Cachaças+-+Minas+Gerais
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Ficha Técnica
@ 2010. SEBRAE/MGTodos os direitos reservados. Não é permitida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio, desde que divulgadas as fontes.
SEBRAE/MG
Presidente do Conselho DeliberativoRoberto Simões
Diretor SuperintendenteAfonso Maria Rocha
Diretor Técnico Luiz Márcio Haddad Pereira Santos
Diretor de OperaçõesMatheus Cotta de Carvalho
UNIDADE DE ATENDIMENTO COLETIVO E AGRONEGÓCIOS
Priscilla Magalhães Gomes LinsGerente
Fernando Machado Ataíde e Rogério Galuppo Fernandes
ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO
Lauro DinizAssessor
Márcia Fonseca, Fernanda Ruas e Daniela Carvalho
AGRADECIMENTO Clotilde Andrade Paiva, Eduardo Campelo, José Carlos Ribeiro e Marcelo Magalhães Godoy
GESTÃO EDITORIAL
Nascentes Comunicação Estratégica
EDITOR Adriano Macedo TEXTOS Adriano Macedo, Breno Procópio e Jorge Fernando dos Santos REVISÃO P.S.Lozar PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO Sandra Fujii FOTOGRAFIA Ignácio Costa e Miguel Aun PRODUÇÃO E TRATAMENTO DE IMAGEM Bárbara Monteiro ILUSTRAÇÃO Diego Baptista e Ricardo Sá IMPRESSÃO E ACABAMENTO Gráfica e editora Mafali
Apresentação 11
Abrideira 13
Certificadas 31
Viagem Litográfica 83
De Salinas a Poço Fundo 131
Saideira 181
11
M ais de três séculos depois de es-
pantar o frio de bandeirantes, ga-
rimpeiros e tropeiros que partici-
pavam da aventura do Ciclo do Ouro em Minas
Gerais, a cachaça de alambique, um dos mais
tradicionais produtos do artesanato mineiro,
está pronta para conquistar o mundo. Para al-
cançar a qualidade, os sabores e a capacidade
de produção necessários à disputa do mercado
internacional, a bebida teve de percorrer longa
trajetória, sempre ligada aos personagens dos
fatos mais marcantes da história do Brasil, dos
tempos da Colônia até a República.
Um subproduto clandestino dos enge-
nhos, a cachaça entrou nas casas-grandes, ga-
nhou espaço nas bodegas dos povoados e foi
levada pelos mascates a todos os pontos do
país. A Minas, chegou entre o fim do século XVII
e início do século XVIII, para deflagrar uma tra-
dição a que se dedicaram artesãos comprome-
tidos pelo desafio de produzir um destilado de
qualidade. Muitos escritores contam a história
da bebida, que virou símbolo de resistência aos
colonizadores, nas lutas pela independência,
e foi transformada pelo Movimento Modernis-
ta de 1922 em sinal de brasilidade, ao lado do
samba, do Carnaval e da feijoada.
Cachaças – Minas Gerais resgata a ampla li-
teratura escrita e oral da saga dos cachaçólogos
e dedica especial atenção à produção da aguar-
Tradição de liberdade e sabor
dente de alambique em Minas, da instalação
dos primeiros engenhos até o início do século
XXI. Também mostra as iniciativas que possibi-
litaram a modernização do processo produtivo
ao longo do tempo, apresenta as principais ci-
dades e regiões produtoras, relaciona marcas
certificadas, reproduz rótulos famosos, lista
quase 300 denominações distintas da cachaça,
visita museus e coleções e dá dicas culturais.
O livro informa ainda que o Sebrae-MG
participa dessa história desde 2001, quando
fez um diagnóstico sobre a cachaça. O estudo
induziu ações que possibilitaram a organização
do processo produtivo e o desenvolvimento
da bebida num padrão de qualidade compatí-
vel com as exigências do mercado mundial e
a imagem conquistada pelo produto. O esta-
do já produz 260 milhões de litros por ano de
cachaça artesanal, em 9 mil alambiques, mais
da metade do total nacional. De ‘Januária’, uma
das pioneiras, a ‘Havana’, a mais famosa, Mi-
nas tem mais de 600 marcas diferentes. Salinas,
Novorizonte, Rubelita, Taiobeiras, Santa Cruz
de Salinas e Fruta de Leite formam o maior polo
de produção da bebida e ali o Sebrae orienta
25 produtores e 109 agricultores familiares para
superar novo desafio: tornar a cachaça brasilei-
ra uma bebida internacional.
Roberto SimõesPresidente do Conselho Deliberativo do Sebrae-MG
13
abrideira
Personalidade única em cada coração, 15
Na algibeira dos tropeiros, 19
De Januária ao polo de Salinas, 22
De filha bastarda a símbolo nacional, 24
Chama da vida desde a Antiguidade, 27
Linha do tempo, 28
14
Bico de pena de Almir Costa (1998) a partir de fotografia de Marcelo Magalhães Godoy, que registrou o processo de limpeza (escumação) do caldo de cana em propriedade do senhor José da Costa, em Cambuquira (MG)
15
A cana destilada tem cabeça, co-
ração e cauda. Para os aman-
tes da cachaça (cuja destilação
ocorre numa das etapas iniciais da pro-
dução), e cachaçólogos, a certeza é uma
só: a melhor parte é o coração. Porque
é a mais límpida e pura, que provoca as
melhores sensações e evita riscos para as
impertinentes ressacas no dia seguinte.
Desde, é claro, que seja apreciada com
moderação. É o coração que alimenta a
cachaça produzida em alambique, dife-
rentemente da aguardente de coluna ou
industrial, que não separa a fração nobre
da bebida. De cada coração nasce uma
personalidade única, resultado de todo
um processo produtivo que, ao longo dos
anos, foi aperfeiçoando a bebida, incor-
porando metodologias e processos com
técnicas mais apuradas para imprimir pa-
drões de qualidade cada vez melhores.
De filha bastarda da indústria da cana-
de-açúcar, produzida no Brasil desde o
período colonial, a cachaça de alambique
se sofisticou, ganhou status de bebida in-
ternacional e caminha rumo a novos mer-
cados, com autonomia, para deixar de
ficar restrita à geografia próxima à produ-
ção. É justamente o mercado, no entan-
to, o maior desafio para os produtores de
cachaça de coração de alambique, tan-
to na disputa com produtores informais
– que não seguem a legislação vigente –,
quanto na identificação de canais de dis-
tribuição eficientes para colocar a bebida
na mesa ou no balcão para o consumidor,
no Brasil e no exterior.
A cachaça produzida em Minas Ge-
rais é referência nacional de qualidade,
resultado de um movimento de organi-
zação do setor iniciado em 1988 com a
reunião de um grupo de produtores para
criar a Associação Mineira dos Produto-
res de Cachaça de Qualidade (Ampaq). A
associação, que estabeleceu normas de
fabricação e a criação de um selo de qua-
lidade (o primeiro para bebidas alcoólicas
do país), foi sugerida no estudo setorial
Aguardente em Minas, realizado pelo Insti-
tuto de Desenvolvimento Industrial (Indi)
em 1982, berço de sua implantação. Esse
diagnóstico mostrou o domínio da cacha-
ça industrial e a tendência de extinção da
cachaça artesanal. Revelou ainda uma fal-
sa mensagem, a de que Minas produzia
cachaça de boa qualidade e era auto-su-
ficiente. “Importávamos 50% da cachaça
consumida aqui. Em Belo Horizonte, só
20% das marcas vendidas eram mineiras
e registradas”, lembra-se o engenheiro
Personalidade única em cada coração
CaChaçólogos
Profissional da cachaça. O amante da cachaça é conhecido na linguagem do setor como cachaçófilo. Fonte: DA SILVA, Jairo Martins. Cachaça, o Mais Brasileiro dos Pra-zeres. Editora Anhembi Morumbi.
CaChaça
Denominação exclusiva da aguardente de cana produzida no Brasil, com teor alco-ólico entre 38° GL e 48° GL. A aguardente de cana pode ter grau alcoólico entre 38° GL e 54° GL, mas acima de 48° GL não pode ser denominada cachaça. A cachaça (nova) é o produto final das seguintes etapas: pre-paração do caldo de cana; propagação do fermento; fermentação; e destilação. Após a destilação, a cachaça de alambique passa por uma série de procedimentos (pós-destilação) destinados a apurar a qualidade: maturação, envelhecimento, análises, mistura (cachaças de diferentes tonéis para ajuste da compo-sição físico-química e características senso-riais), homogeneização, ajuste final do teor al-coólico, filtração, entre outros. Fonte: MAIA, Amazile Biagioni R.A. e CAMPELO, Eduardo Antônio Pinto. Tecnologia da Cachaça de Alambique. Sebrae-MG e Sindbebidas.
Produzida no Brasil desde o período colonial, a cachaça de alambique se sofisticou, ganhou status de bebida internacional e caminha rumo a novos mercados
16
agrônomo José Carlos Ribeiro, à época
profissional do setor da agroindústria do
Indi, responsável pelo estudo que pesqui-
sou as várias regiões do estado.
O setor se desenvolveu pelo trabalho
de empresários com raízes no meio rural
e que tinham condições financeiras e téc-
nicas de investir num projeto com novo
modelo empresarial, com metodologia
associada à tecnologia artesanal. Novas
instituições, públicas e privadas, univer-
sidades, associações e cooperativas se
mobilizaram para se articular e induzir o
desenvolvimento do setor.
O economista Eduardo Campelo res-
salta que Minas sempre teve tradição
na produção de cachaça, mas faltavam
visão empresarial e aprimoramento da
qualidade. Campelo esteve à frente do
Pró-Cachaça (Programa de Incentivo à
Produção de Aguardente), criado em
1992 pelo governo estadual para incen-
tivar e fortalecer o setor produtivo da
cachaça de alambique. “Nosso alvo era
a profissionalização do empresário rural
para desenvolver o produto e a cultura
da cachaça”, afirma Campelo.
Os trabalhos do Sebrae-MG junto ao
setor de produção e comercialização de
cachaça de alambique de Minas Gerais
vêm desde o ano de 2001, com a divulga-
ção do Diagnóstico da Cachaça de Minas
Gerais. O estudo deu sustentação à estru-
turação de ações para auxiliar grupos de
produtores a organizarem o processo pro-
dutivo e desenvolverem produtos dentro
de um padrão de qualidade compatível
com as exigências do mercado interno e
com a imagem que a cachaça conquistou
nos últimos anos.
As ações estruturais implementadas
incluíram, por exemplo, o desenvolvimen-
to do associativismo e da cooperação en-
tre os produtores, a elaboração de mar-
cas, a promoção da imagem do produto,
a adequação dos alambiques às normas
legais, a condução de iniciativas com
foco no padrão de qualidade do produto
e a organização de clínicas tecnológicas.
Lideranças empresariais também fo-
ram capacitadas no processo de boas
práticas comerciais e participaram de
feiras do setor de bebidas nas principais
capitais do país, de rodadas de negócios
e agendas de relacionamento, abrindo
mercados para o produto e contribuin-
do com a comercialização da cachaça. A
partir de 2010, com a conclusão do tra-
balho de estruturação do setor, o foco
do Sebrae-MG passou a ser a consolida-
ção da venda do produto.
“A Ampaq tirou a cachaça da senzala e a
colocou na casa-grande. A nossa ideia era
mostrar que a cachaça é uma aguardente
de cana, como o uísque é uma aguarden-
te de grãos. Também queríamos congre-
gar esse mundo da cachaça que não tinha
número, não tinha bibliografia, pois não
qualidade
A qualidade da cachaça de alambique é resultado de cuidados e controles es-pecíficos adotados em todas as etapas do processo, desde a seleção e a colheita da matéria-prima até o engarrafamento e ro-tulagem do produto. Em seu conjunto, esse monitoramento permite alcançar um produto excepcional, que supera em muito a concor-rência no mercado baseada em preço, pois destina-se à degustação, à apreciação, ao deleite, à fruição... A produção da cachaça é acompanhada da geração de resíduos como a folhagem e o bagaço da cana, o vi-nhoto (resíduo da destilação do vinho) e as cinzas ricas em minerais (resíduo da queima do bagaço). Todos eles têm aproveitamen-tos importantes, tanto para o aumento da lucratividade financeira do empreendimen-to como para a preservação ecológica e proteção ambiental. Fonte: MAIA, Amazile Biagioni R.A. e CAMPELO, Eduardo Antônio Pinto. Tecnologia da Cachaça de Alambique. Sebrae-MG e Sindbebidas.
ClíniCas teCnológiCas
Consultorias coletivas organizadas pelo Sebrae-MG para minigrupos de até 10 em-presários e empreendedores com a orienta-ção de especialistas nas mais diversas áreas de interesse.
17
de litros de cachaça artesanal em 9 mil
alambiques, mais da metade dos 400
milhões de litros produzidos anualmen-
te no Brasil. As bebidas produzidas em
Minas estão sempre no topo da lista das
principais classificações nacionais, como
as das revistas Veja e Playboy. A produção
brasileira anual de cachaça é estimada
em mais de 1,7 bilhão de litros, incluin-
do aí a cachaça industrial, que represen-
ta mais de 70% do mercado. “O eixo do
conhecimento da tecnologia artesanal
havia registro nenhum sobre a cachaça, as
suas histórias, os seus produtores”, afirma
Walter Caetano, primeiro presidente da as-
sociação, produtor da cachaça Germana e
um dos fundadores, em 2001, da Federa-
ção Nacional das Associações dos Produ-
tores de Cachaça de Alambique (Fenaca),
com sede em Belo Horizonte.
“Nasceu em Minas Gerais o embrião
de todas as associações surgidas em
outros estados e também do Programa
Brasileiro de Desenvolvimento da Aguar-
dente de Cana, Caninha ou Cachaça (PB-
DAC), em novembro de 1997”, lembra
Jairo Martins da Silva, autor de Cachaça,
o Mais Brasileiro dos Prazeres.
Em 1999, vários produtores se reuni-
ram para criar a Cooperativa de Produ-
ção e Promoção da Cachaça de Minas
(Coocachaça), com o apoio da Agência
de Promoção às Exportações (Apex).
