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ISCTE - IUL Engenharia de Telecomunicações e Informática Engenharia de Informática, 1 o Ano Cadeira: Análise Matemática II Caderno : Análise Complexa Elaborado de: Rosário Laureano, Helena Soares, Diana Mendes Departamento de Métodos Quantitativos Maio de 2011

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ISCTE - IUL

Engenharia de Telecomunicações e Informática

Engenharia de Informática, 1o Ano

Cadeira: Análise Matemática II

Caderno : Análise Complexa

Elaborado de: Rosário Laureano, Helena Soares, Diana Mendes

Departamento de Métodos Quantitativos

Maio de 2011

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Capítulo 1

Funções analíticas

1.1 Funções complexas de variável complexa

Consideremos uma função f : D → C, onde D é um subconjunto de C. A função f diz-se uma

função complexa de uma variável complexa. Trata-se de uma correspondência que associa a

cada elemento z ∈ D um único elemento w no plano complexo (designado por imagem de z por

f ou valor de f em z):

w = f(z) = f(x+ yi) = u(x, y) + v(x, y)i,

onde u(x, y) e v(x, y) são funções reais de duas variáveis reais x e y, designadas por parte real e

parte imaginária de f(z), respectivamente. O conjunto D ⊆ C é designado por domínio de fe o conjunto das imagens w é designado por contradomínio de f .

Exemplo 1 Consideremos a função f(z) = z2 + 3. Temos

f(x+ yi) = (x+ yi)2 + 3 = x2 + 2xyi− y2 + 3

=¡x2 − y2 + 3

¢+ 2xyi,

e logo u(x, y) = x2 − y2 + 3 e v(x, y) = 2xy. O domínio de f é todo o conjunto C.

Exemplo 2 A função f(z) = z/¡z2 + 1

¢tem por domínio o conjunto

D =©z ∈ C : z2 + 1 6= 0

ª.

Dado que

z2 + 1 = 0⇔ z2 = −1⇔ z = i ∨ z = −i,

podemos concluir que D = C\ −i, i .1

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2 CAPÍTULO 1. FUNÇÕES ANALÍTICAS

Exemplo 3 Seja f a função definida por f(z) = z2 − 4z +Re(z). Então,

f(x+ yi) = (x+ yi)2 − 4 (x+ yi) + x = (x2 − y2 − 3x) + (2xy − 4y)i,

e logo u(x, y) = x2 − y2 − 3x e v(x, y) = 2xy − 4y. O domínio de f é todo o conjunto C.

Nota 1 Verificamos que a cada função f(z) corresponde um par de funções reais de duas var-

iáveis reais, u(x, y) e v(x, y), e que o recíproco também se verifica, isto é, f(z) fica completamente

determinada pelas respectivas funções u(x, y) e v(x, y).

Exemplo 1 Seja f a função complexa de variável complexa tal que u(x, y) = xy e v(x, y) =

3x2 − y3. Sem determinar a expressão f(z) de f na variável z é possível determinar a imagem w

de qualquer objecto z. Por exemplo, a imagem de z = 1− 2i é o número complexo w = −2 + 11i,visto que

f(1− 2i) = u(1,−2) + iv(1,−2) = 1 · (−2) + i(3− (−8)) = −2 + 11i.

Consideremos o número complexo z0 = x0 + y0i. Se z = x+ yi, a expressão

|z − z0| =q(x− x0)

2+ (y − y0)

2

representa a distância entre os afixos Z e Z0 de z e z0, respectivamente. Como tal, os pontos do

plano complexo que satisfazem a equação |z − z0| = ε, ε > 0, são os pontos da circunferência de

centro z0 e raio ε.

Eixo real

ε

|z-z0|=ε

z0 •

Eixo imaginário

Exemplo 4

1 A condição |z| = 1 é a equação da circunferência de centro z0 = 0 e raio ε = 1.

2 A condição |z − 1 + 3i| = 6 é a equação da circunferência de centro z0 = 1− 3i e raio ε = 6.

3 A condição |z| ≤ 1 caracteriza o círculo de centro z0 = 0 e raio ε = 1, designado por círculo

unitário na origem.

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1.1. FUNÇÕES COMPLEXAS DE VARIÁVEL COMPLEXA 3

Exemplo 5 1 Seja A o conjunto definido pela condição Re(z) > 2. Esta condição define um

semiplano direito no plano complexo. O conjunto A é constituído pelos números complexos

z = x+ yi com x > 2. Trata-se de um conjunto aberto.

2 l

Re(z)>2

Eixo real

Eixo imaginário

2 O conjunto A definido pela condição 1 < |z − 2− 3i| < 2 é um conjunto aberto.

•2+3i

1 3 4

i

2i

4i

5i

Eixo real

Eixo

imaginário

Trata-se do conjunto dos pontos z do plano complexo cuja distância ao ponto z0 = 2 + 3i é

superior a 1 mas inferior a 2. Um conjunto deste tipo designa-se por coroa circular aberta.

A fronteira de A é

z ∈ C : |z − 2− 3i| = 1 ∨ |z − 2− 3i| = 2 ,

o conjunto dos pontos que pertencem à circunferência de centro z0 = 2 + 3i e raio ε = 2 ou

à circunferência de centro z0 = 2 + 3i e raio ε = 1. O conjunto fechado

B = z ∈ C : 1 ≤ |z − 2− 3i| ≤ 2 ,

designado por coroa circular fechada, tem a mesma fronteira que A. O conjunto comple-

mentar de A é definido pela condição |z − 2− 3i| ≤ 1 ∨ |z − 2− 3i| ≥ 2.

Exercícios resolvidos

1. Indique o domínio das seguintes funções complexas de variável complexa:

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4 CAPÍTULO 1. FUNÇÕES ANALÍTICAS

(a) f(z) =z

z + 3i; (b) f(z) =

1

z2 + 2;

(c) f(z) =x

x2 + y2+ ixy; (d) f(z) = lnx+ (x− 2y) i.

2. Determine as funções parte real e parte imaginária das seguintes funções complexas de variável

complexa:

(a) f(z) = 2iz + 6z; (b) g(z) = |z|2 ; (c) h(z) = z/z.

Calcule f(1 + 3i), g(−3i) e h(2− 2i).

3. Determine o conjunto dos números complexos que satisfazem as seguintes condições:

(a) Re(z + 1) = 4; (b) |z + 1|− |z − 1| = 4.

4. Averigúe se os conjuntos de números complexos, caracterizados pelas seguintes condições,

são abertos ou fechados, conexos ou não conexos:

(a) |z| < 2; (b) Re(z + 1) ≥ 4; (c) |Im z| > 1 ∧ |z| < 5.

Propostas de resolução

1.

(a) D = z ∈ C : z + 3i 6= 0 = z ∈ C : z 6= −3i = C\ −3i .

(b) O domínio desta função é D =©z ∈ C : z2 + 2 6= 0

ª.

Dado que

z2 + 2 = 0⇔ z2 = −2 = 2cis(−π)

⇔ z =p2cis(−π) =

√2cis

µ−π2+ kπ

¶, k = 0, 1

⇔ z0 =√2cis

µ−π2

¶= −√2i ∨ z1 =

√2cis

³π2

´=√2i,

temos D = C\©−√2i,√2iª.

(c) O domínio desta função é D =©z = x+ iy ∈ C : x2 + y2 6= 0

ª.

Mas

x2 + y2 = 0⇔ x = 0 ∧ y = 0⇔ z = 0.

Logo, D = C\ 0 .

(d) Recordemos que o domínio da função real de variável real logaritmo neperiano, lnx, é

o conjunto R+. Logo, o conjunto dos pontos para os quais faz sentido calcular lnx +

(x− 2y) i éD = z = x+ iy ∈ C : x > 0 ,

ou seja, é o conjunto dos pontos do semiplano direito aberto do plano complexo.

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1.1. FUNÇÕES COMPLEXAS DE VARIÁVEL COMPLEXA 5

2. Seja z = x+ iy.

(a) Temos f(z) = 2i (x+ yi)+6 (x− yi) = −2y+6x+(2x−6y)i. Logo, u(x, y) = −2y+6xe v(x, y) = 2x− 6y. Como

u(1, 3) = −6 + 6 = 0 e v(x, y) = 2− 18 = −16,

temos f(1 + 3i) = 0− 16i = −16i. Alternativamente, podemos calcular directamente

f(1 + 3i) = 2i (1 + 3i) + 6(1− 3i) = −6 + 6 + (2− 18)i = −16i.

(b) g(z) = |x+ iy|2 = x2 + y2.

Então, u(x, y) = x2 + y2 e v(x, y) = 0 e

g(−3i) = u(0,−3) + iv(0,−3) = 02 + (−3)2 + i0 = 9.

(c) h(z) =x+ iy

x− iy=(x+ iy) (x+ iy)

(x− iy) (x+ iy)=

x2 − y2

x2 + y2+

2xy

x2 + y2i.

Logo, u(x, y) =¡x2 − y2

¢/¡x2 + y2

¢, v(x, y) = 2xy/

¡x2 + y2

¢e

h(2− 2i) = u(2,−2) + iv(2,−2) = 22 − (−2)2

22 + (−2)2+2 · 2 (−2)22 + (−2)2

i

= 0 + (−1) i = −i.

3. Seja z = x+ yi.

(a) Dado que

Re(z + 1) = 4⇔ Re(x− yi+ 1) = 4⇔ x+ 1 = 4⇔ x = 3,

a condição Re(z + 1) = 4 representa o conjunto dos pontos do plano complexo na recta

vertical de equação x = 3.

(b) Temos|z + 1|− |z − 1| = 4⇔ |x+ 1 + yi|− |x− 1 + yi| = 4

⇔p(x+ 1)2 + y2 −

p(x− 1)2 + y2 = 4

⇔p(x+ 1)2 + y2 = 4 +

p(x− 1)2 + y2

⇔ (x+ 1)2 + y2 = 16 + (x− 1)2 + y2 + 8p(x− 1)2 + y2

⇔ x2 + 2x+ 1 = 16 + x2 − 2x+ 1 + 8p(x− 1)2 + y2

⇔ x− 4 = 2p(x− 1)2 + y2

⇔ (x− 4)2 = 4£(x− 1)2 + y2

¤∧ x− 4 ≥ 0

⇔ x2 − 8x+ 16 = 4x2 − 8x+ 4 + 4y2 ∧ x ≥ 4⇔ 3x2 + 4y2 = 12 ∧ x ≥ 4

⇔ x2

4+

y2

3= 1 ∧ x ≥ 4.

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6 CAPÍTULO 1. FUNÇÕES ANALÍTICAS

Atendendo a que a elipse x2/4 + y2/3 = 1 não intersecta o semiplano direito x ≥ 4,podemos concluir que o conjunto dos números complexos que satisfazem a condição

|z + 1|− |z − 1| = 4 é vazio.

4.

(a) A condição |z| < 2 representa o interior do círculo de centro em z = 0 e raio r = 2.

Trata-se de um conjunto aberto e conexo.

(b) Do exercício 3(a) concluímos que

Re(z + 1) ≥ 4⇔ x ≥ 3.

O conjunto de pontos que verifica esta condição é um semiplano fechado e conexo.

(c) Se z = x+ iy então

|Im z| > 1 ∧ |z| ≤ 5 ⇔ |y| > 1 ∧ |z| < 5⇔ (y < −1 ∨ y > 1) ∧ |z| < 5

Trata-se da intersecção de cada semiplano, y < −1 ou y > 1, com o interior do círculo decentro em z = 0 e raio r = 5. Logo, o conjunto dos pontos caracterizados pela condição

|Im z| > 1 ∧ |z| < 5 é um conjunto aberto e não conexo.

1.2 Limites e continuidade

As definições de limite e continuidade de uma função complexa de variável complexa num ponto

são análogas às conhecidas no cálculo real.

Consideremos uma função f : D → C definida em D ⊂ C. Seja z0 ∈ C tal que f está definidanuma certa vizinhança de z0 (não necessariamente no ponto z0).

Definição 1 Diz-se que f tem limite L no ponto z = z0 (ou que o número complexo L é o

limite de f quando z se aproxima do ponto z0), e denota-se

limz→z0

f(z) = L,

se para qualquer δ > 0 existe ε > 0 tal que |f(z)− L| < δ sempre que 0 < |z − z0| < ε. Se existe o

limite de f no ponto z0 então este limite é único.

Proposição 1 Propriedades operacionais do limite Sejam f e g funções complexas de var-

iável complexa. Se existem os limites de f e g no ponto z0, são válidas as seguintes igualdades:

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1.2. LIMITES E CONTINUIDADE 7

(a) limz→z0

(f(z)± g(z)) = limz→z0

f(z)± limz→z0

g(z);

(b) limz→z0

(f(z) · g(z)) = limz→z0

f(z) · limz→z0

g(z);

(c) limz→z0

f(z)/g(z) = limz→z0

f(z)/ limz→z0

g(z), desde que limz→z0

g(z) 6= 0.

Proposição 1 Sejam f : D → C uma função complexa de variável complexa e z0 = x0 + y0i tal

que f está definida numa certa vizinhança de z0. Sendo u(x, y) e v(x, y) as partes real e imaginária

de f demonstra-se (exercício 1) que, para z = x+ yi,

(1.1) limz→z0

f(z) = lim(x,y)→(x0,y0)

u(x, y) + i lim(x,y)→(x0,y0)

v(x, y),

onde os dois últimos limites são de funções reais de duas variáveis reais.

Definição 2 Sejam f : D → C uma função complexa de variável complexa e z0 ∈ D tal que f

está definida numa certa vizinhança de z0. A função f diz-se contínua em z0 se

limz→z0

f(z) = f(z0).

A função f diz-se contínua se for contínua em todos os pontos do seu domínio D.

Nota 2 Resulta da proposição anterior que a soma f + g, a diferença f − g e o produto fg de

funções contínuas em z0 é ainda uma função contínua em z0. Se g(z0) 6= 0 o mesmo se verifica

para o quociente f/g.

Além disso, podemos ainda concluir que f é contínua em z0 = x0 + y0i se e só se as funções

reais de variáveis reais u e v são contínuas em (x0, y0). Deste modo, o estudo da continuidade de

funções complexas reduz-se ao estudo da continuidade de funções reais de variáveis reais.

Exercícios resolvidos

1. Seja f : D→ C uma função complexa de variável complexa,

f(x+ yi) = u(x, y) + v(x, y)i,

e seja z0 um ponto interior a D. Mostre que, para z = x+ yi e z0 = x0 + y0i, se tem

limz→z0

f(z) = lim(x,y)→(x0,y0)

u(x, y) + i lim(x,y)→(x0,y0)

v(x, y).

2. Calcule os seguintes limites:

(a) limz→−1+2i

¡3xy + i(x− y2)

¢; (b) lim

z→1+i

z2 − 5iz

; (c) limz→i

z¡z2 + 1

¢z − i

.

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8 CAPÍTULO 1. FUNÇÕES ANALÍTICAS

3. Mostre, recorrendo à definição, que limz→−i 1/z = i.

4. Verifique que a função f(z) = z é contínua em C.

5. Mostre que a função f : C −→ C definida por

f(z) =

⎧⎨⎩z2

|z2| se z 6= 00 se z = 0

não é contínua em z = 0.

Propostas de resolução

1. Assumamos, em primeiro lugar, que existem os limites

lim(x,y)→(x0,y0)

u(x, y) = u0 e lim(x,y)→(x0,y0)

v(x, y) = v0.

Para cada δ > 0 existem, então, números positivos ε1 e ε2 tais que

(1.2) |u(x, y)− u0| <δ

2sempre que 0 <

q(x− x0)

2 + (y − y0)2 < ε1

e

(1.3) |v(x, y)− v0| <δ

2sempre que 0 <

q(x− x0)

2 + (y − y0)2 < ε2.

Seja ε = min ε1, ε2. Atendendo a que

|u(x, y) + v(x, y)i− (u0 + v0i)| = |u(x, y)− u0 + (v(x, y)− v0) i|

≤ |u(x, y)− u0|+ |v(x, y)− v0|

e q(x− x0)

2+ (y − y0)

2= |(x− x0) + (y − y0) i| = |(x+ yi)− (x0 + y0i)|

segue de (1.2) e (1.3) que

|u(x, y) + v(x, y)i− (u0 + v0i)| <δ

2+

δ

2= δ

sempre que 0 < |(x+ yi)− (x0 + y0i)| < ε. Concluímos, então, que existe o limite limz→z0 f(z) =

u0 + iv0.

Reciprocamente, suponhamos que existe o limite limz→z0 f(z) = w0 com w0 = u0+ iv0. Para

cada δ > 0 sabemos, então, que existe ε > 0 tal que

(1.4) |u(x, y) + v(x, y)i− (u0 + v0i)| < δ

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1.2. LIMITES E CONTINUIDADE 9

sempre que 0 < |(x+ yi)− (x0 + y0i)| < ε. Dado que

|u(x, y)− u0| ≤ |u(x, y)− u0 + (v(x, y)− v0) i|

= |u(x, y) + v(x, y)i− (u0 + v0i)| ,

|v(x, y)− v0| ≤ |u(x, y)− u0 + (v(x, y)− v0) i|

= |u(x, y) + v(x, y)i− (u0 + v0i)|

e

|(x+ yi)− (x0 + y0i)| = |(x− x0) + (y − y0) i|

=

q(x− x0)

2+ (y − y0)

2,

segue de (1.4) que

|u(x, y)− u0| < δ e |v(x, y)− v0| < δ,

sempre que 0 <q(x− x0)

2+ (y − y0)

2< ε. Isto mostra que existem os limites lim(x,y)→(x0,y0) u(x, y) =

u0 e lim(x,y)→(x0,y0) v(x, y) = v0.

2.

(a) Comecemos por observar que u(x, y) = 3xy e v(x, y) = x− y2. Atendendo ao exercício

1,

limz→−1+2i

¡3xy + i(x− y2)

¢= lim

x→−1y→2

3xy + i limx→−1y→2

(x− y2)

=¡3 (−1) 2 + i

¡−1− 22

¢¢= −6− 5i.

(b) Recorrendo às propriedades operacionais dos limites,

limz→1+i

z2 − 5iz

= limz→1+i

(1 + i)2 − 5

i · (1 + i)=−5 + 2i−1 + i

=7

2+3

2i.

(c) Substituindo z por i, obtemos uma indeterminação do tipo 0/0. No entanto, se obser-

varmos que z2 + 1 = (z − i) (z + i), podemos calcular facilmente o limite:

limz→i

z¡z2 + 1

¢z − i

= limz→i

z (z + i) (z − i)

z − i= lim

z→iz (z + i) = −2.

3. É preciso que mostrar que dado δ > 0 existe um ε > 0 tal que¯1

z− i

¯< δ sempre que |z − (−i)| = |z + i| < ε.

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10 CAPÍTULO 1. FUNÇÕES ANALÍTICAS

Escrevendo |1/z − i| em função de |z + i|, e usando as propriedades do módulo, obtemos¯1

z− i

¯=

¯1− iz

z

¯=

¯−i (z + i)

z

¯=

¯(z + i)

−iz

¯= |z + i|

¯−iz

¯= |z + i| 1|z| .

Dado que z → −i, podemos supor que |z| > 1/2. Como tal,¯1

z− i

¯= |z + i| 1|z| < 2 |z + i| .

Mas para que |z| > 1/2 é necessário que |z + i| < ε = 1/2. De facto,

|z| = |z + i− i| = |(−i) + (z + i)| ≥ |−i|− |z + i|

= 1− |z + i| > 1− 1/2 = 1/2.

Escolhendo ε = min δ/2, 1/2, sempre que |z + i| < ε, garantimos que¯1

z− i

¯< 2 |z + i| < δ.

4. A função complexa de variável complexa f(z) = z = x− yi tem por domínio o conjunto C.

Dado z0 ∈ C,

limz→z0

z = limx→x0y→y0

(x− yi) = x0 − y0i = z0.

Logo, f é contínua.

5. Analisemos se limz→0 f(z) = f(0). Temos f(0) = 0 e

limz→0

f(z) = limz→0

z2

|z2| = limx→0y→0

x2 − y2 + 2xyi

x2 + y2

= limx→0y→0

x2 − y2

x2 + y2+ i lim

x→0y→0

2xy

x2 + y2.

Relativamente ao 1o dos limites, calculemos os respectivos limites sucessivos (ou iterados):

limy→0

µlimx→0

x2 − y2

x2 + y2

¶= lim

y→0

−y2y2

= limy→0

(−1) = −1

limx→0

µlimy→0

x2 − y2

x2 + y2

¶= lim

x→0

x2

x2= lim

y→01 = 1.

A obtenção de dois limites diferentes permite concluir que não existe o limx→0,y→0¡x2 − y2

¢/¡x2 + y2

¢.

Como tal, não existe o limz→0 f(z) e, logo, a função f não é contínua no ponto z = 0.

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1.3. DERIVAÇÃO E ANALITICIDADE 11

1.3 Derivação e analiticidade

Definição 3 Seja f uma função complexa de variável complexa definida num conjunto aberto D

e seja z0 ∈ D. Define-se a derivada de f em z0, e denota-se por f 0(z0) (ou df/dz ou dw/dz)

como sendo o limite

f 0(z0) = limz→z0

f(z)− f(z0)

z − z0

(caso exista). Se f tem derivada em z0 (i.e., se este limite existe) então f diz-se diferenciável

em z0. Escrevendo ∆z = z − z0, a definição é equivalente à expressão

f 0 (z0) = lim∆z→0

f (z0 +∆z)− f (z0)

∆z

Exemplo 6 Seja f(z) = 2x+3yi de domínio C. Vejamos que f não é diferenciável em nenhum

ponto z0 = x0 + iy0. Calculemos o limite respectivo, considerando ∆z = ∆x + i∆y, onde

∆x = x− x0 e ∆y = y − y0:

f 0(z0) = lim∆z→0

2(x0 +∆x) + 3(y0 +∆y)i− (2x0 + 3y0i)∆x+ i∆y

= lim∆z→0

2∆x+ 3i∆y

∆x+ i∆y.

Suponhamos que ∆z → 0 ao longo de uma recta horizontal (caminho I). Então ∆y = 0 e o

valor do limite (direccional) é

lim∆z→0

2∆x+ 3i∆y

∆x+ i∆y= lim∆x→0

2∆x

∆x= 2.

Por outro lado, se escolhermos outra direcção, por exemplo que ∆z → 0 ao longo de uma

recta vertical (caminho II), temos ∆x = 0 e o valor do limite (direccional) é

lim∆z→0

2∆x+ 3i∆y

∆x+ i∆y= lim∆y→0

3i∆y

i∆y= 3.

I

IIz0+Δz

z0

Δy

Δx

A obtenção de dois limites direccionais diferentes permite concluir que não existe o limite

pretendido.

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12 CAPÍTULO 1. FUNÇÕES ANALÍTICAS

Proposição 2 Se a função f : D → C é diferenciável em z0 então f é contínua em z0. Note-

mos que, tal como no cálculo real, o recíproco não é verdadeiro: existem funções contínuas num

determinado ponto do seu domínio que não têm derivada nesse ponto.

A análise complexa estuda essencialmente as funções complexas de variável complexa que são

diferenciáveis nalguma região do seu domínio.

