que tal dispositivo necessita de revisões, objetivando tornar amplo o papel do CDN e, principalmente, rever a sua composição com a inserção de outros ministérios, como por exemplo, o Ministério da Integração Nacional, principalmente quando se considera o papel deste Conselho no cumprimento do preconizado e já acima destacado Art 136 da Carta Magna. Como fazê-lo sem a importantíssima contribuição daquele Ministério que sequer figura como órgão de assessoria em um contexto no qual deveria integrar o Conselho de Defesa Nacional? Carece de profunda reformulação tal dispositivo legal.

Nessa dissecção dos dispositivos legais, que tratam das catástrofes e da mobilização em caso de catástrofes, destaca-se o Decreto 5376, de 17 de fevereiro de 2005, que trata de maneira bem detalhada das atividades da Defesa Civil no país. Ainda destaca-se, na composição do Conselho Nacional de Defesa Civil (órgão colegiado de caráter normativo, deliberativo e consultivo), a presença dos Comandos das três Forças Armadas, o que denota que sua estrutura considera a possibilidade de utilização da atividade de mobilização nacional, no enfrentamento de catástrofes, tendo em vista as atividades de defesa civil compreenderem: a prevenção de desastres; a preparação para emergências e desastres; a resposta aos

74 Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçada por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.

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Mobilização em Casos de Catástrofes Naturais ou Artificiais

desastres e a reconstrução e a recuperação, todas estas ações em perfeita sintonia às atividades de preparo e execução da mobilização nacional.

Sobressai-se, ainda, no presente Decreto, a previsão de Grupo de Apoio a Desastres, formado por equipe técnica multidisciplinar, mobilizável a qualquer tempo, para atuar em situações críticas, por solicitação expressa de Estados, Municípios e do Distrito Federal; o que representa uma convergência em relação à atividade de mobilização nacional em catástrofes.75

Outra importante iniciativa na direção da mobilização em catástrofes, disposta no Decreto 5376/2005, é a possibilidade da criação das mobilizações comunitárias 76, que consta em seu Art. 13, como competência das COMDECs (Coordenadorias Municipais de Defesa Civil), ou órgãos correspondentes, células estas responsáveis, em nível municipal, de articular a coordenação de todo o sistema e, por conseguinte de importância nodal na estrutura da mobilização em catástrofes.

Até o ano de 2005, observou-se que os dispositivos que tratavam da mobilização tinham como mote as hipóteses de guerra, ou mesmo, as possibilidades maiores de um enfrentamento ante ameaças externas. Acontece que, por diversas vezes, os olhos da mobilização passaram a se preocupar também com a atuação em catástrofe, independente de previsão legal. Ressalta-se que, apesar de as Forças Armadas já atuarem em nível nacional em catástrofes, pouco se falava em termos legais da atividade de mobilização. A situação exigia e ainda carece de transformações.

Observem-se, portanto, tais transformações.O Decreto 5484, de 30 de junho de 2005, aprova a Política de Defesa Nacional,

voltada conforme estabelecido em seu texto preponderantemente para ameaças externas, porém, não exclusivamente para tais ocorrências.

Ao estabelecer objetivos e diretrizes para o preparo e o emprego da capacitação nacional, com a participação de civis e militares em todas as esferas do poder nacional, apresenta este decreto o cerne da mobilização nacional, por meio de um esforço conjunto sob coordenação do Ministério da Defesa, nas ações necessárias à Defesa Nacional. Mas, em termos de transformações, cabe a indagação de como a Política de Defesa Nacional estabeleceu uma nova forma de pensar, para a mobilização nacional em situações de catástrofes?

Essa nova forma de pensar a mobilização, entende-se, teve seus passos iniciais rumo a um novo paradigma de atuação da mobilização nacional, quando do reconhecimento por parte deste dispositivo de que “a percepção de ameaças está desvanecida para muitos brasileiros”, justamente por uma permanência de longos períodos sem embates, não obstante a existência de antagonismos. O que não se

75 Inc. IX, Art.10 do Decreto 5376 de 17 fev. 2005.76 XIX: Promover a mobilização comunitária e a implantação de NUDECs, ou entidades

correspondentes, especialmente nas escolas de nível fundamental e médio e em áreas de riscos intensificados e, ainda, implantar programas de treinamento de voluntários.

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deve olvidar, entretanto, é que a opinião pública, considerada aqui, a parte política deste dispositivo legal, é um dos institutos de maior influência no pensamento político como nos ensina Paulo Bonavides:

Sendo a opinião pública a mais eficaz forma de presença indireta do corpo social na formação da vontade política, não é de admirar que sua excepcional força haja sido já proclamada e reconhecida por governantes, filósofos e cientistas políticos, do século XVIII aos nossos dias”77

E este é considerado um marco para a postura temática, ou seja, a preocupação política com a opinião pública, enquanto mobilizável, no sentido de “conscientizar todos os segmentos da sociedade brasileira de que a defesa da Nação é um dever de todos os brasileiros”78.

Como será posteriormente desenvolvido, e ora se antecipa, entende-se que a atuação em catástrofes da atividade de mobilização é uma autêntica questão de Defesa Nacional.

De forma explicita, portanto, apenas a partir da edição da Política de Defesa Nacional, identificam-se as preocupações institucional e política com o envolvimento da sociedade em questões centrais para o país, como destaca este documento quando trata do assunto Estado, Segurança e Defesa, elegendo a Defesa Civil como uma das importantes medidas de segurança e também ligadas à Defesa Nacional.79

Em 2007, temos a edição da lei 11.631 dispondo sobre a mobilização nacional, onde não há previsão de utilização da mobilização em circunstâncias distintas da agressão estrangeira, o que se considera um retrocesso aos entendimentos anteriores que sinalizavam no sentido de sua irrestrita utilização também em circunstâncias catastróficas. A criação do Sistema Nacional de Mobilização (SINAMOB), pelo que se depreende, representa a grande transformação havida com a edição dessa lei, no sentido de oferecer uma estrutura, definir papéis e atribuições aos órgãos integrantes, passível também de produzir benefícios na atuação em catástrofes, em face ao estabelecimento de um sistema específico, carecendo ainda de definições e regulamentações que chegam com o Decreto 6592 de 2008.

Por este decreto, o SINAMOB ganha, representatividade, define atribuições e estabelece condições de verdadeiramente caminhar no sentido da primeira fase da mobilização, o preparo, mas permanece carente no que concerne a sua atuação

77 BONAVIDES, Paulo. Ciência política. 10. ed. /S;l./: Malheiros, 2003, p. 449.78 Decreto n.º 5.484, de 30 jun. 2005, aprova a Política de Defesa Nacional.79 “As medidas que visam à segurança são de largo espectro, envolvendo, além da defesa externa:

defesa civil; segurança pública; políticas econômicas, de saúde, educacionais, ambientais e outras áreas, muitas das quais não são tratadas por meio dos instrumentos político-militares”

______. Decreto n.º 5.484, de 30 jun. 2005, aprova a Política de Defesa Nacional

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Mobilização em Casos de Catástrofes Naturais ou Artificiais

em catástrofes, quando novamente estabelece como mote em seu Art 2.º apenas a agressão estrangeira para seu estabelecimento.

Mas destaca-se como importante ainda no mesmo dispositivo em seu Art. 35 que “A estrutura do SINAMOB poderá ser utilizada no auxílio às situações emergenciais, desde que aprovada pelo seu Comitê.” Há de se considerar, portanto, essa possibilidade legal no incremento, desde já, das ações de preparo da mobilização nacional para sua atuação em catástrofes.

No mesmo decreto, que regula a atividade da mobilização, ficam estabelecidos seus princípios que deverão nortear todas as ações decorrentes do SINAMOB, de onde derivará tudo o que for concernente às fases de preparação e execução,80.

Esses mesmos princípios (permanência, flexibilidade, economia, coordenação, controle, oportunidade, prioridade e cooperação) são nodais ao desenvolvimento da atividade de mobilização em catástrofes, considerando-se o sentido e a abrangência que encerram em cada um deles.

Assim é que, ao se tratar da permanência como princípio, a atenção de todos os órgãos envolvidos no SINAMOB deve estar dirigida para a necessidade de um planejamento e execução robustas, interligadas, e indeléveis. Há de se considerar este princípio na atuação da mobilização em catástrofes, mesmo nas fases preventivas que ensejará um menor aporte de recursos e envolvimentos materiais e de pessoal, quando da execução dessa atividade em calamidades.

Há de se considerar que todos esses princípios têm influência direta em todas as ações a serem desenvolvidas pela mobilização em caso de catástrofes, sendo que o desenvolvimento de cada princípio e a sua influência na atuação da mobilização em catástrofes, por motivos de limitação do escopo desta postura temática, não serão ora aqui desenvolvidos.

Na perquirição que se fez da legitimidade da aplicação da atividade de mobilização em catástrofes naturais ou artificiais, encontrou-se o Decreto 6703, de 18 de dezembro de 2008, que aprova a Estratégia Nacional de Defesa (END). Por este dispositivo, dividido em duas partes, uma focada na formulação sistemática e a outra em medidas de implementação, fica clara a atenção voltada para a Defesa Nacional.

Pauta-se ainda a END em diretrizes, onde se destaca, em perfeita sintonia e aproveitamento na mobilização em catástrofes, o oportuno conceito de elasticidade da capacidade de mobilização nacional e militar para atender aos desafios apresentados ao país. Trata-se, salvo melhor juízo, de verdadeira diretriz às ações decorrentes, ad hoc, o que se entende ser o princípio maior da atividade de mobilização, ou seja, atuar na defesa pró-ativa, mediante as atividades de planejamento, preparo, execução e controle das atividades de mobilização

80 Conforme nos ensina Aurélio Buarque de Holanda; 7. Filos. Origem de algo, de uma ação ou de um conhecimento.

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contribuindo para mitigar as mudanças estruturais havidas por ocasião de uma catástrofe.81

Por outro lado, o reconhecimento das vulnerabilidades da logística e da mobilização nacional também constitui importante passo em busca de soluções e mudanças estruturais e legais, no sentido de se obter uma estrutura mobilizável assim reconhecida, isto é, realmente mobilizável.

Carece, no entanto, este dispositivo, do reconhecimento da possibilidade clara da utilização da mobilização nacional nos casos de catástrofes, embora não torne tal atividade exclusiva às ameaças externas.

Em termos de análise dos dispositivos legais vigentes, passa-se a perscrutar como derradeira a Lei da Política de Mobilização Nacional, Decreto n.º 7.294, de 06 de setembro de 2010, no qual se encontra o passo direto, cristalino e evidente de que a mobilização deve, sim, ser utilizada em tempos de paz na atuação em catástrofes, quando, é necessário destacar, que para o alcance de seus objetivos gerais, tem a mobilização nacional dentre seus objetivos específicos:

IX - envolvimento da sociedade brasileira com a mobilização nacional; X - minimização dos efeitos negativos decorrentes da mobilização nacional na sociedade; e a XI - integração das atividades de defesa civil

à mobilização nacional;

Estes objetivos encontram-se estreitamente vinculados à possibilidade de sua atuação em situações calamitosas, enquanto busca a necessária sustentação popular, por meio do reconhecimento e aprovação social de sua atividade.

Há de se considerar, ao final da análise dos dispositivos legais, possam eles ser utilizados em aproveitamento às atividades de mobilização em catástrofes, pois urgem mudanças para o seu pleno aproveitamento e legitimidade de tal atividade, visto que, independente de dispositivo autorizador, em face aos colapsos por diversas vezes sofrido pelas defesas civis municipais e estaduaibs, ao longo de todas essas décadas, desde 40, em todas as grandes tragédias que assolaram o país, em sua maioria, climáticas, houve a participação das Forças Armadas, compreendendo um verdadeiro esforço de mobilização.

Haveria respaldo, portanto, em dispositivos legais para efetivamente ocorrer a mobilização, quando a população estiver submetida a catástrofes? Não totalmente, embora se perceba, que diante de tais sinistros, tornam-se deletérias e desprovidas de cabimento tais arguições, cabendo, portanto, em tempos de normalidade, o trabalho profícuo no sentido da aprovação de dispositivos que detalhem e amparem essa forma específica de atuar da mobilização nacional.

81 Diretriz 21, Decreto n.º 6.703, de 18 dez. 2008, aprova a Estratégia Nacional de Defesa, e dá outras providências

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Mobilização em Casos de Catástrofes Naturais ou Artificiais

3 OS OBJETIVOS NACIONAIS E A DEFESA NACIONAL ANTE AS CATÁSTROFES

Muito embora o Brasil não figure entre os países detentores de qualquer uma das cem maiores catástrofes da história82, isso não significa que não tenha sofrido calamidades perturbadoras e que, ainda, não haja, ao longo de décadas, acumulado perdas consideráveis de vidas e incomensuráveis prejuízos materiais com desastres naturais e artificiais.

Em recente trabalho, foi produzido o novo relatório de Risco Mundial, elaborado pelo Instituto de Meio Ambiente e Segurança Humana da Universidade das Nações Unidas, o qual, avaliando o nível de exposição a desastres naturais em 173 países, posiciona o Brasil em 121.º lugar83 com percentual de 4,26%, bem abaixo de vários países da América do Sul, como por exemplo, o Chile com 11,96% de riscos:

Tais catástrofes representam uma real ameaça aos Objetivos Nacionais pela fragilidade a que podem submeter o país e remeter a uma condição de comprometimento; representam também uma ameaça à Defesa Nacional, razão pela qual é merecedora (DN) de um tratamento prioritário dentro das possibilidades de mobilização nacional.

Na leitura dos conceitos dos Objetivos Nacionais/Fundamentais 84, constata-se que uma catástrofe que assole o Brasil pode, em determinadas circunstâncias, comprometer, de forma superficial ou profunda, o estado democrático de direito, a integração nacional, a integridade do patrimônio nacional, a paz social, o progresso e a soberania, isolados ou em conjunto; parcial ou totalmente. Decerto que, independente da gradação com que a catástrofe ofereça comprometimento, todos os institutos acima elencados retratam os Objetivos Nacionais.85

A partir desse entendimento, destaca-se que:

Quando o Poder Nacional é aplicado efetivamente, por intermédio de ações visando a superar Antagonismos, internos ou externos, que possam afetar o atingimento e/ou a manutenção dos Objetivos Fundamentais, fica materializada a Defesa Nacional.86

Assim sendo, muito embora as ameaças consideradas como passíveis de gerar antagonismos sejam em sua maioria originadas em ambientes externos, não se pode desconsiderar que as ameaças internas podem levar a esse comprometimento

82 SPIGNESI, Stephen J. As 100 maiores catástrofes da história; tradução de Flávio Marcos e Sá Gomes. Rio de Janeiro: DIFEL, 2005, 496 p.

83 http://www.ehs.unu.edu/file/get/8696, acessado em 08/11/2011 às 22:04.84 Escola Superior de Guerra. Manual básico. Assuntos específicos. Rio de Janeiro: ESG, v. II, 2009, p.

21-22.85 Idem, p. 23.86 Ibidem, p. 64.

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e aqui se elegem as catástrofes como tais ameaças de ordem interna. Portanto, devem ser essas, efetivamente, consideradas como motivadoras para a utilização da atividade de mobilização na atuação em catástrofes, por tratar-se de uma questão de Defesa Nacional.

O problema em questão, já destacado, recai na identificação social, na atualidade, com as atividades da mobilização nacional e como alcançar o comprometimento da sociedade com a mobilização. Independente de qualquer análise dos procedimentos que regulam as atividades de defesa civil, ante as catástrofes naturais ou artificiais, o que aqui se pretende identificar são as oportunidades de, utilizando-se a mobilização por ocasião da ocorrência de sinistros, angariarem o envolvimento social e as consequentes atuação e motivação da sociedade com as atividades de mobilização. Assim é que, das fases que constituem a mobilização (preparo e execução), pode-se assegurar que, especificamente, na atuação em catástrofes, a partir da excelência da fase de preparo, decorrerá o êxito ou não da fase de execução, quando da ocorrência de catástrofes, podendo, desse apuro na fase de preparação, a mitigação dos efeitos decorrentes do sinistro ocorrido.

Considera-se, assim, que o desenvolvimento da fase de preparo da mobilização dar-se-á de modo contínuo, metódico e permanente87, desde a situação de normalidade, ações essas consideradas nodais no que concerne, não só à atuação em catástrofes, mas, principalmente, na sua prevenção.

4 AS CATÁSTROFES NATURAIS EM PRETO E BRANCO

Como pontuado em nossa introdução, o dicionário Aurélio define ‘catástrofe’ ”como todo acontecimento súbito de consequbências trágicas e calamitosas.”

Entende, assim, que tais acontecimentos pela sua magnitude devem ser eleitos a um patamar superior e mais abrangente do que as guerras.

A partir desse raciocínio, considera-se que a própria guerra, em seu sentido amplo, está contida e considerada como uma espécie de catástrofe, o que, destarte, também justificaria a preparação e atuação da atividade mobilização ante todas as catástrofes ai incluída também a defesa nacional perante uma ameaça externa (guerra).

A história, porém, por meio de uma definição mais realista e, portanto, dura, ensina que as catástrofes são todos aqueles acontecimentos que impactam e permeiam, sobremaneira, por todas as áreas sociais, sejam elas econômicas, educacionais, criminais, e mesmo culturais, com tal profundidade e intensidade, que mesmo onde as sociedades são dotadas de um alto grau de resiliência, passam carência, após um sinistro, invariavelmente de décadas, para alcançar os índices de desenvolvimento experimentados antes da catástrofe vivida.

87

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Mobilização em Casos de Catástrofes Naturais ou Artificiais

Spignesi relata88 que, ao longo de milhares de anos, catástrofes das mais diversas assolaram a humanidade, destacando-se a Peste Negra que ceifou cerca de 75.000.000 vidas na Europa, de 1347 à 1351; a fome na China, em 1876; ciclones, terremotos, guerras e tsunâmis.

O que se pode observar em todas essas catástrofes é que, em qualquer época, e de das várias maneiras pelas quais fossem organizados ou denominados os sistemas de defesa civil de cidades, estados, províncias ou mesmo regiões, os mesmos foram incapazes, de sozinhos, atuarem ante tais ocorrências dessa magnitude.

Os países envolvidos em catástrofes tiveram que atuar diretamente nos desastres por meio do que se denomina, embrionariamente, de mobilização nacional em catástrofes e não invariavelmente necessitaram de uma mobilização internacional, em face do colapso em determinados países assolados por catástrofes.

Em outro estudo de importância para este desenvolvimento temático, produzido pelo Instituto de Geografia de Uberlândia, MG89, há de se considerar que, a partir da década de 50, ocorreu um considerável crescimento de desastres naturais em todo o mundo, quando a taxa de crescimento da população gravitava na faixa de 15% do crescimento de desastres ficava na faixa de 56% em um período de análise compreendido de 1900 á 2000. Destaca-se ainda que na década de 80, a taxa de desastres atingiu a surreal marca de 100%. Tais dados, frutos de estudo em banco de dados, representam uma funesta estatística que não pode ser desprezada.

Este prólogo faz desaguar no aspecto do desenvolvimento, exaustivamente tratado por todos os países em suas estratégias e não de forma diferente no Brasil no binômio Defesa – Desenvolvimento. Considerando, portanto, conforme disposto na Estratégia Nacional de Defesa a indissociabilidade desta da Estratégia Nacional de Desenvolvimento, tem-se que a mobilização em suas fases de preparo, principalmente, voltadas também para a prevenção de catástrofes, tem papel primordial na Estratégia Nacional de Desenvolvimento e, destarte, motivando a Estratégia Nacional de Defesa, assunto que será tratado mais detidamente em tópico específico.

Muito embora a história das catástrofes seja composta de sinistros naturais e artificiais, inegável se mostra o papel devastador das catástrofes naturais quando comparada àquelas provocadas pelo homem, tanto no que concerne ao número de vítimas, quanto às perdas materiais

No Brasil, as catástrofes naturais parecem mesclar uma significativa contribuição humana para seu agravamento, quais sejam:

1 – O crescimento descontrolado da população com a ocupação irregular de áreas;

2 – A desídia das autoridades públicas encarregadas de regular essas ocupações

88 SPIGNESI, Stephen J. Op. citado. 89 Caminhos de Geografia – Revista On line, Disponível em: http://www.ig.ufu.br/revista/caminhos.

html, Acesso em: 8 out.2011, 18h30m

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3 – A inexistência de campanhas de esclarecimentos, não só em relação aos fenômenos da natureza, mas em relação a algumas outras catástrofes relacionadas a doenças epidêmicas.

Essa receita monstruosa parece operar, ano após ano, catástrofes que assumem dimensões cada vez maiores.

Não obstante a inexistência de uma previsão legal, envolvendo diretamente a atividade de mobilização nacional em catástrofes, a possibilidade da utilização de sua estrutura está prevista

De acordo com o detalhado trabalho publicado no INPI em revista eletrônica dos “Caminhos da Geografia”, é apresentado, em Banco de Dados de Desastres Naturais, que surpreendentemente em todo o mundo, notadamente a partir da década de 50, houve um incremento significativo dos desastres naturais90 Por esse mesmo estudo destacam-se , conforme dados do EM-DAT, que:

A taxa de crescimento da população (15%) foi bem inferior à taxa de crescimento dos desastres (56%) para o período analisado (1900-2000). Ressalta-se que na década de 80, a taxa de desastres atingiu seu pico máximo, que foi de 100%.”91

Mas ainda segundo tal relatório, várias foram às causas desse aumento dos desastres no século XX, seja em função do crescimento populacional, ou mesmo, da segregação socioespacial, da acumulação de capital em zonas perigosas ou mesmo do avanço das comunicações e das mudanças globais.

No caso específico do Brasil, destaca esse trabalho, os dados totais do EM-DAT (261 registros) apresentaram-se bem inferiores aos dados da DEDC-SC computados para Santa Catarina (3,373 registros), onde, embora tal erro por possível omissão encontrado no EM-DAT, torne defasado seus dados, ambos os bancos de dados apresentaram grandes similaridades em relação à porcentagem de cada tipo de desastre, com correlação de 0,87. Destaca-se, nesse relatório, que as inundações representam 61% do total registrado.

Em termos de relatórios produzidos, no já mundialmente consagrado relatório da Munich Re92, foram apresentados, agora, em 2011, o mapa mundial de catástrofes naturais de 2010, onde se pode constatar que, mesmo longe de comparação às catástrofes mundiais, o Brasil tem, sim, ameaças palpáveis, quando considerados os tornados no sul do país, chuvas associadas à ocupação cada vez mais desordenada de áreas de morros e encostas nas cidades e tempestades extratropicais, contando ainda com uma miríade de eventos climáticos em toda

90 http://www.inpe.br/crs/geodesastres/conteudo/artigos/Marcelino-etal_2006_Banco_de_dados_de_desastres_naturais.pdf, acessado em 08/10/2011 as 18:00h;

91 Idem , pág, 192 http://www.munichre.com/en/reinsurance/customer_media/touch/default.

aspx?tt=naturalhazards acessado em 11/10/2011 às 10:15h

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Mobilização em Casos de Catástrofes Naturais ou Artificiais

a América do Sul, especialmente na costa do pacífico, o que pode mesmo ensejar a aplicação da mobilização internacional, assunto este que, pela sua importância, merece ser tratado em artigo específico, não sendo objeto no presente deste desenvolvimento temático.

Na história da humanidade, e aqui considerados tão somente a história contemporânea, as catástrofes sejam naturais ou artificiais já ceifaram milhões de vidas por todo o mundo e, inegável é, que, por ocasião dessas ocorrências, a mobilização nacional (latu sensu) demonstrou ser a saída mais eficiente para a contenção do evento, socorro, estabilização e reestruturação da área afetada. Na prevenção das ocorrências de catástrofes naturais, a mobilização nacional também tem demonstrado, ao longo da história, ser uma das melhores opções.

Nos mais recentes exemplos ocorridos no Brasil e mais especificamente na região serrana do Rio de Janeiro, a mobilização nacional foi utilizada com abrangência e intensidade.

Chuvas em grande quantidade, num volume não registrado antes, tomaram a região serrana do Rio de Janeiro, a partir de 11 de janeiro de 2011. O resultado, conhecido em todo o Brasil e também no mundo, foram as consequências da maior catástrofe climática do país com 506 mortes, ultrapassando outra infeliz marca do passado, quando, em 1967, em Caraguatatuba, houve 436 mortos.

Foram também severamente atingidas as cidades de Bom Jardim, Areal, Itaipava, Sumidouro e São José do Vale do Rio Preto. Nos primeiros dias de chuva, a maioria das mortes ocorreu em Nova Friburgo e em Teresópolis.

O colapso das principais cidades da região serrana foi total. Além de vidas ceifadas, pessoas enterradas vivas (e que até hoje permanecem desaparecidas), essas regiões tiveram perdas materiais, como desabamentos de casas, ruas e vilas inteiras; sua infraestrutura de serviços essenciais como abastecimento de água, esgoto, energia elétrica e telefonia foi completamente comprometida. As Forças Armadas necessitaram da utilização de comunicação satelital nos primeiros dias de atuação

A cidade de Teresópolis, que normalmente era responsável por 70% das hortaliças produzidas no estado do Rio de Janeiro, tiveram 80% das plantações devastadas pelas chuvas.

Tudo do que acima foi mencionado contribui tão somente para que se possa retratar de forma minimizada a catástrofe de magnitude incomensurável ocorrida na região serrana do Estado do Rio de Janeiro e destacar o desafio que ali foi lançado quanto à atuação da mobilização nacional.

As estradas de acesso estavam irremediavelmente comprometidas, não havia como demandar à região serrana pelos caminhos convencionais rodoviários.

A Marinha do Brasil, deslocando-se para o local da catástrofe em 13 de janeiro, já possuía um Hospital de Campanha montado no dia 14, além de disponibilizar helicópteros no transporte de pessoal e materiais.

Como atividades finalísticas a cargo da Marinha do Brasil, entre os dias 14 e

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25 de janeiro, foram realizados 2.227 atendimentos, apoio de viaturas e aeronaves à Secretaria de Ação Social para transporte de donativos; tarefas de reconhecimento aéreo e resgate de pessoal por aeronave.

Aqui, devem-se considerar aspectos nodais que justificaram a atividade de mobilização nacional, mesmo que constituída por meios não expressamente constantes da legislação que trata do assunto.

1 – Muito embora as defesas civis de diversos municípios e do estado do Rio de Janeiro tenham atuado com presteza e motivados com a envergadura da missão, sozinhos não teriam condições de prontamente oferecer a resposta que o momento exigia.

2 – Os princípios consagrados no SINAMOB só tiveram condições de serem observados e terem ações decorrentes, com a atuação das Forças Armadas na atividade de mobilização.

No que dizem respeito aos aspectos doutrinários da mobilização nacional, estes podem ser atualmente encontrados numa miríade de dispositivos legais, normativos, artigos, resoluções, inúmeras portarias, exposição de motivos, manuais e memorandos, todos espraiados por longas décadas, quando o cerne da questão não foi enfrentado com a seriedade necessária, qual seja, a motivação da sociedade para o comprometimento com a mobilização nacional. E decorre dessa questão a indagação de como se processa esse comprometimento social, do qual decorrerá todo o sucesso esperado, não só para a fase de preparo, mas também para a fase de execução da mobilização. A resposta poderá ser encontrada nos princípios do SINAMOB, ou melhor, na identificação social com os princípios do SINAMOB.

A falta de integração entre os órgãos competentes se apresenta como outro aspecto que tem nodal influência na mobilização em catástrofes, a saber, o pouco entrosamento entre os órgãos encarregados de fazer frente a esses sinistros. A experiência dá conta de que essa integração é hoje, ainda, muito incipiente, desde a capacidade para atuação conjunta até os aspectos mais simples, porém não menos fundamentais como o estabelecimento, quando da ocorrência do sinistro, de uma rede de comunicações que permita que toda a estrutura de mobilização fale entre si.

Portanto, pode-se destacar como principais óbices à atuação isolada dos órgãos de defesa civil, no enfrentamento de catástrofes, conforme destaca o próprio Ministério da Integração Nacional:

1 – O enfraquecimento dos órgãos de Defesa Civil, Estaduais e Municipaisb. 2 – O distanciamento entre União, Estados e Municípios.Destacam-se exemplos de eficiência das Forças armadas e Forças Auxiliares que,

em conjunto, trazem enormes benefícios na atuação da mobilização em catástrofes:1 – Os Hospitais de Campanha (HCamp), a exemplo do socorro em apoio

ao terremoto do Haiti, Chile e chuvas da região serrana. Os HCamp contribuíram, sobremaneira, para o equilíbrio e o restabelecimento das condições mínimas de saúde à população afetada e devem ser considerados indispensáveis nas atividades

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Mobilização em Casos de Catástrofes Naturais ou Artificiais

de mobilização nacional.2 – As células de Intendência da Força Aérea são estruturas que devem

também ser consideradas como de grande importância no estabelecimento dessa estrutura de mobilização.

Há de se levar em conta, no entanto, que, embora este artigo entenda a necessidade de mudança da legislação e da doutrina, no sentido de que a atuação em catástrofes (e nas catástrofes esteja inclusa a defesa ante ameaças externas – guerra) esteja inserida nas atividades de mobilização, há ainda um longo caminho a percorrer, no sentido da identificação social com as atividades de mobilização nacional. Especificamente, em relação às catástrofes, carece-se, em muito, de investimentos na fase de preparo da mobilização, voltada exclusivamente para a prevenção e a preparação em caso de desastres.

Há de se as considerar o importante trabalho que vem sendo desenvolvido pelo Ministério da Integração Nacional no sentido de estabelecer uma Plataforma Brasileira para redução de Riscos de Desastres, tendo como base cinco prioridades do marco de Hyogo, quais sejam:

1 - Garantir que a redução de risco seja prioridade nacional e local.2 - Identificar, avaliar e vigiar riscos e potencializar o alerta prévio.3 - Criar cultura de segurança e resiliência.4 - Reduzir fatores de risco.5 - Fortalecer a preparação para os desastres. Outra medida que importará em subsídios às ações de preparo para a mobilização

em desastres diz respeito ao Atlas Brasileiro de Desastres, este ainda em fase final de publicação pelo Ministério da Integração Nacional, que dissecará os municípios brasileiros com maior recorrência de desastres, contando para isso, com uma série histórica de até 30 anos de registros, o que propiciará a priorização do mapeamento de áreas de risco em 234 municípios, para subsidiar aplicação dos recursos de prevenção. A divulgação desses dados, paralela a atividades de esclarecimentos junto a população, tudo isso, em conjunto ao aporte de recursos, ensejará o reconhecimento da atividade de mobilização pela sociedade, desde a sua fase de preparação, tendo em vista a identificação prévia das fraquezas municipais e por apontar o caminho para a correção das mesmas.

A desoneração da indústria nacional de determinados encargos tributários foi um enorme passo dado quando da assinatura dia 29 de setembro de 2011, desse novo regime especial de tributação, o que propiciará não só a diminuição da dependência externa em equipamentos de defesa, como também incentivará as indústrias no desenvolvimento de equipamentos, equipagens e oferecimento de serviços duais, atendendo não só as necessidades das Forças Armadas, como também da sociedade. Possibilitará à indústria trabalhar em prol da defesa nacional sem comprometer o seu mote, qual seja, o lucro.

Ainda de acordo com o Governo Federal, os fabricantes de produtos militares ficarão isentos, por cinco anos, do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI),

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Programa de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/PASEP) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins). Tal isenção alcançará também as compras de insumos, mesmo os importados. As empresas precisam ter sede ou fábrica no Brasil para ter direito ao novo benefício, comprovar conhecimento tecnológico na área, ter registro no Ministério da Defesa e produzir equipamentos considerados estratégicos e de difícil obtenção, como munição, armas, aviões, satélites, foguetes, fardas, veículos e rações. De acordo com o Ministério da Defesa, 186 empresas se encaixam dentro dos requisitos exigidos.

Segundo dados ainda do Ministério da Defesa, divulgados de 2000 a 2010, o Brasil importou US$2,37 bilhões em equipamentos militares, contra US$470 milhões de exportações no mesmo período – déficit de cerca de US$1,9 bilhão.

5 CONCLUSÃO

De tudo o que foi aqui exposto, considera-se que, embrionariamente, poder-se-á contribuir para o aperfeiçoamento da mobilização nacional, a partir do ponto em que se observe a motivação social como mecanismo impulsionador e legitimador para tal atividade. Conclui-se, ainda, que a atuação forte, incisiva e participativa nas catástrofes, cada vez mais frequentes e contundentes em nosso país, é o caminho para a plena identificação e reconhecimento social da magnitude dessa atividade.

Apresenta-se, destarte, este caminho, como legítimo ao estabelecimento de uma base de preparo para uma mobilização maior, aqui considerada, a voltada para as ameaças externas, base esta construída a partir da atuação em catástrofes.

Enceta-se tal identificação social ao considerar que a palavra ‘princípio’ tem como significado maior uma fonte de onde nasce um caminho e de onde tudo decorre, razão pela qual coadunar a motivação social aos princípios do SINAMOB representa a identificação e o comprometimento social com a mobilização nacional.

Entende-se, ainda, que sem orçamento próprio, especificamente destinado à mobilização, e sem o palpável reconhecimento popular, será difícil desencadear ações duradouras e abrangentes de mobilização. O caminho para a estruturação da mobilização é atuar em catástrofes, é possuir orçamento próprio.

Há dependência, ainda, de uma preparação da classe dirigente, no sentido de propor mudanças legais, de ativar os embotados artigos de excelentes dispositivos já existentes, enquanto procura-se alcançar do empresariado e da sociedade, em geral, sua participação, reconhecimento e motivação, para, numa situação de catástrofes, seja ela a guerra ou as calamidades, evoluir de uma situação de economia de paz, com uma estrutura produtiva normal, para uma outra, voltada ao atendimento, prioritariamente, dos esforços que lhe forem impostos, considerados aqui a dualidade no desenvolvimento da indústria nacional de defesa e a resiliência da nação.

Há de se considerar ainda a possibilidade de criação de um Fundo de Mobilização Nacional, sem que haja necessidade de participação de cada integrante

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Mobilização em Casos de Catástrofes Naturais ou Artificiais

do subsistema setorial de mobilização, com seus já escassos orçamentos, e contando para tal com recursos próprios, objetivando o cumprimento de suas atribuições legais para a mobilização nacional, aí incluídas as catástrofes, sobretudo nas atividades de preparação que abrangeria a prevenção às situações de calamidade.

O princípio da mobilização deverá subsumir as atividades de preparação e atuação para a guerra, bem como a preparação e a atuação em catástrofes, esta abrangendo aquela, quando ambas as formas de atuar estão em completa sintonia com as atividades de defesa nacional.

O alargamento das possibilidades de utilização da mobilização, não só ensejará a identificação social com a atividade, como também possibilitará o aperfeiçoamento dos setores envolvidos na mobilização.

A integração das capacidades dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, possibilitará a orientação e a coordenação, com o máximo de eficiência, estimulando o fluxo de informações entre os órgãos integrantes, o que contribuirá para o reconhecimento social da atividade de mobilização nacional, sua importante atuação em catástrofes e, por conseguinte, propiciarão transformações que tornem robustas e perenes as ações em prol da defesa nacional.

6 REFERÊNCIAS

BONAVIDES, Paulo. Ciência política. 10. ed. [S.l.]: Malheiros, 2003.

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______. Decreto n.º 5.484, de 30 de junho de 2005. Aprova a Política de Defesa Nacional, e dá outras providências. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/Decreto.

______. Decreto n.º 6.592, de 2 de outubro de 2008. Regulamento da Lei de Mobilização Nacional. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/Decreto.

______. Decreto n.º 6.703, de 18 de dezembro de 2008. Aprova a Estratégia Nacional de Defesa, e outras providências. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/Decreto.

______. Decreto n.º 7.294, de 6 de setembro de 2010. Aprova a lei da Política de Mobilização Nacional. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/Decreto.

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Paulo Roberto Neves Augusto da Silva

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A Indústria Brasileira de Material de Defesa e sua Contribuição para a Mobilização Nacional

A INDÚSTRIA BRASILEIRA DE MATERIAL DE DEFESA E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA A MOBILIZAÇÃO NACIONAL

Ilton Agostinho de OliveiraCoronel Intendente da Reserva da Aeronáutica, estagiário do Curso de Logística e Mobilização Nacional da Escola Superior de Guerra, em 2011.

Resumo

O objetivo deste trabalho é estudar, de forma crítica e objetiva, a importância da Indústria Brasileira de Material de Defesa, e sua contribuição para a mobilização nacional, de acordo com o orçamento do Ministério da Defesa. Percebe-se que a indústria de defesa anda estagnada, pois nada havia que garantisse o prosseguimento dos investimentos em tecnologia. A legislação brasileira sobre a mobilização nacional existe desde 1988, com a Constituição Federal, e foi devidamente incrementada com a criação da Política Nacional de Defesa, de 2005, que veio alavancar a esperança para o renascimento da indústria brasileira de defesa. Tal situação somente poderá ser revertida se o governo federal cumprir com o que prevê o Plano Nacional de Defesa, fomentando o aumento da mão de obra especializada, apoiando e destinando recursos para o cumprimento do que foi planejado, aliado à Medida Provisória n.º 544, de 29 de setembro de 2011, que dispõe sobre regras de incentivo à inovação tecnológica e à agregação de valor. A Indústria Nacional de Material de Defesa faz parte da Política Nacional de Defesa, e dessa forma pertence ao universo de defesa do Brasil, possuindo um amplo potencial de desenvolvimento. Assim, estudar o atual posicionamento dessa indústria dentro do espectro nacional, bem como a sua capacidade de desenvolvimento, proporcionando a geração de empregos, a utilização e o desenvolvimento da tecnologia nacional, sem a devida contrapartida governamental, levará o leitor a ter uma visão diferenciada sobre o que é a teoria e como se apresenta a realidade. Este artigo revê alguns tópicos históricos da indústria nacional de defesa, sua situação atual e suas principais empresas. A análise das conjunturas internacional e nacional permitirá identificar alguns óbices que impedem o desenvolvimento da indústria de defesa brasileira, bem como o que está sendo feito em favor dessa indústria.

Palavras-chave: Política Nacional; Orçamento; Legislação; Tecnologia; Conjuntura.

1 INTRODUÇÃO

“Ganha a guerra, quem mobiliza primeiro, e não quem dá o primeiro tiro”.

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Ilton Agostinho de Oliveira

(General Moltke, prussiano, em 1870, na Guerra Franco-Prussiana)

A compreensão crítico-científica das relações de poder, na esfera internacional, depende de uma profunda análise dos fundamentos sobre os quais estão constituídas, sobretudo, na tradição greco-romana, na cristão-medieval e modernizadas pela “Paz de Westfália”.

Percebe-se que é indissociável compreender a relação entre a religião cristã com a política internacional européia, a partir da sua iniciativa internacionalista, quando a Europa une a cruz à espada durante as Grandes Navegações, para empreender seu modelo expansionista sobre o mundo.

Novamente, no século XIX, as necessidades para atender as motivações imperialistas sob o domínio da Pax Britannica, por ocasião da Revolução Industrial, a Europa parte para o neocolonialismo, com o subsídio ideológico e conta com a religião cristã, através de ações missionárias-catequetéticas.

Verifica-se que a ciência, aliada ao capital, opera na estruturação e manutenção do poder, relacionando sua dinâmica com os poderes, tradicionalmente, constituídos. Rompida a ordem neocolonial ao final da Segunda Guerra Mundial, os países ricos mantêm a relação de poder aos agora emancipados Estados Nacionais.

As estruturas políticas, aliadas às políticas econômicas alicerçadas na agregação tecnológica, impõem uma ordem competitiva, inatingível para os que não dispõem de meios científicos. A produção tecnológica é o principal suporte de barganha na política internacional, a partir da hegemonia da revolução científico-técnica.

Novos atores internacionais passam a exercer importância significativa, ao lado dos Estados Nacionais, como a ONU, o sistema internacional a ela vinculado e as companhias multinacionais. Assumem papel de destaque no novo sistema internacional a partir da Segunda Guerra Mundial e, posteriormente, lançam as bases da globalização.

A nova ordem internacional, estabelecida após a Guerra Fria, destacou diferentes tipos de conflitos de interesses, os quais possuíam características únicas em um mundo bipolar. Mais recentemente, questões como segurança nacional, poder bélico e poder econômico, continuam destacando o Estado como sendo o principal interventor nas relações de poder e nas relações políticas no globo, enquanto que as empresas transnacionais vão dinamizando a ordem e a economia mundial.

Este artigo foi elaborado como uma viagem, onde são abordados aspectos históricos e jurídicos. Caminhando com base no marco legal, chegar-se-á ao clímax, que é o orçamento, ponto de fundamental importância para que a Indústria Nacional de Defesa - IND possa existir; e por fim será apresentada uma visão futurística sobre a contribuição que a IND poderá dar à mobilização nacional.

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A Indústria Brasileira de Material de Defesa e sua Contribuição para a Mobilização Nacional

1.1 O QUE CONTA A HISTóRIA

“O fortalecimento da capacitação do País no campo da defesa é essencial e deve ser obtido com o envolvimento permanente dos setores governamental, industrial e acadêmico, voltados à produção científica e tecnológica e para a inovação. O desenvolvimento da Indústria de Defesa, incluindo o domínio de tecnologias de uso dual, é fundamental para alcançar o abastecimento seguro e previsível de materiais e serviços de defesa”. (Item 6.9 do Decreto 5.484, de 30 de junho de 2005, que aprovou a Política de Defesa Nacional) .

É ponto pacífico dizer que a Indústria de Defesa - ID é um setor estratégico para qualquer nação. Quando o governo dessa nação cria incentivos que favorecem seu desenvolvimento dual, comercializando seus produtos com as Forças Armadas – FA, e também no âmbito internacional, diz-se que esse país tem consciência do significado de mobilização.

É preciso que a ID esteja inserida perfeitamente no Parque Industrial Nacional, constituindo-se de forma diferenciada na produção de equipamentos e materiais específicos, o que obrigará o país a planejar seus elevados custos, pois o processo de fabricação exige investimentos de monta.

Sabe-se que o Brasil possui grande capacidade intelectual para o desenvolvimento tecnológico e industrial, o que certamente proporcionará a produção de componentes de defesa de excelência e de renome mundial.

Mas nem sempre foi assim. As cabeças pensantes sempre existiram, mas uma política de destruição avassaladora de nossa ID, praticamente acabou com a esperança que havia no anseio de muitos brasileiros, paralisando as aquisições de material para as Forças Armadas, fazendo com que os equipamentos nacionais fossem praticamente deteriorados.

Atualmente, depois da criação do Ministério da Defesa – MD, o que se nota é um descaso com o preparo e emprego das instituições militares brasileiras, pois os investimentos voltados para esse campo têm sido bastante prejudicados com o constante contingenciamento, que já se tornou uma rotina anual. De nada adianta a aprovação do orçamento pela Lei Orçamentária Anual - LOA, se depois surge o famoso contingenciamento, que vem arrasando os planejamentos militares e, consequentemente, não deixando migalhas, sequer, para a Indústria Nacional de Defesa - IND. A verdade é que não há, em pleno século XXI, uma Política de Defesa adequada, voltada para a Indústria de Defesa.

De uma forma geral, o mundo entende que uma economia forte gera uma indústria forte, e por analogia, uma defesa forte gera uma IND forte. O mundo atual não é confiável, e dessa forma o país que depender da Indústria de Defesa externa estará propenso a fracassar, pois na hora que houver real necessidade poderá sofrer embargos, e dessa forma poderá ser prejudicado, pois sua IND doméstica não estará à altura de suas necessidades.

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Ilton Agostinho de Oliveira

O poder militar, a guerra como arte, sempre entusiasmou os homens, fazendo com que uma parte do conhecimento sempre se voltasse para os fenômenos da guerra, seus ataques e suas defesas. Por outro lado, as FA do mundo todo sempre dedicaram sua atenção ao progresso da ciência, da tecnologia, da inovação e da pesquisa, a fim de que pudessem utilizá-las de acordo com os interesses militares.

O conhecimento científico e os avanços tecnológicos passaram a ser desejados pela área militar por razões estratégicas, procurando de alguma forma utilizá-los na consecução de materiais e equipamentos militares com o firme propósito de defender a soberania do país.

Procurando nos anais da história é fácil identificar que nenhum país alçou o patamar de potência mundial com uma indústria nacional de defesa baseada e controlada por interesses externos.

O MD ao divulgar a Estratégia Nacional de Defesa - END visou a uma estratégia de defesa que deverá ser desenvolvida a longo prazo, com a intenção de aparelhar as FA, incentivando a participação da indústria nacional de defesa. Em última instância, concedendo benefícios e isenção de impostos na produção de equipamentos de forma dualista, consolidando dessa forma a indústria nacional de defesa no Brasil.

1.2 MARCO LEGAL

“[...] é a criação de um verdadeiro regime especial tributário para a Indústria da Defesa. É isso que nós hoje estamos, aqui, enfaticamente lançando, através dessa Medida Provisória [...]” (Presidente da República Dilma Rousseff, na apresentação da MP 544, de 29 de setembro de 2011) .

Antes de prosseguir nessa viagem, é importante saber o que é ‘’Mobilização Nacional’. A Mobilização Nacional está capitulada na Constituição Federal de 1988, especialmente nos artigos 22 e 84, informando que é competência da União legislar a Mobilização Nacional, bem como, decretar total ou parcialmente a Mobilização Nacional.

A Mobilização Nacional é assim conceituada, de acordo com a Lei n.º 11.631, de 27 de dezembro de 2007:

Mobilização Nacional é o conjunto de atividades planejadas, orientadas e empreendidas pelo Estado, complementando a Logística Nacional, destinadas a capacitar o País a realizar ações estratégicas, no campo da Defesa Nacional, diante de agressão estrangeira.

Para se falar sobre a IND, faz-se necessário mostrar a legislação existente e efetuar algum comentário, o que facilitará a conclusão do trabalho. Numa linha temporal, será mostrado o marco legal da política da Indústria Nacional de Defesa.

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A Indústria Brasileira de Material de Defesa e sua Contribuição para a Mobilização Nacional

Em 19 de julho de 2005, foi assinada a Portaria Normativa n.º 899/MD, que aprovou a Política Nacional da Indústria de Defesa – PNID, constituída de seis artigos, adotando definições, estabelecendo objetivos e orientações e estabelecendo responsabilidade por sua coordenação.

Após sua publicação, a Associação Brasileira das Indústrias de Material de Defesa – ABIMDE declarou ter certeza de que a aprovação desta política é um passo decisivo para o fortalecimento da Base Industrial de Defesa no Brasil – BID, pois, além de definir a abrangência desta indústria, e os produtos estratégicos de defesa, coloca como objetivos para o fortalecimento da BID a necessidade de conscientização da sociedade, quanto às necessidades da BID; produzir e desenvolver os produtos estratégicos no Brasil; reduzir a carga tributária; ampliar a capacidade de aquisição das FA em indústrias brasileiras; melhorar a qualidade dos produtos e aumentar a competitividade para expandir as exportações e melhorias da capacidade de mobilização.

Já em 24 de abril de 2006, o MD assina a Portaria Normativa n.º 586, que aprovou as Ações Estratégicas para a Política Nacional da Indústria Nacional de Defesa, com apenas três artigos, que se destacam quanto à conscientização da sociedade; quanto à necessidade de o País dispor de uma forte Base Industrial de Defesa; e por propor a participação da Presidência da República, dos Ministérios e de outras Entidades nesse esforço em prol do incremento da indústria de defesa. Assim, são partícipes desse trabalho:

_ Ministério da Ciência e Tecnologia;_ Ministério do Desenvolvimento;_ Ministério da Indústria e Comércio Exterior;_ Ministério das Relações Exteriores;_ Ministério da Fazenda;_ Ministério do Planejamento;_ Ministério do Orçamento e Gestão;_ Confederação Nacional das Indústrias (CNI);_ Federações das Indústrias_ Federação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil (AIAB);_ Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa (ABIMDE);_ Sindicato Nacional das Indústrias de Materiais de Defesa (SIMDE).Além das citadas, há outras instituições. Cabe ampliar a atuação da Assessoria

Parlamentar do Ministério da Defesa (MD) junto ao Congresso Nacional nos assuntos de interesse da BID, buscando o apoio das empresas e entidades de classe ligadas à indústria de defesa. Mas como será verificado tudo isso ficou no papel, surgindo dificuldades e restrições orçamentárias, contrariando a estratégia adotada pelo Governo Federal.

Sabe-se que o MD é o órgão do Governo Federal responsável pela direção superior das FA, constituído pelos Comandos da Marinha, do Exército e da

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Ilton Agostinho de Oliveira

Aeronáutica. Sua principal missão é manter a soberania nacional e a integridade territorial, bem como estabelecer políticas ligadas à defesa e à segurança do País, como a PND.

Cabe ao MD promover a ID. Particular atenção deverá ser dada a essa missão, pois não poderá ser responsabilizado um agente da administração federal, ficando essa missão de forma acéfala, uma vez que não são criadas responsabilidades e punições para uma instituição.

Para a Mobilização Nacional - MN ser implementada foi preciso a criação de um sistema complexo que foi estatuído por meio da Lei n.º 11.631, de 27 de dezembro de 2007, que dispõe sobre a Mobilização Nacional, criando o Sistema Nacional de Mobilização – SINAMOB, que consiste no conjunto de órgãos que atuam de modo ordenado e integrado, a fim de planejar e realizar todas as fases da Mobilização e da Desmobilização Nacionais.

No Decreto n.º 6.703, de 18 de dezembro de 2008, que estabelece a Estratégia Nacional de Defesa - END, o Governo federal buscou o fortalecimento das expressões do poder nacional, baseado nas condições econômicas existentes na ocasião, em particular no volume registrado de exportações. A END preconiza o fortalecimento da BID, voltada para o desenvolvimento de tecnologias com aplicação civil e militar. Necessário é que seja implementada uma série de medidas destinadas a facilitar a interação militar com o âmbito civil, aliadas aos instrumentos que garantam as exportações, uma vez que somente o mercado interno não é capaz de sustentar essa indústria, no longo prazo, nem de propiciar o retorno aos pesados investimentos em pesquisas, desenvolvimento e inovações por ela demandados.

Já o Decreto n.º 7.294 de 6 de setembro de 2010, dispõe sobre a Política de Mobilização Nacional, sendo que em seu art. 2.º estatui que a Política de Mobilização Nacional consiste no conjunto de orientações do governo federal, com o objetivo de impulsionar o Estado Brasileiro para o preparo e a execução de Mobilização Nacional e da consequente Desmobilização Nacional.

Em 29 de setembro de 2011, foi assinada a Medida Provisória n.º 544 que estabelece normas especiais para as compras, contratações de produtos, de sistemas de defesa, e de desenvolvimento de produtos e de sistemas de defesa, além de dispor sobre as regras de incentivo à área estratégica de defesa.

Esse mecanismo de fomento à IND é um desdobramento do Plano Brasil Maior, lançado em agosto, que alia defesa comercial e compras governamentais a incentivos, à inovação em produtos e métodos produtivos para tornar mais competitivos os setores que costumam ter dificuldades com o real valorizado, sofrendo a concorrência de competidores internacionais e empregam muito em confecção, calçado, móveis e softwares, para aumentar a competitividade da indústria nacional, a partir do incentivo à inovação tecnológica e à agregação de valor.

Para a compra e contratação de produtos e sistemas de defesa, a MP institui regras especiais, além de criar um regime especial de tributação que desonera as

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empresas voltadas para o setor. Entre os principais encargos desonerados podem-se citar o IPI, PIS/PASEP e COFINS.

Para o desenvolvimento de tecnologias voltadas para o setor de defesa, a MP estabelece incentivos que trarão benefícios às indústrias do setor, como aos trabalhadores, proporcionando maior oferta de empregos e melhores condições para aquisição de bens e serviços importantes para o Brasil.