Com o objetivo de promover e vender a
cachaça mineira de alambique, a Cooca-
chaça reúne atualmente 80 cooperados
com capacidade de produzir até 12 mi-
lhões de litros anuais. José Carlos Ribeiro
afirma que a cooperativa participou de
feiras de bebidas e eventos internacio-
nais em várias partes do mundo. E já ex-
portou a cachaça mineira, por meio da
tecnologia do “blend”, para a América
do Norte, África, Ásia e Europa.
Hoje, o estado é autossuficiente e
produz algo em torno de 260 milhões
migrou de São Paulo para Minas Gerais.
Temos a melhor tecnologia na área, prin-
cipalmente da agroindústria da cacha-
ça. Estamos equiparados em termos de
qualidade sensorial e degustativa aos
melhores uísques do mundo”, garante
José Carlos Ribeiro, que se dedica hoje
à realização de cursos de formação de
mestre alambiqueiro na Fazenda Taver-
na Real, em Itaverava (MG), juntamente
com o filho, o engenheiro de alimentos
Arnaldo Andrade Ribeiro.
No topo da preferêNcia As cachaças de alambique produzidas em Minas Gerais costumam figurar no topo de classificações elaboradas por algumas das principais revistas nacionais. Em 2009, das 10 primeiras posições listadas pela revista Playboy, cinco eram mineiras, figurando Anísio Santiago/Havana, Vale Verde, Claudionor e Germana nas primeiras colocações. Em 2010, Anísio Santiago, Canarinha e Vale Verde ficaram nas pri-meiras posições da relação da revista Veja para as cachaças envelhecidas.
revista Playboy
1o Anísio Santiago/Havana (Salinas, MG)
2o Vale Verde (Betim, MG)
3o Claudionor (Januária, MG)
4o Germana (Nova União, MG)
5o Canarinha (Salinas, MG)
Fonte: Revista Playboy, 6 de agosto de 2009.
revista Veja
1o Anísio Santiago/Havana (Salinas, MG)
2o Canarinha (Salinas, MG)
3o Vale Verde (Betim, MG)
Fonte: Revista Veja, 17 de fevereiro de 2010. Ranking das cachaças envelhecidas.
19
A bebida veio para Minas no final
do século XVII e início do XVIII,
quando a procura do ouro des-
locou bandeirantes, garimpeiros e tro-
peiros para a região. A cachaça seguia as
trilhas com tropeiros e mascates para ser
vendida nos povoamentos que surgiam
ao longo da Serra do Espinhaço, região
muito fria. A bebida era um aliado para
suportar o frio. Desde o período da co-
lonização do estado, era transportada e
consumida também pelos canoeiros em
suas longas viagens através do sertão,
até a construção dos primeiros enge-
nhos em Minas, no início do século XVIII.
“O consumo de açúcar, principalmente
sob a forma de rapadura, e da aguarden-
te faziam parte da dieta alimentar dos
mineiros. A aguardente era largamen-
te consumida pela população escrava,
que buscava na bebida um suprimento
energético para enfrentar os trabalhos
extrativos ou como lenitivo diante da re-
alidade marcada pela exploração do tra-
balho”, registram os professores Marce-
lo Magalhães Godoy e Clotilde Andrade
Paiva, autores do artigo Os 300 anos da
atividade canavieira em Minas Gerais.
Durante décadas, a produção de
cachaça expandiu-se em todo o Brasil.
Com a publicação de decreto régio de 24
de fevereiro de 1743, proibindo a produ-
ção de aguardente na capitania da Bahia,
região que antecedeu Minas Gerais na
produção de cachaça, os engenhos dis-
seminaram-se pela capitania de Minas
para suprir o mercado interno e, poste-
riormente, exportar açúcar, rapadura e
aguardente para outras capitanias.
O século XIX é marcado por uma
nova fase para a agroindústria da cana-
de-açúcar. Com o fim do sistema colo-
nial e o advento da independência, a
atividade se expande com o término da
restrições à produção de aguardente. “A
perseguição restritiva é substituída pela
voracidade fiscal. O destaque com que
a produção de aguardente aparece nos
debates dos legisladores provinciais e
na fala de presidentes da província é
inequívoco indício de que sua dissemi-
nação e volume de produção estavam
longe de ser desprezíveis. Ao longo do
século, são decretadas diversas fórmu-
las de tributar a atividade. Tributam-se
em cascata as unidades produtivas, a
circulação e comercialização e as alíquo-
tas variam constantemente, e chega-se
mesmo a situações de bitributação,
com impostos municipais e provinciais
Na algibeira dos tropeiros
Minas Gerais foi o estado com o maior número de engenhos no Brasil durante todo o século XX, chegando em alguns momentos a ter mais engenhos do que a soma dos demais estados do país
Vinícius Augusto da Silva, produtor da Branquinha de Minas (ver página 70), revive os dias em que foi tropeiro. Até o início do século XX, os muares eram o meio de transporte usual para transporte da bebida a granel
20
coexistindo”, apontam Marcelo Godoy
e Clotilde Paiva. O resultado foram as
baixas arrecadações, a larga sonegação
e as frequentes contestações por parte
dos produtores.
A agroindústria da cana, marcada
pela sazonalidade, conviveu durante os
dois primeiros séculos da história de
Minas com outras atividades. Predomi-
navam as unidades onde os engenhos
funcionavam junto com a pecuária e
outros cultivos, com outras indústrias
rurais, com a siderurgia das pequenas
forjas, com a mineração, com a fiação
e tecelagem, com vários trabalhos ma-
nuais e mecânicos e outras atividades
econômicas. O censo demográfico e
econômico de 1831/32, segundo os pro-
fessores, confirma a convivência destas
duas realidades. Havia desde casos em
que o engenho era mais uma atividade
da fazenda, não a central, até situações
em que o engenho aparecia com desta-
que e a produção de aguardente era a
atividade central da unidade.
Até o início da década de 1930, a
industrialização de subprodutos da
cana não desestruturou a produção
dos engenhos, que continuam a res-
ponder por quase toda a produção de
açúcar, álcool, aguardente e rapadura
do estado. No recenseamento indus-
trial de 1920, as cinco usinas exis-
tentes respondiam por apenas 6% da
produção de açúcar, 26% do álcool e
1% da aguardente. Os engenhos ainda
produziam 94% do açúcar, 74% do ál-
cool, 99% da aguardente e a totalidade
das rapaduras. Nesse período, algumas
regiões se destacam na produção de
cachaça, como Ponte Nova, Januária
e Curvelo, com bebidas que ganharam
fama dentro e fora do estado.
Vendedor de caldo de cana, gravura atribuída ao litógrafo brasileiro Lopes, de meados
do século XIX. Rio de Janeiro, 1840
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Moinho de cana-de-açúcar, do pintor alemão
Johann Moritz Rugendas
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A cachaça Januária, que come-çou a ser produzida no início do sé-culo XX, fez fama durante décadas. A cidade tornou-se sinônimo de ca-chaça. Nos anos 1920, os produto-res começaram a vender a Januária para os barqueiros do São Francisco. Em meados daquela década, comer-ciantes locais criaram engarrafado-ras, surgindo marcas famosas como Claudionor, Caribé, Januária Cente-nária, Aquino e Januária Única, en-tre outras. O elevado conceito das bebidas entre os apreciadores du-rou até meados da década de 1960, quando a imagem e a credibilidade das cachaças produzidas em Brejo do Amparo foram arranhadas com a onda de falsificações.
Nas décadas de 1930 e 1940 há uma significativa mudança no mer-cado, quando as usinas passam a ser apoiadas pelas políticas do Ins-tituto do Açúcar e do Álcool (IAA), criado em 1929 para controlar a produção e manter os preços num nível adequado, protegendo o pro-duto brasileiro no mercado mundial. Para atingir essas finalidades, o IAA estabeleceu rígido sistema de co-tas, distribuídas entre as diferentes unidades produtivas, o que estimu-lou a concentração da produção em grandes usinas, com capacidade de
fabricação em larga escala, deses-truturando a produção de açúcar de engenho.
“A partir da década de 50 assis-te-se a uma progressiva extinção da produção de açúcar nos enge-nhos, restando hoje pouquíssimas expressões, e uma concentração cada vez maior da produção de ra-paduras e aguardente nas áreas de menor dinamismo econômico do estado. Estatísticas apontam para Minas Gerais como o estado com o maior número de engenhos no Bra-sil durante todo o século XX, che-gando em alguns momentos a ter mais engenhos do que a soma dos demais estados do país”, ressaltam Marcelo e Clotilde.
O professor Marcelo Godoy es-tudou o nascimento, a ascensão e o declínio da indústria canavieira em Minas Gerais. A tese de doutorado No país das minas de ouro a paisa-gem vertia engenhos de cana e ca-sas de negócio, defendida por ele em 2004 na Universidade de São Paulo, registra a evolução do setor. Dados do Anuário Estatístico de Mi-nas Gerais para o ano de 1922/25 e do Censo Agropecuário do IBGE para o ano de 1995/96 mostram que o número de engenhos caiu de 32.928 para 23.626 nesse perí-
De Januária ao polo de Salinas
22
23
odo. Deste total, foram registrados 14.817 engenhos de fabricação de rapadura, 343 engenhos de açúcar, 8.466 engenhos para produção de aguardente, 956 engenhocas de garapa e 910 para a fabricação de melado.
São mais de 600 marcas diferen-tes de cachaça em Minas Gerais, resultado de um novo dinamismo na fabricação da bebida. Salinas, no Norte de Minas, é hoje o maior polo de produção de cachaça artesanal do país. A região reúne 25 produto-res e 109 agricultores familiares que formam a Associação dos Produ-tores de Cachaça Artesanal de Sa-linas (APACS). Juntos, produzem 5 milhões de litros por ano. Os produ-tores da APACS são apoiados pelo Sebrae-MG, que desenvolve em cinco municípios da região ações para melhorar a competitividade, aumentar a produção e a venda de cachaça.
O Programa Nacional de Certi-ficação da Cachaça, iniciativa do Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Indus-trial (Inmetro) e do Sebrae Nacional, mostra que as cachaças mineiras se destacam no país. Das 47 marcas certificadas até 2009, 28 são produ-zidas em alambiques mineiros.
24
A aguardente de cana era um subpro-
duto da indústria do açúcar, consu-
mido no Brasil Colônia e exportado
para as costas africanas. A cachaça serviu
como moeda de troca para a compra de es-
cravos que vinham trabalhar nos grandes en-
genhos. Segundo o historiador e antropólo-
go Luís da Câmara Cascudo (1898-1986), em
Prelúdio da Cachaça (Editora Itatiaia), “a cacha-
ça nasceu da indústria do açúcar, bastarda e
clandestina, merecendo depois proclamação
de legitimidade per rescriptum principis. Tornou-
se bebida nacional, determinando uma litera-
tura oral de impressionante vitalidade”.
Para o historiador Caio Prado Júnior
(1907-1990), “a aguardente é um produto
mais democrático que o aristocrático açú-
car, exclusivo dos senhores de engenho”.
Em seu livro O Mito da Cachaça Havana – Anísio
Santiago (Edições Cuatiara), Roberto Carlos
Morais Santiago lembra que a descoberta
da cachaça teria ocorrido casualmente, du-
rante o processo de produção de rapadura
e açúcar mascavo.
O caldo da cana era fervido em tachos
de cobre para ficar limpo e concentrado em
massa de boa espessura. Desta, retirava-
se espuma ou borra com grandes escuma-
deiras. A borra fermentada, acumulada em
cochos de pau, transformava-se em garapa
azeda ou vinho de cana. Esse subproduto
complementava a alimentação de animais
e escravos nos próprios engenhos, sendo
chamado de cagaça, palavra da qual teria se
derivado o termo cachaça. Há uma outra
versão, segundo a qual a bebida era usada
para amolecer carne de porco ou cachaço. A
destilação da garapa azeda em alambiques de
barro deu origem à aguardente nacional.
Jairo Martins da Silva, em Cachaça, o Mais
Brasileiro dos Prazeres, levanta outra hipótese
para o início da destilação da cachaça no
Brasil. “Os portugueses, acostumados a to-
mar bagaceira, improvisaram uma bebida
com a substância residual do caldo de cana,
conhecida como borra, garapa azeda ou garapa
doida. Provavelmente fermentada, ela produ-
zia o mesmo efeito prazeroso”.
O certo é que os senhores de engenho
provaram e aprovaram a bebida dos escravos.
A aguardente entrou na casa-grande e nas bo-
degas, e foi recebida nos salões, passando a
ter importância econômica. Tanto que a Coroa
portuguesa expediu uma Carta Régia, em 13 de
setembro de 1649, proibindo a fabricação da
aguardente em todo o país, com duas exce-
ções: não se aplicava a Pernambuco e o uso da
bebida restringia-se à população escrava, não
sendo permitida a venda, apenas a produção
para consumo próprio.
De filha bastarda a símbolo nacional
per resCriptum prinCipis
Por rescrito do príncipe. Era a le-gitimação do filho natural pedida pelo pai ao Imperador desde que esse não tivesse filhos legítimos e o casamento subsequente fosse impossível.
A cachaça se popularizou e tornou-se signo de resistência aos colonizadores. Atingiu o ápice no século XIX, transformando-se, também, em sinal de brasilidade
25
Na pintura do francês Jean-Baptiste Debret, escravos
africanos extraem a garapa
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A ordem da Corte foi ignorada, pois a ca-
chaça havia caído no agrado dos governantes
locais. Senhores de engenho, comerciantes e
destiladores reagiram, continuaram a produzir
e vender a bebida. Em 1661, finalmente, o Rei
D.Afonso VI, sob a regência da rainha D. Luísa
de Gusmão, suspendeu a proibição. A solu-
ção encontrada pela metrópole portuguesa
foi o aumento constante dos impostos sobre
a sua comercialização. No período entre 1756
e 1766, foi instituído o “subsídio voluntário”
dos estabelecimentos que vendiam “aguar-
dente da terra”, assim como dos proprietários
que a vendessem. Originalmente concebido
com vistas a contribuir para a reconstrução
de Lisboa, devastada por terremoto em 1755,
o tributo acabou renovado por mais dez anos,
de 1768 a 1778. Em 1772, foi criado o “sub-
sídio literário” para subvencionar os “mestres
régios” (professores de primeiras letras), revo-
gado após a Independência.