Definição 4 Seja f uma função complexa de variável complexa definida num conjunto aberto D e

seja z0 ∈ D. A função f diz-se analítica em z0 se é diferenciável em z0 e numa certa vizinhança

de z0. Se f é analítica em todos os pontos de D então diz-se analítica (regular ou holomorfa)

em D.

Proposição 3 Seja D ⊆ C um conjunto aberto e sejam f e g funções analíticas em D. São válidas

as seguintes propriedades:

(a) af(z) + bg(z) é analítica em D e

[af(z) + bg(z)]0 = af 0(z) + bg0(z),

para quaisquer números complexos a e b (linearidade da derivada);

(b) f(z)g(z) é analítica em D e

[f(z)g(z)]0= f 0(z)g(z) + f(z)g0(z);

(c) Se g(z) 6= 0 então f(z)/g(z) é analítica em D eµf(z)

g(z)

¶0=

f 0(z)g(z)− f(z)g0(z)

g2(z);

(d) Se n ∈ N então fn(z) é analítica em D e

[fn(z)]0 = nfn−1(z)f 0(z).

• Sabemos, por (d), que as potências inteiras não negativas 1, z, z2, z3,... são analíticas em C.

Podemos então concluir, por (a), que toda a função polinomial f(z) = cnzn + cn−1z

n−1 +

...+ c2z2 + c1z + c0 é inteira e a sua derivada é

f 0(z) = ncnzn−1 + (n− 1)cn−1zn−2 + ...+ 2c2z + c1.

Quanto ao quociente de duas funções polinomiais

f(z) =anz

n + ...+ a2z2 + a1z + a0

bmzm + ...+ b2z2 + b1z + b0,

designado por função racional, é analítica em todo o seu domínio, ou seja, no conjunto

aberto©z ∈ C : bmzm + ...+ b2z

2 + b1z + b0 6= 0ª.

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1.3. DERIVAÇÃO E ANALITICIDADE 13

Proposição 4 Regra da derivação da função composta (ou regra da cadeia) Sejam f :

A → C e g : B → C funções analíticas nos abertos A e B, respectivamente, tais que f(A) ⊆ B.

Então a função g f : A→ C definida por (g f) (z) = g(f(z)) é analítica em A e

(g f)0 (z) = g0(f(z))f 0(z).

Exercícios resolvidos

1. Calcule as derivadas das seguintes funções:

(a) f(z) = 2z4 − z3 + 10iz; (b) g(z) = (2z + 3)4;

(c) h(z) =1 + (2− i) z

2z + 9; (d) j(z) = z + 1/z.

2. Determine o conjunto dos pontos do plano complexo onde a função f(z) = 1/£¡z3 − 1

¢ ¡z2 + 2

¢¤é analítica.

3. Averigúe se a função f : C→ C definida por

f(z) =

⎧⎨⎩ x3 (1 + i)− y3 (1− i)

x2 + y2se z 6= 0

0 se z = 0

é diferenciável na origem.

Propostas de resolução

1. As funções f e g são polinomiais e logo, o seu domínio é C. A função h é uma função racional,

cujo domínio é o conjunto dos pontos tais que 2z + 9 6= 0, ou seja, C\ −9/2. Da mesmaforma, a função j (designada usualmente por função de Joukowski) é também racional e

tem por domínio o conjunto C\ 0. Mais, estas funções são diferenciáveis nos seus domínios.Para obter a expressão da derivada podemos simplesmente usar as regras de derivação:

(a) f 0(z) = 2¡z4¢0 − ¡z3¢0 + 10i (z)0 = 8z3 − 3z2 + 10i, ∀z ∈ C;

(b) g0(z) =h(2z + 3)4

i0= 4 (2z + 3)3 2 = 8 (2z + 3)3 , ∀z ∈ C;

(c) h0(z) =(1 + (2− i) z)0 (2z + 9)− (1 + (2− i) z) (2z + 9)0

(2z + 9)2

=(2− i) (2z + 9)− (1 + (2− i) z) · 2

(2z + 9)2=

16− 9i(2z + 9)2

, ∀z ∈ C\ −9/2 ;

(d) j0(z) =£z + z−1

¤0= 1 + (−1)z−2 = 1− 1

z2, ∀z ∈ C\ 0 .

2. A função f(z) = 1/£¡z3 − 1

¢ ¡z2 + 2

¢¤é racional e tem por domínio o conjunto aberto

D =©z ∈ C : z3 − 1 6= 0 ∧ z2 + 2 6= 0

ª.

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14 CAPÍTULO 1. FUNÇÕES ANALÍTICAS

Conforme visto no exemplo 22.1 da secção 1.2, a equação z3 = 1 tem por raízes os pontos

z0 = 1, z1 = −1/2 +√3/2i e z2 = −1/2−

√3/2i. Quanto à equação z2 = −2 = 2cis(−π),

as suas raízes são dadas pela expressão

z =√2cis

µ−π2+2kπ

2

¶, para k = 0, 1,

ou seja,

z0 =√2cis

³−π2

´= −√2i ∨ z1 =

√2cis

³−π2+ π

´=√2i.

Concluímos, assim, que

D = C\n1,−1/2 +

√3/2i,−1/2−

√3/2i,−

√2i,√2io.

A função f é analítica em D e, para obter a expressão da derivada podemos simplesmente

usar as regras de derivação,

f 0(z) =h¡z3 − 1

¢−1 ¡z2 + 2

¢−1i0= (−1)

¡z3 − 1

¢−23z2

¡z2 + 2

¢−1+¡z3 − 1

¢−1(−1)

¡z2 + 2

¢−22z

= − 3z2

(z3 − 1)2 (z2 + 2)− 2z

(z3 − 1) (z2 + 2)2.

3. Calculando a derivada no ponto z0 = 0 com ∆z = ρ (cos θ + i sin θ), obtemos

lim∆z→0

f(∆z)− f(0)

∆z= lim

ρ→0

ρ3 cos3 θ (1 + i)− ρ3 sin3 θ (1− i)

ρ2 cos2 θ + ρ2 sin2 θ− 0

ρ (cos θ + i sin θ)

= limρ→0

ρ3£cos3 θ (1 + i)− sin3 θ (1− i)

¤ρ3 (cos θ + i sin θ)

=cos3 θ − sin3 θ + i

¡cos3 θ + sin3 θ

¢cos θ + i sin θ

,

que depende do ângulo θ tomado. Concluímos então que f não é diferenciável na origem.

1.4 Equações de Cauchy-Riemann

Teorema 1 Cauchy-Riemann Seja f : D −→ C uma função complexa de variável complexa

definida por f(z) = u(x, y) + v(x, y)i num conjunto aberto D e z0 = x0 + y0i ∈ D. A derivada

f 0(z0) existe (ou seja, f é diferenciável em z0) se e só se as funções u e v são contínuas e têm

derivadas de 1a ordem contínuas numa vizinhança de (x0, y0) e, no ponto (x0, y0), satisfazem as

equações de Cauchy-Riemann

∂u

∂x(x0, y0) =

∂v

∂y(x0, y0) e

∂u

∂y(x0, y0) = −

∂v

∂x(x0, y0).

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1.4. EQUAÇÕES DE CAUCHY-RIEMANN 15

Assim, se as derivadas parciais de 1a ordem das funções u e v existem, são contínuas e satisfazem

as equações de Cauchy-Riemann em D então f é analítica em D.

Exemplo 7 Consideremos a função f(z) = 2x + 3yi. Vimos no exemplo 13.1, que f não é

diferenciável em nenhum ponto do seu domínio C. De facto, as equações de Cauchy-Riemann não

são válidas em nenhum ponto (x, y):

∂u

∂x= 2 6= 3 = ∂v

∂yembora

∂u

∂y= 0 = −∂v

∂x.

Exemplo 8 Consideremos a função f(z) = 2x2 + y + (y2 − x)i definida em C. Temos u(x, y) =

2x2 + y e v(x, y) = y2 − x, donde

∂u

∂x= 4x,

∂v

∂y= 2y e

∂u

∂y= 1 = −∂v

∂x.

Verificamos que as funções u e v são contínuas e têm derivadas contínuas em todos os pontos.

Pelo teorema de Cauchy-Riemann, f é diferenciável em todos os pontos em que as equações de

Cauchy-Riemann são satisfeitas, ou seja, em pontos (x, y) tais que

4x = 2y ⇔ y = 2x

Logo f é diferenciável nos pontos da recta y = 2x. No entanto, dado que nenhum ponto desta recta

tem uma vizinhança na qual as equações de Cauchy-Riemann sejam válidas, f não é analítica em

nenhum ponto do seu domínio C.

Exemplo 9 Consideremos a função f(z) = z/ |z|2 definida no conjunto aberto D = C\ 0.Temos

f(z) =x

x2 + y2− y

x2 + y2i,

logo,∂u

∂x=

y2 − x2

(x2 + y2)2 =

∂v

∂ye

∂u

∂y= − 2xy

(x2 + y2)2 = −

∂v

∂x.

Portanto, as equações de Cauchy-Riemann são satisfeitas em C\ 0. Pelo teorema de Cauchy-Riemann, f é analítica em C\ 0.

Exercícios resolvidos

1. Verifique as equações de Cauchy-Riemann para a função f(z) = z2 + 3z + 2.

2. Considere a função f(z) = x2 − y2i. Determine os pontos onde f é diferenciável e mostre

que f não é analítica em nenhum ponto do seu domínio. Determine ainda a expressão da

derivada nos pontos em que ela existe.

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16 CAPÍTULO 1. FUNÇÕES ANALÍTICAS

3. Determine os subconjuntos do plano complexo onde as seguintes funções são analíticas e

calcule as suas derivadas:(a) f(z) = x3 − i(1− y)3; (b) f(z) = z − z;

(c) f(z) = ey(cosx+ i sinx); (d) f(z) = x2 + y2i.

4. Prove que as funções f(z) = |z| e g(z) = z não são analíticas em nenhum ponto do seu

domínio.

5. Mostre que as equações de Cauchy-Riemann, escritas em coordenadas polares, são dadas por

∂u

∂r=1

r

∂v

∂θe

∂v

∂r= −1

r

∂u

∂θ.

Propostas de resolução

1. A função f(z) = z2 + 3z + 2 tem parte real u(x, y) = x2 − y2 + 3x + 2 e parte imaginária

v(x, y) = 2xy + 3y. Como

∂u

∂x= 2x+ 3,

∂v

∂y= 2x+ 3,

∂u

∂y= −2y e

∂v

∂x= 2y,

as equações de Cauchy-Riemann são válidas em todos os pontos do domínio C.

2. Temos u(x, y) = x2 e v(x, y) = −y2. Logo,

∂u

∂x= 2x,

∂v

∂y= −2y e

∂u

∂y= 0 = −∂v

∂x.

Verificamos que as equações de Cauchy-Riemann são válidas em pontos (x, y) tais que 2x =

−2y, ou seja, na recta de equação y = −x. Como as funções u, v, ∂u/∂x, ∂u/∂y, ∂v/∂x e∂v/∂y são contínuas em todos os pontos, concluímos, pelo teorema de Cauchy-Riemann, que

f é diferenciável nos pontos da recta y = −x e a derivada é dada por

f 0(z) = 2x+ 0i = 2x = −2y.

No entanto, dado qualquer ponto desta recta, não existe uma vizinhança desse ponto na qual

as equações de Cauchy-Riemann sejam válidas. Logo, f não é analítica em nenhum ponto

do seu domínio C.

3.

(a) Pretendemos determinar os pontos em que f é diferenciável. Para esta função temos

u(x, y) = x3 e v(x, y) = −(1− y)3. Logo,

∂u

∂x= 3x2,

∂v

∂y= 3(1− y)2,

∂u

∂y= 0 e

∂v

∂x= 0.

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1.4. EQUAÇÕES DE CAUCHY-RIEMANN 17

As funções u e v e as suas derivadas parciais de 1a ordem são contínuas em todos os

pontos do plano. Então, pelo teorema de Cauchy-Riemann, f é diferenciável em todos

os pontos em que as equações de Cauchy-Riemann sejam satisfeitas, isto é, quando

3x2 = 3(1− y)2 ⇔ x = 1− y ∨ x = −1 + y,

já que ∂u/∂y = 0 = −∂v/∂x é verificado para qualquer (x, y). As condições x = 1− y

e x = −1 + y definem analiticamente rectas. A função f é diferenciável em pontos

z = x + yi que pertencem a uma das rectas x = 1 − y ou x = −1 + y. No entanto,

dado qualquer ponto destas rectas, não existe uma vizinhança desse ponto na qual as

equações de Cauchy-Riemann sejam válidas. Concluímos então que f não é analítica

em nenhum ponto do seu domínio C. A derivada de f nos pontos das rectas x = 1− y

ou x = −1 + y é dada por

f 0(z) = 3x2 + 0i = 3x2 = 3(1− y)2.

(b) À função f(z) = z − z corresponde u(x, y) = 0 e v(x, y) = 2y. Temos

∂u

∂x= 0 6= ∂v

∂y= 2 e

∂u

∂y= 0 =

∂v

∂x= 0.

Verificamos que as equações de Cauchy-Riemann não são válidas qualquer que seja o

ponto (x, y). Pelo teorema de Cauchy-Riemann concluímos que f não é analítica (nem

diferenciável) em nenhum ponto do seu domínio C.

(c) À função f corresponde u(x, y) = ey cosx e v(x, y) = ey sinx. Temos

∂u

∂x= −ey sinx, ∂v

∂y= ey sinx

∂u

∂y= ey cosx e

∂v

∂x= ey cosx.

Verificamos que as equações de Cauchy-Riemann são válidas em pontos (x, y) tais que

−ey sinx = ey sinx e ey cosx = −ey cosx, ou seja, tais que sinx = 0 e cosx = 0 (notemosque ey 6= 0,∀y ∈ R). Não e

xiste qualquer valor real x tal que sinx = cosx = 0, como tal nenhum ponto do domínio

C de f verifica as equações de Cauchy-Riemann. Pelo teorema de Cauchy-Riemann, f

não é analítica (nem diferenciável) em nenhum ponto do seu domínio.

(d) À função f(z) = x2 + y2i corresponde u(x, y) = x2 e v(x, y) = y2. Temos

∂u

∂x= 2x,

∂v

∂y= 2y e

∂u

∂y= 0 =

∂v

∂x.

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18 CAPÍTULO 1. FUNÇÕES ANALÍTICAS

Verificamos que as equações de Cauchy-Riemann são válidas em pontos (x, y) tais que

2x = 2y, ou seja, na recta de equação y = x. Como as funções u, v, ∂u/∂x, ∂u/∂y,

∂v/∂x e ∂v/∂y são contínuas em todos os pontos, pelo teorema de Cauchy-Riemann, f

é diferenciável nos pontos da recta y = x. A derivada de f nos pontos da recta y = x é

dada por

f 0(z) = 2x+ 0i = 2x = 2y.

No entanto, dado qualquer ponto desta recta, não existe uma vi-zinhança desse ponto

na qual as equações de Cauchy-Riemann sejam válidas. Concluímos então que f não é

analítica em nenhum ponto do seu domínio C.

4. À função f(z) = |z| corresponde u(x, y) =px2 + y2 e v(x, y) = 0. Temos

∂u

∂x=

xpx2 + y2

,∂v

∂y= 0,

∂u

∂y=

ypx2 + y2

e∂v

∂x= 0.

Verificamos que as equações de Cauchy-Riemann são válidas em pontos (x, y) tais que

x/px2 + y2 = 0 e y/

px2 + y2 = 0, ou seja, no ponto (0, 0). Como as funções u e v e

as suas derivadas parciais de 1a ordem são contínuas em todos os pontos, concluímos pelo

teorema de Cauchy-Riemann que f é diferenciável no ponto z = 0. A derivada de f neste

ponto é dada por

f 0(0) =

Ãxp

x2 + y2

!(0,0)

=

Ã−i yp

x2 + y2

!(0,0)

= 0,

No entanto, não existe uma vizinhança de z = 0 na qual as equações de Cauchy-Riemann

sejam válidas. Logo, f não é analítica em nenhum ponto do seu domínio C.

À função g(z) = z corresponde u(x, y) = x e v(x, y) = −y. Temos∂u

∂x= 1,

∂v

∂y= −1, ∂u

∂y= 0 e

∂v

∂x= 0.

Verificamos que as equações de Cauchy-Riemann não são válidas, qualquer que seja o ponto

(x, y). Pelo teorema de Cauchy-Riemann, concluímos que f não é analítica (nem diferen-

ciável) em nenhum ponto do seu domínio C.

5. Temos a seguinte relação entre as coordenadas rectangulares e polares:

x = r cos θ e y = r sin θ.

Como tal, num ponto z0 = x0 + y0i = r0 cos θ0 + ir0 sin θ0 = r0cisθ0, temos

∂u

∂r(r0, θ0) =

∂u

∂x(x0, y0) cos θ0 +

∂u

∂y(x0, y0) sin θ0,

∂v

∂θ(r0, θ0) =

∂v

∂x(x0, y0) (−r0 sin θ0) +

∂v

∂y(x0, y0)r0 cos θ0.

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1.5. FUNÇÕES HARMÓNICAS 19

Atendendo às equações de Cauchy-Riemann em coordenadas rectangulares,

∂u

∂r(r0, θ0) =

∂v

∂y(x0, y0) cos θ0 −

∂v

∂x(x0, y0) sin θ0

=1

r0

µ∂v

∂y(x0, y0)r0 cos θ0 −

∂v

∂x(x0, y0)r0 sin θ0

¶=

1

r0· ∂v∂θ(r0, θ0) .

De modo análogo, temos

∂u

∂θ(r0, θ0) =

∂u

∂x(x0, y0) (−r0 sin θ0) +

∂u

∂y(x0, y0)r0 cos θ0,

∂v

∂r(r0, θ0) =

∂v

∂x(x0, y0) cos θ0 +

∂v

∂y(x0, y0) sin θ0

donde, atendendo novamente às equações de Cauchy-Riemann em coordenadas rectangulares,

∂v

∂r(r0, θ0) = −∂u

∂y(x0, y0) cos θ0 +

∂u

∂x(x0, y0) sin θ0

= − 1r0

µ−∂u∂y(x0, y0) (−r0) cos θ0 +

∂u

∂x(x0, y0) (−r0) sin θ0

¶= − 1

r0

∂u

∂θ(r0, θ0) .

1.5 Funções harmónicas

Definição 5 Dada uma função u : D −→ R, definida num subconjunto aberto D de R2, com

derivadas parciais de 2a ordem contínuas, designa-se por Laplaciano de u a expressão

∂2u

∂x2(x, y) +

∂2u

∂y2(x, y)

e denota-se por 52u(x, y). A função u diz-se harmónica se satisfaz a equação 52u (x, y) = 0,

para todo o (x, y) ∈ D, designada por equação de Laplace.

Temos então o seguinte resultado:

Proposição 5 Seja f(z) = u(x, y) + v(x, y)i uma função complexa de variável complexa. Se f é

analítica num conjunto aberto D então u e v são funções harmónicas em D.

• Verificamos então que as partes real e imaginária de uma função analítica verificam a equaçãode Laplace. Esta ligação entre funções analíticas e a equação de Laplace reforça a importância

das funções de variável complexa e abre caminho para numerosas aplicações da matemática.

Definição 6 Se f = u + iv é uma função analítica definida num conjunto aberto D, então as

funções u e v são designadas por harmónicas conjugadas em D.

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20 CAPÍTULO 1. FUNÇÕES ANALÍTICAS

Exemplo 2 Consideremos a função polinomial f(z) = z2. Trata-se de uma função analítica em

C a que corresponde u(x, y) = x2 − y2 e v(x, y) = 2xy. Temos

∂u

∂x= 2x,

∂u

∂y= −2y, ∂v

∂x= 2y e

∂v

∂y= 2x,

pelo que

∂2u

∂x2+

∂2u

∂y2= 2 + (−2) = 0

∂2v

∂x2+

∂2v

∂y2= 0 + 0 = 0.

Isto mostra que u e v são funções harmónicas em C. Além disso, são conjugadas harmónicas por

constituírem as partes real e imaginária, respectivamente, da função analítica f(z) = z2.

Proposição 6 Se u é uma função harmónica num conjunto aberto D e z0 ∈ D, então existe uma

vizinhança de z0 na qual u = Re(f). Por outras palavras, existe uma função harmónica v definida

em D tal que a função definida por f(z) = u(x, y) + v(x, y)i é analítica em D.

Exemplo 3 Seja u(x, y) = x3 − 3xy2. Trata-se de uma função harmónica em todos os pontos do

plano

∂2u

∂x2=

∂x(3x2 − 3y2) = 6x

∂2u

∂y2=

∂y(−6xy) = −6x.

Pela proposição 29, existe uma função f analítica em C (trata-se de uma função inteira) tal que

u = Re(f). Determinemos então a função f . Sabemos que f é tal que f(z) =¡x3 − 3xy2

¢+v(x, y)i,

onde a função v(x, y) está por determinar. Pelas equações de Cauchy-Riemann, temos

∂v

∂x= −∂u

∂y= 6xy

o que implica v(x, y) = 3x2y + c(y). Por outro lado,

∂v

∂y=

∂u

∂x= 3x2 − 3y2

ou seja, ∂¡3x2y + c(y)

¢/∂y = 3x2 − 3y2. Então,

3x2 + c0(y) = 3x2 − 3y2 ⇒ c0(y) = −3y2⇒ c(y) = −y3 +K, para qualquer K ∈ R.

Obtemos v(x, y) = 3x2y − y3 +K e, como tal, para z = x+ yi,

f(z) = x3 − 3xy2 + (3x2y − y3 +K)i.

O exemplo apresentado mostra que a função harmónica conjugada de uma dada função har-

mónica u está univocamente determinada a menos de uma constante aditiva real.

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1.5. FUNÇÕES HARMÓNICAS 21

Exercícios resolvidos

1. Considere a função u(x, y) = x3 − 3xy2. Encontre uma função conjugada harmónica v que

verifique v(0, 0) = 2.

2. Determine os conjuntos nos quais as seguintes funções são harmónicas:

(a) u(x, y) = Re(z + 1/z); (b) u(x, y) =−y − 1

x2 + (y + 1)2.

3. Encontre, se possível, uma função f inteira tal que Re(f) = x2 − 3x− y2.

Propostas de resolução

1. Podemos mostrámos que v(x, y) = 3x2y− y3 +K para qualquer constante K ∈ R. Para quev verifique v(0, 0) = 2 a constante real K não pode ser arbitrária. De facto,

v(0, 0) = 2⇔ 3 · 0− 0 +K = 2⇔ K = 2.

A função v pedida é v(x, y) = 3x2y − y3 + 2.

2.

(a) Notemos que u é parte real da função f(z) = z + 1/z, analítica no conjunto aberto

C\ 0. Então, pela proposição 27, a função u é harmónica em C\ 0.

(b) A função u não está definida nos pontos para os quais o denominador se anula. Como

x2+(y + 1)2= 0 se e só se x = 0 e y = −1, o domínio de u é D = C\ −i. Efectuando

os cálculos necessários para z 6= −i, obtemos

∂2u

∂x2=

2 (y + 1)³x2 + (y + 1)2

´− 8x2 (y + 1)³

x2 + (y + 1)2´3 ,

∂2u

∂y2=

2 (y + 1)³x2 + (y + 1)

2´− 4 (y + 1)

³(y + 1)

2 − x2´

³x2 + (y + 1)2

´3 .