A MP contempla aqueles produtos considerados estratégicos; entre eles estão os veículos, foguetes, equipamentos eletrônicos, armas e munições, satélites, aviões, embarcações, fardamento, rações e softwares, além de obras e serviços utilizados em atividades de defesa.

A Mobilização Nacional deve ser entendida como uma atitude eminentemente consciente e participativa, que tem como estímulo preponderante uma expectativa de permanente possibilidade de conflitos que possam direta ou indiretamente, envolver o país. (Slide da palestra da Professora Maria Leonor da Silva Teixeira no CLMN-2011)

Conforme exposto até o momento, pode-se dizer que a mobilização nacional afeta as cinco expressões do Poder Nacional, verificando alguns fatores:

Expressão Econômica: Fatores econômicos são os meios capazes de produzir variações, quantitativas e qualitativas, nos fundamentos do Poder Nacional e em todos os demais componentes do sistema econômico, bem como nas relações que entre eles se processam, com vistas à produção de efeitos econômicos. No rol desses fatores, destacam-se: modernização e adaptação às mudanças; capacidade do conhecimento científico e tecnológico; capacidade de acumulação e absorção do capital fixo; capacidade empresarial; capacidade e financiamento; capacidade de consumo e capacidade de participação.

Expressão Psicossocial: Os fatores são, entre outros: Cultura e padrões de comportamento; níveis de bem-estar; dinâmica ambiental e dinâmica estrutural.

Expressão Militar: Destacam-se os seguintes fatores: doutrina militar; estrutura militar; capacidade de comando e controle; integração das Forças Armadas; instrução, adestramento e aprestamento; moral militar; capacidade logística; capacidade de mobilização; serviço militar e capacidade científico-tecnológica.

Expressão Política: Os fatores indicam estados e comportamentos dos fundamentos e dos órgãos e ainda, as diferentes formas e variações de intensidade das interações mantidas entre esses diversos componentes analíticos da expressão: situação geopolítica; condicionamentos históricos; cultura política; doutrinas e ideologias políticas; qualidade e ordenamento jurídico; qualidade e atitude do eleitorado; qualidade e atuação das elites e lideranças políticas e Interação dos poderes do Estado.

Expressão Ciência, Tecnologia e Inovação: Os fatores são os elementos dinâmicos que influem sobre os fundamentos da expressão, valorizando-os ou depreciando-os, entre eles destacam-se: educação; comunicação; nível de pesquisa

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e desenvolvimento experimental; dinâmica produtiva; infraestrutura científica e tecnológica; biodiversidade; diversidade mineral e proteção ambiental.

2 DO ORÇAMENTO

“O desejo de conquistar é sem dúvida algo de ordinário e natural, e todo aquele que se entrega a tal desejo, quando possui os meios para realizá-lo, é antes louvado que censurado.”

(Niccolo Maquiavelli, em ”O príncipe”)

Esta é uma das melhores definições sobre o que vem a ser orçamento para a administração pública. Segundo Willoughby (Apud BUEHLER, 1940):

[...] o orçamento é um documento que o executivo principal, sendo a autoridade responsável pela conduta de aplicação dos recursos das atividades governamentais, utiliza diante das entidades e autoridades que levantam receitas ou concedem recursos, para relatar a forma que ele e seus subordinados administraram os recursos do governo durante o ano fiscal findo. Mostra também a situação atual do tesouro público e, baseado nestas informações, ele estabelece o plano de ação para o ano seguinte e aponta os meios pelos quais as atividades serão financiadas.

2.1 MARCO LEGAL

Traçando uma linha do tempo é possível conhecer a história do orçamento no Brasil. A primeira Constituição Brasileira de 1824 apresentou os primeiros passos, ainda incipientes, sobre a elaboração do orçamento da União, estipulando que a iniciativa das leis sobre impostos competia à Câmara dos Deputados, enquanto ao Poder Executivo cabia a elaboração da proposta orçamentária que seria enviada à Assembléia Geral, composta pelo Senado e pela Câmara para aprovação da Lei Orçamentária. No que tange ao orçamento, era atribuição do Ministério da Fazenda receber o orçamento dos outros ministérios e seus respectivos orçamentos, e apresentá-los à Câmara dos Deputados, juntamente, com as possíveis receitas, cabendo ao Poder Legislativo a competência para fixação anual das receitas e despesas do Governo Federal.

Na Constituição de 1891, o orçamento passou a ser competência do Congresso Nacional, sendo que a proposta orçamentária seria encaminhada pelo Poder Executivo para votação do Poder Legislativo.

Em 1922, com a implantação do Código de Contabilidade da União surgem as orientações contábeis, financeiras patrimoniais e orçamentárias.

A Constituição Federal de 1934 introduziu a classificação da despesa, dividindo-a em duas partes: uma fixa e outra variável, além de atribuir a responsabilidade pela elaboração da proposta orçamentária ao Presidente da República, cabendo ao Poder Legislativo a votação do orçamento e o julgamento das contas do Presidente.

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Já em 1937, a Constituição possuía um capítulo com seis artigos sobre a elaboração da proposta orçamentária, tendo como característica a classificação da despesa em itens para cada serviço, departamento, estabelecimento ou repartição, facultando a necessária flexibilidade na fase da execução.

Em 1946, a nova Constituição no quesito ‘proposta orçamentária’ era semelhante à de 1934, onde o Poder Executivo elaborava o projeto de lei, que era debatido e votado no Poder Legislativo.

Em 17 de março de 1964, surge a Lei n.º 4.320, que vigora até os dias atuais, que estatuiu normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.

A Constituição de 1988 estatuiu que a prerrogativa de propor emendas ao Projeto de Lei Orçamentária cabe ao Poder Legislativo, além de indicar quais serão as receitas que suportarão as despesas públicas, exigindo ainda do Poder Executivo a elaboração anual da LDO – Lei de Diretrizes Orçamentárias, com a finalidade de orientar a confecção da Lei Orçamentária. A Constituição se refere aos planejamentos de médio e longo prazos e ao controle do setor público pelo Poder Legislativo.

No Brasil, depois de aprovada a LDO, é confeccionada a LOA, votada pelo Congresso e sancionada pelo Presidente da República.

O orçamento do Governo Federal é um instrumento para a organização e planejamento dos recursos financeiros. A Política de Defesa do Brasil garante recursos suficientes e contínuos para proporcionar condições eficazes e eficientes para o preparo e emprego das FA, mas é verificado que, ano após ano, o orçamento de defesa representa muito pouco em relação ao Orçamento Geral da União - OGU, onde a maior parcela está voltada para o pagamento de pessoal.

2.2 OS NÚMEROS

Assim, com base em pesquisa realizada no site da Secretaria de Orçamento Federal – SOF, serão analisados os valores repassados no último quinquênio, conforme abaixo:

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Numa abordagem rápida, verifica-se que pouquíssimos recursos foram destinados ao MD para aplicação em investimentos. A razão entre o orçamento aprovado pela LOA e o valor destinado para investimentos ficaram assim: 2007 (1,7%), 2008 (7,6%), 2009 (2,2%), 2010 (2,5%) e 2011(3,6). Os recursos destinados aos investimentos do MD são ínfimos, em relação às suas necessidades, não servindo de atrativo para os empresários envolvidos com a IND.

Em países em outro estágio econômico, onde a ID é bastante desenvolvida, o governo proporciona esse crescimento, efetuando grandes encomendas, aumentando o PIB, o número de trabalhadores empregados e aumentando suas divisas externas com a venda para os países dependentes.

Está claro que se faz necessário o reaparelhamento das FA tendo em vista a cobiça de todo nosso território, por suas riquezas e, em particular, da Amazônia. O ideal seria que os equipamentos militares fossem produzidos em nosso quintal, com uma tecnologia autóctone, favorecendo dessa forma a IND com o objetivo de monitoramento de nossas fronteiras, além de uma integração dos projetos militares aos projetos nacionais, facilitando assim uma indústria dualística, ora favorecendo a tecnologia militar, ora favorecendo os interesses industriais.

Todos sabem que a Segurança Nacional estará comprometida se não possuir os devidos meios contra ameaças externas, pois o Brasil depende, grandemente, da indústria de outros países, que em caso de conflito poderão cancelar os contratos de materiais existentes, deixando o Brasil em situação difícil.

Conforme pesquisa da SIPRI - Stockholm International Peace Research Institute – Suécia - 2008, entre as dez maiores produtores mundiais de material de defesa, seis são americanas (Boeing, Lockheed Martin, Northhrop Grumman, Raytheon, General Dynamics e L-3 Communications); uma é italiana (Finmeccanica); uma é francesa (Thales) uma é inglesa (BAE Systems) e uma é do Oeste Europeu (EADS).

Dessa forma, é possível verificar a dependência mundial existente. É comum países sul-americanos adquirirem armamento e outros produtos militares em fornecedores fora do continente sul-americano, por falta de uma IND, não somente brasileira, mas também sul-americana, o que contribui para o enfraquecimento da defesa desses países, como também cria uma oportunidade para os empresários que ainda não vislumbraram esse nicho sul-americano, bastando para isso que a IND seja devidamente estimulada, com investimentos agradáveis, a fim de que os fornecedores estrangeiros possam ser substituídos por fornecedores nacionais, com apoio governamental. No Brasil, as maiores empresas voltadas para a indústria de defesa são: Embraer, Taurus, CBC, Condor e IBCA.

Para estimular uma indústria, seja ela de defesa ou não, o mínimo necessário é o capital, e em nosso caso os recursos destinados a investimentos do orçamento da União. Se não houver um entendimento governamental, voltado para um orçamento atrativo, proporcionando o surgimento de empresas voltadas para a

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defesa nacional, de nada adiantará regular ou legislar em prol desse segmento da indústria.

A PND, de 2005, estabeleceu objetivos para o fortalecimento da BID, havendo a necessidade de conscientizar a sociedade em geral quanto à necessidade de: produzir e desenvolver produtos estratégicos no Brasil; reduzir a carga tributária; ampliar a capacidade de aquisição das FA em indústrias brasileiras; melhorar a qualidade dos produtos; aumentar a competitividade para expansão das exportações e melhorar a capacidade de mobilização.

Até a criação da END, em 2008, o Brasil não havia experimentado uma política de Estado voltada para a Defesa Nacional. Nunca foi elaborado um programa de aquisições voltado para a indústria nacional, com uma política adequada para a previsão de sua demanda, e, em consequência, impossibilitado de programar e calcular essa demanda. Hoje é uma realidade o fato de que possuir uma Indústria Nacional de Defesa é a garantia de suprimento das FA e a sustentação da Soberania Nacional.

Merino identificou que as deficiências estruturais do setor da Indústria de Defesa carregam um sério problema institucional. A raiz do problema estaria na falta de uma clara política de apoio ao setor, que procurasse atender aos interesses da Segurança Nacional. Uma política que garantisse o permanente desenvolvimento de uma tecnologia autóctone, de forma estável e longe de sobressaltos capazes de provocar perdas de capacitação tecnológica já adquirida, e que afastasse o perigo de aquisições oportunistas que afetam a sobrevivência da indústria no longo prazo. (MERINO, 1991).

3 VISÃO PROSPECTIVA

“As coisas futuras ainda não existem; e se ainda não existem, não existem presentemente. De modo algum podem ser vistas, se não existem. Mas podem ser prognosticadas pelas coisas presentes que já existem e se deixam observar.” (Santo Agostinho)

Prever o futuro é futurar; predizer, prognosticar; supor, conjecturar. O futuro

possível de ser previsto é um futuro feito de conjecturas gestadas no presente e que serão, ao longo do tempo, testadas, confirmadas ou refutadas.

Oráculos, pitonisas, sacerdotes, adivinhos, santuários e sortilégios são palavras recorrentes na mitologia e traduzem a fé na existência de um poder superior e na possibilidade de relações recíprocas com este poder. Tirésias foi o maior deles. Cego, recebeu de Zeus o dom da manteia, conhecia o passado, o presente e o futuro. De Atena, ele recebeu o dom da adivinhação, da interpretação do voo e da linguagem dos pássaros.

Compreender o futuro, como processo, implica ultrapassar os limites da

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linearidade e da causalidade e percebê-lo sempre como um tempo que se situa no encontro do presente e do futuro. Um intervalo dinâmico, onde sujeitos e sociedades se posicionam e se reposicionam constantemente na busca da realização da vida presente e futura.

Toffler (1994, p. 157) advoga que “a sedução da informação” e o desprezo por tudo o que é estável e consolidado provoca a antecipação sistemática do futuro, o que pode ser visualizado nos “sinais indiscutíveis de uma estrutura social doente”.

O dilúvio de novidades que está a ponto de se despejar sobre todos nós irá se espalhar das universidades e centros de pesquisa para as fábricas e escritórios, do mercado e dos meios de comunicação de massa para os nossos relacionamentos sociais, da comunidade para o lar. (TOFFLER, 1994, p. 196)

Sobreviver ao futuro é adaptar-se. Adaptar-se é superar o choque do futuro que já está entre nós. Para muitos, isto é um desafio intransponível, crise derradeira num cenário marcado pela transitoriedade, que promove a emergência da adversidade e multiplica ao infinito as possibilidades de escolha e a responsabilidade do indivíduo pelas mesmas.

A partir dos idos de 90, numa conjuminância de fatores, a ciência, tecnologia e inovação na área de defesa foram afastadas do país, o que veio dilapidar os fabricantes nacionais, quando então o Brasil se tornara dependente do exterior.

É preciso ter em mente que o Conflito das Malvinas ainda é recente na página da história, onde se pode tirar como lição a competência da IND inglesa que foi de fundamental importância na vitória, uma vez que os argentinos não possuíam uma IND tendo que adquirir seus materiais no exterior, quando sofreram embargos, facilitando sua derrota.

Para os tempos modernos, o futuro é o suporte do progresso, um acelerador do presente que nos impulsiona em direção a novas conquistas. O futuro não mais “a Deus pertence”, é uma conquista e construção do homem no exercício da sua racionalidade. Um horizonte temporal a partir do qual se subtrai, supera e ultrapassa ao presente. Na concepção moderna, o futuro não é algo que surge, de forma independente e autônoma, ele é causado e como tal pode ser conhecido, antecipado, controlado, ou melhor, projetado e planejado.

É importante que a IND tenha seu foco voltado para a defesa dissuasória, contra novos e potenciais atores agressivos. É digna de apreço a projeção de poder, em qualquer lugar do mundo, para a defesa do país contra crescentes interesses de ‘aliados’ e para a manutenção da paz, o que exigirá sempre uma pronta resposta.

É necessário que o desenvolvimento científico, tecnológico e industrial com escala e criatividade inovadora suficientes aos diversos projetos, atuais e futuros, e a multiplicação de efeitos por toda a economia brasileira, ajudem a colocar a IND, em novo e superior patamar de desenvolvimento social e de significativa

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projeção econômica na comunidade internacional. Apesar do anúncio bombástico do Governo Federal proclamando benesses para os empresários da ID, o orçamento do MD não contemplou somas importantes para investimentos nos últimos cinco anos. De nada adianta a existência de uma END se não houver recursos disponíveis e suficientes. Como defender a Amazônia (Verde e Azul) se as FA não possuem a tecnologia necessária? Os parcos recursos destinados aos investimentos inibem o desenvolvimento de tecnologias de defesa, sejam aquelas desenvolvidas dentro dos quartéis, sejam aquelas desenvolvidas em parceria com as empresas da ID.

Torna-se praticamente impossível atender às missões contempladas na END sem um aporte orçamentário significativo, a fim de acompanhar o desenvolvimento científico-tecnológico. Até quando o país estará à mercê das tecnologias e engenhocas estrangeiras adquiridas com cláusulas de transmissão de tecnologia e conhecimento?

Dentro de um cenário prospectivo para destacar a importância da IND na MN podem-se citar alguns aspectos considerados importantes para seu desenvolvimento:

1 - Considerável aumento no orçamento da União para os investimentos voltados para a defesa, viabilizando os investimentos de longo prazo, com a determinação de um orçamento consolidado, estabelecendo seu valor em percentuais do PIB, além de financiamentos a longo prazo destinados à pesquisa, tecnologia e inovação. Esse orçamento serviria para incrementar o setor, atendendo de forma dual ao mercado militar interno e também aos mercados externo e não militares.

2 – Ampliação da capacidade de aquisição das FA, livrando-as das constantes restrições orçamentárias e contingenciamentos, o que prejudica o planejamento e a não realização dos objetivos propostos, nos quais os casos mais exemplares são: a aquisição de aviões de caça e a construção do submarino nuclear. É preciso investir em pesquisa e desenvolvimento, favorecendo a indústria brasileira com aquisição de equipamentos comuns às três Forças, com programas de aquisição proporcionando ganho de escala e de economia.

3 – Abertura de financiamentos para desenvolvimento de pesquisas voltadas para a defesa, quando concursos acadêmicos premiariam a inovação, favorecendo o produto nacional, principalmente no que se refere à modificação das linhas de crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES, para os produtos de defesa, no mesmo grau de igualdade às outras atividades.

Se o país quiser garantia da Soberania e da Segurança Nacional é preciso que a ID seja realmente encarada como um setor produtivo, gerador de trabalho e de riqueza, a fim de fortalecer a nossa capacidade dissuasória e as necessidades existentes nas áreas industrial, científica e tecnológica de defesa.

A importação de material de defesa, em detrimento da produção interna, está pautada na falta de recursos voltados para investimentos, causando baixa

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demanda interna, impossibilitando o reconhecimento da IND no cenário mundial, obrigando o Brasil a ficar dependente da tecnologia de outras nações. Assim, além de manter-se vulnerável, a falta de recursos contribui para deteriorar, ainda mais, o desenvolvimento de pesquisas nacionais voltadas para a defesa.

Sabe-se que não é possível identificar uma expressão do poder de forma isolada. Assim, todas possuem um inter-relacionamento e uma interdependência, pois quando se trata de realizar uma ação direta do governo ou do financiamento estatal para universidades, institutos de pesquisa e indústrias de caráter estratégico, é necessário ter em mente o objetivo de produzir material de emprego militar, evidenciando a capacidade de mobilização, pois estarão em movimento todas as expressões do Poder Nacional.

Em face do estágio avançado de desenvolvimento dos produtos de defesa no planeta, com certeza uma nação jamais será capaz de produzir a totalidade dos itens de suas necessidades, por isso é necessário concentrar esforços na produção da maior parte dos insumos estratégicos, principalmente, daqueles julgados de importância crítico-estratégica, cabendo tão-somente ao Governo Federal esse papel fundamental, pois ideias, intelecto e insumos o Brasil já possui.

A grande contribuição da IND para a Mobilização Nacional está na disposição de avançar, tecnologicamente, em produtos de defesa numa colaboração biunívoca com o campo militar, transformando o conhecimento em capacidade de produzir bens e serviços, o que significa produtividade, competitividade, elevação de renda, capacidade de investimento, prosperidade, poder militar e, finalmente, soberania.

É mister salientar que o assunto ‘defesa’ não diz respeito somente aos militares. Defesa abrange todas as expressões do Poder Nacional.

Mas, como a Indústria de Defesa Nacional poderá colaborar com a Mobilização Nacional se ela praticamente não existe?

4 REFERÊNCIAS

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BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

______. Decreto n.º 5.484, de 30 de junho de 2005. Aprova a Política de Defesa Nacional, e dá outras providências. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/Decreto.

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A Indústria Brasileira de Material de Defesa e sua Contribuição para a Mobilização Nacional

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______. Decreto n.º 10.451, de 16 de setembro de 1942. Decreta mobilização geral. Disponível em: www.2.camara.gov.br/.../decreto-10451-16-setembro-1942-468273-publicacaooriginal.

______. Decreto-Lei n.º 4.812, de 8 de outubro de 1942. Dispõe sobre a requisição de bens imóveis e móveis, necessários às Forças Armadas e à defesa passiva da população, e dá outras providências. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/1937.../Del4812.

______. Lei n.º 4.320, de 17 de março de 1964. Estatui Normas Gerais de Direito Financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. Disponível em: www2.camara.gov.br/internet/legislação/.../visualização.

______. Lei n.º 11.631, de 27 de dezembro de 2007. Dispõe sobre a Mobilização Nacional e cria o Sistema Nacional de Mobilização - SINAMOB. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006.

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ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA (Brasil). Elementos de logística e mobilização. assuntos específicos. Rio de Janeiro, 2011. Parte 3.

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TZU, Sun. A arte da guerra. São Paulo, Pensamento. 1988.

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A Segurança da Informação no Contexto Cibernético e a Mobilização Nacional

A SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO NO CONTEXTO CIBERNÉTICO E A MOBILIZAÇÃO NACIONAL

Luiz Guilherme Sá da SilvaTenente-coronel de Infantaria da Força Aérea Brasileira, estagiário do Curso de Logística e Mobilização Nacional da Escola Superior de Guerra, em 2011.

Resumo

Esta pesquisa visa a atender ao aprimoramento da Gestão da Segurança da Informação no contexto cibernético, nas ações e atividades visando à Defesa Nacional e sua relação com a Mobilização Nacional. O levantamento dos assuntos relevantes foi realizado por meio de uma pesquisa exploratória constituída por uma análise bibliográfica e uma análise documental. A análise documental está baseada nos documentos do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da Republica e também nos atos normativos referentes à Mobilização Nacional. Os dados obtidos na pesquisa documental são tratados qualitativamente. São abordados temas da gestão da segurança da informação dentro do Setor Cibernético apresentado como o GSI-PR trata o assunto. É feita uma avaliação dos atos normativos e sua conformidade com as ações da Mobilização Nacional. Ao final, conclui-se sobre as ações do Governo Federal alinhadas à Política de Mobilização Nacional como forma de adequar e manter-se atualizado frente às constantes inovações de TI e preparado para se contrapor às possíveis ameaças no campo da Segurança da Informação que afetam a Defesa Nacional. Os dados estão atualizados até 30 de outubro de 2011.

Palavras-chave: Conformidade; Controles; Cibernética; Segurança da Informação; Mobilização.

1 INTRODUÇÃO

Na atualidade, as organizações sejam governamentais sejam privadas, necessitam de agilidade e eficácia, na condução dos seus negócios, para que possam sobreviver em mercados cada vez mais competitivos onde existem riscos ao seu funcionamento. A grande quantidade de informações disponíveis tem vital importância para a correta tomada de decisão por parte dos governantes e representantes do setor privado. Por esse motivo, as instituições públicas e privadas começaram a realizar investimentos tecnológicos e computacionais para registrar e armazenar informações, visando a facilitar a obtenção de resultados mais precisos e em menor tempo.

A Segurança da Informação (SI), no âmbito da Administração Pública Federal

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Luiz Guilherme Sá da Silva

(APF), foi considerada estratégica, tendo como pilares a Tecnologia da Informação (TI), a Gestão do Conhecimento e também a Segurança da Informação. A proteção da informação como patrimônio é crucial nos tempos atuais, e pode vir a ser o grande diferencial para o sucesso ou fracasso de uma instituição.

Sua importância dentro do Governo Federal é evidente, pois tendo em vista a sua importância estratégica, proporcionará uma vantagem competitiva perante um eventual oponente racional, quando da proteção do ativo chamado ‘Informação’. Corroborando com o citado anteriormente, no momento atual, encontram-se em vigor a Estratégia Nacional de Defesa e a Política Nacional de Defesa. Tanto a Política como a Estratégia enfatizam a importância dada ao setor cibernético na Defesa Nacional, sendo este um dos assuntos com afinidade com a Segurança da Informação.

O autor atua na área de TI, desde 1998, tendo realizado diversas especializações nesta área e cursos afetos ao campo de Segurança da Informação, o que motivou o interesse por esta pesquisa que procura relacionar o setor cibernético e a mobilização nacional.

Na atualidade, os ataques cibernéticos se caracterizam pelo uso dos meios computacionais para ações ofensivas, na rede mundial de computadores, contra alvos estratégicos vulneráveis, os quais são buscados com o propósito de causar enfraquecimento das suas defesas convencionais e também causar transtornos na capacidade de comandar e controlar áreas sensíveis da infraestrutura de um determinado país ou instituição.

A Gestão da Segurança da Informação e, consequentemente, a respectiva proteção da informação, tratam não só da sua produção, mas também, como compartilhá-la, corretamente, e preservá-la quando necessário. Para isso, a referida gestão deve ter requisitos de disponibilidade, integridade, confidencialidade e autenticidade. Desta forma, o tema proposto pretende responder ao seguinte problema: em que nível os processos de segurança da informação referentes ao setor cibernético estão alinhados com a mobilização nacional?

Assim, o objetivo geral será verificar se as documentações normativas sobre segurança da informação, no setor cibernético, estão alinhadas com as atividades de mobilização nacional.

No intuito de atingir o objetivo geral, os seguintes objetivos específicos foram estabelecidos:

a) Descrever os requisitos de segurança da informação no setor cibernético; b) Citar os aspectos aplicáveis da segurança da informação no setor cibernético

aplicáveis na mobilização nacional; e c) Realizar o processo de verificação de conformidade. Com os objetivos da pesquisa definidos, é necessário verificar as argumentações

que justificam o presente trabalho. Nesse sentido, o tema da pesquisa, em questão, despertou a inquietação e preocupação do autor, principalmente para ações

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normativas de cunho estratégico e suas consequências nos níveis operacional e tático da gestão da segurança da informação.

É dentro desse contexto que o problema já mencionado passa a ser o objetivo intrínseco deste trabalho, mostrando a importância da proteção da informação para o Estado, através das práticas recomendadas para a Gestão da Segurança da Informação.

O presente trabalho está estruturado em cinco tópicos. No segundo, foram descritos a revisão literária e fundamentação do estudo. A etapa seguinte abordou gestão da segurança da informação no GSI-PR. A quarta parte apresentou os resultados da investigação, com a análise dos dados obtidos. Ao final, apresentaram-se as considerações decorrentes do estudo.

2 REVISÃO LITERÁRIA E FUNDAMENTAÇÃO

Compartilhar informações e ao mesmo tempo protegê-las é um desafio a ser vencido nos tempos atuais. Para que isto possa ocorrer, sem perdas para aqueles que usam a informação, a Gestão da Segurança da Informação, atuando nos Processos, Tecnologia e Recursos Humanos, utiliza práticas e normas técnicas adotadas no Brasil e no mundo.

Além de valor significativo, a informação possui seu ciclo de vida, segundo Beal (2004). Ela segue um fluxo dentro das organizações que vai da identificação da necessidade de requisitos, sua obtenção, tratamento, armazenamento, distribuição, uso e descarte.

Logo, é preciso que este administrador entenda e gerencie bem os conceitos afetos a proteção da informação, pois a conscientização dos integrantes é muito importante, tendo em vista que as informações circulantes armazenadas têm o valor que lhes é dada pela organização.

A segurança de uma determinada informação pode ser afetada por fatores comportamentais e de uso de quem se utiliza dela, pelo ambiente ou infraestrutura que a cerca ou por pessoas mal-intencionadas que têm o objetivo de furtar, destruir ou modificar tal informação.

Os controles aplicados são extremamente importantes para assegurar o correto tratamento dado à informação. É necessário que cada informação possua um proprietário e que o mesmo consiga avaliar o quão crítica é esta informação para a proteção do conhecimento.

Ameaças de todas as espécies deverão receber atenção, para que a informação a ser protegida não perca seus requisitos de segurança: perda de confidencialidade, perda de integridade e perda de disponibilidade. Níveis de Segurança, Segurança Física, Segurança Lógica e Política de Segurança também devem ser implementados para o tratamento da informação. As pessoas são ativos que possuem vulnerabilidades, e por isso recebem também a atenção da Segurança

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da Informação, pois o ativo mais importante pode vir a ser elo mais fraco na proteção do conhecimento.

A estrutura atual de Governo Federal e de sua área de Defesa será avaliada ao longo da pesquisa. Esta mostrará em que nível o Estado Brasileiro se encontra, atualmente, e as deficiências, porventura, encontradas na estrutura organizacional, nos seus integrantes, na infraestrutura de suporte tecnológico e na área afeta à Segurança da Informação. Depois de expostas, tornar-se-ão base para a sugestão de melhorias nos processos que tratam da proteção da informação em proveito da mobilização nacional.

Este cenário, observado nas organizações públicas, mostra a dificuldade de se implantar uma Gestão de Segurança de Informação neste tipo de estrutura vertical. Dificuldade esta, nem sempre visível nas proposições de boas práticas de proteção de informação, principalmente, quando agilidade nem sempre está presente nas organizações públicas.

2.1 METODOLOGIA

O levantamento dos assuntos relevantes será realizado por meio de uma pesquisa exploratória constituída por uma análise bibliográfica e uma análise documental. A análise documental está baseada nos documentos formalmente publicados no âmbito da Administração Federal. Os dados obtidos, na pesquisa documental, são tratados de forma qualitativa. Serão abordados temas da gestão da segurança da informação e do setor cibernético, mostrando como o MD trata a Gestão da Segurança da Informação e sua infraestrutura no uso da rede mundial de computadores, bem como as interações desta temática com a mobilização.

O campo de pesquisa deste trabalho verificará, através de comparação, a normatização que trata de SI, no Governo Federal, verificando a conformidade com as diretrizes de mobilização nacional.

2.2 MOBILIZAÇãO

De acordo com a Estratégia Nacional de Defesa e a Política Nacional de Defesa, a vertente do setor cibernético é uma das três áreas de atuação estratégica da Defesa Nacional. Mas antes que se fale em segurança da informação e em setor cibernético, algumas informações sobre a mobilização nacional devem ser conhecidas para melhor compreensão do tema da pesquisa.

A MOBILIZAÇãO destina-se a preparar o País para fazer frente a uma agressão estrangeira. É um instrumento legal, previsto na Constituição Federal, que reúne um conjunto de atividades planejadas, orientadas e empreendidas pelo Estado, complementando a LOGÍSTICA NACIONAL, destinadas a capacitar a Nação Brasileira a realizar ações estratégicas, no campo da Defesa Nacional, diante de agressão

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estrangeira, para garantir a defesa e a sua soberania. A MOBILIZAÇãO envolve todas as expressões do Poder Nacional, possibilitando a soma de esforços no sentido de garantir a soberania do Estado, como guardiã dos mais valiosos bens nacionais.

Desde a situação de normalidade, a MOBILIZAÇãO deve ser objeto de atenção do Governo e de toda a sociedade. A aplicação dos recursos financeiros destinados aos Programas de Desenvolvimento Nacional deve guardar perfeita sintonia com os setores de interesse da Defesa Nacional, utilizando-se, para tal, de um sistema integrado por órgãos do governo, denominado Sistema Nacional de Mobilização (SINAMOB).

Durante um conflito, a MOBILIZAÇãO canaliza todos os recursos do País ― humanos, financeiros e materiais ― para atender aos esforços contra a agressão estrangeira.

A MOBILIZAÇãO compreende duas FASES: o PREPARO e a EXECUÇãO. A FASE DO PREPARO consiste na realização de ações estratégicas que

viabilizem a execução da MOBILIZAÇãO, sendo desenvolvida desde a situação de normalidade, de modo contínuo, metódico e permanente.

A FASE DA EXECUÇãO consiste no conjunto de atividades que, depois de decretada a MOBILIZAÇãO, são empreendidas pelo Estado, de modo acelerado e compulsório, a fim de transferir meios existentes no Poder Nacional e promover a produção e obtenção oportuna de meios adicionais.

Ao longo da história mundial, ocorre um evento de longa duração, a I Guerra Mundial (1914-1918), o qual não foi corretamente avaliado por franceses e alemães. Ficou patenteado que, para sustentar a guerra, era necessário mobilizar todas as expressões do Poder Nacional. As lições aprendidas nesse grande conflito, posteriormente, foram objeto de estudo, tanto por parte das elites civis como das militares.

Com a eclosão da II Guerra Mundial (1939-1945) e de suas repercussões em todos os continentes, ficou evidenciado ser a guerra um assunto vital para as nações, não podendo ficar restrito apenas aos chefes militares. Assim, os civis, sobretudo das vertentes política e econômica, sentiram a necessidade de participar da formulação e condução da estratégia nacional. A partir daí, consagra-se a responsabilidade histórica da sociedade em promover o preparo e o emprego do Poder Nacional para atender aos objetivos da Política.

Até outubro de 1988, a mobilização foi de responsabilidade da Secretaria-Geral do Comitê de Segurança Nacional (SG/CSN). De novembro de 1988 a dezembro de 1989, passou a ser encargo da Secretaria de Assessoramento da Defesa Nacional (SADEN). De janeiro de 1990 a dezembro de 1998, a mobilização nacional ficou a cargo da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE/PR).

Com a extinção da SAE/PR, a mobilização nacional passou, em janeiro de 1999, a ser encargo do Ministério Extraordinário de Projetos Especiais (MEPE), que foi extinto em junho de 1999.

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A partir da criação do Ministério da Defesa, em 10 de junho de 1999, a mobilização nacional passou à responsabilidade do Departamento de Mobilização (DEPMob), da Secretaria de Logística, Mobilização, Ciência e Tecnologia (SELOM).

O Sistema Nacional de Mobilização (SINAMOB) consiste no conjunto de órgãos que atuam de modo ordenado e integrado, a fim de planejar e realizar todas as fases da mobilização e da desmobilização Nacionais.

O SINAMOB, tendo como órgão central o Ministério da Defesa, estrutura-se sob a forma de direções setoriais que responderão pelas necessidades da mobilização nacional nas áreas política, econômica, social, psicológica, segurança e inteligência, defesa civil, científico-tecnológica e militar.

Será de competência do SINAMOB: Prestar assessoramento direto e imediato ao Presidente da República •

na definição das medidas necessárias à mobilização nacional, bem como aquelas relativas à desmobilização nacional;

Formular a Política de Mobilização Nacional;•Elaborar o Plano Nacional de Mobilização e os demais documentos •

relacionados à mobilização nacional;Elaborar propostas de atos normativos e conduzir a atividade de •

mobilização nacional;Consolidar os planos setoriais de mobilização nacional;•Articular o esforço de mobilização nacional com as demais atividades •

essenciais à vida da Nação; eExercer outras competências e atribuições que lhe forem cometidas •

por regulamento. O SINAMOB poderá requerer dos órgãos e entidades dos Estados, do

Distrito Federal e dos Municípios e de pessoas ou de outras entidades as informações necessárias às suas atividades.

Os recursos financeiros indispensáveis ao preparo da Mobilização Nacional serão consignados nos orçamentos dos órgãos integrantes do SINAMOB, respeitada a característica orçamentária de cada órgão.

O SINAMOB é composto pelos seguintes órgãos:I - Ministério da Defesa;II - Ministério da Justiça;III - Ministério das Relações Exteriores;IV - Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão;V - Ministério da Ciência e Tecnologia;VI - Ministério da Fazenda;VII - Ministério da Integração Nacional;VIII - Casa Civil da Presidência da República;IX - Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República;

e

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X - Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República.O SINAMOB, tendo como órgão central o Ministério da Defesa,

estrutura-se sob a forma de direções setoriais que responderão pelas necessidades da mobilização nacional nas áreas política, econômica, social, psicológica, de segurança e inteligência, de defesa civil, científico-tecnológica e militar.

A base legal da mobilização começa na Constituição Federal, onde diz que a mobilização nacional é um instrumento constitucional que o País dispõe para, por meio do investimento em áreas econômicas e sociais, garantir o desenvolvimento e a soberania nacional. O dispositivo constitucional contido no art. 22 atribui competência à União para legislar sobre mobilização:

A Constituição Federal trata, ainda, no Art. 84, inciso XIX, acerca da prerrogativa de decretação da mobilização nacional. Nos termos deste dispositivo, cabe ao Presidente da República, ao decretar a mobilização nacional, especificar o espaço geográfico ou a área de interesse estratégico para a Defesa Nacional em que será aplicado o esforço da mobilização.

A Mobilização Nacional é um ato exclusivo do Poder Executivo, autorizado pelo Congresso Nacional ou referendado por ele, quando no intervalo das sessões legislativas.

A Lei n.º 11.631, de 27 de dezembro de 2007, dispõe sobre a Mobilização Nacional e cria o Sistema Nacional de Mobilização (SINAMOB), instrumento previsto nos art. 22, inciso XXVIII e art. 84, inciso XXIX da Constituição Federal, que carecia de um marco regulatório.

O SINAMOB consiste no conjunto de órgãos que atuam de modo ordenado e integrado, a fim de planejar e realizar as fases de preparo e de execução da mobilização e da desmobilização nacionais, sendo que este Ministério (Defesa) está elencado no art. 6.º da Lei de Mobilização Nacional como um dos componentes deste Sistema.

A regulamentação da Lei de Mobilização Nacional criou o Comitê do SINAMOB, órgão colegiado deliberativo, constituído pelos agentes representantes dos órgãos previstos no art. 6.º da Lei no 11.631, de 2007, com a finalidade de deliberar sobre as matérias previstas no art. 7.º daquela Lei.

A citada norma estabelece parâmetros para qualificação da agressão estrangeira, condição necessária para a decretação da mobilização nacional quando das ameaças ou atos lesivos à soberania nacional, à integridade territorial, ao povo brasileiro ou às instituições nacionais, ainda que não signifiquem invasão ao território nacional.

A Política de Defesa Nacional, voltada para ameaças externas, tem por finalidade fixar os objetivos para a defesa da Nação, bem como orientar o preparo e o emprego da capacitação nacional, em todos os níveis e esferas de poder, e com o envolvimento dos setores civil e militar.

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A Doutrina Básica de Mobilização, de 14 de setembro de 1987, o Manual Básico de Mobilização Nacional, de 10 de agosto de 1988 e a Política e Diretrizes Governamentais de Mobilização Nacional, de maio de 1989, todas em processo de atualização, complementam a base legal de Mobilização Nacional.

Tendo sido vistas as referências legais que normatizam a mobilização nacional, ver-se-á, a seguir, a Segurança da Informação com seu mapa conceitual e seus princípios básicos.

2.3 SEGURANÇA DA INFORMAÇãO

Atualmente, percebe-se, de maneira clara, junto às instituições, sejam privadas sejam públicas, a grande dependência de tecnologia. Os sistemas informatizados são muitos e complexos, tornando as organizações dependentes, pois são utilizados para diversos fins, além de controlar o fluxo de informação nas organizações.

Diante desse fato, pode-se afirmar que a informação é um bem que tem valor para a organização e que, portanto, deve ser protegida adequadamente, assim como os ambientes e os equipamentos utilizados para o seu processamento. Informações adulteradas, não disponíveis quando são necessárias, sob o conhecimento de pessoas de má fé ou de concorrentes, podem expor a organização e seus profissionais a grandes perigos e prejuízos consideráveis.

Não existe segurança 100% efetiva. Esta premissa parece assustar, mas a gestão da segurança da informação tem que conviver com esta realidade.

Pelo Decreto-Lei n.º 3505 de 2000, tem-se o conceito de Segurança da Informação:

Proteção dos sistemas de informação contra a negação de serviço a usuários autorizados, assim como contra a intrusão, e a modificação desautorizada de dados ou informações, armazenados, em processamento ou em trânsito, abrangendo, inclusive, a segurança dos recursos humanos, da documentação e do material, das áreas e instalações das comunicações e computacional, assim como as destinadas a prevenir, detectar, deter e documentar eventuais ameaças a seu desenvolvimento.

Segundo Allemand, Freire e Netto (2007), a segurança da informação, para ser efetiva, possui controles através de políticas, práticas, procedimentos, estruturas organizacionais, hardwares e softwares. Estes controles visam, basicamente, a garantir os seguintes objetivos de segurança:

Confidencialidade - Garantir que a informação seja acessível somente a pessoas autorizadas;

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Integridade - Garantir que as informações e métodos de processamento somente sejam alterados através de ações planejadas e autorizadas;

Disponibilidade - Garantir que os usuários autorizados tenham acesso à informação e aos ativos correspondentes sempre que necessário;

Autenticidade - Garantir a veracidade do emissor, sendo genuíno, e que possa ser verificado quanto à sua confiança.

Mais recentemente outros dois objetivos têm sido bastante discutidos:Irretratabilidade (ou Não Repúdio) - Garantir a autoria de determinadas

ações, impedindo o repúdio (negação) da mesma; eLegalidade (ou Conformidade) - Garantir que as medidas legais cabíveis

sejam aplicadas quando necessárias.Deve-se buscar o equilíbrio entre a segurança e o negócio principal da

organização, para o melhor cumprimento da missão-fim. Para que esse equilíbrio seja atingido, a questão a seguir deve ser abordada para a compreensão do leitor.

2.4 - PORQUE SE PRECISA DA SEGURANÇA DA INFORMAÇãO?A informação, os processos de apoio, os sistemas e as redes são importantes

ativos para os negócios. Segundo Allemand, Freire e Netto (2007), a informação possui mais valor que qualquer outro bem da organização. Cada vez mais as organizações, seus sistemas de informação e redes de computadores são testados por diversos tipos de ameaças à segurança da informação, que estão se tornando rotineiras e mais sofisticadas.

Segundo o Livro Verde de Segurança Cibernética no Brasil, cujo objetivo visa a expressar potenciais diretrizes estratégicas para o estabelecimento da Política Nacional de Segurança Cibernética, articulando visão de curto (2 - 3 anos), médio (5 –7 anos) e longo (10 – 15 anos) prazos no tema, abrangendo como ponto de partida, os seguintes vetores: Político Estratégico, Econômico, Social e Ambiental, CT&I, Educação Legal, Cooperação Internacional e Segurança das Infraestruturas Críticas.

Outrossim, há uma diversidade de atores atuando no Governo Federal em prol da segurança cibernética, em que a título de exemplo, cita-se o GSIPR (DSIC e ABIN), o MRE, o MJ (DPF), o MD, a MB, o EB, o COMAER, o que faz com que a proposição da Política fique ainda mais reforçada, uma vez que a mesma viabilizará o exercício da macro-coordenação do tema, e propiciará a congruência dos esforços e iniciativas entre os diferentes atores da citada rede, apoiada no senso comum e suas derivações.

Levantamento feito pelo CERT-BR (Centro de Estudos, Resposta e Tratamento de Incidentes de Segurança no Brasil) mostrou aumento dos incidentes relacionados à Segurança da Informação, no período de 1999 a 2010, conforme mostra a figura do gráfico a seguir:

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Figura 1: Incidentes reportados 1997-2010 – Cert. br

Fonte:Cert.br

Os controles de segurança da informação, segundo Allemand, Freire e Netto (2007), são baratos e eficientes, se forem incorporados projetos e especificações dos requisitos de um sistema de informação. No entanto, muitos dos sistemas de informação atuais ou em produção, não foram projetados para serem seguros. A identificação de quais controles devem ser implantados requer um planejamento atento aos detalhes.

Para que uma gestão de segurança realmente ocorra, é necessária, a participação de todas as pessoas da organização. De nada adiantam dispositivos de hardware protegendo a rede, auxiliados por softwares sofisticados e processos bem-estruturados, se as pessoas não estão conscientizadas sobre a importância da segurança da informação e não sabem como administrá-la.

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A Segurança da Informação no Contexto Cibernético e a Mobilização Nacional

3 GESTÃO DA SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO NO GOVERNO FEDERAL

A informação tem grande importância pelo seu valor no atual cenário mundial, pois é o principal ativo das instituições, estando constantemente exposta a riscos, necessitando por isso de um processo de Gestão de Segurança que proteja esse ativo.

O Governo Brasileiro possui, em sua estrutura governamental, o Departamento de Segurança da Informação e Comunicações (DSIC), que faz parte do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. Esta estrutura centralizada de coordenação e planejamento é essencial para realizar a gestão da Segurança da Informação.

O DSIC possui a seguinte estrutura:

Figura 2: Organograma do DSIC

Fonte: site dsic.planalto.gov.br

As missões do DSIC1 são as discriminadas a seguir:1. Adotar as medidas necessárias e coordenar a implantação e o

funcionamento do Sistema de Segurança e Credenciamento - SISEC, de pessoas e empresas, no trato de assuntos, documentos e tecnologia sigilosos;

2. Planejar e coordenar a execução das atividades de segurança cibernética e de segurança da informação e comunicações na administração pública federal;

3. Definir requisitos metodológicos para implementação da segurança cibernética e da segurança da informação e comunicações pelos órgãos e entidades da administração pública federal;

4. Operacionalizar e manter centro de tratamento e resposta a incidentes ocorridos nas redes de computadores da administração pública federal;

1 De acordo com o Artigo 6.º do Decreto N.º 7.411, de 29 dez. 2010. (Publicado no DOU N.º 250, de 30 dez. 20100 - Seção 1).

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5. Estudar legislações correlatas e implementar as propostas sobre matérias relacionadas à segurança cibernética e à segurança da informação e comunicações;

6. Avaliar tratados, acordos ou atos internacionais relacionados à segurança cibernética e à segurança da informação e comunicações, referentes ao inciso I;

7. Coordenar a implementação de laboratório de pesquisa aplicada de desenvolvimento e de inovação metodológica, bem como de produtos, serviços e processos, no âmbito da segurança cibernética e da segurança da informação e comunicações; e

8. Realizar outras atividades determinadas pelo Ministro de Estado ou pelo Secretário-Executivo.

O arcabouço legal que trata da Segurança da Informação tem como base o Decreto n.º 3.505, de 13 de junho de 2000, que institui a Política de Segurança da Informação nos órgãos e entidades da Administração Pública Federal, sendo complementado por normas editadas pelo DSIC. Tais normas servem como guia para administração pública federal. As normas são as seguintes:

- Norma Complementar n.º 01/DSIC/GSIPR, Atividade de Normatização que disciplina a Gestão de Segurança da Informação e Comunicações na APF, direta e indireta.

- Norma Complementar n.º 02/DSIC/GSIPR, Metodologia de Gestão de Segurança da Informação e Comunicações.

- Norma Complementar n.º 03/DSIC/GSIPR, Diretrizes para a Elaboração de Política de Segurança da Informação e Comunicações nos órgãos e Entidades da Administração Pública Federal.

- Norma Complementar n.º 04/DSIC/GSIPR, e seu anexo, Diretrizes para o processo de Gestão de Riscos de Segurança da Informação e Comunicações - GRSIC nos órgãos e entidades da Administração Pública Federal.

- Norma Complementar n.º 05/DSIC/GSIPR, e seu anexo, Disciplina a criação de Equipes de Tratamento e Respostas a Incidentes em Redes Computacionais - ETIR nos órgãos e entidades da Administração Pública Federal.

- Norma Complementar n.º 06/IN01/DSIC/GSIPR, Estabelece Diretrizes para Gestão de Continuidade de Negócios, nos aspectos relacionados à Segurança da Informação e Comunicações, nos órgãos e entidades da Administração Pública Federal, direta e indireta – APF.

- Norma Complementar n.º 07/IN01/DSIC/GSIPR, Estabelece as Diretrizes para Implementação de Controles de Acesso Relativos à Segurança da Informação e Comunicações, nos órgãos e entidades da Administração Pública Federal, direta e indireta – APF.

- Norma Complementar n.º 08/IN01/DSIC/GSIPR, Estabelece as Diretrizes para Gerenciamento de Incidentes em Redes Computacionais nos órgãos e entidades da Administração Pública Federal.

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A Segurança da Informação no Contexto Cibernético e a Mobilização Nacional

- Norma Complementar n.º 09/IN01/DSIC/GSIPR, Estabelece orientações específicas para o uso de recursos criptográficos como ferramenta de controle de acesso em Segurança da Informação e Comunicações, nos órgãos ou entidades da Administração Pública Federal, direta e indireta.

O DSIC tem diversas metas a atingir, entre elas: disseminar os conceitos de segurança de informação para todos os servidores públicos. Outros pontos não podem ser desconsiderados. Vulnerabilidades, muitas vezes, causadas por erro humano são as mais difíceis de prevenir e detectar. O Brasil, atualmente, possui grupos de resposta a ataques cibernéticos ao país. O conhecimento adquirido por esses grupos será disseminado para governos estaduais e municipais, bem como, para os integrantes dos poderes legislativos e judiciário.

Desta forma, estabelece o Governo Federal as suas recentes ações na área de Segurança da Informação. No tópico seguinte, será feita, portanto, a interpretação qualitativa dos dados bibliográficos e documentais obtidos, de forma a responder ao problema de pesquisa estabelecido para este estudo.

4 ANÁLISE QUALITATIVA DO SETOR CIBERNÉTICO E A MOBILIZAÇÃO NACIONAL

Neste item, apresenta-se a análise preliminar de conformidade das normas e ações que estão em andamento no Setor Cibernético e de Segurança da Informação dentro do enfoque Mobilização Nacional.

A análise qualitativa foi realizada com base em normas e ações do Governo Federal que tratam de Segurança da Informação e sua inter-relação com a Mobili-da Informação e sua inter-relação com a Mobili-Informação e sua inter-relação com a Mobili-zação Nacional.

Relembra-se, aqui, o conceito de Mobilização:

Conjunto de atividades empreendidas pelo Estado, ou por ele orienta-das, desde a situação de normalidade, completando e complementan-do a Logística Nacional, com o propósito de capacitar o Poder Nacional a realizar ações estratégicas, no campo da Segurança Nacional, para fazer face a uma situação de emergência, decorrente da iminência de concretização ou efetivação de uma Hipótese de Guerra.

Segundo a Doutrina de Mobilização Nacional (1987), a mesma deve ser apre-ciada sob dois aspectos distintos:

Como atividade ou conjunto de atividades desenvolvidas, desde o tempo •de paz, em todas as Expressões do Poder nacional, visando à consecução de Objetivos estabelecidos por uma Política de Mobilização. Como um estado ou situação emergencial em que todas as forças da Nação •são compelidas a fazer face às contingências decorrentes de uma guerra.

Tendo como foco os aspectos apresentados anteriormente, cabe situar a se-gurança da informação no contexto cibernético atual.

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As atividades de Gestão da Segurança da Informação desenvolvidas pelo DSIC, no âmbito do Poder Executivo, amparadas pelas Leis, Decretos, Portarias, Instruções Normativas, Normas Complementares e Legislação Específica. Relacionada à Segu-. Relacionada à Segu- Relacionada à Segu-rança da Informação, atuam em consonância com a Doutrina de Mobilização Nacio-, atuam em consonância com a Doutrina de Mobilização Nacio- atuam em consonância com a Doutrina de Mobilização Nacio-nal e os objetivos geral e específicos da Política de Mobilização Nacional, bem como, estão pertinentes a Estratégia Nacional de Defesa e Política Nacional de Defesa.

São diversos os atores e órgãos envolvidos da Administração Federal (Man-darino, 2008). A interação entre eles se faz necessária para as ações de segurança e defesa cibernética da nação através de uma possível Estratégia de Defesa Ciberné-tica. Ações estas as quais terão efeitos em todas as Expressões do Poder Nacional: Política; Econômica; Militar; Psicossocial; e Científico e Tecnológica.

Estes mesmos atores e órgãos da Administração Federal estão presentes nos Subsistemas Setoriais de Mobilização, quando no trato do assunto segurança e de-, quando no trato do assunto segurança e de-quando no trato do assunto segurança e de-fesa cibernética.

Tendo sido realizada a analise qualitativa das normas e ações do Governo Federal de SI, no contexto cibernéti co e da Mobilização Nacional, a seguir são apre-, no contexto cibernéti co e da Mobilização Nacional, a seguir são apre- no contexto cibernético e da Mobilização Nacional, a seguir são apre-da Mobilização Nacional, a seguir são apre-a Mobilização Nacional, a seguir são apre-sentadas as considerações finais.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa verificou se os instrumentos normativos e ações da APF sobre Segurança da Informação estão em conformidade com as diretrizes da Mobilização Nacional.

O levantamento dos assuntos relevantes à SI foi realizado por meio de uma pesquisa exploratória, constituída por uma análise bibliográfica e documental. A análise documental foi baseada nos documentos formalmente publicados no âm-bito do Governo Federal. Os dados obtidos na pesquisa documental foram tratados de forma qualitativa. Foram abordados temas da gestão da segurança da informa-ção no setor cibernético e sua relação com a mobilização nacional.

Foi feita uma avaliação comparativa de conformidade dos controles afetos ao setor cibernético emanados do Governo Federal e seu alinhamento com Mobiliza-ção Nacional.