No final do século XVII, a descoberta de
ouro em Minas Gerais e o surgimento de vá-
rios povoados em lugares altos e úmidos da
Serra do Espinhaço foram acompanhados do
deslocamento da cachaça para o interior do
estado. Os garimpeiros passam a consumir a
cachaça levada pelos tropeiros para ameni-
zar o frio. As trilhas eram interligadas a Paraty,
por onde o ouro era escoado para Portugal
através da baía da Ilha Grande. O crescente
comércio da cachaça, mesmo na época da
proibição, estimulou o surgimento de alam-
biques clandestinos na região, que chegou
a ter cerca de 150 engenhos. Como se dizia
à época, “onde mói um engenho, destila um
alambique”, registra Câmara Cascudo. A fama
da região como produtora cresceu tanto que
Paraty passou a ser sinônimo de cachaça,
sendo comum pedir um “cálix de paraty”.
A cachaça no Brasil Colônia adquiriu ta-
manha popularidade que o aumento do con-
sumo da bebida passou a ameaçar a fabrica-
ção dos produtos similares europeus. Daí as
sucessivas tentativas de proibição de Portu-
gal, já que ela competia com o vinho e a ba-
gaceira, a famosa aguardente produzida com
bagaço de uva.
A bebida tornou-se símbolo de resistência
aos colonizadores. Atingiu o ápice no século
XIX, transformando-se, também, em sinal de
brasilidade. Tanto os rebelados da revolução
de Pernambuco, em 1817, quanto os inconfi-
dentes das Minas Gerais, três décadas antes,
consumiam a bebida nas lutas de Indepen-
dência, como forma de rebeldia e protesto.
Em 1822, o próprio imperador Dom Pedro II
teria brindado à Independência do Brasil com
uma boa dose de pinga.
A partir de 1889, a cachaça perde o gla-
mour. Os republicanos que assumiram o poder
passaram a discriminá-la como símbolo do de-
cadente passado imperial. A moda agora era
consumir produtos vindos da Europa. Somen-
te a partir do Movimento Modernista de 1922 é
que a popular caninha começa a recuperar seu
status como símbolo de brasilidade, ao lado do
samba, do Carnaval e da feijoada.
Chama da vida desde a Antiguidade
Desde a Antiguidade, o homem produz bebidas alcoólicas. A difi-culdade para encontrar e conservar água potável levou-o a fermentar sementes e a destilar gramíneas para matar a sede. A cerveja surgiu na Mesopotâmia, de grãos de ceva-da embolorados, e teria motivado a invenção da escrita para que os sacerdotes pudessem controlar es-toques de sementes e da bebida.
O vinho teria sido descoberto pelo próprio Noé, que plantou uma muda de videira no Monte Ararat, logo após o dilúvio. O cultivo da uva no Egito antigo era exclusivo dos sacerdotes. Os egípcios curavam suas moléstias inalando vapor de líquidos fermentados. Mais tarde, graças ao Império Romano, o vinho se propagou pela Europa. Os ára-bes, por sua vez, desenvolveram o processo da destilação, aumentan-do a produção de bebidas na Idade Média. Já no Caribe, escravos afro-descendentes fermentaram o mela-ço da cana e descobriram o rum. No Brasil, surgiu a cachaça, irmã caçula do açúcar, produto que vigorou du-rante dois séculos como a base da economia nacional.
“Em geral, os nomes de bebi-da destilada, nos vários idiomas, associam as palavras água e vida. Exemplo disso já se observa na nossa cachaça, água ardente, onde
27
o “ardente” se refere à “chama da vida”. Na Noruega, temos o aquavit dos vikings, no qual os termos la-tinos aqua vitae ficam bem claros. No caso do uísque da Escócia, a palavra se origina de uisgebeatha, que em celta antigo significa exa-tamente a mesma coisa: “água da vida”. Os destilados franceses, fei-tos a partir de frutas, levam tam-bém o mesmo nome, eau de vie, e, na Rússia, vodca traduz-se por “aguazinha”, que tem uma conota-ção positiva”, lembra Jairo Martins da Silva no livro Cachaça, o Mais Brasileiro dos Prazeres (Editora Anhembi Morumbi).
A cana-de-açúcar é uma planta do gênero Saccharum originária da Ásia. Historicamente, no Brasil, o surgimento da cachaça ocorreu em São Vicente, em 1532, com a cana trazida das ilhas atlânticas da Madeira e São Tomé por Mar-tim Afonso de Souza. De lá, Du-arte Coelho trouxe cana para Per-nambuco, no ano seguinte. Ainda que as primeiras mudas tenham chegado ao Brasil bem antes, em 1504, trazidas pelo fidalgo portu-guês Fernando de Noronha, ape-nas a partir da implantação das capitanias de São Vicente e Per-nambuco é que começaram a ser instalados os primeiros engenhos de açúcar no Brasil.
saCerdotisa egípCia
Sacerdotes egípcios curavam doenças com a inalação de vapor de líquidos fermen-tados.
28
1504 1532 1649 1661 1743 1756 a 1766 1772 1889 1922 1929 1982 1983 1988 1989 1990 1992 1993 1997 1998 1999 2001 2002 2005 2007 2009
O fidalgo português, Fernando de Noronha traz as primeiras mudas de cana para o Brasil.
Acredita-se que a cachaça surgiu em São Vicente, descoberta por acaso pelos escravos.
A produção e o consumo de cachaça passam a ter importância econômica no Brasil Colônia, até que a Coroa portuguesa expede Carta Régia, em 13 de setembro desse ano, proibindo a fabricação da aguardente em todo o país, permitida apenas para consumo próprio.
A metrópole portuguesa suspende a proibição e passa a elevar os impostos sobre a venda da aguardente.
Decreto Régio de 24 de fevereiro de 1743 proíbe a produção de aguardente na capitania da Bahia, o que a incentiva na capitania de Minas.
É instituído e passa a valer o subsídio voluntário sobre a aguardente. Os recursos são destinados à reconstrução de Lisboa, devastada por terremoto em 1755.
Criação do subsídio literário sobre a venda da bebida. O recolhimento é destinado ao pagamento de “professores de primeiras letras”. O tributo é oficialmente revogado anos após a independência.
A partir da República, a cachaça perde o glamour. Os republicanos que assumiram o poder passaram a discriminá-la como símbolo do decadente passado imperial.
A partir do Movimento Modernista a popular caninha começa a recuperar seu status como símbolo de brasilidade, ao lado do samba, do Carnaval e da feijoada.
Criação do Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA), que estabelece um rígido sistema de cotas, desestruturando a produção dos engenhos nas décadas de 1930 e 1940.
O Instituto de Desenvolvimento Industrial (Indi) realiza o estudo setorial Aguardente em Minas.
O Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais abre linha de crédito para projetos de produção de cachaça de alambique.
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BICO DE PENA DE ALMIR COSTA, A PARTIR DE FOTOGRAFIA DE MARCELO MAGALHÃES GODOy
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A LISBOA ANTES E DEPOIS DO TERREMOTO, REPRODUÇÃO DE GRAVURA ALEMÃ DO SÉCULO XVIII
29
1504 1532 1649 1661 1743 1756 a 1766 1772 1889 1922 1929 1982 1983 1988 1989 1990 1992 1993 1997 1998 1999 2001 2002 2005 2007 2009
Criação da Associação Mineira dos Produtores de Cachaça de Qualidade (Ampaq).
Criação da Comissão de Estudos de Aguardentes de Cana da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), com sede em Belo Horizonte.
A Ampaq cria o Programa de Garantia de Qualidade, conferindo o selo de qualidade às cachaças de seus associados.
Criação do Programa de Incentivo à Produção de Aguardente (Pró-Cachaça), aprovado pela Lei Estadual Nº 10.853, de 4 de agosto desse ano.
Decreto Estadual Nº 34.645, de 14 de abril, regulamenta o Pró-Cachaça.
Decreto 2.314, de 4 de setembro, do governo federal, regulamenta a Lei Nº 8.918, de 14 de julho de 1994, que dispõe sobre a padronização, a classificação, o registro, a inspeção, a produção e a fiscalização de bebidas.
Criação do Programa Brasileiro de Desenvolvimento da Aguardente de Cana, Caninha ou Cachaça (PBDAC), cujo embrião surgiu em Minas Gerais.
Criação da Feira e Festival Internacional da Cachaça (Expocachaça), realizada anualmente em Belo Horizonte.
Criação da Cooperativa de Produção e Promoção da Ca-chaça de Minas, com apoio da Agência de Promoção às Exportações (Apex).
O Sebrae-MG produz o diagnóstico da cachaça de alambique do estado de Minas Gerais.
Criação da Federação Nacional das Associações dos Produtores de Cachaça de Alambique (Fenaca), com sede em Belo Horizonte.
Lei Estadual Nº 13.949, de 11 de julho, estabelece o padrão de identidade e as características do processo de elaboração da Cachaça de Minas.
O Decreto 4.062, de 21 de dezembro, do governo federal, define as expressões Cachaça, Brasil e Cachaça do Brasil como indicações geográficas, de origem e uso exclusivamente brasileiros.
O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) aprova, por meio da Instrução Normativa nº 13, de 29 de junho, o regulamento técnico para fixação dos padrões de identidade e qualidade para aguardente de cana e para cachaça.
Em 30 de outubro desse mesmo ano, a Instrução Normativa 56 do MAPA aprova os requisitos e procedimentos para registro de estabelecimentos produtores de cachaça, organizados em associações ou cooperativas legalmente constituídas.
Início da implantação do processo de certificação da cachaça com a assinatura do convênio entre o Sebrae Nacional e o Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro), com a definição da análise de conformidade para o produto pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).
O governo de Minas sanciona, em 11 de janeiro, a lei que declara como Patrimônio Cultural de Minas Gerais o processo de fabricação de cachaça de alambique.
O Decreto nº 6.871, de 4 de junho, da presidência da República, regulamenta a Lei nº 8.918 (14/07/94), que dispõe sobre a padronização, a classificação, o registro, a inspeção, a produção e a fiscalização de bebidas.
Decreto nº 42644, de 5 de junho (Lei da Cachaça de Minas Gerais), regulamenta a Lei nº 13.949, de 11 de julho de 2001.
certificadas
Água da Bica de Brumadinho, 32
DJ resgata tradição da região dos Maias, 36
No alto da serra, uma cachaça “Da Boa”, 41
Dois dedos de prosa em Piranguinho, 44
Gavião do Vale une irmãos em passatempo levado a sério, 47
Irmãs gêmeas de padrão internacional, 51
Prazer de Minas representa o estado dentro e fora do país, 55
Prosa & Viola: legado cultural com a alma do homem sertanejo, 58
Pura de origem na terra do gado zebu, 62
Lenda para deixar saudade, 65
Segredos de Araxá em forma de cachaça, 67
Branquinha nasce granfina, 70
A marca da brasilidade, 74
O canto do Uirapuru chega à China, 77
Flores de sucesso brotam em Salinas, 80
31
32
No início do ano 2000, o publi-
citário Alexandre Wagner pro-
curava alguma atividade ren-
tável para ajudar a pagar as despesas
da sua propriedade rural, em Brumadi-
nho, na Região Metropolitana de BH.
Ao ser procurado por um amigo para se
filiar a uma cooperativa de produtores
de cachaça, não se interessou. “Falei
que não gostava de cachaça, não tinha
interesse”. Depois de muita insistên-
cia do amigo, acabou tornando-se um
cooperado e descobriu que produzir
cachaça poderia ser a solução para a
propriedade rural. Investiu no negócio,
montou o alambique e começou a pro-
duzir, juntamente com o sócio Edson
Oliveira, a Água da Bica e a Rainha do
Milênio, em 2005.
Para chegar à outra ponta do ne-
gócio, o mercado, Alexandre Wagner
colocou em prática, no ano seguinte,
uma ideia criativa, o “Bate-Papo com
Cachaça”. O objetivo era promover
encontros de degustação de cacha-
ças de alambique em bares e restau-
rantes da capital mineira e da Região
Metropolitana. O projeto surgiu após
se constatar um problema comum que
atinge todo produtor: a divulgação da
bebida.
Para realizar o “Bate-Papo com Ca-
chaça”, o publicitário comprava amos-
tras de aproximadamente 50 marcas
produzidas no estado; depois fazia
parcerias com proprietários de bares e
restaurantes. “Durante os encontros,
os clientes podiam escolher a cachaça
e degustar à vontade; o proprietário
enchia sua casa e lucrava, e a cultura
da cachaça artesanal era divulgada”,
explica o produtor. “O mais importante
era consolidar um espaço para a Água
da Bica, por isso colocávamos cartazes
com fotos da marca no bar e distribuía-
mos folders sobre o evento”.
No período de três anos, de 2006 a
2008, o evento percorreu mais de mil
estabelecimentos da Região Metropoli-
tana de BH, resultando numa cadeia de
comercialização. “Em Minas existe essa
cultura do bar, o cliente é leal e sem-
pre volta. Então, depois que fazíamos
o bate-papo, o cliente voltava e pedia a
Água da Bica, porque tinha experimen-
tado durante a degustação. O proprie-
tário era obrigado a comprar para aten-
der o seu público”, conta Alexandre.
Água da Bica de Brumadinho
“Eu armazeno as minhas marcas em três madeiras diferentes, porque assim ofereço produtos diferenciados” Alexandre Wagner, produtor das cachaças Água da Bica, Sonhadora e Rainha do Milênio
Alexandre Wagner (ao lado) diz que a bebida está presente em todos os estados brasileiros
Alambique iniciou a produção em 2005
35
Em 2007, ele criou também a marca
Sonhadora, uma cachaça suave, enve-
lhecida em tonéis de jequitibá e com
teor alcoólico mais baixo destinado
ao público feminino. Atualmente, as
marcas Água da Bica e Sonhadora são
encontradas em aproximadamente 100
pontos de venda da capital mineira, e
estão presentes em todos os estados
brasileiros. Wagner ressalta que não
tem vendas expressivas em todo o país,
mas conseguiu, no curso de cinco anos,
formalizar parcerias com lojas especia-
lizadas e representantes para que as
suas marcas pudessem ser compradas
em qualquer região. “Minha formação
em publicidade facilitou na divulgação
das cachaças. Normalmente, o produ-
tor monta um engenho com maquiná-
rio muito bom, produz uma cachaça de
qualidade, mas depois tem dificuldade
de colocar o produto no mercado”, ar-
gumenta Wagner.