Então,∂2u

∂x2+

∂2u

∂y2= 0

⇔ 4 (y + 1)³x2 + (y + 1)2

´− 4 (y + 1)

³x2 + (y + 1)2

´= 0

⇔ 0 = 0.

Logo, u é harmónica no seu domínio, isto é, em D = C\ −i.

Alternativamente, se observarmos que u(x, y) é parte imaginária da função analítica em

C\ −i, f(z) = 1/ (z + i), concluímos de imediato que u é harmónica neste conjunto.

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22 CAPÍTULO 1. FUNÇÕES ANALÍTICAS

3. A função u é harmónica,

∂2u

∂x2=

∂x(2x− 3) = 2

∂2u

∂y2=

∂y(−2y) = −2

e está definida em todo o conjunto C. Pela proposição 29 existe v(x, y) tal que u(x, y)+v(x, y)i

é analítica em C. Pelas equações de Cauchy-Riemann, temos

∂v

∂x= −∂u

∂y= 2y,

que implica v(x, y) = 2xy + c(y). Por outro lado,

∂v

∂y=

∂u

∂x= 2x− 3,

ou seja, ∂ (2xy + c(y)) /∂y = 2x− 3. Então,

2x+ c0(y) = 2x− 3⇔ c0(y) = −3⇒ c(y) = −3y +K, para qualquer constante real K.

Obtemos v(x, y) = 2xy − 3y + K e, escolhendo K = 0, vem v(x, y) = 2xy − 3y e f(z) =x2 − 3x− y2 + (2xy − 3y) i.

Exercícios propostos

1. Determine as funções parte real e parte imaginária de cada uma das seguintes funções com-

plexas de variável complexa:

(a) f(z) = z2 + 3z − 2i; (b) f(z) =z + 2

z − 1 ;

(c) f(z) = 3iz + 4(i+ z); (d) f(z) =z − i

|z − i| .

2. Caracterize geometricamente os conjuntos definidos pelas seguintes condições e indique quais

os que são regiões:

(a) |z + 4| > 2; (b) (Im z)2 ≤ 4;

(c) 1 < |Re z| ≤ 2; (d) 3π/4 < arg z < π.

3. Estude as seguintes funções definidas em C quanto à continuidade na origem:

(a) f(z) =

⎧⎨⎩Im z

|z| se z 6= 00 se z = 0

; (b) f(z) =

⎧⎨⎩Re z

1 + |z| se z 6= 00 se z = 0

.

4. Mostre que a função f(z) = − (2xy + 5x) +¡x2 − 5y − y2

¢i é inteira e calcule f 0(z).

5. Mostre que as funções f(z) = Re z, g(z) = y + xi e h(z) = z2 não são analíticas em nenhum

ponto do plano complexo.

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1.5. FUNÇÕES HARMÓNICAS 23

6. Determine em que pontos as seguintes funções são diferenciáveis. Mostre que não são analíti-

cas em nenhum ponto do plano complexo.

(a) f(z) = 3x2y2 − 6x2y2i; ; (b) f(z) = x2 − x+ y +¡y2 − 5y − x

¢i.

7. Determine o valor da derivada de f no ponto indicado

(a) f(z) = (z − i) / (z + i) em i; (b) f(z) =¡z4 + 1

¢/z4 em − 1− i.

8. Determine a imagem das funções

(a) f(z) = x2 − y +¡y2 − x

¢i, para z na recta x = 1;

(b) f(z) = z3, para z no 1o quadrante (Re z ≥ 0 e Im z ≥ 0);(c) f(z) =

1

z, para |z| ≥ 1.

9. Determine os valores reais de a e b para os quais a função f(z) = 3x− y+5+(ax+ by − 3) ié inteira.

10. Mostre que a função u(x, y) = x3 − 3xy2 − 5y é harmónica em R2 e determine uma função

conjugada harmónica v.

11. Determine a função analítica f(z) = u(x, y) + v(x, y)i tal que

(a) u(x, y) = x2 − y2; (b) v(x, y) = 2y(x− 1);(c) u(x, y) = x3 − 3xy2; (d) u(x, y) = ln

¡x2 + y2

¢.

12. Determine os valores reais de a e b para os quais as seguintes funções são harmónicas em R2

e determine as funções conjugadas harmónicas.

(a) u(x, y) = ax3 + by3; (b) u(x, y) = eax cos 5y.

13. Determine, caso existam, os seguintes limites

(a) limz→i

¡4z3 − 5z2 + 4z + 1− 5i

¢;

(b) limz→i

¡z4 − 1

¢/ (z − i) ;

(c) limz→0 z/z.

14. Mostre que, dada uma função analítica f , são válidas as seguintes expressões para cálculo da

derivada

f 0 =∂u

∂x− i

∂u

∂ye f 0 =

∂v

∂y+ i

∂v

∂x.

15. Para x > 0 considere a função

f(z) =1

2ln(x2 + y2) + i arctan

y

x.

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24 CAPÍTULO 1. FUNÇÕES ANALÍTICAS

(a) Use as equações de Cauchy-Riemann para mostrar que f é diferenciável em todo o seu

domínio;

(b) Mostre que f 0(z) = 1/z;

(c) Mostre que a função conjugada f não é diferenciável em nenhum ponto do seu domínio.

Soluções

1. (a) u(x, y) = x2 − y2 + 3x− 5, v(x, y) = 2xy + 3y; (b) u(x, y) =x2 + y2 + x− 2(x− 1)2 + y2

, v(x, y) =

− 3y

(x− 1)2 + y2; (c) u(x, y) = 4x+ 3y, v(x, y) = 3x+ 4y + 4; (d) u(x, y) =

x

x2 + (y − 1)2,

v(x, y) =y − 1

x2 + (y − 1)2.

2. (a) Todo o plano complexo excepto o círculo de centro (−4, 0) e raio√2; (b) união de dois

semiplanos fechados: y ≥ 2 e y ≤ −2; (c) união de duas faixas ilimitadas verticais, definidaspelas condições −2 ≤ x < −1 e 1 < x ≤ 2; (d) porção do plano complexo no 2o quadrantedelimitada pelas rectas y = −x e x = 0, excluindo-as. São regiões os conjuntos definidos em(a) e (d).

3. (a) É contínua; (b)

4. f 0(z) = −2y − 5 + 2xi.

5. Usar teorema de Cauchy-Riemann.

6. (a) É diferenciável ao longo dos eixos coordenados; (b) é diferenciável ao longo da recta de

equação y = x+ 2.

7. (a) −i/2; (b) 15 (1− i) /2.

8. (a) A parábola de equação v = u2−2u; (b) os três primeiros quadrantes, incluindo a semirectay = 0 e x ≥ 0, e a semirecta x = 0 e y ≤ 0; (c) o círculo de centro em z = 0 e raio 1, excluindo

o ponto z = 0.

9. a = 1, b = 3.

10. v(x, y) = 3x2y − y3 + 5x+ 3.

11. (a) f(z) = x2 − y2 + (2xy +K) i = z2 +Ki, K ∈ R; (b) f(z) = z2 − 2z + 1 +K, K ∈ R;(c) f(z) = z3 +K, K ∈ R; (d) f(z) = ln

¡x2 + y2

¢+ (2 arctan (y/x) +K) i, K ∈ R.

12. (a) a = b = 0, v(x, y) = K, K ∈ R; (b) a = ±5, v(x, y) = ±e±5x sin 5y +K, K ∈ R.

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1.5. FUNÇÕES HARMÓNICAS 25

13. (a) 6− 5i; (b) −4i; (c) não existe.

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26 CAPÍTULO 1. FUNÇÕES ANALÍTICAS

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Capítulo 2

Funções elementares

2.1 A função exponencial

Definição 7 Para qualquer z = x+ yi ∈ C, define-se a função exponencial de z por

ez = ex+yi = exeyi = ex(cos y + i sin y),

que pode também ser denotada por exp z.

Nota 3 Quando tomamos z como número real, z = x + 0i, a definição de ez coincide com a

definição já conhecida em R:

ez = ex+0i = ex(cos 0 + i sin 0) = ex(1 + 0i) = ex.

Deste modo, a função exponencial de variável complexa é um prolongamento da função exponencial

de variável real.

Proposição 7 Propriedades da exponencial Sejam z, w ∈ C. São válidas as seguintes pro-priedades:

(a) ez+w = ez · ew;

(b) ez nunca se anula;

(c)¯ex+iy

¯= ex;

(d) ez é uma função periódica, com período 2πi;

(e) ez = 1⇔ z = 2nπi, para algum n ∈ Z;

(f) (ez)n = enz, com n ∈ Z.

27

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28 CAPÍTULO 2. FUNÇÕES ELEMENTARES

Proposição 8 A função exponencial

f (z) = ez = ex (cos y + i sin y)

é analítica em C e a sua derivada é

f 0 (z) = ez

(ez)0 = ez

Exercícios resolvidos

1. Escreva na forma algébrica os números complexos e3+i, e−π4 i e e2±3πi.

2. Mostre, usando a definição de derivada, que f(z) = ez é uma função inteira (analítica).

3. Resolva a equação ez = −1.

4. Determine o domínio de analiticidade da função g(z) = z2/ (ez − 1).

Propostas de resolução

1. Relembramos que

z = x+ iy ⇔ z = r (cos θ + i sin θ) = r eθi

onde r = |z| =px2 + y2 e θ = arctan

³yx

´Então temos:

e3+i = e3 (cos 1 + i sin 1) = e3 cos 1 +¡e3 sin 1

¢i;

e−π4 i = e0

³cos³−π4

´+ i sin

³−π4

´´= −√2

2−√2

2i:

e2±3πi = e2 (cos (±3π) + i sin (±3π)) = e2 (−1 + 0i) = −e2 + 0i = −e2.

2. Dado um complexo arbitrário z0 procedamos ao cálculo, pela definição, da derivada de f em

z0 :

f 0(z0) = f 0(z0) = lim∆z→0

f(z0 +∆z)− f(z0)

∆z= lim∆z→0

ez0+∆z − ez0

∆z

= lim∆z→0

ez0(e∆z − 1)∆z

= ez0 lim∆z→0

e∆z − 1∆z

= ez0

visto que lim∆z→0¡e∆z − 1

¢/∆z = 1, logo a derivada existe para qualquer z0, logo a função

é analítica.

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2.2. AS FUNÇÕES TRIGONOMÉTRICAS 29

3. Temosez = −1⇔ ex(cos y + i sin y) = −1

⇔ ex cos y + (ex sin y) i = −1⇔ ex cos y = −1 ∧ sin y = 0⇔ ex cos y = −1 ∧ y = kπ, k ∈ Z

Se k é par então cos y = 1 e logo,

ex cos y = −1⇒ ex = −1,

o que sabemos ser impossível. Se k é ímpar, dado que cos y = −1, temos

ex cos y = −1⇒ ex = 1⇒ x = 0.

Então,

ez = −1⇔ x = 0 ∧ y = (2n+ 1)π,

com n ∈ Z. O conjunto S das soluções da equação ez = −1 é dado por

S = (2n+ 1)πi : n ∈ Z .

4. A função g(z) = z2/ (ez − 1) tem por domínio o conjunto

D = z ∈ C : ez − 1 6= 0 .

Tratando-se do quociente de duas funções inteiras, a função g(z) é analítica em todos os

pontos tais que ez − 1 6= 0, ou seja, em todos os pontos do domínio D. Mas, pela alínea (e)

da proposição 3,

ez − 1 6= 0⇔ ez 6= 1⇔ z 6= 2nπi, n ∈ Z.

Logo, o domínio de analiticidade da função dada é

D = C\ z ∈ C : z = 2nπi, n ∈ Z .

2.2 As funções trigonométricas

Definição 8 Para qualquer z ∈ C, definem-se as funções seno e coseno de z por

sin z =ezi − e−zi

2ie cos z =

ezi + e−zi

2.

Nota 4 Vejamos que se mantêm as propriedades já conhecidas em R.

Proposição 9 Propriedades do seno e do coseno Sejam z, w ∈ C. São válidas as seguintespropriedades:

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30 CAPÍTULO 2. FUNÇÕES ELEMENTARES

(a) sin(−z) = − sin z;

(b) cos(−z) = cos z;

(c) sin2 z + cos2 z = 1;

(d) sin(z ± w) = sin z cosw ± cos z sinw;

(e) cos(z ± w) = cos z cosw ∓ sin z sinw;

(f) sin z e cos z são funções periódicas, com período 2π.

Proposição 10 As funções sin z e cos z são analíticas em C e tem lugar as seguintes regras de

derivação:

(sin z)0 = cos z e (cos z)0 = − sin z

Nota 5 Outras funções trigonométricas de variável complexa e as suas derivadas

tan z =sin z

cos z, onde (tan z)

0=

1

cos2 z, cos z 6= 0

cot z =cos z

sin z, onde (cot z)0 = − 1

sin2 z, sin z 6= 0

sec z =1

cos z, onde (sec z)

0= sec z tan z, cos z 6= 0

csc z =1

sin z, onde (csc z)0 = − csc z cot z, sin z 6= 0

Exercícios resolvidos

1. Mostre que cos z não é analítica em nenhum ponto do seu domínio.

2. Determine as partes real e imaginária das funções seno e coseno.

3. Mostre que |sin z| ≥ |sinx| .

4. Resolva a equação cos z = 2.

5. Mostre que sin(2z) = 2 sin z cos z e cos(2z) = cos2 z − sin2 z.

6. Mostre que ainda é válida em C a fórmula de Euler

eiz = cos z + i sin z.

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2.2. AS FUNÇÕES TRIGONOMÉTRICAS 31

Propostas de resolução

1. Dado z = x+ yi,

cos z =ezi + e−zi

2=

e(x−yi)i + e−(x−yi)i

2=

ey+xi + e−y−xi

2

=ey(cosx+ i sinx) + e−y(cosx− i sinx)

2

=(ey + e−y) cosx+ i(ey − e−y) sinx

2.

A esta função correspondem as partes real e imaginária

u(x, y) = (ey + e−y) cosx

2e v(x, y) = (ey − e−y) sin

x

2,

respectivamente. As funções u e v não verificam as equações de Cauchy-Riemann. Por

exemplo,∂u

∂x=

∂v

∂y⇔ −e

y + e−y

2sin

x

2= (ey + e−y) sin

x

2

⇔ −ey + e−y

2= ey + e−y ⇔ ey + e−y = 0,

trata-se de uma equação impossível.

2. Atendendo às expressões de seno e coseno hiperbólicos conhecidas em R, podemos escrever

sin z =ezi − e−zi

2i=

e−y+xi − ey−xi

2i

=e−y(cosx+ i sinx)− ey(cosx− i sinx)

2i

=(e−y − ey) cosx+ i (e−y + ey) sinx

2i

=e−y + ey

2sinx+ i

ey − e−y

2cosx

= sinx cosh y + i cosx sinh y.

Logo, u(x, y) = sinx cosh y e v(x, y) = cosx sinh y. Analogamente,

cos z =ezi + e−zi

2=

e−y+xi + ey−xi

2

=e−y(cosx+ i sinx) + ey(cosx− i sinx)

2

=(e−y + ey) cosx+ i (e−y − ey) sinx

2

=e−y + ey

2cosx− i

ey − e−y

2sinx

= cosx cosh y − i sinx sinh y,

donde u(x, y) = cosx cosh y e v(x, y) = sinx sinh y.

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32 CAPÍTULO 2. FUNÇÕES ELEMENTARES

3. Notemos que, dado y ∈ R, temos

cosh2 y − sinh2 y =

µe−y + ey

2

¶2−µey − e−y

2

¶2=

e−2y + 2e−yey + e2y −¡e2y − 2eye−y + e−2y

¢4

=4e−y+y

4= 1.

Atendendo ao exercício 2, podemos escrever

|sin z|2 = |sinx cosh y + i cosx sinh y|2

= (sinx cosh y)2 + (cosx sinh y)2

= sin2 x(1 + sinh2 y) + cos2 x sinh2 y

= sin2 x+¡sin2 x+ cos2 x

¢sinh2 y

= sin2 x+ sinh2 y =¯sin2 x

¯+ sinh2 y.

Logo,

|sin z|2 ≥ |sinx|2

e, dado que |sin z| e |sinx| representam números reais positivos, concluímos que |sin z| ≥|sinx|. De modo análogo prova-se que

|cos z|2 = cos2 x+ sinh2 y,

o que permite concluir que |cos z| ≥ |cosx|, para z = x+ yi.

4. Temos

cos z = 2⇔ ezi + e−zi

2= 2⇔ ezi + e−zi = 4.

Multiplicando por ezi 6= 0, obtemos a equação quadrática

cos z = 2 ⇔¡ezi¢2 − 4ezi + 1 = 0

⇔ ezi =4±√16− 42

= 2±√3.

Então,

e(x+yi)i = e−y+xi = e−y(cosx+ i sinx) = 2±√3,

o que permite concluir que

e−y cosx = 2±√3 ∧ e−y sinx = 0.

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2.3. AS FUNÇÕES HIPERBÓLICAS 33

De e−y sinx = 0 concluímos que sinx = 0, ou seja, que x = nπ, para n ∈ Z. Se n ímparentão cosx = −1 e logo

−e−y = 2±√3⇔ e−y = −2±

√3,

o que sabemos ser impossível, visto que −2±√3 < 0. Se n par, cosx = 1 e logo,

e−y = 2±√3⇔ −y = ln

³2±√3´⇔ y = − ln

³2±√3´.

Atendendo a que ln¡2−√3¢= − ln

¡2 +√3¢, podemos concluir que as soluções da equação

são z = 2kπ ± i ln¡2 +√3¢. Notemos que esta equação é impossível em R.

5. sin(2z) = sin(z + z) = sin z cos z + cos z sin z = 2 sin z cos z;

cos(2z) = cos(z + z) = cos z cos z − sin z sin z = cos2 z − sin2 z.

6. cos z + i sin z =ezi + e−zi

2+ i

ezi − e−zi

2i=2ezi

2= ezi.

2.3 As funções hiperbólicas

Recordemos que para x ∈ R, as funções hiperbólicas seno e coseno são definidas através da funçãoexponencial de variável real por

(2.1) sinhx =ex − e−x

2e coshx =

ex + e−x

2.

As respectivas funções de variável complexa definem-se de modo análogo.

Definição 9 Para qualquer z ∈ C, definem-se as funções seno hiperbólico e coseno hiperbólicode z por

sinh z =ez − e−z

2e cosh z =

ez + e−z

2.

Proposição 11 As funções seno e coseno hiperbólico são analíticas em C e são válidas as seguintes

fórmulas de derivação:

(sinh z)0 =ez + e−z

2= cosh z e (cosh z)0 =

ez − e−z

2= sinh z.

• Também se podem definir as funções tangente e cotangente hiperbólicas de variável complexa,a saber

tanh z =sinh z

cosh z, coth z =

cosh z

sinh z=

1

tanh z,

assim como a função secante hiperbólica, 1/ cosh z, e a função cosecante hiperbólica, 1/ sinh z.

Proposição 12 As funções hiperbólicas tem asa seguintes propriedades

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34 CAPÍTULO 2. FUNÇÕES ELEMENTARES

1. As funções seno e coseno hiperbólico são periódicas de período 2πi

2. sinh (iz) = i sin (z) , cosh (iz) = cos z

3. sin (iz) = i sinh (z) , cos (iz) = cosh (z)

4. sinh (z) = sinh (x) cos (y) + i cosh (x) sin (y)

5. cosh (z) = cosh (x) cos (y) + i sinh (x) sin (y)

6. sinh (z) = 0⇔ z = −nπi, n ∈ N

7. cosh (z) = 0⇔ z = − (2n+ 1) π2 i, n ∈ N

Exercícios resolvidos

1. Determine, às relações entre as funções trigonométricas e as funções hiperbólicas, as partes

real e imaginária das funções seno e coseno.

2. Mostre que cos z = cosh(iz).

3. Mostre que cosh2 z − sinh2 z = 1.

4. Mostre que 2πi é o período das funções seno e coseno hiperbólicos.

Propostas de resolução

1. sin z = sin(x+ yi) = sinx cos(yi) + cosx sin(yi) = sinx cosh y + i cosx sinh y

cos z = cos(x+ yi) = cosx cos(yi)− sinx sin(yi) = cosx cosh y − i sinx sinh y.

2. cos(iz) =e(iz)i + e−(iz)i

2=

e−z + ez

2= cosh z.

3. cosh2 z − sinh2 z = (ez + e−z)2

4− (e

z − e−z)2

4

=e2z + 2ez−z + e−2z − e2z + 2ez−z − e−2z

4= 1.

4. Temos

sinh(z + 2πi) = sinh(x+ (2π + y)i)

= sinhx cos(2π + y) + i coshx sin(2π + y)

= sinhx cos y + i coshx sin y = sinh z,

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2.4. A FUNÇÃO LOGARITMO 35

assim como

cosh(z + 2πi) = cosh(x+ (2π + y)i)

= coshx cos(2π + y) + i sinhx sin(2π + y)

= coshx cos y + i sinhx sin y = cosh z.

Não seria de esperar outro valor para o período, dado que estas funções são definidas através

da função exponencial.

2.4 A função logaritmo

No caso das funções reais, a função logaritmo neperiano é simplesmente a função inversa da função

exponencial neperiana. Dados x, y ∈ R temos x = ln y se e só se ex = y.

O caso complexo é mais delicado. A função exponencial é periódica de período 2πi e, como tal,

não é invertível em todo o seu domínio C. No entanto, pretende-se que a relação

(2.2) log z = w se e só se z = ew

se mantenha válida em C. Se (2.2) se verificar para w = u+ vi então

eu+vi = z ⇔ eu(cos v + i sin v) = z

⇔ |z| = eu ∧ arg z = v

⇔ u = ln |z| ∧ v = arg z.

Deste modo, para z 6= 0 (visto que ew 6= 0 para todo o w ∈ C), é natural definir

(2.3) log z = ln |z|+ i arg z.

Existem, no entanto, infinitos valores para log z, um para cada argumento de z. A diferença

entre quaisquer dois destes valores é um múltiplo inteiro de 2πi. Assim, a expressão (2.3) não

define uma função.

Observemos que, se z = |z| ei arg z = x+ yi,

elog z = eln|z|+i arg z = eln|z|ei arg z = |z| ei arg z = z.

Mas,

log(ez) = ln |ez|+ i arg ez = ln ex + i(y + 2kπ)

= x+ (y + 2kπ)i = (x+ yi) + 2kπi = z + 2kπi,

para k ∈ Z. No entanto, se considerarmos para argumento de z o seu argumento principal, casoem que tomamos k = 0, é possível definir a função logaritmo.

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36 CAPÍTULO 2. FUNÇÕES ELEMENTARES

Definição 10 Para qualquer z = x+yi ∈ C, com z 6= 0, define-se a função logaritmo principalde z por

log z = ln |z|+ i arg z,

com arg z ∈ [−π, π[.