O presente estudo procurou ressaltar a importância do assunto ‘segurança’, o qual veio atrelado ao ativo que possui um valor inestimável nos dias atuais, a in-formação. Com isso seu foco principal passou a ser a proteção de tão valioso ativo, juntamente com a avaliação dos aspectos normativos existentes no Governo Fed-eral referente aos controles recomendados de Segurança da Informação afetos ao setor cibernético.

Estabeleceu-se o PROBLEMA a ser resolvido: Em que nível os processos de segurança da informação referentes ao setor cibernético estão alinhados com a mo-bilização nacional ?

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A Segurança da Informação no Contexto Cibernético e a Mobilização Nacional

Os objetivos específicos foram alcançados através da leitura das normas afe-tas ao setor cibernético que tratam da Segurança da Informação, que forneceu os critérios adotados ao longo da pesquisa, para comparar a documentação normativa de SI do Governo Federal com as diretrizes da mobilização nacional.

As ameaças existentes, na atualidade, devem ser miti gadas, para não coloca-, na atualidade, devem ser miti gadas, para não coloca- na atualidade, devem ser miti gadas, para não coloca-, devem ser miti gadas, para não coloca- devem ser mitigadas, para não coloca-rem em risco os ativos que uma organização classifica como críticos, dentre eles seu conhecimento. Os controles melhoram os processos e procuram manter os requisi-tos exigidos para garantia da Segurança da Informação: integridade, disponibilidade e confidencialidade da informação.

A pesquisa realizada procurou, na documentação consultada, mostrar a con-, na documentação consultada, mostrar a con- na documentação consultada, mostrar a con-formidade do Governo Federal em relação às práticas e processos referentes à Se-gurança da Informação e seu alinhamento com a Mobilização Nacional, sendo este o principal objetivo deste projeto de pesquisa.

Para isso, os assuntos referentes à Segurança da Informação e sua gestão foram mostrados. Tendo como embasamento sólidos conceitos teóricos contidos na pesquisa bibliográfica realizada, bem como foram elencadas em normas utiliza-das nas boas práticas de Gestão da Segurança da Informação.

Sem dúvida, o tema abordado merece a reflexão de todos os integrantes da Sociedade Brasileira. Dessa forma, os resultados obti dos dessa comparação per-, os resultados obti dos dessa comparação per- os resultados obtidos dessa comparação per-sa comparação per-a comparação per-mitem inferir que o Governo Federal, em suas normati zações de SI, possui aspec-, em suas normati zações de SI, possui aspec- em suas normatizações de SI, possui aspec-, possui aspec- possui aspec-tos que garantem a disponibilidade, a integridade, a confi dencialidade e a auten-a integridade, a confi dencialidade e a auten-integridade, a confi dencialidade e a auten-a confi dencialidade e a auten-confidencialidade e a auten-a auten-auten-ticidade, quando na proteção da informação e estão, dessa forma, alinhados com o preparo e execução da Mobilização Nacional na Defesa e Segurança do Estado Brasileiro , principalmente, no que concerne à prevenção e à repressão de ações hostis no setor cibernético.

Como trabalhos futuros, sugerem-se que medidas sejam tomadas, a fim de que o tema desta pesquisa possa vir a ter uma estrutura adequada no tratamento da gestão da Segurança da Informação, de forma a permiti r que o setor respon-, de forma a permiti r que o setor respon- de forma a permitir que o setor respon-sável pela estratégias do Governo Federal direcione ações que norteiem os níveis operacionais e táticos, através dos Planos de Mobilização a serem elaborados nas instituições pertencentes ao Estado.

6 REFERÊNCIAS

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O Marketing e a Comunicação Social na Mobilização Nacional

O MARKETING E A COMUNICAÇÃO SOCIAL NA MOBILIZAÇÃO NACIONAL

Marcelo Adahir Vieira FerreraCapitão de Corveta da Marinha do Brasil, estagiário do Curso de Logística e Mobilização Nacional da Escola Superior de Guerra, em 2011.

Resumo

Este artigo tem por finalidade verificar o papel do Marketing e da Comunicação Social na Mobilização Nacional. A presente conjuntura internacional tem exigido a preocupação das nações no planejamento e aplicação de um sistema de mobilização eficaz, para que possam responder, prontamente, a qualquer ameaça às suas soberanias. Com o Brasil não é diferente. Desta forma, a Comunicação Social, aliada às técnicas de Marketing, surge como o veículo que irá atuar como um vetor de conscientização da sociedade, evidenciando a importância do Sistema Nacional de Mobilização (SINAMOB). Para tanto, se faz necessário conhecer os fundamentos do Marketing e da Comunicação Social, desde os conceitos, passando pelos seus elementos e os princípios existentes. Este trabalho analisa os meios de comunicação e o impacto nas expressões do Poder Nacional, apresentando as políticas e as estratégias a serem implementadas. Enfim, constata-se que uma mentalidade de mobilização requer o emprego de uma Comunicação Social eficiente para atuar em ambas as fases da mobilização com absoluta eficácia.

Palavras-chave: Mobilização; Marketing; Comunicação Social.

1 INTRODUÇÃO “Há muita coisa terrível, mas nada é mais terrível do que o homem.” (Sófocles)

A Mobilização Nacional envolve todas as expressões do Poder Nacional num processo amplo e global, desenvolvendo um conjunto de atividades orientadas pelo Estado, partindo da situação de normalidade em complemento à logística nacional, com a intenção de capacitar o Poder Nacional a realizar ações estratégicas, no campo da Segurança Nacional.

No entanto, sua organização é complexa. Suas concepções, planejamento e execução movimentam e atingem contingentes de todas as regiões do Brasil. Além disso, faz-se necessário seu perfeito entendimento por parte de todos os brasileiros, dos mais diversos segmentos da sociedade, bem como suas completas adesões. Tendo em vista nosso gigantismo territorial, bem como o crescente interesse

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Marcelo Adahir Vieira Ferrera

despertado em outros países, devido à descoberta recente de novas riquezas, devem-se possuir mecanismos para que a população brasileira tenha noção das ameaças que o território nacional possa sofrer.

Considerando os recentes e constantes avanços tecnológicos, constatam-se mudanças profundas no processo de Comunicação Social. As mídias tradicionais (jornal, revista, livro, rádio, televisão), aliadas ao advento de novas mídias, principalmente da internet e com alcance cada vez mais difundido em vários segmentos da sociedade, tornam aquele processo (comunicação) cada vez mais dinâmico.

Nesse contexto, a comunicação social, aliada a técnicas de marketing, torna-se o veículo de suma importância, pela influência que desempenha em todas as expressões do Poder Nacional, pois serve para conscientizar a população da importância de a sociedade também estar mobilizada.

O marketing aplicado à comunicação social torna-se vetor fundamental no processo de mobilização nacional, na medida em que evidencia a importância de se ter o Sistema Nacional de Mobilização (SINAMOB) pronto para ser empregado.

II - FUNDAMENTOS DO MARKETING E DA COMUNICAÇÃO SOCIAL

“A explosão da comunicação fará do homem uma vítima das técnicas, ou permitirá como tinham desejado seus promotores, construir uma sociedade melhor, sem qualquer tipo de exclusão?” (Phillipe Breton e Serge Proulx, em “A Explosão da Comunicação”).

Marketing é uma palavra que se confunde muito com vendas, propaganda, merchandising... De fato, em termos de empresa, marketing é tudo isto, mas encerra outros significados, pois se preocupa também com o planejamento, com a organização, com o produto e, principalmente, com o consumidor. Quando todas as atividades dentro de uma empresa encontram-se integradas, tendo como foco principal o atendimento da necessidade do consumidor e a sua satisfação, tem-se o que se chama de ‘marketing’. Em sentido mais amplo, segundo Moreira, conceitua-se ‘marketing’ como um conjunto de atividades que, através de um instrumento chamado “pesquisa de mercado”, possibilita à autoridade decisória preparar o planejamento de um produto e determinar seu preço, adotar a melhor estratégia para divulgar seu produto e manter satisfeitas as necessidades dos clientes, bem como utilizar-se da logística para efetuar a distribuição adequada, de maneira eficiente e eficaz, em se comparando aos seus concorrentes. Por meio da propaganda e publicidade, atividades mercadológicas que utilizam mídias pagas e

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O Marketing e a Comunicação Social na Mobilização Nacional

não pagas, respectivamente, o marketing procura levar o cliente ao produto.Para tratar com o público, segundo Blythe (2010), Margolis e Garrigan (2008),

o marketing faz uso da função de Relações Públicas. Esta função normalmente é desempenhada por um profissional de Comunicação Social.

Pode-se notar o entrelaçamento de definições, o que já possibilita fazer uma analogia ao escopo deste trabalho: o “marketing” utiliza a ferramenta “comunicação social” para tratar com o grande cliente, povo brasileiro, na tentativa de apresentar e vender o produto “Mobilização Nacional”. Pode-se dizer que há uma intensa aplicação de “marketing social” na difusão da ideia de “mobilização nacional”, considerando que esta forma de marketing difere da mercadológica, por focar o bem-estar do cidadão como objetivo principal.

As campanhas de marketing social são campanhas de formação e informação, dependendo da capacidade de comunicar, eficazmente, a mensagem social pretendida. Podem-se identificar as variáveis publicidades, relações públicas e marketing relacional como as principais ferramentas a serem utilizadas. Kotler (1978) explica qual a importância do marketing social para que algumas mudanças aconteçam na sociedade:

O Marketing Social visa a produzir um plano ótimo para proporcionar uma mudança social desejada. O fato de o plano ser ótimo, no entanto, não garantirá que a mudança-alvo será atingida. Dependerá de quanto fácil ou difícil seja a mudança social alvo. Sem o Marketing Social, poderá acontecer que a mudança social desejada tenha somente dez por cento de possibilidade de ser alcançada; o melhor plano de Marketing Social poderá aumentar essa possibilidade a quinze por cento. Em outras palavras, algumas mudanças sociais são relativamente fáceis de acontecer, mesmo sem o marketing social; outras são extremamente difíceis de acontecer, mesmo com o Marketing social.

São agentes de marketing social o Governo, empresas, Organizações Não Governamentais e Organizações Internacionais, como, por exemplo, a Organização das Nações Unidas (ONU).

A comunicação social existe desde o momento em que o homem passou a viver em grupo, e sua valorização implica estimular um crescente nível de participação e aumentar, em cada cidadão, o sentimento de responsabilidade em relação à Instituição a que pertence. Sua descrição inicial nos remete a Aristóteles, quando formulou seu clássico esquema, representado pela pessoa que fala (QUEM/emissor), pelo discurso que pronuncia (QUE/mensagem) e pela pessoa que ouve (A QUEM/receptor). Por emissor, entende-se aquele que fala, escreve, desenha, faz gestos ou movimentos. Todas essas formas expressam sinais codificados, os quais consubstanciam a mensagem. Por sua vez, receptor é aquele que recebe os sinais, interpreta-os e transforma-os em emissor mediante uma resposta aos estímulos

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Marcelo Adahir Vieira Ferrera

contidos na mensagem, realimentando o circuito comunicacional.Ao longo do estudo do processo de comunicação social, dois novos

componentes foram acrescentados aos anteriores: o Canal – que caracteriza o meio para a transmissão da mensagem – e o Efeito – que determina a resposta obtida junto ao receptor. De acordo com Rodrigues (2006), a comunicação social, em seu planejamento e execução, reger-se- á pelos seguintes princípios de ética, conforme destacados a seguir:

a) Verdade – A que assegura coerência, credibilidade e confiança; verdade é a essência da atividade da comunicação social, dado

b) Austeridade – O exercício da atividade envolve muito mais o uso da inteligência e da sensibilidade do que propriamente a aplicação de recursos financeiros;

c) Impessoalidade – É indispensável retirar das atividades da comunicação social qualquer conotação de promoção pessoal ou de grupo. Devem ser exaltados os aspectos coletivos da Instituição, o valor do homem em seu trabalho anônimo e, sobretudo, sua vocação para servir;

d) Dignidade – Não é aconselhável a solicitação ou aceitação de favores ou doações que possam, de alguma forma, levantar suspeitas ou dar margem a falsas interpretações;

e) Exemplo – Em qualquer Instituição, o exemplo é importante princípio de comunicação social. Exemplo de dedicação à missão, de simplicidade e austeridade, de capacidade de renúncia e de serviço, de relacionamento e de respeito pela opinião alheia;

f) Imparcialidade – Considera-se necessária a existência, em todos os escalões da Instituição, da salutar mentalidade de comunicação social, voltada para o tratamento imparcial da opinião coletiva, pública, e da opinião publicada pelos órgãos de comunicação social; e

g) Legitimidade – Em qualquer situação ou atividade, o respeito às Instituições Nacionais, à ordem jurídica vigente e aos fundamentos morais da nacionalidade devem ser considerados pela comunicação social.

Acrescentam-se aos princípios anteriores alguns conceitos básicos, para que a comunicação social possa manter a sociedade devidamente informada:

a) O Direito do Público em Saber – A comunicação de um país democrático contempla o acesso do público às informações sobre quaisquer atividades, particularmente, sobre o emprego da expressão militar, bem como de qualquer órgão do governo. A democracia também garante o direito de a imprensa livre publicar informação sem coerção ou censura;

b) Máxima Divulgação com o Mínimo de Retardo – Fornecer informações oportunas e precisas, para que o governo, a mídia e o povo possam compreender aspectos da defesa nacional. Deve ser o objetivo principal. Não se devem restringir informações com o objetivo de evitar críticas. É importante reduzir ao mínimo o

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O Marketing e a Comunicação Social na Mobilização Nacional

tempo para eventuais especulações da mídia. A comunicação social, ao manipular as notícias ou restringir o acesso a informações não sigilosas, porém comprometedoras, só logrará publicidade negativa para a Instituição; e

c) Informação Sempre de Fonte Confiável – A informação de uma fonte confiável, competente e respeitada tem maior credibilidade que aquela que provém de uma fonte pouco confiável. Normalmente, apenas pessoas credenciadas estão autorizadas a divulgar informações ao público e aos meios de comunicação em nome da instituição, em razão da capacidade que possuem de relacionamento com o público e com os meios de comunicação social.

Existe um número de princípios importantes que fundamentam os conceitos básicos detalhados anteriormente, regendo a comunicação social em ambiente de mobilização nacional, conforme se verifica:

a) Comunicação Social é um Processo Contínuo – A comunicação social tem a obrigação constante de divulgar a Instituição. Fazê-lo, diariamente, é investir paulatinamente, na construção de uma imagem de credibilidade e na confiança da Instituição perante a sociedade. Quando a comunicação social divulga informações sobre a Expressão Militar – especialmente notícias favoráveis – desperta na população a existência do profissionalismo militar e lhe dá o retorno do correto investimento efetuado na atividade de segurança nacional;

b) Comunicação Social tem um Efeito Multiplicador – Abrange todas as expressões do Poder Nacional, mantendo contato com os públicos externo e interno. Tal relação permite conquistar a opinião pública, além de reforçar os valores da instituição internamente; e

c) Comunicação Social é um Sistema Único – Uma das razões básicas da utilização da comunicação social é evitar a disseminação de informações desorganizadas e conflitantes aos seus diferentes públicos, pois estas demonstram falta de organização, causam confusão e diminuem a confiança pública.

3 O MARKETING E A COMUNICAÇÃO SOCIAL NA MOBILIZAÇÃO NACIONAL

A civilização judaico-cristã ocidental, herdeira do humanismo e racionalismo greco-romanos, bem como dos valores renascentistas e iluministas, coloca o Homem como centro de todas as ações. Como ser que se comunica e que pensa, ao receber o feed-back de seu interlocutor, pode ser influenciado por este estímulo, podendo alterar seu comportamento a adaptar-se a um processo de vida diferente. Isso se conclui pelo forte poder socializador da palavra humana. O Homem nasce como ser único, indivisível e individual, mas torna-se comunicativo e social, na medida em que avança seu processo educacional.

Com o passar dos séculos, o ser humano foi inovando seu processo de inserção pela comunicação, principalmente pela adoção de veículos (meios) de transmissores cada vez mais abrangentes, eficientes e eficazes. Se no passado

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remoto havia papiros e livros rudimentares, hoje o homem utiliza cada vez mais a internet para se comunicar, além dos livros eletrônicos. Até chegar a este ponto, foram utilizados (e ainda são) o rádio, a televisão, bem como as mais variadas formas de mídia. O processo de comunicação passou a ser coletivo com o alcance de multidões e emprego de meios de comunicação de massa. Passou-se, então, ao que se denomina ‘comunicação social’.

Em paralelo à evolução da socialização humana, ocorreu a formação e consolidação dos conceitos de País, Estado, Nação, Povo, Território. Tais conceitos, obviamente ainda presentes na Humanidade, foram duramente atingidos pelo processo de globalização, por alterar o conceito de soberania, diminuindo o poder do Estado Nacional. Surgem novos atores no cenário internacional, como as Organizações Não Governamentais e empresas transnacionais, que pressionam governos de acordo com seus interesses. Soma-se a isto a constituição de blocos econômicos, diminuindo sobremaneira a capacidade de o Estado garantir sua plena autonomia. Interesses das mais variadas ordens (política, diplomática, econômica, militar) condicionam ou até determinam quais serão os objetivos fundamentais durante as situações críticas, quando o Estado deverá manter o máximo de liberdade de ação.

O advento das comunicações digitais, fruto do elevado desenvolvimento tecnológico, observado na segunda metade do século XX, possibilitou a inserção de um número cada vez maior de indivíduos na complexa rede social de comunicações. Distâncias foram encurtadas, na medida em que a velocidade dos eventos aumentou substancialmente. O fluxo de informações também aumentou, possibilitando a formação de algo extremamente importante para qualquer governo: a opinião pública. Conquistar o apoio da opinião pública, ou pelo menos de grande parte dela, tornou-se imperativo para quem exerce o poder, principalmente durante situações críticas, ou de emergência. Para atingir este propósito, faz-se cada vez mais uso da mídia, em todas as suas formas, sendo que esta passou a adquirir cada vez maior evidência e importância. O fluxo de informações veiculado pela mídia, utilizando ferramentas de propaganda e de comunicação de massa, possibilita o exercício de efetiva modelagem sobre a formação da opinião pública. Como o fluxo de informações atinge um número cada vez maior de indivíduos, estes as recebem praticamente em tempo real, tendo em vista o advento da era digital. As comunicações de massa passaram a ser globais. Conquistar o apoio da opinião pública tornou-se fundamental para os tomadores de decisão, pois qualquer decisão tomada afeta sobremaneira a opinião pública.

Na maior parte dos Estados ocidentais, encontra-se o aparato militar (Forças Armadas) subordinado ao poder político civil, característica básica da democracia. A ação armada, ou seja, a entrada de um país em um conflito armado dar-se-á após decisão tomada pelo poder vigente, em função da opinião pública. Caso esta avalie e julgue ser necessário o Estado conflagrado, então o país irá “à guerra”. Caso

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O Marketing e a Comunicação Social na Mobilização Nacional

contrário, não irá. O apoio da opinião será a garantia para a tomada de qualquer decisão estratégica, a fim de que o Poder Militar adote e persiga seus objetivos. Conquistar o apoio da opinião pública passou a ser fundamental!

Passada a etapa de entrar ou não em uma situação de beligerância, respaldada pelo apoio popular, o país (e seu governo) se defronta agora com a condução e manutenção do Poder Militar durante o conflito, na busca de seus objetivos. Se os custos materiais num conflito armado são altos, a perda de vidas humanas tem um preço maior ainda. A manutenção do esforço de guerra requer que a sociedade, mobilizada em torno deste objetivo, realmente tenha noção da importância de se manter nacionalmente mobilizada. Vê-se a importância da mobilização nacional. Para isso, é mister que a sociedade seja bem-educada, pois só assim terá a exata noção desta importância. O público educado, ciente do poder de sua opinião e de estar mobilizado, quer ser informado sobre o andamento do conflito. O público educado tem ciência da importância da mobilização de toda a Nação, não somente da classe militar, que é a que mais se envolve nas ações em uma situação de conflito. O público educado tem ciência dos valores nacionais e das tradições comuns, cultuadas por todos, como, por exemplo, os Símbolos Nacionais. Se achar necessário retirar o apoio à manutenção do país no conflito, assim o fará, ficando o Poder Militar esvaziado na busca de seus objetivos. Observa-se agora a importância de se manter um efetivo e eficaz aparato de comunicação social, por parte dos poderes vigentes (civil e militar), durante a situação de conflito. Somente com um bom sistema de comunicação social, a sociedade será mantida informada e ciente da importância de permanecer mobilizada. Os poderes vigentes terão conseguidos o apoio e o engajamento positivo da opinião pública. A comunicação social, como processo que visa a aperfeiçoar o relacionamento entre os homens, quer como indivíduos, quer como integrantes de um grupo social, na fase de planejamento da mobilização nacional, deve ser direcionada para os campos da propaganda institucional, por meio dos veículos de comunicação de massa, da publicidade e/ou propaganda comercial, das relações públicas, da operação psicológica e das ações comunitárias.

A Comunicação Social, quando bem utilizada, é um multiplicador do poder de combate. Dentro deste foco, cresce em importância a função da mídia, como instrumento de assessoria do governo para o planejamento de todas as operações, na medida em que serve de “termômetro” das percepções e anseios populares.

Na busca incessante do apoio da mídia em todas as suas formas (falada, escrita, eletrônica), de maneira a receber, fidedignamente, qual é a opinião pública durante a situação de conflito, torna-se imperioso o estabelecimento de boas relações com a imprensa. Para o cientista político Marcus Figueiredo, hoje em dia:

[...] o poder da Imprensa na formação da opinião é mediado por outras fontes de informação e, com isso, deixa de ser absoluto [... ] como a

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Marcelo Adahir Vieira Ferrera

mídia é um autoemissor de mensagens que atua ao lado de outras fontes no mercado de informação, a sua credibilidade, frente às demais fontes, é um facilitador para o público na aquisição e processamento da informação. Em outras palavras, quanto maior a credibilidade da fonte emissora da mensagem, maior será a sua influência, pois a credibilidade na fonte orienta positivamente a seletividade na aquisição da informação e diminui a ansiedade do povo, na busca de outras fontes para confronto.

A mobilização nacional, como atividade humana, para realizar-se plenamente, busca no homem e na comunicação humana seus instrumentos de realização nas fases de preparo, execução e desmobilização. A mobilização nacional arregimenta os diversos meios e recursos, materiais e imateriais, para fortalecer o Poder Nacional e capacitá-lo para a previsão das necessidades e a provisão dos recursos para subvencionar a “realização de ações de emergência, em proveito direto da “Segurança Nacional”2.

Segundo Aguiar (1998), tanto na fase de preparo, como na fase de execução, a mobilização nacional é dinamizada pelo poder da comunicação social, que atua em todas as expressões do Poder Nacional: política, econômica, psicossocial, militar e científico-tecnológica.

A expressão política é fundamental para o sucesso de implantação do Sistema Nacional de Mobilização (SINAMOB, órgão central de coordenação Ministério da Defesa, de atuação também na Casa Civil e Ministério das Relações Exteriores), pois atua diretamente nos três poderes da República: Executivo, Legislativo e Judiciário. Enquanto o Executivo atua no cenário internacional, pela pessoa do próprio Presidente da República, o Legislativo trata da legislação pertinente à mobilização nacional (o SINAMOB é disposto pela Lei n.◦ 11.631, de 27/12/2007, regulamentada pelo Decreto n.◦ 6.592, de 02/10/2008). Já o Judiciário deve atuar junto aos demais Poderes, no sentido de fazer garantir a aplicação da Lei referente ao SINAMOB.

Ademais, da atuação dos Poderes constituídos da República, espera-se a positiva atuação dos partidos políticos, no sentido de se estabelecer a consciência política dos representantes do povo no que se refere à importância da mobilização nacional.

Verifica-se, neste contexto, que o papel desempenhado pela comunicação social, em consonância às técnicas de marketing, busca a harmonia entre os Poderes, permitindo que o apoio popular se torne uma fonte para o governo, que a usa como uma justificativa contínua para sua política. Por outro lado, quando o público recebe poucas informações sobre a política nacional, é fácil para os líderes políticos tomarem decisões que não são do interesse geral.

A expressão econômica, abrangendo os Ministérios da Fazenda, Agricultura, Comunicações, Desenvolvimento Agrário, Desenvolvimento da Indústria e

2 1 ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA. Fundamentos doutrinários. Rio de Janeiro: ESG, 2000, p.203.

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O Marketing e a Comunicação Social na Mobilização Nacional

Comércio, Minas e Energia e Transportes, tem impacto de suma importância no contexto da mobilização, por ser a fonte da maioria dos recursos a serem empregados. Portanto, requer condições plausíveis, em tempo de paz, para que possa se adaptar, com eficácia, quando ocorrer situações de emergência. Nota-se a importância da mobilização nos mais diversos setores da economia, como o agrário e o industrial, sendo que este último reveste-se de importância maior, no conjunto da mobilização nacional, por proporcionar reflexos em outros campos do Poder. O perfeito entrosamento entre Indústria e Universidade possibilitará o fomento das mais variadas formas de tecnologias, garantindo a segurança e a independência nacional de tecnologias estrangeiras, fundamental no processo de mobilização.

Dentro deste foco, o marketing e a comunicação social devem ser empregados para convencer o mundo corporativo de que o setor industrial deve estar em sintonia com os interesses da nação, quando sua força produtiva for exigida. Cabe às Federações das Indústrias dos Estados atuarem no segmento empresarial, convencendo-o do valor de cada indústria para uma mobilização eficaz.

Por intermédio da expressão psicossocial, dirigida pela Secretaria de Comunicação Social e de atuação pelos Ministérios do Planejamento, Desenvolvimento Social, Cidades, Cultura, Educação, Esporte, Meio Ambiente, Previdência, Saúde, Trabalho e Turismo, busca-se a formação de uma consciência nacional voltada para a mobilização nacional, com o objetivo de fortalecer o Poder Nacional e definir as necessidades básicas das expressões desse Poder, para dar suporte à Segurança Nacional, quando da iminência de eclosão de situações emergentes no país. O mecanismo da comunicação social buscará a referida consciência da sociedade, que estará devidamente informada e ciente do valor que o País possui em função de suas riquezas.

É na expressão psicossocial, segundo Silva (2000) e Alzicorbe (2002), que a comunicação social desempenha sua função principal, pois retrata fielmente a postura da nação nas três fases da mobilização (preparo, execução e desmobilização). Por trabalhar diretamente o homem, foco que se procura atingir com a importância da mobilização, requer que se utilize todo o poderio da mídia, empregando os meios disponíveis, de modo a se transmitir o conhecimento necessário à população de maneira equilibrada.

A expressão militar, dirigida pelo Ministério da Defesa, requer Forças Armadas preparadas e extremamente detentoras de meios modernos e eficazes, com recursos humanos devidamente conhecedores dos meios a serem empregados. Também requer uma indústria bélica em consonância com a expressão econômica e capaz de subsistir com tecnologia própria, sem dependência externa. A expressão militar é de maior representação em caso de mobilização, por caracterizar o braço militar da operação. Possui órgãos de comunicação social, de modo a instruir o público interno e orientar o público externo. No entanto, tais órgãos enfrentam dificuldades para exercer o seu papel de difundir a imagem das Forças Armadas, por não possuírem

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elementos especializados para este tipo de trabalho e nem meios de comunicação de massa, além de as verbas próprias para este fim serem praticamente inexistentes.

A expressão científica e tecnológica, dirigida pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, deve ser a garantidora do binômio Desenvolvimento e Segurança. Um país que investe na educação de seus nacionais tem maior chance de possuir profissionais altamente qualificados e que trabalharão no sentido de produzir bens e serviços de alta qualidade e que poderão ser requisitados, numa situação de mobilização. Utilizando–se a comunicação social aliada ao marketing, na divulgação do valor agregado a tais produtos, poder-se-á atingir até mesmo o mercado externo. Através de mídias especializadas (revistas, portais eletrônicos, etc.), os conhecimentos sobre o que a tecnologia pode proporcionar, bem como sua evolução, tornam-se conhecidos pela população.

4 POLÍTICAS E ESTRATÉGIAS (PROPOSTAS) PARA A FORMAÇÃO DE UMA POLÍTICA DE COMUNICAÇÃO SOCIAL PARA A MOBILIZAÇÃO NACIONAL

É imperioso que a ferramenta comunicação social, utilizada em conjunto às técnicas de marketing, seja mais atuante por ocasião do processo de mobilização nacional, em todas as suas fases (preparo e execução) e na posterior desmobilização. Desta maneira, sugere-se a adoção das seguintes propostas:

- Difundir a ideia e o significado de mobilização nacional a toda a população;- Programar e promover as ações de comunicação social no País, por meio do

Ministério das Comunicações e da Secretaria de Comunicação Social do Governo Federal;

- Elevar o nível educacional e de consciência política da população, com o total engajamento do Ministério da Educação, tendo por objetivo primeiro transmitir a solidificar elementos da moral e do civismo, como o culto aos Símbolos Nacionais, a toda a sociedade, a fim de permitir o correto entendimento sobre o que é mobilização nacional e sua importância, bem como o comprometimento de todas as classes socioeconômicas com a mobilização. O incremento educacional possibilitará, dependendo do relacionamento do governo com a mídia, obter o apoio da opinião pública;

- Difundir, de maneira especial, a ideia de mobilização nacional aos profissionais de mídia, a fim de que estes se tornem elementos propagadores e facilitadores do entendimento e adoção desta ideia pelo restante da população;

- Incentivar a valorização das relações sociais;- Identificar e segregar os públicos que deverão ser tratados

psicologicamente;- Realizar painéis e produzir documentos sobre a Política de Mobilização

Nacional, objetivando o engajamento da sociedade na discussão do assunto e reduzindo óbices ainda existentes;

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O Marketing e a Comunicação Social na Mobilização Nacional

- Atuar, por intermédio das assessorias parlamentares (Forças Armadas) no Congresso nacional, tendo como base a Política de Mobilização Nacional e a Comunicação Social;

- Concitar o mundo empresarial (indústria e comércio) e as federações que os representam, bem como os órgãos educacionais do Sistema “S” (SENAI e SENAC), para apoiarem e participarem efetivamente da divulgação e da ideia de mobilização nacional;

- Conscientização de todo o segmento político, de forma a manter a classe dirigente ciente da importância da mobilização nacional, bem como manter o Sistema Nacional de Mobilização – SINAMOB, corretamente estruturado e regulamentado juridicamente;

- Buscar a integração dos centros de comunicação social das Forças Armadas, a fim de permitir a concentração de esforços, no objetivo de difundir a ideia de mobilização nacional por quem exerce seu esforço principal no caso de situação de conflito, ao restante da sociedade;

- Descrever as características científico-tecnológicas das camadas da população que produzem bens e serviços utilizáveis numa situação de mobilização nacional, em todas as expressões do Poder Nacional, notadamente a psicossocial;

- Coordenar, por meio de programas de fomento específicos do Estado, as repartições públicas, privadas, estatais, paraestatais, indústrias e empresas especializadas na produção de meios necessários à execução da mobilização nacional;

- Fortalecer o papel da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (SECOM/PR) e proporcionar ao referido órgão condições para que possa integrar os demais órgãos envolvidos no SINAMOB, a fim de que uma política de comunicação social governamental seja criada, bem como incentivar a integração da SECOM/PR a outros órgãos de comunicação, privados, ou não;

- Possibilitar à SECOM/PR a difusão da política de mobilização nacional a todo o território nacional; e

- Em associação à política de mobilização nacional, fomentar uma política de defesa nacional e difundi-la no Brasil e no exterior, a fim de que seja transmitida a imagem de que a indústria nacional de defesa, ativa e vibrante, encontra-se sintonizada à ideia de mobilização nacional.

5 CONCLUSÃO

Através deste trabalho, tarefa curricular do Curso de Logística e Mobilização Nacional/2011, procurou-se mostrar a importância da aplicação das técnicas de marketing, na comunicação social, por ocasião da difusão da necessidade de mobilização nacional. Não basta haver apenas uma conscientização da necessidade de mobilização. Deve, sim, haver uma política de mobilização nacional, já disposta

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e regulamentada, devendo ser a comunicação social e o marketing aplicados em todas as suas fases: planejamento e execução e, posterior, desmobilização.

Inegável o avanço social observado nos últimos anos, bem como a consolidação das instituições democráticas nacionais, após 1985. Vive-se o pleno e tão sonhado Estado Democrático de Direito. A “Constituição Cidadã”, de 1988, possibilitou o ingresso de milhões de brasileiros ao cenário político e econômico nacional. Milhões de brasileiros tornaram-se conscientes do exercício de seu poder pelo voto. A palavra “cidadania” entrou no vocabulário nacional. No entanto, para garantir os direitos conquistados, uma série de deveres também veio associada, sendo, muitas vezes despercebida.

Este tema, proposto pela Coordenação do Curso, reveste-se de algo, ao mesmo tempo desafiador e motivante, tendo em vista a elevada carência que se observa, no cenário nacional, de elementos propagadores da política de mobilização nacional. O Sistema de Mobilização Nacional, já disposto e regulamentado desde 2008, apesar de atuação interministerial, coordenado pelo Ministério da Defesa, carece de elementos propagadores de seu significado e das responsabilidades atinentes aos diversos setores da sociedade. Como é de praxe, para o cidadão comum, o assunto ‘defesa’ é apenas restrito ao meio militar. Se perguntado sobre o que é ‘mobilização nacional’, provavelmente não saberá definir. Logo, torna-se necessário, como ponto de partida, investir maciçamente em educação, pois somente desta maneira os cidadãos entenderão que também são parte deste binômio: defesa e mobilização. Soma-se à problemática educacional, a quase completa falta de produção científica sobre mobilização nacional, principalmente na expressão psicossocial do Poder Nacional.

Desenvolver ações que criem e consolidem a imagem da mobilização junto à sociedade brasileira, associada a fortes referências como Soberania, Segurança, Democracia, assim como os outros Objetivos Nacionais, é o desafio que se apresenta. Neste contexto, surge a imperiosa necessidade de se estabelecer uma Política de Comunicação Social, associada a técnicas de aplicação de marketing social, para a mobilização nacional. Para tal fim, o estabelecimento de bom relacionamento com a imprensa, na busca do apoio da opinião pública, torna-se fundamental.

Deve-se aproveitar a imensa rede de comunicação de massa, com o objetivo de propagar a mentalidade e política de mobilização nacional a toda a população, independente de classe social e de localização geográfica. A mobilização nacional é dever de todos os cidadãos! No entanto, não bastam apenas os recursos materiais para tal fim. O material humano também deve ser de primeira qualidade. Para isso, deve-se investir maciçamente em educação. É exatamente o que faz esta Escola Superior de Guerra, ao transmitir aos seus estagiários as ideias fundamentais de mobilização, numa tentativa de ajudar na conscientização de sua necessidade, no contexto do país. Esta Instituição é, atualmente, o principal vetor de influência no meio civil, sobre a Mobilização Nacional.

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O Marketing e a Comunicação Social na Mobilização Nacional

Deve-se, sobretudo, fazer crer ao cidadão de que, assim como a defesa, a mobilização é assunto de todos, não somente da classe militar. Para isso, cresce em importância a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, como vetor principal de coordenação de todos os órgãos de Comunicação Social, para a propagação da Política de Mobilização Nacional.

A mobilização nacional determinará o cenário que o país terá como “pano de fundo”, na busca de melhor e mais eficaz política para seu desenvolvimento.

A comunicação social é um vetor que deve ultrapassar as fronteiras nacionais, no trabalho de informação de que a Nação Brasileira encontra-se em permanente estado de mobilização. Desta maneira, sairá fortalecido o Poder Nacional. Para tanto, a comunicação social deve ser entendida como elemento garantidor da soberania nacional.

6 REFERÊNCIAS

AGUIAR, Cleusa Maria Paim de. A Comunicação social na mobilização psicológica. Rio de Janeiro: ESG, 1998.

AIZCORBE, José Ricardo Bezerra Herce. A comunicação social na mobilização psicossocial. Rio de Janeiro: ESG. 2002.

BLYTHE, Jim. Um livro bom, pequeno e acessível sobre marketing. São Paulo: Ed. Bookman, 2010.

MARGOLIS, Jonathan ; GARRIGAN, Patrick. Marketing de guerrilha para leigos. Rio de Janeiro: Ed Altabooks, 2008.

MOREIRA, Eduardo J.A. Fundamentos de marketing. Pernambuco: Ed. Quickgraphic, 2002.

RODRIGUES, Luiz Olavo Martins. A comunicação social e a mobilização nacional. Rio de Janeiro: ESG, 2006. Disponível em: http://www.mobilizacaonacional.org.br. Acesso em: 16 out. 2011.

SILVA, Valdísio Vieira da. A comunicação social na mobilização psicossocial: uma política de comunicação social na Mobilização Nacional. Rio de Janeiro: ESG, 2000.

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Silvia Maria Pineschi Braun

O PAPEL DO GERENCIAMENTO DE RISCOS NA LOGÍSTICA

Silvia Maria Pineschi BraunAssessora de Diretoria no Instituto de Resseguros do Brasil/RJ, estagiária do Curso de Logística e Mobilização Nacional da Escola Superior de Guerra, em 2011.

Resumo

A conjuntura mundial pressiona as empresas a caminharem na direção da otimização de processos, redução de custos, agilidade máxima. Ao buscarem a competitividade desejada e necessária, estressando seu processo ao limite, as empresas expuseram-se cada vez mais a riscos. Nesse contexto, a sobrevivência das organizações será determinada pela capacidade de gerenciar riscos, ou seja, identificar e transpor os óbices para atingir seus objetivos estratégicos. Este trabalho analisa a importância da Gestão de Riscos para as organizações e sua extrema relevância para a Logística Empresarial e Nacional. Também são apresentados os fatores que influenciam o desenvolvimento da Gestão de Riscos no contexto internacional e sua direta relação com o desenvolvimento socioeconômico e a Mobilização Nacional. Ao final, são apresentadas algumas sugestões para o desenvolvimento de uma consciência de prevenção de perdas e, consequentemente, da Mobilização Nacional.

Palavras-chave: Logística; Gerenciamento de Risco; Mobilização Nacional.

1 INTRODUÇÃO

Novos riscos surgem a cada dia. O aumento da complexidade dos processos industriais e logísticos, alterações no ambiente macroeconômico, novas tecnologias, redes sociais, bem como a alteração dos fatores climáticos são os desafios que se apresentam para as organizações e para as Nações. As recentes e definitivas transformações nos cenários macroeconômicos mundiais têm se refletido nos diversos segmentos industriais. Motivadas por este novo ambiente, as empresas estão se voltando para a busca de novas tecnologias e técnicas gerenciais que lhes garantam a competitividade necessária e desejada. Como os reflexos dessas mudanças não ocorrem de maneira uniforme em todos os setores industriais, a intensidade da velocidade e o impacto das transformações estão sendo determinados pelo ambiente competitivo em cada setor.

Nos setores onde a competição entre as empresas é claramente percebida, o desenvolvimento tecnológico e a preocupação com os clientes têm papel fundamental. Nesses setores, as transformações das estruturas empresariais e da

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O Papel do Gerenciamento de Riscos na Logística

filosofia de abordagem do mercado consumidor se utilizam dos conceitos de gestão de riscos, dentro da gestão de ativos. Já em outros setores onde a competição não é intensa, sobressai o modelo, desprovido da preocupação com a gestão de riscos.

Apesar de sua importância para a economia moderna, o desenvolvimento da gestão de riscos muitas vezes parece não corresponder às necessidades impostas pelos riscos existentes. Sendo assim, a análise do desenvolvimento da gestão de riscos requer, antes, a análise do panorama mundial da gestão de riscos, considerando os fatores que o influenciam, tendo em vista osefeitos da globalização.

2 GESTÃO DE RISCOS. CONCEITOS

O risco é uma condição própria da existência humana (BERNSTEIN, 1997). De maneira geral, o risco está sempre associado a uma exposição à adversidade. Segundo Redja (1996), mesmo que a percepção do risco seja clara do ponto de vista do indivíduo, seus conceitos e definições irão variar de acordo com o campo de aplicação, podendo ser considerados como: possibilidade de perda, incerteza, desvio que prejudique um objetivo inicialmente traçado, probabilidade de ocorrência de um evento indesejado.

Apesar das diferenças, diversos autores – entre eles Redja (1996), Vaughan (1996), Candel (1990) – costumam se referir à presença de dois elementos fundamentais ligados ao risco: a indeterminação e a perda. Para que se configure o risco é preciso que haja pelo menos duas possibilidades distintas, e que pelo menos uma seja indesejada, podendo significar perda ou ganho menor que o esperado.

O risco, aqui considerado como exposição à adversidade ou vulnerabilidade, pode surgir a partir de uma série de fatores e alterações circunstanciais. Esses fatores são normalmente denominados “perigos” (incêndio, roubo, alagamento, desmoronamento, etc.) que podem ser ou não potencializados ou reduzidos em função do ambiente, ou seja, da exposição ao risco. A exposição ao risco ou hazard, como é largamente conhecida, é a condição que pode não só aumentar a probabilidade de ocorrência de um evento adverso, como agravar suas consequências, caso este venha a ocorrer.

A eliminação total do risco é impossível (VAUGHAN, 1996), mesmo assim este pode ser reduzido a níveis bastante satisfatórios, do ponto de vista empresarial, que é o da continuidade das operações. Com este objetivo, deve ser reduzida a incerteza e seu caráter subjetivo, pois esta é derivada da falta de capacidade ou conhecimento em relação ao objeto do risco.

Administrar o risco e seus efeitos passa necessariamente pela redução da incerteza, o que representa uma visão mais objetiva ou mais “real” do risco. Bernstein (1997) destaca que em um mundo de causas e efeitos, o conhecimento das causas permitirá a previsão dos efeitos. Segundo ele, o “acaso para o ignorante não é o acaso para o cientista. O acaso é apenas a medida da nossa ignorância”.

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Nesta concepção “o risco é uma opção e não um destino”.A necessidade de domínio do risco teve sua origem nos primórdios da

humanidade com os jogos de azar, mas somente no século XVII, época do Renascimento (princípio da teoria das probabilidades) e, posteriormente, no nascimento do capitalismo, foram registrados os primeiros movimentos científicos envolvendo o estudo do risco.

A administração estruturada e sistemática do risco, denominada Gestão de Riscos, somente foi implementada nos Estados Unidos por volta de 1950, pós-guerra, quando, pela primeira vez, foi mencionado o termo risk manager para definir o profissional dedicado em tempo integral às funções, não só de contratação de seguros, mas também de prevenção e de controle de perdas.

Devido ao rápido desenvolvimento tecnológico, a maioria dos riscos que envolve a atividade empresarial, atualmente, não poderia ser sequer imaginada há uma década, quando seus efeitos raramente atingiam simultaneamente uma grande diversidade de áreas, de ambientes e de pessoas. Mudanças sociais, climáticas, ambientais e empresariais, novas formas de comunicação têm sido os principais responsáveis pelo surgimento de novos riscos. Em adição, os “mega” empreendimentos, principalmente relacionados a um elevado grau de complexidade, sofisticação e vulto de investimentos representam exposição de ativos de grande monta a riscos mais evidentes.

Diante do avanço experimentado pela humanidade, a gestão de riscos extrapolou os conceitos de engenharia, segurança, administração de seguros e finanças, e tornou-se uma ferramenta de administração indispensável no mundo corporativo, para qualquer empresa, independentemente de porte ou ramo de atuação. Suas técnicas estão em contínuo processo de evolução, uma vez que a cada dia o ambiente se transforma trazendo novos riscos.

3 PROCESSO DE GESTÃO DE RISCOS

A evolução das técnicas de gerenciamento e principalmente da maneira de enxergar o papel da gestão de riscos fez surgir um novo conceito não mais limitado a um mero controle de perdas, mas de forma mais ampla. A chamada “Segurança Integral” partiu dos seguintes princípios:

1. Controlar perdas, pois estas podem comprometer o bom funcionamento das empresas;

2. Transformar a “Segurança” em fator estratégico com uma abordagem bastante ampla.

Para ser efetivo, o processo de gestão de riscos deve ser sistemático. Portanto, para implementar a análise e controle dos riscos se faz necessária a elaboração de um Programa de Gestão de Riscos que deve ser moldado de acordo com as características técnicas e financeiras da empresa.

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O Papel do Gerenciamento de Riscos na Logística

A escolha das técnicas utilizadas no processo de gestão de riscos deve ser baseada na disponibilidade de recursos da empresa. Para a escolha, prevalece a relação custo/benefício, embora a utilização desse critério leve a alguns desvios, porque, normalmente, os custos são tangíveis mas os benefícios, algumas vezes, não.

Ainda assim, deve-se considerar que a forma com que a empresa irá implementar uma determinada técnica ou metodologia é que determinará o quão “caro” ou “barato” será o Programa de Gestão de Riscos. Muitas vezes, a opção por técnicas qualitativas pode trazer resultados igualmente satisfatórios ou até melhores do que sofisticados modelos matemáticos. O ideal é a combinação de técnicas qualitativas e quantitativas, na medida do possível, levando em consideração o ambiente e a organização em que o programa será implementado.

Segundo Brasiliano (2010), a adoção de uma política de gestão de riscos deve ser norma de conduta de qualquer organização, porque representa um conjunto de diretrizes estabelecidas pela empresa (acionistas, conselho de administração, proprietários) para orientar o processo de gestão de risco, a escolha da metodologia, o que estabelecerá os níveis de criticidade.

3.1 DETERMINAÇãO DE OBJETIVOS

A determinação dos objetivos é fundamental para que a empresa possa empregar seus recursos e esforços na direção correta. Sendo assim, é necessário que a empresa determine quais as metas devem ser atingidas, tanto para a manutenção do programa (pré-perdas) quanto para quando um evento adverso vier a ocorrer (pós-perdas). Os objetivos devem ser quantificados sempre que possível para que se possa avaliar os resultados e reformular o programa continuamente.

De forma geral, os objetivos da Gestão de Riscos devem ser:Minimizar os efeitos adversos que o risco pode trazer para a empresa pelo menor custo possível (investimentos em prevenção).Adequação dos recursos pós-perda.Redução dos custos relacionados aos riscos puros 3.Segurança do Trabalho.Atendimento às obrigações legais e contratuais.Redução da incerteza em relação à continuidade dos negócios.

3.2 IDENTIFICAÇãO E ANÁLISE DE RISCOS

Os riscos significativos para uma organização são aqueles que, isoladamente ou em conjunto (ou série), podem comprometer o cumprimento de seus objetivos

3 1. Riscos Puros: situações em que só há possibilidade de perdas; Riscos Especulativos: situações em que há possibilidade de lucro ou perda, sucesso ou fracasso.

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(ARM 54, 1997). Portanto, identificar e analisar riscos é sempre um grande desafio.

Frequentemente, surgem técnicas para identificação de riscos, dentre as mais difundidas e utilizadas, podem-se destacar (BENTES, 2007):

- Série de Riscos (SR): Técnica qualitativa que promove a análise da sequência de eventos por relação de causa e efeito, que podem levar a um acidente ou falha;

- Análise Preliminar de Riscos: Técnica para análise inicial qualitativa, mais utilizada em novos produtos e processos. A ênfase é na revisão dos aspectos de segurança;

- Análise de Modos de Falhas e Efeitos: Técnica mais específica para a análise de riscos de equipamentos ou sistemas, também utilizada para manutenção e análise de desempenho. O objetivo é partir das falhas para determinar suas causas;

- Técnica de Incidentes Críticos: Análise operacional qualitativa, com o objetivo de identificar erros e condições inseguras. Baseia-se no levantamento de informações através de entrevistas;

- Análise de Árvore de Falhas: Técnica qualitativa e quantitativa, aplicável principalmente na análise de eventos indesejados em sistemas complexos;

- Hazop (Hazard Operability Study): Mais utilizado pelas indústrias petroquímicas para avaliar os riscos nas linhas de processo. Em termos gerais, pode-se dizer que o HAZOP é bastante semelhante à AMFE, contudo, a análise realizada pelo primeiro método é feita através de palavras-chave que guiam o raciocínio dos grupos de estudo multidisciplinares, fixando a atenção nos perigos mais significativos para o sistema; e

- What If/Checklist: Técnica de análise geral qualitativa com base em questionamento sistemático de procedimentos, processos e instalações.

Independentemente das técnicas, a gestão de riscos é uma arte. Em função do elevado grau de complexidade e interdependência de processos e fornecedores, a identificação dos riscos e sua análise depende, fundamentalmente, da qualidade das informações disponíveis e de que maneira estas serão trabalhadas pelas empresas, inclusive, considerando a elaboração de cenários futuros de perdas. A empresa deve buscar pleno conhecimento do seu ambiente e de suas interfaces.

Todas as técnicas costumam utilizar isoladamente, ou em conjunto, as seguintes ferramentas:

Brainstorming .Questionários.Análise do histórico de eventos, na empresa ou em empresas do mesmo segmento. Análise de registros financeiros e contábeis.Análise do fluxo de processo e forma de operação.Análise das instalações.

A utilização da Tecnologia da Informação é essencial para que os dados

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O Papel do Gerenciamento de Riscos na Logística

obtidos no processo de investigação possam ficar registrados, de forma adequada, e sirvam de base para as análises quantitativas do histórico de perdas e elaboração das projeções.

3.3 AVALIAÇãO DE ALTERNATIVAS PARA TRATAMENTO DOS RISCOS

As empresas, de maneira geral, podem sofrer perdas em virtude de uma grande variedade de causas. A diferente natureza dos riscos é que irá determinar sua classificação, que resulta no estabelecimento de procedimentos para prevenção e enfrentamento do problema ou seja, estruturação de procedimentos de tratamento. A Figura 1, apresenta uma visão simplificada da natureza dos riscos industriais.

Figura 1 – Natureza dos Riscos Industriais (CANDEL, 1990)

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Assim, todo o processo de identificação e análise de riscos tem por objetivo dar subsídios para o que pode ser considerado como a finalidade principal da Gestão de Riscos que é a escolha da resposta mais adequada para cada risco apresentado, ou seja decidir as medidas a serem adotadas para evitar a ocorrência de acidentes e ao mesmo tempo minimizar os impactos financeiros que estes possam causar, caso ocorram.

As medidas para tratamento dos riscos podem ser segmentadas em dois grupos principais com finalidades específicas: medidas de controle para evitar a ocorrência dos eventos e/ou minimizar os efeitos em caso de ocorrência, e medidas de financiamento para garantir que haja recursos disponíveis para continuidade e sobrevivência da empresa.

3.3.1. 1 Medidas de Controle (redução da frequência e severidade)

As medidas de controle podem ser preventivas quando se referem ao uso ou instalação de dispositivos de segurança em equipamentos, procedimentos de manutenção preditiva e preventiva, planejamento de condições mais seguras, etc., ou protetivas quando estão associadas aos sistemas como hidrantes, extintores, sprinklers, brigadas de incêndio que visam a minimização dos danos. Nas medidas protetivas podem ser incluídos ainda os planos de emergência e contingência. Abaixo, alguns exemplos de medidas de controle:

Eliminação (extinção ou abandono de um processo ou procedimento).Prevenção (manutenção preditiva e preventiva): alarmes, processos operacionais mais seguros, respeito às normas de segurança – física e patrimonial.Redução de perdas (protetiva): extintores, sprinklers, ou outros sistemas que minimizam a extensão dos danos.Separação ou duplicação (planos de contingência, planos de emergência, redundâncias e alternativas operacionais).Transferência contratual de responsabilidades (terceirização).

3.3.1.2 Financiamento

O financiamento de riscos, por sua vez, visa a garantir os recursos necessários para fazer frente a perdas de alta severidade que porventura venham a ocorrer. Há duas formas de garantir esses recursos: retenção e transferência.

Através da retenção, a empresa financia as perdas com recursos próprios (constituição de reservas ou provisões, administração de fundos, empréstimos). Na transferência, esses recursos são obtidos fora da empresa, como é o caso do seguro.