A fazenda Sítio do Sossego, de 75
hectares, está localizada próximo ao
rio Paraopeba e produz por ano 120
mil litros. A produção é dividida entre
as marcas Água da Bica (80 mil litros),
Sonhadora (30 mil litros) e Rainha do
Milênio (10 mil litros). Esta última,
voltada para público seleto, é enve-
lhecida durante cinco anos em barril
de carvalho e chega a custar R$ 300.
“Eu armazeno as minhas marcas em
três madeiras diferentes, porque assim
ofereço produtos diferenciados; é uma
forma de atender um público mais am-
plo”, informa Wagner.
Além das estratégias de mercado,
o produtor investiu também em quali-
dade na construção do engenho na fa-
zenda Sítio do Sossego. Com a consul-
toria do engenheiro Arnaldo Ribeiro,
do Centro de Tecnologia da Cachaça,
Wagner comprou dornas de aço inox,
maquinário para moagem, alambique,
envazadora, filtro para retirada do ex-
cesso de cobre, barris e tonéis para a
adega com capacidade de 55 mil litros
de cachaça. Em 2007, as marcas Água
da Bica e Sonhadora receberam o selo
do Inmetro como certificação de pro-
cesso. Alexandre Wagner lembra que
muitos dos requisitos presentes no
Regulamento de Avaliação de Confor-
midade (RAC) – documento fornecido
pelo organismo certificador de pro-
duto acreditado pelo Inmetro com os
padrões de produção da cachaça arte-
sanal – já estavam adequados. “O selo
representou mais um passo para a tra-
jetória da Água da Bica e Sonhadora.
Um atestado de qualidade para o seu
público consumidor”.
ficHa tÉcNicaCidade: Brumadinho Região: Região Metropolitana de BHProdutor: Alexandre Wagner(31) 9208-3853Início da produção: 2005Volume: 120 mil litros por ano Teor alcoólico: Água da Bica (42%) Sonhadora (39%)Envelhecimento: um ano em umburana
(Água da Bica) e jequitibá (Sonhadora); e cinco anos em carvalho (Rainha do Milênio)
36
DJ resgata tradição da região dos Maias
A DJ Cachaça Mineira surgiu em
novembro de 2004 para resga-
tar uma antiga tradição de fa-
bricação de cachaça artesanal na região
dos Maias, em São Gonçalo do Pará, no
centro-oeste do estado, que chegou a
concentrar inúmeros alambiques na dé-
cada de 1940. Na região, a família do
empresário Leonardo Gonçalves Mo-
reira adquiriu a Fazenda do Engenho,
inicialmente para descanso e lazer. Foi
nessa área que Leonardo decidiu cons-
truir um dos melhores alambiques do
Brasil, que se tornou referência nacio-
nal. A cachaça foi certificada pelo Inme-
tro (por meio do IPEM de São Paulo) e
recebeu o reconhecimento da Associa-
ção Mineira dos Produtores de Cachaça
de Qualidade (Ampaq).
O desenvolvimento da empresa se-
guiu um caminho diferente do que é
percorrido normalmente neste setor de
produção de cachaça artesanal. Ao in-
vés de começar com pequena estrutura
de produção para se desenvolver aos
poucos, a DJ optou por construir, des-
de o início, uma grande estrutura que
possibilitasse alcançar a excelência do
produto, que tem como preocupação
básica a qualidade. Para isso investiu
muito em pesquisa e tecnologia.
Além de todo o diferencial de produ-
ção, a DJ se destacou também pela ima-
gem inovadora do produto, representa-
da pela mudança do estilo adotado pela
maioria das cachaças, o perfil rústico. A
opção foi por uma versão mais moderna.
A garrafa da DJ passou então a ser fabri-
cada com a técnica de “fosqueamento in-
termitente em serigrafia vitrificada” para
dar um aspecto de sofisticação. “Esta
imagem sintetiza a evolução do mercado
consumidor desse destilado nacional,
que está em pleno crescimento”, afirma
Silvana Moreira, diretora da DJ.
O projeto de identidade da marca ti-
nha a intenção de fazer com que o con-
sumidor se surpreendesse duplamente,
tanto pelo estilo inovador quanto pela
qualidade superior. E deu certo. Com
as séries Ouro e Prata, a DJ mostra que
uma bebida tradicional como a cachaça
pode ganhar estilo e qualidade, con-
quistando os mais exigentes paladares.
“Quando se buscam soluções criativas,
o produtor consegue ampliar o seu es-
paço”, afirma Silvana Moreira.
Com esta visão, a DJ conquistou o
primeiro lugar no Prêmio ABRE de De-
sign & Embalagem em 2008, na cate-
goria Bebidas Alcoólicas. Organizado
pela Associação Brasileira de Embala-
“Quando se buscam soluções criativas, o produtor consegue ampliar o seu espaço”Silvana Moreira Gonçalves, diretora da Cachaça DJ
37
gem, o concurso é considerado o mais
importante do setor, pois representa
toda essa cadeia produtiva e conta
com o apoio da Organização Mundial
de Embalagem (WPO), da União Latino-
Americana de Embalagem (ULADE), do
Programa Brasileiro de Design (PSD) do
Ministério do Desenvolvimento, Indús-
tria e Comércio Exterior, e do Centro
São Paulo Design (CSPD).
A responsabilidade ambiental tam-
bém é algo que embasa todas as ações
da empresa. Toda cana-de-açúcar utiliza-
da na produção é plantada manualmen-
te e sem o uso de agrotóxicos. Também
foram plantadas 2.500 mudas de árvores
nativas na reserva florestal da Fazenda.
Na DJ, o vinhoto não prejudica o meio
ambiente, já que é depositado em um
tanque preparado para recebê-lo, sendo
pulverizado em seguida no canavial, fun-
cionando como fertilizante natural.
O bagaço da cana de açúcar é reapro-
veitado no abastecimento da caldeira. A
cabeça e a cauda da cachaça, descartá-
veis na produção, são convertidas em ál-
cool combustível para abastecer a frota
da DJ, evitando-se impactos ambientais
com o descarte desses subprodutos. A
água utilizada no resfriador, que passa
apenas em canos e serpentinas, retorna
para a caixa-d’água, criando
assim um novo ciclo. E o
lixo é totalmente recicla-
do e comercializado, com
renda destinada a institui-
ções filantrópicas.
A DJ também reconhe-
ce que a satisfação dos
seus funcionários reflete di-
retamente na qualidade do
produto, por isso, a sede da
DJ oferece conforto e quali-
dade de vida a seus colabo-
radores. A acomodação é em
chalés mobiliados. A empre-
sa oferece ainda assistência
ambulatorial, treinamento e
incentivos para qualificação
profissional, alimentação de
qualidade e área de lazer.
Desde 2007 no mercado,
a DJ vende para vários estados
brasileiros, entre eles São Pau-
lo, Amazonas, Rio Grande do Sul
e Paraná. Silvana Moreira conta que
várias ações estão sendo feitas para co-
locar o destilado de São Gonçalo do Pará
entre as principais marcas do país. Uma
delas é a participação em feiras do setor
como a ExpoCachaça (MG) e o Congres-
so Brasileiro de Bebidas (SP), além da
promoção de eventos culturais. Outra
iniciativa que tem rendido bons resulta-
dos é a produção de embalagem perso-
nalizada para o segmento corporativo.
Silvana Gonçalves afirma que a bebida se destaca também pela imagem inovadora do produto
39
Reconhecimento internacional
A cachaça DJ recebeu a medalha de ouro na Com-petição de Degustação do Ministério do Rum 2009, realizada no Salão Flórida do Hotel Delano, em Miami Beach. Vinte e dois jurados se reuniram durante dois dias de competição para degustar 65 tipos de bebidas destiladas feitas de cana-de-açúcar, produzidas em mais de 20 países como Porto Rico, Panamá, República Dominicana, Venezuela e Nicarágua. Os destilados são julgados por seu aroma, gosto inicial, corpo e conjunto, numa escala de 1 a 25 para cada um dos atributos. A nota final é a soma da pontuação atribuída a cada atri-buto. Organizado por Edward Hamilton, autor de vários livros sobre o rum, a competição avalia as bebidas em categorias reconhecidas pela Indústria de Destilados de Cana-de-Açúcar. A cachaça DJ dividiu a medalha de ouro com marcas famosas como Bacardi Reserva Limi-tada e Castro Rum. A DJ Cachaça Mineira também foi agraciada com a medalha de Prata no Concurso Mun-dial de Bruxelas Brasil 2008.
ficHa tÉcNicaCidade: São Gonçalo do Pará Região: Centro-oesteProdutores: Leonardo Moreira Gonçalves, Lander
Moreira Gonçalves e Silvana Moreira Gonçalves
(37) 3221-2800Início da produção: 2005Volume: 200 mil litros por ano Teor alcoólico: 40%Envelhecimento: quatro anos em jequitibá-rosa
41
Nome da cachaça é uma homenagem dos proprietários, Silvia e Gil Moura (ao lado), à terra onde nasceu a família
No alto da serra, uma cachaça “Da Boa”
O compositor carioca Lamartine
Babo certa vez recebeu uma car-
ta apaixonada de Nair Pimenta
de Oliveira, moradora de Boa Esperança,
no sul de Minas. A moça dizia-se grande
fã de suas músicas e, com isso, passaram
a se corresponder por cartas. Passado al-
gum tempo, Lamartine recebeu o convite
de um dentista para conhecer Boa Espe-
rança. Chegando lá descobriu que Nair era,
na verdade, o tal dentista chamado Carlos
Alves Neto. Sem perder o bom humor, La-
martine compôs uma de suas mais belas
canções, Serra da Boa Esperança.
Muitos anos depois, a música que des-
creve a dor do poeta ao deixar sua terra
“no coração do Brasil” inspirou os empre-
sários Gil e Silvia Moura no batismo de sua
cachaça, pois eles procuravam uma marca
que simbolizasse as belezas de Boa Espe-
rança. “A canção de Lamartine Babo fala
um pouco da nossa própria história, já que
fomos criados na capital, mas sentimos
saudades da cidade onde nasceu toda a
família. Queríamos de algum modo home-
nagear Boa Esperança, a cidade dos cafe-
zais e do Festival da Canção, que já tem
mais de 40 anos de história”, explicam Gil
e Silvia Moura, proprietários do Alambique
Toledo e Moura Ltda.
O batismo então se deu e a cachaça foi
registrada como “Serra da Boa Esperança”.
Porém, seu nome foi reduzido (pelo fato de
o adjetivo “Da Boa” fazer parte do próprio
nome) e passou a ser conhecido em Minas
como Da Boa, uma estratégia dos produ-
tores, que tiveram a ideia de um rótulo que
destacasse a expressão, clara referência
ao universo da cachaça. “Conseguimos
explorar um nome que está na cabeça de
todo brasileiro quando vai tomar uma pin-
ga: esta é da boa!”, brinca Gil.
A serra da Boa Esperança é um acidente
geográfico no meio rural de Boa Esperança
e municípios adjacentes. Possui aproxima-
damente 100 km², que vai desde a Serra
Azul, passando pela Serra do Buracão, até
o Chapadão. Ali, num de seus enclaves, o
casal Gil e Silvia fundou em 2003 o Alam-
bique Toledo e Moura Ltda., localizado na
Fazenda Várzea do Ribeirão de São Pedro,
numa região cercada de plantações de
café, milho e criação de gado leiteiro.
A ideia dos empresários era produzir
uma cachaça artesanal de qualidade, que
se tornasse referência na região de Boa
Esperança. “A nossa família é do sul de
Minas, mas moramos em Belo Horizon-
te há muitos anos. Queríamos investir na
nossa terra, e a cachaça apareceu como
“Queríamos de algum modo homenagear Boa Esperança, a cidade dos cafezais e do Festival da Canção”Gil e Silvia Moura, proprietários do
Alambique Toledo e Moura Ltda.
42
Capelo
Proteção superior de chaminé, para evi-tar a entrada de vento e chuva. O alambique capelo tem uma coluna lisa e essa proteção na parte superior. Segundo a empresa D & R Alambiques, são três os tipos de alambi-ques: capelo, coluna e tromba de elefante.
oportunidade. No começo o objetivo
era o lucro, depois passamos a nos en-
cantar com a produção do alambique”,
explica Gil.
Na época, o engenho foi todo mon-
tado dentro dos padrões do Ministé-
rio da Agricultura, com o objetivo de
colocar a cachaça Da Boa, como ficou
popularmente conhecida na região, no
mapa das cachaças artesanais de quali-
dade. Merecem destaque os dois alam-
biques capelos, a estrutura produtiva
em elevação – moenda e fermentação
na parte mais alta, e a caldeira na parte
mais baixa –, fora as duas grandes ade-
gas com mil barris de carvalho escocês
no total e nove tonéis de 5 mil litros de
jequitibá-rosa. Há ainda dois tonéis de
jequitibá de grande volume – um de 50
mil e outro de 70 mil litros.
A qualidade técnica e a infraestru-
tura da fazenda Várzea do Ribeirão de
São Pedro impressionam. Gil Moura
conta que no início pediu apoio à Uni-
versidade Federal de Lavras (UFLA), que
prestou consultoria e forneceu levedu-
ras selecionadas para o processo de
fermentação. O resultado é uma bebida
de qualidade com leve toque frutado e
suavidade característica.
Além de produzir 120 mil litros por
ano de cachaça, o Alambique Toledo e
Moura mantém um rigoroso padrão téc-
nico voltado à preservação ambiental.
A água usada no resfriamento do alam-
bique é reutilizada junto com o vinhoto
na irrigação; o bagaço vai para a cal-
deira e também serve de alimento para
o gado. O engenho possui ainda uma
nascente, uma represa de 10 mil metros
quadrados e uma reserva ambiental de
3,5 hectares.
E quando o assunto é religiosidade,
a Da Boa também tem sua fé. Gil conta
que sua mãe Luzia Augusta trouxe de
Portugal uma pequena imagem de Nos-
sa Senhora de Fátima. A família devota
construiu uma pequena capela na en-
trada da propriedade. Toda essa estru-
tura da Fazenda Várzea do Ribeirão de
São Pedro fez tanto sucesso que entrou
para o roteiro turístico do município de
Boa Esperança.