Podemos agora afirmar que a função logaritmo principal, log z, é a função inversa da re-

strição da função exponencial de variável complexa à região fundamental x+ yi : −π ≤ y < π.Ou seja, verifica-se (2.2).

Nota 6 Podemos definir a função logaritmo mais geralmente da seguinte forma: a função loga-

ritmo relativa ao intervalo [θ0, θ0 + 2π[ é a função

log z = ln |z|+ i arg z, arg z ∈ [θ0, θ0 + 2π[ .

Esta função designa-se muitas vezes por ramo do logaritmo correspondente ao intervalo [θ0, θ0 + 2π[;

quando θ0 = −π, obtém-se o ramo principal do logaritmo. A função logaritmo relativa ao inter-

valo [θ0, θ0 + 2π[ é a função inversa da restrição da função exponencial à região fundamental

x+ yi : θ0 ≤ y < θ0 + 2π .

Nota 7 Quando z é um número real positivo, z = x+ 0i com x > 0, a definição de log z coincide

com a definição já conhecida em R

log z = log x = ln |x|+ i arg x = lnx.

Salvo indicação em contrário, em tudo o que se segue, quando nos referimos à

função log z referimo-nos à função logaritmo principal.

Nota 8 No cálculo real, não está definido o logaritmo de números negativos. Em C tal não é

verdade. Por exemplo,

log(−1) = ln |−1|+ i arg(−1) = ln 1 + i (−π) = −πi.

Este é um dos motivos que nos leva a considerar notações diferentes para o logaritmo de um número

complexo e para o logaritmo neperiano de um número real.

A parte real da função logaritmo, u(x, y) = ln |z| = lnpx2 + y2, é contínua em C\ 0. Con-

tudo, a parte imaginária v(x, y) = arg(x+yi) é descontínua nos pontos de coordenadas (x, 0), com

x < 0 (exercício 5). Como tal, a função logaritmo não é contínua no eixo real negativo, ou

seja, em complexos z da forma z = x+ 0i, com x ≤ 0.As propriedades do logaritmo que se verificam no cálculo real continuam válidas em C, desde

que correctamente interpretadas. Vejamos os seguintes exemplos.

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2.4. A FUNÇÃO LOGARITMO 37

Exemplo 4 Consideremos os números complexos z = −1 e w = i e escolham-se os argumentos

no intervalo [0, 2π[. Temos |z| = 1, arg z = π, |w| = 1 e argw = π/2. Como tal,

log z + logw = (ln 1 + iπ) +³ln 1 + i

π

2

´=3π

2i.

Por outro lado,

zw = cis³π +

π

2

´= cis

2,

pelo que

log (zw) = ln 1 + i

µ3π

2

¶=3π

2i.

Logo, neste caso, verifica-se a igualdade log z + logw = log (zw).

Escolha-se agora o intervalo [−2π, 0[ para os argumentos de z e w. Então, arg z = −π, argw =−3π/2 e arg (zw) = −π/2, donde

log z + logw = (ln 1− iπ) +

µln 1− i

2

¶= −5π

2i,

log (zw) = ln 1 + i³−π2

´= −π

2i.

Neste caso, verificamos que a diferença (log z + logw)− log (zw) é de −2πi.

Proposição 13 Propriedades do logaritmo Sejam z,w ∈ C\ 0. São válidas as seguintespropriedades:

(a) log(zw) = log z + logw (mod 2πi);

(b) log(z/w) = log z − logw (mod 2πi).

(c) log (z) é analítica no conjunto C\ x+ iy : x ≤ 0 e y = 0 e a sua derivada é dada por

(log z)0 =1

z

Exercícios resolvidos

1. Determine os valores de log(−2), log i, log(−1− i) e log¡√3 + i

¢.

2. Resolva a equação ez =√3 + i.

3. Calcule o valor principal de log(−3).

4. Considere os números complexos z = −i e w = −1 + i. Mostre que log (z/w) = log z − logw(mod 2πi).

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38 CAPÍTULO 2. FUNÇÕES ELEMENTARES

5. Mostre que a função v(x, y) = arg(x + yi) é descontínua nos pontos de coordenadas (x, 0) ,

com x < 0.

6. Mostre que a função f(z) = log z verifica as condições de Cauchy-Riemann para z = x+ yi,

com z 6= 0 e z 6= x < 0.

7. Derive a função

f(z) = log(ez + 1),

indicando a região em que é analítica.

Propostas de resolução

1. log(−2) = ln 2 + i arg (−2) = ln 2 + i(π + 2kπ),

log i = ln 1 + i arg i = i³π2+ 2kπ

´,

log (−1− i) = ln√2 + i arg(−1− i) = ln

√2 + i

µ−3π4+ 2kπ

¶,

log¡√3 + i

¢= ln 2 + i arg

¡√3 + i

¢= ln 2 + i

³π6+ 2kπ

´, k ∈ Z.

2. Temos

ez =√3 + i⇔ z = log

³√3 + i

´.

Pelo exercício 1, o conjunto solução da equação é

S =nln 2 + i

³π6+ 2kπ

´: k ∈ Z

o.

3. Dado que −3 = 3cis (−π), o valor principal do logaritmo de −3 é

log(−3) = ln 3 + i(−π) = ln 3− πi.

4. Consideremos os números complexos z = −i e w = −1 + i e escolham-se os argumentos no

intervalo [−π, π[. Temos |z| = 1, arg z = −π/2, |w| =√2 e argw = 3π/4. Como tal,

log z − logw =³ln 1 + i

³−π2

´´−µln√2 + i

4

¶= ln

√2 + i

µ−π2− 3π4

¶= ln

√2− i

4.

Por outro lado,

z

w=

1√2cis

µ−π2− 3π4

¶=

1√2cis

µ−5π4

¶=√2cis

4,

pelo que

logz

w= ln

√2 + i

4.

Verificamos então que a diferença (log z − logw)− log (z/w) é de −2πi.

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2.4. A FUNÇÃO LOGARITMO 39

5. Seja (x0, 0) ∈ R2 tal que x0 < 0. Então,

lim(x,y)→(x0,0)

y>0

arg(x+ yi) = π,

enquanto que

lim(x,y)→(x0,0)

y<0

arg(x+ yi) = −π.

Podemos assim concluir que, para x0 < 0, não existe lim(x,y)→(x0,0) v(x, y).

6. Para z = x+ yi = reiθ temos u(r, θ) = ln r e v(r, θ) = θ. Assim,

∂u

∂r=

1

re

∂u

∂θ= 0

∂v

∂r= 0 e

∂v

∂θ= 1,

o que mostra serem válidas as equações de Cauchy-Riemann estabelecidas para coordenadas

polares,∂u

∂r=1

r

∂v

∂θe

∂v

∂r= −1

r

∂u

∂θ.

7. A função ez + 1 é analítica em C. Logo, log (ez + 1) é analítica em todos os pontos tais

que ez + 1 pertence ao domínio de analiticidade da função logaritmo, ou seja, é analítica no

conjunto

C\ z ∈ C : Im (ez + 1) = 0 ∧Re (ez + 1) ≤ 0 .

Escrevendo z = x+ yi,

Im (ez + 1) = 0⇔ ex sin y = 0⇔ sin y = 0⇔ y = nπ, para n ∈ Z.

Por outro lado,

Re (ez + 1) ≤ 0⇔ ex cos y + 1 ≤ 0⇔ ex cos y ≤ −1.

Como y = nπ, n ∈ Z, temos cos y = 1, se n é par, e cos y = −1, se n é ímpar. Se n for parentão ex ≤ −1, o que é impossível. Se n for ímpar então ex ≥ 1, ou seja, x ≥ 0. Concluímosque f é analítica no conjunto

C\ z = x+ yi : x ≥ 0 ∧ y = 2(k + 1)π, k ∈ Z .

Utilizando o teorema da função composta,

f 0(z) =ez

ez + 1.

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40 CAPÍTULO 2. FUNÇÕES ELEMENTARES

Exercícios propostos

1. Calcule todos os valores de ei, log(−2i), e3 log(1−i).

2. Resolva, em C, as seguintes equações:

(a) cos z = 10; (b) cos z = sin z; (c) sin z = 2;

(d) sinh z = −i; (e) eiz = −3; (d) ez + 6e−z = 5.

3. Apresente as seguintes funções na forma f(z) = u+ vi:

(a) f(z) = e−iz; (b) f(z) = ez2

.

4. Determine as regiões onde as seguintes funções são analíticas e calcule f 0(z):

(a) f(z) = eπz3−1; (b) f(z) = cos (1/z) + e

1z2+1 ;

(c) f(z) = sin¡log z2

¢; (d) f(z) =

√z2 − 2.

5. Determine para que valores de z é válida a igualdade log z2 = 2 log z, quando se considera o

ramo principal do logaritmo.

6. Mostre que a função f(z) = ez não é analítica em nenhum ponto do seu domínio.

7. Mostre que e2πi = 1, eπ/2i = i, eπi = −1, e−π/2i = −i e e−πi = −1.

8. Mostre que¯eiy¯= 1, para todo o y ∈ R.

9. Mostre que u(x, y) = Re³ez

2´é uma função harmónica.

10. Mostre que tan z = u+vi onde u(x, y) = sin 2x/ (cos 2x+ cosh 2y) e v(x, y) = sinh 2x/ (cos 2x+ cosh 2y) .

11. Prove que a função tan z é periódica de período π.

12. Mostre que, para quaisquer z, w ∈ C, são válidas as seguintes igualdades

(a) cosh (z + w) = cosh z coshw + sinh z sinhw;

(b) sinh (z + w) = sinh z coshw + cosh z sinhw;

(c) cosh2 z + sinh2 z = 1.

13. Mostre que cos z = cos z.

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2.4. A FUNÇÃO LOGARITMO 41

Soluções

1. cos 1 + i sin 1; ln 2 + i (−π + 2kπ), k ∈ Z; −2− 2i.

2. (a) z = 2nπ ± i ln¡10 + 3

√11¢; (b) z = π/4 + nπ; (c) z = π/2 + 2nπ − i ln

¡2±√3¢; (d)

z = (−π/2 + 2nπ) i; (e) (−π + 2nπ)− (ln 3) i; (f) z = ln 3 + 2nπi ∨ z = ln 2 + 2nπi.

3. (a) ey cosx− iey sinx; (b) ex2−y2 cos (2xy) + iex

2−y2 sin (2xy).

4. (a) f 0(z) = 3πz2eπz3−1, ∀z ∈ C; (b) f 0(z) = 1

z2sin

µ1

z

¶− 2z

(z2 + 1)2 e

1z2+1 , ∀z ∈ C\ −i, 0, i;(c)

f 0(z) =2

zcos¡log z2

¢, ∀z ∈ C\ z = yi : y ∈ R; (d) z√

z2 − 2, ∀z ∈ C\

©z = yi ∨ z = x,−

√2 ≤ x ≤

√2ª.

5. z = reiθ, com r > 0 e θ ∈ [−π/2, π/2[.

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42 CAPÍTULO 2. FUNÇÕES ELEMENTARES

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Capítulo 3

Integração no plano complexo

O estudo da integração no plano complexo é importante por duas razões essenciais. Por um

lado, podem ocorrer integrais de variável real cujo cálculo não é imediato pelos métodos usuais de

integração real mas que a integração complexa permite resolver facilmente. Por exemplo, o cálculo

do integral Z ∞0

sin2 x

x2dx.

Por outro lado, algumas propriedades básicas das funções analíticas podem ser estabelecidas com

base na integração complexa não sendo as abordagens alternativas imediatas. O teorema de

Cauchy-Goursat, por exemplo, permite concluir que as funções analíticas possuem derivadas de

todas as ordens.

3.1 Integrais curvilíneos

Os integrais curvilíneos, integrais de uma função f(z) ao longo de uma certa curva no plano

complexo, são definidos de forma análoga à usada para definir integrais curvilíneos no plano bidi-

mensional R2.

Definição 11 Sejam a, b ∈ R, com a ≤ b. Uma curva em C é o contradomínio de uma função

contínua γ : [a, b] → C. A função γ é designada por parametrização da curva (de parâmetro

real t) e

γ(t) = x(t) + iy(t), t ∈ [a, b]

por equação paramétrica da curva.1

1Podemos pensar numa curva como a trajectória de um ponto material (x(t), y(t)) = x(t) + iy(t) ∈ C, em cadainstante t, com t a variar num intervalo de tempo [a, b].

43

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44 CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO

Dada uma curva parametrizada por γ(t) = x(t) + y(t)i, t ∈ [a, b], e t0 ∈ [a, b], o vector

γ0(t0) = x0(t0) + iy0(t0)

designa-se por vector tangente à curva no ponto t = t0.2

Sempre que não haja ambiguidade, referimo-nos à curva γ para mencionar a curva parame-

trizada por γ.

Definição 12 Uma curva γ diz-se suave (ou regular) quando as funções x(t) e y(t) têm derivadas

contínuas no intervalo [a, b] e o vector γ0(t) = x0(t) + iy0(t) não se anula em [a, b].

Se existir uma partição do intervalo [a, b], ou seja, um número finito de valores reais a0, a1, . . . , an,

com a0 = a < a1 < · · · < an = b, tal que as restrições γj = γ|]aj−1,aj [, j = 1, 2, . . . , n, são curvas

suaves então a curva γ diz-se seccionalmente suave (ou seccionalmente regular). Neste caso,

γ diz-se a soma (ou união) das curvas γj, j = 1, 2, . . . , n, e denota-se por γ1+γ2+ · · ·+ γn.

a bt

γ

••

γ(t)

γ(a)

γ(b)

x

y

A suavidade de uma curva significa geometricamente que ela tem vector tangente γ0(t) = x0(t) +

iy0(t) único em cada ponto e que este varia continuamente em t.

Exemplo 10 A função γ(t) = x(t) + iy(t) tal que½x(t) = ty(t) = t2

, t ∈ R

define a parábola dada, em coordenadas rectangulares, pela equação y = x2. Consideremos a

função γ : [−1, 2]→ C definida por γ(t) = t+ it2. Dado que x(t) e y(t) são funções contínuas com

derivadas contínuas no intervalo [−1, 2], γ é uma curva suave que corresponde ao arco da parábola2Note-se que γ é uma aplicação de variável real. Como tal, a existência da derivada γ0(t) implica que existam as

derivadas x0(t) e y0(t) enquanto derivadas de funções reais de variável real.Em cada instante t, o vector tangente (x0(t), y0(t)) = x0(t)+ iy0(t) pode ser interpretado como o vector velocidade

de um ponto material, com posição (x(t), y(t)).

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3.1. INTEGRAIS CURVILÍNEOS 45

y = x2 compreendido entre os pontos z1 = γ(−1) = −1 + i e z2 = γ(2) = 2 + 4i. Note-se que

γ0(t) = 1 + 2ti 6= 0 para −1 ≤ t ≤ 2. Geometricamente,

γ

x

y •

•-1 2 -1 2

Exemplo 11 A circunferência de centro na origem e de raio 1 pode ser parametrizada por γ(t) =

cos t+ i sin t = eit, t ∈ [0, 2π]. De facto,

x2(t) + y2(t) = cos2 t+ sin2 t = 1.

Trata-se de uma curva suave visto que x(t) = cos t e y(t) = sin t são funções contínuas com

derivadas contínuas no intervalo [0, 2π] e γ0(t) = − sin t+ i cos t 6= 0 para 0 ≤ t ≤ 2π (as funçõesseno e coseno não têm zeros coincidentes).

Exemplo 12 A elipse de centro na origem e de semi-eixos horizontal e vertical com medidas a 6= 0e b 6= 0, respectivamente, tem parametrização γ(t) = a cos t+ ib sin t, t ∈ [0, 2π]. Com efeito,

x2(t)

a2+

y2(t)

b2= cos2 t+ sin2 t = 1.

Trata-se, tal como a circunferência, de uma curva suave.

Exemplo 13 A curva γ parametrizada por

γ(t) =

½t+ it2 se − 1 ≤ t ≤ 2t+ 4i se 2 ≤ t ≤ 3

é seccionalmente suave. Dado que γ1(2) = γ2(2), γ é a união da curva γ1(t) = γ|]−1,2[(t) = t+ it2

com a curva γ2(t) = γ|]2,3[(t) = t + 4i. Além disso, γ1 é uma curva suave dado que as funções

x(t) = t e y(t) = t2 têm derivadas contínuas e γ01(t) = 1 + 2ti 6= 0. Analogamente, a restrição γ2

é uma curva suave. Observamos que γ não é suave pois γ01 (2) = 1 + 4i enquanto que γ02 (2) = 1.

No que segue todas as curvas consideradas são seccionalmente suaves, salvo indicação em con-

trário.

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46 CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO

Definição 13 A orientação ou sentido de uma curva γ : [a, b] → C, a ≤ b, é de γ(a) para

γ(b). A curva −γ parametrizada por

(−γ)(t) = γ(a+ b− t), t ∈ [a, b] ,

corresponde ao mesmo conjunto de pontos mas orientada no sentido inverso ao de γ.

Quando o ponto final coincide com o ponto inicial, γ(a) = γ(b), a curva γ diz-se fechada. A

orientação de uma curva fechada diz-se positiva (ou directa) se é contrária à dos ponteiros do

relógio e diz-se negativa (ou indirecta) no caso contrário.

Se γ(t1) 6= γ(t2) sempre que t1 6= t2, com t1, t2 ∈ ]a, b[, então a curva diz-se simples. Umacurva simples e fechada é designada por curva de Jordan3 .

Exemplo 14 A curva γ(t) = z0 + reit, com t ∈ [α, β] e β ≤ α + 2π, define um arco da circun-

ferência de centro z0 e de raio r, com extremidades inicial e final γ (α) e γ (β), respectivamente.

Trata-se de uma curva suave dado que x(t) = x0 + r cos t e y(t) = y0 + r sin t têm derivadas con-

tínuas e γ0(t) = ireit 6= 0 em todos os pontos. Quando β = α+2π, temos γ (α) = γ (β) e a curva é

fechada e descrita no sentido positivo. Atendendo a que se trata de uma circunferência, é imediato

que se trata de uma curva simples. A curva (−γ) (t) = z0 + re−it, t ∈ [α, α+ 2π], representa amesma circunferência, mas orientada no sentido negativo.

Comecemos por definir o integral curvilíneo de uma função complexa de variável real.

Definição 14 Seja h : [a, b] → C uma função complexa de variável real definida por h(t) =

u(t) + iv(t), para funções u e v contínuas em [a, b]. Define-se o integral curvilíneo da função

h no intervalo [a, b] como sendo o número complexoZ b

a

h(t)dt =

Z b

a

u(t)dt+ i

Z b

a

v(t)dt,

onde os integrais de u e v são integrais usuais de funções reais de uma variável real.

Exemplo 5 Pretendemos determinar o integral curvilíneo da função h(t) = t2+1+t3i no intervalo

[0, 1]. Dado que u(t) = t2 + 1 e v(t) = t3 são as partes real e imaginária de h, respectivamente,

temos Z 1

0

¡t2 + 1 + it3

¢dt =

Z 1

0

(t2 + 1)dt+ i

Z 1

0

t3dt =4

3+1

4i.

Segue-se a definição de integrais curvilíneos para funções complexas de variável complexa.

3Em referência a Camille Jordan (1838-1922).

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3.1. INTEGRAIS CURVILÍNEOS 47

Definição 15 Sejam f uma função contínua definida num aberto A ⊆ C e γ : [a, b]→ C uma curva

seccionalmente suave tal que γ ([a, b]) ⊂ A. Define-se o integral curvilíneo (ou simplesmente

integral) ao longo de γ, que se denota porRγf(z)dz (ou simplesmente por

Rγf), como sendo o

número complexo Zγ

f(z)dz =nXj=1

Z aj

aj−1

f¡γj (t)

¢· γ0j(t)dt,

onde a0 = a < a1 < · · · < an = b é uma partição do intervalo [a, b] tal que as restrições γj =

γ|]aj−1,aj [, para j = 1, . . . , n, parametrizam curvas suaves. A função f é designada por função

integranda. Quando a curva é fechada é usual a notaçãoHγf .

A continuidade da função f em todos os pontos da curva e a continuidade das restrições γ0j ,

para j = 1, ..., n, garantem a existência do integral. O valor do integral corresponde, assim, à

soma (finita) dos n integrais curvilíneos das funções complexas de variável real f¡γj (t)

¢· γ0j(t) em

cada um dos intervalos [aj−1, aj ], conforme a definição 6. No caso particular de f ser uma função

contínua em todos os pontos de uma curva suave γ : [a, b]→ C, temos o caso mais simples em queZγ

f(z)dz =

Z b

a

f (γ (t)) · γ0(t)dt.

Exemplo 15 Consideremos a circunferência de centro na origem e de raio 2. Uma parametrização

para esta curva suave pode ser definida por

γ(t) = 2 cos t+ i2 sin t = 2eit, t ∈ [0, 2π] .

Pretendemos calcular o valor do integral de f(z) = 1/z ao longo da curva γ. A função f está

definida e é contínua em todos os pontos da curva γ (f tem por domínio C\ 0 mas a origem não

pertence à curva). Então, dado que γ0(t) = −2 sin t+ i2 cos t,Iγ

f(z)dz =

Z 2π

0

f(2 cos t+ i2 sin t) (−2 sin t+ i2 cos t) dt

=

Z 2π

0

1

2 cos t+ i2 sin t(−2 sin t+ i2 cos t) dt

=

Z 2π

0

2 cos t− i2 sin t

4 cos2 t+ 4 sin2 t(−2 sin t+ i2 cos t) dt

=

Z 2π

0

−4 cos t sin t+ 4i cos2 t+ i4 sin2 t+ 4 sin t cos t

4dt

=

Z 2π

0

4i

4dt = i

Z 2π

0

dt = 2πi.

Em alternativa, podemos usar a forma γ(t) = 2eit. Temos então γ0(t) = 2ieit e o integral é dado

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48 CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO

por Iγ

f(z)dz =

Z 2π

0

f¡2eit

¢2ieitdt

=

Z 2π

0

1

2eit2ieitdt =

Z 2π

0

idt = i

Z 2π

0

dt = 2πi.

Exemplo 6 Consideremos a curva representada na figura e a função f(z) = z definida em todo o

plano complexo.

x

y2+2i

0

Trata-se de uma curva seccionalmente suave, união de duas curvas suaves: o segmento de recta

que une z = 0 a z = 2 parametrizado por γ1(t) = t, t ∈ [0, 2] , e o segmento de recta que une z = 2a z = 2 + 2i parametrizado por γ2(t) = 2 + (t− 2) i, t ∈ [2, 4]. Dado que a função f(z) = z é

contínua em C (em particular, na curva) e γ01(t) = 1 e γ02(t) = i, o integral curvilíneo é obtido

como soma de dois integrais na variável real t,Zγ

f(z)dz =

Z 2

0

f(t)dt+

Z 4

2

f (2 + (t− 2) i) i dt

=

Z 2

0

tdt+

Z 4

2

(2 + (t− 2) i) i dt

=

Z 2

0

tdt+ i

Z 4

2

2dt−Z 4

2

(t− 2) dt = 4i.