A contratação de seguros é a forma mais conhecida de transferência de riscos e tem, por objetivo, maximizar a sua utilização, ou seja, a obtenção da cobertura mais ampla pelo menor custo.

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O Papel do Gerenciamento de Riscos na Logística

Os erros mais comuns na contratação de seguros estão ligados à falta ou ao excesso de coberturas. Enquanto o excesso representa um desperdício, a falta pode trazer a exposição a riscos indesejáveis. Esses erros costumam ocorrer simultaneamente.

A finalidade básica do seguro é restabelecer “um equilíbrio econômico perturbado”, isto é, voltar aos mesmos padrões imediatamente anteriores à ocorrência do sinistro, não podendo ser entendido como jogo ou qualquer atividade com fins lucrativos para o segurado.

Um risco para ser segurável deve atender aos seguintes critérios (FUNENSEG, 1993): ser possível, futuro e incerto (a única exceção é o seguro de vida cuja ocorrência é certa, porém, indefinida no tempo). Além disso, o risco, para ser segurável, deve independer da vontade das partes contratantes, resultar em prejuízo de ordem econômica e ainda ser mensurável.

As melhores praticas (VAUGHAN, 1996) recomendam a combinação de retenção parcial e transferência para que as empresas obtenham melhores resultados.

3.4 DETERMINAÇãO DOS LIMITES DE RETENÇãO E TRANSFERÊNCIA. MATRIZ DE RISCOS

A empresa deve procurar estabelecer os limites de retenção e transferência, que é determinar, na política de gestão de riscos, o nível de “aversão” ao risco pretendido, que é a definição do nível de perdas que a organização está disposta a assumir e a partir de que limite deverão ser transferidos, em um determinado espaço de tempo.

Uma ferramenta bastante utilizada é a Matriz de Riscos. Através da matriz de riscos, é possível comparar os diversos eventos, a partir do seu, em termos de severidade (impacto) e frequência (probabilidade de ocorrência), dentro de um espaço de tempo pré-estabelecido, e promover o tratamento mais adequado e as prioridades de ação.

Figura 2 – Matriz de Riscos (BRASILIANO, 2011)

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De forma conceitual, os riscos com baixa severidade (impacto) e alta frequência (probabilidade de ocorrência) devem ser trabalhados pela empresa através de ações de manutenção e procedimentos operacionais, e, em geral, representam as franquias das apólices de seguro e/ou a POS (Participação Obrigatória de Segurado). São as PNE – Perdas Normais Esperadas que a empresa controla e assume com recursos próprios.

Já os riscos de alta severidade devem ser, em sua maioria, transferidos pois podem comprometer a continuidade de suas operações ou a sobrevivência da organização e seu financiamento é caro, considerando a necessidade de constituição de reservas e/ou provisões de valor elevado.

Nem sempre os riscos de alta severidade podem ser seguráveis, o que torna o controle desses riscos e seu financiamento um grande desafio.

3.5 MONITORAMENTO DOS RISCOS E DO PROGRAMA DE GESTãO DE RISCOS

Como todo o processo de gestão, o Programa de Gestão de Riscos deve ser planejado, de forma que possa ser eficientemente, implementado e monitorado, para que venha a ser continuamente melhorado. Nessa etapa, é fundamental estabelecer indicadores de performance para acompanhamento, divididos em preventivos e de sinistralidade.

Exemplos de Indicadores Preventivos:- Indicadores Econômicos: Custo do programa, percentual de investimentos/

ano, investimentos totais por funcionário.- Indicadores Organizacionais: Detalhamento das ações realizadas em

cada ano de desenvolvimento do programa, benefícios obtidos diretos e indiretos.

- Indicadores Técnicos: Quantidade de ações ou condições inseguras detectadas, tempo de treinamento em segurança dos funcionários, ações recomendadas x ações implementadas.

- Indicadores Legais e Normativos: Percentual de cumprimento de normas por grupo de risco, normas e dispositivos legais considerados, quantidade de inspeções preventivas realizadas.

Exemplo de Indicadores de Perdas:- Indicadores de Danos Pessoais: Número de acidentados/total de

empregados, dias não trabalhados/dias trabalhados, - Indicadores de Danos Físicos Diretos: Quantidade de incidentes/valor das

perdas, tempo de paralisação, custo da paralisação.- Indicadores de Danos a Terceiros: Quantidade de reclamações/valor

das reclamações, quantidade e custo dos funcionários que trataram as reclamações. Honorários advocatícios/custo das reclamações.

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O Papel do Gerenciamento de Riscos na Logística

Figura 3 – Exemplo de Indicadores de Gestão de Riscos em Projetos (UNISIS PMBOK, 2011)

IV - GERENCIAMENTO DE RISCOS NA CADEIA DE SUPRIMENTOS

O processo de globalização da economia, iniciado a partir dos anos 80, foi responsável por uma verdadeira mudança de paradigma, para as empresas em função da necessidade de incremento da produção com significativa redução de custos.

Nesse sentido, (FM GLOBAL, 2006) as empresas procuraram reduzir ao máximo seus estoques, seguindo as tendências de produção Just-in-time, produção enxuta, sempre com ênfase à velocidade e otimização de processos e recursos. Buscou-se eliminar redundâncias, contingências, localizar o fornecimento em regiões e fornecedores de baixo custo, segmentando a produção por diversas empresas. A terceirização das atividades fora do “core business” ou da atividade principal da empresa virou uma tendência. As empresas que antes produziam um determinado bem se tornaram responsáveis apenas pela montagem.

Ao mesmo tempo, a internet passou a representar uma ferramenta poderosa para a comercialização dos produtos. O e-commerce pressionou a velocidade de resposta das empresas, com necessidade de acompanhamento em tempo real do processo logístico e de gerenciamento dos fornecedores da cadeia de produção.

Evidencia-se assim um ambiente de crescente complexidade, advinda da competitividade no meio empresarial e da constante necessidade de se obter vantagem estratégica, com forte demanda por agilidade, velocidade e menores

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custos. Todo esse ambiente, em contrapartida, expõe as empresas a riscos cada vez maiores. Apenas um evento pode determinar o fim de uma empresa, se não estiver bem gerenciado.

Somente para demonstrar a afirmativa acima, foram destacados alguns eventos que, se não abalaram a continuidade das empresas, pelo menos impactaram, fortemente, em suas operações:

– Incêndio no Centro de Distribuição do Ponto Frio, em 12 de maio de 2010, Guarulhos/SP: perdas diretas e indiretas estimadas em R$400 milhões;

– Incêndio no Centro de Distribuição da Gradiente, em 19 de março de 2002, Barueri/SP: perda total, prédio e conteúdo, incluindo lucros cessantes;

– Incêndio no Centro de Distribuição da Sony, Londres, em 9 de agosto de 2011, em função dos distúrbios/tumultos ocorridos na cidade: perda total, prédio e conteúdo, incluindo lucros cessantes.

No Brasil, o problema relacionado aos acidentes rodoviários e o roubo de cargas representa um custo significativo para os embarcadores e transportadores. Todo esse custo, incluindo o seguro, é repassado ao consumidor, final encarecendo os produtos.

A legislação brasileira, a exemplo do DPVAT, obriga a contratação de seguros tanto para o embarcador quanto para o transportador (Decreto Lei 73/66) – Transporte Nacional, Responsabilidade Civil do Transportador Rodoviário de Carga e Responsabilidade do Transportador – Roubo de Carga. Somente em 2010, foram registrados prêmios da ordem de R$1,4 bilhão, pagos pelos segurados, e sinistros de aproximadamente R$1 bilhão (Fonte: SUSEP 2011). O prêmio pago pelos segurados (embarcadores e transportadores) cresceu 20% em relação ao ano anterior, apesar de todo o investimento em tecnologia de gestão de riscos (atualmente exigida por todas as seguradoras nesse segmento) e tecnologia embarcada, o que representa grande preocupação para as empresas brasileiras.

Com essa preocupação, foi realizada uma pesquisa pela AMR Research (MALONE, 2011), junto aos principais executivos especialistas em Supply Chain Management dos EUA, que procurou identificar quais as principais preocupações e qual a percepção em relação ao crescimento e/ou surgimento de novos riscos.

Com base na pesquisa realizada, foram evidenciados os principais riscos envolvidos na cadeia de suprimentos, pela percepção de seus executivos:

-- Falha de fornecedores (28%);-- Falha na Estratégia (17%);-- Desastres Naturais (15%);-- Eventos Geopolíticos (11%);-- Risco Regulatório (11%);-- Falha na Logística (10%);-- Infrações relacionadas à propriedade intelectual/ patentes (7%);-- Outros (1%).

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O Papel do Gerenciamento de Riscos na Logística

Quanto à evolução dos riscos identificados, a maioria dos executivos percebe que os riscos estão se agravando rapidamente.

Tais aspectos estão estimulando o desenvolvimento e a priorização do gerenciamento de riscos na cadeia de suprimentos. Na pesquisa, aproximadamente 30% dos executivos entrevistados estão aplicando as tecnologias e metodologias de gerenciamento de riscos, enquanto 50% ainda estão avaliando a utilização dessas tecnologias.

A pesquisa apurou ainda que a cadeia de suprimentos é muito mais suscetível ao risco. à medida que as empresas se internacionalizam, ampliando sua área de atuação para a redução de custos, mais dependente e, consequentemente, mais crítico se torna o processo. Os clientes globais, cada vez mais exigentes, demandam produtos e serviços de alta qualidade, forçando a capacidade logística. A volatilidade e a variabilidade provocam incerteza para as empresas, cuja sobrevivência vai depender fortemente do gerenciamento de riscos. Furacões como Katrina e Rita e Tsunamis são eventos que as empresas têm que estar preparadas para enfrentar.

Outro estudo realizado pela empresa FM Global, 2006 destacou que os novos riscos relacionados à cadeia de suprimentos nem sempre encontram amparo no seguro, ou por não encontrarem cobertura disponível no mercado ou pelo elevado custo que pode inviabilizar a contratação. Neste caso, o seguro representa a última fronteira.

4.1 CASO FEDEX

A FEDEX (FEDEX, 2010) é um exemplo de empresa da cadeia de suprimentos que saiu da “armadilha” da otimização e obteve uma posição de liderança de mercado através de ênfase nos planos de contingência.

Ao invés de ficar engessada em um modelo de otimização, que provavelmente não teria sustentação, considerando os riscos climáticos, técnicos e operacionais de se movimentar um volume significativo de cargas, com garantia de entrega rápida, a FEDEX agregou valor à sua operação por meio do investimento em gerenciamento de riscos.

A estratégia de verticalizar serviços e equipamentos críticos foi determinante para o sucesso das operações. Os Estados Unidos contam com serviços meteorológicos disponíveis de reconhecida competência, mas a FEDEX optou por desenvolver e operar sua própria central de controle meteorológico, com pesado apoio de TI, como diferencial para identificar riscos e promover ação rápida para a alteração de rotas.

Para que a estratégia funcione, não basta identificar os riscos. A empresa optou por ter frota própria de aviões, aeródromos exclusivos, localizados em pontos determinados e em quantidade suficiente para suprir as operações “normais” e a reserva de contingência. Em diversos pontos do globo, a empresa mantém aviões

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prontos para decolar (em standby, aguardando o comando para pronto emprego), com equipes preparadas para promover a transferência das cargas em tempo hábil.

Essa “reserva tática” faz parte do plano de contingência que a empresa põe em prática em cada situação de risco ou óbice (furacões, erupções vulcânicas, situações de emergência como o “11 de Setembro 2001”)

4.2 EXEMPLOS DE AÇÕES PARA CONTROLE DOS RISCOS NAS OPERAÇÕES LOGÍSTICAS:

Considerando o exemplo da FEDEX, as empresas que não puderem verticalizar seus processos logísticos devem gerenciar os riscos da cadeia de suprimentos, além das suas fronteiras.

As empresas devem avaliar os riscos de trabalhar com um fornecedor de “baixo custo” estabelecido em um país “em desenvolvimento”, sujeito a catástrofes naturais, com padrão de segurança e gestão de riscos deficiente e sistema legal pouco confiável (FM Global, 2006).

A necessidade de gerenciamento de risco dos fornecedores inclui, ainda, o controle das instalações físicas, recursos humanos, fornecimento de energia, sistemas operacionais, redes de transportes e procedimentos de segurança, até o menor nível da cadeia. Esses dispositivos ou requisitos de gestão de riscos podem inclusive constar dos contratos de fornecimento, embora um litígio internacional não seja desejado.

Não basta gerenciar apenas os riscos catastróficos, neste segmento de mercado, atrasos freqüentes podem significar danos à imagem e a perda de mercado.

Por isso, o gerenciamento de riscos deve incluir planos de contingência, prevendo fornecedores alternativos, em locais diferentes, que não estejam sujeitos aos mesmos riscos de catástrofes naturais e/ou riscos políticos. Para tanto, são necessárias:

Ações Institucionais:

Cadastramento de fornecedores, principalmente fornecedores críticos;Verificação do cumprimento das exigências legais, normas técnicas e regras estabelecidas pelos órgãos governamentais, não-governamentais que dizem respeito à Segurança, à proteção à Saúde e ao Meio Ambiente e à Qualidade;Utilização de instalações físicas, de infraestrutura e de equipamentos operacionais adequados;Institucionalização e cumprimento de normas, procedimentos e planos de

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O Papel do Gerenciamento de Riscos na Logística

contingência específicos para cada tipo de operação;Institucionalização e cumprimento de programa de treinamento intensivo; eElaboração de banco de dados com informação de sinistros com a descrição das causas e seus efeitos.

Exemplo de Planilha de Análise de Riscos em Centros de Distribuição

Riscos Hazard Ação/ Controle Financiamento

IncêndioRouboAcidentes PessoaisResp. Civil

Freqüência x Severidade (R$)

Instalação e inspeção de redes de hidrantes, conjuntos de extintores, sprinklers, brigadas de incêndio operativas, sistema de pára-raios

Instalação de comportas e bombas (contra alagamentos e inundações)

Instalação de controles de temperatura e umidade

Segregação de mercadorias e controle de compatibilidade

Programa de manutenção mecânica e predial

Utilização de equipamentos adequados a cada tipo de operação

Inspeções periódicas das estruturas físicas da empresa, nas quais são checados os itens de segurança contra incêndio, segurança patrimonial e segurança do trabalho, com relatórios de recomendações imediatas, de curto, médio e longo prazo.Vigilância 24 horas, sensores de presença, barreiras físicas e controle de acesso

Retenção: (R$)Seguro:Limites da Apólice:Coberturas:Franquias

Exemplo de Ações/ Controles no Transporte Rodoviário de Cargas

Preparação da carga e da viagem de forma sigilosa, com proibição de paradas ou pernoites em locais não autorizados, quando for o caso;Cadastramento e qualificação de motoristas ou do proprietário do veículo

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autônomo, com pesquisa detalhada, incluindo análises nos âmbitos financeiro, criminal e civil, entre outros;Utilização obrigatória de meio de comunicação (rádio ou telefone celular) por parte do motorista para cada viagem;Utilização de equipamentos adequados a cada tipo de transporte;Utilização de sistema de rastreamento e monitoramento de veículos, quando necessário; eObrigatoriedade de cumprimento da tabela de ações preventivas, principalmente no que diz respeito à escolta armada ou patrulhamento, dependendo do caso.

5 CONTEXTO INTERNACIONAL DA GESTÃO DE RISCOS

A partir de sua origem e tomando por base os Estados Unidos, considerado um dos países mais desenvolvidos, em termos de Gestão de Riscos é possível traçar paralelos entre os padrões de desenvolvimento de um país e sua postura, no que concerne à segurança e à prevenção de riscos.

Com este objetivo, Rancan, (1996) comparou países da Comunidade Europeia e os Estados Unidos, entre outros, e analisou de fatores relevantes para a compreensão do padrão de desenvolvimento da gestão de riscos em cada país e em determinado setor industrial, sendo os seguintes:

Contexto sócio econômico;Sistema jurídico com relação à proteção do meio ambiente, dos trabalhadores e da qualidade dos produtos; eNível de desenvolvimento do mercado segurador local.

Partindo da pesquisa realizada por RANCAN (1996), este trabalho procurou identificar semelhanças no comportamento dos diversos países o que permitiu agrupá-los em “desenvolvidos” e “em desenvolvimento”.

5.1 - PAÍSES “DESENVOLVIDOS”

O grupo de países considerados “desenvolvidos”, como os Estados Unidos, Alemanha, Bélgica, Holanda e Inglaterra, fora algumas diferenças regionais, apresentam diversos pontos em comum.

Nesses países, o padrão socioeconômico é bastante elevado, há grande disponibilidade de informação e, consequentemente, grande interesse da sociedade pelos assuntos relacionados à proteção ambiental e aos direitos do consumidor. As leis relacionadas ao meio ambiente e aos direitos sociais costumam ocasionar penalidades para as empresas infratoras na forma de multas de valor elevado. O sistema jurídico é eficiente, julgando com rapidez, principalmente os casos relacionados a empresas, não cedendo facilmente às pressões econômicas.

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O Papel do Gerenciamento de Riscos na Logística

O mercado segurador é bastante desenvolvido, tendo em vista principalmente o fato de terem sido os primeiros a criarem os mecanismos de transferência de riscos.

A gestão de riscos não está limitada às grandes empresas, mas abrange também as pequenas e médias, além de várias empresas do setor público. Os conceitos de “segurança integral” são largamente difundidos e a maioria das empresas possui, em seu quadro funcional, a figura do Gerente de Riscos. A matriz industrial varia de um país para o outro, mas, de maneira geral, é formado por uma gama diversificada de indústrias com grande desenvolvimento tecnológico.

5.2 PAÍSES “EM DESENVOLVIMENTO”

Os países considerados como “em desenvolvimento” foram Itália, China, Rússia e Espanha, embora estes últimos tenham apresentado grande progresso nos últimos anos. Analisando o modelo apresentado por RANCAN (1996), pode-se enquadrar o Brasil neste grupo.

De forma geral, nestes países, a mobilização da sociedade e o interesse pelas questões de segurança e meio ambiente é recente, e mesmo assim não é expressivo. Os meios de comunicação costumam dar ênfase somente nos casos de grandes acidentes ou catástrofes naturais devido à repercussão popular. No entanto, não há por parte da sociedade e da imprensa um movimento de conscientização, de educação, ou mesmo, cobrança de atitudes que pressionem as empresas a mudar seu comportamento. A instabilidade econômica contribuiu fortemente para agravar o quadro de dificuldades, inibindo os investimentos em prevenção de riscos. Apesar de o Brasil estar passando por um período de estabilidade e crescimento econômico, as crises dos anos anteriores inibiram o planejamento dos investimentos nessa área.

As empresas resistem em cumprir as normas de segurança e o ambiente legal favorece esse comportamento. O mercado segurador, nesses países, tem pouco interesse no segmento de riscos industriais, o que dificulta a transferência de conhecimento em gestão de riscos entre seguradora e empresas. Neste grupo, a maioria das empresas não tem gerentes de risco com dedicação exclusiva e este papel costuma ser representado pelo corretor de seguros, unicamente, com a finalidade da contratação de seguros pura e simples.

5.3 NOVAS TENDÊNCIAS – ISO 31000

Uma ferramenta que contribuirá para a melhoria e desenvolvimento da gestão de riscos, no Brasil, é a ISO 31000, que foi lançada no Brasil como ABNT NBR ISO 31000:2009 - Gestão de Riscos - Princípios e Diretrizes. Essa norma apresenta os mesmos conceitos já praticados internacionalmente, segundo o Guia PMBOK

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de Gerenciamento de Projetos e também da OHSAS 18001:2007 (OCCUPATIONAL HEALTH AND SAFETY MANAGEMENT SYSTEMS – REQUIREMENTS) e não tem por finalidade a certificação, mas sim o objetivo de servir como um guia para as empresas implementarem o processo de maneira sistemática.

A norma ISO 31000 pode ser utilizada por qualquer empresa pública ou privada, associação, ONGs, grupo ou indivíduo, e não é específica para uma determinada indústria ou setor.

DE Cicco, (2011) ressalta que foi iniciado o primeiro levantamento global sobre a norma ISO 31000:2009. O objetivo da pesquisa é avaliar como a ISO 31000 é percebida pelos gestores de riscos e organizações dos setores econômicos escolhidos, além de contribuir para a elaboração da ISO 31004, Gestão de Riscos - Orientações para a Implementação da ISO 31000, que deverá ser publicada em 2013.

Membros de mais de 100 associações de gestão de riscos de todo o mundo estão sendo convidados a participar do estudo. Essas iniciativas contribuem para a disseminação da cultura de gestão de riscos nas empresas brasileiras.

6 CONSIDERAÇÕES SOBRE GESTÃO DE RISCOS E MOBILIZAÇÃO NACIONAL

Qual a relação entre Gestão de Riscos empresarial e Mobilização Nacional? Partindo dos estudos elaborados pelo Manual Básico, da ESG (2009),

destacam-se alguns conceitos:“Envolvida uma coletividade em situação que ponha em risco sua 1.

sobrevivência, é imperioso reagir no sentido de neutralizar ou eliminar a ameaça.” “A ação de prevenir, neutralizar e eliminar ameaças que surjam na vida das 2.

nações, não deve ficar ao sabor das improvisações, pois que, dessa forma, estaria comprometida a própria Soberania Nacional e estimulada a atuação do inimigo ante a imprevidência do oponente”.

A Mobilização Nacional é “o conjunto de atividades planejadas, orientadas 3. e empreendidas pelo Estado, desde a situação de normalidade, complementando a Logística Nacional, com o propósito de capacitar o País a realizar ações estratégicas no campo da Defesa Nacional, para fazer face a uma agressão estrangeira.”

Comparando os conceitos apresentados pela ESG e os conceitos de Gestão de Riscos, é possível considerar que a Mobilização Nacional é a Gestão de Riscos Nacional. Assim como as empresas, com visão estratégica, estão elaborando planos para transformar a superação dos riscos em diferencial competitivo, o que estão fazendo os países mais avançados ou mais preparados para mobilizar?

Qual o nível de redundância ou contingência estabelecido por países como os Estados Unidos, Inglaterra e Alemanha? Os Estados Unidos e a Alemanha têm uma estratégia clara nesse sentido. Além dos fortes incentivos à indústria Nacional de Defesa, esses países “controlam” importantes indústrias e empresas (públicas

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O Papel do Gerenciamento de Riscos na Logística

e privadas) mobilizáveis como é o caso da FEDEX (EUA) e da DHL (Alemanha). Em 2010, somente com a indústria de defesa os Estados Unidos gastaram USD 533.8 bilhões, com um adicional de USD 130 bilhões para “contingência relacionada às operações externas de combate ao terrorismo”, o que significa estar a contingência presente no planejamento.

Outro dado de destaque é que a preparação para a mobilização de catástrofes é um importante passo para a mobilização em caso de conflito. Também, considerando o exemplo dos Estados Unidos, é possível destacar novamente a FEDEX. Em seu site na internet, (FEDEX, 2011) a empresa apresenta seus serviços de assistência, de fácil acesso, com missão claramente definida: “A missão da FedEx é apoiar ativamente e fornecer uma contribuição de valor para as comunidades a que presta serviço e de fortalecer a sua reputação global através de uma alocação estratégica dos seus recursos, funcionários e rede.” Somente no serviço de “Assistência em Emergências e Catástrofes”, a FedEx oferece contribuições e apoio logístico/transporte através de protocolos que mantém com diversas instituições de socorro, de forma a assegurar que o apoio chegue de forma rápida e eficiente.

Além disso, nos países sujeitos a catástrofes naturais, a população é treinada nas escolas, desde o ensino fundamental, inclusive através de participação em simulações. Nos Estados Unidos, simulações de incêndio, furacão e terremoto nas escolas é prática comum pelo menos a cada 6 meses ou em caso de alerta.

O Brasil pode explorar mais o enfoque de gestão de riscos empresarial para tratar as questões relacionadas à mobilização nacional, utilizando os conceitos e sistemática próprios da gestão de riscos, para o desenvolvimento da logística nacional, seja como abordagem estratégica para mapear os óbices e quantificar seus impactos, seja para melhor desenvolver as empresas brasileiras.

Para fins de exemplo, os projetos de infraestrutura revelam sua relevância como objetivo estratégico e a partir daí, quantificar os riscos que podem advir de sua não realização e suas consequências.

Em relação a cada projeto, podem ser estabelecidos marcos e indicadores de riscos e as ações capazes de possibilitar a transposição dos óbices, dimensionados em termos de recursos e meios necessários à prática.

Com relação às catástrofes naturais, também há muito que desenvolver, não só no sentido da prevenção como da resposta rápida de eficiente mobilização. No Brasil, as mudanças climáticas não eram relevantes e não provocavam danos significativos, e passaram a ser uma nova preocupação.

Há necessidade de fomento por meio de convênios com centros de pesquisa exclusivos para tratar de metodologia de gestão de riscos, incluindo os riscos climáticos e mapeamento de áreas de risco. Cadastramento de fornecedores de suprimentos, equipamentos, mão-de-obra em regiões próximas as áreas de risco podem ser um caminho, além de convênios com empresas transportadoras e construtoras para que sejam prontamente mobilizadas. Inciativas nesse sentido já

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estão em andamento, como o cadastramento de Empresas de Interesse da Defesa Nacional (EIDN), estabelecido pela Portaria Normativa N.º- 1.417/MD, de 31 de maio de 2011 e o Sistema de Georreferenciamento da Presidência da República.

Estabelecimento de parcerias com Seguradoras e Resseguradoras, como o IRB-Brasil RE, também devem ser considerados para a União, com objetivo de transferência de tecnologia em gestão de riscos, metodologias e questionários específicos para avaliação e monitoramento dos riscos, além do expertise em regulação de sinistros (processo de avaliação e indenização de sinistros). Nos mercados dos Estados Unidos e da Alemanha, há muitas parcerias entre o governo e as Seguradoras e Resseguradores, seja na forma de administração de pools, sejam fundos, seja na forma de seguro convencional.

Para financiamento dos riscos, há alternativas como a formatação e administração de Fundo de Catástrofes, a exemplo do Fundo de Estabilidade do Seguro Rural, que foi criado pelo Decreto Lei 73/66 para proteção de eventos climáticos somente para o Seguro Rural, para que possam ser disponibilizados tecnicamente recursos com o objetivo de amparar tais eventos.

7 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

Em tempos de crise, especialmente, a gestão de riscos passou a ser uma ferramenta estratégica para o desenvolvimento, e indispensável para empresas que desejem ser competitivas. Os países desenvolvidos já caminham neste sentido. A relação entre desenvolvimento da gestão de riscos e desenvolvimento da mobilização nacional pode ser considerada direta.

Investimentos em contingência e redundância são necessários se comparados a um evento indesejado e imprevisto de grandes dimensões ou uma série de eventos pequenos e não identificados que funcionam como uma “torneira aberta” de recursos.

Para o Brasil, a abordagem estratégica da gestão de riscos pode representar uma importante ferramenta para o desenvolvimento do País e da mobilização nacional.

Além da redução de perdas humanas e materiais provocadas por acidentes, por mau planejamento e supervisão deficiente de serviços, e perdas causadas por paralisação de produção, pode-se considerar o aumento da produtividade, redução de custos operacionais ou “custo Brasil”, sem falar na qualificação dos recursos humanos que saem do processo mais colaborativos e difusores das políticas de segurança e qualidade.

O ensino dos principais conceitos de gestão de riscos nas Escolas e Universidades deveria ser obrigatório, como forma de disseminação de uma cultura nacional voltada para a segurança e proteção.

Os meios de comunicação também têm papel importante, tanto para a divulgação de práticas seguras das empresas, normas de segurança, responsabilidade civil, social e ambiental quanto para a divulgação de ações práticas em situações de emergência.

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O Papel do Gerenciamento de Riscos na Logística

A mobilização nacional tem muito a ganhar com isso, seja por ocasião de catástrofes naturais ou em hipótese de conflito armado. Recursos humanos com consciência em gestão de riscos são mais facilmente mobilizáveis e mais conscientes de seu papel social.

Quanto mais o Brasil puder identificar seus riscos, suas ameaças, seus principais óbices, mais rapidamente e de maneira mais eficiente e eficaz poderá enfrentá-los.

8 REFERÊNCIAS

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BERNSTEIN, Peter L. Desafio aos deuses: a fascinante história do risco. Rio de Janeiro: Campus, 1997.

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CANDEL, Filomeno Mira. A gerência de riscos e o seguro industrial: gerência de riscos. [S.l.]: Mapfre, 1990.

DAY, George S. A dinâmica da estratégia competitiva. Rio de Janeiro: Campus, 1999.

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RANCAN, Verónica. Comparación entre modelos internacionales de gerencia de riesgos: gerencia de riesgos. [S.l.]: MAPFRE, Ed. Espanhola, n.º 52, 1996.

VAUGHAN, Emmett J. Fundamentals of risk and insurance. 7th Ed., [S.l.]: John Wiley & Sons, Inc, 1996.

GERENCIAMENTO de Riscos: parte I, 04 abr. 2011. Unisis PMBOK Disponível em: <http://unisis.wordpress.com/2011/04/04/pmbok-%E2%80%93-areas-de-conhecimento-%E2%80%93-gerenciamento-de-riscos/

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Silvia Maria Pineschi Braun

EXPANSÃO DA MALHA FERROVIÁRIA BRASILEIRA E SUL-AMERICANA PARA O DESENVOLVIMENTO E INTEGRAÇÃO REGIONAL, COM PRIORIDADE NAS

EXPRESSÕES ECONÔMICA E MILITAR – REFLEXOS NA MOBILIZAÇÃO NACIONAL

Rafael Aquino dos Santos Major de Engenharia do Exército Brasileiro, estagiário do Curso de Logística e Mobilização Nacional da Escola Superior de Guerra, em 2011.

Resumo

Será abordada a expansão da malha ferroviária no cenário brasileiro e sul-americano, como meio de integração e desenvolvimento. Como metodologia para o desenvolvimento deste artigo, será apresentado somente o modal ferroviário, dentro do tema proposto pelo CLMN - 2011, onde se destacará o processo de investigação, iniciado por uma pesquisa sobre o tema em artigos e publicações diversas. Para alcançar esse objetivo o referido trabalho foi dividido em tópicos. O primeiro aborda a expansão da malha ferroviária brasileira, o segundo a expansão da malha ferroviária sul-americana, ambas com seu histórico, situação atual, aspectos de planejamento de expansão e o consequente desenvolvimento4 e integração brasileira e sul-americana, tanto no campo da expressão do poder econômico, como no campo da expressão militar. As considerações parciais, ao final desses tópicos, feitas de forma dedutiva, partiram de dados gráficos e análises estatísticas para melhor subsidiar os reflexos na Mobilização Nacional.

Palavras-chave: Integração Sul-americana; Ferrovia; Mobilização Nacional.

1 INTRODUÇÃO

A oportunidade de o Brasil participar das rodas de decisão dos destinos mundiais faz com que ele assuma responsabilidades dentro e fora do país. Estas, que dizem respeito à sua afirmação como país em pleno desenvolvimento, o colocou como contribuinte de algumas instituições supranacionais. Instituições como o Fundo Monetário Internacional (FMI), membro da Organização Mundial do

4 “É o processo global de fortalecimento e aperfeiçoamento do Poder Nacional, particularmente de seus fundamentos (Homem, Terra e Instituições), visando à conquista, à manutenção dos Objetivos Nacionais e à consecução do Bem Comum”. (Prof. Gustavo Alberto Trompowsky Heck).

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Expansão da Malha Ferrov. Brasileira e Sul-Americana para o Desenvolvimento e Integração Regional

Comércio (OMC), e integrante de grupos de países que se destacam, por estar entre os maiores exportadores de minérios, de alimentos, e ter a maior reserva de água potável do mundo (Aquíferos Guarani e Álter do Chão), deixando-o em posição de destaque internacional.

Além disso, deve ser considerada a posição geopolítica do país. Possuidor das riquezas já citadas, de uma população aproximada de 190 milhões de habitantes, base física com cerca de 8,5 milhões de quilômetros quadrados, 7.637 km de litoral, 15.719 km de fronteiras terrestres, uma área vital como o estreito do Oceano Atlântico, rios navegáveis no interior do país e um relevo pouco movimentado, entre outros fatores, torna-se objeto de cobiça no cenário internacional.

Assim, por mais que o panorama lhe seja favorável, com produtos de necessidade internacional, é preciso maior colaboração dos seus parceiros do continente para melhor desenvolver-se. De acordo com o Tratado de Assunção, a nação deve manter seus vizinhos fortes e desenvolvidos, integrando-se, a fim de crescerem juntos, enfrentando as ameaças do mercado globalizado.

Nesse contexto, foi dada ênfase a uma pesquisa bibliográfica preliminar que auxiliou o embasamento teórico, facilitando a seleção de dados bibliográficos.

O caráter desta pesquisa qualitativa certamente possibilitará que o assunto seja tratado por outros interessados pelo tema em questão, abordando aspectos das expressões do Poder Nacional relacionados com a Logística e Mobilização Nacional.

2 EXPANSÃO DA MALHA DE TRANSPORTE FERROVIÁRIO PARA O DESENVOLVIMENTO E INTEGRAÇÃO REGIONAL

2.1 MALHA DE TRANSPORTE BRASILEIRA

2.1.1 Histórico

A história das ferrovias no Brasil inicia-se com a estrada de ferro da Baía da Guanabara até a cidade de Petrópolis, no Rio de Janeiro, com quatorze quilômetros e meio de extensão. Foi à primeira operação de intermodalidade no Brasil, pois integrava o transporte hidroviário e o ferroviário. Foi inaugurada em 1854, pelo empreendedor Irineu Evangelista de Souza, que via neste modal o apoio a uma exportação mais competitiva para o mercado agroexportador, utilizando tecnologia do exterior. Após esta primeira experiência, seguiram-se várias outras ferrovias com o cunho de país exportador de produtos primários, nos estados do Rio de Janeiro, Bahia, São Paulo, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná.

Recentemente, o fato que marcou o uso de ferrovias foi a necessidade das nações se manterem dentro do mercado exportador e importador mundial, devido à globalização. Diante disso, as nações buscaram atender ao comércio internacional, a fim de obter maiores lucros, desprezando, parcialmente, o mercado regional.

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Contudo, com a formação de blocos econômicos, foi notória a necessidade de manter o mercado circunvizinho aquecido e cooperativo, conforme o Protocolo do Tratado de Assunção, para manter o mercado interno competitivo.

Assim, fez-se imprescindível a integração do mercado econômico sul-americano e de suas infraestruturas, para que pudessem diminuir custos e competirem em melhores condições com os demais países de outros mercados ou blocos econômicos.

2.1.2 Situação atual

A infraestrutura ferroviária existente no país é concentrada nas proximidades do litoral, atendendo, precariamente, o escoamento da produção agrícola do interior do país para o litoral. No entanto, possibilita o escoamento de minério de áreas inóspitas para qualquer parte do mundo.

Hoje, há aproximadamente 28.607 quilômetros de malha ferroviária no Brasil, tendo aproximadamente 12.000 quilômetros em operação. As bitolas da malha ferroviária brasileira estão divididas em métricas (1,00 metros) com extensão de 23.068 quilômetros, largas (1,60 metros) com extensão de 5.016 quilômetros e mistas, com 523 quilômetros de extensão, dados de 2011, da Associação Brasileira da Indústria Nacional de Ferrovias (ABINFER).

Uma das mais sérias restrições que se fazem à bitola métrica refere-se à velocidade máxima que o afastamento de 1m admite. As linhas de bitola métrica sempre foram instaladas tendo em vista velocidades baixas, reduzido custo de implantação, trilhos leves e outros fatores técnicos e econômicos restritivos. Isso porque, na época, essas linhas eram construídas em países que apresentavam baixos recursos de capital ou baixa expectativa de expansão de tráfego futuro, sem a perspectiva de retorno financeiro certo e liquido para a economia daquele tempo. Diga-se de passagem, para países como a Austrália, África do Sul e Japão, também (VFCO).

No entanto, o que mais interessa, em economia dos transportes, é o gabarito útil dos veículos. Por exemplo, o gabarito útil do material rodante de carga da bitola métrica brasileira oferece maior capacidade de oferta de espaço e de peso que a maior parte das ferrovias europeias, asiáticas e africanas. O Japão (1,067 m) opera vagões-cegonha de dois andares, destinados ao transporte de automóveis, pois a altura e a largura dos túneis são compatíveis com o que transporta.

Portanto, o mais importante é o escoamento fácil, rápido e confiável do tráfego, do que propriamente a bitola. Por isso, a uniformização da bitola deve dar-se, tendo padrão aquela que ofereça menores custos, inclusive, de manutenção e de operacionalidade.

Diante da existência de bitolas diferentes entre as linhas e concessões, o transporte ferroviário brasileiro fica prejudicado pela perda de tempo no transbordo

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de carga. Desta maneira, acarreta perda na concorrência com outros países que já fizeram a unificação das bitolas, conseguindo aumentar a velocidade de transporte e cumprir horários de entrega de mercadorias.

A malha ferroviária brasileira foi privatizada em linhas, com o Plano Nacional de Desestatização (PND)5, conforme diretrizes internacionais para promover o desenvolvimento seguindo o Consenso de Washington, justamente com a liberalização do mercado e afastamento do Estado dos meios produtivos, conforme o pensamento de Keynes. Com isso, a privatização da malha ferroviária foi efetuada em regime de concessões (arrendamento), no ano de 1996.

Assim, as ferrovias que eram onerosas ao governo até a década de 1990, aproximadamente 1 milhão de reais por dia, passaram a render até o ano de 2010, 2 bilhões de reais em impostos e pagamentos pelas concessões. Por outro lado, o investimento em melhorias chegou a 23 bilhões de reais até o ano de 2010, o que antes não podia ser feito. Da mesma maneira, a carga transportada que era de 45 mil toneladas passou a ser de 144 mil toneladas por ano, com possibilidades de aumentar ainda mais com a instalação de fábricas de vagões (03) e locomotivas (02) no Brasil, possibilitando a inclusão de mais tipos de vagões para transportar outros produtos do mercado nacional. O exemplo da concessão da MRS Logística torna evidente a corrida para esse modal. Enquanto possuía 13 empresas no portfólio, em 1996, passou a 77 até o ano 2011, em setores antes dominados pelo modal rodoviário. A demanda prioritária para cada concessão do transporte de carga é evidenciada na Tabela 1.

Tabela 1 - DEMANDA DE PRODUTOS TRANSPORTADOS

Fonte: ANTT 2007

5 Criado pela Lei n.º 8.031/90 de 14 de abril de 1990, este Programa representou um marco para diversos segmentos da estrutura estatal estratégica por meio de privatizações/desestatizações de empresas estatais.

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A evolução das ferrovias também é ressaltada quanto à situação de pessoas empregadas. Enquanto nos anos 90 eram empregadas 15000 pessoas, atualmente passam de 35000 pessoas (ABINFER). Isso acarreta o desenvolvimento psicossocial e circulação financeira no mercado interno, favorecendo o crescimento econômico.

Seguiu-se, ainda, a instalação e criação de diversas empresas em território nacional que desenvolvem vagões de passageiros (Alstom, Bombardier, Bom Sinal, CAF Brasil, Siemens, IESA-Hitachi e Grupo MPE) com 80 % de nacionalização. Da mesma forma, o setor de locomotivas até 3000 HP (General Electric, Project way MGE e ZEIT) com 100% de nacionalização e locomotivas com mais de 3000 HP com 50 % de nacionalização. Outros produtos como dormentes (Grupo Singapure, Thermit do Brasil, etc.), molas (Randra, Marafon e Cia Ltda.), desvios hidráulicos (VAE, Voith e Altran), entre outros. Há um total de 428 empresas voltadas para o modal ferroviário, o que evita importação de produtos fabricados no Brasil. No entanto, há a impossibilidade de alguns produtos não atingirem escala de produção ou por serem muito onerosos ou por serem fabricados no Brasil, como motores eletrodiesel e dormentes.

Considerando as concessões existentes e suas áreas de atuação, a extensão da malha ferroviária, suas interconexões e conexões com outros modais, são evidenciadas a situação da existência de bitolas diferentes e os seus problemas decorrentes das necessidades de transbordo de carga para o produto seguir até o seu destino.

Diante deste contexto, o Governo Federal procura desenvolver políticas governamentais atreladas a programas para auxiliar o desenvolvimento do país, como o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) 1 e 2, o Plano Nacional de Logística e Transporte (PNLT) e a Câmara de Política de Integração Nacional e Desenvolvimento Regional.

O PNLT consiste na retomada da valorização do Ministério dos Transportes, com base em dados georreferenciados com a participação da iniciativa privada, do setor produtivo, dos consumidores e dos governos nas três esferas, para mudar as matrizes energética e econômica de transporte, para maior eficiência logística nacional. Entre as dez premissas básicas do Plano, se destaca a ideia de que é um Plano de Estado, buscando atender à nação e os Estados, continuadamente, com foco no aspecto logístico, com gestão institucional e garantindo a segurança nacional, a territorialidade e o meio ambiente. Por conseguinte, a infraestrutura de ferrovias entra na pauta para ser implantada conforme a necessidade econômica regional de desenvolvimento.

Com o mesmo propósito, os PAC 1 e 2, mais que planos de expansão do investimento, pretendem introduzir um novo conceito de investimento em infraestrutura no Brasil. Um conceito que faz das obras de infraestrutura (energia, transporte e comunicações) um instrumento de universalização dos benefícios econômicos e sociais para todas as regiões do País. Esse plano busca estimular a

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eficiência produtiva dos principais setores da economia, impulsionar a modernização tecnológica, acelerar o crescimento nas áreas já em expansão, e ativar áreas deprimidas, aumentar a competitividade e integrar o Brasil com seus vizinhos e o mundo.

Surge assim a Câmara de Política de Integração Nacional e Desenvolvimento Regional, iniciativa governamental que busca o desenvolvimento integrado e sustentável, sob a coordenação da Casa Civil da Presidência da República, de modo a promover ações coordenadas, aproveitando complementaridades e proporcionando desenvolvimento e sustentabilidade das políticas estabelecidas. Estas políticas são priorizadas de acordo com as necessidades, problemas e potencialidades locais, consideradas as diretrizes políticas estaduais, municipais e das sociedades locais. Com isso, os recursos e os passos do desenvolvimento dos modais, principalmente o ferroviário, são acompanhados para proporcionarem o desenvolvimento regional e nacional.

Desta forma, nos dias atuais, têm-se diversas linhas de ação para instituir o desenvolvimento e a integração do país, com a participação de diversos atores políticos de expressão nacional que podem influir no processo decisório favorável à consecução dos programas e planos.

Salientam-se, por isso, programas complementares aos já citados, como: o Programa de Promoção da Sustentabilidade de Espaços Sub-Regionais, o Programa de Promoção e Inserção Econômica de Sub-Regiões, o Programa de Desenvolvimento da Faixa da Fronteira e o Programa de Gestão da Política de Desenvolvimento Regional e Ordenamento Territorial. Todos, parte constituinte do plano de governo de desenvolvimento do país e de sua integração.

Assim, como os anteriores, o Plano Brasil Maior delineia uma nova política industrial, tecnológica, de serviços e de comércio exterior, com o objetivo de aumentar a competitividade dos produtos nacionais, a partir do incentivo à inovação e à agregação de valor.

Tendo-se o conhecimento dos programas para desenvolvimento econômico e social brasileiro, de toda malha ferroviária nacional atual e das concessões ferroviárias, é notório que a infraestrutura ferroviária existente não atende às pretensões governamentais de integrar o território nacional e o mercado interno, a fim de melhorar a logística. Contudo, antes de apresentar as necessidades de expansão da malha ferroviária brasileira, será apresentada a matriz nacional de transporte, com suas distorções, eficiência operacional dos sistemas de transporte, a sua economicidade e o impacto no meio ambiente.

2.1.3 Aspectos econômicos

A matriz de transporte do Brasil reflete a falta de planejamento a longo prazo e a indisponibilidade de recursos financeiros em um período da história em que

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imperava uma inflação alta, precariedade de tecnologia e capacitação das indústrias para fabricação de produtos para os transportes, como o aquaviário e ferroviário. O país teria que importar muito material e equipamento para implantar ferrovias e o modal aquaviário no processo agroexportador. Com isso, o custo e o benefício teriam uma disparidade muito grande para a economia nacional na, época, voltada para o modal rodoviário, refletida na Tabela 2.

Tabela 2 - MATRIZ DE TRANSPORTE DO BRASIL

Meio de transporte

Total de tonelada x Km úteis cargas transportada

2006 (%) Previsão 2023(%)

Rodoviário 58 33

Ferroviário 25 32

Aquaviário 13 29

Dutoviário 3,6 5

Aéreo 0,4 1 Fonte: PNLT do Ministério dos Transportes

Para se entender o porquê de implantar outros modais, além do rodoviário, será apresentada a eficiência dos meios de transporte.

Se for considerado o consumo de combustível e custo de transporte, a eficiência do transporte rodoviário chega até aos 400 quilômetros, o ferroviário fica dos 900 aos 1500 quilômetros e o aquaviário acima dos 1500 quilômetros. Do mesmo modo, um vagão graneleiro que transporta 100 toneladas de grãos teria sua equivalência equiparada a uma locomotiva com cem vagões transportando o equivalente a 357 caminhões de 28 toneladas.

Outra maneira de compararem-se os transportes é por meio do emprego da energia para transporte de carga com potencia de um HP (Horse Power). Com a mesma potência de um HP, em meio aquático se transporta 4000 quilogramas, em meio ferroviário se desloca 500 quilogramas, por meio rodoviário se transporta 150 quilogramas e por via aérea se transporta 6 quilogramas.

Além disso, pode-se fazer referência à capacidade dos diferentes modais quando se utiliza a energia de um quilo de carvão mineral para transportar uma tonelada. O comparativo ficaria conforme Tabela 3:

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Tabela 3 – EFICIÊNCIA ENERGÉTICA DE TRANSPORTE

Meio de transporte Distância percorrida (quilômetros)

Aquaviário 40,0

Ferroviário 20,0

Rodoviário 6,5

Fonte: ANTT e COPPEAD

A equivalência de rendimento e economicidade entre modais de transporte faz da ferrovia a mais viável para o país, pois os polos agroindustriais e agropecuários estão além de 400 quilômetros de distância dos portos de exportação, e atendidas por rodovias com sérias dificuldades de manutenção, um dos principais gargalos.

Levando-se em consideração o terreno e a necessidade de transporte, o modal hidroviário, o mais econômico, não atende a todas as áreas produtivas do Brasil. Os rios não podem ser mudados de curso para atender as áreas produtivas que necessitam de escoamento para centros consumidores ou polos industriais. Por isso, as ferrovias se tornam o modal mais conveniente, pois o peso transportado do produto, a distância a ser percorrida e a quantidade acentuam a economia. Contudo, o emprego da multimodalidade é a forma mais eficiente para aproveitar o máximo de efetividade no transporte nacional.

No aspecto de poluição do meio ambiente, para transportar uma tonelada a uma distância de 1500 quilômetros, um trem produz três vezes mais CO2 e um caminhão produz nove vezes mais do mesmo gás que um rebocador. O transporte aquaviário é mais sustentável, mas possui restrição de transporte no centro-sul do país, quanto à proximidade dos centros de produção, Região Centro-Oeste, e de beneficiamento ou polos industriais.

Ainda que alinhado com a análise no campo econômico, passam-se a abordar em seguida outros aspectos relevantes.

Com os vários programas nacionais, que abordam o aproveitamento das áreas com suas peculiaridades e vocação produtiva, bem como corredores de transporte no mercado interno, o Brasil vem perseguindo o desenvolvimento integral de seus Estados, de acordo com o posicionamento econômico-político do mercado internacional. Com a sobreposição do mapa da malha ferroviária brasileira sobre o que foi anteriormente comentado, observa-se que a malha ferroviária existente se concentra em áreas de recursos naturais seguindo na direção dos polos industrializados e com intensidades tecnológicas média e alta. Já as Regiões Centro-Oeste e Norte não possuem a mesma concentração de estradas de ferro, o que dificulta o escoamento da produção, extrativismo, minérios e outros produtos da margem direita do rio Amazonas.

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O Governo ciente da situação, com impasses burocráticos devido às concessões, buscou normatizá-las e regularizá-las por meio de resoluções, amparadas na agência reguladora do transporte terrestre, a Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT), do Ministério do Transporte (MT).

Surgiu com isso a resolução número 3.694, de 2011, que busca regulamentar a situação dos usuários dos serviços de transporte ferroviário de cargas, estabelecendo o regulamento às empresas que contratam as Concessionárias para Transportar suas Cargas.

à esteira da anterior surgiram outras duas: a resolução número 3.695, de 2011, que regulamenta as Operações de Direito de Passagem e Tráfego Mútuo, visando à integração do Sistema Ferroviário Nacional. Diante desta resolução, as empresas terão que acordar com outras o uso da via concedida, a fim de propiciar maior emprego da malha ferroviária disponível.

A última resolução, a de número 3.696, também de 2011, pactua as metas de produção por trecho e metas de segurança para as concessionárias de serviço público de transporte ferroviário de cargas.

Estas resoluções não se limitam a tratar dos pontos elencados, mas buscam discipliná-los por meio de regras para novos investimentos de elevada importância para a superação de gargalos logísticos que diminuem o potencial das ferrovias brasileiras.

Em suma, elas reequilibram a relação entre a concessionária e os usuários, pois estes são a parte mais frágil e precisam de um quadro legal que garanta seus direitos. Não é possível que os ganhos de produtividade das ferrovias, proporcionados, em parte, pelos volumes contratados pelos usuários, sejam aspirados pelas concessionárias que, em última instância, são prestadoras de serviços públicos.

A aplicação imediata dessas mudanças operacionais tornará o transporte ferroviário mais eficiente e trará benefícios ao País, reduzindo empecilhos logísticos normativos, tornando a produção nacional mais competitiva.

Também deve ser levado em conta que o atraso na infraestrutura de transporte e a falta de visão multimodal provocam custos logísticos de 11,6% do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro, contra 8,7% nos Estados Unidos, diferença que representa R$ 120 bilhões, aproximadamente o lucro total das 500 maiores empresas nacional no ano de 2010, segundo a última edição de Melhores e Maiores, da Revista Exame. Para ultrapassar este percalço; o país necessita investir na infraestrutura de transporte, por volta de R$ 400 bilhões para transformar os obstáculos em fator de competitividade, segundo o Plano CNT de Transporte e Logística 2011. Inserem-se neste bojo outros R$ 57 bilhões para a construção de 500 km de metrôs ou trens urbanos e implantação dos Veículos Leves sobre Trilhos (VLT), nas principais cidades do país.

A fim de apresentar as vantagens dos VLT, segue as seguintes comparações. Um trem com capacidade de 1800 passageiros equivale a 43 ônibus ou 200 vans

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ou 1200 veículos particulares. Isso representaria uma retração na quantidade de ônibus e veículos de transporte, nas ruas das principais cidades do país, diminuindo os congestionamentos urbanos e propiciando um desenvolvimento sustentável.

Ainda com transporte de passageiros surgem os Trens de Alta Velocidade (TAV), os quais gerariam empregos diretos e indiretos, na fabricação de vagões, locomotivas, acessórios e equipamentos, além de acarretar a evolução na área tecnológica pela passagem de projetos com turn key6, o que viabiliza a passagem de conhecimentos. De outra forma, acarretaria a redução no tempo de deslocamento, maior competitividade entre aeronaves e trens entre as cidades beneficiadas e redução de congestionamentos em aeroportos e rodovias.

Havendo decisão política, os recursos aparecem. E, tal qual na política industrial e de inovação, o Governo deveria buscar parcerias na iniciativa privada, para suprir suas deficiências de capital e gerência para superar os gargalos em infraestrutura de transporte.

A tentativa de melhorar esta situação é o planejamento de desembolso previsto com o PAC 1 e 2, PNLT e Plano de Logística Brasileira (pelo Conselho Nacional de Transporte), que fica a mercê da situação do mercado financeiro mundial, com seus altos e baixos devido à especulação financeira.