Atualmente, a cachaça Da Boa é co-
mercializada no sul e oeste de Minas,
Zona da Mata e Região Metropolitana
de Belo Horizonte, além dos estados de
São Paulo, Rio de Janeiro e capitais do
Nordeste. Gil Moura conta que parte ex-
pressiva das vendas é feita por meio de
distribuidores, fora as vendas diretas.
Com produção anual de 120 mil litros,
o Alambique Toledo e Moura Ltda. tem
conseguido comercializar 30% de sua
produção, sendo o restante envelhecido
com o objetivo de lançar lotes especiais
43
ficHa tÉcNicaCidade: Boa Esperança Região: SulProdutor: Alambique Toledo e Moura Ltda.(35) 3851-2717 e (35) 9954-2717Início da produção: 2003Volume: 120 mil litros por ano Teor alcoólico: 42%Envelhecimento: dois anos em barris de carvalho
(ouro) e jequitibá-rosa (prata)com valor agregado. Além da qualidade
técnica da cachaça Da Boa, já certifica-
da pelo Inmetro, mediante o Programa
Nacional de Certificação da Cachaça em
2007, e pelo selo da AMPAQ em 2004,
que faz parte do primeiro critério para
comercialização. Gil e Silvia acreditam
que o momento agora é investir em es-
tratégias de marketing e formar parcerias
com distribuidores e representantes de
outros estados a fim de levar a marca de
Boa Esperança para todo o Brasil.
44
Dois dedos de prosa em Piranguinho
Conhecida como a capital na-
cional do pé de moleque, a
cidade de Piranguinho, no sul
do estado, começa a se firmar, tam-
bém, como a região do dedo de prosa,
ou melhor, da cachaça de alambique
Dedo de Prosa, lançada em 2004 pelos
irmãos Saulo e Jacqueline Germiniani.
Os dois entraram de cabeça no setor
depois de imersões profissionais em
cursos especializados na área de fabri-
cação de cachaça. Isso para firmar o pé
no mercado de bebidas com um produ-
to de excelência e fazer da propriedade
uma usina de oportunidades.
A história da cachaça começou
com o patriarca da família Germinia-
ni, o seu Saulo, um apaixonado pelos
destilados. Com histórico bem sucedi-
do no comércio de carne em Itajubá,
o empresário adorava estudar os pro-
cessos de destilação, principalmen-
te do uísque e da cachaça. O gosto
pela bebida era tanto que seu Saulo
resolveu comprar um alambique para
produzir a própria cachaça na Fazenda
Serra Grande, propriedade da família
em Piranguinho.
A construção do engenho ocorreu
em 2001, mas os filhos só decidiram ini-
ciar a produção depois de estudar bem
a área e o mercado. Saulo e Jacqueline
fizeram os cursos de Especialização e
Pós-Graduação em Cachaça na Univer-
sidade Federal de Lavras e o curso de
Mestre Alambiqueiro em Itaverava, pelo
Centro de Tecnologia Canavieira, além
de cursos de capacitação técnica do
Sebrae-MG. “Queríamos produzir uma
cachaça artesanal para competir em
qualidade com as melhores do merca-
do”, afirma Jacqueline Germiniani Calvo.
“Com os cursos, aprendemos a técnica,
mas precisávamos descobrir um jeito
nosso, um ponto nosso de produção,
para que a marca tivesse um diferen-
cial”. Isso foi possível após a realização
de muitos testes, de corte, moagem,
fermentação e destilação.
Na Agroindustrial Serra Grande
Ltda., empresa dos irmãos Germinia-
ni, é produzida atualmente a Dedo de
Prosa versão Carvalho e Louro-Canela.
São produzidos 80 mil litros anuais da
marca. Os próximos passos compreen-
dem o lançamento das cachaças Savas-
“O papel do produtor de cachaça artesanal é pesquisar sempre e criar novas oportunidades de negócio, mas sempre com foco na qualidade” Jacqueline Germiniani Calvo, proprietária da Agroindustrial Serra Grande Ltda.
Bebida é produzida na Fazenda Serra Grande,
em Piranguinho
DIV
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ÃO
DE
DO
DE
PR
OS
A
46
si nas versões ouro e prata e 180º (mix
de aguardente, limão e mel), em par-
ceria com produtores da região, e do
licor Dedo de Prosa. “Percebemos que
investir em outros produtos é uma saí-
da de mercado para alcançar um equilí-
brio comercial precisamos diversificar o
segmento. De repente, irão surgir novos
nichos e a Dedo de Prosa já vai estar
preparada para absorver esse merca-
do”, afirma Jacqueline. “O papel do pro-
dutor de cachaça artesanal é pesquisar
sempre e criar novas oportunidades de
negócio, mas sempre com foco na qua-
lidade do seu produto”. E para transfor-
mar toda a cadeia produtiva da cachaça
em agronegócio, a Agroindustrial Serra
Grande também envaza e produz blends,
como o da marca Colinas do Sul Ouro,
da Cooperativa do Sul de Minas.
Jacqueline, que coordena a pro-
dução da Dedo de Prosa, também é a
responsável pela criação de gado de
corte, num total de 800 cabeças da
raça Nelore, criadas em confinamento
com venda certa para o frigorífico da
região. Além disso, comercializa fer-
mento, bagaço e mudas de cana-de-
açúcar. E ainda sobra tempo para viajar
pelo Brasil a fim de dar palestras e con-
sultorias sobre o processo de fabrica-
ção da cachaça e desenvolvimento de
ações sustentáveis. “No caso da Dedo
de Prosa, todas as etapas de produção
são registradas dentro de um controle
rigoroso, a fim de manter a padroni-
zação do produto”. Na Fazenda Serra
Grande, as máquinas e conexões são
limpas diariamente. E a água do poço
artesiano, “nossa principal matéria-pri-
ma”, é analisada duas vezes ao ano.
Os produtores procuram ser o mais
ecológicos possível. Os resíduos viram
insumo, parte da palha e do bagaço da
cana são usados na queima da caldeira
e na forração do canavial. O bagaço é
vendido para produtores de cogumelo,
que o utilizam para forração dos solos.
Também é usado na propriedade para
fazer o berço para o gado descansar
durante o confinamento. O vinhoto vira
adubo no canavial e grande parte é des-
tinada para alimento do gado. Todos
esses processos são acompanhados
por um consultor ambiental.
Jacqueline Calvo acredita que o pa-
pel de todo produtor de cachaça de
alambique é levar a cultura do desti-
lado de cana aos diversos públicos.
“Mostramos que o consumo de bebida
alcoólica deve ser na quantidade certa,
e que uma boa cachaça é um alimento
que faz bem”. Desde, é claro, que seja
uma bebida de qualidade, o que deve
ser a regra número um de quem pro-
duz cachaça.
ficHa tÉcNicaCidade: PiranguinhoRegião: Sul de MinasProdutores: Jacqueline e Saulo de Barros Germiniani(35) 3623-1777 ramal 206 Início da produção: 2004Volume: 80 mil litros por anoTeor alcoólico: 40%Envelhecimento: três anos em barris de
carvalho (ouro) e dois anos em louro-canela (prata)
47
Gavião do Vale une irmãos em passatempo levado a sério
O município de Belo Vale, co-
nhecido pela sua tradição
histórica – com os legados da
Fazenda Boa Esperança, do Barão de
Paraopeba, e do Museu do Escravo –,
pelas belezas naturais e pela produção
de mexerica “ponkan”, vem ganhando
fama como produtor de cachaça arte-
sanal de qualidade. Uma das marcas de
destaque é a cachaça Gavião do Vale,
do casal Oliveira e Eunice Paiva. Produ-
zida na fazenda Gavião, numa área de
49 hectares, localizada entre Belo Vale e
Piedade dos Gerais, a bebida é comer-
cializada nas versões ouro e prata, am-
bas envelhecidas durante cinco anos.
Dona Eunice conta que a Gavião do Vale
é muito apreciada pelo público femini-
no. “A nossa bebida tem baixa acidez,
suavidade e um toque adorável”.
Vendida basicamente nos municí-
pios próximos como Congonhas, Con-
selheiro Lafaiete, Ouro Branco, Moeda
e Tiradentes, e na Região Metropolita-
na de Belo Horizonte, a Gavião do Vale
começou sua história por acaso, há
quase 10 anos. Em 1999, o procurador
de justiça Oliveira Salgado Paiva parti-
cipou, juntamente com o irmão, o mé-
dico Olinto de Paiva Neto, de um curso
de degustação na Associação Mineira
de Produtores de Aguardente de Quali-
dade (Ampaq). Dali, saíram com a ideia
de montar um pequeno alambique,
igual ao das histórias que escutavam
do avô Balbino Lopes Salgado, imigran-
te português que chegou ao município
de Abre Campo no final do século XIX,
empregado na Fazenda Córrego Frio,
produtora de cana-de-açúcar, fumo e
café. Balbino enamorou-se de Cornélia,
filha do fazendeiro José de Abreu, ca-
sando-se em seguida com ela.
Como gestor da fazenda Córrego
Frio, Balbino ajudou na fabricação da
cachaça Cristalina, que se tornou uma
das marcas mais conhecidas na pri-
meira metade do século XX na região
da Zona da Mata Mineira. Com a mor-
te de José de Abreu, ele passou a ser
o proprietário da marca. “Meu avô era
conhecido também como Tenente Bino,
por ter exercido cargos políticos de
destaque durante mais de 30 anos em
Abre Campo. Em 1950, ele vendeu a pa-
tente da Cristalina para um empresário
“A nossa bebida tem baixa acidez, suavidade e um toque adorável”Eunice Caetano Paiva, produtora da Gavião do Vale
Cristalina
História familiar da produção da aguar-dente Cristalina, em Abre Campo, motivou os irmãos Oliveira Salgado Paiva e Olinto de Paiva Neto a enveredarem na produção de cachaça em Belo Vale.
Produtores receberam consultoria de especialistas e doutores para garantir a qualidade da produção
49
da cidade chamado Francisco Nassif.
Alguns anos depois conheci o senhor
Nassif, que me disse ter comprado todo
o alambique do meu avô, as dornas, a
caldeira, tudo. Só não comprou a recei-
ta. Aí não tinha jeito de acertar a mão
na cachaça”, conta Oliveira.
Proprietários da fazenda Gavião des-
de a década de 1990, Oliveira e Olinto
resolveram então, em 2000, construir o
engenho. O que parecia um passatem-
po foi levado a sério, assumindo um
tom profissional.
O investimento inicial priorizou a
qualidade técnica e incluiu equipamen-
tos: dornas de aço inox, filtros, caldeira,
envasadora, uma adega com 80 barris
de carvalho e mais seis tonéis de jequi-
tibá. O planejamento previu a adequa-
ção da produção às normas técnicas
do Ministério da Agricultura. Os irmãos
receberam consultoria do engenheiro
agrônomo Luiz Cláudio da Silveira, da
Universidade Federal de Viçosa, que
deu orientações sobre o plantio da
cana-de-açúcar; e da doutora Amazile
Biagioni Maia, responsável pelas aná-
lises químicas da bebida. Além da es-
trutura de produção, a fazenda Gavião
se preocupou também com os padrões
ambientais, com rodízio do solo para o
plantio da lavoura, o reaproveitamento
do vinhoto (usado na irrigação) e do ba-
gaço. Na propriedade, há ainda uma re-
serva de mata nativa, de nove hectares,
e três nascentes.
Com a morte do irmão e idealizador
da Gavião do Vale, Olinto Paiva Neto,
em 2004, seu Oliveira contou com a
ajuda da esposa Eunice Caetano para
gerir a fazenda. A empresária passou a
desenvolver estratégias para comercia-
lização da marca, com a participação
em feiras, como a Feira e Festival In-
ternacional da Cachaça (ExpoCachaça),
e eventos com o apoio do Sindicato
das Indústrias de Cerveja e Bebidas em
Geral do Estado de Minas Gerais (Sin-
dbebidas). A empresa Salgado e Paiva
Agroindústria Ltda., responsável pela
Gavião do Vale, também tem contado
com um grupo de distribuidores nos es-
tados de Minas Gerais e São Paulo. Ao
obter o selo do Inmetro em dezembro
de 2008 por meio do Programa Nacio-
nal de Certificação da Cachaça (PNCC),
a Gavião do Vale deu mais um passo
no seu projeto de expansão. “O selo
foi uma vitória pra gente, pois certifica
a nossa qualidade para o mercado e o
público em geral. Queremos que a nos-
sa marca se torne conhecida e passe a
ser consumida por mais pessoas”, de-
fende Eunice Caetano.
ficHa tÉcNicaCidade: Belo ValeRegião: Central Produtor: Salgado e Paiva Agroindústria Ltda.(31) 3337-9857 e (31) 99849857 Início da produção: 2002Volume: 30 mil litros por anoTeor alcoólico: 43% Envelhecimento: cinco anos em carvalho e jequitibá
51
Irmãs gêmeas de padrão internacional
Elas fazem parte de uma geração
de cachaças preocupada com a
qualidade da bebida e a saúde
do consumidor. Gêmeas de 25 anos, a
Vale Verde tem corpo dourado; a Minha
Deusa, pele prateada. Ambas envelhe-
cidas durante três anos. A primeira, em
barris de carvalho. A segunda, em barris
de grápia. As duas nasceram das mãos
do empresário Luiz Otávio Pôssas Gon-
çalves, que na boca pequena do merca-
do é considerado um Midas. Por onde
passou no ramo de bebidas, há emble-
máticas histórias de sucesso. Ex-pro-
prietário da Refrigerantes Minas Gerais,
franquia mineira da Coca-Cola, criou a
Kaiser no Brasil, numa ideia considera-
da tão ousada à época pelo presidente
do grupo mundial, Donald Keough, que
Luiz Otávio recebeu apenas “um dólar”
de contribuição para a empreitada. O
empresário ainda guarda a nota, colo-
cada numa moldura.
Dessa trajetória, carregou na baga-
gem a experiência necessária para dar
vida à Fazenda Vale Verde, proprieda-
de da família no município de Betim, a
poucos minutos de Belo Horizonte. Ali,
construiu um alambique com tecnolo-
gia europeia e tornou-se o precursor
no uso desse conhecimento na pro-
dução de cachaça. “Para abrir a fábrica
da Kaiser tive de viajar para o exterior,
pesquisar na Europa os vários métodos
de destilação e fermentação, tanto de
cervejas como do uísque e do vinho.