Exemplo 16 Consideremos a função f(z) = z, de domínio C, e o arco da circunferência de centro

na origem e de raio 1 situado no 1o quadrante, parametrizado por γ(t) = cos t+ i sin t, t ∈ [0, π/2].Temos γ0(t) = − sin t+ i cos t e, sendo f(z) = x− yi uma função contínua em todos os pontos da

curva, obtemos Zγ

f(z)dz =

Z π/2

0

f (cos t+ i sin t) (− sin t+ i cos t)dt

=

Z π/2

0

(cos t− i sin t) (− sin t+ i cos t)dt

=

Z π/2

0

i¡cos2 t+ sin2 t

¢dt = i

Z π/2

0

dt =π

2i.

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3.1. INTEGRAIS CURVILÍNEOS 49

Exemplo 17 Dada a função f(z) = z2 contínua em todo o plano complexo, pretendemos calcular

o valor do seu integral ao longo do segmento de recta definido, em coordenadas rectangulares, pela

equação y = 5x, entre os pontos z1 = 0 e z2 = 2 + 10i. Podemos considerar a própria variável x

como parâmetro e usar a parametrização γ(x) = x+ 5xi, com x ∈ [0, 2]. Temos γ0(x) = 1+ 5i e ointegral é então dado porZ

γ

f(z)dz =

Z 2

0

f (x+ 5xi) (1 + 5i)dx =

Z 2

0

(x+ 5xi)2 (1 + 5i)dx

=

Z 2

0

¡10x2i− 24x2

¢(1 + 5i)dx =

Z 2

0

¡−74x2 − 110x2i

¢dx

=

Z 2

0

−74x2dx− i

Z 2

0

110x2dx = −5923− 880

3i.

Nota 9 Seja f(z) = u(x, y) + v(x, y)i e γ (t) = x(t) + iy(t) a parametrização de uma curva. Sem

perda de generalidade, podemos supor que γ é suave4 . Temos

Re

f(z)dz =

[u(x, y)dx− v(x, y)dy] ,

e

Im

f(z)dz =

[u(x, y)dy + v(x, y)dx] .

O integral curvilíneoRγf(z)dz pode assim ser escrito em termos de dois integrais de linha no plano

bidimensional.

Algumas propriedades dos integrais curvilíneos são enunciadas a seguir.

Proposição 14 Seja γ uma curva em C seccionalmente suave. Sejam f e g funções definidas e

contínuas na curva γ. São válidas as seguintes propriedades:

(a)Rγ[C1f(z) + C2g(z)] dz = C1

Rγf(z)dz+C2

Rγg(z)dz para constantes C1, C2 ∈ C (linearidade

do integral curvilíneo);

(b)R−γ f(z)dz = −

Rγf(z)dz (integral curvilíneo na orientação inversa);

(c) Se γ = γ1 + · · · + γn5 então

Rγ1+···+γn

f(z)dz =Rγ1f(z)dz + · · · +

Rγn

f(z)dz (integral

curvilíneo ao longo da união de curvas).4No caso em que γ é uma curva seccionalmente suave basta, atendendo à definição 8, usar o mesmo raciocínio

em cada subintervalo [aj−1, aj ] da partição do intervalo [a, b].5Escrevemos γ = γ1+γ2 para denotar que γ é a união ou soma das curvas seccionalmente suaves γ1 e γ2:

dadas curvas γ1 : [a, b]→ C e γ2 : [b, c]→ C com γ1(b) = γ2(b), define-se γ1 + γ2 : [a, c]→ C por

(γ1 + γ2) (t) =γ1 (t) se a ≤ t ≤ bγ2 (t) se b ≤ t ≤ c

.

A soma geral γ = γ1+ · · ·+ γn define-se de forma análoga.

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50 CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO

Exemplo 7 Considerando a curva apresentada na figura,

• 1+2i

1+i

Eixo real

Eixo imaginário

pretendemos calcular o valor do integral curvilíneo da função f(z) = x2 + y2i ao longo desta

curva seccionalmente suave. Esta curva é a união de duas curvas suaves, uma parametrizada por

γ1(t) = t + ti com t ∈ [0, 1] e outra parametrizada por γ2(t) = 1 + ti, com t ∈ [1, 2]. Entãoγ = γ1 + γ2 e logo Z

γ

f(z)dz =

Zγ1

f(z)dz +

Zγ2

f(z)dz

=

Z 1

0

f(γ1(t)) · γ01(t)dt+Z 2

1

f(γ2(t)) · γ02(t)dt

=

Z 1

0

¡t2 + t2i

¢(1 + i) dt+

Z 2

1

¡1 + t2i

¢i dt

= (1 + i)

Z 1

0

t2(1 + i)dt+

Z 2

1

¡i− t2

¢dt

= (1 + i)2Z 1

0

t2dt+ i

Z 2

1

dt−Z 2

1

t2dt

= (1 + i)2 1

3+ i− 7

3= −7

3+5

3i.

A mesma curva pode ser parametrizada por diferentes funções. Põe-se a questão de saber se o

valor do integral curvilíneoRγf(z)dz é independente da parametrização usada. Para responder a

esta questão necessitamos da seguinte definição.

Definição 16 Dada uma curva seccionalmente suave parametrizada por γ : [a, b]→ C, uma nova

função eγ : hea,ebi→ C diz-se uma reparametrização de γ se existe uma função α : [a, b]→hea,ebi

tal que α0(t) > 0, α(a) = ea, α(b) = eb e γ (t) = eγ (α (t)).As condições impostas a α, α0(t) > 0, α(a) = ea e α(b) = eb, garantem que a curva parametrizada

por eγ tem a mesma orientação que a curva parametrizada por γ.

Proposição 15 Se eγ : hea,ebi→ C é uma reparametrização de γ : [a, b]→ C entãoZγ

f(z)dz =

f(z)dz.

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3.1. INTEGRAIS CURVILÍNEOS 51

Exemplo 8 Pretendemos calcularRγRe(z)dz ao longo do segmento de recta que une z1 = 0 a

z2 = 1 + i. Escolha-se a parametrização γ : [0, 1]→ C dada por γ(t) = t+ it. A função integranda

é contínua nos pontos da curva. Dado que γ0(t) = 1 + i, temosZγ

Re(z)dz =

Z 1

0

Re (γ(t)) · γ0(t)dt =Z 1

0

Re (t+ it) (1 + i)dt

=

Z 1

0

t(1 + i)dt = (1 + i)

Z 1

0

t dt =1

2+1

2i.

Para a mesma curva podemos considerar outras parametrizações, por exemplo, eγ : [1, 2] → C

definida por eγ(t) = (t− 1) + i (t− 1) . Verificamos que o integral é dado pelo mesmo valor,Zγ

Re(z)dz =

Z 2

1

Re (eγ(t)) · eγ0(t)dt = Z 2

1

Re [t− 1 + i (t− 1)] (1 + i)dt

=

Z 2

1

(t− 1) (1 + i)dt = (1 + i)

Z 2

1

(t− 1) dt = 1

2+1

2i.

Frequentemente, é útil obter uma estimativa superior do módulo de um integral. Dada uma

curva parametrizada por γ(t) = x(t)+y(t)i, com t ∈ [a, b], o comprimento da curva γ é definidopor

l (γ) =

Z b

a

px0(t)2 + y0(t)2dt =

Z b

a

|γ0(t)| dt.

Nota-se que, o comprimento de uma curva é independente da parametrização considerada.

Proposição 16 Seja f uma função complexa de variável complexa definida e contínua num aberto

A ⊆ C e seja γ : [a, b] → A uma curva seccionalmente suave em A. Se f for limitada sobre a

curva, isto é, se existir M ≥ 0 tal que |f(z)| ≤M , para todo o z ∈ γ ([a, b]), então¯Zγ

f(z)dz

¯≤M · l(γ).

Exemplo 9 Consideremos a função complexa f(z) = ez/ (z + 1) de domínio C\ −1. Pre-

tendemos obter uma estimativa superior do módulo do integral de f ao longo da circunferên-

cia de centro na origem e de raio 4, definida por |z| = 4. Considerando a parametrização

γ(t) = 4 cos t+ 4 sin t, 0 ≤ t ≤ 2π, o comprimento desta curva é dado pelo integral

l (γ) =

Z 2π

0

q(−4 sin t)2 + (4 cos t)2 dt =

Z 2π

0

4 dt = 8π

(como seria de esperar pela fórmula do perímetro de uma circunferência). Quanto à limitação da

função f ao longo desta circunferência, podemos escrever¯ez

z + 1

¯=

|ez||z + 1| ≤

|ez||z|− 1 =

|ez|4− 1 =

|ez|3=

ex

3≤ e4

3,

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52 CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO

já que o valor máximo que x = Re(z) pode tomar ao longo da circunferência é 4. Então, pela

proposição 16, obtemos a estimativa pedida,¯Iγ

ez

z + 1dz

¯≤ e4

38π =

8πe4

3.

Exercícios resolvidos

1. Dada a função complexa f(z) = z calcule o valor do integral curvilíneoRγf(z)dz onde γ é a

curva definida por x(t) = 3t e y(t) = t2, com t ∈ [1, 4].

2. Calcule o valor do integral curvilíneoRγf(z)dz para

(a) f(z) = y − x− 3x2i sobre a curva que é a união do segmento de recta que une z = 0 az = i com o segmento de recta que une z = i a z = 1 + i;

(b) f(z) = (z + 2)/z sobre a semicircunferência parametrizada por γ(θ) = 2eiθ, com 0 ≤θ ≤ −π;

(c) f(z) = 1/z sobre os pontos da semicircunferência de centro 2 e de raio 1 com parte real

superior a 2 e percorrida no sentido negativo.

3. Considere o caminho γ(t) = eit, para t ∈ [0, 2π]. Prove que são nulos os integrais curvilíneosIγ

1

|z|dz eIγ

1

|z2|dz.

4. Calcule o valor do integral curvilíneoRγf(z)dz onde γ é a curva de equação dada, em coor-

denadas rectangulares, por y = x3 entre os pontos z = −1− i e z = 1+ i, e onde f é a função

definida por

f(z) =

½1 se y < 04y se y > 0

.

5. Considere a curva γ(t) = eit, com t ∈ [0, π]. Mostre que¯Zγ

ez

zdz

¯≤ eπ.

6. Escrevendo o integral curvilíneo em termos de integrais reais, prove queZγ

dz = B −A

quando a integração é feita ao longo de uma curva seccionalmente suave que una o ponto A

ao ponto B.

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3.1. INTEGRAIS CURVILÍNEOS 53

Propostas de resolução

1. Dada a curva γ(t) = 3t + it2, com t ∈ [−1, 4], temos γ0(t) = 3 + 2ti. Sendo x(t) = 3t e

y(t) = t2 funções contínuas com derivadas contínuas no intervalo [−1, 4], a curva γ é suave.Corresponde ao arco da parábola definida, em coordenadas rectangulares, pela equação y =

x2/9 entre os pontos z = γ(−1) = −3 + i e z = γ(4) = 12 + 16i. Sendo a função f(z) = z

contínua em todos os pontos da curva γ, o integral curvilíneo é dado por

zdz =

Z 4

−13t+ it2(3 + 2ti)dt =

Z 4

−1

¡3t− t2i

¢(3 + 2ti)dt

=

Z 4

−1

¡9t+ 2t3 + 3t2i

¢dt =

Z 4

−1

¡9t+ 2t3

¢dt+ 3i

Z 4

−1t2 dt

=9

215 +

1

2255 + 3i

1

363 = 195 + 63i.

2. (a) O segmento de recta que une z = 0 a z = i pode ser parametrizado por γ1(t) = ti, com

0 ≤ t ≤ 1, e o segmento de recta que une z = i a z = 1 + i por γ2(t) = t + i, com

0 ≤ t ≤ 1.

Eixo real

Eixo imaginário

1+ii• ••

Dado que a função f(z) = y−x− 3x2i está definida e é contínua ao longo de cada umadas curvas suaves consideradas, temos

f(z)dz =

Z 1

0

f(ti)i dt+

Z 1

0

f(t+ i)1 dt =

Z 1

0

ti dt+

Z 1

0

¡1− t− 3t2i

¢dt

= i

Z 1

0

t dt+

Z 1

0

(1− t) dt− 3iZ 1

0

t2 dt = i+1

2− 3i1

3=1

2.

(b) A semicircunferência parametrizado por γ(θ) = 2eiθ, com −π ≤ θ ≤ 0, centrada na

origem e com raio 2 situada nos 3o e 4o quadrantes, é uma curva suave com γ0(θ) = 2ieiθ.

A função f(z) = (z+2)/z está definida (o seu domínio é C\ 0 e a origem não pertence

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54 CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO

a γ) e é contínua na semicircunferência γ. Temos, entãoZγ

f(z)dz =

Z 0

−πf¡2eiθ

¢2ieiθ dθ =

Z 0

−π

2eiθ + 2

2eiθ2ieiθ dθ

= i

Z 0

−π

¡2eiθ + 2

¢dθ = i

Z 0

−π(2 (cos θ + i sin θ) + 2) dθ

= i

∙Z 0

−π(2 cos θ + 2) dθ + 2i

Z 0

−πsin θdθ

¸= i [2π + 2i (−1− 1)] = i(2π − 4i) = 4 + 2πi.

(c) Os pontos da semicircunferência de centro 2 e de raio 1 com parte real superior a 2,

percorrida no sentido negativo,.podem ser parametrizados por γ(t) = 2 + cos t − i sin t

com −π2≤ t ≤ π

2.

21 3 Eixo real

Eixo imaginário

Trata-se de uma curva suave onde a função f(z) = 1/z está definida (o seu domínio é

C\ 0) e é contínua. O integral curvilíneo é dado porIγ

f(z)dz =

Z π/2

−π/2f(2 + cos t− i sin t)(− sin t− i cos t)dt

=

Z π/2

−π/2

1

2 + cos t− i sin t(− sin t− i cos t)dt

=

Z π/2

−π/2

(2 + cos t+ i sin t) (− sin t− i cos t)

(2 + cos t− i sin t) (2 + cos t+ i sin t)dt

=

Z π/2

−π/2

−2 sin t− 2i cos t− i

(2 + cos t)2 + sin2 tdt

=

Z π/2

−π/2

−2 sin t− i (2 cos t− 1)4 + 4 cos t

dt

=1

2

Z π/2

−π/2

− sin t1 + cos t

dt− i

4

Z π/2

−π/2

2 cos t− 11 + cos t

dt.

Efectuando a mudança de variável no 2o integral simples tan t/2 = s, temos cos t =

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3.1. INTEGRAIS CURVILÍNEOS 55

¡1− s2

¢/¡1 + s2

¢e t0 = 2/

¡1 + s2

¢. Obtemos, então,

f(z)dz =1

2

Z π/2

−π/2

− sin t1 + cos t

dt− i

4

Z 1

−1

21− s2

1 + s2− 1

1 +1− s2

1 + s2

2

1 + s2ds

=1

2[ln |1 + cos t|]π/2−π/2 −

i

2

Z 1

−1

2− 2s2 − 1− s2

1 + s2 + 1− s21

1 + s2ds

=1

2(ln 1− ln 1)− i

2

Z 1

−1

1− 3s22

1

1 + s2ds

= 0 +i

4

Z 1

−1

3s2 − 11 + s2

ds =i

4

Z 1

−1

µ3− 4

1 + s2

¶ds

=i

4[3s− 4 arctan s]1−1 =

i

4

³3− 4π

4+ 3 + 4

³−π4

´´=

i

4(6− 2π) = 3− π

2i.

3. Dada a curva γ(t) = eit, para t ∈ [0, 2π] temos γ0(t) = ieit. Trata-se da circunferência de

centro na origem e de raio 1, onde as funções f(z) = 1/ |z| e g(z) = 1/¯z2¯, de domínio

C\ 0, estão definidas e são contínuas. Para esta curva suave os integrais curvilíneos sãodados por I

γ

1

|z|dz =Z 2π

0

1

|eit| · ieit dt =

Z 2π

0

ieit dt =£eit¤2π0= e2πi − 1 = 0

1

|z2|dz =Z 2π

0

1

|e2it| · ieit dt =

Z 2π

0

1

e2· ieit dt = 1

e2

Z 2π

0

ieit dt = 0.

4. A curva pode ser parametrizada por γ(t) = t+ t3i, com −1 ≤ t ≤ 1. Trata-se de uma curvasuave com γ0(t) = 1 + 3t2i. A função f , de domínio C, é contínua em todos os ponto da

curva. TemosZγ

f(z)dz =

Z 1

−1f(γ(t)) · γ0(t)dt =

Z 1

−1f(t+ t3i)

¡1 + 3t2i

¢dt

=

Z 0

−1

¡1 + 3t2i

¢dt+

Z 1

0

4t3 ·¡1 + 3t2i

¢dt

=

Z 0

−1dt+ 3i

Z 0

−1t2 dt+ 4

Z 1

0

t3 dt+ 12i

Z 1

0

t5 dt

= 1− 3i3+4

4+12i

6= 2 + i.

5. A curva γ(t) = eit, para t ∈ [0, π], é a semicircunferência de centro na origem e de raio 1

situada nos 1o e 2o quadrantes. Trata-se de uma curva suave onde a função f(z) = ez/z,

de domínio C\ 0, está definida e é contínua. Pretendemos obter uma estimativa superior

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56 CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO

do módulo do integral curvilíneo de f ao longo da semicircunferência. O comprimento da

semicircunferência é π,

l (γ) =

Z π

0

q(− sin t)2 + (cos t)2 dt =

Z π

0

dt = π,

e todos os seus pontos verificam |z| =¯eit¯= 1. Quanto à limitação da função f ao longo

desta semicircunferência, podemos escrever¯ez

z

¯=|ez||z| ≤

|ez|1= ex ≤ e,

já que o valor máximo que x pode tomar ao longo da circunferência é 1. Então, por (5.2),

temos a estimativa pedida ¯Iγ

ez

zdz

¯≤ eπ.

6. Consideremos a parametrização γ(t) com t ∈ [a, b] para uma curva seccionalmente suave queuna o ponto A ao ponto B. Temos a função f(z) = 1 que é contínua ao longo de qualquer

curva seccionalmente suave. Como tal,Zγ

dz =

Z b

a

f(γ(t)) · γ0(t)dt =Z b

a

γ0(t)dt = γ (b)− γ(a) = B −A.

3.2 Primitivação complexa

O teorema fundamental do cálculo integral para funções reais de variável real afirma que o integral

da derivada de uma função é a diferença dos valores da função nos extremos do intervalo de

integração e que o integral indefinido de uma função é uma primitiva para a função. Vejamos um

resultado análogo para integrais curvilíneos complexos.

Definição 17 Dada uma função complexa f definida e contínua numa região A ⊆ C, a função Ftal que F 0 (z) = f (z), para todo z ∈ A, diz-se uma primitiva de f (ou uma antiderivada de f).

Notemos que esta definição implica que F é analítica em A (e, portanto, também contínua em

A) por ter derivada em todos os pontos do aberto A.

Exemplo 10 A função F (z) = − cos z é uma primitiva de f(z) = sin z visto que (− cos z)0 = sin z.Dado que (− cos z + C)

0= sin z, qualquer que seja C ∈ C, − cos z + C é a expressão geral das

primitivas de f(z) = sin z.

Sejam f uma função complexa definida e contínua numa região A ⊆ C e F = u + iv uma

primitiva de f em A. Se γ : [a, b] → C é uma curva contida em A parametrizada por γ(t) =

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3.2. PRIMITIVAÇÃO COMPLEXA 57

x(t) + y(t)i entãoZγ

f(z)dz =

Z b

a

f(γ(t)) · γ0(t)dt =Z b

a

d

dtF (γ(t))dt = F (γ(b))− F (γ(a)).

Está assim provado o seguinte resultado.

Teorema 2 Teorema fundamental do cálculo integral Sejam γ : [a, b]→ C uma curva e f

uma função contínua numa região A ⊆ C contendo a curva γ. Se F é uma primitiva de f em A

então Zγ

f(z)dz = F (γ(a))− F (γ(b)).

Em particular, se γ(a) = γ(b), Iγ

f(z)dz = 0.

Se γ(a) = z1 e γ(b) = z2 é usual escreverZγ

f(z)dz = [F (z)]z2z1 = F (z2)− F (z1).

Notemos ainda que, nas condições do teorema anterior, o valor do integralRγf(z)dz depende

apenas dos extremos da curva γ. Assim, se α for outra curva com as mesmas extremidades, o valor

do integral é o mesmo. Diz-se que o integral é independente da curva considerada e pode

denotar-se simplesmente porR z2z1

f(z)dz.

Teorema 3 Seja f uma função contínua numa região A ⊆ C. Então são equivalentes as seguintesafirmações:

(i) f tem uma primitiva em A;

(ii) o valor do integral curvilíneo de f é o mesmo ao longo de qualquer curva contida em A ligando

pontos z1 e z2 fixos;

(iii) o valor do integral curvilíneo de f é zero ao longo de qualquer curva fechada contida em A.

Exercícios resolvidos

1. Mostre que não existe uma função analítica f definida em C\ 0 tal que f 0(z) = 1/z.

2. CalculeRγz2 dz, para a curva γ(t) = eit sin3 t, com t ∈ [0, π/2].

3. CalculeRγez dz sobre o contorno do triângulo de vértices z = 0, z = 1 e z = πi.

4. Calcule o valor de cada um dos seguintes integrais curvilíneos:

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58 CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO

(a)R π+2i0

cos (z/2) dz;

(b)R i/2i

eπz dz;

(c)R 31(z − 2)3 dz.

5. Seja γ a parametrização de uma curva contida no conjunto C\ z ∈ C : Re z ≤ 0 que una oponto z = −i ao ponto z = i. Calcule o valor do integral curvilíneo

Rγ1/z dz.

6. CalculeRγlog z dz, onde γ é o arco da circunferência de centro na origem e de raio r situado

no 1o quadrante.

7. Demonstre as implicações (i)⇒ (ii) e (ii)⇒ (iii) do teorema 2.

Propostas de resolução

1. Suponhamos, por absurdo, que existe uma função f analítica definida em C\ 0 tal quef 0(z) = 1/z. Vimos que a função logaritmo principal log z verificava (log z)0 = 1/z. Contudo,

a função logaritmo, embora definida em C\ 0, não é analítica no eixo real negativo.

2. A função f(z) = z2 é contínua em C e F (z) = z3/3 é uma primitiva de f . A curva γ(t) =

eit sin3 t, para t ∈ [0, π/2], une o ponto z = γ(0) = 0 ao ponto z = eπi/2 = i. Então, pelo

teorema 1, Zγ

f(z)dz =

∙z3

3

¸i0

=i3

3− 0 = − i

3.

3. O contorno do triângulo de vértices 0, 1 e πi é seccionalmente suave.

••

Eixo real

Eixo imaginário

1

πi

Consideremos as parametrizações γ1(t) = t + 0i, com 0 ≤ t ≤ 1, γ2(t) = 1 − t/π + ti. com

0 ≤ t ≤ π e γ3(t) = 0− ti,com −π ≤ t ≤ 0. A função f(z) = ez é contínua no contorno do

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3.2. PRIMITIVAÇÃO COMPLEXA 59

triângulo γ. Temos entãoZγ

f(z)dz =

Z 1

0

f(t) dt+

Z π

0

f(1− t

π+ ti)

µ− 1π+ i

¶dt+

Z 0

−πf(−ti)(−i)dt

=

Z 1

0

et dt+

Z π

0

e1−tπ+ti

µ− 1π+ i

¶dt+

Z 0

−πe−ti(−i)dt

=£et¤10+he1−

tπ+ti

iπ0+£e−ti

¤0−π = e+ eπi − e+ e− eπi = e.