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), por meio do Departamento de Energia Elétrica, informou que existem na carteira do Banco 268 projetos, distribuídos da seguinte forma: 113 destinados à energia alternativa, 16 em hidrelétricas, 21 para a área de distribuição de energia, 31 para transmissão, 9 na área de ferrovias, 29 em rodovias e 16 térmicas, ou seja, há previsão de desembolso a fim de efetivar obras para desenvolvimento do país e integrá-lo.

A situação atual dos empreendimentos esta sendo levada ao cabo pela VALEC Engenharia, Construção e Ferrovia, empresa pública, responsável por construir 11.241 quilômetros de ferrovias até o final de 2015, o equivalente a 40% da malha ferroviária atual. As Estradas de Ferro (EF) 151, 267, 334 e 354, fazem parte dos serviços da VALEC, enquanto o que falta para completar os 13.916 quilômetros de estradas de ferro de 1,60 metros e 859 quilômetros de 1,00 metros é de responsabilidade de outras instituições (EF 232- Transnordestina).

A EF 151, Ferrovia Norte-Sul, que hoje transporta, principalmente, soja, farelo de soja, fertilizantes e combustíveis, passaria a transportar produtos manufaturados, em container, da região de Manaus para a região Centro-Sul. A Região Sul e o Mato Grosso do Sul (MS) receberiam as benesses da EF 151. Anunciado pelo governo federal em abril deste ano, através de um acordo firmado entre Brasília e o Conselho de Desenvolvimento do Sul, que reúne RS, SC, PR e MS, os estados se comprometem a realizar esforços conjuntos de apoio à proposta federal. Esforço este para que a VALEC, realize os estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental para a

6 Projetos fechados.

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realização do projeto. O ramal ferroviário entraria no Rio Grande do Sul (RS) pela cidade de Erechim e iria até o porto de Rio Grande. Isso viabilizaria a integração do país e o deslocamento de mercadorias de Norte a Sul, entre os dois portos nos extremos da linha férrea, Barbarena ou Belém e Rio Grande, gerando maior circulação de mercadorias e, consequentemente, o desenvolvimento.

Além das EF já citadas, tem-se a 334, denominada de Ferrovia de Integração Oeste- Leste (FIOL), integrando a região de Figuerópolis, no Tocantins, até Ilhéus, na Bahia, com o transporte de grãos, algodão, insumos agropecuários, minérios e fertilizantes. Com isso, tornando os produtos transportados por ferrovias mais competitivos, favorecendo o crescimento econômico e aumentando a integração da região.

Não distante, a EF 267 (em projeto), a Ferrovia do Pantanal ligaria Panorama, em São Paulo, até Porto Murtinho, no Mato Grosso do Sul, transportando minérios, calcário, cimento, soja, carne de frango e de gado. Tudo isso, por que há a possibilidade de ligação com a EF 280, a ferrovia do frango, que liga Chapecó e Itajaí, em Santa Catarina, por meio da conexão na cidade de Dourados, no MS, de onde pode sair pela hidrovia Paraná-Paraguai, ou via férrea pelo Paraguai, melhorando a economia e ligando o interior do Brasil.

Outro aspecto que favorece o desenvolvimento do país é a capacitação de pessoal fornecida em parcerias com instituições de ensino e a iniciativa privada, na área de engenharia ferroviária, com cursos técnicos (ABIFER, ALL, Siemens, VALE, AmstedMaxion, MRS, SENAI, Escola James Stewart e Escola Técnica Silva Freire) e de especialização (Universidade Federal de Juiz de Fora, POLI/USP e Instituto Militar de Engenharia), ampliando ainda mais os horizontes no transporte ferroviário.

Sendo assim, a malha ferroviária nacional passaria a ter a situação propícia a integração do país por meio do modal ferroviário, conforme Anexo F.2 e F.3. Por conseguinte, o desenvolvimento, com aproveitamento do potencial das áreas integradas, suas matérias-primas, indústrias, serviços, capital econômico disponível para empregar, força de trabalho (rural e urbana), polos tecnológicos e comércio existente, poderiam criar uma conexão ferroviária com outros modais (rodoviário, marítimo e fluvial), já existentes. Com isso aumentaria a competitividade dos produtos nacionais e diminuiriam os problemas nas interconexões de malhas e modais.

2.1.4 - Aspectos relacionados ao Campo Militar

Quanto ao aspecto militar, o principal seria o carreamento de meios e pessoas para áreas que necessitassem de concentração para fins belicosos e de apoio logístico, pois possibilitaria a distribuição de suprimentos com maior facilidade estratégica, em praticamente todo o território nacional.

Além disso, tornaria viável o emprego de um transporte mais barato para a

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realização de adestramentos, a exemplo do que é realizado na Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN), utilizando a malha ferroviária da MRS Logística para deslocamento de tropas em exercícios. Da mesma forma, a facilidade de apoio logístico de manutenção em localidades mais longínquas, aos equipamentos e viaturas, em tempo de paz, ao invés do sobrecarregado modal rodoviário, minimizando a vulnerabilidade logística de apoio de manutenção pesada. Da mesma maneira, o apoio à mobilidade estratégica para o interior do país em convulsões internas, apoio sanitário à tropa e evacuação em apoio à tropa seriam facilitados.

Com a Política de Defesa Nacional (PDN)7, foi viabilizada uma agenda para que o Ministério da Defesa apresente ao Ministério dos Transportes uma programação de investimentos de médio e longo prazos, a fim de que as vias de transporte sejam priorizadas conforme as necessidades estratégicas advindas de Hipóteses de Emprego. Desta forma, poderão ser incluídas as vias de transporte de acordo com as prioridades no PNLT. Contudo, será trocada a denominação desta política para Política Nacional de Defesa (PND) no final do ano de 2011, a fim de evocar todos os demais ministérios em suas áreas de atuação na Defesa do país.

Avulta-se com isso, a necessidade de seguir as orientações estratégicas de número 6.6 da PDN, onde a Expressão Militar do País deve fundamentar-se na capacidade das Forças Armadas e no potencial dos recursos nacionais mobilizáveis para defender o Brasil. Com isso, fica evidente a necessidade de entendimentos de mobilização para a nação, por meio da percepção da sociedade, surgindo à viabilidade de aproximar produtos de defesa e empresas estratégicas da área ferroviária para beneficiar as ações de mobilização, como a MRS Logística, VALE e CSN (Companhia Siderúrgica Nacional), por exemplo.

Assim, surge a possibilidade de adentrar a Amazônia por via férrea até as cidades de Vilhena e Porto Velho, ambas em Rondônia e outra linha até a cidade de Santarém, no Pará, pois a manutenção da normalidade no transporte à Região Centro-Sul do país por rodovias deve permanecer sem prejuízo. Isso porque a Força Terrestre deve apoiar as suas tropas empregadas em possíveis Zonas de Combate e Administrativa com outra linha de ação que não só a via rodoviária, que pode se deteriorar com o excesso de peso e prejudicar as vias de acesso normais de Manaus e Porto Velho.

Isso tudo, porque o emprego militar, em caso de guerra, deve interferir o mínimo na vida do país. Deve-se buscar a manutenção da rotina do país na sua Zona Interna, onde não deverá haver combates, mas a segurança da população com as Forças Auxiliares.

Seguindo o raciocínio da PDN, no número 7, das Diretrizes, vem o inciso XIII, que apresenta o fortalecimento da infraestrutura de valor estratégico para a Defesa Nacional, prioritariamente a de transporte, energia e comunicações. Além

7 Política de Defesa Nacional - Decreto N.º 5.484, de – 30/06/2005.

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deste inciso, o XIV busca promover a interação das demais políticas governamentais com a Política de Defesa Nacional, o que facilitaria em muito a ação operacional na Amazônia ou em qualquer porção do território nacional.

Assim, como a área a ser servida pela malha ferroviária seria aumentada em torno de 13.916 quilômetros, de Norte a Sul e de Leste a Oeste, seria positivo para o país tal empreendimento no campo militar.

2.1.5 Considerações Parciais

Levando-se em conta a malha ferroviária existente, em estado precário, a necessidade de melhorias a serem feitas, devido à exigência do mercado nacional e mundial para transformar pessoas e os produtos nacionais mais competitivos, os planos e programas governamentais e da iniciativa privada estão facilitando o acesso das mercadorias dos diversos setores ao transporte ferroviário. Esses empreendimentos estão auxiliando no desenvolvimento do país e na integração da população brasileira por meio do acesso a mercadorias de outras áreas do território nacional. Não obstante, colabora com a Expressão do Poder Militar por facilitar, nos deslocamentos de pessoal e de suprimentos logísticos em caso de exercícios ou de necessidade estratégica para o país, o atingimento de todos os pontos de seu território.

2.2 MALHA DE TRANSPORTE DA AMÉRICA DO SUL

2.2.1 Histórico

A primeira ferrovia da América do Sul foi inaugurada em 1851, no Peru, com um trecho de 14 quilômetros, entre Lima e Calero. Um ano depois, em 1852, o Chile inaugurou sua primeira ferrovia, cuja construção teve início em 1849. O principal emprego, nos países que as utilizavam, era transportar as mercadorias de exportação aos portos, tanto os do Oceano Pacífico como os do Atlântico. Assim, foram instaladas as primeiras linhas férreas no continente, ligando os centros consumidores e exportadores nacionais, atendendo ao trânsito de pessoas e de mercadorias. Cabe salientar que alguns países não as empregaram para integração regional, por questões do terreno ou vegetação, que impediam sua construção. Entre esses, pode-se salientar a Venezuela, Equador, Guiana e Suriname. Com o passar do tempo, as linhas férreas diminuíram de tamanho devido ao incremento das rodovias, com veículos produzidos em grande escala e possibilitando a entrega de produtos de porta em porta.

Os novos interesses do mercado, na década de 1960, também contribuíram para a diminuição das ferrovias, pois a indústria de material ferroviário era diminuta, embora não desprezível. Com isso, o material para conservação tornava-se oneroso

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para os países sul-americanos, no contexto da época. Assim, ficou restrito a interesses de exportadores de materiais em grandes volumes e pesados, em enviá-los diretamente aos portos e, daí, para o mercado externo, o que fez a malha férrea diminuir na média de 26,1%, no período avaliado.

Tabela 4 - EVOLUÇãO DA MALHA FERROVIÁRIA SUL-AMERICANA (1945-2006)

2.2.2 - Situação Atual

Destaca-se que a América do Sul possui uma região verdadeiramente amazônica, outra andina e a considerada como cone sul. Observa-se que os obstáculos naturais, a mata Amazônica e a Cordilheira dos Andes, forçaram os países a maior ou menor coalizões, visando à obtenção de interesses comuns.

Assim, como programas e planos nacionais para desenvolvimento e integração desses países, há programas brasileiros e sul-americanos que convergem para políticas públicas setoriais e regionais, como o Programa Faixas de Fronteiras. Além disso, há política de estado que regem as estratégias dos países, como o Mercado Comum do Sul (MERCOSUL), Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), Comunidade Andina de Nações (CAN), União das Nações Sul-Americanas (UNASUL) e Iniciativa de Integração da Infraestrutura Sul-Americana (IIRSA).

O programa Faixas de Fronteira busca o fortalecimento das regiões de fronteira e de seus subespaços, envolvendo a Amazônia, a região central e o MERCOSUL. Configura-se como uma oportunidade de adquirir a competitividade necessária, para o desenvolvimento sustentável integrado com os países da América do Sul, o que estimula investimentos em arranjos e cadeias produtivas prioritárias para o desenvolvimento sustentável de regiões menos dinâmicas. Com isso, otimiza benefícios sociais deles decorrentes, o desenvolvimento local e a integração da América do Sul.

O mesmo ocorre com o MERCOSUL, que busca a integração da Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e Venezuela, com outros países, por meio de planos

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econômicos e programas de desenvolvimento sub-regionais e regionais. Observa-se isto no Eixo de Integração e Desenvolvimento (EID)8 MERCOSUL-Chile, do IIRSA, com a expansão da malha ferroviária.

A OTCA, criada como um instrumento jurídico de natureza técnica, tem por objetivo promover o desenvolvimento harmônico da Amazônia e vem colaborando para o desenvolvimento e integração sul-americana. Com a realização da distribuição equitativa dos benefícios desse desenvolvimento entre as partes contratantes, busca elevar o nível de vida de seus povos e lograr a plena incorporação de seus territórios amazônicos às respectivas economias nacionais. A intenção de construção da ferrovia de ligação bioceânica entre Colômbia (Porto de Bahia Solano) e Venezuela (Porto de Cabello), denota a expansão da malha ferroviária, como meio de integração e desenvolvimento.

Assim, também, a CAN, a partir de 1996, tinha como objetivo acelerar o desenvolvimento dos países membros, através da integração econômica e social. Houve melhora no volume do comércio, mas ainda incipiente. Propunha a integração regional nos moldes dos padrões internacionais e se integrou ao MERCOSUL, passando a uma nova fase de integração, a partir de 2008, com a União das Nações Sul-Americanas (UNASUL), ampliando sua área de atuação.

Já a IIRSA é um projeto de desenvolvimento da infraestrutura de transporte, energia e telecomunicações do continente, voltado para a integração física dos doze países da América do Sul, visando alcançar um padrão de desenvolvimento territorial equitativo e sustentável.

Esse plano surgiu com o aquecimento do mercado internacional, já no final do século passado, em 1996, onde o engenheiro Eliezer Batista, da Secretária de Assuntos Estratégicos (SAE) e ex-presidente do Vale do Rio Doce, na época, realizou o Estudo de Eixos. Eixos que se fixaram por meio de relações de infraestrutura e comércio internacional, por meio da localização das riquezas naturais e da melhoria da infraestrutura. Já no ano de 2000, o Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão (MPOG) e Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) deram início ao planejamento do país a partir de regiões identificadas por seu inter-relacionamento econômico. Assim, surgiu um dos meios de viabilizar o desenvolvimento e integração, nacional e sul-americano por meio de Eixos Integrados de Desenvolvimento.

A UNASUL deverá auxiliar na convergência dos outros blocos já existentes no continente, começando com a eliminação de tarifas para produtos considerados não sensíveis até 2014, e para produtos sensíveis até 2019. Com isso, buscará eliminar barreiras entre os mercados consumidores e complementares na América do Sul. O tratado define metas para a integração em diferentes áreas: cooperação

8 Dispõe sobre a organização do espaço sul-americano em faixas multinacionais que concentram fluxos de comércio atuais e potenciais para promover o desenvolvimento de negócios.

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econômica e comercial; cadeias de produção; pesquisa e inovação; promoção da diversidade cultural; intercâmbio de informação e de experiências em matéria de defesa; e segurança pública. Corroborando, o Presidente da República Federativa do Brasil disse, ainda, no seu discurso de abertura da UNASUL: “Integração financeira e energética, ferroviária e rodoviária, além da defesa, são áreas prioritárias”.

Acredita-se que essa união melhore as condições para uma integração estrutural entre as nações sul-americanas, permitindo maior dinamismo para a concretização de acordos e intenções já estabelecidas. Com o IIRSA, a consolidação de tais corredores, sem dúvida, contribuirá de forma significativa para a almejada integração.

2.2.3 Aspectos econômicos

Com o desenvolvimento dos EID, a necessidade de baixo custo logístico estimulou o emprego do transporte ferroviário e sua integração com os outros meios de transporte, aumentando a eficiência logística, por diminuírem os custos. Conforme a Agenda de Implementação Consensual (AIC) 2005-2010 e do Plano de Ação Estratégica 2012-2022, do IIRSA, demonstram o interesse comum sul-americano no desenvolvimento e integração regional.

Assim, tem-se a visão geral de como o Brasil irá auxiliar na consecução da integração e desenvolvimento regional, facilitando o deslocamento de mercadorias de áreas com características próprias para serem transportadas e levadas aos pontos de consumo no continente e no mundo.

Destarte, o PAC 1 e 2, os quais são baseados no PNLT, quanto à infraestrutura de transporte, busca também a integração sul-americana, pois induz a construção de ferrovias nos trechos que diminuem custos para a cadeia logística nacional e dos seus parceiros no continente. Com isso diminuiria até quatro dias de deslocamento marítimo de cargas que se destinam do Oceano Atlântico ao continente asiático ou do Oceano Pacífico para a Europa, evitando passar pelo Canal do Panamá, que se encontra congestionado pelo afluxo de carga internacional.

Diante desta situação, a expansão da malha ferroviária sul-americana está sendo desenvolvida por aqueles países que têm condições de construí-la, repará-la e conservá-la, para melhor atenderem às demandas do mercado sul-americano. Levam-se em consideração, também, os eixos que poderão servir para o transporte multimodal ou intermodal, o que baixa o custo do transporte logístico e aumenta a competitividade dos produtos dos diversos países sul-americanos.

Atualmente, a malha ferroviária Argentina, com aproximadamente 32.170 quilômetros, necessita de recuperação de trechos da cidade de Resistência à Salta; de Salta à Pocitos; de Salta (Argentina) à Socompa (Chile), porém, se conserva como a maior da América do Sul. É necessário construir o trecho ferroviário de Foz do Iguaçu (Brasil) à Resistência (Argentina) e de Ponta Porã (Brasil) à Resistência

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(Argentina), o que aumentaria a sinergia comercial entre países, como Argentina, Brasil e Chile. Não obstante, a malha ferroviária de Buenos Aires está em boas condições de uso, pois a América Latina Logística (ALL) mantém o transporte de carga em condições de intercambio entre o Brasil e a Argentina. Há, ainda, linhas férreas entre a Argentina e o Chile, com transporte viável para gesso, cimento, combustíveis, gás liquefeito de petróleo entre outros produtos. Apesar disso, há conexões com o Brasil, o Paraguai e a Bolívia. O entrave são as bitolas diferentes dentro da Argentina, e do Brasil com a Argentina.

Conclui-se, parcialmente, que a economia mundial, atual, dá ênfase ao comércio com países da Ásia e Pacífico. Frente a esta realidade, os países sul-americanos necessitam melhorar a infraestrutura ferroviária integrada, até, então, sem condições de competir com o mercado internacional. Isso, porque as ferrovias não estão integradas, necessitando de construção de trechos entre o Chile e a Argentina, entre o Brasil e o Paraguai e a Bolívia, entre o Brasil e a Argentina, o que poderia levar mais desenvolvimento nas cadeias produtivas locais dos países e, com isso, aumentar a integração e o desenvolvimento entre eles.

2.2.4 Aspectos relacionados ao campo militar

Com a criação do Conselho de Segurança das Nações Sul-Americanas, foram estimuladas a ação conjunta e a defesa integrada das nações, para adestramento ou operações reais, conforme a PDN. Contudo, continuam em elaboração os acordos entre as nações para normatizarem o planejamento das ações, propriamente ditas.

A existência de associações específicas, na área do transporte ferroviário, seja de logística seja de indústrias, favorece a aproximação da iniciativa privada, no que diz respeito aos interesses das instituições supranacionais sul-americanas, tanto na área econômica quanto na área militar dos países envolvidos.

A importância desse ramo para os países está na ação governamental em planejar, orientar e empreender as atividades, ainda em tempo de paz, para que, se necessário, complemente a capacidade logística de cada país em ações estratégicas no aspecto da Defesa Nacional, quando o país sofrer ataque estrangeiro.

Para isso, os países devem programar estes empreendimentos de interesses comuns, por meio de reuniões com entidades de desenvolvimento tecnológico na área, para integrar conhecimentos e facilitar a interação. A iniciativa privada interagiria em áreas afins para melhorar o cenário sul-americano, frente ao contexto internacional. Os governos providenciariam, em contrapartida, a redução de impostos e taxas por se tratarem de produtos de defesa e de interesse comum entre os países, produtos duais, favorecendo ao aquecimento do mercado e facilitando a industrialização de produtos de defesa regionais.

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Já a execução da reunião de bens existentes em cada país, para atender a falta de material, seria por meio de transporte que atendesse as áreas em conflito.

Diante dessa realidade, seria necessário que houvesse vias de acesso seguras e que não causassem atraso na entrega dos produtos em escassez, a fim de manter o poder adicional à tropa para sustentar a sua capacidade de reagir à ação externa. Por conseguinte, seria necessário que o transporte ferroviário fosse integrado por meio de vias férreas mistas ou pela substituição das linhas férreas seculares existentes. Poderia ser moldado pelas linhas férreas americanas do século XIX, que foram substituídas, num pequeno espaço de tempo, para melhor atender às necessidades econômicas, sem prejudicar o interesse comum da sociedade, o transporte coletivo e a segurança da nação.

Não obstante, a rede ferroviária poderia facilitar o deslocamento de pessoal e equipamentos, não só no Brasil, com a integração dessa rede entre os países quando solicitado apoio de outro país para interação logística, buscando uma mobilização mais eficiente. Da mesma maneira, permitiria a aproximação de meios e de pessoal nas áreas de Hipótese de Emprego junto às fronteiras, principalmente na Amazônia.

2.2.5 Considerações parciais

A existência de obstáculos naturais entre os países dificulta a integração ferroviária, mas não a impossibilita.

A expansão da malha ferroviária leva à redução do tempo de deslocamento e da distância em relação aos corredores do Atlântico e do Pacífico, aumentando a competitividade dos produtos sul-americanos no mercado asiático e internacional. Com isso, as conexões e padronização de trechos na malha ferroviária sul-americana tornam-se mais necessárias e viáveis, diminuindo ainda mais o tempo de transbordo e mudança de modais de transporte.

O mesmo ocorreria quando as empresas, voltadas para a indústria ferroviária, atendessem às necessidades de defesa de cada país, pois teriam seus produtos considerados de defesa, em emprego, em outras situações, nas vias férreas, devido à sua característica dual. Com isso, seria mais viável a integração quanto ao aspecto militar, pois poderiam compartilhar mais de construção de produtos de defesa regional.

Infere-se, parcialmente, que o aumento da malha ferroviária sul-americana seria efetiva no desenvolvimento e na integração dos países integrantes dos trechos ferroviários viáveis para transporte. Da mesma maneira, quanto aos aspectos militares, a expansão da malha ferroviária seria favorável ao apoio logístico e ao desenvolvimento tecnológico para possíveis produtos de defesa com emprego dual.

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3 CONCLUSÃO

Cônscio da sua importância, no teatro internacional, pela sua abundância de água doce, localização, energia e solos férteis, o Brasil vem procurando integrar-se aos demais países sul-americanos, para desenvolverem-se em conjunto e fazer frente aos antagonismos.

Assim, entre os empreendimentos do Estado em tempo de paz, como os programas desenvolvidos nos últimos anos, que buscam a expansão da malha ferroviária, destaca-se o transporte ferroviário como o meio mais eficaz para um país de dimensões continentais, como o Brasil.

Desta forma, faz-se do trem o meio mais eficaz para a integração logística do transporte nacional, seja para a economia agroexportadora e para a crescente conteinerização seja para a exportação de minérios, por meio da multimodalidade ou intermodalidade. Isso é imprescindível para a logística nacional, ou sul-americana, por mais que haja percalços de bitolas e conservação de trilhos, de locomotivas e de vagões.

Por outro lado, quanto ao aspecto militar, o modal ferroviário se sobressai pela sua viabilidade de abrangência tanto interna (dentro do país), quanto continental, entre os oceanos, pelo lado econômico e pela sustentabilidade ambiental. Por isso, possibilita a atuação do poder bélico nos seguintes aspectos:

- Apoio logístico em material e pessoal, de norte a sul e de leste a oeste, no território nacional, bem como a integração de malhas com outros países com acesso ao Oceano Pacífico, viabilizando a mobilização estratégica no continente;

- Interligação com centros industriais e tecnológicos que auxiliem no desenvolvimento e fornecimentos de produtos de defesa (material de emprego militar); e

- Concentração de meios para as áreas nas quais a malha rodoviária teria problemas de trafegabilidade (capacidade de peso na pista de rolamento por centímetro quadrado), levando-se em conta a necessidade de grande movimentação de material e equipamentos, evitando repetir a experiência da logística da Guerra de Canudos.

Infere-se, que a Mobilização Nacional tem, como reflexo da expansão da malha ferroviária brasileira e sul-americana, a possibilidade de aumentar a sua eficácia com o mínimo de transtornos para a vida da população, por aumentar a amplitude de ação e com maior rapidez, e, por fim minimizar os transtornos para a população por viabilizar a redundância de apoio logístico de transporte de material e pessoal no interior do país e entre os países do continente.

“Até que o perigo da guerra deixe de ameaçar o mundo, será criminoso, perante a nação, o governo que não se preparar para enfrentá-la”. (Epitácio Pessoa, 7 abr 1920).

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Reflexões Econômicas sobre a Dissuasão como Elemento de Defesa Nacional

REFLEXÕES ECONÔMICAS SOBRE A DISSUASÃO COMO ELEMENTO DE DEFESA NACIONAL

Júlio Grevy Montenegro Osório e AlvesAnalista de Propriedade Industrial no Instituto Nacional de Propriedade Industrial, RJ, estagiário do Curso de Logística e Mobilização Nacional, da Escola Superior de Guerra, em 2011.

Resumo

A atual Estratégia Nacional de Defesa – END é apresentada com seus principais eixos e diretrizes, assim como o conceito de “dissuasão”. Este artigo apresenta uma comparação gráfica entre o percentual do Produto Interno Bruto – PIB, em relação aos Gastos Militares do Brasil de 1988 a 2009, no contexto da América do Sul. Ressalta-se o fato de que o dimensionamento dos respectivos gastos revela uma decisão econômica e que a dissuasão será tão mais custosa quanto maior o poder do seu possível oponente ou da capacidade fiscal do país. A média dos gastos militares dos principais países da América do Sul também é apresentada para embasar, empiricamente, que o nível de gasto relativo das Forças Armadas Brasileiras é modesto frente às necessidades e dimensão do território nacional. As reflexões econômicas sobre dimensionamento, incentivos fiscais como os da Medida Provisória n.° 544/11, direcionados para a Base Industrial de Defesa - BID e em consonância com da Estratégia Nacional de Defesa - END, são apresentados. Também a Mobilização Nacional, seus principais marcos legais, assim como as fases de preparação e execução são analisados, sob a ótica da dissuasão. Por último, estão as conclusões e as recomendações.

Palavras-chave: Defesa Nacional; Dissuasão; Mobilização; Estratégia.

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho trata da atual Estratégia Nacional de Defesa - END, apresentando seus principais eixos e diretrizes, assim como o conceito de dissuasão como elemento de manutenção da paz.

O segundo item do desenvolvimento do artigo apresenta uma comparação gráfica entre o percentual do Produto Interno Bruto - PIB em relação aos Gastos Militares do Brasil, de 1988 a 2009, no contexto da América do Sul. Ressalta-se o fato de que o dimensionamento dos respectivos gastos revela uma decisão econômica e que a dissuasão será tão mais custosa quanto maior o poder do seu possível oponente ou da capacidade fiscal do país. A média dos gastos militares dos principais países da América do Sul também é apresentada para embasar,

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Júlio Grevy Montenegro Osório e Alves

empiricamente, que o nível de gasto relativo das Forças Armadas é modesto frente às necessidades e dimensão do território nacional.

Em seguida, foram apresentadas as reflexões econômicas sobre dimensionamento, sobre os incentivos fiscais, como os da Medida Provisória n.° 544/11, direcionados para a Base Industrial de Defesa - BID e em consonância com da Estratégia Nacional de Defesa – END.

A Mobilização Nacional, os seus principais marcos legais, assim como as fases de preparação e execução são analisados sob a ótica da dissuasão.

Por último, estão as conclusões e considerações finais. Ao término do artigo, pretende-se que o leitor tenha conhecimento dos conceitos fundamentais da Estratégia Nacional de Defesa e da importância da dissuasão como elemento da manutenção da paz e da soberania. Adicionalmente, foram mostradas as opções de dimensionamento econômico dos gastos militares e os elementos positivos do incentivo e da estruturação de uma Base Indústrial de Defesa como elemento de preparo à mobilização nacional.

2 ESTRATÉGIA NACIONAL DE DEFESA. DISSUASÃO

A atual Estratégia Nacional de Defesa – END foi aprovada em 18 de dezembro de 2008, por meio do Decreto n.° 6.703, e determina, formalmente, a orientação do Estado Brasileiro a respeito dos assuntos ligados à Defesa Nacional. Neste documento, ficam definidos a sua formulação sistemática, que se organiza em torno de três eixos estruturantes: restruturação das Forças Armadas, reorganização da indústria nacional de material de defesa e a composição dos efetivos das Forças Armadas.

A reestruturação das Forças Armadas possui diretrizes estratégicas, as quais se relacionam, especificamente, com cada força e, ao lado de cada diretriz, aborda-se o papel de três setores decisivos para a Defesa Nacional: o cibernético, a cargo do Exército; o espacial, a cargo da Aeronáutica; e o nuclear, a cargo da Marinha.

Resumidamente, a END pauta-se em vinte e três diretrizes, elencadas a seguir:

Dissuadir a concentração de forças hostis nas fronteiras brasileiras, nos 1. limites das águas territoriais brasileiras, e impedir-lhes o uso do espaço aéreo nacional;Organizar as Forças Armadas sob a égide do trinômio monitoramento/2. controle, mobilidade e presença;Desenvolver as capacidades de monitorar e controlar o espaço aéreo, o 3. território e as águas jurisdicionais brasileiras;Desenvolver, lastreado na capacidade de monitorar/controlar, a 4. capacidade de responder prontamente a qualquer ameaça ou agressão: a mobilidade estratégica;

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Reflexões Econômicas sobre a Dissuasão como Elemento de Defesa Nacional

Aprofundar o vínculo entre os aspectos tecnológicos e os operacionais da 5. mobilidade, sob a disciplina de objetivos bem definidos;Fortalecer três setores de importância estratégica: o espacial, o cibernético 6. e o nuclear;Unificar as operações das três Forças, muito além dos limites impostos 7. pelos protocolos de exercícios conjuntos;Reposicionar os efetivos das três Forças;8. Adensar a presença de unidades do Exército, da Marinha e da Força Aérea 9. nas fronteiras;Priorizar a região amazônica;10. Desenvolver, para fortalecer a mobilidade, a capacidade logística, 11. sobretudo na região amazônica;Desenvolver, para atender aos requisitos de monitoramento/controle, 12. mobilidade e presença, o conceito de flexibilidade no combate;Desenvolver, para atender aos requisitos de monitoramento/controle, 13. mobilidade e presença, o repertório de práticas e de capacitações operacionais dos combatentes;Promover a reunião, nos militares brasileiros, dos atributos e predicados 14. exigidos pelo conceito de flexibilidade;Rever, a partir de uma política de otimização do emprego de recursos 15. humanos, a composição dos efetivos das três Forças, de modo a dimensioná-las para atender adequadamente ao disposto na Estratégia Nacional de Defesa; Estruturar o potencial estratégico em torno de capacidades;16. Preparar efetivos para o cumprimento de missões de garantia da lei e da 17. ordem, nos termos da Constituição Federal;Estimular a integração da América do Sul;18. Preparar as Forças Armadas para desempenharem responsabilidades 19. crescentes em operações de manutenção da paz;Ampliar a capacidade de atender aos compromissos internacionais de 20. busca e salvamento;Desenvolver o potencial de mobilização militar e nacional para assegurar 21. a capacidade dissuasória e operacional das Forças Armadas;Capacitar a indústria nacional de material de defesa para que conquiste 22. autonomia em tecnologias indispensáveis à defesa; eManter o Serviço Militar Obrigatório.23.

Ao observar as características das diretrizes anteriormente elencadas, fica claro o desejo de construir capacidades de defesa, por meio da dissuasão de possíveis ameaças decorrentes do convívio normal entre nações, sem prejuízo da tradição pacífica do Brasil explicitada no preâmbulo da Constituição de 1988, transcrita a seguir.

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Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil. (Grifo nosso).

O conceito mais geral de dissuasão é trabalhado como sendo a capacidade de se infringir um custo maior que o benefício que uma ação militar pode proporcionar a um Estado que queira continuar a política através do seu braço armado. Neste sentido, possuir Forcas Armadas com credibilidade de emprego é fundamental. Paralelamente, as relações comerciais, financeiras e econômicas, podem ser contabilizadas como custo dissuasório, pois haveria a certeza de retaliação.

Cabe ressaltar que, ao estimular a integração da América do Sul, a própria END explicita:

Essa integração não somente contribuirá para a defesa do Brasil, como possibilitará fomentar a cooperação militar regional e a integração das bases industriais de defesa. Afastará a sombra de conflitos dentro da região. Com todos os países avança-se rumo à construção da unidade sul-americana. O Conselho de Defesa Sul-Americano, em debate na região, criará mecanismo consultivo que permitirá prevenir conflitos e fomentar a cooperação militar regional e a integração das bases industriais de defesa, sem que dele participe país alheio à região.9

Evidentemente, a dissuasão exige não apenas recursos financeiros aplicados na expressão militar do poder nacional, mas esforços políticos na construção de sinergias econômicas regionais. Além disso, a clássica escolha econômica de se construir arados ou canhões pode servir de metáfora, que se reflete no Orçamento Federal. O tamanho e as competências de transformação das Forças Armadas em cumprimento às diretrizes da END devem acompanhar as possibilidades fiscais do País. Por outro lado, e muito sabiamente, a promoção da sinergia entre a END e a estratégia nacional de desenvolvimento fica evidente.

Estratégia nacional de defesa é inseparável de estratégia nacional de desenvolvimento. Esta motiva aquela. Aquela fornece escudo para esta. Cada uma reforça as razões da outra. Em ambas, se desperta para a nacionalidade e constrói-se a Nação. Defendido, o Brasil terá como dizer não, quando tiver que dizernão. Terá capacidade para construir seu próprio modelo de desenvolvimento.

9 Estratégia Nacional de Defesa, Decreto n.° 6.703, de 18 de dezembro de 2008, anexo.

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Reflexões Econômicas sobre a Dissuasão como Elemento de Defesa Nacional

E ainda qualifica como forte o projeto de desenvolvimento que se oriente pelos seguintes princípios:

Independência nacional1. , efetivada pela mobilização de recursos físicos, econômicos e humanos, para investimento no potencial produtivo do País. Aproveitar a poupança estrangeira, sem dela depender;Independência nacional2. , alcançada pela capacitação tecnológica autônoma, inclusive nos estratégicos setores espacial, cibernético e nuclear. Não é independente quem não tem o domínio das tecnologias sensíveis, tanto para a defesa como para o desenvolvimento; eIndependência nacional3. , assegurada pela democratização de oportunidades educativas e econômicas e pelas oportunidades para ampliar a participação popular nos processos decisórios da vida política e econômica do País. O Brasil não será independente, enquanto faltar à parcela do seu povo condições para aprender, trabalhar e produzir.

Como consequência à Estratégia Nacional de Defesa - END, a Medida Provisória n.° 544, de 29 de setembro de 2011, busca fomentar a indústria de defesa brasileira, especialmente no que diz respeito ao desenvolvimento de tecnologias nacionais capazes de proporcionar o fortalecimento do exercício da soberania, a partir da independência nas escolhas de produtos que atendam aos interesses estratégicos do País. Estabelece regras de incentivo fiscal com relação ao PIS/Cofins e ao IPI para a área estratégica de defesa e normas especiais para as compras, contratações de produtos e de sistema de defesa, e desenvolvimento de produtos e de defesa.

A Medida Provisória institui, para as pessoas jurídicas, previamente habilitadas, o Regime Especial Tributário para a Indústria de Defesa – RETID, que contempla a suspensão do PIS/Cofins e do IPI no caso de venda no mercado interno ou de importação de bens ou serviços.

Sem dúvida, é um incentivo há muito esperado pelo setor, que poderá se beneficiar e reconquistar a importância que já teve nas décadas de 70 e 80. Entre outros motivos, a referida indústria foi atingida pela redução relativa dos orçamentos militares. No final da década de 80, mais precisamente em 1989, a relação Gastos Militares/ PIB era de 2,6%. Em 2009, esta mesma relação foi reduzida para 1,67%.

2.1 GASTOS MILITARES NO CONTEXTO SUL-AMERICANO

Os três eixos estruturantes da END possuem uma dificuldade comum não negligenciável: a escassez de recursos econômicos. Isso significa uma reduzida quantidade de recursos da Expressão do Poder Econômico Nacional colocado à disposição das Forças Armadas, limitando o seu poder de dissuasão.

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Júlio Grevy Montenegro Osório e Alves

Gráfico 1: Percentual do PIB em gastos militares no Brasil - 1988 a 2009

Fonte: SIPRIMilitaryExpenditureDatabase 201110

A alocação de recursos, no ciclo Orçamentário Federal, obedecendo ao

escopo dos Planos Plurianuais, nem sempre obedecem a uma racionalidade.

A execução do Orçamento Federal não raro é atingida pelas necessidades de

políticas econômicas de curto e médio prazo. Todas as necessidades e justificativas

convergem e passam pelo crivo do Ministério do Planejamento Orçamento e

Gestão e são enviadas pelo Executivo para o Congresso Nacional. Neste sentido,

necessidades altamente justificadas e prementes do Estado Brasileiro podem ser

postergadas ou até mesmo despercebidas pelo Poder Executivo e pelos senhores

deputados e senadores. Inclusive a própria END identifica o pouco envolvimento

da sociedade brasileira com os assuntos de defesa e escassez de especialistas

civis nesses temas. Como alocar maiores recursos, se a sociedade não sabe da

realidade das Forças Armadas? Este é um óbice específico a ser superado pelo

Ministério da Defesa.

O Gráfico 1 demonstra o percentual do PIB brasileiro dos gastos militares

de 1988 até 2009. Nota-se o pico de 2,6% em 1989 até a estabilidade de cerca de

1,5% desde 2003 até 2009. Empiricamente, a situação fica demonstrada. Este nível

de gastos seria teoricamente aceitável, se os países que nos rodeiam possuíssem

alocação tão baixa quanto a nossa. Entretanto, a situação varia, conforme o gráfico

2 demonstra.

10 http://milexdata.sipri.org. Elaboração do gráfico: o Autor.

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Reflexões Econômicas sobre a Dissuasão como Elemento de Defesa Nacional

Gráfico 2: Média dos gastos militares em relação percentual ao PIB de 2000 a 2009

Fonte: SIPRIMilitaryExpenditureDatabase2011,11

O gráfico 2, sobre a média dos gastos militares dos principais países sul-americanos, no período de 2000 a 2009, revela que os gastos brasileiros superam apenas os da Argentina, Paraguai, Peru e Venezuela. Por outro lado, os gastos militares em relação ao PIB do Brasil foram superados, em ordem crescente, por Uruguai, Bolívia, Equador, Colômbia e Chile. Isso significa que ao longo dos 10 anos selecionados, cinco importantes países da América do Sul investiram relativamente mais em defesa que o Brasil.

Outro dado relativo ao contexto sul-americano é o efetivo militar dos principais países do continente.

Tabela 1 – Efetivo militar

PaísEfetivo

Forças Armadas

Exército Marinha Força Aérea

Uruguai 23.700 15.200 5.500 3.000Paraguai 20.200 14.900 3.600 1.700Bolívia 31.500 25.000 3.500 3.000Equador 57.500 50.000 4.500 3.000Chile 87.000 51.000 24.000 12.000Venezuela 79.000 34.000 15.000 7.000Peru 115.000 75.000 25.000 15.000Argentina 71.100 41.400 17.200 12.500Colômbia 153.000 130.000 15.000 8.000Brasil 287.600 189.000 48.600 50.000Fonte: Carvalho, Roberto. “Capacidade Dissuasória das Forças Armadas Brasileiras”. Curso de Altos

Estudos de Política e Estratégia, 2002.

11 http://milexdata.sipri.org. Elaboração do gráfico: o Autor.

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Apesar do seu efetivo enxuto, principalmente das suas forças terrestres em relação ao seu enorme território e fronteiras, o Brasil tenta minimizar o problema, reposicionando o efetivo conforme as diretrizes da END, mais especificamente, priorizando a Amazônia, as fronteiras e não descuidando da elasticidade por meio do Serviço Militar Obrigatório.

2.2 - Reflexões econômicas

A alocação de recursos e o modelo de desenvolvimento são escolhas econômicas de um país. Alocar poucos recursos proporcionais ao PIB para os gastos militares tem sido a escolha brasileira, há mais de dez anos. Tal escolha, em longo prazo, afeta a credibilidade do poder de dissuasão das forças militares, abrindo possibilidades e ameaças não percebidas pela sociedade brasileira.

Por outro lado, recursos econômicos têm por característica serem escassos e as necessidades humanas tendem ao infinito. As diversas teorias econômicas são utilizadas, nem sempre com sucesso, para o crescimento econômico e a maximização dos recursos disponíveis. Colocar os gastos militares ao mínimo possível pode ter uma lógica conjuntural de curto prazo, mas em longo prazo coloca em risco a soberania e a integridade nacional.

Neste sentido, a Estratégia Nacional de Defesa – END procura a sinergia entre os interesses da Defesa e do Desenvolvimento Nacional. O incremento da Base Industrial de Defesa – BID procura desenvolver o somatório de esforços em prol do mesmo fim entre a sociedade brasileira e as necessidades estratégicas da Defesa Nacional. O empresariado nacional está sendo estimulado através do recém-criado Regime Especial Tributário para a Indústria de Defesa – RETID, por meio da Medida Provisória n.° 544/11.

No entanto, mesmo que os gastos militares aumentem mais um pouco, não seria suficiente para sustentar a BID e suprir, eficazmente, nossas necessidades de Defesa. É necessário conjugar esforços com os países sul-americanos, tanto na consolidação de interesses comuns, quanto na complementação da utilização da capacidade de produção da Indústria Nacional de Defesa.

2.3 - Mobilização nacional

Segundo a Escola Superior de Guerra - ESG, a mobilização é um processo pelo qual a Nação se prepara para enfrentar uma guerra. Nesse sentido, a Estratégia Nacional de Defesa considera a capacidade de mobilização nacional como um fator de dissuasão nas relações internacionais, pois potencializa e confere elasticidade para complementar a logística nacional, quando o país estiver em conflito armado. Segundo Sun Tzu, “Em batalhas, quaisquer que sejam os resultados, o gosto será sempre amargo, mesmo para os vencedores.

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Reflexões Econômicas sobre a Dissuasão como Elemento de Defesa Nacional

Portanto, a guerra deve ser a última solução e só deve ser travada quando não existir outra saída.”12

No caso brasileiro, a última solução, ou seja, declarar guerra é uma competência privativa do Presidente da República, no caso de agressão estrangeira e autorizado pelo Congresso Nacional ou referendado por ele, quando no intervalo das sessões legislativas e nas mesmas condições, decretar, total ao parcialmente a mobilização nacional, conforme artigo 84, inciso XIX da Constituição Federal.

Desta maneira, na decretação da Mobilização Nacional, a partir da regulamentação do artigo e inciso anteriormente citado, por meio da Lei 11.631/07, o Poder Executivo especificará o espaço geográfico em que será realizada e as medidas necessárias à sua execução, conforme enumera o parágrafo único do artigo 4.°:

I - A convocação dos entes federados para integrar o esforço da Mobilização Nacional;

II - A reorientação da produção, da comercialização, da distribuição e do consumo de bens e da utilização de serviços;

III - A intervenção nos fatores de produção públicos e privados;IV - A requisição e a ocupação de bens e serviços; eV - A convocação de civis e militares.

Somente no Decreto n.° 6.592/08, o parâmetro para a qualificação da expressão “agressão estrangeira” foi definido como: ameaças ou atos lesivos à soberania nacional, à integridade territorial, ao povo brasileiro ou às instituições nacionais, ainda que não signifiquem invasão ao território nacional. Cabe ressaltar que o Brasil ainda necessita atualizar o Decreto-Lei 4.812/42, que regulamenta as requisições de bens imóveis e móveis, necessários às Forças Armadas e a defesa passiva da população, além de outras providências. O referido Decreto-Lei precisa ser repensado à luz da Constituição Federal de 1988, da Estratégia Nacional de Defesa - END e do Sistema Nacional de Mobilização - SINAMOB.

O SINAMOB tem como órgão central o Ministério da Defesa – MD e estrutura-se sob a forma de direções setoriais, as quais responderão pelas necessidades da Mobilização Nacional nas áreas política, econômica, social, psicológica, de segurança e inteligência, de defesa civil, científico-tecnológica e militar.

São competências do SINAMOB, conforme a Lei 11.631/07:

I - Prestar assessoramento direto e imediato ao Presidente da República na definição das medidas necessárias à Mobilização Nacional, bem como aquelas relativas à Desmobilização Nacional;

12 Tzu, Sun. A arte da guerra.

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II - Formular a política de Mobilização Nacional;III - Elaborar o Plano Nacional de Mobilização e os demais documentos

relacionados à Mobilização Nacional;IV - Elaborar propostas de atos normativos e conduzir a atividade de

Mobilização Nacional;V - Consolidar os planos setoriais de Mobilização Nacional;VI - Articular o esforço de Mobilização Nacional com as demais atividades

essenciais à vida da Nação; eVII - Exercer outras competências e atribuições que lhe forem cometidas por

regulamento.

De caráter deliberativo e também integrante do SINAMOB, o Comitê do SINAMOB tem por finalidade dispor sobre matérias de competência do Sistema, estabelecidas no art. 7.° da Lei 11.631/07.

São membros titulares do Comitê do SINAMOB, com direito a voto:

I - O Ministro de Estado da Defesa, que o presidirá;II - O Ministro de Estado da Defesa ou seu substituto legal de cada órgão a

seguir indicado:a) Ministério da Justiça;b) Ministério das Relações Exteriores;c) Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão;d) Ministério da Ciência e Tecnologia; e) Ministério da Fazenda;f) Ministério da Integração Nacional;g) Casa Civil da Presidência da República;h) Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República; ei) Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República.

Desde a situação de normalidade, a aplicação dos recursos financeiros destinados aos Programas de Desenvolvimento Nacional deve guardar sintonia com setores de interesse da Defesa Nacional, utilizando-se, para tal, de um sistema integrado por órgãos do governo denominado Sistema Nacional de Mobilização (SINAMOB). Na eventualidade de um conflito, a mobilização canaliza os recursos do País (recursos humanos, financeiros, materiais) para atender aos esforços contra a agressão estrangeira. Neste sentido, existem duas fases distintas da mobilização nacional: o preparo e a execução.

O preparo consiste na realização de ações estratégicas que viabilizem a execução da mobilização, sendo desenvolvida desde a situação de normalidade, de modo contínuo, metódico e permanente. Assim, é no momento de normalidade que se tem trabalhado na aprovação de Leis, Doutrinas, planejamentos, implementação

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Reflexões Econômicas sobre a Dissuasão como Elemento de Defesa Nacional

de estratégias de desenvolvimento coerentes com a END, preparo das Forças Armadas aos novos desafios da realidade, enfim, tudo que se pode fazer em tempo de normalidade.

Já a fase de execução consiste no conjunto de atividades que, depois de decretada a mobilização, são empreendidas pelo Estado, de modo compulsório e acelerado, objetivando transferir meios existentes no Poder Nacional e promover a produção e obtenção oportuna de meios adicionais. A complementação dos recursos financeiros, materiais, bélicos, recursos humanos civis e militares serão colocados à disposição do esforço de guerra.

Cabe ressaltar que, quanto maior o preparo, menor será a mobilização numa situação de conflito. Todo o planejamento da mobilização nacional será acompanhado de um planejamento de desmobilização, a fim do retorno seguro à normalidade do País. A capacidade de mobilização, se bem desenvolvida, também possui efeito dissuasório.

3 CONCLUSÃO

O preparo do Brasil visando a uma situação de guerra não é uma tarefa trivial. Primeiro, pelas tradições pacíficas, das quais o Brasil pode se orgulhar. Segundo, pelas dimensões continentais de um país que faz fronteira com todos da América do Sul, exceção do Chile e do Equador. Terceiro, porque o processo de desenvolvimento brasileiro nunca teve como força motriz guerras de conquista, nem a indústria bélica. Difícil também pelos desafios normais do desenvolvimento econômico, com demandas sociais, necessidades de investimentos em infraestrutura, saúde, educação, segurança pública, dificuldades institucionais de diversas naturezas.

Entretanto, o Estado Brasileiro, após a sua redemocratização, depois da promulgação da Constituição Federal e da estabilização da inflação em níveis toleráveis, tem se dedicado com mais eficiência ao planejamento. A defesa nacional sempre foi o foco das Forças Armadas, agora, porém, por meio de importantes marcos legais, tais como a Constituição; a Lei 11.631/07, que criou o SINAMOB; o Decreto 6.592/08, que criou o Comitê do SINAMOB; pela definição de uma Politica de Defesa Nacional; e a uma Estratégia Nacional de Defesa (Decreto 6703/08), pode-se inferir que o país tem se preparado metodicamente para um eventual conflito.

Conflitos são normais na história das nações. O foco brasileiro é de defesa, pois a guerra de conquista está descartada por força constitucional. Neste trabalho, constatou-se a restringida aplicação de recursos orçamentários em relação ao Produto Interno Bruto e o reduzido efetivo militar em face da grandiosidade do território nacional.

Tal situação prejudica o elemento dissuasório das Forças Armadas do Brasil. A dissuasão é um elemento-chave para evitar conflitos armados. O poder de dissuasão, sobejamente sabido pelos especialistas, também reconhecido

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pela END, será recuperado conforme as ações previstas forem sendo realizadas. Cabe ressaltar que a própria END é de 2008, ano de uma forte crise financeira internacional, que forçou o Brasil a adotar medidas anticíclicas e posteriormente, já em 2010 e 2011, medidas macroprudenciais com um maior ajuste das despesas públicas. Esses ajustes de curto prazo são óbices temporários que o Ministério da Defesa, conjuntamente com os Ministérios da Área Econômica podem diminuir. Mais complicado é o envolvimento da sociedade brasileira no tema “Defesa”.

O envolvimento da sociedade brasileira no tema se reflete no Orçamento Federal. Temas pouco conhecidos, apesar de importantíssimos, são relegados com poucos recursos. A Defesa Nacional não pode ser um assunto exclusivo de militares. Neste sentido, a Escola Superior de Guerra - ESG tem se esforçado, por meio de seus cursos regulares de alto nível, a aumentar o envolvimento e sensibilizar a sociedade brasileira a superar este óbice.

A inauguração de um campus da ESG, em Brasília, é um passo para o maior envolvimento da estrutura estatal em relação ao tema. No entanto, a principal contribuição deste trabalho, além da identificação dos óbices já mencionados, é a indicação do aproveitamento dos recursos humanos disponíveis, formados pela ESG, e o conhecimento e a experiência da Escola Nacional de Administração Pública – ENAP em cursos à distância pela internet. O alcance e a capilaridade da internet, além de extremamente baratos, poderiam ser direcionados aos estudantes de diversos níveis, aos professores, aos jornalistas e a outros formadores de opinião. Vale ressaltar que diversos cursos superiores já estão no formato semipresencial em diversas Universidades Federais e particulares. Outro caminho possível é a formação em nível de mestrado e doutorado para a formação de especialistas de nível internacional, sem prejuízo dos cursos já desenvolvidos pela ESG.

Com a criação de uma carreira específica na área de Defesa, a ESG também poderia formar os futuros concursados, analogamente como faz o Instituto Rio Branco com os diplomatas brasileiros. Enfim, estas são formas institucionais de aproximar a sociedade ao tema da Defesa Nacional.

4 REFERÊNCIAS

ACIOLI, Rodrigo Girdwood. O papel do governo na revitalização da indústria nacional de defesa. Rio de Janeiro: ESG, 2011.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. São Paulo: Saraiva, 1990.

______. Decreto nº 6703, de 18 de dezembro de 2008. Aprova a estratégia nacional de defesa. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Decreto/D6703.

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Reflexões Econômicas sobre a Dissuasão como Elemento de Defesa Nacional

______. Lei nº 11631, de 27 de dezembro de 2007. Dispõe sobre a Mobilização Nacional e cria o Sistema Nacional de mobilização: SINAMOB. Disponível em: http://www.leidireto.com.br/lei-11631.html. Acesso em: 1 set. 2011.