Quis aplicá-los na produção da cacha-
ça”, explica Gonçalves. Na avaliação de
especialistas do setor, o projeto signifi-
cou também o início da profissionaliza-
ção da produção de cachaça artesanal,
a partir de meados dos anos 1980. O
modelo de alambique de Luiz Otávio
passou a mostrar, ano a ano, que a qua-
lidade estava vinculada à tecnologia.
“Naquela época, a maioria dos alam-
biques trabalhava sem aporte científico
e tecnológico. Primeiro, inovamos ao
selecionar a cana e a não queimá-la. Na
produção da Vale Verde também retirei
a fermentação com fubá, que embora
seja mais rápida não é de boa qualidade
e gera mais acidez. Passamos a usar so-
mente a fermentação natural e leveduras
selecionadas”, lembra Luiz Otávio. Já a
garapa extraída da moagem da cana era
centrifugada, decantada e filtrada antes
de ir às dornas de fermentação. No pro-
cesso de destilação, a cachaça que saía
do alambique passava por um filtro de
“Há um público específico para a cachaça artesanal, que é diferente da bebida industrializada”Luiz Otávio Pôssas Gonçalves, produtor das cachaças Vale Verde e Minha Deusa
Trajetória do empresário Luiz Otávio é marcada por histórias de sucesso no setor de bebidas
52
resina catiônica, que assegura a retira-
da de metais pesados, como o cobre e
o zinco; e, depois, por um filtro de car-
vão, responsável pela redução da acidez.
“Um costume antigo dos produtores de
cachaça artesanal era usar o fogo direto,
a partir da queima de lenha ou do baga-
ço de cana, para aquecer o alambique e
fazer a destilação. Um dos cuidados que
tivemos desde o início foi fazer a desti-
lação a vapor, porque assim se consegue
o aquecimento do caldo a uma tempera-
tura gradual e constante, o que faz com
que o álcool superior (mais volátil) se se-
pare primeiro. Esse álcool é pior para a
saúde. Enfim, com esse processo conse-
guimos fazer uma separação melhor”.
Além do investimento em tecnologia
e do incentivo à profissionalização do
setor, a cachaça Vale Verde também foi
pioneira, entre os produtores de bebi-
das destiladas, na área da preservação
ambiental. Em 2002, criou o Vale Verde
Parque Ecológico com o objetivo de ofe-
recer aos visitantes um espaço de lazer,
diversão e ecoturismo. São 30 hectares
onde estão dispostos um orquidário
com mais de 20 mil orquídeas e viveiros
de pássaros silvestres como papagaios,
araras, tucanos e lóris, entre outros. Há
ainda um parque de pesca, uma horta
orgânica, passeios de charrete e peda-
linhos, além de trilhas ecológicas para
o visitante. Na propriedade, um acervo
com quase 2 mil garrafas, de diversas
marcas de todo o Brasil, estão reuni-
das no Museu da Cachaça, que atrai a
atenção dos apaixonados pelo assunto.
“A receita obtida na venda das cachaças
Vale Verde é revertida, integralmente, em
ações de preservação ambiental do par-
que. Além disso, empresas, instituições
governamentais e de ensino mantêm
parcerias conosco, desenvolvendo ações
de responsabilidade ambiental e social”,
O modelo de alambique da Vale Verde mostrou, a partir
de 1985, que a qualidade na produção de cachaça
está associada à tecnologia
53
informa o gerente geral da Fazenda Vale
Verde, Rafael Gonçalves Horta.
O Parque Ecológico recebe a média
mensal de 6,5 mil visitantes, o que de-
monstra o sucesso da iniciativa. “Esta-
mos incentivando os jovens a ações de
preservação ambiental, oferecendo co-
nhecimento sobre a fauna e a flora. Além
dos benefícios sócio-ambientais do par-
que, conseguimos divulgar a nossa mar-
ca”, comenta o gerente.
Atualmente, a Vale Verde e a Minha
Deusa são vendidas para quase todas
as regiões do Brasil. Segundo o gerente
Rafael Gonçalves Horta, as duas marcas
já podem ser encontradas nas regiões
Sudeste e Sul, em quase todos os esta-
dos do Nordeste, bem como no Distri-
to Federal, em Goiás, no Mato Grosso,
Amazonas, Pará e Acre. Sinônimos de
cachaças de qualidade, a Vale Verde e
a irmã, Minha Deusa, carregam o reco-
nhecimento de organismos públicos e
privados, além de revistas nacionais e
internacionais.
A Vale Verde foi, por exemplo, a
primeira cachaça a receber o Selo de
Qualidade AMPAQ (Associação Mineira
de Produtores de Aguardente de Qua-
lidade) no começo da década de 1990.
Em 2007, obteve o selo de qualidade do
Inmetro e foi escolhida a melhor cacha-
ça brasileira no Ranking de Cachaças da
Revista Playboy. Pela mesma publica-
ção, a Vale Verde recebeu, em 2009, o
primeiro lugar na categoria Melhor Ca-
chaça Extra Premium. E em 2010, quan-
do os produtos completam 25 anos de
lançamento, a revista europeia Drink
Business concedeu a medalha de ouro à
cachaça envelhecida Vale Verde e à não
envelhecida Minha Deusa.
A cachaça Minha Deusa segue os
mesmos padrões de produção da Vale
Verde. Tem, no entanto, escala produtiva
menor, de 20 mil litros por ano, enquanto
a Vale Verde produz anualmente 150 mil
litros. “A Minha Deusa foi idealizada para
atender ao público que prefere a cachaça
branca. A ideia era ser uma bebida para
fazer batidas e coquetéis, e com preço
mais baixo”, explica Rafael Horta.
Sobre o futuro da cachaça de alam-
bique, Luiz Otávio defende a busca pela
qualidade. “Vejo muito futuro para a ca-
chaça, principalmente agora que temos
a certificação que diferencia o bom pro-
duto do ruim. Defendo que haja essa
segmentação do mercado, é preciso que
um órgão governamental incentive isso,
essa competição, essa definição da ori-
gem da cachaça e o seu modo de produ-
ção, porque aí ela vai ampliar o seu pú-
blico. Porque há um público específico
para a cachaça artesanal, que é diferente
da bebida industrializada”, completa.
ficHa tÉcNicaCidade: Betim Região: Metropolitana de BHProdutor: Luiz Otávio Pôssas Gonçalves / Fazenda Vale Verde(31) 3079-9171 Início da produção: 1985Volume de produção: 150 mil litros por anoTeor alcoólico: 40%Envelhecimento: três anos em barris de carvalho
(Vale Verde) e três anos em dornas de grápia/madeira neutra (Minha Deusa)
55
Prazer de Minas representa o estado dentro e fora do país
O empresário Euler Chaves ini-
ciou a produção da cachaça
Prazer de Minas em 1999 com
o objetivo de gerar mais receita para
a sua propriedade rural, localizada no
município de Esmeraldas, na região me-
tropolitana de Belo Horizonte. Com tra-
jetória bem sucedida no ramo de venda
de combustíveis, mas sem experiência
na produção de destilados, Euler resol-
veu conhecer a fundo o universo dos
alambiques artesanais para transformar
a sua marca, dez anos depois, numa das
principais cachaças de Minas. Vendida
para 18 estados brasileiros – onde o
consumidor tem saboreado a suavidade
e o buquê da cachaça envelhecida em
tonéis de carvalho –, a Prazer de Minas
foi eleita, em 2009, a Melhor Cachaça da
Feira e Festival Internacional da Cachaça
(ExpoCachaça). O resultado veio acom-
panhado de um convite irrecusável: car-
regar o selo do Instituto Estrada Real e
representar Minas Gerais em eventos
no Brasil e no exterior. “Estamos tendo
um reconhecimento da nossa trajetória,
e espero que novas portas sejam aber-
tas”, afirma Euler Chaves, que atribui
essas conquistas à preocupação, desde
o início, com a qualidade em todas as
fases da produção. “Priorizamos uma
infraestrutura moderna, muita preocu-
pação com a higiene desde o corte e a
lavagem da cana à destilação. A nossa
fazenda também foi uma das primeiras
a utilizar leveduras selecionadas da Uni-
versidade Federal de Lavras em 1999
para o destilado de cachaça, produzin-
do uma bebida de altíssima e refinada
qualidade”.
Localizada em região de vale, área de
60 hectares, a Prazer de Minas montou
uma das estruturas de produção de ca-
chaça mais modernas do estado, com
dois alambiques de cobre aquecidos por
caldeira, sala de fermentação climatiza-
da, dornas de inox, sistema de engarra-
famento e duas adegas sendo uma com
barris de carvalho inglês, e outra com
dornas de jequitibá. “Ao se seguir um
processo limpo, conseguimos uma ca-
chaça com baixa acidez, transparente, e
de excelente qualidade”, observa Euler.
As características da bebida têm
agradado ao mercado. Mas para chegar
a ele, o empresário Euler Chaves tem
“Estamos tendo um reconhecimento da nossa trajetória, e espero que novas portas sejam abertas”Euler Chaves, produtor da Prazer de Minas
Para Euler (na foto da página ao lado), processo limpo garante cachaça com baixa acidez e excelente qualidade
56
Fazenda integra projeto da Estrada Real
Após o convite do Instituto Estrada Real, a Fazenda Prazer de Minas está se preparando para abrir o empreendimento ao público, transformando-se num ponto turístico. Para isso, investe R$ 80 mil somente na urbanização da fazenda, incluindo a construção de um piso similar ao da Estrada Real. “A pavimentação original é o chamado pé de moleque, mas como não encontramos esse material, estamos fazendo de tudo para ficar parecido e criar aquela mesma sensação do caminho histórico”, afirma Euler Chaves. O empreendimento também terá restaurante e a oferta de passeios ecológicos para os turistas, pois dentro da fazenda há duas reservas florestais ideais para passeios.
A parceria com o Instituto Estrada Real renderá ainda outros benefícios: “Estamos numa fase de mudança. No começo de fevereiro de 2010, a Prazer de Minas passou a ser comercializada com o novo rótulo, com o acréscimo do brasão Estrada Real. A Prazer de Minas vai representar também a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais e receberá o apoio do governo estadual. Nossa cachaça estará presente em todos os eventos, exposições e na rede de hotelaria da Estrada Real”, informa Chaves.
56
feito um trabalho de relacionamento
permanente com os grandes distribuido-
res. Quando começou a comercializar a
cachaça, em 2002, ele passou a investir
nos principais mercados consumidores
do Brasil. Hoje, vende 30 mil litros anuais
da bebida, grande parte consumida fora
de Minas. “Uma vez por mês viajo para
divulgar a Prazer de Minas. Visito um ou
dois grandes distribuidores, seja em Bra-
sília, São Paulo, Rio de Janeiro ou outros
estados”. O esforço maior, no entanto,
está concentrado em São Paulo, o maior
mercado brasileiro para a cachaça. “São
Paulo é o maior comprador da Prazer de
Minas”, afirma Euler.
Os esforços estão concentrados,
também, num nicho em que poucos
produtores de cachaça artesanal cos-
tumam investir: a classe A. No início,
a marca inovou no formato das emba-
lagens, ao fazer parte de um grupo que
passou a utilizar garrafas transparentes
importadas do Uruguai. “Nós começa-
mos a importar a garrafa transparente,
cilíndrica, diferenciada para atender um
público sofisticado. Depois essa garrafa
começou a ser produzida em São Paulo
57
ficHa tÉcNicaCidade: EsmeraldasRegião: Metropolitana de BHProdutor: Euler Chaves(31) 9990-3390 Início da produção: 1999Volume: 50 mil litros por anoTeor alcoólico: 39%Envelhecimento: dois, três, cinco e dez anos
em barris de carvalho Inglês ou dornas de jequitibá
pela Saint-Gobain”. Logo após, a Prazer
de Minas também passou a ter garrafa
própria, exclusiva e personalizada. Uma
das iniciativas para aproximar a Prazer
de Minas ainda mais de um público se-
lecionado ocorreu em 2004. A cachaça
chegou ao mercado em edição “Gold”
com cinco anos de envelhecimento, ven-
dida em garrafa de cristal, francesa, com
design moderno e muito nobre. A come-
moração dos dez anos da marca veio
acompanhada de investimento arrojado
para uma cachaça artesanal. O empresá-
rio Euler Chaves importou 200 garrafas
de cristal da Boêmia (República Tcheca).
“É a nossa edição Celebration, em co-
memoração aos dez anos da Prazer de
Minas com uma cachaça nobre envelhe-
cida em carvalho.” Cada unidade custou
R$ 1.260,00. O cliente recebe a garrafa
em casa, numerada e com certificado no
nome dele. Chaves garante que quase
não existem mais dessas garrafas impor-
tadas da Boêmia. “Uma grande empre-
sa comprou 40 unidades para oferecer
a celebridades, e o próprio empresário
presenteou o presidente Lula e o vice-
presidente José Alencar.”
58
Prosa & Viola: legado cultural com a alma do homem sertanejo
Conhecido como a sede do Cir-
cuito Turístico Guimarães Rosa
e por estar localizado no centro
geográfico de Minas, o município de Mor-
ro da Garça, na região central do estado,
começa a fazer parte também do roteiro
dos alambiques artesanais. Ex-distrito
de Curvelo – região que deu notoriedade
a cachaças que marcaram época como
Florisbella, Correinha, Reis, Sarobá, Excel-
sior e Marcolina, entre outras –, Morro da
Garça meteu na algibeira o legado cultural
dos vaqueiros e das cantorias e produziu
uma cachaça de qualidade e com a identi-
dade da região: a Prosa & Viola.
Desde o começo de 2001, quando o
engenheiro e produtor rural José Antô-
nio de Freitas Souza resolveu montar um
alambique, a ideia era produzir uma
cachaça bem elaborada tecnica-
mente e que tivesse uma relação
com o homem sertanejo, com as
coisas rurais. “Eu sou um ho-
mem que cresceu no campo e
apaixonado pela sua cultura.
Por esse motivo, a minha ca-
chaça representa esse uni-
verso”, explica.