4. (a) A função f(z) = cos (z/2) é contínua em todos os pontos do seu domínio C e F (z) =

2 sin (z/2) é uma primitiva de f . Então, pelo teorema 1,Zγ

f(z)dz =h2 sin

z

2

iπ+2i0

= 2 sin³π2+ i´− 0 = e(π/2+i)i − e−(π/2+i)i

2i

=e−1+π/2i − e1−π/2i

2i=

e−1 (0 + i)− e1 (0− i)

2i=

e−1 − e

2=1− e2

2e.

(b) A função f(z) = eπz é contínua em todos os pontos do seu domínio C e F (z) = 1/πeπz

é uma primitiva de f . Então, pelo teorema 1,Zγ

f(z)dz =

∙1

πeπz¸i/2i

=1

π

³eπ/2i − eπi

´=1

π(i− 1) .

(c) A função f(z) = (z − 2)3 é contínua em todos os pontos do seu domínio C e F (z) =

(z − 2)4/4 é uma primitiva de f . Então, pelo teorema 1,Zγ

f(z)dz =

∙(z − 2)44

¸31

=1

4(1− 1) = 0.

5. A função f(z) = 1/z é contínua em todos os pontos do seu domínio C\0, ao qual pertencemtodos os pontos da curva, e F (z) = log z é uma primitiva de f . Então, pelo teorema 1, temosZ

γ

f(z)dz = [log z]i−i = log(−i)− log i = ln 1 + i

³−π2

´−³ln 1 + i

π

2

´= −πi.

6. A função f(z) = log z é analítica em todos os pontos do conjunto C \ z ∈ C : Re z ≤ 0, aoqual pertencem todos os pontos da curva, e F (z) = z log z− z é uma primitiva de f . A função

F tem derivada contínua em todos os pontos do conjunto C \z ∈ C : Re z ≤ 0 ao qual pertencem todos

os pontos da curva. Então, pelo teorema 1, temosZγ

f(z)dz = [z log z − z]rii = ri log(ri)− ri− (i log i− i)

= ri³ln r + i

π

2

´− ri− i

³ln 1 + i

π

2

´+ i

=π (1− r)

2+ r (ln r − 1) i.

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60 CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO

3.3 Teorema de Cauchy-Goursat

Em 1825, o matemático francês Louis-Augustin Cauchy provou um dos mais importantes teoremas

da análise complexa: se γ parametriza uma curva simples e fechada (i.e., uma curva de Jordan)

no plano complexo e f é uma função analítica em todos os pontos da curva e do seu interior então

f(z)dz = 0.

Se f não for analítica em toda a região do interior da curva então o valor do integral poderá ou

não ser nulo. Consideremos o seguinte exemplo.

Exemplo 11 A função f(z) = 1/z analítica em C \ 0. Se a curva de Jordan considerada for acircunferência de centro na origem e de raio r,

f(z)dz =

Z 2π

0

f¡reiθ

¢reiθdθ =

Z 2π

0

1

re−iθireiθdθ

= i

Z 2π

0

dθ = i [θ]2π0 = 2πi.

Não era esperado um resultado nulo dado que a função f não é analítica no círculo de centro na

origem e de raio r. No entanto, para a função f(z) = 1/z2 temos

f(z)dz =

Z 2π

0

f¡reiθ

¢reiθdθ =

Z 2π

0

1

r2e−i2θireiθdθ

= −1r

£e−iθ

¤2π0= −1

r

¡e−i2π − e0

¢= 0,

mas tal não ocorre por consequência do teorema de Cauchy. De facto, f é analítica em C \ 0,não sendo, portanto, analítica na curva e no seu interior.

Definição 18 Um conjunto D diz-se simplesmente conexo se toda a curva de Jordan em D pode

ser deformada num ponto de D, sem sair do conjunto D. Dito de outro modo, num conjunto

simplesmente conexo D, cada curva simples fechada inteiramente contida em D delimita apenas

pontos do conjunto D. Num conjunto simplesmente conexo não é admitida a existência de ”bura-

cos”. Todo o plano complexo é um exemplo de conjunto simplesmente conexo. O interior de uma

curva de Jordan é uma região simplesmente conexa. No entanto, o exterior de uma curva

fechada não o é, assim como também não o é a região entre duas circunferências. Uma região que

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3.3. TEOREMA DE CAUCHY-GOURSAT 61

não é simplesmente conexa designa-se por região multiplamente conexa.

Região multiplamente conexa

Região multiplamente conexa

Região simplesmente conexa

Teorema 4 Sejam f uma função analítica e com derivada contínua em todos os pontos de uma

região simplesmente conexa D e γ a parametrização de uma curva de Jordan contida em D. EntãoIγ

f(z)dz = 0.

Uma versão mais precisa do teorema de Cauchy foi desenvolvida pelo matemático francês

Edouard Goursat em 1883. Ele provou que a hipótese de continuidade de f 0 pode ser omitida. A

reformulação do teorema é a seguinte.

Teorema 5 Teorema de Cauchy-Goursat Sejam f é uma função analítica numa região sim-

plesmente conexa D e γ a parametrização de uma curva de Jordan contida em D. Então

f(z)dz = 0.

Visto que o interior de uma curva de Jordan é uma região simplesmente conexa, o teorema de

Cauchy-Goursat pode ter a seguinte reformulação mais simples.

Teorema 6 Se f é uma função analítica numa região simplesmente conexa D então, para cada

curva de Jordan γ contida em D, é válido queIγ

f(z)dz = 0.

Exemplo 18 Consideremos a função inteira f(z) = sin(ez). Em particular, é analítica nos pontos

da circunferência de centro na origem e raio 1 bem como no seu interior. Sendo γ uma parame-

trização desta curva de Jordan temos, pelo teorema 4,Iγ

sin(ez)dz = 0.

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62 CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO

Exemplo 19 Pretendemos determinar o valor do integral curvilíneo de f(z) = ez ao longo de

qualquer curva de Jordan γ. Trata-se de uma função inteira que, em particular, é analítica em

todos os pontos da curva e do seu interior. Temos então, pelo teorema 4,Iγ

ezdz = 0.

Exemplo 20 Consideremos a função racional f(z) = 1/z2 e a elipse definida, em coordenadas

rectangulares, por (x− 2)2 + (y− 5)2/4 = 1. A função é analítica em C \ 0 mas a origem não é

ponto da elipse nem do seu interior. Podemos então, pelo teorema 4, concluir queIγ

1

z2dz = 0.

Exemplo 12 Pretendemos calcular o valor do integral curvilíneoRγ1/¡z2 + 1

¢dz = 0 ao longo

da circunferência γ definida por |z| = 3. A função f(z) = 1/¡z2 + 1

¢é analítica em C −i, i

visto que z2 + 1 = (z − i) (z + i). Ambos os complexos z = −i e z = i estão no interior da curva

γ. Atendendo a que

1

z2 + 1=

1

2iz − i

−1

2iz + i

temos Iγ

1

z2 + 1dz =

1

2i

µ1

z − i− 1

z + i

¶dz.

Consideremos as curvas de Jordan γ1 e γ2 definidas por |z − i| = 1/2 e |z + i| = 1/2, respectiva-mente. Temos, então, pelo teorema 8,I

γ

1

z2 + 1dz =

1

2i

Iγ1

µ1

z − i− 1

z + i

¶dz +

1

2i

Iγ2

µ1

z − i− 1

z + i

¶dz

=1

2i

Iγ1

1

z − idz − 1

2i

Iγ1

1

z + idz +

1

2i

Iγ2

1

z − idz − 1

2i

Iγ2

1

z + idz.

Visto que a função 1/ (z + i) é analítica na circunferência γ1 e no seu interior, assim como a função

1/ (z − i) é analítica na circunferência γ2 e no seu interior temos, pelo teorema 4,Hγ11/(z+i)dz =H

γ21/(z − i)dz = 0. Quanto aos restantes integrais curvilíneos, consideremos as parametrizações

γ1(θ) = i+1

2eiθ e γ2(θ) = −i+

1

2eiθ

com 0 ≤ θ ≤ 2π. Temos, então,Iγ1

1

z − idz =

Z 2π

0

1

γ1(θ)− iγ01(θ)dθ =

Z 2π

0

112e

1

2ieiθ dθ = i

Z 2π

0

dθ = 2πi

e Iγ2

1

z + idz =

Z 2π

0

1

γ2(θ) + iγ02(θ)dθ =

Z 2π

0

112e

1

2ieiθ dθ = i

Z 2π

0

dθ = 2πi.

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3.3. TEOREMA DE CAUCHY-GOURSAT 63

Como tal, Iγ

1

z2 + 1dz =

1

2i2πi− 0− 0− 1

2i2πi = 0.

Exercícios resolvidos

1. Determine o domínio de analiticidade das seguintes funções e aplique o teorema 4 para

mostrar queHγf(z)dz = 0, onde γ é uma parametrização da circunferência definida por

|z| = 1.

(a) f(z) = ze−z;

(b) f(z) = 1/¡z2 + 2z + 2

¢;

(c) f(z) = log(z + 2).

2. CalculeHγe3z/ (z − iπ) dz, onde γ é a elipse de equação |z − 2| + |z + 2| = 6 descrita no

sentido positivo.

3. Sejam f(z) = u+ iv uma função analítica numa região D e γ(t) = x(t)+y(t)i, com t ∈ [a, b],uma curva de Jordan contida e D.

Mostre que Iγ

∂u

∂xdx =

∂v

∂xdy e

∂u

∂xdy = −

∂v

∂xdx.

4. Sejam γ e η parametrizações de curvas que unam z = −i a z = i definidas por γ(t) = eit,

para t ∈ [−π/2, π/2] , e η(t) = (−1 + 2t) i, para t ∈ [0, 1].Zγ

µz2

2+ |z|2

¶dz e

µz2

2+ |z|2

¶dz

e determine os seus valores. Justifique que não é possível utilizar o teorema 4.

5. Sejam z1, z2 ∈ C \ 0, z1 6= z2. Se γ é um caminho de z1 para z2 no interior de uma região

simplesmente conexa que não contenha a origem, mostre queZγ

1

z2dz =

Z z2

z1

1

z2dz =

1

z1− 1

z2.

6. Use um integral indefinido para calcular o valor do integral curvilíneoZ 2i

−2i

1

zdz

ao longo de qualquer curva que une z = −2i a z = 2i, contida no semiplano direito.

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64 CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO

Propostas de resolução

1. A circunferência definida por |z| = 1 é uma curva de Jordan.

(a) A função f(z) = ze−z tem domínio C e é contínua em todo o seu domínio. Podemos

então, pelo teorema 4, concluir que Iγ

ze−zdz = 0.

(b) A função racional f(z) = 1/¡z2 + 2z + 2

¢tem por domínio o conjunto

©z ∈ C : z2 + 2z + 2 6= 0

ª.

A equação z2 + 2z + 2 = 0 é equivalente a

z =¡−2 +

√−4¢/2 = −1 + i ∨ z =

¡−2−

√−4¢/2 = −1− i.

Como tal, temos Df = C \ −1 + i,−1− i. A função f é contínua em todo o seu

domínio. Nenhum dos pontos −1 + i e −1 − i pertence à circunferência definida por

|z| = 1 ou ao seu interior. De facto, |−1 + i| =√2 > 1 e também |−1− i| =

√2 > 1.

Podemos então, pelo teorema 4, concluir queIγ

1

z2 + 2z + 2dz = 0.

(c) A função f(z) = log(z + 2) está definida para números complexos tais que z 6= −2.Temos então Df = C \ −2. A função f é analítica em complexos z tais que z+2 não

seja um número real negativo, ou seja, f é analítica em

C \ x+ yi : x ≤ −2 ∧ y = 0 .

Nenhum dos pontos do conjunto x+ yi : x ≤ −2 ∧ y = 0 pertence à circunferênciadefinida por |z| = 1 ou ao seu interior. De facto, os pontos deste conjunto têm módulo

superior ou igual a 2. Podemos então, pelo teorema, concluir queIγ

log(z + 2)dz = 0.

2. A elipse de equação |z − 2|+ |z + 2| = 6 tem centro em (0, 0) e semieixos maior e menor de

valor 3 e√5, respectivamente. De facto,

|x+ yi− 2|+ |x+ yi+ 2| = 6⇔p(x− 2)2 + y2 +

p(x+ 2)2 + y2 = 6,

o que implica

(x− 2)2 + y2 + 2p(x− 2)2 + y2

p(x+ 2)2 + y2 + (x+ 2)2 + y2 = 36.

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3.3. TEOREMA DE CAUCHY-GOURSAT 65

Temos, então, −x2 + 14− y2 =p(x− 2)2 + y2

p(x+ 2)2 + y2 que implica

¡−x2 + 14− y2

¢2=

³(x− 2)2 + y2

´³(x+ 2)

2+ y2

´⇔

⇔¡−x2 + 14− y2

¢2=¡x2 + y2 + 4− 4x

¢ ¡x2 + y2 + 4 + 4x

¢⇔ x4 − 28x2 + 2x2y2 + 196− 28y2 + y4 =

¡x2 + y2 + 4

¢2 − 16x2⇔ 20x2 + 36y2 = 180

⇔ 5x2 + 9y2 = 45

⇔ x2

9+

y2

5= 1.

A função f(z) = e3z/ (z − iπ) tem por domínio C \ πi e é analítica em todo o seu domínio.

O ponto πi não pertence à elipse definida por |z − 2| + |z + 2| = 6 ou ao seu interior. De

facto, |πi− 2|+ |πi+ 2| = 2√4 + π2 > 6. Podemos então, pelo teorema 4, concluir queI

γ

e3z

z − iπdz = 0.

3. Sendo f(z) = u+ iv uma função analítica numa região D e γ uma curva de Jordan contida

em D, sabemos ser nulo o valor do integralHγf(z)dz. Temos então,I

γ

(udx− vdy) + i

(udy + vdx) = 0,

o que permite concluir queIγ

(udx− vdy) = 0 eIγ

(udy + vdx) = 0,

equivalente a Iγ

udx =

vdy eIγ

udy = −Iγ

vdx.

Isto permite concluir queIγ

∂u

∂xdx =

∂v

∂xdy e

∂u

∂xdy = −

∂v

∂xdx.

4. Consideremos a função f(z) = z2/2 + |z|2. Trata-se de uma função definida e contínua emtodo o plano complexo. Podemos escrever a expressão de f como segue:

f(z) =z · z2+ z · z = z

µz

2+ z

¶.

Cada uma das parametrizações γ e η define uma curva suave e f está definida ao longo de cada

uma dessas curvas. Isto garante a existência de cada um dos integrais curvílineos presentes

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66 CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO

no exercício. Para o cálculo de cada um desses integrais, consideremos que γ0(t) = ieit e

η0(t) = 2i. Temos entãoZγ

µz2

2+ |z|2

¶dz =

z

µz

2+ z

¶dz =

Z π/2

−π/2eit

Ãeit

2+ eit

!ieitdt.

Atendendo a que eiteit = cos2 t+ sin2 t = 1, temos entãoZγ

µz2

2+ |z|2

¶dz = i

Z π/2

−π/2

Ãeit

2+ eit

!dt

= i

Z π/2

−π/2

µcos t− i sin t

2+ cos t− i sin t

¶dt

= i3

2

Z π/2

−π/2(cos t− i sin t) dt = i

3

2(−2− i · 0) = −3i.

De modo análogo, temosZη

µz2

2+ |z|2

¶dz =

z

µz

2+ z

¶dz

=

Z 1

0

(−1 + 2t) iÃ(−1 + 2t) i

2+ (−1 + 2t) i

!· 2idt

= 2i

Z 1

0

(1− 2t) iµ(1− 2t) i

2+ (−1 + 2t) i

¶dt

= −2Z 1

0

(1− 2t)µ−12+ t

¶idt = −2i

Z 1

0

µ−12+ 2t− 2t2

¶dt

= −2iµ−12+ 1− 2

3

¶=1

3i.

Não é possível utilizar o teorema 4 porque nenhuma das curvas é fechada.

5. Basta atender a que F (z) = −1/z é uma primitiva de f(z) = 1/z2 e que o integral curvilíneoZγ

1/z2dz é independente do caminho considerado, podendo denotar-se simplesmente porR z2z11/z2dz. Notemos que as funções f(z) = 1/z2 e F (z) = −1/z estão definidas em C \ 0

mas, atendendo a que γ é um caminho de z1 para z2 no interior de uma região simplesmente

conexa que não contém a origem, está garantido que F é uma função com derivada contínua

num aberto G contendo a curva. Obviamente, estamos a considerar que γ parametriza uma

curva seccionalmente suave.

6. Um integral indefinido (ou primitiva) de f(z) = 1/z é F (z) = log z. Como tal, temosZ 2i

−2i

1

zdz = [log z]

2i−2i = ln 2 + i

π

2−³ln 2 + i

³−π2

´´= πi,

considerando qualquer curva seccionalmente suave que una z = −2i a z = 2i orientada no

sentido positivo.

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3.4. APLICAÇÕES DO TEOREMA DE CAUCHY-GOURSAT 67

3.4 Aplicações do teorema de Cauchy-Goursat

3.4.1 Fórmulas integrais de Cauchy

Apresentado o teorema de Cauchy-Goursat, podemos agora estabelecer algumas consequências

importantes deste teorema.

Teorema 7 Fórmula integral de Cauchy Seja f uma função analítica no interior e sobre

uma curva de Jordan γ orientada no sentido positivo. Se z0 é um ponto qualquer no interior de γ,

então

f(z0) =1

2πi

f(z)

z − z0dz.

Esta fórmula mostra que os valores de f sobre γ determinam completamente os valores de f

no interior de γ. Dito de outro modo, o valor de uma função analítica no interior de uma curva de

Jordan é determinado pelos seus valores sobre essa curva.

Exemplo 13 Pretendemos calcular o valor do integral curvilíneoZγ

cos z/zdz, onde γ é uma curva

de Jordan contendo a origem no seu interior. A função f(z) = cos z é inteira. Pela fórmula integral

de Cauchy, tomando z0 = 0, temosZγ

cos z

zdz = 2πi · f(0) = 2πi,

já que f(0) = 1.

Recorrendo à fórmula integral de Cauchy podemos, ainda, obter uma fórmula para a derivada

f 0(z0).

Teorema 8 Fórmula integral de Cauchy para a primeira derivada Seja f uma função

analítica no interior e sobre uma curva de Jordan γ orientada no sentido positivo. Se z0 é um

ponto qualquer no interior de γ, então

f 0(z0) =1

2πi

f(z)

(z − z0)2 dz.

Podemos agora enunciar o resultado que afirma que uma função analítica é infinitamente difer-

enciável, possui derivadas de todas as ordens. Este resultado fornece ainda uma fórmula para as

derivadas de todas as ordens. A sua demonstração usa o método de indução matemática.

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68 CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO

Teorema 9 Fórmula integral de Cauchy para derivadas de qualquer ordem Seja f uma

função analítica no interior e sobre uma curva de Jordan γ orientada no sentido positivo. Se z0 é

um ponto qualquer no interior de γ, então

f (n)(z0) =n!

2πi

f(z)

(z − z0)n+1 dz.

Exemplo 14 Pretendemos calcular o valor do integral curvilíneoZ|z|=2

ez/ (z − 1)4 dz. Para tal,

consideremos a função inteira f(z) = ez que verifica f (n)(z) = ez. O ponto z0 = 1 está no interior

da circinferência definida por |z| = 2. É então possível aplicar a fórmula integral de Cauchy paraa derivada de ordem n = 3, obtendo-seZ

|z|=2

ez

(z − 1)4dz =

2πi

3!· f (3)(1) = πe

3i,

já que f (3)(1) = e.

Exercícios resolvidos

1. Calcule o valor do integral curvilíneoHγ(ez + z) / (z − 2) dz, onde

(a) γ é uma parametrização da circunferência de centro na origem e de raio 1;

(b) γ é uma parametrização da circunferência de centro na origem e de raio 3.

2. Calcule o valor dos seguintes integrais curvilíneos

(a)H|z|=5 [sin (3z)] / (z + π/2) dz;

(b)H|z−i|=2 1/

¡z2 + 4

¢2dz;

(c)H|z|=2 [log (z + 3)] /

£z¡z2 + 9

¢¤dz.

3. Seja f(x+iy) =¡y3 − x3 + 3xy2 − 3x2y

¢+i¡x3 + y3 − 3xy2 − 3x2y

¢. Calcule

Z|z|=1

f(z)/z2dz.

4. Seja f uma função analítica sobre e no interior de uma curva de Jordan parametrizada por

γ. Se z0 é um ponto que não está sobre a curva, mostre queZγ

f 0(z)

z − z0dz =

f(z)

(z − z0)2 dz.

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3.4. APLICAÇÕES DO TEOREMA DE CAUCHY-GOURSAT 69

Propostas de resolução

1. Consideremos a função f(z) = ez + z que é analítica em todo o plano complexo.

(a) Embora f seja analítica no interior e sobre a circunferência com centro na origem e raio

1, não é possível aplicar a fórmula integral de Cauchy visto que z0 = 2 não é um ponto

interior a esta circunferência. Consideremos então a função g(z) = (ez + z) / (z − 2) queé contínua em C \ 2. Atendendo a que é possível considerar uma região simplesmenteconexa que contenha esta circunferência (que é uma curva de Jordan) e onde g seja

contínua temos, pelo teorema 4, Iγ

ez + z

z − 2 dz = 0.

(b) A função f é analítica no interior e sobre a circunferência com centro na origem e raio

3 (que consideramos orientada no sentido positivo). Tomando z0 = 2 que é um ponto

no interior de γ temos, pela fórmula integral de Cauchy,Iγ

ez + z

z − 2 dz = 2πi · f(2) = 2π¡e2 + 2

¢i,

já que f(2) = e2 + 2.

2. Qualquer das curvas |z| = 5, |z − i| = 2 e |z| = 2 são curvas de Jordan. Para o que segue

vamos considerar estas circunferências orientadas no sentido positivo.

(a) Consideremos a função f(z) = sin(3z) que é analítica no interior e sobre a circunferência

com centro na origem e raio 5. Tomando z0 = π/2 que é um ponto no interior desta

circunferência temos, pela fórmula integral de Cauchy,I|z|=5

sin (3z)

z + π2

dz = 2πi · f(−π2) = 2πi sin

µ−3π2

¶= −2πi.

(b) Temos¡z2 + 4

¢2= [(z + 2i) (z − 2i)]2 = (z + 2i)

2(z − 2i)2. Consideremos a função

f(z) = 1/ (z + 2i)2, de domínio CÂ −2i, que é analítica no interior e sobre a circun-ferência de centro i e de raio 2. Tomando z0 = 2i que é um ponto no interior desta

circunferência temos, pela fórmula integral de Cauchy para a primeira derivada,

I|z−i|=2

1

(z2 + 4)2 dz =

I|z−i|=2

1

(z + 2i)2

(z − 2i)2dz = 2πi · f 0(2i) = 16π,

já que f 0(2i) = (−2) (2i+ 2i) = −8i.