______. Decreto nº 7294, de 6 de setembro de 2010. Aprova a Lei da Política de mobilização nacional. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato20072010/2010/Decreto/D7294.htmAcesso em: 1 set. 2011.

CARVALHO, Roberto. Capacidade dissuasória das forças armadas brasileiras. Rio de Janeiro: ESG, 2002.

ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA (Brasil). Manual básico: elementos doutrinários. Rio de Janeiro, 2009. V.1.

TZU, Sun. A arte da guerra. 1. ed. São Paulo: Saraiva de Bolso, 2010.

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Fernando Henrique da Conceição Sobrinho

SERVIÇO CIVIL OBRIGATÓRIO: IDÉIAS, REFLEXÕES E APLICAÇÕES PARA A MOBILIZAÇÃO

Fernando Henrique da Conceição SobrinhoTenente-coronel de Artilharia do Exército Brasileiro, estagiário do Curso de Logística e Mobilização Nacional da Escola Superior de Guerra, em 2011.

Resumo

O Serviço Militar Obrigatório é o modelo de conscrição em vigor no Brasil, conforme está previsto no artigo 143 da Constituição Federal de 1988. Este modelo vem sendo questionado por alguns setores da sociedade brasileira, que acreditam ser o serviço militar “voluntário” o mais adequado aos tempos atuais. Independente do modelo adotado, grande parte dos jovens que se alistam não são aproveitados pelo serviço militar, ficando estes alheios à situação atual das Forças Armadas brasileiras e das condicionantes para boas ações de Desenvolvimento e Mobilização Nacional. Uma excelente opção de aproveitamento dos jovens que não serviram às Forças Armadas ou que tiveram seus estudos, de nível superior, financiados pelo Estado, a participarem deste processo, seria a criação de um Serviço Civil Obrigatório. O objetivo principal deste trabalho é mostrar a necessidade de criação de um Serviço Civil Obrigatório que vise a incluir todos os jovens brasileiros no processo de Desenvolvimento e Mobilização Nacional, fazendo parte de efetivo mobilizável das Forças Armadas. Para tal será feita, além de uma pesquisa bibliográfica, a consulta a documentos e publicações de onde se possam extrair conhecimentos e experiências que contribuam para a execução desse trabalho e para a consecução do objetivo traçado.

Palavras-chave: Mobilização; Serviço Civil; Serviço Militar.

I - INTRODUÇÃO

O modo de conscrição para o serviço militar, em vigor no Brasil, é o obrigatório. Anualmente, realiza-se o alistamento, nas Delegacias e Juntas do Serviço Militar, a classe de jovens do sexo masculino que completa 18 anos. No ano seguinte ao alistamento, apenas uma pequena parcela (em torno de 100 mil jovens) é aproveitada para a prestação do serviço militar inicial nas Forças Armadas.

A Constituição Federal, em seu artigo 143, ampara a existência do Serviço Militar Obrigatório, o qual é regulado pela Lei n.º 4.375, de 17 de agosto de 1964 (Lei do Serviço Militar) e pelo Decreto n.º 57.654, de 20 de janeiro de 1966 (Regulamento da Lei do Serviço Militar).

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Serviço Civil Obrigatório: Idéias, Reflexões e Aplicações para a Mobilização

Esse modelo de conscrição vem sendo questionado por alguns setores da sociedade, haja vista o exemplo de serviço militar voluntário existente em outros países, como por exemplo, na Argentina, Espanha e França e que poderia ser adotado no Brasil.

O Serviço Militar Obrigatório no Brasil justifica-se pelo fato de abarcar jovens de todas as classes sociais, raças, credos, níveis de escolaridade, enfim, por se traduzir em um grande panorama da sociedade brasileira.

Em paralelo ao Serviço Militar Obrigatório, existe a idéia de criação de um Serviço Civil que buscaria aproveitar o excesso de contingente não aproveitado pelo Serviço Militar Inicial, dentro da mesma classe de jovens que acabou de realizar o alistamento, e que estão na faixa dos 18/19 anos.

Além dos jovens citados acima, concluem o curso superior nas universidades e faculdades brasileiras cerca de um milhão de jovens, apesar do Censo do Ensino Superior realizado em 2010, relatar que, aproximadamente, seis milhões de jovens se matriculam por ano nas instituições da rede pública e privada. De acordo ainda com este censo, das 2.314 instituições de nível superior, 245 são da rede pública e 2.069 são particulares. Cabe ressaltar que grande parte desses jovens (os do sexo masculino) não foi abrangida pelo Serviço Militar Obrigatório.

Segundo a Estratégia Nacional de Defesa (END), aprovada em 2008, a base da Defesa Nacional é a identificação da Nação com suas Forças Armadas e de suas Forças Armadas com a Nação. Tal identificação exige que a Nação compreenda serem inseparáveis as causas do desenvolvimento e da defesa. Considera que, por isso, o Serviço Militar Obrigatório deve ser mantido e reforçado. É a mais importante garantia da Defesa Nacional. Pode ser também o mais eficaz nivelador republicano, permitindo que a Nação se encontre acima de suas classes sociais.

Os objetivos do presente trabalho são explicar o modo de conscrição brasileiro, comparar o atual modo de conscrição com o voluntário e traçar argumentos favoráveis à criação de um Serviço Civil Obrigatório, que vise a aproveitar os jovens que não forem absorvidos pelo Serviço Militar Inicial na fase do alistamento e, também, os que concluem seus cursos superiores nas instituições de ensino da rede pública nacional e que podem vir a contribuir de maneira significativa para o desenvolvimento nacional, além de serem aproveitados como parte da reserva das Forças Armadas.

Esse serviço civil também será fator importante a ser levado em consideração quando da necessidade de uma mobilização nacional.

2 SERVIÇO MILITAR OBRIGATÓRIO NO BRASIL

2.1 - HISTóRICO

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Fernando Henrique da Conceição Sobrinho

2.1.1 - Colônia

Encontra-se assinalado no livro História do Exército Brasileiro que, em 1542, pela Câmara de São Vicente, foi promulgado um “termo” que pode ser considerado como o primeiro esboço do Serviço Militar Obrigatório no Brasil. Esse “termo” dava organização a uma milícia formada, à época, por colonos e índios.

Outros historiadores fixam como primeira manifestação do serviço militar no Brasil a imposição do Regimento de El-Rei, de 1548, introduzido na colônia por Thomé de Souza, pelo qual todo colono deveria possuir uma arma de fogo e os proprietários de engenho deveriam ter pólvora para dois canhões pequenos, vinte arcabuzes, vinte lanças, quarenta espadas e gibões de armas acolchoados. Uma e outra data evidenciam, sem dúvida, uma organização militar que congregava os habitantes para a defesa da terra. Havia nascido, então, em nosso solo, o serviço militar e a mobilização.

Registra-se, ainda, como base da organização de um exército permanente, o Regimento dos Capitães-Mores e mais capitães e oficiais das Companhias de Gente de Cavalo e de Pé, datado de 1570. De acordo com esse Regimento, em cada cidade o alcaide-mor e senhores eram os capitães-mores (comandantes das milícias), que registravam, em livro autenticado, toda a gente que por lei era obrigada a ter armas.

A esse regimento seguiu-se, em 1574, a provisão sobre as ordenanças ou Provisão Régia, que segundo alguns autores, assinala o início da regulamentação sobre a prestação do serviço militar, desta feita obrigatório, organizando pela primeira vez, a Força Terrestre do Brasil Colônia.

2.1.2 - Império e República

Em 1808, com a chegada da família real portuguesa ao Brasil, foram criadas as Secretarias de Estado da Marinha e do Exército no Rio de Janeiro.

A Carta Magna do Império de 1824, que esteve vigente até a República, instituiu a Marinha e o Exército como instituições nacionais permanentes, prescrevendo que todos os brasileiros eram obrigados a pegar em armas para sustentar a independência e a integridade do Império, defendendo-o dos inimigos externos. Em que pese o preceito constitucional, o serviço militar não foi tornado obrigatório e o governo descurou-se do preparo dos efetivos militares, ocorrendo a redução dos efetivos e dos meios nas duas Forças. O quadro repercutiu de forma desfavorável ao País, sendo as conseqüências dramáticas observadas por ocasião da deflagração da Guerra do Paraguai em 1864, quando, de forma rápida e conturbada, teve que ser mobilizado o potencial humano e material disponível, socorrendo-se a Nação de todos os seus recursos humanos e materiais. Apelou-se para o patriotismo e criaram-se os Corpos de Voluntários da Pátria.

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A Marinha necessitou de urgentes reforços, comprados à Europa, embora a sua situação, inicialmente, fosse até mesmo melhor que a do Exército. Esses fatos ocorreram porque de 1824 a 1874, adotou-se o sistema de voluntariado e de reengajamento de efetivos já incorporados, e somente quando estes não suprissem as necessidades, colocava-se em prática o sistema de recrutamento forçado.

Um fato, até certo ponto curioso, é que os recrutados à força serviriam à Pátria por dezesseis anos, os voluntários comuns por oito anos e os semestreiros (filhos de lavradores ou de abastados) por seis meses no primeiro ano e três meses nos sete anos seguintes. O recrutamento forçado era executado por patrulhas, que percorriam os bares e tabernas, à noite, à procura dos homens, entre os quais as autoridades escolhiam os que deveriam assentar praça.

O alistamento era feito na Junta da Paróquia, pela autoridade policial mais graduada e pelo Pároco. Nessa junta, era feito o sorteio daqueles que seriam incorporados, entretanto, tal modelo não surtiu o efeito desejado, em virtude de falhas e deficiências do regulamento. Em 1874, foi promulgada a lei pela qual se abolia o sistema de recrutamento forçado.

A Constituição de 1891, que instituiu a República, reafirmou a obrigatoriedade do serviço militar no seu artigo 86, onde regulamentava que todo brasileiro era obrigado ao serviço militar na defesa da Pátria e da Constituição na forma das leis federais. Pelo artigo 87, parágrafo 3.º, foi abolido o recrutamento compulsório. O Exército e a Marinha seriam compostos pelo voluntariado sem prêmio e na falta deste, pelo sorteio, previamente organizado.

Seguiu-se a Lei n.º de 1908, que regulava o alistamento, o sorteio e a obrigatoriedade do serviço militar entre os homens de 21 e 44 anos. Esta lei, entretanto, não teve aceitação popular, provocando grandes reações por parte da opinião pública que a tornaram insubsistente. Necessidades provocadas pela 1.ª Guerra Mundial, que ameaçava a segurança do País, levaram o Presidente Wenceslau Brás a fazer cumprir o diploma legal de 1908.

Em 5 de janeiro de 1915, a Lei n.º 2.924 disciplinou a reorganização do Exército e o serviço militar tornou-se obrigatório e pessoal.

Olavo Bilac pregou, em notável campanha por todo o Brasil, entre 1915 e 1916, a necessidade do serviço militar, como preito de amor à Pátria, mostrando o quartel como uma escola de civismo. Demonstrou aos brasileiros a nobreza do dever militar e por isso é considerado o Patrono do Serviço Militar Brasileiro, sendo o dia do seu nascimento, 16 de dezembro, adotado como o Dia do Reservista.

Seguiram-se as leis e decretos de 1918, 1920 e 1936. O Decreto-Lei n.º 9.500, de 23 de julho de 1946, regulamentou a prestação do Serviço Militar Obrigatório, com convocação geral da classe, extinguindo-se afinal o sorteio, considerando-se como ‘classe’ o conjunto de brasileiros nascidos no mesmo ano. Esse dispositivo vigorou por quase vinte anos e a Lei 4.375, de 11 de agosto de 1964 (atual Lei do Serviço Militar) e o seu regulamento (Decreto 57.654, de 20 de janeiro de 1966)

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buscaram sanar suas limitações, guardando, entretanto, as linhas mestras da legislação anterior.

A Emenda Constitucional número 1 de outubro de 1969, estabeleceu que todos os brasileiros estavam obrigados ao serviço militar ou a outros encargos necessários à segurança nacional, nos termos e sob penas da lei; isentava, entretanto, as mulheres e os eclesiásticos em tempos de paz, ficando os mesmos, sujeitos a outras responsabilidades previstas em lei.

A Constituição de 1988, no seu artigo 143, estabelece que o serviço militar é obrigatório nos termos da lei. Em seu parágrafo 1.º, ressalta que às Forças Armadas competem, na forma da lei, atribuir serviço alternativo aos que, em tempos de paz, após alistados, alegarem imperativo de consciência, entendendo-se como tal o decorrente da crença religiosa e da convicção filosófica ou política, para se eximirem de atividades de caráter essencialmente militar. E ainda em seu parágrafo 2.º, ressalta que as mulheres e os eclesiásticos ficam isentos do serviço militar obrigatório em tempos de paz, sujeitos, porém, a outros encargos que a lei lhes atribuir.

Passados tantos anos da promulgação da Constituição, não existe documento legal que estabeleça ou regule o mencionado serviço alternativo. Por conseguinte, todos os enquadrados no parágrafo 1.º do artigo 143 são automaticamente dispensados da incorporação em qualquer uma das três Forças.

2.2 COMPARAÇãO ENTRE O SERVIÇO MILITAR OBRIGATóRIO E O SERVIÇO MILITAR VOLUNTÁRIO

“A principal arma de um Exército é o homem, de nada adiantam armas, por mais aperfeiçoadas que sejam, se não houver homens capazes de manejá-las.”

(Dwight Eisenhower)

Os dias atuais vêm comprovando o que já havia sido dito por Seeckt em 1928: é preferível menores contingentes de profissionais militares, do que grandes contingentes militares, pouco ou mal preparados.

As discussões sobre qual das formas de serviço militar seria a mais adequada surtiram efeitos variados no mundo, e no Brasil não poderia deixar de ser diferente. Existem segmentos da sociedade que acreditam ser a obrigatória a mais interessante e outros que preferem a voluntária. Alguns países utilizam o serviço militar obrigatório como a Alemanha, Bolívia, Colômbia, o Chile, Egito, Equador, Israel, México e a Suíça. No Egito, o estudante de faculdade, após apresentar-se na junta do serviço militar, recebe um certificado provisório que o obriga a apresentar-se novamente ao final do curso que esteja realizando, quando então poderá ser convocado ou, mais uma vez, dispensado do serviço militar.

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Serviço Civil Obrigatório: Idéias, Reflexões e Aplicações para a Mobilização

O serviço militar é voluntário em alguns países como na África do Sul, Argentina, Espanha, nos Estados Unidos, na França, Guiana, Indonésia, Inglaterra, Itália, Japão, Peru, Suriname, Uruguai e Portugal.

Já a China e a Guatemala adotam o serviço militar misto, alternando entre convocações obrigatórias e voluntárias.

Cada país, em função de sua realidade política, de seus problemas particulares e de suas possibilidades, adota o tipo de recrutamento que melhor atenda às suas necessidades, a duração do serviço militar mais conveniente e efetua um gasto anual com suas Forças Armadas, conforme sua economia suporta ou conforme a situação vigente exige. É modelo peculiar a cada nação, em função de suas necessidades de defesa, das condicionantes econômicas e psicossociais e da sua estatura geopolítica, o que faz surgir especificidades inerentes ao contexto particular de cada país estudado. A Argentina e o Uruguai adotaram o sistema de serviço militar voluntário, em modelo que não foi seguido pelos demais países latino-americanos e vêm encontrando dificuldades de recompletamento dos seus respectivos contingentes.

Algumas vantagens do Serviço Militar Obrigatório podem ser citadas, como:- O universo da seleção inicial para o serviço militar é maior;- Maior facilidade de recompletamento dos contingentes das Forças

Armadas;- Propicia maior integração das Forças Armadas com a população civil;- Universaliza o sentimento de nacionalidade;- Proporciona maior representatividade das classes sociais brasileiras na

prestação serviço militar inicial;- Proporciona maior representatividade de jovens em função de seus credos,

raças e níveis de educação;- Contribui para a higidez da juventude no seu todo;- Desperta no cidadão o orgulho de ter servido à Pátria;- Aumenta o contingente mobilizável; e- Divulga a um maior número de indivíduos os conhecimentos sobre as

Forças Armadas.Algumas vantagens do Serviço Militar Voluntário podem ser citadas, como:- Liberdade em servir, despertando entre os jovens, uma verdadeira

consciência profissional;- Desperta no cidadão o orgulho de ter servido à Pátria;- Satisfação pessoal aliada à satisfação profissional;- Não interrompe a vida estudantil contra a vontade do jovem;- Maior absorção da mão-de-obra jovem que esteja ociosa;- Maior motivação dos quadros das Forças Armadas;- Soldados mais ajustados psicologicamente;- Militares com mais ideal, dedicação e amor às Forças Armadas;

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- Melhor aproveitamento da instrução, decorrente da vontade de servir do jovem incorporado;

- Formação de profissionais com melhor qualidade;- Menores contingentes, entretanto, mais eficientes e eficazes;- Não retira, salvo por vontade própria, o jovem de uma função para a qual

já está preparado;- Serviço militar melhor aceito pela sociedade; e- Mais democrático.

Conclusões parciais:O tempo de duração do serviço militar inicial é pequeno e abarca uma

pequena parcela de jovens, refletindo esse fato negativamente na formação da reserva mobilizável e, conseqüentemente, no grau de confiabilidade das Forças Armadas ante a iminência de um conflito que envolva nosso País;

Com o advento das modernas tecnologias, é necessário que os novos soldados tenham maior instrução, adestramento e aprestamento, havendo necessidade de permanecerem mais tempo na caserna para seu melhor aproveitamento;

O serviço militar precisa deixar de ser visto como uma oportunidade de emprego para os jovens desempregados, e sim, como uma parcela de doação que cada cidadão brasileiro faz à Nação. O interessante seria que esse serviço militar abrangesse os jovens de ambos os sexos e não somente os jovens do sexo masculino. O momento de prestação deste serviço seria durante o Serviço Militar Inicial ou após a conclusão de cursos de nível superior nas entidades de ensino público brasileiras.

Deve-se manter o Serviço Militar Obrigatório até que, pela educação, adquiram os brasileiros um grau de consciência cívica que os faça voluntariamente, cumprir o serviço militar como um dever indeclinável para com a Pátria.

3 SERVIÇO CIVIL OBRIGATÓRIO

“Enquanto as guerras não forem abolidas das relações internacionais, o despreparo para enfrentá-las será tão criminoso quanto elas próprias.” (Um lorde inglês)

A criação de um Serviço Civil Obrigatório no Brasil serviria para trazer aos jovens que não participaram do serviço militar o conhecimento necessário sobre as Forças Armadas e sobre a Mobilização Nacional, além de permitir que os mesmos cumpram a determinação constitucional de servir à Pátria.

Todos os brasileiros são obrigados ao serviço militar ou a outros encargos necessários à Segurança Nacional, com isso o Serviço Civil Obrigatório poderia aproveitar grande parte do excedente de jovens não aproveitados pelo serviço militar em outros setores que concorressem para o desenvolvimento nacional ou

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para a segurança nacional. Seria, de certa forma, a extensão do tratamento que já é dado aos concludentes

das universidades e faculdades de medicina que não prestaram o serviço militar inicial e são convocados para o serviço militar e incluiria, dentro da mesma idéia, outras classes de estudantes e profissionais que muito poderiam ser úteis às Forças Armadas e ao Brasil, além de poder abranger os jovens de ambos os sexos.

Poderia, também, ser aproveitada a capacidade ociosa de alguns estabelecimentos de ensino militares como a Escola de Logística, a Escola de Instrução Especializada e o Centro de Aviação do Exército para a formação de reservas de quadros técnicos, como especialistas em mecânica de viaturas, mecânica de aviação, aviônica etc., e usar os estabelecimentos de ensino civis para a formação de pessoal, em todos os níveis, necessários às Forças Armadas e às suas reservas.

A criação do Serviço Civil Obrigatório permitiria o aproveitamento de elementos dispensados do serviço militar e a utilização desses elementos, por exemplo, na defesa civil ou nos ministérios civis, onde receberiam determinados encargos, como mão de obra especializada, no interior do País; outro aproveitamento poderia ser nas próprias Forças Armadas, como engenheiros, economistas, administradores, psicólogos, dentistas, farmacêuticos, veterinários etc., os quais desempenhariam suas funções como Aspirantes a Oficial ou 2º Tenente R2, no caso de concludentes de cursos superiores, e de 3º Sargento no caso de concludentes de cursos técnicos.

Outro aproveitamento possível seria em ações do tipo Projeto Rondon, no qual o estudante universitário seria integrado ao processo de desenvolvimento nacional e teria uma visão melhor dos problemas brasileiros, nas suas peculiaridades regionais, auxiliando em áreas como a dos transportes, assistência social, energia, esportes, engenharia, saúde, telecomunicações, administração, agronomia e informática. Cabe ressaltar que a experiência já feita no período de funcionamento do Projeto Rondon trouxe, como consequência, um oferecimento crescente de profissionais para trabalhos no interior. As mulheres e os religiosos poderiam ser convocados para prestar o serviço civil em escolas, entidades sociais, enfermarias de hospitais, prefeituras, serviços comunitários ou na própria burocracia militar.

A idade para prestação do serviço militar seria regulada em função da formação e da habilitação do indivíduo, tendo em vista, sempre, o atendimento dos interesses nacionais, sendo de 18/19 anos para aqueles que prestarem o Serviço Militar Inicial e acima dos 20 anos para aqueles que concluírem seus cursos de nível superior nos estabelecimentos de ensino da rede pública.

O Serviço Civil Obrigatório traria, como algumas vantagens, a participação de jovens de ambos os sexos; a continuidade do preceito da universalidade; o reforço nas condições de segurança nacional; a contribuição decisiva para o desenvolvimento nacional, assim como para o desenvolvimento do conceito de cidadania em todos os jovens; e a participação de grande número de jovens na vida nacional. Este serviço, aliado ao serviço militar, permitiria que o cidadão ou a cidadã

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servissem à Pátria, em qualquer setor de atividade, criando uma integração e uma capacidade de mobilização tal, que contribuiria na compreensão e na solução dos mais variados problemas nacionais.

Teria a duração de um ano e todos os brasileiros dedicariam esse ano de suas vidas ao serviço da Pátria, em todos os campos do Poder Nacional e em todo o território nacional.

Alguns movimentos na sociedade brasileira vêm dando força a criação de um serviço civil, como exemplo, cita-se a audiência pública promovida pela Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF) da Câmara dos Deputados, onde o então 1.º vice-presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), Carlos Vital, destacou que médicos e outros profissionais de saúde, formados em instituições públicas de ensino – ou cujos estudos em instituições particulares tenham sido financiados pelo poder público – devem prestar serviços remunerados obrigatórios em comunidades carentes desses profissionais pelo período de doze meses.

O então Secretário de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde, Milton de Arruda Martins, participante dessa audiência, afirmou que o projeto de lei conta com a simpatia do Ministério da Saúde, mas ponderou que os problemas de carência não serão resolvidos apenas com profissionais recém-formados. Em sua exposição, Martins citou o Programa de Valorização do Profissional de Atenção Básica do Ministério da Saúde, que incentiva médicos, dentistas e enfermeiros a atuarem em regiões carentes – os médicos que aderem ao projeto recebem bônus para ingresso em programas de residência médica.

André Luiz Costa, à época, Diretor de Relações Institucionais da União Nacional dos Estudantes (UNE), afirmou que embora a UNE considere que o ensino superior brasileiro vive um bom momento, as universidades brasileiras ainda estão distantes dos problemas do País, por isso, o Serviço Civil Obrigatório deveria fazer parte da formação dos profissionais recém-formados em qualquer área.

Outro movimento partiu do senador Humberto Costa (PE), que prevê a instituição do Serviço Civil Obrigatório como forma de minimizar a carência de algumas regiões do País por profissionais da área de saúde e outras áreas. Se o Senado aprovar a PEC 36/2011, os profissionais de saúde formados em universidades públicas, ou que tenham sido beneficiados com bolsas de estudos e outros incentivos financeiros pagos com recursos públicos, poderão dar sua contrapartida à sociedade. A proposta abrange todas as profissões da área de saúde regulamentadas por lei, entre elas: médico, enfermeiro, nutricionista, psicólogo, dentista, fonoaudiólogo, fisioterapeuta, farmacêutico e biomédico, além de outras consideradas úteis e fundamentais para o desenvolvimento dessas regiões. De acordo com o texto do senador pernambucano, os profissionais recém-formados deverão trabalhar, temporariamente, em unidades públicas de saúde nos municípios ou regiões que precisam de mão de obra. O serviço será remunerado, com prazo fixo definido por lei. Segundo o senador Humberto, a intenção da PEC é enfrentar

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Serviço Civil Obrigatório: Idéias, Reflexões e Aplicações para a Mobilização

os problemas relacionados à má distribuição de recursos humanos em saúde. “Os municípios mais longínquos e as periferias das grandes metrópoles são as áreas que apresentam os maiores déficits de profissionais de saúde”, informa o senador.

Ao dedicarem um ano de suas vidas para servir à comunidade, os jovens oriundos das classes média e alta aprenderiam mais sobre o Brasil, aprenderiam mais sobre as Forças Armadas e sobre as necessidades de desenvolver e mobilizar nosso país.

O Serviço Civil Obrigatório seria uma oportunidade de integração, educação e disciplina. Jovens deveriam consagrar um tempo para o bem público, por lei, para criar bases e valores, avaliar outros modos brasileiros de vida. Por que não um estudante de Direito, dedicar quatro horas diárias de trabalho a um balcão de atendimento de pequenas causas em uma favela ou região carente? O estudante de Ciências Contábeis orientar famílias em pequenos empreendimentos? O estudante de Letras incentivar adolescentes a ler? São tantos universitários financiados pelo povo brasileiro, anualmente, e o que eles vêm dando de retorno ao País? Porque não retribuir o apoio dado pela sociedade durante um ano?

O presidente Lula chegou a propor, em setembro de 2008, o Serviço Social Obrigatório para homens dispensados do serviço militar e para todas as mulheres brasileiras. Eles prestariam à sociedade serviços relacionados à sua formação técnica, profissional ou acadêmica, porém esse projeto foi engavetado.

A sensação reinante é de que se desperdiça o potencial de um exército de jovens inteligentes e criativos que poderiam ajudar a construir uma sociedade mais justa e menos desigual.

4 O SERVIÇO CIVIL OBRIGATÓRIO E A MOBILIZAÇÃO

Segundo a Estratégia Nacional de Defesa, e complementarmente ao Serviço Militar Obrigatório a criação de um Serviço Civil de amplas proporções (que envolvesse todos os jovens, homens ou mulheres) seria fundamental para o desenvolvimento e mobilização nacionais. Nele poderão ser progressivamente aproveitados os jovens brasileiros que não forem incorporados no Serviço Militar. Nesse Serviço Civil – concebido como generalização das aspirações do Projeto Rondon - receberão os incorporados, de acordo com suas qualificações e preferências, formação para poder participar de um trabalho social. Esse trabalho se destinará a atender às carências do povo brasileiro e a reafirmar a unidade da Nação. Receberão, também, os participantes do Serviço Civil, treinamento militar básico que lhes permita compor força de reserva, mobilizável em circunstâncias de necessidade. Serão catalogados, de acordo com suas habilitações, para eventual mobilização.

à medida que os recursos permitirem, os jovens do Serviço Civil serão estimulados a servir em região do País diferente daquelas de onde são originários, levando às regiões mais distantes e mais carentes uma grande parcela de ajuda

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que permitirá às mesmas um melhor desenvolvimento e aos jovens um maior conhecimento da realidade nacional brasileira.

Até que se criem as condições para instituir, plenamente, o Serviço Civil, as Forças Armadas tratarão, por meio de trabalho conjunto com prefeitos municipais, de restabelecer a tradição dos Tiros de Guerra. Em princípio, todas as prefeituras do País deverão estar aptas para participar dessa renovação dos Tiros de Guerra, derrubadas as restrições legais que ainda restringem o rol dos municípios qualificados.

Os Serviços Militar e Civil evoluirão em conjunto com as providências para assegurar a mobilização nacional em caso de necessidade, de acordo com a Lei de Mobilização Nacional. O Brasil entenderá, em todo o momento, que sua defesa depende do potencial de mobilizar recursos humanos e materiais em grande escala, muito além do efetivo das suas Forças Armadas em tempo de paz. Jamais tratará a evolução tecnológica como alternativa à mobilização nacional; aquela será entendida como instrumento desta. Ao assegurar a flexibilidade de suas Forças Armadas, assegurará também a elasticidade delas.

O interessante seria que a Nação abraçasse a causa da defesa e nela identificasse requisito para o engrandecimento do povo brasileiro.

5 CONCLUSÃO“No futuro, convirá que os que forem desobrigados da prestação do serviço militar sejam incentivados a prestar um serviço civil, de preferência em região do País diferente das quais se originam.”(Plano Estratégico de Defesa Nacional)

As nações devem estar preparadas para a eventualidade de ter que entrar em conflito com outros povos, sejam vizinhos, ou não. Essas possibilidades, principalmente nos dias atuais, são mais do que previsíveis, como vemos amplamente divulgadas, em todos os meios de comunicação, decorrentes de desentendimentos antigos, como, por exemplo, as divergências entre israelenses e árabes, ou entre a Índia e o Paquistão, e, mais recentemente, entre os Estados Unidos e o Iraque.

A frase dos romanos: “Si vis pacem para bellum”, vem a ser uma recomendação com significado: “Se queres a paz, prepara-te para a guerra”, vale como um alerta de preparação para o caso de a nação vir a sofrer um ataque, e também como aviso, aos possíveis inimigos, de que esse ataque não será surpresa e será devidamente rechaçado.

A grande extensão territorial brasileira bem diz da necessidade de prover o governo de todos os meios necessários à manutenção da incolumidade do país, que, diga-se de passagem, faz fronteira com outros dez países. A guerra do Paraguai, o maior conflito bélico ocorrido na América do Sul, que durou, praticamente seis anos, foi uma demonstração da necessidade de estar preparada a nação brasileira para ocorrências semelhantes.

Um dos setores mais importantes dessa preparação é a instrução a ser dada aos brasileiros, no sentido de conhecer, para melhor utilizar, os armamentos bélicos,

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Serviço Civil Obrigatório: Idéias, Reflexões e Aplicações para a Mobilização

veículos, carros de combate, peças de artilharia e munições. Exatamente com essa finalidade, passou a ser exigido dos jovens brasileiros (do sexo masculino), que fossem trazidos a essa instrução, por meio da prestação de serviço militar, obrigatório, exigência essa que contou com a campanha liderada pelo poeta, Olavo Bilac.

Mas, ao contrário do que se poderia esperar, resultou certo de que a nação não teve condição de desenvolver, à altura das necessidades, o número de unidades de treinamento (quartéis e escolas militares), o que tornou impossível levar à instrução militar todos os jovens, a princípio chamados entre os 18 ou 19 anos de idade, sendo grande número deles dispensado, sem a prestação do serviço militar, por excesso de contingente.

Embora não se podendo negar a validade do serviço militar, é lícito que se diga que o modelo poderia e deveria ser utilizado, em nosso país, mesmo na área civil, e não apenas para os jovens, mas, igualmente para as jovens, que seriam chamados para a prestação de serviços públicos, notadamente naqueles destinados ao atendimento social em áreas distantes e mais carentes do País, o que valeria como um inestimável aprendizado, além de poder ser caracterizado como efetivo exercício de cidadania, uma vez que é direito do cidadão, entre outros, o de aprender a atender a seu próximo.

As transformações sociais que vêm ocorrendo, neste inicio de século, provocam mudanças profundas no mercado de trabalho. Um país, como o Brasil, enfrenta o duplo desafio: o de fazer frente aos avanços tecnológicos e às novas expectativas das empresas, que agora enfrentam mercados globalizados; e o de integrar à economia produtiva um número crescente de jovens com pouca ou nenhuma qualificação profissional.

Isso significa reconhecer que, para enfrentar esse duplo desafio, é necessário ampliar e racionalizar programas de educação profissional e formação cívica, uma vez que os profissionais que irão enfrentar o mundo moderno devem estar preparados para o trabalho e para o exercício da cidadania.

Especificamente, no Brasil, cerca de 1.500.000 jovens atingem, anualmente, a faixa etária destinada a prestação do serviço militar. Destes, aproximadamente 100.000 irão prestar o Serviço Militar Inicial. O restante dos jovens, ou seja, a maioria deles, será inserida no mercado de trabalho com uma formação educacional média, lastreada apenas no ensino fundamental ou no ensino médio incompleto, sem qualquer aperfeiçoamento técnico-profissional, e deficiente formação sobre cidadania.

Nesse sentido, existe hoje um grande número de esforços isolados, tanto no âmbito da iniciativa privada quanto na governamental, com o objetivo de proporcionar ao jovem brasileiro uma melhor formação profissional para inseri-lo no mercado de trabalho.

Essas iniciativas, muitas vezes exitosas, podem atingir um maior número de jovens, através da comunhão de esforços que, certamente, ́ permitirá a racionalização do uso dos recursos e a participação integrada de diversos segmentos da sociedade,

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comprometidos com o desenvolvimento sociocultural do jovem brasileiro e de sua profissionalização.

Com isso, a criação do Serviço Civil Obrigatório traria a oportunidade de levar a todos os jovens brasileiros a exata noção da palavra ‘Pátria’, inserindo-os no processo de desenvolvimento e mobilização nacional. A formação militar, mesmo que pequena ou limitada, serviria para mostrar a todos esses jovens o papel fundamental das Forças Armadas na segurança do País, principalmente ante um conflito armado ou a uma agressão externa, além de conscientizá-los sobre o importante papel de cada um nessas citadas situações.

Este trabalho teve como objetivo mostrar a necessidade de criação de um Serviço Civil Obrigatório que vise à inclusão de todos os jovens brasileiros no processo de desenvolvimento e mobilização nacional, tornando-os partes integrantes do efetivo mobilizável das Forças Armadas.

6 REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei nº 4.375, de 17 de agosto de 1964. Lei do serviço militar. Disponível em: planalto.gov.br/ccivil_03/leis/e4375.htm.

______. Decreto nº 6.703, de 18 de dezembro de 2008. Aprova a Estratégia nacional de defesa, e dá outras providências. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_.../2008/Decreto/D6703htm.

________. Decreto nº 57.654, de 20 de janeiro de 1966. Regulamento da lei do serviço militar, alterado pelo Decreto n.º 1.294, de 26 outubro de 1994. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto/D57654.

COSTA, Vanderlei Dias. Serviço militar: obrigatório e voluntário: uma análise comparativa. Rio de Janeiro: ESG, 2005.

KUHLMANN, Paulo Roberto Loyolla. O serviço mlitar, democracia e defesa nacional: razões da permanência do modelo de recrutamento no Brasil. São Paulo: USP, 2001.

MORAES, Roberto. Censo do ensino superior.

Disponível em: <http://www.hoper.com.br/noticia-hoper.php?id=155>Acesso em: 11 out. 2011.

MOREIRA, Luiz Fernando. Vantagens e desvantagens do serviço militar obrigatório e do serviço militar voluntário nas expressões do poder nacional. Rio de Janeiro: ESG, 1984.

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A Tecnologia da Informação na Mobilização de Recursos Humanos

A TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO NA MOBILIZAÇÃO DE RECURSOS HUMANOS

Anderson dos Santos BartzMajor de Cavalaria do Exército Brasileiro, estagiário do Curso de Logística e Mobilização Nacional da Escola Superior de Guerra, em 2011.

Resumo

Este trabalho foi desenvolvido, a fim de mostrar como a Tecnologia da Informação, nos dias atuais, vem atuando em benefício do Serviço Militar e da Mobilização de seus Recursos Humanos. Busca apresentar o projeto do Sistema Eletrônico de Recrutamento Militar e Mobilização, suas características e possibilidades, apoiadas em plataforma web, bem como a forma com que o sistema auxilia em todo o processo de Serviço Militar, começando pelo alistamento dos jovens cidadãos, passando pela seleção, e terminando com a sua distribuição às Forças Armadas. É realizada uma breve abordagem sobre a importância do Serviço Militar Obrigatório e a forma como as Organizações Militares utilizam o sistema para controlar seus efetivos da ativa e também para monitorarem os militares que compõem a reserva mobilizável do país, otimizando, sobremaneira o processo de convocação de reservistas, sendo este o foco principal deste trabalho.

Palavras-chave: Mobilização de Recursos Humanos; Serviço Militar Obrigatório; Tecnologia da Informação.

1 INTRODUÇÃO

O desenvolvimento dos países emergentes, nos próximos dez anos, vai-se dar num ambiente de estresse crescente pela disputa de recursos naturais na terra e no mar. Países como o Brasil, que dispõem de recursos naturais, precisam ter essa preocupação em mente e insistir na manutenção de Forças Armadas bem-treinadas e com adequado poder dissuasivo, para estar em condições de defender seu território, sua soberania e seu povo..

O Brasil possui um efetivo de militares da ativa com cerca de 250.000 homens, porém devido ao seu tamanho continental e os seus mais de 23.000 km de fronteiras com mais de 10 países, sendo 15.791 km terrestres e 7.367 km marítimas, podem ser levantadas diversas Hipóteses de Emprego (HE), todas constatando a necessidade do aumento do efetivo das Forças Armadas. Caso isso venha a ocorrer, será preciso uma convocação de sua reserva mobilizável, ou seja, uma rápida mobilização de Recursos Humanos (RH).

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O Brasil possui reserva mobilizável, graças ao advento do serviço militar obrigatório, o qual não raramente é questionado pela sociedade quanto a sua real necessidade, questão que também será abordada neste artigo.

O efetivo que compõe a reserva mobilizável do país vinha sendo controlado através de fichários e arquivos físicos localizados nas 27 Circunscrições de Serviço Militar (CSM) distribuídas pelas regiões do Brasil. Com o advento de novas tecnologias de informação, surgiu a necessidade de um sistema que gerencie todos os militares, da ativa e da reserva, de forma a mobilizar, de maneira rápida e eficaz, os recursos humanos necessários para fazer frente a uma hipótese de emprego.

Atualmente, a Diretoria de Serviço Militar (DSM), sediada em Brasília-DF, através do Sistema de Recrutamento Militar e Mobilização (SERMILMOBWEB), coordena todas as fases do alistamento militar até a incorporação do recruta, das três Forças Armadas - Exército, Marinha e Aeronáutica - bem como controla os efetivos da reserva mobilizável da Força Terrestre, gerenciando um banco de dados com mais de 33 milhões de nomes.

Este artigo pretende abordar o serviço militar obrigatório, base para a formação da reserva mobilizável do país, bem como o sistema utilizado pelas Forças Armadas (FA) para gerenciamento de Recursos Humanos, o SERMILMOBWEB, a fim de gerar subsídios que possibilitem um aperfeiçoamento do mesmo e, consequentemente, um aumento de sua confiabilidade.

2 SERVIÇO MILITAR OBRIGATÓRIO: A ALTERNATIVA ADEQUADA

Na história das civilizações, desde que a guerra passou a ser instrumento de imposição da vontade coletiva ou da defesa dos interesses comuns, os clãs, as tribos, as cidades, os reinos e, por fim, as nações vêm buscando maneiras de impelir – ou compulsar – homens às armas.

O cenário mundial, nessa transição de séculos, caracterizado atualmente pela unipolaridade derivada da hegemonia de potências dominantes; pela associação de nações em blocos político-econômicos; pelo surgimento dos conflitos de 4.ª geração e pela alta tecnologia agregada ao aparato bélico, levou a que fosse discutida a necessidade da manutenção de Forças Armadas e também, até como corolário, a natureza do serviço militar.

Em 1908, a Lei n.º 1860 instituiu o serviço militar obrigatório, extinguiu a figura do soldado profissional e estabeleceu que a convocação se faria por sorteio. Entretanto, esta lei não foi posta em prática por descaso das autoridades e falta de apoio da opinião pública. Tal situação induziu Olavo Bilac, nos anos de 1915 e 1916, a liderar uma campanha cívica por todo o país, pela necessidade e importância da prestação injuntiva do serviço militar como dever de todos os cidadãos brasileiros.

Paulatinamente, a pregação empreendida pelo “Príncipe dos Poetas” foi encontrando eco na sociedade brasileira, resultando em leis e decretos que,

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A Tecnologia da Informação na Mobilização de Recursos Humanos

editados em 1918, 1920, 1934, 1939 e 1946, deram ao Serviço Militar conformação semelhante à atual. Em reconhecimento, Olavo Bilac recebeu o título de Patrono do Serviço Militar Brasileiro e no dia 16 de dezembro, sua data natalícia, é comemorado o Dia do Reservista.

Atualmente, as atividades do Serviço Militar estão amparadas em vasta legislação, que tem por base o ditame constitucional do Art. 143 da Constituição Federal de 1988 e a Lei do Serviço Militar de 1964, complementados por decretos, portarias e normas que regulamentam e detalham seus múltiplos aspectos.

O processo de recrutamento em vigor fundamenta-se na obrigatoriedade e universalidade do Serviço Militar, sendo precedido pelo alistamento e compreende quatro fases distintas e sucessivas: a convocação, a seleção, a designação e a incorporação ou matrícula. A convocação é feita por classes – que compreendem todos os brasileiros nascidos entre 1º de janeiro e 31 de dezembro de determinado ano – no ano em que a classe completa 18 anos. A partir de 2003, o alistamento, convocação, seleção e designação passaram a ser comuns às três Forças e centralizados no Exército Brasileiro (EB).

Nos dias atuais, o número anual de alistados gira em torno de 1.700.000 indivíduos do sexo masculino, onde são selecionados cerca de 40% dos alistados. Isto decorre da exclusão dos alistados em municípios não tributários, até chegar-se a um efetivo que permita uma seleção acurada, sem sobrecarregar em demasia as Comissões de Seleção (CS).

A fase final, a incorporação, dá-se nas Organizações Militares (OM) de destino, onde se apresenta um efetivo de conscritos necessário, acrescido de uma majoração, sendo submetido a uma Seleção Complementar que consta de revisão médico-odontológica e entrevista, na qual são obtidos dados pessoais, identificados problemas sociais e constatados impedimentos surgidos após a Seleção Geral. Terminada a Seleção Complementar, segundo dados da DSM, incorporam anualmente, nas diversas OM das Forças Armadas aproximadamente 70 mil jovens, encerrando- se as atividades do recrutamento.

Do apresentado, depreende-se que o Serviço Militar é obrigatório e ao mesmo tempo democrático, uma vez que a ele acorrem representantes de todos os estratos econômicos, políticos, sociais e raciais da população; está fundamentado em sólida e concatenada legislação e direcionado pelos interesses políticos da nação, de acordo com o prescrito na Estratégia Nacional de Defesa (END), aprovada em dezembro de 2008.

O processo do serviço militar obrigatório é operacionalizado por uma estrutura, com amplitude nacional e apoiada por meios informatizados, que se tem mostrado, ano após ano, capaz de processar os dados de expressivo contingente de brasileiros e selecionar o efetivo para atender às necessidades das Forças; homens que, depois de instruídos e adestrados, virão a constituir importante reserva mobilizável para o país.

Da análise das características e peculiaridades do Sistema de Serviço Militar Brasileiro, podem-se inferir as seguintes vantagens:

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a) É altamente democrático, pois é dever e direito de todo cidadão brasileiro, sem qualquer distinção;

b) Referenda o caráter nacional do Exército, incorporando brasileiros originários de todo o País e pertencentes a quase todas as camadas e segmentos da população, e trazendo para a Força Terrestre a imagem do “povo em armas”;

c) O afluxo anual de um contingente de 70 mil jovens exige permanente preparação e atualização dos quadros das Forças Armadas, encarregadas de sua formação e qualificação, tanto militar, quanto profissional, permitindo prover a Nação brasileira com igual efetivo de cidadãos de sólidas convicções éticas e conscientes de seu papel na sociedade;

d) A renovação dos contingentes contribui, decisivamente, para aumentar a identificação da Força Terrestre com a Nação e previne a segregação do estamento militar;

e) A amplitude do universo que acorre ao Sistema propicia uma seleção acurada e, em decorrência, excelência nos recursos humanos, tanto no efetivo variável, quanto na reserva mobilizável;

f) A racionalidade na seleção dos municípios tributários, privilegiando os localizados no entorno das OM e preservando os mais afastados e situados em área de vocação agropecuária, contribui para evitar o êxodo rural;

g) O Serviço Militar representa, para muitos jovens, oriundos das camadas mais pobres da população, uma oportunidade para se capacitarem, profissionalmente ou melhorarem seu nível educacional, dando-lhes melhores condições de inserção no mercado de trabalho;

h) O tempo de caserna complementa a formação do jovem, consolidando e incrementando valores morais, respeito às leis e noções de civismo e cidadania;

i) Os recrutas e seus familiares atuam como agentes de Comunicação Social, difundindo a verdadeira imagem do Exército e contribuindo para a elevada credibilidade que desfruta a Instituição;

j) Contribui para o aumento da compreensão da sociedade brasileira quanto às suas responsabilidades na Defesa Nacional; e

k) É a alternativa de menor custo econômico, uma vez que o recruta percebe menores vencimentos, não é movimentado, não pode possuir dependente e não gera encargos previdenciários.

Na União Européia, a adoção do serviço militar voluntário como condição sine qua non para todos os países membros, gerou verdadeiras crises para alguns deles. Vale aqui recordar as grandes dificuldades que vêm sendo vividas pelas Forças Armadas espanholas, no que tange ao recrutamento de voluntários, chegando ao ponto de se verem compelidas a aceitar em suas fileiras jovens oriundos das ex-colônias, descaracterizando a nacionalidade de seu estamento militar.

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É interessante conhecer a opinião do Gen Stewart Jr. do exército norte-americano, em cujo artigo defende o retorno do seu país ao Serviço Militar Obrigatório:

[...] os fatos comprovam que a sustentabilidade da força somente de voluntários não é real[..]. E se eles encontrarem essa vontade de mudar, os oficiais subalternos, mais uma vez, comandarão o ‘Exército da Constituição’ de Washington e nossa República evitará sua condenação da história.

Observando além-fronteiras, verifica-se que dos 140 países com Forças Armadas organizadas, 83 adotam o sistema de conscrição obrigatória. Como é comprovado pela figura 01.

Figura 01- Serviço Militar no Mundo.13

Em síntese, pode-se afirmar que o sistema vigente atende, com vantagens, ao seu principal objetivo: a obtenção de recursos humanos de qualidade, de acordo com a estatura político-estratégica do Brasil, além de assegurar difusão e fixação da imagem das Forças Armadas, revelando-se, perfeitamente adequado às suas finalidades.

13 Fonte: Disponível em: www.defesa.net. Acesso em: 24 out. 2011.

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Deixando esses argumentos à reflexão, conclui-se ressaltando que a manutenção do serviço militar obrigatório foi definida como pilar na identificação das Forças Armadas com a Nação e condição básica para se compor uma reserva mobilizável forte, uma das cinco metas da Estratégia Nacional de Defesa em vigor.

2.2 - MOBILIZAÇãO DE RECURSOS HUMANOS

O planejamento da mobilização militar, visando à rápida capacitação das Forças Armadas, deverá prever, por HE, os recursos e meios necessários ao atendimento das carências nos níveis requeridos, conforme a função logística recursos humanos constante da Doutrina de Logística Militar.

Nesse planejamento, deverá ser observada a tendência, na atualidade, de os conflitos armados ocorrerem de modo rápido e violento, exigindo uma pronta resposta do Poder Nacional, o que impõe uma fase meticulosa de preparo para atender com rapidez à transição para a execução da mobilização.

O Sistema de Mobilização de Recursos Humanos (S Mob RH) segue os princípios básicos previstos nas Instruções Gerais para o Sistema de Mobilização do Exército (IG 20-07 – SIMOBE), no que concerne à objetividade, continuidade, controle, coordenação, economia de meios, flexibilidade, interdependência, objetividade, oportunidade, prioridade, unidade de comando, segurança, simplicidade, confiabilidade, interoperabilidade, e deve ser factível.

O Sistema Nacional de Mobilização - SINAMOB - consiste no conjunto de órgãos gerenciados pelo Ministério da Defesa (MD), que atuam de modo ordenado e integrado, e que tem por objetivo realizar, integrar e coordenar as ações de planejamento, preparo e execução das atividades de Mobilização Nacional e Desmobilização Nacional.

As Forças Armadas integram o SINAMOB através do Sistema de Mobilização Militar (SISMOMIL), o qual no Exército é gerenciado pelo seu Estado Maior (EME). A Mobilização de Recursos Humanos fica a cargo do Departamento Geral do Pessoal (DGP); a de Recursos Logísticos, por conta do Comando Logístico (COLOG); e os exercícios de mobilização, a cargo do Comando de Operações Terrestres (COTER). Estes integrando o Sistema de Mobilização do Exército (SIMOBE).

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A Tecnologia da Informação na Mobilização de Recursos Humanos

A finalidade do SIMOBE é realizar, por meio da utilização de recursos de tecnologia da informação, a integração de processos, procedimentos, métodos, rotinas e técnicas destinadas à produção de conhecimentos com qualidade e oportunidade necessárias ao gerenciamento eficiente, eficaz e efetivo de todas as atividades relativas à mobilização militar terrestre, assim como às de desmobilização.

A Diretoria de Serviço Militar (DSM) é o órgão técnico-normativo para todas as atividades ligadas ao Serviço Militar e à Mobilização de Recursos Humanos do DGP.

A mobilização de Recursos Humanos é realizada em duas fases: preparo e execução.

a) Preparo: oportunidade em que são realizados: 1) O cadastramento dos recursos humanos nos bancos de dados do S Mob RH, com o detalhamento das respectivas origens de obtenção; 2) A administração dos recursos humanos – atividade, que tem como tarefa principal o controle de efetivos, a destinação, e o gerenciamento dos efetivos prontos, visando a prover as organizações militares dos recursos humanos necessários para as diversas demandas operacionais e logísticas; e 3) Para a determinação das carências, decorrente do exame pormenorizado dos planos operacionais e logísticos de cada HE e, em particular, das ações e operações previstas, definindo o quando, em que quantidade, com que habilitação, a que custo, e em que local, deverão estar disponíveis os recursos humanos mobilizáveis. A realização desta atividade, ressaltada pela complexidade a ela inerente e por constituir-se na base em que se assentarão as fases subsequentes, é subsidiada pela Lista de Carência de Recursos Humanos (LCRH), produzida pelo S Mob RH.b) Execução: oportunidade em que são realizadas: 1) A obtenção dos recursos humanos mobilizáveis necessários ao emprego da Força Terrestre na HE considerada, segundo o arcabouço legal vigente, os planos e as condicionantes de obtenção oferecidas tempestivamente pelos sistemas integrantes do SIMOBE; e 2) A distribuição oportuna e eficaz dos recursos humanos mobilizados necessários ao emprego da Força Terrestre na HE considerada, segundo o previsto nos respectivos planos operacionais e logísticos.

Segundo o prescrito na Estratégia Nacional de Defesa, o Brasil é pacífico por tradição e por convicção. Vive em paz com seus vizinhos, rege suas relações internacionais, dentre outros, pelos princípios constitucionais da não

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intervenção, na defesa da paz e na solução pacífica dos conflitos. Esse traço de pacifismo é parte da identidade nacional e um valor a ser preservado pelo povo brasileiro.

No entanto, na atual situação “pacifica internacional” em que o Brasil se encontra, deve-se dar mais ênfase à fase de preparo da mobilização de recursos humanos, quando, observando as três atividades que nela se estabelecem, cresce a necessidade de um sistema informatizado para gerenciar este enorme banco de dados que compõe a reserva mobilizável do país, daí a importância do Sistema de Recrutamento Militar e Mobilização (SERMILMOBWEB).