Na fazenda Alvorada, com área de 480
hectares e criação de gado de corte, José
Antônio montou um pequeno alambique
unindo tecnologia às normas produtivas
de uma boa cachaça artesanal. Com ca-
pacidade atual de 30 mil litros anuais, a
estrutura do engenho possui salas de fer-
mentação isoladas, duas engarrafadoras,
filtros de polimento para a separação
de partículas sólidas da cachaça e ade-
ga com 180 barris de carvalho e quatro
tonéis de jequitibá. Fora o maquinário,
a Agro-Indústria Prosa & Viola (nome da
empresa responsável pela marca) inves-
tiu numa produção ecologicamente cor-
reta, adequada à legislação ambiental.
Merecem destaque as ações de reapro-
veitamento de resíduos, como o baga-
ço e o vinhoto; o corte sustentável da
cana, com a proibição de desmatamen-
tos e queimadas na área de plantio; e a
reutilização da água, que após resfriar o
alambique ou ser usada para limpeza das
instalações, é escoada e usada na irriga-
ção da lavoura.
Além da qualidade produtiva, a Fa-
zenda Alvorada possui a beleza dos cam-
pos cerrados, sendo a sua região famosa
Eu sou um homem que cresceu no campo e apaixonado pela sua cultura. Por esse motivo, a minha cachaça representa esse universo”José Antônio de Freitas Souza, produtor da cachaça Prosa & Viola
60
A Prosa & Viola e a Terra de Minas foram as duas primeiras cachaças artesanais a receber, em dezembro de 2006, o selo Inmetro de qua-lidade, por meio do Programa Nacional de Cer-tificação da Cachaça (PNCC). A iniciativa, que avalia todas as etapas do processo artesanal de produção, como práticas ambientais, proprieda-des químicas e padronização, resultou em um
ganho de imagem efetivo para as duas marcas. “Os certificados n° 1 e 2 do Inmetro são, respec-tivamente, da Prosa & Viola e da Terra de Minas. Isso significou muito pra gente e mostrou que temos qualidade”, afirma o produtor José Antô-nio. Ele ressalta que, durante as duas auditorias realizadas pelos técnicos do Inmetro, a Agro-In-
60
Pioneiras na certificação
dústria Prosa & Viola foi aprovada nos quesitos de limpeza e higiene; na adoção de controles rigorosos no trato da matéria-prima, manejo do canavial e cuidado com fertilizantes e outros in-sumos; cumprimento da legislação trabalhista e nos aspectos ambientais. A gerente de vendas, Daniela Vilaça, conta que após a obtenção da certificação as marcas ganharam muito em mídia espontânea. “Em 2007, foram veiculadas maté-rias em sites, revistas e publicações diversas”, afirma a gerente.
Dentre as estratégias de venda, a Prosa & Viola e a Terra de Minas começaram a partici-par de feiras do setor, eventos de degustação e, também, de encontros das mais diversas áreas profissionais, mas sempre com foco no público classe A. Congressos médicos, fóruns de profis-sionais do setor imobiliário, feiras agropecuárias e encontros gastronômicos são exemplos dessa iniciativa. “Acreditamos que, ao ter contato com públicos diferentes, divulgamos a nossa marca e mostramos a qualidade da cachaça artesanal”, define Daniela.
Atualmente, a Prosa & Viola e a Terra de Mi-nas são vendidas em Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Bahia, Paraná, Santa Ca-tarina e Rio Grande do Sul. O projeto para o fu-turo é ampliar as vendas no Rio de Janeiro, onde a Terra de Minas já tem um público consumidor; em São Paulo e, principalmente, em Minas. “No nosso estado temos investido na região do en-torno de Belo Horizonte, e em Uberlândia e Dia-mantina, lugares onde temos representantes. Mas queremos ampliar esse quadro”, garante a gerente de vendas.
61
por representar o início do sertão rosia-
no. Dizem que foi passando por aqueles
caminhos que o escritor João Guimarães
Rosa descreveu com deslumbramento o
Morro da Garça, uma elevação rochosa
de 350 metros cercada de superfície pla-
na. Chamado depois de “morro testemu-
nho” e eternizado por Rosa no conto “O
Recado do Morro”, o da Garça continua
referência para vaqueiros e viajantes que
passam pela região.
Foi ali que, em 2001, a Prosa & Viola
comemorou a sua primeira safra. Porém,
antes de ser comercializada, foi envelhe-
cida em barris de carvalho por três anos
ficHa tÉcNicaCidade/Região: Morro da Garça / Região CentralProdutores: José Antônio de Freitas Souza e Daniela Vilaça Souza(31) 8709-2266 Início da produção: 2001Volume: 30 mil litros por anoTeor alcoólico: 40% Envelhecimento: três anos em barril de carvalho
(Prosa & Viola); um ano em tonel de jequitibá (Terra de Minas)
para ganhar a característica aparência
ouro. Em 2004, na Feira e Festival In-
ternacional da Cachaça (ExpoCachaça),
José Antônio e sua filha Daniela Vilaça
Souza, gerente de vendas da empresa,
montaram um estande para a cachaça
de Morro da Garça e começaram a pro-
sear com os fregueses. Foi a entrada no
mercado. “Depois da experiência da fei-
ra, percebemos que o público procurava
também uma cachaça branca para fazer
coquetéis. Aí idealizamos a Terra de Mi-
nas, um destilado prata armazenado em
tonéis de jequitibá e com o gosto da
nossa região”, explica o produtor.
62
“Quando se começa a fabricar a cachaça artesanal não se tem ainda um padrão... Às vezes, esse gosto característico, tão próprio da sua terra, acaba agradando mais pessoas”Marcos Cordeiro de Resende,produtor da P.O. de Minas
Pura de origem na terra do gado zebu
O nome pode causar certa estra-
nheza à primeira vista. Afinal,
P.O. (ou Puro de Origem) é uma
sigla geralmente utilizada para designar
um animal com pedigree, puro de uma raça.
Mas foi justamente pela familiaridade com
a expressão em Conquista, no Triângulo
Mineiro, região de raças zebuínas, que o
produtor e alambiqueiro Marcos Cordeiro
de Rezende conseguiu associar os mes-
mos atributos à cachaça P.O. de Minas.
Assim, transmite ao mercado a percepção
de um produto com pureza garantida na
origem. “Meu tio Oto Rezende da Cunha
foi quem criou a marca no começo da
década de 1980 pensando na cultura dos
criadores de gado. A marca fez sucesso
e se tornou muito falada por aqui”, infor-
ma Marcos Cordeiro, conhecido na região
como Marcos da P.O.
A trajetória da cachaça pode ser di-
vidida em dois momentos. De 1980 até
1995, período em que Oto Rezende da
Cunha produziu a cachaça em sua fa-
zenda, localizada em Capinópolis, a 160
quilômetros de Uberlândia. Ao longo de
quinze anos, seu Oto foi modernizando
o modo de produção da P.O. de Minas.
Quando resolveu parar, o sobrinho Mar-
cos Cordeiro, que queria uma alternativa
para a criação de gado leiteiro, ficou com
a marca. A partir de 1996, na Fazenda
Montágua, no município de Conquista,
Marcos priorizou a melhoria técnica do
produto. “Eu era apenas um consumidor
de cachaça e trabalhava com produção
de leite há 14 anos. Mas sempre enfren-
tava muitas dificuldades. Então resolve-
mos investir, eu, meu pai Donaldo e mi-
nha mulher Séfora, na cachaça”.
Para conhecer os processos de produ-
ção da cachaça artesanal, Marcos buscou
informação técnica junto ao Sebrae-MG.
Com o suporte da instituição, fez cur-
sos de alambiqueiro e de fermentação.
Descendente de italianos que imigraram
Cachaça com fermento caipira
A P.O. de Minas é fabricada na Fazenda Montágua,
em Conquista, dentro das normas de certificação das
chamadas bebidas de qualidade. A cachaça apresenta
teor alcoólico de 39%, baixa acidez e um buquê com
leve toque do carvalho, madeira usada nos barris para o
envelhecimento da bebida durante dois anos.
No processo de fermentação é usado o chamado
fermento caipira, cuja mistura traz milho, farelo de ar-
roz e farelo de soja. Já na destilação, o produtor separa
o coração da cachaça para ser envelhecido, reutilizan-
do a cabeça e a cauda para produzir álcool para uso
doméstico.
“Acredito que um dos fatores que ajudou na venda
da nossa cachaça foi a suavidade. Isso porque a P.O. de
Minas é mais leve do que as cachaças de outras regi-
ões do estado. Além disso, quando se começa a fabricar
a cachaça artesanal não se tem ainda um padrão e o
produtor acaba buscando um gosto, um sabor que seja
do seu agrado. Às vezes, esse gosto característico, tão
próprio da sua terra, acaba agradando mais pessoas”,
afirma o produtor Marcos Cordeiro de Rezende.
A Fazenda Montágua é propriedade da família Re-
zende há mais de 70 anos. A área foi comprada pelo
bisavô de Marcos Cordeiro na década de 1930. O nome
“Montágua” foi dado porque as terras, a 25 quilômetros
do Rio Grande, são banhadas por muita água de qua-
lidade – nascentes, minas d’água e córregos. Marcos
Cordeiro conta que na época da certificação do Inmetro
os técnicos fizeram estudos de qualidade da água, cujo
resultado foi positivo. “Essa água é utilizada na produ-
ção da cachaça. Um exemplo disso está na preparação
do caldo para moagem”, relata.
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ficHa tÉcNicaCidade: ConquistaRegião: Triângulo MineiroProdutor: Marcos Cordeiro de Resende(34) 9978-0540 e (34) 9989-2034 Início da produção: 1996Volume: 30 mil litros por anoTeor Alcoólico: 38% (prata) e 39% (ouro)Envelhecimento: dois anos em barril de carvalho
(ouro) e jequitibá-rosa (prata)
para o Brasil no início do século XX para
trabalhar nas lavouras de café, Marcos
passou a contar com a família no negó-
cio. Ele fica na produção, responsável por
supervisionar a moagem, a fermentação,
o alambique e a limpeza do maquinário.
O pai Donaldo, com 78 anos, ajuda a es-
posa de Marcos no engarrafamento e na
rotulagem. E a filha Daniela desenvolve as
estratégias de divulgação da marca.
A fabricação da cachaça, no entanto,
é apenas uma das etapas do processo da
cadeia produtiva da bebida. Outra igual-
mente importante, na avaliação do pro-
dutor, é a venda do produto e a conquista
de um espaço no mercado. De acordo
com estimativa do Sebrae-MG, existem
mais de 600 marcas de cachaça em Minas
Gerais, fora os alambiques com produção
e venda clandestina. Ou seja, o produtor
que atua na formalidade enfrenta, além
da alta tributação, um mercado concorri-
do e, em muitos casos, uma disputa des-
leal. “No início, a gente vendia apenas a
granel em Conquista e, depois, no Triân-
gulo Mineiro. Além da concorrência, havia
ainda depreciação em relação à cachaça
artesanal. As pessoas acreditavam que
não tínhamos qualificação e higiene. Era
comum a gente escutar que havia gambá
lá na fazenda”, relembra Cordeiro.
Em 2000, o produtor da P.O. de Minas
deu mais um salto de qualidade ao pro-
fissionalizar o negócio, contando com a
consultoria do Centro de Tecnologia Ca-
navieira (CTC) para a completa adequa-
ção às normas do Ministério da Agricul-
tura e Pecuária (Mapa). O resultado foi a
ampliação das vendas para outras regiões
de Minas Gerais, além dos estados de São
Paulo e Rio de Janeiro. “A gente percebeu
que esse preconceito contra a cachaça
artesanal poderia diminuir se houvesse
mais qualidade na produção. Quando o
produtor agrega valor ao seu produto, ele
amplia o mercado. Por isso, quando o Se-
brae apareceu com a certificação e o selo
do Inmetro, a gente logo topou”.
O Sebrae-MG ajudou a P.O. de Minas
com 50% do custo da certificação, além
do apoio técnico para a implementação
dos procedimentos. “Na fazenda a gente
já aproveitava os resíduos, como o vinho-
to e o bagaço; mas a mudança principal foi
no controle rigoroso do processo de pro-
dução, com análises químicas constantes,
controle da fermentação e o estabeleci-
mento de normas”, relata o produtor.
Depois de tanto esforço, Marcos Cor-
deiro não perde o bom humor e diz que
tem a fórmula para fazer bons negócios
com o seu produto. “Eu digo que só faço
o que gosto, mulher e cachaça. Essa
brincadeira é porque tenho três filhas e
sou conhecido como o alambiqueiro da
P.O. de Minas”.
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Lenda para deixar saudade
Transformar cachaça de qualidade
em lenda. Foi com este espírito
que o engenheiro químico Car-
los Assis deu início, em 2002, à ideia de
produzir cachaça no Engenho Santa Fé,
em campos de chapadão de Uberaba. No
projeto do engenho, os segredos dos fer-
mentos artesanais se aliaram à moderna
tecnologia de equipamentos e a um rígi-
do controle de qualidade para produzir
uma bebida única. Na região, onde nasce
o Velho Chico, águas cristalinas brotam
“Quando nasce uma cachaça de qualidade, uma áurea envolve o engenho, nasce ali uma lenda, que se torna presente por gerações” Carlos Assis, produtor da Lenda do Chapadão
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AÇ
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ND
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O C
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PAD
ÃO
66
de veredas e deixam sua marca nas ca-
chaças que ali são preparadas.
Produzida em alambiques de cobre,
a Lenda do Chapadão provém de vinho
fermentado em ambiente isolado, onde
estão instaladas as dornas de aço inox,
com dispositivos de ajuste de tempera-
tura e de rigoroso controle de sanidade.
Neste ambiente reservado, se processa
uma fermentação inspirada na tradição
da melhor cachaça mineira. Em cana-
vial próprio, cultivado sem agrotóxico, a
cana da safra é colhida e moída diaria-
mente, produzindo uma garapa límpida
rica em sacarose. O bagaço serve como
combustível na caldeira, de onde é obti-
da a energia (por meio do vapor) para a
destilação controlada.
A preservação do meio ambiente
combina com a qualidade da cachaça
produzida. As nascentes de água crista-
lina, a fauna e flora são rigorosamente
preservadas, o vinhoto é aspergido no
canavial como fonte de nutrientes e o
reflorestamento com plantas nativas
é prática comum na área que cerca o
Engenho. No caso da água, captada em
fonte natural, o reaproveitamento é su-
perior a 90%, após sua utilização princi-
palmente nos resfriadores e no circuito
de vapor condensado (utilizado na cal-
deira para o aquecimento necessário
à destilação), retornando ao seu curso
natural na mesma qualidade quando da
sua captação.