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70 CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO

(c) Consideremos a função f(z) = [log (z + 3)] /¡z2 + 9

¢, de domínio CÂ −3i, 3i, 3, que é

analítica no interior e sobre a circunferência de centro na origem e de raio 2. Tomando

z0 = 0 que é um ponto no interior desta circunferência temos, pela fórmula integral de

Cauchy,

I|z|=2

log (z + 3)

z (z2 + 9)dz =

I|z|=2

log (z + 3)

z2 + 9z

dz = 2πi · f(0) = 2π log 39

i,

já que f(0) = [log 3] /9.

3. A função f(z) = u(x, y) + iv(x, y) com u(x, y) = y3 − x3 + 3xy2 − 3x2y e v(x, y) = x3 +

y3 − 3xy2 − 3x2y é analítica em todo o plano complexo visto que se verificam as condições

de Cauchy-Riemann,∂u

∂x(x, y) = −3x2 + 3y2 − 6xy = ∂v

∂y(x, y)

e∂u

∂y(x, y) = 3y2 + 6xy − 3x2 = −

¡3x2 − 3y2 − 6xy

¢= −∂v

∂x(x, y).

Em particular, f é analítica no interior e sobre a circunferência de centro na origem e de raio

1. Tomando z0 = 0 que é um ponto no interior desta circunferência temos, pela fórmula

integral de Cauchy para a primeira derivada,Z|z|=1

f(z)

z2dz = 2πi · f 0(0) = 0

já que f 0(0) =∂u

∂x(0, 0) + i

∂v

∂x(0, 0) = 0.

4. Suponhamos que z0 é um ponto que está no interior da curva de Jordan γ. Se f uma função

analítica sobre e no interior da curva de Jordan parametrizada por γ temosZγ

f(z)

(z − z0)2 dz = 2πi · f

0(z0)

e, f é infinitamente diferenciável. Sendo f 0 analítica sobre e no interior da curva de Jordan

parametrizada por γ, também Zγ

f 0(z)

z − z0dz = 2πif 0(z0),

conforme o pretendido. Se z0 é um ponto que está no exterior da curva de Jordan γ(t) =

x(t) + iy(y), com a ≤ t ≤ b, entãoZγ

f(z)

(z − z0)2 dz =

Z b

a

f(γ(t))

(γ(t)− z0)2 γ

0(t)dz =

Z b

a

f 0(γ(t))

(γ(t)− z0)2 dz

=

Z b

a

f 0(γ(t))

γ(t)− z0

1

γ(t)− z0dz = (???) =

f 0(z)

z − z0dz

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3.4. APLICAÇÕES DO TEOREMA DE CAUCHY-GOURSAT 71

Teorema 10 Teorema de Morera Seja f uma função contínua numa região simplesmente

conexa D tal queRγf = 0, para qualquer curva de Jordan γ contida em D. Então f é analítica

em D.

Notemos que o teorema de Morera é o recíproco do teorema de Cauchy-Goursat.

Exercícios propostos

1. CalculeHγf(z)dz onde γ é a curva definida por |z| = 1 e f cada uma das seguintes funções:

(a) f(z) = [sin z] /£¡z2 − 25

¢ ¡z2 + 9

¢¤;

(b) f(z) = tan z;

(c) f(z) = ez/ (z + 3)− 3z;

(d) f(z) = z2 + 1/ (z − 4).

2. CalculeHγf(z)dz onde f(z) =

2z + 1

z2 + ze γ é cada uma das seguintes curvas:

(a) γ definida por |z| = 1/2;

(b) γ definida por |z − 3i| = 1;

(c) γ definida por |z| = 2.

3. Determine o valor do integral curvilíneoHγ(z − 1) / [z (z − i) (z − 3i)] dz.

4. Determine o valor de cada um dos seguintes integrais:

(a)R 2πiπi

cosh z dz;

(b)R 4i−4i 1/z

2 dz;

(c)R 1−i−i/2 (2z + 1)

2 dz.

5. CalculeHγ2z dz onde γ(t) = 2t3 +

¡t4 − 4t3 + 2

¢i, −1 ≤ t ≤ 1.

6. Mostre queHγ1/z dz = 2πi onde γ é o contorno do paralelogramo de vértices z = 2i, z = −2,

z = −2i e z = 2.

7. Mostre queHγ2z dz = −1 − 2i onde γ é uma curva com ponto inicial z = −1 e ponto final

z = 2.

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72 CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO

Soluções

1. (a) 0

(b) 0

(c) −6πi

(d) 0

2. (a) 2πi

(b) 0

(c) 4πi

3. −π − πi

4. (a) 0

(b) i/2

(c) −7/16− 22/3i

5. 48 + 24i

3.5 Integração

3.5.1 Exercícios resolvidos

1. Considere a circunferência γ de centro na origem e raio 2. Calcule o valor do integralHγf(z)dz

para f(z) = 1/z.

2. Calcule, pela definição, o valor do integralRγ

z + 2

zdz, onde γ é parametrizada por:

(a) z = 2eiθ, 0 ≤ θ ≤ π;

(b) z = 2eiθ, π ≤ θ ≤ 2π;

(c) z = 2eiθ, 0 ≤ θ ≤ 2π.

3. Seja γ a circunferência de raio 1 centrada na origem e percorrida uma vez no sentifo positivo.

Usando o teorema de Cauchy e as fórmulas integrais de Cauchy, calcule o valor de cada um

dos seguintes integrais:

(a)Rγ1 dz;

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3.5. INTEGRAÇÃO 73

(b)Rγ

ez

zdz;

(c)Rγ

cos z

(z − 2i)7dz;

(d)Rγ

sin z

(2z − i)6 dz.

3.5.2 Propostas de resolução

1. Uma parametrização para a circunferência γ de centro na origem e raio 2 pode ser definida

por γ(t) = 2 cos t+ i2 sin t = 2eit para t ∈ [0, 2π]. Para vector tangente em cada ponto temos

γ0(t) = −2 sin t+ i2 cos t. Trata-se de uma curva suave, pois x(t) = 2 cos t e y(t) = 2 sin t são

funções contínuas com derivadas contínuas para todo o 0 ≤ t ≤ 2π e a função f está definidae é contínua em todos os pontos da curva (f tem por domínio C \ 0 mas a origem não

pertence à curva). Não é necessário considerar uma partição e temos, então,Iγ

f(z)dz =

Z 2π

0

f(2 cos t+ i2 sin t) (−2 sin t+ i2 cos t) dt

=

Z 2π

0

1

2 cos t+ i2 sin t(−2 sin t+ i2 cos t) dt

=

Z 2π

0

2 cos t− i2 sin t

4 cos2 t+ 4 sin2 t(−2 sin t+ i2 cos t) dt

=

Z 2π

0

−4 cos t sin t+ 4i cos2 t+ i4 sin2 t+ 4 sin t cos t

4dt

=

Z 2π

0

4i

4dt = i

Z 2π

0

dt = 2πi.

Em alternativa, pode-se usar γ(t) = 2eit tendo-se então γ0(t) = 2ieit. O integral pedido é

dado por Iγ

f(z)dz =

Z 2π

0

f¡2eit

¢2ieitdt

=

Z 2π

0

1

2eit2ieitdt =

Z 2π

0

idt = i

Z 2π

0

dt = 2πi.

2. (a) Para a parametrização z (θ) = 2eiθ da semicircunferência tem-se z0 (θ) = 2ieiθ. Por-

tanto, pela definição de integral, temosZγ

z + 2

zdz =

µ1 +

2

z

¶dz =

Z π

0

µ1 +

2

2eiθ

¶2ieiθdθ

=

Z π

0

¡2ieiθ + 2i

¢dθ = 2eiθ

¯π0+ 2πi = −4 + 2πi.

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74 CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO

(b) AnalogamenteZγ

z + 2

zdz =

µ1 +

2

z

¶dz =

Z 2π

π

µ1 +

2

2eiθ

¶2ieiθdθ

=

Z 2π

π

¡2ieiθ + 2i

¢dθ = 2eiθ

¯2ππ+ 2πi = 4 + 2πi.

(c) Pela aditividade do integral em relação ao caminho de integração, este integral de linha

é a soma dos integrais das alíneas anteriores,Zγ

z + 2

zdz = (−4 + 2πi) + (4 + 2πi) = 4πi.

3. (a) A função constante f(z) = 1 é analítica em C, que é uma região simplesmente conexa.

Portanto, pelo teorema de Cauchy, o integral de f(z) ao longo de qualquer caminho

fechado em C é 0. Em particular, Zγ

1 dz = 0.

(b) A função f(z) = ez é analítica em C e γ é um caminho fechado simples contendo a

origem e orientado no sentido positivo. Portanto, pela fórmula de Cauchy,Zγ

ez

zdz =

f(z)

z − 0dz = 2πif(0) = 2πi.

(c) A funçãocos z

(z − 2i)7

é analítica em C \ 2i. Como 2i não pertence ao interior do contorno γ, a função é

analítica numa região que contem o interior do contorno γ. Portanto, pelo teorema de

Cauchy, Zγ

cos z

(z − 2i)7dz =

f(z)dz = 0.

(d) Pode-se escrever o integral na formaZγ

sin z

(2z − i)6 dz =

1

26

sin z¡z − i

2

¢6 dz.Aplicando a fórmula integral de Cauchy para a derivada de ordem 5 de uma função

analítica à função f(z) = sin z que é analítica em C (e, portanto, numa região que

contém o interior do caminho γ), tem-seZγ

sin z

(2z − i)6 dz =

1

262πi

5!f (5)

µi

2

¶=

πi

25120cos

µi

2

¶=

πi

2815

e−12 + e

12

2=(1 + e)πi

2915√e.

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Capítulo 4

Representação em série de funçõesanalíticas

Consideremos o desenvolvimento em série de Taylor para uma função real de variável real f em

torno de um ponto a ∈ Df ,∞Xn=0

f (n)(a)

n!(x− a)

n= f(a) + f 0(a)(x− a) +

1

2f 00(a)(x− a)2 + · · · .

Estabelecer este desenvolvimento pode conduzir a algumas dificuldades. Por um lado, podem não

existir as derivadas de todas as ordens. É o caso da função

f(x) =

½x2 se x ≥ 0−x2 se x ≤ 0

em que temos f 0(x) = 2 |x| e, como tal, não existe f 00(0). Por outro lado, as derivadas de todas asordens podem existir mas a série de Taylor não convergir para a função f . Por exemplo, é possível

mostrar por indução matemática que a função

f(x) =

½exp

¡−1/x2

¢se x 6= 0

0 se x = 0.

tem derivadas de qualquer ordem na origem e que f (k) (0) = 0, para todo k ∈ N. Como tal, a sériede Taylor em torno da origem é a série nula, enquanto que a função não vale zero em nenhuma

vizinhança de a = 0.

No caso de funções complexas de variável complexa, a situação é um pouco mais simples

quando falamos de funções f analíticas. Se uma função f é analítica num ponto z0, a fórmula

integral de Cauchy para derivadas garante que f tem derivadas de todas as ordens nesse ponto.

Como consequência, veremos que uma série de potências de (z − z0) designada por série de Taylor

converge para f . Por outro lado, mesmo no caso de f não ser analítica num ponto z0, há situações

em que é possível obter um outro tipo de desenvolvimento em série através das chamadas séries de

Laurent.

75

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76 CAPÍTULO 4. REPRESENTAÇÃO EM SÉRIE DE FUNÇÕES ANALÍTICAS

4.1 Séries de Taylor e de Laurent

Teorema 11 Teorema de Taylor Se f é uma função analítica no disco D(z0, R) = z : |z − z0| < R,com 0 < R ≤ ∞, então f pode ser representada por uma série de potências que converge para f(z),a saber,

f(z) =∞Xn=0

f (n) (z0)(z − z0)

n

n!, para todo o z ∈ D(z0, R).

A série definida no teorema anterior designa-se por série de Taylor de f em torno de

z0 (ou série de Taylor de f com centro z0) e os coeficientes an = 1/n!f (n) (z0) designam-

se por coeficientes de Taylor de f no ponto z0. Este desenvolvimento é único, isto é, se∞Pn=0

bn (z − z0)n =

∞Pn=0

f (n) (z0) (z − z0)n /n!, tem-se necessariamente bn = 1/n!f (n) (z0). Quando

z0 = 0, a série é designada por série de MacLaurin1 da função f . O resto de ordem n da

série de Taylor de f em torno do z0 é dado pela expressão

Rn(z) =(z − z0)

n+1

2πi

f(ζ)

(ζ − z0)n+2

(ζ − z)dζ.

Para além de sabermos que uma função analítica tem derivadas de todas as ordens, verificamos

agora que elas podem sempre ser representadas por uma série de potências. Esta propriedade não

é, em geral, verdadeira no cálculo real. Existem funções reais de variável real que têm derivadas

de todas as ordens mas que não podem ser representadas por uma série de potências. É o caso da

função definida por f(x) = exp¡−1/x2

¢para x 6= 0 e f(0) = 0.

Exemplo 21 Seja f(z) = exp z. A função f é inteira e f (n) (z) = exp z, para todo o n ∈ N.Temos então f (n) (0) = 1, para todo o n ∈ N, logo a série de Taylor de f em torno de z0 = 0 é

dada por

exp z = 1 + z +z2

2!+ · · · =

∞Xn=0

zn

n!, para todo o z ∈ C.

Notemos que esta série é a obtida do desenvolvimento em série da função real ex substituindo x

por z.

Exemplo 22 Seja f(z) = 1/(1− z). A função f é analítica e

f (n)(z) =n!

(1− z)n+1,

logo f (n)(0) = n!. Como tal, obtemos a série de Taylor

1

1− z= 1 + z + z2 + · · · =

∞Xn=0

zn,

1Em homenagem ao matemático escocês Colin MacLaurin (1698− 1746).

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4.1. SÉRIES DE TAYLOR E DE LAURENT 77

para |z| < 1.As séries de Taylor são obviamente séries de potências. O recíproco também é verdadeiro

(demonstrado no exercício 1).

Proposição 17 Uma série de potências com raio de convergência não-nulo é a série de Taylor da

sua função soma.

Para funções como 1/z ou ez/z2 o teorema de Taylor não se aplica em z = 0, tratando-se

de funções não analíticas na origem. Para estas funções existe uma outra expansão, a chamada

expansão de Laurent, que recorre a potências inversas de z − z0 em vez de potências de z − z0.

Esta expansão é de grande importância no estudo dos pontos onde uma função não é analítica

(designados por singularidades ou pontos singulares) e para obter o teorema dos resíduos, um

outro resultado fundamental da análise complexa que será apresentado no próximo capítulo.

Teorema 12 Teorema de Laurent Seja f uma função analítica na coroa circular C(z0, r, R) =

z ∈ C : 0 < r < |z − z0| < R, com r ≥ 0 e R > r. Então

f(z) =∞Xn=0

an (z − z0)n+∞Xn=1

bn(z − z0)

n ,

onde os coeficientes são dados por

an =1

2πi

f(ζ)

(ζ − z0)n+1 dζ, n = 0, 1, 2, ...

e

bn =1

2πi

f(ζ) (ζ − z0)n−1 dζ, n = 1, 2, ....

Exemplo 15 Consideremos a função f(z) =1

z (z − 1) . A função é analítica em C(0, 0, 1). Pre-

tendemos determinar a série de Laurent de f nesta região. Temos

f(z) =1

z (z − 1) = −1

z+

1

z − 1

e sabemos que 1/(1− z) =∞Pn=0

zn para |z| < 1. Podemos então concluir que

f(z) = −1z− 1

1− z= −1

z− 1− z − z2 − z3 − · · ·

em C(0, 0, 1). Relativamente à região C(0, 1,∞), podemos colocar a mesma questão. Temos

1

z − 1 =1

z

⎡⎢⎣ 1

1− 1z

⎤⎥⎦

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78 CAPÍTULO 4. REPRESENTAÇÃO EM SÉRIE DE FUNÇÕES ANALÍTICAS

e, dado que |1/z| < 1,

1

z − 1 =1

z

∞Xn=0

µ1

z

¶n=∞Xn=0

µ1

z

¶n+1=∞Xn=1

µ1

z

¶n.

Como tal,

f(z) = −1z+

1

z − 1 = −1

z+∞Xn=1

µ1

z

¶n=∞Xn=2

µ1

z

¶npara |z| > 1.

Exercícios resolvidos

1. Mostre que uma série de potências com raio de convergência não-nulo é a série de Taylor da

sua função soma.

2. Desenvolva a função f(z) = 1/£(z − 1)2(z − 3)

¤em série de Laurent para 0 < |z − 1| < 2 e

para 0 < |z − 2| < 3

Propostas de resolução

1. Consideremos a série de potências

f(z) =∞Xn=0

an (z − z0)n = a0 + a1(z − z0) + a2 (z − z0)

2 + · · · .

Temos f(z0) = a0. Pela proposição 68 temos

f 0(z) = a1 + 2a2 (z − z0) + 3a3 (z − z0)2+ · · · ,

donde f 0(z) = a1,

f 00(z) = 2a2 + 3 · 2a3 (z − z0) + · · · ,

donde f 00(z) = 2!a2, e em geral, f (n)(z0) = n!an. Deste modo, os coeficientes an são os que

definem a série de Taylor de f em torno de z0,

an =1

n!f (n) (z0) .

2. Necessitamos exprimir z− 3 em termos de z− 1. Se pretendermos atender a que 1/(1− z) =∞Pn=0

zn para |z| < 1, escrevemos

f(z) =1

(z − 1)2(z − 3) =1

(z − 1)21

z − 3

=1

(z − 1)21

−2 + (z − 1) =−1

2(z − 1)21

1− z − 12

.

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4.1. SÉRIES DE TAYLOR E DE LAURENT 79

Temos, para |(z − 1)/2| < 1,

f(z) =−1

2(z − 1)21

1− z − 12

=−1

2(z − 1)2∞Xn=0

µz − 12

¶n,

ou seja,

f(z) = − 1

2(z − 1)2 −1

4(z − 1) −1

8− 1

16(z − 1)− 1

32(z − 1)2 − · · ·

para 0 < |z − 1| < 2. Para obter potências de z − 3, escrevemos z − 1 = 2 + (z − 3) e, comvista à série binomial, temos

f(z) =1

(z − 1)2(z − 3) =1

[2 + (z − 3)]21

z − 3

=1

z − 3 [2 + (z − 3)]−2=

1

4 (z − 3)

∙1 +

z − 32

¸−2.

Para |(z − 3)/2| < 1,

f(z) =1

4 (z − 3)

"1 +−21!

µz − 32

¶+(−2) (−3)

2!

µz − 32

¶2+(−2) (−3) (−4)

3!

µz − 32

¶3+ · · ·

#,

ou seja,

f(z) =1

4(z − 3) −1

4+3

16(z − 3)− 1

8(z − 3)2 + · · ·

para 0 < |z − 3| < 2.

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80 CAPÍTULO 4. REPRESENTAÇÃO EM SÉRIE DE FUNÇÕES ANALÍTICAS

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Capítulo 5

Resíduos e polos

Este capítulo tem como resultado principal o teorema dos resíduos que afirma que o valor do

integral de uma função analítica f ao longo de uma curva fechada e simples é igual a 2πi vezes o

somatório dos resíduos de f no interior dessa curva. Este teorema é muito útil para o cálculo de

integrais.

5.1 Resíduos

Definição 19 Seja f uma função complexa de variável complexa. Diz-se que z0 é um ponto

singular de f (ou que f tem no ponto z0 uma singularidade) se f não é analítica em z0 (podendo

existir em qualquer vizinhança de z0 pontos onde a função é analítica). Se existe uma vizinhança

de z0 onde f é analítica, excepto no ponto z0, então o ponto singular z0 diz-se um ponto singular

isolado (ou uma singularidade isolada).

Exemplo 23 A função f(z) = 1/£z(z2 + 4)

¤tem pontos singulares isolados em z = 0, z = 2i e

z = −2i.

Exemplo 24 Se f(z) = log z, todos os pontos do eixo real negativo, incluindo a origem, são pontos

singulares mas não existem pontos singulares isolados.

Seja z0 um ponto singular isolado de uma função f . Então, existe uma série de Laurent que

representa f ,

f(z) =+∞X

k=−∞ck(z − z0)

k =+∞Xk=0

ck(z − z0)k +

+∞Xk=1

c−k(z − z0)k

= · · ·+ c−2(z − z0)2

+c−1

z − z0+ c0 + c1(z − z0) + c2(z − z0)

2 + · · · ,

válida para uma vizinhança definida por 0 < |z − z0| < R. Os termos da série que envolvem

potências de z− z0 de expoente negativo ,P+∞

k=1 c−k/(z− z0)k =

P+∞k=1 c−k(z− z0)

−k, constituem

81

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82 CAPÍTULO 5. RESÍDUOS E POLOS

a parte principal de f em z0. O coeficiente c−1 da potência (z − z0)−1 designa-se por resíduo

de f em z0 e denota-se por Res(f, z0).

Exemplo 25 Dado que

1

1− z= − 1

z − 1 = −∞Xn=1

µ1

z

¶n= −1

z− 1

z2− 1

z3− · · · ,

temos Res(1/ (1− z) , 0) = −1.

Exemplo 26 Dado que

1

(z − 1)2 (z − 3)= − 1

2(z − 1)2 −1

4(z − 1) −1

8− 1

16(z − 1)− 1

32(z − 1)2 − · · · ,

temos Res¡1/£(z − 1)2(z − 3)

¤, 1¢= −1/4. Atendendo a que

1

(z − 1)2 (z − 3)=

1

4(z − 3) −1

4+3

16(z − 3)− 1

8(z − 3)2 + · · · ,

Res¡1/£(z − 1)2(z − 3)

¤, 3¢= 1/4.

Podemos questionar o porquê de atribuir um nome específico ao coeficiente c−1? Note-se que,

dada uma curva de Jordan γ orientada positivamente no disco 0 < |z − z0| < R e que contenha o

ponto z0 no seu interior, temos

(5.1) c−1 =1

2πi

f(z)dz.

Este facto facilita o cálculo de muitos integrais em variável complexa.

Exemplo 16 Pretendemos calcular o valor do integralRγexp (1/z) dz, onde γ é a circunferência

definida por |z| = 1 com orientação positiva. A função integranda tem um ponto isolado em z = 0.

Sabemos que o valor deste integral é 2πi vezes o resíduo de exp (1/z) em z = 0. Recordando que a

série de Laurent de exp z em torno do ponto z = 0 é dada por

∞Xj=0

1

j!zj

para todo o z, temos

exp1

z=∞Xj=0

1

j!z−j = 1 +

1

z+1

2!

1

z2+ ....

Como tal, o resíduo de f em z = 0 tem o valor 1, ou seja, Res(f, 0) = 1. Temos então

1 =1

2πi

exp1

zdz

donde se conclui queRγexp(1/z)dz = 2πi.