2.3 SISTEMA ELETRÔNICO DE RECRUTAMENTO MILITAR E DE MOBILIZAÇãO

A organização do Sistema do Serviço Militar apresenta grande capilaridade, dada por cerca de 5.300 Juntas do Serviço Militar (JSM), órgãos municipais existentes em quase todos os municípios brasileiros e pontas de lança do Sistema. O trabalho das Juntas é coordenado pelas 305 Delegacias de Serviço Militar (DelSvMil), supervisionadas pelas 27 Circunscrições de Serviço Militar (CSM) que, por sua vez, se subordinam a uma das 12 Regiões Militares, por intermédio das Seções de Serviço Militar Regionais (SSMR), constituindo a estrutura básica do Serviço Militar da Força Terrestre.

No ano de 2003, o Ministério da Defesa decidiu pela unificação do alistamento das três Forças Armadas, ficando a DSM responsável por gerenciar todo processo de recrutamento dos brasileiros para a prestação do Serviço Militar Inicial na Marinha, Exército e Aeronáutica.

O SERMIL, como era anteriormente chamado, teve sua implantação definitiva em todo território nacional a partir do ano de 1977. Em 20 de agosto de 2000, atendendo a Portaria nº 713 – Cmt Ex, o DGP aprovou as Instruções Gerais para o Sistema de Processamento Automático de Dados para o Serviço Militar Inicial.

No ano de 2006, foi implementado o Projeto de Integração SERMIL – SIMP (Sistema Informatizado de Mobilização de Pessoal), visando a possibilitar a concentração de dados de pessoal em uma base única, dentro de cada Comando Militar de Área, utilizando-se do Banco de Dados do SERMIL.

No entanto, o SERMILMOB funcionava apenas na rede interna do Exército – EB NET, atendendo somente aos órgãos de Serviço Militar que possuíssem acesso àquela rede, dessa forma, nem todos os órgãos vinculados ao serviço militar tinham acesso ao sistema, como mostra a figura 03.

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Figura 3: Fluxo de acesso ao banco de dados do SERMILMOB.14

Paralelo aos processos vinculados ao serviço militar, quais sejam, o alistamento, a seleção, a distribuição e a incorporação, segue a missão de acompanhar o militar licenciado que compõe a reserva mobilizável do país. Essa missão era realizada através de fichas de mobilização, que arquivadas, fisicamente, e em grandes quantidades em JSM, Del Sv Mil e CSM, compunham um banco de dados do local onde o militar declarava residir.

As fichas de Mobilização eram encaminhadas às CSM onde eram digitadas para inserção no banco de dados do SERMILMOB. Além de causar grandes dificuldades de armazenamento dessas fichas, algumas delas deixavam de ser digitadas, devido à grande quantidade e outras eram inseridas com dados errados, tornando assim um banco de dados que não expressava a realidade e, portanto pouco confiável.

14 Fonte: DSM- Plano do projeto SERMILMOB WEB

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A implantação do SERMILMOB em plataforma Web (internet), a partir do ano de 2010, permitiu que todos os usuários do Sistema, de acordo com seu nível de responsabilidade, acessassem seu banco de dados, ou seja, todas as 305 Delegacias de Serviço Militar e suas 5.300 Juntas de Serviço Militar, todas as Organizações Militares e suas seções mobilizadoras, além de cerca de 1.700.000 cidadãos que efetuam o alistamento anual, como demonstra a figura 04.

Figura 4: Fluxo de acesso ao banco de dados do SERMILMOBWEB15

Toda essa quantidade de informações encontra-se armazenada no Centro integrado de Telemática do exército (CITEx), em Brasília-DF, e possibilita um melhor gerenciamento do banco de dados do Sistema, contribuindo para a agilização dos processos conduzidos pelos órgãos de Serviço Militar, otimização da produtividade da Gestão do Pessoal e, principalmente, torna mais confiável os dados inseridos por serem mais atuais e inseridos por fonte mais próxima da origem.

15 Fonte: DSM- Plano do projeto SERMILMOB WEB

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Figura 5: Página do SERMILMOBWEB16

Para a mobilização de Recursos Humanos, esse Sistema trouxe um avanço incalculável, pois agora os dados de qualquer militar da ativa ou da reserva poderão ser acessados por todos os usuários do SERMILMOBWEB, de acordo com seu nível de responsabilidade, o qual é administrado pela DSM e disponibilizado através de Login e Senha.

No Portal do SERMILMOBEWB, ao selecionar “mobilização”, o usuário tem acesso à diversas funcionalidades tais como:

a) Cadastramento de reservista: onde são cadastrados todos os militares por ocasião de seu licenciamento; b) Consultas: onde se pode localizar um reservista através de seu nome, registro de alistamento (RA), identidade, CPF, ou nome da mãe. Sendo o banco de dados composto por mais de 33 milhões de nomes cadastrados;c) Informações de OM: torna disponível qual o tipo e natureza de Organização Militar, quanto à sua operacionalidade e efetivo;d) Quadro de Cargos (QC): de natureza reservada, é o efetivo previsto para determinada OM cumprir sua missão de combate, onde fica disponível o seu efetivo real existente e, consequentemente, a necessidade de complemento para fins de mobilização;e) Relatórios: onde são apresentados relações de efetivos das mais diversas naturezas, tais como todos os militares licenciados, organizados por região militar, facilitando, sobremaneira, as atividades de mobilização de recursos humanos;

16 Fonte: www.sermilweb.eb.mil.br

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f) Relatórios do EXAR: onde são disponibilizados dados quantitativos e qualitativos da reserva mobilizável na disponibilidade dos cidadãos, por ocasião do exercício de apresentação da reserva; eg) Validação do EXAR: onde o reservista comprova suas apresentações anteriores realizadas pelo exarnet.

Figura 6: Página do SERMILMOBWEB. Controle da Mobilização de Recursos Humanos.17

Finalmente, pode-se perceber que a transferência do SERMILMOB para a plataforma Web trouxe um avanço significativo para a mobilização de Recursos Humanos, pois o processo anterior era realizado através de fichas e banco de dados local, sendo lento, restrito e ineficaz e, atualmente, proporciona um controle real e eficaz de toda a reserva mobilizável do país.

2.4 - Inconsistências do SERMILMOBWEB

A partir da implantação do SERMILMOB em plataforma Web, no ano de 2010, a DSM realizou visitas de orientação técnica a todas as Regiões Militares do Exército

17 Fonte: www.sermilweb.eb.mil.br

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Brasileiro, com a finalidade de divulgar o novo projeto, quando o autor deste artigo esteve presente e pôde verificar quais as principais dificuldades e inconsistências de sua implantação.

Tendo em vista o sistema ainda ser visto como projeto a ser concluído em 2012, ele apresenta, ainda, algumas inconsistências a serem analisadas, quais sejam:

a) Adequação doutrinária do processo de mobilização de recursos humanos;b) Atualização do banco de dados de recursos humanos por parte das

organizações militares;c) Disponibilização da internet para os órgãos de serviço militar nas regiões

mais inóspitas do país;d) Treinamento e capacitação dos operadores do novo sistema;e) Integração do banco de dados das três Forças Armadas, bem como das

Forças Auxiliares;f) Vinculação do SERMILMOB com outros órgãos públicos federais para fins

de atualização das habilitações adquiridas pela reserva mobilizável.

4 CONCLUSÃO

Países como o Brasil, que dispõem de recursos naturais abundantes, fundamentais à manutenção da raça humana no planeta e, consequentemente, cobiçados por outros países do mundo, necessita de um enorme poder dissuasório nos mais diversos comitês internacionais. Uma forma de expressar esse poder é através de suas Forças Armadas, que são considerados os meios de emprego militar e de seus efetivos disponíveis.

Em se tratando de Recursos Humanos, o Brasil possui o maior efetivo entre os exércitos da América Latina, com cerca de 250.000 soldados, e uma reserva mobilizável de 280.000 homens, considerando apenas os que são convocados, anualmente, para apresentação durante os cinco anos subsequentes ao desligamento; e os que se encontram na Reserva que podem chegar a quase quatro milhões, se forem considerados os brasileiros reservistas com idade até 45 anos.

Porém, de nada adianta ter uma reserva mobilizável tão vasta, se não houver uma forma de gerenciá-la, de maneira a ser empregada de forma eficaz e em tempo oportuno. Para isso, o novo Sistema de Recrutamento Militar e Mobilização (SERMILMOBWEB) surge como ferramenta fundamental.

O projeto de implantação do SERMILMOB em plataforma Web trouxe um grande avanço no gerenciamento de recursos humanos do Exército Brasileiro e, futuramente, de todas as Forças Armadas, tornando possível a localização de militares da ativa e da reserva em qualquer local do país, permitindo mobilizar os efetivos adequados a determinada hipótese de emprego de forma rápida e eficaz.

O Sistema ainda carece de algumas atualizações, porém é uma demonstração que as novas tecnologias de informação são fundamentais para as necessidades do mundo moderno, e, sendo assim, o SERMILMOBWEB desenvolvido pela Diretoria de Serviço Militar, já demostra ser extremamente útil e eficaz para a mobilização de recursos humanos do país.

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5 REFERÊNCIAS

BRASI BRASIL. Lei n.º 4.375, de 17 agosto de 1964. Lei do serviço militar. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4375.htm.

______. Decreto n.º 57.654, 20 de janeiro de 1966. Regulamento da lei do serviço militar. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto/d57654.

______. Portaria n.º 011-EME, IG 20-07, de 22 de abril de 1980. Sistema de mobilização do exército.

______. Lei n.º 6.880, de 9 de dezembro de 1980. Dispõe sobre o Estatuto dos militares. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6880htm.

______. Portaria nº 018-DGP, de 24 de março de 1986. Instruções reguladoras do funcionamento dos órgãos de execução do serviço militar em tempo de paz. Disponível em: dsm.dgp.eb.mil.br/.../Portarias/Portarias%20018_DGP.

______. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. São Paulo: Saraiva, 1990.

______. Portaria n.º 082-DGP, de 4 de junho de 2004. Normas técnicas para as comemorações do dia do reservista e exercício de apresentação da reserva. Disponível em: dsm.dgp.eb.mil.br/.../Portarias/Portarias%20082-DGP.

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______. Portaria nº 133 – EME, de 14 de dezembro de 2007. Aprova as normas para o funcionamento do sistema informatizado de mobilização de pessoal (SIMP). Disponível em: dsm.dgp.eb.mil.br/.../Portarias/Portaria%20133_EME.

______. Lei nº 11.631, de 27 de dezembro de 2007. Dispõe sobre a mobilização nacional e sistema nacional de mobilização – SINAMOB. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010.

______. Decreto n.º 6.703, de 17 de dezembro de 2008. Aprova a Estratégia nacional de defesa, e dá outras providências. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_.../2008/Decreto/D6703.htm.

______. Portaria n.º 172-DGP, de 12 de agosto de 2010. Normas técnicas para o funcionamento do sistema eletrônico de recrutamento militar e mobilização, NT-15. Disponível em: dsm.dgp.eb.mil.br/índex.php?

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O Papel do Corpo de Bombeiros Militar na Mobilização Nacional

O PAPEL DO CORPO DE BOMBEIROS MILITAR NA MOBILIZAÇÃO NACIONAL

Carlos Alberto RasiaTenente-coronel Bombeiro Militar do Distrito Federal, estagiário do Curso de Logística e Mobilização Nacional da Escola Superior de Guerra, em 2011.

Resumo

O Corpo de Bombeiros Militar é uma instituição sesquicentenária e participa da história do desenvolvimento do Brasil de forma ativa em razão da importância dos seus serviços prestados à sociedade brasileira. No desempenho de sua missão constitucional de prevenção e combate a incêndios, prevenção e atendimento de catástrofes, busca e salvamento, atendimento pré-hospitalar, ações de defesa civil e perícia de incêndio, estas Forças Auxiliares têm demonstrado um estreito e intenso relacionamento com a população brasileira, que lhe tem conferido, ano após ano, índices de confiabilidade até então não superados por qualquer outra instituição nacional, chegando atualmente a 97% de aprovação. Observa-se que tal popularidade promove a sensação de segurança da população, quando se pode concluir que a Corporação presta um serviço ímpar, promovendo dentro da expressão do poder, principalmente no campo psicossocial. O envolvimento dos Corpos de Bombeiros Militares, nos esforços de mobilização, deve levar em conta as atribuições legais destas Forças Auxiliares, a capacidade dos mesmos em treinar, equipar, a sua expertise, em estabelecer e operacionalizar planos de auxílios mútuos e pontos de apoio real e potencial, além da sua capacitação técnica voltada para emergências. Neste trabalho, apresentar-se-ão o histórico, o quadro geral dos Corpos de Bombeiros, a interação dos Corpos de Bombeiros com a Defesa Civil e a importância da necessidade de aprimorar, dentro da Estratégia Nacional de Defesa, conforme estabelece o Decreto n.° 6.703, de 18 de dezembro de 2008, a participação da Corporação de forma efetiva nos propósitos da Defesa Nacional.

Palavras-chave: Bombeiros Militares; Atribuição; Mobilização.

1 INTRODUÇÃO

O Corpo de Bombeiros Militar como instituição destinada, por força constitucional, à salvaguarda de vidas e bens, realiza uma série de atividades operacionais para a consecução de sua missão-fim.

Diante da vasta gama de atribuições desempenhadas pelos diversos setores operacionais da organização, bem como da distribuição das unidades da Corporação

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pelo vasto território nacional, faz-se necessário um estudo sobre os procedimentos a serem adotados em caso de necessidade de uma mobilização nacional para a defesa do País.

No novo contexto estrutural do Corpo de Bombeiros Militares, as mudanças advindas pelas novas regulamentações de organização básica da Corporação manifestaram-se diretamente na área operacional e, com isso, a ratificação da necessidade de um aprimoramento na utilização dos recursos humanos da corporação, aliado às novas tecnologias existentes para o combate aos sinistros, para a promoção da segurança nas ações de defesa civil e também na sua contribuição quando do seu acionamento para a resposta a agressão estrangeira. Nesse caso, frisa-se, por oportuno, que a segurança da população e das instalações estratégicas é um papel importante nas atribuições do Corpo de Bombeiros.

Diante do cenário evolutivo que vem se desvelando na organização do sistema de segurança pública, faz-se necessária a atualização das referências normativas aplicadas aos serviços da Corporação, os quais são protagonizados pelo atendimento emergencial da população e do patrimônio público e privado.

A possível carência de normas atualizadas induz à transmissão da cultura operacional corporativa por práticas empíricas ou informais, o que dificulta a padronização e aperfeiçoamento dos procedimentos envolvidos nestes processos, além de fragilizar a estrutura essencialmente técnica que caracteriza a atividade do bombeiro militar.

De maneira não menos relevante, apresenta-se a estrutura militar da Corporação, a qual estando, fundamentalmente arraigada à disciplina, manifesta-se, dentre outras práticas, no cumprimento integral das leis, normas e outras regulamentações que padronizam as suas atividades e que, numa análise mais criteriosa, é o cerne da eficiência e do pronto emprego característicos das Forças Auxiliares.

Neste sentido, as normas operacionais permitem delinear regras a serem observadas pelos comandantes dos grupamentos de bombeiros e pelos militares de serviço, tudo no intuito da padronização dos procedimentos e do emprego dos recursos, bem como a delimitação precisa de competências.

Para que se concretize essa visão de futuro, focada na qualidade da realização da missão-fim, torna-se essencial a utilização de métodos de gerenciamento baseados na ciência da administração.

Desta forma, o papel do Corpo de Bombeiros Militar é parte total de um conjunto normativo operacional vigente na Corporação, estabelecendo, para tanto, os princípios e conceitos básicos do ordenamento jurídico e estratégico que subsidiam a excelência dos serviços prestados pela Corporação.

2 HISTÓRICO DO CORPO DE BOMBEIROS MILITAR

Conforme consta no Planejamento Estratégico do CBMDF, a origem dos Corpos de Bombeiros remonta à Antiguidade. Uma das primeiras organizações de

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O Papel do Corpo de Bombeiros Militar na Mobilização Nacional

combate ao fogo de que se tem notícia foi criada na antiga Roma. Augusto, que se tornou Imperador em 27 a. C., formou um grupo de “vigiles”. Esses “vigiles” patrulhavam as ruas para impedir incêndios. Sabe-se muito pouco a respeito do desenvolvimento das organizações de combate ao fogo na Europa até o grande incêndio de Londres em 1666. Esse incêndio destruiu grande parte da cidade e deixou milhares de pessoas desabrigadas. Antes do incêndio, Londres não dispunha de um sistema organizado de proteção contra o fogo. Após o incêndio, as companhias de seguro da cidade começaram a formar brigadas particulares para proteger as propriedades de seus clientes.

Em 2 de julho de 1856, o Imperador Dom Pedro II assinou o Decreto Imperial n.º 1.775. Este Decreto reuniu numa só Administração as diversas seções que até então existiam para o Serviço de Extinção de Incêndios, Arsenais da Marinha de Guerra, Repartição de Obras Públicas e Casa de Correção, sendo, assim, criado e organizado o Corpo Provisório de Bombeiros da Corte, sob a jurisdição do Ministério da Justiça.

Em 30 de abril de 1860, o Decreto n.º 2.587 torna definitivo o Corpo Provisório de Bombeiros da Corte, passando sua subordinação à jurisdição do Ministério da Agricultura, que na mesma data era criado.

Em 17 de dezembro de 1881, foi assinado o Decreto n.º 8.837, estabelecendo a organização militar ao Corpo de Bombeiros, elevando seu efetivo a 300 homens e autorizando o governo a empregá-lo, em caso de guerra, como Corpo de Sapadores ou Pontoneiros, ficando em tal emergência com a mesma organização de Batalhão de Engenheiros.

Em 1960, com o advento da mudança da Capital Federal para Brasília, e com o que ficou estabelecido a partir da Lei 3.752, de 14 de abril de 1960, foi disposta a organização do Corpo de Bombeiros do Distrito Federal.

Em 25 de junho de 1966, o Decreto-Lei n.º 9 estabeleceu que o Corpo de Bombeiros do Distrito Federal passava a ser subordinado ao Prefeito do Distrito Federal, fixando também seu efetivo em 1.238 homens.

Em 16 de janeiro de 1967, chega a Brasília o último contingente do Rio de Janeiro, consolidando a transferência para a nova capital federal. Também nesse ano, em 13 de março, o Decreto-Lei n.º 315 passa a subordinação do Corpo de Bombeiros à Secretaria de Segurança Pública.

A Constituição Federal, promulgada em 1988, garantiu a situação de militares aos integrantes dos Corpos de Bombeiros Estaduais e do Distrito Federal, bem como consolidou as atribuições destas instituições.

Em 20 de novembro de 1991, foi promulgada a Lei Federal n.º 8.255, que dispõe sobre a Organização Básica do Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal. Ainda nesse ano, em 6 de dezembro, a Lei Federal n.º 8.258 fixou o efetivo do CBMDF em 6.600 bombeiros militares.

Em 1993, efetivou-se o ingresso de 3 (três) cadetes femininos no Curso de Formação de Oficiais, bem como de 42 (quarenta e dois) soldados femininos nas

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fileiras do CBMDF, marcando o início da participação das mulheres na estrutura da Corporação.

Em 6 de novembro de 2009, foi promulgada a Lei Federal n.º 12.086, que alterou a Lei Federal n.º 8.255, de 20 de novembro de 1991, modificando a estrutura funcional do CBMDF, adequada à atual realidade do Distrito Federal, fixando o efetivo em 9.703 militares. Contudo, a instituição possui atualmente 5.487 militares.

A Corporação possui um total de 26 (vinte e seis) unidades de atendimento a emergências, estrategicamente distribuídas em todo o território do Distrito Federal.

2.1 MISSãO

Proteção de vidas, patrimônio e meio ambiente.

2.2 ATRIBUIÇÕES

Estabelecida pela Constituição Federal, em seu artigo 144, pela Lei Federal n.º 8.255/91, alterada pela Lei Federal n.º 12.086/2009, consiste em proporcionar a proteção pessoal e patrimonial da sociedade e do meio ambiente, por meio de ações de prevenção, combate e investigação de incêndios urbanos e florestais, salvamento, atendimento pré-hospitalar e ações de defesa civil, no âmbito do Distrito Federal.

2.3 VISãO

Ser referência para a sociedade pela excelência dos serviços prestados, por meio da qualificação dos seus integrantes, da gestão estratégica da Instituição, do constante reequipamento e da inovação tecnológica.

2.4 VALORES

2.4.1 Bravura

Intrepidez, coragem necessária ao desempenho das missões institucionais.

2.4.2 Dignidade

Honestidade e brio, requisitos necessários ao perfil do bombeiro militar.

2.4.3 DisciplinaRegime de ordem necessário ao bom funcionamento da Instituição.

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O Papel do Corpo de Bombeiros Militar na Mobilização Nacional

2.4.4 - Ética

Estudo dos juízos de apreciação referentes à conduta humana, suscetível de qualificação do ponto de vista do bem e do mal, seja relativamente à determinada sociedade, seja de modo absoluto. A ética enseja o respeito entre os bombeiros militares e entre estes profissionais e a sociedade.

2.4.5 - Hierarquia

Ordem e subordinação da autoridade em diferentes níveis. A hierarquia pos-sibilita maior agilidade na mobilização e emprego do efetivo da Instituição.

2.4.6 - Patriotismo

Amor à pátria, qualidade de patriota. Valor imprescindível para a preservação da segurança da sociedade.

2.4.7 - Respeito à vida

Valor máximo da Instituição. Capacidade de doar a própria vida para salvar a de outros. Lema Institucional: “Vidas alheias e riquezas salvar”.

2.4.8 - Respeito ao meio-ambiente

Consciência da importância da preservação do meio-ambiente na garantia do bem-estar da sociedade.

2.4.9 - Responsabilidade Social

Forma de gestão ética e transparente que busca desenvolver processos educativos que torne a Corporação parceira e corresponsável pela sociedade, pelo meio ambiente e pelo país.

2.4.10 - Tradição

Transmissão de valores através de gerações. A atividade de combate a incêndio remonta a antiguidade romana, salvar vidas e proteger bens é uma tradição mantida até os dias de hoje.

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3 ORDENAMENTO NORMATIVO

O Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal, instituição permanente, essencial à segurança pública e às atividades de defesa civil, fundamentada nos princípios da hierarquia e disciplina, e ainda Força Auxiliar e Reserva do Exército, nos casos de convocação ou mobilização, organizada e mantida pela União nos termos do inciso XIV do art. 21 e dos §§ 5.º e 6.º, do art. 144, da Constituição Federal, subordinada ao Governador do Distrito Federal, destina-se à execução de serviços de perícia, prevenção e combate a incêndios, de busca e salvamento, de atendimento pré-hospitalar e de prestação de socorros nos casos de sinistros, inundações, desabamentos, catástrofes, calamidades públicas e outros em que seja necessária a preservação da incolumidade das pessoas e do patrimônio18.

De maneira complementar ao disposto na Constituição Federal, há legislações infraconstitucionais que regulamentam as atividades do CBMDF, como é o caso da Lei 8.255/91, a qual trata da Organização Básica da Corporação e detalha suas atribuições.

De modo geral, o serviço operacional da Corporação obedece à seguinte hierarquia e ordenamento jurídico:

Figura 1 - Fluxograma normativo do serviço operacional do CBMDF

18 Lei N.º 7.479/86 – Estatuto do CBMDF, com a redação alterada pela Lei 12.086/09.

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O Papel do Corpo de Bombeiros Militar na Mobilização Nacional

4 ATRIBUIÇÃO DO CORPO DE BOMBEIROS

As atribuições do Corpo de Bombeiros e em especial ao Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal são definidas na Lei 8.255 de 20 de novembro de 1.991, incrementadas pelo Decreto 7.163, de 29 de abril de 2010, sendo de competência da Corporação o desempenho das seguintes atividades:

I - Realizar serviços de prevenção e extinção de incêndios;II - Realizar serviços de busca e salvamento;III - Realizar perícias de incêndio relacionadas com sua competência;IV - Prestar socorros nos casos de sinistros, sempre que houver ameaça

de destruição de haveres, vítimas ou pessoas em iminente perigo de vida;

V - Realizar pesquisas técnico-científicas, com vistas à obtenção de produtos e processos, que permitam o desenvolvimento de sistemas de segurança contra incêndio e pânico;

VI - Realizar atividades de segurança contra incêndio e pânico, com vistas à proteção das pessoas e dos bens públicos e privados;

VIII - Executar atividades de prevenção aos incêndios florestais, com vistas à proteção ambiental;

VIII - Executar as atividades de defesa civil;IX - Executar as ações de segurança pública que lhe forem cometidas por

ato do Presidente da República, em caso de grave comprometimento da ordem pública e durante a vigência do estado de defesa, do estado de sítio e de intervenção no Distrito Federal;

X - Executar serviços de atendimento pré-hospitalar;XI - Desenvolver na comunidade a consciência para os problemas

relacionados com incêndios, acidentes em geral e pânico (Decreto 7.163);

XII - Promover e participar de campanhas educativas direcionadas à comunidade em sua área de atuação (Decreto 7.163); e

XIII - Fiscalizar, na sua área de competência, o cumprimento da legislação referente à prevenção contra incêndio e pânico (Decreto 7.163).

Obs.: Atividades de defesa civil, segundo a Política Nacional de Defesa Civil, consistem em um conjunto de ações preventivas, de socorro, assistenciais e de reconstrução, destinadas a evitar ou minimizar os desastres, preservar o moral da população e restabelecer a normalidade social, sendo que a atuação do CBMDF se direciona, prioritariamente, àquelas preventivas e de socorro e, secundariamente, assistenciais e reconstrutivas.

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5 SITUAÇÃO DOS CORPOS DE BOMBEIROS NO BRASIL

Para uma melhor análise da mobilização do Corpo de Bombeiros Militar é necessário o levantamento de dados que possibilitem ao gestor público tomar a decisão estratégica mais apropriada, principalmente em caso de mobilização nacional, devidamente decretada pelo Presidente da República.

Os quadros abaixo demonstram uma estratificação de dados que fornecem informações importantes para a complexidade da decisão, bem como da necessidade de aprimoramento e em um primeiro momento pelos governos estaduais em minimizar o déficit de militares desta Força Auxiliar nos estados.

Em termos práticos, esta situação acarretou grandes disparidades entre as diversas unidades federativas, no que diz respeito ao efetivo de militares por região, sendo que, na grande maioria dos estados, o número de bombeiros varia do muito ruim ao sofrível. Em números absolutos, os bombeiros militares, na ativa, somam, atualmente em todo o Brasil, aproximadamente, um efetivo de mais de noventa mil homens.

Fonte: Liga Nacional de Bombeiros

O reduzido número desses militares reflete a também irrisória parcela de municípios atendidos, situação gravíssima quando analisada à luz de padrões consagrados em todo o mundo, tais como o estabelecido pela National Fire Protection Association – NFPA, instituição norte-americana de renome internacional na área de combate a incêndios, a qual preconiza: “Noventa por cento das ocorrências de incêndio tem de ser atendidas em até quatro minutos”.

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O Papel do Corpo de Bombeiros Militar na Mobilização Nacional

Fonte: Liga Nacional de Bombeiros

Por uma visão global dos quadros apresentados, percebe-se, em caso de mobilização nacional, por ameaça estrangeira, que o País terá serias dificuldades em promover a segurança da população, com o uso dos Corpos de Bombeiros Militares, em razão da dificuldade de equalizar os quantitativos de Bombeiros Militares no País.

5.1 OS CORPOS DE BOMBEIROS MILITARES E SUA INTEGRAÇãO COM AS COORDENADORIAS MUNICIPAIS DE DEFESA CIVIL (COMDEC)

Os Corpos de Bombeiros Militares possuem, como atribuição constitucional, as atividades de Defesa Civil nas ações de prevenção, preparação, resposta e reconstrução. Verifica-se que, mesmo em caso de mobilização nacional, a resposta aos desastres ambientais e/ou antropogênicos continuarão a ser uma missão da Corporação e por esse motivo deve-se estar devidamente, preparados para atender aos anseios da sociedade, sob a ótica da defesa nacional, bem como no enfretamento aos desastres.

Atualmente, o quantitativo de unidades operacionais de bombeiros, nos municípios brasileiros apresenta um quadro de aproximadamente 7% em todo o território nacional. Esse dado nos leva a uma informação que um dos grandes óbices para o atendimento a toda sociedade, tanto na mobilização nacional como no atendimento emergencial é promover a implantação de novas unidades operacionais no País.

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Fonte: Secretaria Nacional de Defesa Civil

O Sistema Nacional de Defesa Civil (SINDEC) apresenta, na sua concepção como órgão de atendimento emergencial nos desastres aos municípios brasileiros, as Coordenadorias Municipais de Defesa Civil (COMDEC). Atualmente, existem aproximadamente, mais de três mil e oitocentas COMDEC em todo o País. Cabe ressaltar que, apesar do número expressivo de COMDEC, não existe uma política de recursos humanos reconhecida pelo Ministério do Trabalho, como profissionais públicos em Defesa Civil. A maioria dos funcionários das COMDEC são funcionários públicos de outros setores da administração do município, cedidos para trabalhar como agentes de defesa civil, sendo que muitos são funcionários sem nenhum preparo técnico no enfrentamento aos desastres.

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O Papel do Corpo de Bombeiros Militar na Mobilização Nacional

Fonte: Secretaria Nacional de Defesa Civil

O quadro abaixo apresenta uma interessante sobreposição de unidades de bombeiros com as COMDEC, onde percebe-se que as interações dessas instituições poderiam aperfeiçoar o atendimento ao cidadão na resposta aos desastres e, paralelamente, fortaleceria a Defesa Nacional em caso de mobilização nacional frente à ameaça estrangeira.

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Fonte: Secretaria Nacional de Defesa Civil

6 A MOBILIZAÇÃO NACIONAL

Em dezembro de 2007, a Lei de Mobilização Nacional foi atualizada e aprovada pelo Presidente da República. Ao realizar um estudo sobre a Lei de Mobilização Nacional, pôde-se verificar as condições pelas quais os Corpos de Bombeiros Militares poderão executar suas atribuições legais, durante o processo de Mobilização e Desmobilização Nacional, que estão definidas pela Lei Federal n.º 11.631, de 27/12/2007 e pelo Decreto n.º 6.592, de 2/10/2008.

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O Papel do Corpo de Bombeiros Militar na Mobilização Nacional

Nos termos da citada lei, conceitua-se ‘Mobilização Nacional’ como: “[...] o conjunto de atividades planejadas, orientadas e empreendidas pelo Estado, completando a Logística Nacional, destinadas a capacitar o País a realizar ações estratégicas, no campo da Defesa Nacional, diante de agressão estrangeira.”

Por logística compreende-se não apenas os recursos materiais, como também os recursos humanos necessários ao enfrentamento. Neste sentido, verifica-se que, das sete funções logísticas preconizadas pela ESG, é possível cotejar a participação dos Corpos de Bombeiros em todas elas, em menor ou maior grau, conforme a situação concreta que se apresentar.

A acima citada lei conceitua ‘Desmobilização Nacional’ como: “[...] o conjunto de atividades planejadas, orientadas e empreendidas pelo Estado, com vistas no retorno gradativo do país à situação de normalidade, quando cessados ou reduzidos os motivos determinantes da execução da Mobilização Nacional.”

Ressalta-se que a participação dos Corpos de Bombeiros Militares, na fase de desmobilização, apresenta uma característica ímpar e ao mesmo tempo de dualidade, pois as ações de segurança face à mobilização serão minimizadas, entretanto, as ocorrências de natureza ordinárias realizadas pela Corporação continuarão de forma normal, o que é um fator de óbice quando do retorno dos militares para as suas Corporações de origem.

7 O EXÉRCITO BRASILEIRO E OS CORPOS DE BOMBEIROS MILITARES NA MOBILIZAÇÃO NACIONAL

O Ministério da Defesa, por meio do Exército Brasileiro, instituiu o Sistema de Mobilização Militar (SISMOMIL) e verifica-se que a atual estrutura do presente sistema comporta as Forças Armadas de forma globalizada, com o intuito de unificação de procedimentos e facilidade de códigos abertos para os seus sistemas.

Veja-se o quadro abaixo:

COMPOSIÇÃO DO SISMOMIL

Observa-se que a presente composição do sistema inclui as Forças Armadas dentro de um padrão único para o seu emprego na mobilização nacional, entretanto

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percebe-se a ausência dentro do sistema da participação das Forças Auxiliares, principalmente dos Corpos de Bombeiros Militares.

A Portaria Normativa N.º 343/MD, de 01 de março de 2011, no que se refere ao Art. 2.º, versa sobre:

A Política de Mobilização Militar tem por finalidade o estabelecimento dos objetivos e das diretrizes para a orientação do preparo e do emprego da Mobilização e da Desmobilização Militares, em complemento à Logística Militar, a fim de contribuir para o cumprimento da missão do Ministério da Defesa – MD.

Infere-se, então, que a participação do Corpo de Bombeiros como Instituição Militar necessita estar neste mesmo conjunto de atribuições no intuito da importância das atividades operacionais realizadas pelos mesmos no período de mobilização e de desmobilização.

As medidas preventivas e de controle adotadas para reduzir, ao mínimo, os efeitos de uma possível agressão estrangeira, são fatores que irão de forma imediata acionar os Corpos de Bombeiros Militares para prestar o apoio logístico necessário, no intuito de promover o controle de danos, entre outros.

Tais medidas, que são executadas antes, durante e após a ocorrência dessas ações, aplicam-se também, no caso de grandes desastres ou de catástrofes da natureza. O restabelecimento do controle, a localização, o resgate e a evacuação de feridos, o isolamento de áreas perigosas, o combate a incêndios, a remoção de escombros e outras providências semelhantes são exemplos de ações de controle de danos.

A existência de numerosas forças e instalações militares em uma área de retaguarda exige que sejam, claramente, definidas as responsabilidades e as relações de comando entre tais forças.

Diante do exposto, infere-se a grande importância do emprego dos Corpos de Bombeiros na Mobilização Nacional, sendo a sua participação imprescindível.

Depreende-se claramente a necessidade da estreita colaboração entre o Exército Brasileiro e os Corpos de Bombeiros Militares.

Esta colaboração deverá acontecer já na fase de preparo da Mobilização Nacional, utilizando-se de processos de capacitação e treinamento para nivelamento dos conhecimentos técnicos e operacionais de ambas as forças, caso contrário a participação dos Corpos de Bombeiros redundará de forma ineficaz aos objetivos propostos.

8 ANÁLISE DOS OBJETIVOS E AÇÕES PARA MELHORIA DA EFETIVIDADE DOS CORPOS DE BOMBEIROS NA MOBILIZAÇÃO NACIONAL

Com o intuito de superar ou minimizar os óbices apresentados, deve-se antes de tudo, empreender ações e esforços, para que os Corpos de Bombeiros

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O Papel do Corpo de Bombeiros Militar na Mobilização Nacional

sejam dotados, desde já, com os recursos mínimos para o cumprimento de suas missões legais. Afinal, se o objetivo pretendido é sua eficaz participação em caso de Mobilização Nacional, o pensamento norteador, simples, mas verdadeiro, deve ser o seguinte: o que funciona na paz poderá funcionar na guerra, mas o que não funciona na paz, certamente, não funcionará na guerra.

Observa-se também que a dotação dos recursos necessários aos Corpos de Bombeiros contribuiria para os esforços de desenvolvimento da Nação, uma vez que os investimentos requeridos são sobejamente, compensados pela proteção auferida à sociedade.

Aliado a esta busca de recursos, cabem várias estratégias menos custosas, e que dizem respeito à interação da Força Terrestre com os Corpos de Bombeiros, no sentido de planejarem, em conjunto, a minimização de danos e a redução dos prejuízos nas ações subsequentes.

Com o objetivo de atender a essas duas vertentes, há que se considerar o óbice representado pelo fato dos Corpos de Bombeiros serem instituições de âmbito estadual, onde a subordinação está ligada diretamente ao Governador de Estado, o que, por razões políticas e administrativas, podem resultar em tratativas infrutíferas na Mobilização Nacional.

A situação acima descrita poderá ser enfrentada pela padronização de procedimentos a ser adotada pelo Exército, no que tange à preparação específica para a Mobilização Nacional. Já, para a dotação dos recursos mínimos, necessários ao cumprimento de suas missões cotidianas, este ente catalisador de esforços deverá ser a Secretaria Nacional de Segurança Pública – SENASP, órgão vinculado ao Ministério da Justiça.

9 CONCLUSÃO

A Mobilização Nacional é um dos mecanismos de que a Nação dispõe para promover a Defesa Nacional e, consequentemente, a Segurança Nacional, em caso de agressão estrangeira. A Mobilização Nacional complementa a Logística Nacional e capacita o Poder Nacional a realizar ações estratégicas de defesa.

A Logística Nacional se constitui em um instrumento vital de apoio, de atuação permanente, de que se vale a Estratégia Nacional para a aplicação do Poder Nacional, visando à conquista e manutenção dos Objetivos Nacionais - ON.

Dentre os ON destacam-se os Objetivos Fundamentais que, em razão de pretenderem atingir os mais elevados interesses nacionais e a preservação da identidade da Nação, perduram por longo tempo.

Um dos Objetivos Fundamentais da Nação Brasileira é a Paz Social.A Escola Superior de Guerra se expressa da seguinte maneira a respeito da

Paz Social:

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Na visão de uma sociedade que cultua valores espirituais, a paz constitui condição necessária e efeito desejado. A Paz Social reflete um valor de vida, não imposto, mas decorrente do consenso, em busca de uma sociedade caracterizada pela conciliação e harmonia entre pessoas e grupos, principalmente entre o capital e o trabalho, e por um sentido de justiça social que garanta a satisfação das necessidades mínimas de cada cidadão, valorizando as potencialidades da vida em comum, beneficiando a cada um, bem como a totalidade da sociedade.

Paralelamente a este conceito, inserem-se os serviços prestados pelos integrantes dos Corpos de Bombeiros Militares do Brasil, que se dedicam, diuturnamente, à garantia da incolumidade física dos cidadãos brasileiros e à proteção de seus bens materiais, sempre seguindo o nobre lema dos Corpos de Bombeiros Militares do Brasil – “VIDAS ALHEIAS, RIQUEZAS SALVAR”.

Entretanto, a logística de que dispõe estas instituições militares, para a devida prestação dos serviços operacionais, figura entre as muitas e grandes contradições existentes neste nosso imenso Brasil: de um lado se alinham nobres ideais, serviços de importância inegável, grande demanda por atendimentos e profissionais preparados e abnegados e sempre prontos para colocar em risco a própria vida em benefício de outrem. Em contraposição, encontram-se orçamentos pífios, indiferença por parte dos governantes e administração arcaica, o que acarreta uma ineficácia administrativa e operacional da Corporação perante a comunidade.

O quadro acima descrito apresenta uma situação degradável dos Corpos de Bombeiros, que, salvo uma ou outra exceção, não possuem os meios mínimos necessários ao cumprimento de suas missões constitucionais.

Em resumo, urge dotar as Corporações de Soldados do Fogo de ferramentas de gestão, aplicadas de forma racional e efetiva, suporte em tecnologia da informação e, principalmente, na capacitação constante de seus recursos humanos e aquisição de equipamentos operacionais, para que, em caso de decretação da Mobilização Nacional, a sociedade possa ter minimizada a sensação de insegurança e, quando da desmobilização, seja sentida, por essa mesma sociedade, a percepção da paz social na promoção do bem comum.

Referências

ATHOS, Ferreira Camargo. A mobilização nacional e os corpos de bombeiros. Rio de Janeiro: ESG, 2006.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 2003.

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Warlei Oliveira Gomes

A TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO, UTILIZADA NA LOGÍSTICA EMPRESARIAL, E A APLICABILIDADE DOS SISTEMAS INTEGRADOS DE GESTÃO NAS FASES DA FUNÇÃO SUPRIMENTO DA LOGÍSTICA MILITAR: A

UTILIZAÇÃO DO RFID

Warlei Oliveira GomesMajor da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais, estagiário do Curso de Logística e Mobilização Nacional da Escola Superior de Guerra, em 2011.

Resumo

O presente artigo apresenta um estudo sobre os novos Sistemas Integrados de Gestão, empregados na Tecnologia da Informação, e utilizados na Logística Empresarial, para aplicação, ou não, nas fases da Função Suprimento da Logística Militar. Aborda, de forma específica, o RFID - Radio Frequency Identification (Identificação por Radiofrequência), método que utiliza ondas eletromagnéticas para acessar dados armazenados em um microchip acoplado a uma pequena antena, identificando, automaticamente, os objetos nele fixados e que pode ser aplicada em uma série de situações, proporcionando mais visibilidade, rastreamento e sincronização da cadeia de suprimentos, com total confiabilidade, sugerindo-se a sua utilização nas Forças Armadas Brasileiras. A abordagem do tema teve, como supedâneo teórico, os conceitos de Logística; os estudos levados a efeito sobre as Logísticas Militar e Empresarial, suas especificidades e relações; os Sistemas de Informação da Tecnologia da Informação; o RFID e, por fim, a conclusão, oportunidade em que o autor caracteriza a situação atual e, através de uma visão prospectiva, apresenta sugestão para solução do problema.

Palavras-chave: Logística; Logística Militar; Logística Empresarial; Sistemas de Informação, RFID - Radio Frequency Identification.

1 INTRODUÇÃO

“Ao contrário das antigas inovações, que tinham uma tendência a conceder uma vantagem competitiva duradoura ao inovador, muitas tecnologias da era da informação são igualmente acessíveis a todos os competidores. O que diferencia os competidores não é quem possui a tecnologia, mas aquele que a emprega melhor”.

(Linda C. Jantzen, 2003)

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A Tecnologia da Informação, Utilizada na Logística Empresarial

A evolução do conhecimento científico e tecnológico verificada nas últimas décadas tem proporcionado um avanço sem precedentes nos conceitos até então imutáveis.

As novas tecnologias permitem que o homem atinja resultados considerados inimagináveis. As informações são processadas em maior volume e velocidade, otimizando as práticas e modificando a atuação dos gestores, refletindo na maximização dos níveis de desempenho.

Diante deste cenário evolutivo, a logística empresarial aproveita as novas ferramentas para aperfeiçoar os seus processos e reduzir a possibilidade de custos e fomentar novos negócios.

A logística militar, reconhecida por muitos estudiosos como referência para o surgimento da logística empresarial, passou a estudar, e a conhecer a aplicabilidade dos novos Sistemas Integrados de Gestão por esta última utilizados, aplicando-os nas suas atividades logísticas.

Neste diapasão, tendo por escopo o tema “As Novas Ferramentas da Logística Empresarial e suas Aplicações na Logística Militar”, tem o presente artigo o objetivo estudar os novos sistemas integrados de gestão, empregados na tecnologia da informação utilizados na logística empresarial, para aplicação, ou não, nas fases da função suprimento da logística militar.

Diante desse quadro, sugere-se a seguinte indagação: como os novos sistemas integrados de gestão da tecnologia da informação utilizados na logística empresarial, podem ser aplicados nas fases da função suprimento da logística militar?

No desenvolvimento do trabalho, são abordados alguns temas de relevância para dar supedâneo à conclusão, respaldado pelo marco teórico, indispensável à cientificidade da abordagem realizada, destacando-se: a logística; a logística militar; a logística empresarial; a logística militar e a sua relação com a logística empresarial; os sistemas de informação e, por fim, o RFID (Identificação por Radiofrequência).

Assim sendo, o presente Trabalho Individual (TI), previsto no programa do Curso de Logística e Mobilização Nacional/2011 (CLMN/2011), da Escola Superior de Guerra (ESG), pretende, sem a pretensão de esgotar o assunto, apresentar um estudo dos novos sistemas integrados de gestão, empregados na Tecnologia da Informação utilizados na Logística Empresarial, para aplicação, ou não, nas fases da Função Suprimento da Logística Militar, em específico o RFID - Radio Frequency Identification, ou seja, a Identificação por Radiofrequência para as Forças Armadas Brasileiras.

2 LOGÍSTICA

A logística encerra uma atividade antiga, que se relaciona à dinâmica de previsão e provisão de meios. Ela remonta aos primórdios da história humana, ao período em que o homem deixou de ser nômade.

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Warlei Oliveira Gomes

A evolução da logística na antiguidade pode ser exemplificada na passagem bíblica em que Moisés, durante a travessia do deserto, mandou o povo assumir o alimento da colheita anterior.

Antecipando ao conceito da logística sob o enfoque militar, considerando-a originária deste meio, urge apontar os posicionamentos, a seguir transcritos, como forma de balizamento dos entendimentos expressos sobre o termo em comento.

Segundo Ballou (2001), ao citar a definição promulgada pelo Conselho de Administração Logística (CLM – Concil of Logistics Management), tem-se que:

Logística é o processo de planejamento, implementação e controle do fluxo eficiente e economicamente eficaz de matérias-primas, estoque em processo, produtos acabados e informações relativas desde o ponto de origem até o ponto de consumo, com o propósito de atender às exigências do cliente.

Para Christopher (2002), a logística é o processo de gerenciar estrategicamente a aquisição, a movimentação e a armazenagem de materiais, peças e produtos acabados, inseridos os fluxos de informação correlatos, com a organização e seus canais de marketing, de modo a poder maximizar a lucratividade presente e futura, pelo atendimento de pedidos a baixo custo.

Das ideias expostas sobre o significado do processo que representa a logística, não se pode desconsiderar a interpretação do termo sob o enfoque militar, que representa, para inúmeros estudiosos do assunto, o passo inicial para o aprofundamento desta ciência.

É relevante mencionar que o termo ‘logística’ passou a existir significando ‘abastecer’, ‘transportar’ e ‘alojar tropas’, contribuindo para que os recursos certos estivessem no local certo e na hora certa, permitindo que as campanhas militares fossem realizadas, propiciando a vitória das tropas em combate.

A história nos revela a importância do papel da logística na administração dos conflitos, prestando seus préstimos a países e organizações internacionais, em específico nas atividades de mobilização, deslocamentos, posicionamento e manutenção das tropas, com o fornecimento de equipamentos e suprimentos.

Malveira (2005), apud Ballou (2001, p. 21), enfatiza a logística sob o foco do contexto militar, baseado na utilização do termo durante a Segunda Guerra Mundial, que “De acordo com a definição do dicionário, logística é o ramo da ciência militar que lida com a obtenção, manutenção e transporte de material, pessoal e instalações”.

O mesmo autor, desta feita citando Christopher (2002), enfatiza o resgate ao fato histórico da Segunda Guerra Mundial, como exemplo extraordinário de logística, oportunidade em que ocorreu a derrota do General alemão Von Rommel19,

19 Comandante do “Afrika Korps”, famoso exército alemão atuante no norte da África, composto

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A Tecnologia da Informação, Utilizada na Logística Empresarial

no deserto de El Alamein, na África, que teria mencionado: “[...] antes da luta em si, uma batalha é ganha ou perdida pelos serviços de intendência”.

Outro fato mais recente que ratifica a importância da logística militar aplicada durante um conflito armado ocorreu na Guerra do Golfo, vencida pelos Estados Unidos da América, em 1991, contra o Iraque, oportunidade em que ficou demonstrada a precisão no oferecimento do suporte adequado às tropas, quando empregadas nos campos de batalha. A eficiência e a eficácia no cumprimento dos conceitos da logística militar foram preponderantes para que os Estados Unidos pudessem vencer a mencionada guerra, quando não deixaram faltar suprimentos na hora necessária.

2.1 A LOGÍSTICA MILITAR

“A Logística é tudo ou quase tudo, no campo das atividades militares, exceto o combate”. (Barão de Jomini)

De acordo com a publicação da Doutrina de Logística Militar, Portaria Normativa n.º 614/MD (MD 42-M-02), de 24 de outubro de 2002, conceitua-se ‘Logística Militar’ como o “Conjunto de atividades relativas à previsão e à provisão dos recursos e dos serviços necessários à execução das missões das Forças Armadas”.

O Ato Administrativo Normativo acima citado elenca as fases da logística militar, que são: determinação de necessidades, obtenção e distribuição. Para qualquer tipo de logística, seja militar, nacional ou empresarial, constata-se a existência das fases, de forma distinta e relacionadas entre si:

a) Determinação das Necessidades: levantamento completo, em quantidade e qualidade, dos meios necessários à execução das ações planejadas, bem como dos locais e prazos em que tais meios deverão estar disponíveis. A importância dessa fase é ressaltada pela complexidade a ela inerente e por se constituir na base em que se assentarão as fases subsequentes. Nesta fase, destacam-se as seguintes indagações: o quê, quanto e para quem prover?

b) Obtenção: identificação das fontes e tomada de medidas para a aquisição e a obtenção dos recursos necessários à aquisição dos meios. As indagações são realizadas no sentido de: onde e como obter?

c) Distribuição: consiste em fazer chegar, oportuna e eficazmente, aos usuários, todos os recursos fixados pela determinação das necessidades. A distribuição dos recursos materiais compreende o recebimento, o armazenamento, o transporte e a entrega. Caracterizam esta fase as seguintes perguntas: como, para quem, quando e onde distribuir?

O recebimento inclui o destino inicial e o escalonamento. O armazenamento

pela 15,ª e 21,ª Divisões de blindados, conhecidos como “Panzer”.

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Warlei Oliveira Gomes

abrange a escolha dos tipos de instalação e as formas de acondicionamento, a determinação das áreas de estocagem, a escolha dos locais para as instalações, a disposição, o controle e a preservação do material armazenado. O transporte é a parte dinâmica da distribuição e consiste no deslocamento do material dos locais de armazenagem ou de obtenção até os locais de consumo. A entrega consiste na transferência orgânica e administrativa do material ao usuário.

As três fases da logística militar compõem o denominado ciclo logístico. As fases se amoldam objetivando a satisfação do usuário. O ciclo logístico tem o seu início na determinação das necessidades do usuário, passa pela fase da obtenção dos meios e se completa com a entrega do bem ou serviço ao usuário. Infere-se que o usuário é o foco da logística militar. Objetivo análogo pode ser descrito nas logísticas nacional e empresarial.

Consta, ainda, na Doutrina de Logística Militar, na Portaria Normativa já mencionada, o conceito de Funções da Logística Militar, que consiste na reunião, sob uma única designação, de um conjunto de atividades logísticas afins, correlatas ou de mesma natureza, com a seguinte divisão:

a) Recursos Humanos: conjunto de atividades relacionadas com o gerenciamento do pessoal;b) Saúde: conjunto de atividades relacionadas com a conservação do pessoal nas condições adequadas de aptidão física e psíquica, por intermédio de medidas sanitárias de prevenção e de recuperação;c) Suprimento: conjunto de atividades que trata da previsão e provisão do material, de todas as classes, necessário às organizações e forças apoiadas;d) Manutenção: conjunto de atividades que são executadas visando a manter o material na melhor condição de emprego e, quando houver avarias, reconduzi-lo à condição anterior;e) Engenharia: conjunto de atividades que são executadas, visando ao planejamento e à execução de obras e de serviços com o objetivo de obter e adequar a infraestrutura física e as instalações existentes às necessidades das Forças;f) Transporte: conjunto de atividades que são executadas visando ao deslocamento de recursos humanos, materiais e animais por diversos meios, em tempo e para os locais predeterminados, a fim de atender às necessidades; eg) Salvamento: conjunto de atividades que são executadas visando à salvaguarda e ao resgate de recursos materiais, suas cargas ou itens específicos.Das funções logísticas citadas, aquela que foi intitulada como “suprimento”

se destaca das demais, pois discorre sobre tema específico, relacionando-se diretamente ao assunto em comento.

As atividades da função logística suprimento são idênticas àquelas citadas para

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A Tecnologia da Informação, Utilizada na Logística Empresarial

a logística militar, ou seja: levantamento das necessidades; obtenção e distribuição. Elas já foram mencionadas anteriormente. Cabe, entretanto, um enfoque especial na atividade de Distribuição.

A Portaria Normativa n.º 614/MD (MD 42-M-02) apresenta o conceito de ‘Distribuição’ como sendo: “a atividade que inclui o transporte e a entrega, o recebimento, a armazenagem ou aplicação final do suprimento.”