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5.1. RESÍDUOS 83

Suponhamos agora que f é uma função analítica em todos os pontos, excepto num número

finito de pontos singulares isolados z1, z2, ..., zn, e que γ é uma curva simples e fechada (orientada

positivamente) contendo no interior os pontos zk, k = 1, ...n. Para cada k = 1, ...n, consideremos

uma circunferência γk centrada em zk, contida em γ e não contendo outros pontos singulares para

além de zk. Então, aplicando o teorema de Cauchy-Goursat para regiões multiplamente conexas e

(7), obtemos Iγ

f(z)dz =

Iγ1

f(z)dz +

Iγ2

f(z)dz + ...+

Iγn

f(z)dz

= 2πiRes(f, z1) + 2πiRes(f, z2) + ...+ 2πiRes(f, zn)

= 2πinX

k=1

Res(f, zk).

Podemos então enunciar o seguinte teorema.

Teorema 13 Teorema dos resíduos Seja D uma região simplesmente conexa e γ uma curva

de Jordan orientada positivamente contida em D. Se f é uma função analítica em γ e no seu

interior excepto num número finito de pontos singulares isolados z1, z2, ..., zn do seu interior de γ,

então Iγ

f(z)dz = 2πinX

k=1

Res(f, zk).

Exemplo 17 Pretendemos determinar o valor do integralIγ

f(z)dz =

1

(z − 1)2 (z − 3)dz

onde γ é o contorno do rectângulo definido por x = 0, x = 4, y = −1 e y = 1. TemosIγ

1

(z − 1)2 (z − 3)dz = 2πi [Res (f, 1) +Res (f, 3)] = 2πi

∙−14+1

4

¸= 0.

De facto, os pontos singulares isolados z1 = 1 e z2 = 3 estão contidos no interior de γ. No entanto,

para γ a circunferência definida por |z| = 2, temosIγ

1

(z − 1)2 (z − 3)dz = 2πiRes (f, 1) = 2πi

µ−14

¶= −π

2i,

já que o ponto singular isolado z2 = 3 não está contido no interior da circunferência de centro 0

e raio√2.

Exercícios

1. Calcule o valor dos seguintes integrais, onde γ é a circunferência orientada positivamente

definida por |z| = 2:

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84 CAPÍTULO 5. RESÍDUOS E POLOS

(a)Hγexp

1

z2dz;

(b)Hγcos

1

zdz;

(c)Hγ

1

zsin

1

zdz.

5.2 Polos e outras singularidades

Seja z0 ponto singular isolado de uma função complexa f . Se a série de Laurent de f em torno de z0

inclui um número finito de termos envolvendo potências negativas de z−z0, o ponto z0 é designadopor polo. Significa que a parte principal de f em z0 é constituída por um número finito de termos

não nulos. Neste caso, existe um número inteiro n tal que c−n é o primeiro coeficiente não-nulo

da parte principal de f em z0. O número n ∈ N diz-se a ordem do polo. Um polo de ordem

1 também se designa por polo simples. Se não existem na série de Laurent termos envolvendo

potências negativas de z − z0, o ponto singular isolado z0 diz-se uma singularidade removível.

Trata-se do caso em que a parte principal de f em z0 é nula, ou seja, todos os coeficientes c−n

(n ∈ N) são nulos. Se a série de Laurent de f em torno de z0 inclui um número infinito de termos

envolvendo potências negativas de z − z0, o ponto z0 é designado por singularidade essencial.

Uma singularidade essencial é portanto um ponto singular isolado que não é polo nem singularidade

removível. Verificamos assim que os pontos singulares isolados são classificados conforme a sua

parte principal contenha um número finito de termos, um número infinito de termos ou nenhum

termo.

Exemplo 27 Consideremos a função

f(z) =1

(z − 1)2 (z − 3)

cuja série de Laurent é dada por

f(z) =1

(z − 1)2 (z − 3)= − 1

2(z − 1)2 −1

4(z − 1) −1

8− 1

16(z − 1)− · · ·

para 0 < |z − 1| < 2. Dado que c−2 = −1/2 6= 0 (sendo c−n = 0 para n = 3, 4, 5, ...), z0 = 1 é um

polo de ordem 2.

Exemplo 28 Dado que

f(z) =sin z

z2=1

z− z

3!+

z3

5!− · · ·

para z 6= 0, concluímos que z0 = 0 é um polo simples de f .

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5.2. POLOS E OUTRAS SINGULARIDADES 85

Exemplo 29 Se f(z) = (sin z) /z então z = 0 é uma singularidade removível. De facto, temos

f(z) =1

zsin z =

1

z

µz − z3

3!+

z5

5!− z7

7!· · ·¶

= 1− z2

3!+

z4

5!− z6

7!+ · · · .

Exemplo 30 Dado que exp z =P∞

n=0 zn/n! para z 6= 0, a série de Laurent de f(z) = exp 3/z em

z0 = 0 é dada por

exp3

z=∞Xn=0

1

n!

µ3

z

¶n= 1 +

3

z+

32

2!z2+

33

3!z3+

34

4!z4+ · · ·

para z 6= 0. Como tal, z0 = 0 é uma singularidade essencial.

Verificámos na secção 7.1 que o teorema dos resíduos é uma boa ferramenta para o cálculo

de integrais. Dado que escrever a série de Laurent em cada ponto singular pode ser trabalhoso, é

conveniente encontrar técnicas que facilitem o cálculo de resíduos. Vejamos que, em casos especiais

mas muito frequentes, os resíduos são de fácil determinação. De facto, para z0 um polo de qualquer

ordem, é fácil determinar Res(f, z0).

CASO 1

Suponhamos que z0 é um polo de f em z0 de ordem n. Temos

(5.2) f(z) =c−n

(z − z0)n +

c−n+1

(z − z0)n−1 + · · ·+

c−1z − z0

+ c0 + c1 (z − z0) + · · ·

para 0 < |z − z0| < R. Multiplicando ambos os membros de (8) por (z − z0)n, obtemos

(z − z0)nf(z) = c−n+ c−n+1 (z − z0) + · · ·+ c−1 (z − z0)

n−1+ c0 (z − z0)

n+ c1 (z − z0)

n+1+ · · · ,

a série de Taylor de φ(z) = (z− z0)nf(z). Pretendemos o coeficiente c−1 de (z − z0)

n−1 que, dada

a definição de série de Taylor, sabemos ser dado por φ(n−1)(z0)/(n− 1)!. Temos então

c−1 = Res(f, z0) =φ(n−1)(z0)

(n− 1)! .

Em alternativa, podemos ainda considerar sucessivas derivações (até á ordem n− 1),

[(z − z0)nf(z)]

(n−−1)= (n− 1)!c−1 + n!c0 (z − z0) + (n+ 1)!c1 (z − z0)

2+ · · · ,

donde se conclui que

limz→z0

[(z − z0)nf(z)]

(n−−1)= (n− 1)!c−1

ou seja,

c−1 =1

(n− 1)! limz→z0[(z − z0)

nf(z)](n−−1)

.

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86 CAPÍTULO 5. RESÍDUOS E POLOS

Designando (z − z0)nf(z) por φ(z) podemos então escrever

Res(f, z0) =1

(n− 1)! limz→z0φ(n−1)(z) =

1

(n− 1)!φ(n−1)(z0) =

φ(n−1)(z0)

(n− 1)! .

Exemplo 18 Calculemos os resíduos de f(z) = (exp z) /z2¡z2 + 1

¢. A função tem pontos singu-

lares em z = 0, z = i e z = −i. Para o cálculo do resíduo de f em z0 = 0 consideremos que é um

polo de ordem 2 e, como tal, seja

φ(z) = (z − 0)2 ez

z2 (z2 + 1)=

ez

z2 + 1.

O resíduo é dado pela expressão

Res(f, 0) =φ0(0)

1!=

"¡z2 + 1

¢ez − 2zez

(z2 + 1)2

#z=0

= 1.

Para o cálculo do resíduo de f em z0 = i consideremos que é um polo simples e, como tal, seja

φ(z) = (z − i)ez

z2 (z2 + 1)=

ez

z2(z + i).

O resíduo é dado pela expressão

Res(f, i) =φ(i)

0!=

∙ez

z2(z + i)

¸z=i

= −ei

2i.

De forma análoga, verificamos que Res(f,−i) = e−i

2i. Se pretendermos determinar o valor do

integral

ez

z2 (z2 + 1)dz,

onde γ é uma curva de Jordan contendo z = i e z = −i (mas não contendo z = 0), podemos

utilizar o teorema dos resíduos,Zγ

ez

z2 (z2 + 1)dz = 2πi

µei

2i+

e−i

2i

¶= −2πi sin 1.

CASO 2

Suponhamos que a função f(z) se pode escrver como um quociente de funções

f(z) =p(z)

q(z)

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5.2. POLOS E OUTRAS SINGULARIDADES 87

onde p e q são funções analíticas em z = z0, com p(z0) 6= 0, q(z0) = 0 e q0(z0) 6= 0. O ponto

singular z0 é um polo simples de f e podemos escrever

f(z) =p(z)

q(z)=

p(z0) + p0(z0)(z − z0) + · · ·

q0(z0)(z − z0) +q00(z0)

2(z − z0)2 + · · ·

.

Considerando φ(z) = (z − z0)f(z), temos

φ(z) =p(z0) + p0(z0)(z − z0) + ...

q0(z0) +q00(z0)

2(z − z0) + ...

.

Mas então,

Res(f, z0) = φ (z0) =p(z0)

q0(z0).

Exemplo 19 Consideremos γ o contorno do rectângulo de lados definido por x = ±1, y = −π ey = 3π e f a função definida por

f(z) =cos z

exp z − 1 .

Pretendemos calcular o valor do integralZγ

f(z)dz. Os pontos singulares da função integranda f

são as soluções da equação exp z = 1, ou seja, os pontos z = 2kπi, para k ∈ Z. Os pontos singularesisolados no interior de γ são z = 0 e z = 2πi. Então, pelo teorema dos resíduos,Z

γ

cos z

ez − 1dz = 2πi [Res(f, 0) +Res(f, 2πi)] .

Notemos que f(z) =p(z)

q(z)=

cos z

ez − 1 , onde p e q são funções analíticas em ambos os pontos 0

e 2πi. Temos ainda p(0) = 1 6= 0, p(2πi) 6= 0, q(0) = q(2πi) = 0 e q0(0) = e0 = 1 6= 0,

q0(2πi) = e2πi = 1 6= 0. Como tal,

Res(f, 0) =p(0)

q0(0)=cos 0

e0= 1 e Res(f, 2πi) =

p(2πi)

q(2πi)=cos 2πi

e2πi=

e−2π + e2π

2.

Portanto, Zγ

cos z

ez − 1dz = 2πiµ1 +

e−2π + e2π

2

¶.

Exercícios resolvidos

1. Mostre que f(z) = (sin z) /z3 tem um polo de ordem 2 em z0 = 0.

2. Determine os resíduos da função f(z) = 1/¡z4 + 1

¢.

3. Determine o valor do integralHγtan z dz, onde γ é a circunferência definida por |z| = 2 com

orientação positiva.

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88 CAPÍTULO 5. RESÍDUOS E POLOS

4. Determine o valor do integralHγ(2z + 6) /

¡z2 + 4

¢dz, onde γ é a circunferência orientada

positivamente definida por |z − i| = 2.

5. Determine o valor do integralHγexp z/

¡z4 + 5z3

¢dz, onde γ é a circunferência definida por

|z| = 2 com orientação positiva.

6. Determine o valor do integralHγexp (3/z) dz, onde γ é a circunferência orientada positiva-

mente definida por |z| = 1.

Propostas de resolução

1. Temos

sin z

z3=1

z2sin z

z=1

z2

µ1− z2

3!+

z4

5!− z6

7!+ · · · .

¶=1

z2− 1

3!+

z2

5!− z4

7!+ · · · .

2. Sejam z1, z2, z3 e z4 as raizes da equação z4 + 1 = 0. Temos

z1 = expπi

4, z2 = exp

3πi

4, z3 = exp

5πi

4e z4 = exp

7πi

4.

Condiderando f como quociente de funções analíticas p(z) = 1 e q(z) = z4 + 1, obtemos

Res (f, z1) =

∙1

4z3

¸z=z1

=1

4z31=1

4exp

µ−3πi4

¶= − 1

4√2− 1

4√2i,

Res (f, z2) =

∙1

4z3

¸z=z2

=1

4z32=1

4exp

µ−9πi4

¶=

1

4√2− 1

4√2i,

Res (f, z3) =

∙1

4z3

¸z=z3

=1

4z33=1

4exp

µ−15πi

4

¶=

1

4√2+

1

4√2i,

Res (f, z4) =

∙1

4z3

¸z=z4

=1

4z34=1

4exp

µ−21πi

4

¶= − 1

4√2+

1

4√2i.

3. Dado que f(z) = tan z = sin z/ cos z e

(5.3) cos z = 0⇔ z =(2n+ 1)π

2para n ∈ Z,

temos Iγ

tan z dz = 2πihRes

³f,−π

2

´+Res

³f,

π

2

´i= 2πi [−1− 1] = −4πi

atendendo a que z1 = −π/2 e z2 = π/2 são os únicos complexos de (9) que pertencem ao

interior de γ. Dado que (cos z)0 = − sin z, temos

Res³f,−π

2

´=

sin³−π2

´− sin

³−π2

´ = −1 e Res³f,

π

2

´=

sinπ

2

− sin π2

= −1,

donde concluímos que Iγ

tan z dz = 2πi [−1− 1] = −4πi.

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5.2. POLOS E OUTRAS SINGULARIDADES 89

5.2.1 Exercícios resolvidos

1. Seja f(z) = zke1/z, com k inteiro positivo.

(a) Calcule a série de Laurent de f(z) para z próximo de 0. Qual é a maior região de

validade desse desenvolvimento em série?

(b) Calcule o resíduo Res f(z) |z=0 .

(c) Calcule os possíveis valores deIf(z)dz ao longo de curvas de Jordan seccionalmente

regulares não intersectando a origem.

(d) Calcule I|z−1|= 1

2

f(z)

(z − 1)2dz,

com a curva orientada no sentido directo.

2. Seja g(z) uma função analítica em C tal que g(0) 6= 0. Seja f(z) = zmg(z), com m inteiro

positivo. Mostre que1

2πi

I|z|=1

f 0(z)

f(z)dz = m,

se a curva for percorrida no sentido directo.

3. Considere a função real de variável real f(x) = 5 + 4 cosx.

(a) Calcule, utilizando o teorema dos resíduos, o valor dos integrais

In =

Z π

−π

einx

f(x)dx, n = 0, 1, 2, ....

(b) Deduza, da alínea anterior, o valor dos integrais

an =1

π

Z π

−π

cos (nx)

f(x)dx e bn =

1

π

Z π

−π

sin (nx)

f(x)dx, n = 0, 1, 2, ....

(c) Diga, justificando, qual o valor da soma da sériea02+P∞

n=1 an cos (nx) + bn sin (nx)

para x ∈ [−π, π] .

4. Seja r > 1 e γ = z ∈ C | |z| = r.

(a) Calcule, usando o teorema dos resíduos, o valor do integralIγ

1

z (z − 1)dz.

(b) Obtenha o resultado da alínea anterior usando o teorema de Cauchy e majorando o

módulo do integral para r grande.

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90 CAPÍTULO 5. RESÍDUOS E POLOS

(c) Prove que f(z) = 1/ (z − 1) não é a derivada de uma função analítica em C\ 1.

(d) Prove que

g(z) =1

z (z − 1)é a derivada de uma função analítica em C\ [0, 1].

5. Seja f uma função inteira tal que

|f(z)| ≤ c (1 + rα)

se |z| = r, onde c e α pertencem a R+. O que pode afirmar quanto a f? Sugestão: prove

uma generalização do teorema de Liouville.

5.2.2 Propostas de resolução

1. (a) Da série de potências ez =P∞

n=0

zn

n!, obtem-se e

1z =

P∞n=0

z−n

n!. Logo,

zke1z =

∞Xn=0

zk−n

n!=

∞Xj=−k

z−j

(k + j)!= zk + zk−1 +

zk−2

2!+ · · ·+ 1

k!+∞Xj=1

z−j

(k + j)!,

usando uma reindexação n → j com j = n − k. Quanto à maior região de validade

recorde-se que, para uma série de Laurent do tipoP∞

n=−∞ an (z − z0)n, é a maior coroa

circular, r < |z − z0| < R, que não contém singularidades e que contém pontos onde a

série é convergente. A função dada apenas possui uma singularidade, z = 0. Portanto,

a maior região de validade desta série de Laurent é a região definida por |z| > 0, ou

seja, C \ 0.

(b) Por definição, Res f(z) |z=0 = a−1, onde a−1 é o coeficiente correspondente à potência

z−1 da série anterior. Como tal,

Res f(z) |z=0 = a−1 =1

(k + 1)!.

Note-se que z=0 é uma singularidade essencial da função zke1z e, como tal, não é um

pólo. Assim, não é válida a aplicação da expressão para cálculo de resíduos de pólos de

ordem n.

(c) Seja γ a curva de Joprdan ao longo da qual o integral é calculado. Se 0 pertence ao

interior da curva γ, pelo teorema dos resíduos tem-seIγ

f(z)dz = ±2πiRes f(z) |z=0 = ±2πi

(k + 1)!,

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5.2. POLOS E OUTRAS SINGULARIDADES 91

em que o sinal + ou − é usado se γ percorrida, respectivamente, no sentido positivo ounegativo. Se 0 não pertence ao interior da curva γ, pelo teorema de Cauchy, tem-seI

γ

f(z)dz = 0.

(d) Como o disco |z − 1| ≤ 1/2 está contido numa região onde a função f(z) é analítica,

pode aplicar-se a fórmula integral de Cauchy para a primeira derivada,

1

2πi

I|z−1|= 1

2

f(z)

(z − 1)2dz = f 0(1).

Dado que f 0(z) =¡kzk−1 − zk−2

¢e1z , obtem-seI

|z−1|= 12

f(z)

(z − 1)2dz = 2πif 0(1) = 2πi (k − 1) e.

2. Seja f(z) = zmg(z) com g(z) analítica, então f 0(z) = mzm−1g(z)+zmg0(z) e, portanto, para

0 < |z| ≤ 1 tem-sef 0(z)

f(z)=

mzm−1g(z) + zmg0(z)

zmg(z)=

m

z+

g0(z)

g(z).

Como g(z) 6= 0, se |z| ≤ 1, a função g0(z)/g(z) é analítica para |z| ≤ 1. Portanto, z = 0 é aúnica singularidade de f 0(z)/f(z) no disco |z| ≤ 1 e é um pólo simples cujo resíduo facilmentese calcula,

Res∙f 0(z)

f(z)

¸z=0

= limz→0

z

µm

z+

g0(z)

g(z)

¶= m.

Pelo teorema dos resíduos, tem-se

1

2πi

I|z|=1

f 0(z)

f(z)dz = Res

∙f 0(z)

f(z)

¸z=0

= m.

3. (a) Seja γ a curva |z| = 1 parametrizada por z(x) = eix, para x ∈ [−π, π]. Então,Z π

−π

einx

f(x)dx =

Z π

−π

einx

5 + 4 cosxdx =

Z π

−π

¡eix¢n

5 + 2 (eix + e−ix)dx

=

zn

5 + 2 (z + z−1)

dz

iz= −i

zn

2z2 + 5z + 2dz

= − i

2

zn¡z + 1

2

¢(z + 2)

dz

= − i

22πiRes

"zn¡

z + 12

¢(z + 2)

#z=− 1

2

= π

¡−12¢n

32

=(−1)n π3 · 2n−1 ,

para n = 0, 1, 2, ....

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92 CAPÍTULO 5. RESÍDUOS E POLOS

(b) Uma vez que cos (nx) = Re¡einx

¢e sin (nx) = Im

¡einx

¢, imediatamente se conclui que

an =1

πRe (In) =

(−1)n

3 · 2n−1 e bn =1

πIm (In) = 0.

(c) Os coeficientes an para n = 0, 1, 2, ... e bn para n = 1, 2, ... são os coeficientes de Fourier

da função periódica de período 2π,

g(x) =1

5 + 4 cosx.

Como esta função é de classe C1 em R, pelo teorema de Fourier conclui-se que a soma

da série é1

5 + 4 cosx, para cada x ∈ R.

4. (a) Tem-se

Res∙

1

z (z − 1)

¸z=0

= limz→0

1

z (z − 1) = −1,

e

Res∙

1

z (z − 1)

¸z=1

= limz→1

1

z= 1.

Como talIγ

1

z (z − 1)dz = 2πiµRes

∙1

z (z − 1)

¸z=0

+Res∙

1

z (z − 1)

¸z=1

¶= 0.

(b) O teorema de Cauchy afirma que os integrais de funções analíticas num domínio Ω, ao

longo de caminhos homotópicos em Ω, são iguais. Como tal, o valor do integral não

depende de r. Tem-se, atendendo a que |z − 1| ≥ |z|− 1 para |z| > 1,¯Iγ

1

z (z − 1)dz¯≤Iγ

1

|z| (|z|− 1) |dz| =Iγ

1

r (r − 1) |dz| =2πr

r2 − r

e

¯Iγ

1

z (z − 1)dz¯→ 0 quando r→ +∞. Logo,

1

z (z − 1)dz = 0.

(c) Seja Ω um domínio em C e f : Ω→ C uma função contínua. Sabe-se que f é a derivada

de uma função analítica se e só se o integral de f ao longo de qualquer contorno fechado

em Ω for nulo. Ora, I|z−1|=1

1

z − 1dz = 2πi 6= 0.

Conclui-se que f(z) =1

z − 1 não é a derivada de uma função analítica em C\ 1.

(d) Se C é um contorno de Jordan fechado em C\ [0, 1], descrito no sentido positivo, então Cé homotópica à curva γ do enunciado (supondo γ também descrita no sentido positivo)

ou C é homotópica a um ponto, pelo queIC

1

z (z − 1)dz =Iγ

1

z (z − 1)dz = 0.

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5.2. POLOS E OUTRAS SINGULARIDADES 93

Conclui-se que os integrais de g(z) =1

z (z − 1) ao longo de contornos fechados emC\ [0, 1] são nulos. Como tal, g é a derivada de uma função analítica em C\ [0, 1].

5. Designe-se por n a parte inteira de α, ou seja, o número natural tal que α − 1 < n ≤ α.

Provemos que a derivada de ordem n+1 de f é identicamente nula. Seja a ∈ C e r > 0. Pelafórmula integral de Cauchy,

f (n+1)(a) =(n+ 1)!

2πi

Z|z−a|=r

f(z)

(z − a)n+2 dz.

Então ¯f (n+1)(a)

¯≤ (n+ 1)!

Z|z−a|=r

|f(z)||z − a|n+2

|dz|

≤ (n+ 1)!

Z|z−a|=r

c (1 + |z|α)|z − a|n+2

|dz|

≤ (n+ 1)!

Z|z−a|=r

c [1 + (r + |a|)α]rn+2

|dz|

=(n+ 1)!

c [1 + (r + |a|)α]rn+2

2πr

∼ c (n+ 1)!rα+1

rn+2→ 0

quando r → +∞. Assim, f (n+1)(a) = 0. Como a é arbitrário, f (n+1) ≡ 0. Integrando n+ 1vezes, conclui-se que f é um polinómio de grau menor ou igual a n.