A atividade de Distribuição utiliza dois sistemas de classificação, objetivando o controle dos suprimentos:

a) O Sistema de Classificação Militar, que diz respeito ao sistema que agrupa todos os itens de suprimento, conforme a finalidade de emprego, em dez classes e é utilizado nos planejamentos logísticos amplos e na simplificação de instruções e planos, sendo:

Classe I - Material de Subsistência.Classe II - Material de Intendência.Classe III - Combustíveis e Lubrificantes.Classe IV - Material de Construção.Classe V - Armamento e Munição.Classe VI - Material de Engenharia e de Cartografia.Classe VII - Material de Comunicações, Eletrônica e de Informática.Classe VIII - Material de Saúde.Classe IX - Material Naval, de Motomecanização e de Aviação.Classe X - Materiais não incluídos nas demais classes.b) O Sistema de Classificação por Catalogação, referente ao sistema que

reúne todos os itens de suprimento em grupos e classes.A catalogação consiste na codificação padronizada de itens de material,

compreendendo um sistema com um banco de dados capaz de identificar cada item catalogado, através do fornecimento dos seguintes dados: código, nomenclatura, descrição, modificações, componentes intercambiáveis, fabricantes, usuários e outras informações adicionais.

A catalogação é um valioso instrumento empregado pelos sistemas de gerenciamento logístico com o propósito de permitir, no menor tempo possível, a identificação do item de suprimento procurado, sua localização e quantidades disponíveis em estoque.

O sistema de suprimento é o conjunto integrado das organizações, do pessoal, dos equipamentos, dos princípios e das normas técnicas, destinado a proporcionar o adequado fluxo dos suprimentos.

A organização e o funcionamento do sistema pressupõem, além de outras atividades, a existência de controles capazes de proporcionar todas as informações pertinentes à situação dos estoques, e a comparação das necessidades com as disponibilidades.

Com o intuito de abastecer, transportar e alojar as tropas, contribuindo para

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que os recursos certos estivessem no local certo e na hora certa, permitindo que as campanhas militares fossem realizadas, objetivando a vitória nas batalhas, constata-se que o termo logística teve como origem o meio militar, assim considerado por inúmeros estudiosos do assunto.

Ao longo da história, em especial da experiência militar nos combates, sobressaíram ensinamentos que foram aproveitados pelos empresários, influenciando-os no surgimento e no aprimoramento da logística empresarial, quando as melhores práticas do mercado refletiram na modificação de atuação de um terceiro, de forma a ser atingir um nível de desempenho superior.

2.2 A LOGÍSTICA EMPRESARIAL

Segundo Pozo (2010):

A Logística Empresarial trata de todas atividades de movimentação e armazenagem que facilitam o fluxo de produtos, desde o ponto de aquisição da matéria-prima até o ponto de consumo final, assim como dos fluxos de informação que colocam os produtos em movimento, com o propósito de providenciar níveis de serviço adequados aos clientes a um custo razoável.

Complementou o posicionamento acima expondo que, atualmente, a logística é tomada e considerada como perfeita, quando há integração da administração de materiais em sua totalidade e distribuição física dos produtos e serviços com a plena satisfação do cliente e dos acionistas.

A logística empresarial estuda como a administração pode prover melhor nível de rentabilidade no processo de pleno atendimento do mercado e satisfação completa ao cliente, com retorno garantido ao empreendedor, através de planejamento, organização e controles efetivos para as atividades de armazenagem, programas de produção e entregas de produtos e serviços com fluxos facilitadores do sistema organizacional e mercadológico.

A atividade logística é uma atividade vital para uma organização, seja militar ou empresarial.

Atualmente, a logística empresarial está associada diretamente ao fato de uma organização relacionar-se com o cliente, interagindo de forma eficiente com a cadeia produtiva para conquistar o objetivo final, que representa estar atuando de forma competitiva no mercado. Ela nos ensina a aprimorar diversas atividades, representadas, dentre outras, pela otimização dos estoques, simplificação da cadeia de suprimentos, execução de compras de maneira eficiente e o gerenciamento do material.

O gerenciamento enfatiza a maximização das atividades logísticas, propiciando o corte de custos e a otimização da cadeia logística.

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A Tecnologia da Informação, Utilizada na Logística Empresarial

2.3 A RELAÇãO ENTRE A LOGÍSTICA MILITAR E A LOGÍSTICA EMPRESARIAL

A logística empresarial da atualidade representa importante ferramenta para que as empresas se mantenham competitivas, atuando de forma efetiva na cadeia de suprimentos e, por via de consequência, propiciem a redução de custos.

Se a logística militar influenciou, sobremaneira, a logística empresarial, ao longo da história, nos dias de hoje está em curso uma verdadeira inversão. Os militares estão sedimentando comportamentos e experiências empresariais para atualizarem e aperfeiçoarem os seus conhecimentos logísticos.

As logísticas militar e empresarial são complementares e estão intimamente ligadas, apesar das especificidades de cada uma. Asseverou Junior (2010) que a logística empresarial desenvolve técnicas e métodos para uma maior eficiência que podem e devem ser aproveitados na logística militar, sem desconsiderar algumas especificidades desta, que lhes são próprias e necessárias.

Mencionou Bertaglia (2009) que “A tecnologia da informação e a inovação tecnológica tornam possível um futuro no qual a cadeia de abastecimento possa ser realmente integrada”.

Constata-se que a logística empresarial está cada vez mais evoluída, quando se trata da aplicação das novas tecnologias de informação. Com o fito de melhor atender ao cliente, são utilizados sistemas integrados de gestão, desenvolvidos para integrar, controlar e gerenciar a cadeia de suprimentos.

A tecnologia da informação desempenha, nos dias atuais, um papel fundamental, proporcionando maior confiabilidade no processo, pois informações erradas levam a movimentações erradas. O fluxo de informação está extremamente ligado ao movimento físico de produtos e materiais. O entendimento do fluxo de informação permite identificar as informações que realmente agregam valor ao processo, de modo que se possam descartar aquelas que aumentam a velocidade e a confiabilidade das transações.

A tecnologia da informação, empregada na logística empresarial, acompanhou o desenvolvimento das novas técnicas, em especial das novas tecnologias e da ciência. Segundo Bertaglia (2009), as organizações tradicionais estão sofrendo uma transformação importante ao usar a tecnologia como base para alterar os seus padrões de comportamento.

Para atingir mencionados patamares evolutivos, estão sendo utilizados sistemas integrados de gestão, desenvolvidos para integrar, controlar e gerenciar as cadeias de suprimentos. As atualizações dos sistemas são decorrentes do avanço dos estudos sobre o assunto.

Na busca da automatização do processo produtivo e para obter vantagem competitiva, as empresas estão recorrendo aos sistemas integrados de informação, com a utilização de algumas tecnologias disponíveis no mercado.

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3 SISTEMAS DE INFORMAÇÃO

Conforme aponta Monteiro (1999), os Sistemas de Informação são os sistemas ou práticas utilizadas pelas empresas para melhorar o seu desempenho, incluindo ter um custo operacional adequado, processos logísticos inteligentes e integração com fornecedores e clientes através de ferramentas apropriadas.

Figura 1: Adaptação do livro de Ballou, Ronald H. Gerenciamento da cadeia de suprimentos: planejamento, organização e logística empresarial – 4. ed., 2001.

Afirma Ballou (1993) que um dos fatores mais relevantes ao desenvolvimento dos processos administrativos é a aplicação da tecnologia da informação, proporcionando um grande aumento de eficiência. Tais sistemas abrangem todas as ferramentas que a tecnologia disponibiliza para o controle e gerenciamento do fluxo de informação de uma organização.

Acrescentou o mesmo autor que existem no mercado alguns tipos de ferramentas que facilitam e tornam a informação mais acurada para aplicação na cadeia de suprimentos. Alguns exemplos destes sistemas são: o código de barras, o EDI (Electronic Data Interchange), o ECR (Efficient Consumer Response) e os ERP que integram todos os outros.

Os Sistemas Integrados de Gestão ou ERP – Enterprise Resource Planning – são sistemas complexos onde integram, de forma eficaz, todos os sistemas operacionais da empresa. Segundo Souza (1999), pode-se defini-los como: “Sistemas de informação integrada adquiridos na forma de pacotes de software comercial, com a finalidade de dar suporte à maioria das operações de uma empresa”.

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A Tecnologia da Informação, Utilizada na Logística Empresarial

Infere-se, da definição acima, que um ERP consiste, basicamente, na integração de todas as atividades do negócio, entre elas, finanças, marketing, produção, recursos humanos, compras, logística, processo de distribuição, dentre outras, com o benefício direto de facilitar, tornar mais rápido e preciso o fluxo de informação permitindo, assim, o controle dos processos de negócios.

No desenvolvimento de sistemas integrados de gestão, para aplicação na cadeia de suprimentos, destacam-se algumas ferramentas que facilitam o compartilhamento, mesmo que parcial, das bases de dados, formando os Sistemas de Informações Logísticas, sendo:

a) WMS (Warehouse Management System): Pode ser traduzido como Sistema de Gerenciamento de Armazéns, e consiste na tecnologia utilizada em armazéns que integra e processa as informações de localização de material, controle e utilização da capacidade produtiva de mão de obra, além de emitir relatórios para os mais diversos tipos de acompanhamento e gerenciamento. O sistema prioriza uma determinada tarefa em função da disponibilidade de um funcionário, informando a sua localização no armazém. Com este recurso, ocorre um aumento na produtividade, quando diferentes tipos de tarefas são intercaladas.

b) RFID (Radio Frequency Identification): O significado indica ‘Identififcação por Radiofrequência’ que é, relativamente, uma das mais novas tecnologias de coleta automática de dados.

c) Código de Barras: O sistema surgiu da ideia de se criar um mecanismo de entrada de dados mais rápida e eficiente, objetivando findar com os erros cometidos com a coleta de dados feita manualmente, passando a ser a maneira mais eficaz de coletar dados em termos de velocidade da informação, facilidade de migração para o sistema de controle de estoque. Para cada produto ou objetivo da identificação existe um tipo de código de barras, ensejando uma padronização mundial para a leitura do sistema.

d) EDI (Electronic Data Interchange): Ou Intercâmbio Eletrônico de Dados é um sistema que auxilia diretamente a rotina dos vendedores, tornando mais ágil o processo de comunicação com a empresa, principalmente na transmissão de dados. Os vendedores têm a possibilidade de consultar o estoque da empresa e informar ao cliente a possibilidade de disponibilização da mercadoria. Todas as informações são transmitidas on line para a empresa, dinamizando a coleta e transferência dos pedidos.

e) VMI (Vendor Managed Inventory): Ou Estoque Administrado pelo Fornecedor, refere-se a uma ferramenta muito importante para a cadeia de suprimentos, que trabalha com Just-in-time. Por intermédio do sistema EDI, o fornecedor poderá verificar a real necessidade de produto, no momento certo e na quantidade necessária. Para Wanke (2010), o VMI constituiria outra denominação para o Continuous Replenishment Program (CRP) que representa uma iniciativa de fabricantes de bens de consumo com o objetivo de criar maior controle sobre os

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níveis de estoque nos varejistas e permitir maior liberdade para determinação das políticas de reposição, entretanto, o fornecedor teria responsabilidade exclusiva sobre as decisões de reposição.

f) ECR (Efficient Consumer Response): É um conjunto de práticas desenvolvidas por fabricantes, distribuidores e varejistas com o objetivo de obter ganhos por eficiência nas atividades comerciais e operacionais entre as empresas, prestando um serviço de qualidade ao consumidor final. Não é considerado nem um sistema ou técnica.

No mundo corporativo, a tecnologia RFID tem despertado cada vez mais o interesse da indústria em diferentes segmentos tais como logística, farmacêutica, rastreamento de animais e varejo. Em todas essas áreas, RFID provê uma melhor rastreabilidade, visibilidade e compartilhamento de informações entre parceiros comerciais a respeito dos ativos dentro de cada etapa do processo de fabricação, distribuição, transporte e armazenamento em uma cadeia de suprimento.

4 A TECNOLOGIA RFID (RAdIo FREquENcy IdENTIFIcATIoN) – IDENTIFICAÇÃO POR RADIOFREQUÊNCIA.

Segundo Hessel, et al. (2009):

A tecnologia RFID (Radio Frequency Identification) – Identificação por Radiofrequência, método que utiliza ondas eletromagnéticas para acessar dados armazenados em um microchip, acoplado a uma pequena antena, identificando automaticamente os objetos nele fixados, pode ser aplicada em uma série de situações, proporcionando mais visibilidade, rastreamento e sincronização da cadeia de suprimentos, com total confiabilidade.

O RFID é uma tecnologia utilizada para identificar, rastrear e gerenciar desde produtos e documentos até animais ou mesmo indivíduos, sem contato e sem a necessidade de um campo visual. O sistema consiste em uma tecnologia de packing list eletronizado, disponibilizando dados de quantidade, tipo, origem, validade, movimentações ou manipulações de produtos.

A identificação por radiofrequência surgiu nos anos 1940, em plena Segunda Guerra Mundial, conforme foi mencionado por Laban (2005), mas foi na Guerra do Golfo, em 1991, que se consagrou como uma excelente ferramenta para a logística, à medida que os contêineres militares tiveram mapeados e delineados todos os materiais do seu interior.

O RFID se caracteriza como uma tecnologia de identificação que utiliza a radiofrequência para capturar os dados, permitindo que uma etiqueta seja lida sem a necessidade de campo visual, através de barreiras e objetos tais como madeira, plástico, papel, dentre outros.

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A Tecnologia da Informação, Utilizada na Logística Empresarial

Um sistema RFID digital funciona como um sistema poderoso de aquisição de dados em tempo real, com a vantagem de eliminação de intervenções humanas manuais e visuais, dinamizando assim o tempo de transições e assegurando eficiência e eficácia. A tecnologia RFID é utilizada para a detecção e identificação automática de um objeto.

O funcionamento do sistema RFID foi descrito por Hessel, et al. (2009), da seguinte forma:

[...] um aparelho com função de leitura envia, por meio de uma antena, sinais de radiofrequência em busca de objetos a serem identificados. No momento em que um dos objetos é atingido pela radiação, ocorre um acoplamento entre ele e a antena, o que possibilita que os dados armazenados no objeto sejam recebidos pelo leitor. Esse trata a informação recebida (identificação) e a envia ao computador. O acoplamento na maioria dos sistemas de RFID é eletromagnético (backscatter) ou magnético (indutivo). O método utilizado em uma implementação depende da aplicação, custo, velocidade e alcance de leitura. O elemento que permite a comunicação entre a etiqueta e o leitor é antena. A etiqueta e o leitor possuem uma antena cada um.

Associada à tecnologia RFID existe uma forte demanda de Tecnologia da Informação (TI) para processamento, armazenamento e análise dos dados gerados.

Um sistema de RFID básico consiste em três componentes: etiqueta, leitor e antenas.

a) Etiqueta RFID: Também conhecida como transponder (transmitter + responder), a tag contém dados que são transmitidos ao leitor no momento em que é interrogada. O propósito de uma etiqueta RFID, que consiste basicamente de um circuito integrado, é anexar fisicamente dados sobre o objeto, ou mesmo sobre seres vivos, como é o caso das etiquetas que identificam bovinos.

As etiquetas são classificadas como passivas, semipassivas ou ativas, dependendo da sua fonte de energia.

As etiquetas passivas se caracterizam por não necessitarem de baterias internas. Elas são alimentadas pela energia do campo eletromagnético do respectivo leitor. A maioria das etiquetas passivas é pequena e tem uma longa vida útil. São econômicas em relação às demais e mais comuns na indústria atual de RFID. As desvantagens dessas etiquetas são o alcance restrito de leitura e a necessidade de alta potência do leitor.

As etiquetas semipassivas são híbridas das etiquetas ativas e passivas. Esse tipo de etiqueta possui uma bateria de baixo custo que é usada para alimentar os circuitos elétricos internos, entretanto, não possui transmissor. Podem ser encontradas em tamanhos variados, dependendo do alcance e da sua funcionalidade. Esse tipo de

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etiqueta permite que os leitores utilizem potências menores e armazenem mais informações se comparadas às etiquetas passivas.

As etiquetas ativas possuem um transmissor e uma bateria interna que fornece energia para a comunicação entre a etiqueta e o leitor, influenciando diretamente no alcance dos sinais gerados. Podem armazenar uma quantidade de informação maior do que a etiqueta passiva e semipassiva. São normalmente utilizadas no rastreamento de objetos de alto valor.

b) Leitor ou interrogador de RFID: trata-se de um sofisticado equipamento de rádio e deve possuir as funções de criar, amplificar sinais de radiofrequência e enviá-los através de uma antena; receber a resposta da etiqueta, amplificar e demodular esse sinal e, organizar os dados recebidos e armazená-los por alguns instantes até poder enviá-los para um computador.

c) Antenas: São os condutores da comunicação de dados entre a etiqueta e o leitor.

O leitor normalmente está conectado a um computador central ou outro equipamento que possua a inteligência necessária para processar os dados da etiqueta.

Trata-se de uma tecnologia a ser aplicada em produtos de alto valor agregado, como por exemplo, em paletes e contêiner que circulam nas indústrias farmacêuticas e eletroeletrônicas, visando à lucratividade, pois corresponde a um processo de custo ainda elevado.

Em itens com baixo preço unitário, como commodity, não se aplica o controle de radiofrequência devido ao ônus na cadeia de suprimentos.

A tecnologia RFID é uma oportunidade excitante para os que se propõem a investigar novas e melhores formas de sua utilização para uma gestão de informações mais eficiente. Nas várias cadeias, os sistemas logísticos são informados, simultaneamente, com dados atualizados que facilitam e dinamizam o processo decisório.

A nova tecnologia da Identificação por Radiofrequência, apesar de não ser a única solução para todos os casos de aplicação, se apresenta, na atualidade, como uma ferramenta de destaque na exatidão de informações, controle e operação mais competitivos, proporcionando mais velocidade, dinamismo e confiabilidade, principalmente em relação à tecnologia do código de barras.

A tecnologia RFID pode ser aplicada em uma série de situações: segurança e controle de acessos, controle de tráfego de veículos, identificação pessoal, rastreamento de animais, identificação de objetos, dentre outros. Nas mais diversificadas áreas: setor público (controle de passaportes, identificação de ativos em bibliotecas), farmacêutico (autenticidade de produtos), automotivo (imobilizador eletrônico de motor), varejista (controle do fluxo de mercadorias), aéreo (identificação e movimentação de bagagens em aeroportos), médico-hospitalar (identificação de pacientes, controle da administração de medicamentos), entre outros.

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A Tecnologia da Informação, Utilizada na Logística Empresarial

Com o objetivo inicial de melhorar a eficiência, o controle e a rastreabilidade de materiais de toda a cadeia de fornecimento, a tecnologia RFID passou a ser utilizada pelas Forças Armadas. Segundo Giurlani (2011):

[...] o projeto foi iniciado em 2008, n.º 21 Depósito de Suprimentos do Exército (21 D SUP), localizado no bairro da Lapa, em São Paulo, que atende 61 bases militares no estado paulista. Todos os itens estocados nas unidades de depósito são rubricados segundo a sua finalidade (estoque de distribuição geral e estoque de distribuição por área jurisdicional), a qual é estabelecida pelo órgão gestor da logística do Exército Brasileiro – o Comando Logístico, por intermédio da sua Diretoria de Abastecimento.

Mas o resultado alcançado no 21.º D SUP foi além daquele inicialmente pretendido, conforme mencionou Giurlani (2011), pelas características de rapidez e precisão, o emprego da tecnologia RFID permitiu a redução da ordem de 23% das necessidades de material para o estoque de área (em favor do estoque geral) de materiais da Classe II (fardas, camisetas, coturnos, capacetes, coletes à prova de balas, barracas e produtos para acampamento, dentre outros).

Pelas informações fornecidas no artigo intitulado “Na medida certa”, publicado na Revista Tecnologística n.º 187, o emprego da tecnologia RFID permitirá, ainda, melhorar o planejamento de compras naquela unidade do Exército Brasileiro.

Das pesquisas realizadas, constata-se que o Centro Logístico da Aeronáutica (CELOG), da Força Aérea Brasileira (FAB), também utiliza a tecnologia RFID na coleta automática de dados de alguns materiais distribuídos e outros que se encontram armazenados.

As aplicações da tecnologia RFID no Exército Brasileiro e na Força Aérea Brasileira, como experiências positivas, demonstram a viabilidade da expansão da utilização da nova tecnologia no âmbito das Forças Armadas. A atividade Distribuição, da Função Logística Suprimento, torna-se mais dinâmica, com reflexos positivos no controle dos processos de recebimento, armazenagem e aplicação final do suprimento.

Estudos mais específicos devem ser iniciados objetivando apontar quais são as classes do Sistema de Classificação Militar aptos a recepcionarem o emprego da tecnologia RFID.

5 CONCLUSÃO

“A experiência mostra que os homens são governados por aquilo que costumam ver e fazer, a ponto de mesmo as melhorias mais simples e óbvias nas ações mais comuns serem adotadas com hesitação, relutância e lentidão”. (Alexander Hamilton, 1791)

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Warlei Oliveira Gomes

No estudo da logística, ao longo da história humana, constata-se que as ações logísticas sempre existiram, sem, contudo terem, necessariamente, esta denominação.

As atividades logísticas, representadas pelo binômio “previsão e provisão”, atuam subsidiando a segurança e o desenvolvimento com os meios necessários, respaldados pela Estratégia de Defesa e pelo Desenvolvimento, respectivamente.

Ultrapassada a análise histórica e evolutiva da logística, que para muitos autores teve sua origem na atividade militar, chega-se aos dias atuais, à visão empresarial dessa atividade.

Na atualidade, a logística é vista por muitos especialistas como uma ferramenta gerencial capaz de promover não só a diminuição dos custos operacionais, mas também como uma estratégia competitiva para o alcance de novos mercados e novos clientes.

Dos ensinamentos difundidos por Ballou (2011), sobressai que “Logística é área vital da administração de empresas em muitas organizações.

A Logística Empresarial, aproveitando-se dos ensinamentos da Logística Militar, passou a empregar novas técnicas e métodos que conduziram à racionalização de aquisições, armazenagem e distribuição de materiais. O desenvolvimento das novas tecnologias propiciou a interligação de entidades ou organizações que passaram a atuar em conjunto, de forma cooperativa, com vistas a administrar o fluxo de materiais e informações, desde os fornecedores até os clientes finais, contextualizando o que se denomina “cadeia de suprimentos”.

Com o desenvolvimento das novas tecnologias da informação para uso na área de informática e de automação, principalmente nas últimas décadas, passou-se a vivenciar uma nova era, a da integração dos sistemas, do compartilhamento de dados e informações e da maximização das potencialidades.

Constata-se o surgimento de diversos sistemas, que passaram a se interagir, afastando a idéia ou a possibilidade da existência de “sistema isolado”.

Com a utilização da Tecnologia da Informação e suas potencialidades, inseridos os seus Sistemas de Informação, foram desenvolvidas ferramentas objetivando o tratamento e a recuperação de dados para a transformação e a consolidação de informações disponibilizadas aos usuários. Ainda se está passando pelo período da evolução tecnológica, inserida no contexto de “mundo globalizado”.

Neste contexto, ressalta-se o RFID - Radio Frequency Identification, que emprega tecnologia de identificação via radiofrequência e pode ser considerado como uma das mais novas tecnologias de coleta automática de dados. Sua maior vantagem é o fato de permitir a codificação em ambientes não favoráveis e em produtos onde o uso de código de barras, por exemplo, não é eficiente. Esse sistema funciona com uma antena, um transmissor e um decodificador. Esses componentes interagem através de ondas eletromagnéticas, transformando-as em informações capazes de serem processadas por um computador.

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A Tecnologia da Informação, Utilizada na Logística Empresarial

Verifica-se que a Tecnologia da Informação (TI) tem prestado incontestável auxílio na evolução da Logística, em primeiro plano a empresarial, maximizando a possibilidade de lucro e, secundariamente, a Logística Militar, minimizando custos. O desenvolvimento da TI, em especial dos Sistemas de Informação, permeando o cerne das organizações e instituições públicas, torna-se fator preponderante para a melhoria de processos, modernização administrativa, desempenho gerencial, vantagem competitiva, qualidade, dentre outros benefícios.

A aplicação da tecnologia RFID não pode ser considerada como a única e exclusiva solução para todos os problemas relativos à melhoria da eficiência na gestão de informações. Atualmente, se devida e corretamente empregada, como observado nos casos do Exército Brasileiro e da Força Aérea Brasileira, poderá se tornar uma ferramenta bastante útil para o Ministério da Defesa, demonstrando também ser potencialmente ágil para subsidiar a tomada de decisão na área logística, no âmbito das Forças Armadas.

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Warlei Oliveira Gomes

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Defesa Alimentar no Teatro de Operações, Combate ao Inimigo Invisível

DEFESA ALIMENTAR NO TEATRO DE OPERAÇÕES, COMBATE AO INIMIGO INVISÍVEL

Mário Roberto Ziccardi de Camargo SallesInspetor do Departamento de Polícia Rodoviária Federal/RJ, estagiário do Curso de Logística e Mobilização Nacional da Escola Superior de Guerra, em 2011.

Resumo

Qual o impacto de um surto de toxinfecção alimentar no Teatro de Operações Militares? Como se pode, de forma simples e com baixo custo, ampliar as defesas brasileiras contra essa ameaça? Este artigo destaca os principais agentes etiológicos das toxinfecções alimentares, e seus impactos em operações militares, descrevendo os aspectos facilitadores para sua ação. Constrói um cenário, onde a disseminação desses agentes no Teatro de Operações impacta negativamente o êxito da missão. Propõe soluções de fácil aplicação e baixo custo com emprego a curto e médio prazos.

Palavras-chave: Alimentar; Alimento; Defesa; Toxinfecção; Operações, Militares.

1 INTRODUÇÃO

Historicamente, a espécie humana tem sofrido a ação de agentes etiológicos que, à sua época, foram implacáveis, causando dor e sofrimento, e que muitas vezes tiveram mais de um ciclo de destruição, com alguns casos que nos assombram até os dias de hoje.

Um dos grandes nomes na história do estudo das infecções e suas disseminações é o de Ignaz Semmelweis, obstetra austríaco, que fez observações sistemáticas de casos de septicemia em parturientes (1845-1860). Ele relacionou a alta mortalidade das parturientes com o fato dos estudantes de medicina e médicos saírem da sala de necrópsia e se dirigirem para a sala de parto sem a adequada antissepsia de suas mãos. Ao instituir a lavagem das mãos entre esses dois procedimentos, houve uma queda significativa das infecções. Na época, Semmelweis foi duramente criticado e suas ideias foram ignoradas por muitos anos, porém, após a sua aceitação, foram fundamentais para a redução da mortalidade provocada por infecções.

A implacabilidade de vários desses agentes infecciosos é tão notória, que muitos são os casos de utilização deles como armas de guerra não convencional. Essa realidade já se fez presente em vários conflitos na Idade Média, quando se atiravam corpos de vítimas de doenças graves, como a varíola ou peste bubônica (peste negra), por cima das muralhas de cidades sitiadas. Adotava-se também

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a utilização de cadáveres em estado de putrefação nos reservatórios de água, tornando-a imprópria ao consumo.

Nos tempos atuais, o homem ainda está sujeito às ações dessa natureza, como as atribuídas ao grupo terrorista Al-Qaeda, que teria tentado disseminar o bacillus anthracis (carbúnculo), com utilização de correspondências contaminadas. Esses atentados despertaram novamente as preocupações com as armas não convencionais. Essas preocupações desencadearam uma série de medidas, principalmente na logística de salvamento, com a elevação do status das ações de prevenção de danos, principalmente aos recursos alimentares.

No entanto, um fator parece ter sido deixado em segundo plano. A grande maioria dos agentes etiológicos veiculados por alimentos pode ser encontrada no próprio ambiente do Teatro de Operações. Não seria necessária uma intervenção inimiga para deflagrar um surto toxinfeccioso com graves danos à saúde da tropa e perda de sua capacidade operacional. A simples manutenção dos níveis atuais de prevenção seria suficiente para manter o alto risco a que nossas tropas em operações se submetem. O treinamento dos combatentes não aborda com a devida importância os cuidados higiênicos sanitários que devem ser tomados no Teatro de Operações, e mesmo que este combatente tenha essa noção, os equipamentos oferecidos não contemplam produtos para antissepsia das mãos e desinfecção dos utensílios, antes das refeições.

Os conhecimentos sobre os ciclos destas toxinfecções alimentares, e a susceptibilidade de seus agentes a diversas substâncias, já permite que se adote medidas de prevenção eficazes.

2 OBJETIVO

O objetivo é demonstrar, através da proposição de um cenário, o impacto de uma toxinfecção alimentar no Teatro de Operações, propondo soluções de baixo custo e fácil aplicação a curto e médio prazos.

3 DA PESQUISA

O levantamento bibliográfico sobre toxinfecção, em operações militares e suas consequências danosas, revelou que quase nada se publica sobre este assunto, apesar de muitos casos terem sido relatados por militares de altas patentes em conversas preliminares.

A falta de registro dos fatos ocorridos, certamente, dificulta as tomadas de decisão e as proposições de solução.

Partirei dos conhecimentos levantados em entrevistas informais com Comandantes das três Forças, e da analogia com acontecimentos assemelhados envolvendo civis.

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Vários casos ocorridos em eventos civis podem trazer informações que servem para formar a ideia de qual seria o impacto de toxinfecções alimentares em operações militares, principalmente quando se analisa a velocidade da manifestação dos sintomas e a capacidade de disseminação dos agentes patológicos envolvidos.

Em Araraquara, estado de São Paulo, no ano 1983, entre a madrugada e o final da tarde do dia 7 de abril, 561 funcionários de uma empresa apresentaram problemas gastrintestinais que os incapacitaram. A refeição servida para 922 pessoas, no refeitório, durante o almoço do dia anterior, composta de carne assada com molho, linguiça assada, salada, arroz, feijão, pão, abacaxi, água e leite encontrava-se contaminada por Salmonella sp.

No Município de Ibiúna, São Paulo, no dia 19 de fevereiro de 2003, 120 operários de uma empresa da região foram atendidos no Pronto-Socorro do Hospital local. As pessoas tiveram os seguintes sintomas: dores abdominais, náuseas, vômitos e diarreia. Os operários relataram que os sintomas debilitantes apareceram dez a doze horas após o almoço.

Em setembro de 2004, na cidade de São Paulo, ocorreu um surto de toxinfecção alimentar em um evento científico promovido por uma instituição pública que contratou um bufê para o fornecimento das refeições. Foram atingidos 28 dos 55 participantes que se alimentaram no primeiro dia do evento, tendo sido identificada a Salmonella Typhimurium como causadora do surto, e implicado o sanduíche de tomate seco com queijo branco como fonte da contaminação.

Em dezembro de 2007, um surto de toxinfecção alimentar acometeu 54 funcionários de uma empreiteira a serviço em uma refinaria do município de Cubatão, São Paulo. Os funcionários apresentaram os sintomas de: diarreia, cólica abdominal, náuseas, mal-estar, cefaleia, vômitos, tontura e febre. Amostras de carne assada estavam contaminadas por coliformes termotolerantes, frequentemente associados à toxinfecções alimentares.

Considerando a vasta literatura que relata a complexidade do problema envolvendo as toxinfecções alimentares em ambientes supostamente controlados, era de se esperar a existência de medidas profiláticas por parte das Forças Armadas no Teatro de Operações. Porém, após análise da logística referente à alimentação adotada em diversos tipos de operações militares, verifiquei que, apesar de altos investimentos com grande desenvolvimento na cadeia de suprimento, existem vulnerabilidades a serem sanadas.

É importante ver o que dizem as Portarias Normativas n.º 1.416/MD e n.º 1.417/MD, ambas de 16 de outubro de 2008, que aprovam a Ração Operacional de Combate – R2 e a Ração Operacional de Emergência – R3, respectivamente. As duas, no Anexo I número III letra c, trazem o seguinte texto:

c) itens acessórios: destinam-se a propiciar condições adequadas para o consumo dos demais itens. São eles: fogareiro portátil (1 unidade);

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combustível gel (1 unidade); caixa de fósforo (1 unidade); purificador de água (1cartela com 5 comprimidos ou frasco tipo conta-gotas); repositor hidroeletrolítico (1 unidade); e papel para fins múltiplos (6 unidades dobradas).

Nota-se que não se faz menção a nenhum produto destinado à higienização das mãos e utensílios a serem empregados no ato de alimentar-se. O combatente fica sujeito aos agentes etiológicos presentes nestas superfícies, não adiantando o fato de ter-se gasto verbas, tecnologia e logística para colocar em suas mãos, provavelmente contaminadas, um produto microbiologicamente, seguro.

Dados obtidos nesta pesquisa, com respostas anônimas de 183 recrutas da Força Aérea Brasileira, em outubro de 2011, sobre seus hábitos de higiene antes das refeições, vão ao encontro das afirmações acima. Os recrutas receberam um questionário (figura 1) com três perguntas: sobre seus hábitos de higiene, sobre a importância que dão ao assunto e se tiveram alguma instrução a respeito. Com os resultados (figura 2) constatou-se que, apesar de 84,7% declararem a falta de instrução sobre o assunto em questão, 90,71% dos recrutas entrevistados dão muita importância ao tema. Essa importância não se reflete nos hábitos, pois 36,07% confessaram não lavar as mãos antes de se alimentar. Este último número pode ser bem maior, considerando que as respostas podem ter sido influenciadas pela importância que os entrevistados dão ao tema. Importância essa que implicaria em maior resistência ao assumir não terem o hábito que eles próprios julgam relevante. Essa realidade por si só já desenha um cenário desfavorável, que seria fatal para qualquer tropa em operação.

Figura 1

Questionário para artigo de conclusão do Curso de Logística e Mobilização Nacional CLMN 2011 da Escola Superior de Guerra.Será de fundamental importância que as respostas sejam verdadeiras, pois poderão servir para melhorar as condições de sobrevivência nas operações militares.Pergunta 1Você tem o hábito de lavar as mãos antes de se alimentar?( ) Sim ( ) NãoPergunta 2Qual a importância de lavar as mãos antes das refeições?( ) Pouca importância. ( ) Média importância. ( ) Muita importância.Pergunta 3Você recebeu alguma instrução sobre a prevenção de doenças contraídas (“pegas”) ao se alimentar?( ) Sim ( ) Não

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Defesa Alimentar no Teatro de Operações, Combate ao Inimigo Invisível

Figura 2.

RECRUTAS PESQUISADOS. 183

LAVAM AS MãOS ANTES DE SE ALIMENTAR. 117 63,93%

NãO LAVAM AS MãOS ANTES DE SE ALIMENTAR. 66 36,07%

IMPORTÂNCIA QUE DãO A LAVAR AS MãOS ANTES DE SE ALIMENTAR.* NENHUM RECRUTA RESPONDEU POUCA IMPORTÂNCIA.

MUITA IMPORTÂNCIA

166

90,71%

MÉDIA IMPORTÂNCIA

17

9,29%

TIVERAM INSTRUÇãO SOBRE O TEMA. 28 15,30%

NãO TIVERAM INSTRUÇãO SOBRE O TEMA. 155 84,70%

4 OS PRINCIPAIS AGENTES ETIOLÓGICOS

Dentre os vários organismos causadores de doenças relacionadas à alimentação, destacam-se, para o estudo que aqui se desenvolve, os que têm o menor tempo de incubação, com alto risco de disseminação, que teoricamente trariam um impacto mais significativo às operações. São eles:

4.1 STAPHYLOCOCCUS AUREUS

Produtor de toxina termoestável (resistente à variação de temperatura).Fonte: Cabelo, nariz, boca, mãos e pele de animais.Contaminação: Tocar alimentos após cocção com mãos ou utensílios contaminados.Incubação: 1 a 6 horas.Duração: 1 a 3 dias.Sintomas: Mal-estar, vômito e diarreia. Sem febre.Destruído em 2 minutos a temperatura de 65,5º C.

4.2 STREPTOCOCCUS FECALIS

Incubação: 2 a 18 horas.Duração: 6 a 42 horas.

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Sintomas: Mal-estar, às vezes vômitos, diarreia.Apresentam baixa patogenicidade, mas são frequentemente agentes oportunistas em infecções hospitalares ou em indivíduos com baixa resistência.

4.3 CLOSTRIDIUM PERFRINGENS

Produtor de esporos e toxinas resistentes às altas temperaturas.Fonte: Solo, intestino do homem e animais, hortaliças e temperos.Contaminação: Matéria-prima (carnes, aves e hortaliças), contaminação cruzada entre alimentos cozidos e crus, superfícies e utensílios.Incubação: 2 a 22 horas.Duração: até 12 horas.Sintomas: Predominam diarreia e cólicas abdominais, sem febre.Destruído a 100º C em 20 minutos.

4.4 BACILLUS CEREUS

Produtor de esporos e toxinas termo resistentes.Fonte: Solo, cereais, grãos e hortaliças.Contaminação: Contaminação de superfícies com hortaliças, caixas não higienizadas e mãos contaminadas.Incubação: 2 a 18 horas.Duração: até 12 horas.Sintomas: Predominam vômitos e náuseas, raras vezes se observa diarreia ou febre.Destruído a 100º C por 5 minutos.

4.5 - SALMONELLA SP

Fonte: Intestino de animais e homens, carne e aves, rações animais (farinha de ossos, farinha de sangue e farinha de peixe).Contaminação: Contaminação cruzada entre matéria-prima contami-nada com alimentos cozidos ou desinfetados, através das mãos, equi-pamentos, utensílios e bancadas. Cozimento inadequado de alimento contaminado.Incubação: 12 a 48 horas.Duração: 1 a 7 dias.Sintomas: Diarreia, cólicas, mal-estar, náuseas e vômitos. Pode haver febre.Destruída a 66º C por 1 minuto.

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Defesa Alimentar no Teatro de Operações, Combate ao Inimigo Invisível

4.6 SHIGELLA SP

Fonte: Intestino do homem e mãos contaminadas, água contaminada por esgoto, hortaliças regadas com água contaminada.Contaminação: Mãos contaminadas em contato com alimento já cozido ou higienizado, água não tratada.Incubação: 1 a 3 dias.Duração: 2 a 6 dias.Sintomas: Diarreia com muco, pus e sangue, além de tenesmos (constante vontade de evacuar, acompanhada de cólicas). Pode ocorrer febre.Destruída a 60º C por 15 minutos.

4.7 VIBRIO CHOLERAE

Fonte: intestino do homem e mãos contaminadas, água contaminada por esgoto, hortaliças regadas com água contaminada.Contaminação: Mãos contaminadas em contato com alimento já cozido ou higienizado, água não tratada.Incubação: 1 hora a 5 dias.Duração: 7 a 14 dias.Sintomas: Diarreia aguda com aspecto de agua de arroz. Podem ocorrer vômitos, dor abdominal e febre.Destruída a 60º C por 15 minutos.

Na figura 3, encontram-se, de forma resumida, as principais características dos agentes causadores de toxinfecção alimentar. É necessário de destacar que, na maioria dos casos, o período de incubação é muito curto e a transmissão se dá pelo contato direto e indireto, o que é de fundamental importância para determinar o grau de disseminação. Os efeitos debilitadores ocorrem ainda durante o fluxo das ações no Teatro de Operações, repercutindo, negativamente, nos resultados esperados. Os primeiros indivíduos infectados passam a transmitir o agente patogênico, mesmo antes de manifestar os sintomas. Suas mãos, ao tocar objetos de uso comum, tais como: maçaneta, cantil, volante de veículos, armamento, munição e carregadores, deixam os microrganismos que irão contaminar outros indivíduos do grupo que por sua vez passam a ser agentes disseminadores.

Depois de instalado o foco da doença em uma área povoada, torna-se muito difícil reagir antes que se manifestem os primeiros sintomas. As medidas de combate aos focos, normalmente, se iniciam após a grande maioria dos membros do grupo atingido já terem se contaminado, pois são reativas ao surgimento destes sintomas.

Somente em áreas em que se adotam rotinas preventivas de desinfecção e antissepsia é que se pode minimizar o impacto negativo desses agentes, eliminando os focos e cortando seus ciclos de transmissão.

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Mario Roberto Ziccardi de Camargo Salles

Figura 3: Quadro resumido com as características dos agentes destacados.20

Doença Salmonelose Bacilose Cólera Estafilococose

Patógeno Salmonella spBacillus cereus

Vibrio cholerae

Staphylococcus aureus.

Produtor de toxinas?

Não Sim Sim Sim

Incubação 8 a 48 horas 2 a 18 horas.1 hora a 5 dias

1 a 7 horas

Duração 1 a 7 dias 12 horas 7 a 14 dias 24 a 48 horas

Sintomas

Cólicas, cefaleia, náusea, vômito, febre, diarreia, anorexia.

Predominam vômitos e náuseas, raras vezes se observa diarreia ou febre.

Diarreia aguda, semelhante à água de arroz, desidratação. Podem ocorrer vômitos.

Náusea, vômito, diarreia, desidratação, salivação excessiva, sudorese.

Alimentos envolvidos

Aves e ovos principalmente, carnes, leite, molhos a base de ovos. Produtos que utilizam ovos crus: maionese caseira, gemada, mousses.

Arroz cozido mantido por longo período à temperatura ambiente.

Água não tratada, alimentos crus ou cozidos comidos já frios.

Presunto e produtos cárneos, derivados de leite, cremes e alimentos proteicos.

5 CENÁRIO PROPOSTO

Durante uma operação de combate a guerrilheiros, que estariam utilizando solo brasileiro, na região amazônica, para processamento de cocaína, um pelotão do Exército Brasileiro se prepara para a ação.

Apesar de toda a dificuldade, a logística empregada estabelece uma zona administrativa a dez quilômetros da zona de combate, onde, supostamente,

20 Fonte: FRANCO, B.D.M.; LANDGRAF M. Microbiologia dos alimentos, São Paulo: Atheneu,1996.

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Defesa Alimentar no Teatro de Operações, Combate ao Inimigo Invisível

estariam as instalações inimigas. Tendo em vista a complexidade das ações a serem deflagradas, toda a

infraestrutura do Módulo de Alimentação a Pontos Remotos – MAPRE foi deslocada para a Zona Administrativa – ZA, estabelecendo-se um rigoroso controle das refeições distribuídas.

Os combatentes recebem diariamente rações R2 para mantê-los nas investidas que irão identificar a localização exata do inimigo para a ação final.

Durante o retorno de um destes deslocamentos, por volta das 14 horas, um grupo de soldados encontra uma tribo indígena e o soldado X, inadvertidamente, pega no colo uma criança que passava por eles, e a leva de volta para perto da mãe. O grupo prossegue com a missão e, antes de chegar à ZA, atravessam um córrego com o auxilio de uma corda, que é colocada em posição pelo soldado X. Após a travessia, às 16 horas, param para um rápido lanche. O soldado X e os demais abrem os sacos de ração, retirando com as mãos os itens que irão consumir e os utensílios que irão utilizar. Alimentam-se e às 18 horas chegam à Zona Administrativa, já com mal-estar.

Cinco soldados vão ao banheiro e percebem que estão com diarreia profusa, vômitos e muita sede. No dia seguinte, continuam com os sintomas e vão buscar atendimento médico. O médico imediatamente reconhece as possibilidades e dispara um alerta ao comando da operação, porém, tanto o comandante como seu estado-maior já apresentam os sintomas.

O grupamento do dia retorna mais cedo com a notícia que na tribo visitada pelo grupo do soldado X havia seis mortos e vários índios com os sintomas de diarreia aguda, semelhante à água de arroz, desidratação e vômitos. Entre os mortos, o menino que o soldado X pegou no colo. Após vários dias, já com a operação cancelada e a logística de saúde atuando intensamente, foi confirmado o diagnóstico de cólera, com 78% dos militares afetados em 48 horas, ficando estes fora de combate por 9 dias em média.

6 CONCLUSÃO

Diante do cenário apresentado, não resta a menor dúvida de que a defesa alimentar deve ser levada em consideração nos planejamentos das operações. Porém, com um enfoque mais primário, pois não adiantará toda a tecnologia e recursos empenhados na formulação, produção, distribuição e salvaguarda de rações e água de qualidade, se não houver um produto antisséptico disponibilizado nos kits operacionais e condições mínimas de treinamento e orientações nutricionais e higiênico-sanitárias, para todos os níveis das Forças Armadas. Não se pode deixar de lado o fato de que os principais agentes patogênicos, veiculados no momento da alimentação, já estão no Teatro de Operações. Podem ainda, neste, se instalar naturalmente, ou através de ações inimigas, espreitando, prontos para agir caso

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Mario Roberto Ziccardi de Camargo Salles

encontrem o ambiente favorável. Esses agentes podem se utilizar da própria ração saudável, manipulada inadequadamente, como meio de cultura para seu fortalecimento antes do ataque.

Devido à frequência com que determinados surtos são observados, em sua maioria provocados pela exposição do alimento ao ambiente por tempo prolongado e condições de higiene inadequadas, torna-se relevante insistir na necessidade de aprimorar os procedimentos de higienização ambiental.

Três medidas, duas de curto prazo e outra de médio prazo seriam suficientes para reduzir drasticamente o risco de derrota em operações, decorrentes de baixas por toxinfecções alimentares. As de curto prazo e baixo custo se baseiam em estudos existentes sobre antissepsia das mãos com álcool gel 70% (KAWAGOE, 2004), que confirmam a redução de 99,9% da contaminação de mãos que contenha matéria orgânica. Sugere-se, então, a inclusão imediata de dois sachês com 7g de álcool gel cada, a uma concentração de 70% para cada refeição nos kits R2 e R3. Um para assepsia das mãos e outro para desinfecção dos utensílios, com as devidas orientações de uso.

Outra sugestão é a implantação urgente de rotinas de desinfecção de superfícies de uso comum como maçanetas, torneiras e corrimão, com panos descartáveis umedecidos em álcool 70% e a antissepsia das mãos com álcool gel a 70%, localizado em dispensers dispostos, estrategicamente, na Zona Administrativa.

Para médio prazo, a solução proposta é a introdução da matéria, ‘Defesa Alimentar no Teatro de Operações’, nos cursos de formação de todos os níveis das Forças Armadas, com noções de biologia, com ênfase nos ciclos biológicos dos principais agentes patogênicos endêmicos e possíveis armas biológicas.

O fato de 84,7% dos recrutas pesquisados afirmarem não terem tido instrução sobre o tema fortalece a necessidade de implantar a matéria no seu curso de formação, tanto em regiões mais desenvolvidas, como nas menos favorecidas, na tentativa de equalizar conhecimento básico sobre o assunto. Plantando esses conhecimentos e dando alternativas para promover defesa contra as toxinfecções alimentares, ampliar-se-á o espectro de ação de medidas para todo o território nacional, pois esses recrutas, bem orientados, serão multiplicadores das informações adquiridas, quando em contato com suas comunidades.

Adotando-se estas três medidas, reduzir-se-á a vulnerabilidade com relação a doenças transmitidas no ato da alimentação, preparando melhor as tropas brasileiras, tanto para defesa de infecções naturais, como para uma possível ação não convencional.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Defesa. Portaria Normativa n.º 1.416/MD, de 16 de outubro de 2008. Aprova a ração operacional de combate-R2. Disponível em: www.sgla.eb.mil.br/sistema/be/copiar.php,

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301Caderno de Estudos Estratégicos de Log. e Mob. Nac., v.1, n.4, p. 291-300, jan./dez. 2012

Defesa Alimentar no Teatro de Operações, Combate ao Inimigo Invisível

______. Ministério da Defesa. Portaria Normativa n º 1.417/MD, de 16 de outubro de 2008. Aprova a ração operacional de emergência-R3. www.sgla.eb.mil.br/sistema/br/copiar.php.

LANDGRAF, M.. Microbiologia dos alimentos. São Paulo: Atheneu, 1996.

GERMANO, P. M. L. et al. Prevenção e controle das toxinfecções de origem alimentar. Revista Higiene Alimentar, São Paulo, v. 7, n. 27, p. 6-11, 1993.

GUIMARãES, A.G. ; LEITE, C.C.; TEIXEIRA, L. D. S. ; SANT.ANNA, M. E. B.; ASSIS, P.N. Detecção de salmonella spp. em alimentos e manipuladores envolvidos em um surto de infecção alimentar. Revista Brasileira de Saúde e Produção Animal, Bahia, v. 1, n. 2, p. 1-4, 2001.

KAWAGOE, Julia Yaeko. Higiene das mãos: comparação da eficácia antimicrobiana do álcool - formulação gel e líquida - nas mãos com matéria orgânica. 2004. Tese (Doutorado em Enfermagem na Saúde do Adulto) - Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2004. Disponível em: <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/7/7139/tde-17112006-095710/>. Acesso em: 11 jan. 2011.

SABIONI, J.G. et al. Intoxicação alimentar por queijo Minas contaminado com Staphylococcus aureus. Revista de Saúde pública, S. Paulo, v.5, n22, p. 458-61, 1988.

SOARES, Celina Maram et al. Contaminação ambiental e perfil toxigênico de bacillus cereus isolados em serviços de alimentação. Ciência Rural, Santa Maria, v.38, n.2, p.504-510, mar./abr., 2008.

SOUZA, Levy Sardenberg. A importância da segurança alimentar nas operações militares. Caderno de Estudos Estratégicos de Logística e Mobilização Nacional,Rio de Janeiro, v.1, n.2, p. 241-252, jan./dez. 2009.

SABIONI, J.G. et al. Intoxicação alimentar por queijo minas contaminado com staphylococcus aureus. Revista de Saúde Pública, São Paulo, n. 22, p.458-61, 1988.

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Esta revista foi impressa na gráfica da ESCOLA SUPERIOR DE GUERRAFortaleza de São João - Av. João Luís Alves, s/n - Urca - Rio de Janeiro - RJ

CEP 22291-090 - www.esg.br

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ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA

CURSO DE LOGÍSTICA E MOBILIZAÇÃO NACIONAL

A origem da Escola Superior de Guerra remonta aos idos de 1942, quando com a

criação do Curso de Alto Comando, por meio da Lei de Ensino Militar. Sete anos depois,

em 20 de agosto de 1949, pelo Decreto nº 785, o então Presidente da República Eurico

Gaspar Dutra criou a Escola Superior de Guerra, instituto de altos estudos, subordinado

diretamente ao Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, e destinada a desenvolver e

consolidar os conhecimentos necessários para o exercício das funções de direção e

planejamento da segurança nacional.

Em 1957, nascia o Curso de Mobilização Nacional na ESG, pelo Decreto nº 40.835

de 24 de janeiro de 1957, do então Presidente da República Juscelino Kubitschek, que

funcionou nos anos de 1958 e 1959, e cuja finalidade era: “cooperar no estabelecimento

da doutrina de Mobilização Nacional e preparar civis e militares para as funções

relacionadas com a Mobilização Nacional (Boletim Interno nº 9 de 29 de janeiro de 1957,

da ESG)”.

De 1982 a 1986, o Curso Básico de Mobilização Nacional se estruturou e funcionou

na Escola Nacional de Informações (EsNI), deixando o ambiente da ESG.

Em 1991, este importante Tema da Soberania Nacional retorna à Escola Superior

de Guerra, agora com o nome de Curso de Logística e Mobilização da Expressão Militar do

Poder Nacional, embrião do atual Curso.

Em 1994, o Curso de Logística e Mobilização da Expressão Militar do Poder

Nacional passa a se chamar Curso de Introdução à Mobilização Nacional.

À procura de sua derradeira identidade, de 1997 a 2001, o Curso recebe uma nova

denominação: Curso Intensivo de Mobilização Nacional.

Finalmente em 2002, a Escola Superior de Guerra instituiu aquele que perdura até

os dias atuais o Curso de Logística e Mobilização Nacional que tem como principal

objetivo habilitar civis e militares para o exercício de funções logísticas nas Forças

Armadas e em órgãos vinculados ao Sistema Nacional de Mobilização (SINAMOB) do

Poder Nacional.

“Ganha a guerra, quem mobiliza primeiro, e não quem dá o primeiro tiro”

(Moltke)