Com safras da ordem de 15 mil litros,
Assis já totaliza 70 mil litros descansan-
do em tonéis de madeira, parte durante
dois anos, reservada em barris de carva-
lho (tipo ouro), parte em tonéis de jequi-
tibá-rosa (tipo prata). Os destilados são
conhecidos pela suavidade e pelo aroma.
“A Lenda do Chapadão, certificada
pelo Inmetro, tem seu mercado principal
em cidades de Minas, São Paulo e Brasí-
lia, e reúne qualificação para participar
de seleto mercado e de confrarias no fu-
turo”, afirma o produtor. Para divulgar a
bebida, a Lenda do Chapadão tem parti-
cipado de feiras setoriais e também reali-
za o “Dia de Campo”, quando um bar ou
cachaçaria oferece a bebida aos clientes
para ser degustada. “Já fizemos o evento
no Mercado Central de Belo Horizonte e
de São Paulo, em clubes, restaurantes. E
o público aprovou, porque quando nossa
cachaça é degustada, não se tem pressa
pois ela é suave e desce macia”.
Fluminense de Nova Friburgo, Carlos
Assis mora na roça, e junto ao engenho
recebe os amigos para relembrar sauda-
des, numa prosa “acompanhada de len-
das”. “O ato de degustar uma cachaça
possui a mágica de nos levar por cami-
nhos em que só a saudade nos guia, daí
a lenda”, considera Assis.
ficHa tÉcNicaCidade: UberabaRegião: Triângulo MineiroProdutor: Carlos Assis(34) 3313-0855 Início da produção: 2003Volume: 15 mil litros por anoTeor alcoólico: 40%Envelhecimento: um ano em barris de carvalho e
jequitibá-rosa
67
Segredos de Araxá em forma de cachaça
F oi na fazenda Asa Branca, em
Araxá, localizada no Alto Para-
naíba, que Paulino Correa Chi-
crala, descendente de libaneses, pas-
sou a desvelar segredos desta terra e a
contá-los em forma de cachaça. Que o
apreciador não espere, depois de beber
algumas doses, descobrir confidências
íntimas de personagens consagrados
da região como Ana Jacinta de São José
(a Dona Beja) nem as propriedades das
águas medicinais do lugar. Mas poderá
apreciar o sabor suave de uma cachaça
envelhecida em carvalho e que carrega
um pouco da história da família. Pauli-
no Chicrala lembra-se do tempo em que
ficava na fazenda do seu avô, quando
menino, vendo o preparo da rapadura.
“Meu avô Chicrala Miguel Elias veio para
o Brasil em 1907, do Líbano, descenden-
te de uma família muito tradicional que
raramente consumia bebida alcoólica.
Em sua fazenda, havia criação de gado e
produção de café. E claro, a produção de
melado para a rapadura”.
O gosto pelas coisas do campo fi-
cou marcado em Paulino, que resolveu,
em 1998, iniciar uma atividade rural na
fazenda Asa Branca. “Tenho essa pro-
priedade bem próxima a Araxá. Pen-
sando em torná-la produtiva, analisei
várias opções desde cogumelo, avicul-
tura e pupunha até produção de leite. A
cachaça era um produto relativamente
marginalizado, mas já começava a dar
os primeiros passos para tornar-se uma
bebida refinada e apreciada pelos mais
exigentes degustadores”.
Como a região do Alto Paranaíba é
marcada por um clima bem equilibra-
do, altitude apropriada para o cultivo
da cana-de-açúcar e conta com água
de primeira qualidade, Paulino decidiu
investir na cachaça. Junto com a família
iniciou o plantio do canavial e construiu
um alambique adequado aos padrões
técnicos, com dornas, serpentinas e
tubulações de aço inox, o que facilita
a higienização de todo o equipamen-
to; filtros para retirada de resíduos de
cobre; alambique aquecido a vapor e
envazadora. Em 1998, foi produzida a
primeira safra, de cerca de 20 mil litros,
da marca Segredo de Araxá.
“Fazer cachaça é um processo sim-
ples, é necessário ter disciplina, higiene
“A cachaça era um produto relativamente marginalizado, mas já começava a dar os primeiros passos para tornar-se uma bebida refinada e apreciada pelos mais exigentes degustadores”.Paulino Correa Chicrala, produtor das cachaças Segredo de Araxá e Carnaval
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e estar envolvido com o negócio. Digo
sempre que higiene, manejo e equipa-
mentos adequados são parte do segre-
do da boa cachaça artesanal”, afirma
Paulino. O produtor conta que apren-
deu a produzir cachaça sozinho. Auto-
didata, visitou inúmeros alambiques,
conversou com especialistas da área,
leu livros sobre o assunto e, o principal,
colocou a mão na massa.
Embora tenha aprendido sozinho a
maior parte do processo, Paulino garan-
te que a produção da Segredo de Araxá
respeita todas as normas técnicas. Ali na
Fazenda Asa Branca, de 48 hectares, ro-
deada por flora nativa de cerrado, com
exemplares de jatobá, ipê, cedro, angico
e pau-ferro, o visitante vai encontrar o
cuidado com o fabrico da cachaça arte-
sanal em harmonia com o meio ambien-
te. Dentre as ações sustentáveis, mere-
cem destaque a redução da queima de
lenha substituída pelo bagaço na caldei-
ra; a utilização das pontas da cana para
alimentar o gado; o aproveitamento do
vinhoto na irrigação do canavial e o rea-
proveitamento da água.
A Segredo de Araxá obteve o selo or-
gânico do Instituto Mineiro de Agropecu-
ária (IMA) em 2009 devido aos procedi-
mentos sustentáveis, como o manejo do
canavial e a não utilização de agrotóxico.
“Cerquei toda a fazenda com mata nativa
e tenho 30 pés de bálsamo de refloresta-
mento. Também preservo duas nascentes
dentro da propriedade”, relata Paulino.
Certificada pelo Inmetro em abril de
2009, o que atestou os processos de
moagem, fermentação e destilação a
vapor, a Segredo de Araxá é envelhecida
durante seis anos em barris de carva-
lho, em um ambiente com temperatu-
ra, luminosidade e umidade adequadas.
O resultado, segundo Paulino Chicrala,
é uma bebida suave, aromática e com
teor alcoólico de 40%. Outro destaque
da Segredo de Araxá é a baixa acidez,
em torno de 0,63g por 100ml de álcool
anidro. É um valor relativamente baixo,
já que o Ministério da Agricultura, Pecu-
ária e Abastecimento estabelece teor de
acidez máximo de até 0,100g por 100ml
de álcool anidro.
A cachaça Segredo de Araxá é vendi-
da atualmente em Minas Gerais, Distrito
Federal, Rio de Janeiro, São Paulo, Para-
Região do Alto Paranaíba
é marcada por clima equilibrado e altitude apropriada para
o cultivo da cana-de-açúcar
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ficHa tÉcNicaCidade: AraxáRegião: Alto ParanaíbaProdutor: Paulino Chicrala,
Chicrala Agroindustrial Ltda.(34) 9105-6674 Início da produção: 1999Volume anual de produção: 50 mil litros por anoTeor alcoólico: 40%Envelhecimento: quatro e seis anos em carvalho
(Segredo de Araxá) e dois anos em jequitibá (Carnaval)
ná, Ceará, Bahia, Mato Grosso do Sul,
Mato Grosso, Goiás e Amazonas. De
acordo com Paulino Chicrala, desde o
começo da produção a bebida tem sido
vendida para distribuidores, e também
via telefone e internet.
O produtor, porém, critica a atuação
do governo em virtude da alta tributa-
ção e da falta de ações para a valori-
zação da cachaça artesanal. Apesar de
os produtores de cachaça terem sido
excluídos do Simples, ficando sujeitos,
por exemplo, a pagar IPI de R$ 2,90 por
garrafa, reduzindo a competitividade do
produto, Paulino não pensa em parar,
em razão dos investimentos já realiza-
dos. “Estamos desenvolvendo ações
visando a ampliar o nosso espaço no
mercado”, ressalta.
O produtor tem investido nos úl-
timos anos na exportação da Segredo
de Araxá. Ele participa do consórcio
ConBrasil Cachaça Export com foco no
mercado norte-americano, que reúne
um produtor de São Joaquim de Bicas
(cachaça Ilha Grande), um produtor de
Coluna, do norte de Minas (cachaça
Coluninha) e a sua marca de Araxá. Os
três têm selo orgânico do IMA, pois não
fazem uso de agrotóxicos no plantio da
cana e tampouco no processo de pro-
dução da cachaça. “Já fizemos três ex-
portações para os EUA, em 2004, 2006
e 2007, com o volume aproximado de 6
mil litros. Cada produtor é responsável
por um terço do que é exportado. De-
pois da crise, em 2008 e 2009, aguar-
damos a recuperação do mercado para
voltar a vender”, ressalta. “Meu grande
sonho é a exportação, vender volumes
maiores de uma vez só. A Segredo de
Araxá quer avançar nesse projeto. O
produto exportado passa a ser mais va-
lorizado no mercado interno”.
Para o consumidor que visita a Fa-
zenda Asa Branca, em Araxá, o alambi-
que oferece um atrativo diferente para
o fã de uma boa caninha. O produtor
Paulino Chicrala armazenou a cachaça
Segredo de Araxá em vários tipos de
madeira. Dessa forma, o visitante pode
degustar a cachaça envelhecida em to-
néis de umburana, ipê, bálsamo, amen-
doim, garapa, freijó, carvalho, jequitibá,
jatobá e castanheira. “A ideia é que o
visitante possa provar o destilado em
diferentes madeiras. A de que ele gostar
mais, ele leva”, brinca.
A Chicrala Agroindustrial Ltda., ra-
zão social da fazenda, também lançou
em 2004 a cachaça Carnaval, destinada
ao mercado externo. A marca também
foi certificada pelo Inmetro. “Quando
fui escolher o nome, pensei numa mar-
ca que representasse bem o Brasil, por
isso escolhi Carnaval, a maior festa po-
pular brasileira, conhecida internacio-
nalmente”. A Carnaval é comercializada
na versão ouro, envelhecida por quatro
anos em barris de carvalho; e na versão
prata, envelhecida por dois anos em
barris de jequitibá.
70
Branquinha nasce granfina
E ra princípio da década de 1940,
quando Vinícius Augusto da
Silva, de apenas 15 anos, cos-
tumava deixar a Fazenda de Coração de
Jesus, no município de Claro dos Poções,
norte de Minas, montado em lombo de
burro na companhia de outros tropeiros
para levar a tal da Granfina a Jequitaí e
outras cidades da região. Em cada via-
gem, a comitiva levava duas bimbarras
de 40 litros cada no lombo do animal.
A bebida, vendida a granel, abastecia as
feiras e mercados, de Jequitaí a Montes
Claros. “Com o tempo, passamos a fa-
zer venda contratada”, relembra seu Vi-
nícius, hoje com 84 anos e produtor da
cachaça Branquinha de Minas.
O antigo tropeiro, hoje produtor, co-
meçou cedo a descobrir os segredos dos
alambiques. Ainda adolescente passou
a trabalhar na fazenda do tio Dermeval
Santos Silva, comerciante pioneiro que
percebeu a demanda por aguardente em
sua venda, em Água Boa (atual distrito
de Vista Alegre), e a escassez do produ-
to por ali. Naquela época, o tio decidiu
produzir a própria cachaça, a Granfina. O
comerciante contratou Manoel Pessoa,
um alambiqueiro “dos bons” de Salinas,
e o levou para a Fazenda Coração de Je-
sus. Em pouco tempo, Dermeval passou
a vender a bebida no balcão e, posterior-
mente, em toda a região.
Seu Vinícius guarda até hoje boas
lembranças da Fazenda Coração de Je-
sus. Pois foi lá que, além de aprender
a ser vaqueiro, arrieiro e administrador,
conheceu a menina Maria de Lourdes,
filha do tio Dermeval. “Vixe, não tirava
os olhos dela. Digo que ela me comprou
pra eu trabalhar pro pai dela. Quando
a gente se casou ela não tinha 17 anos
ainda”, lembra-se. Nos tempos da tro-
pa, seu Vinícius partia de Vista Alegre
para Montes Claros, numa viagem de 10
léguas – cerca de 65 quilômetros. Ele
e a comitiva faziam o caminho em três
marchas ou pousos fixos, como se cos-
tuma dizer – em Felício Alves, Atoleiro
e Montes Claros. Depois, voltavam com
carga de feijão, arroz e outros utensí-
lios. “A Granfina ficou muito afamada na
época, foi a cachaça boa que apareceu
na nossa região. Lembro que até em Pi-
rapora o povo consumia a cachaça do
tio Dermeval”, relata. A bebida era tão
boa que, vez ou outra, o guia da tropa
não resistia aos atributos da Granfina.
“O Raimundo Preto fazia um canudo
com talo de mamoeiro e ficava por ali;
“A Branquinha de Minas busca unir a tradição dos alambiqueiros da época do meu avô Dermeval com a tecnologia e a qualidade deste novo tempo”Antônio Augusto da Silva, produtor das cachaças Branquinha de Minas e Branca de Minas
BimBarra
Bras. MG Pipote grande para conduzir cachaça. Fonte: Novo Aurélio - O Dicionário da Língua Portuguesa - Século XXI. Editora Nova Fronteira, 3ª edição, 1999.
lÉgua
Antiga unidade brasileira de medida itinerária, equivalente a 3.000 braças, ou seja, 6.600m; légua brasileira. Fonte: Novo Aurélio - O Dicionário da Língua Portugue-sa - Século XXI. Editora Nova Fronteira, 3ª edição, 1999.
72
mineira. Marcelo percebeu a necessidade
de expandir o negócio; ele então com-
prou novo maquinário, fez treinamentos,
tudo para alcançar um outro padrão de
qualidade”, explica Antônio Augusto da
Silva, filho de seu Vinícius e neto de seu
Dermeval. “O tio Marcelo resolveu vender
a cachaça somente engarrafada, deixando
de comercializá-la em barril, o que é uma
forma tradicional lá na região de Montes
Claros. A fazenda acabou perdendo di-
nheiro e teve que voltar a vender a granel
para o público local”, afirma.
Um novo marco na história da Fazen-
da Coração de Jesus foi iniciado em 2003,
quando uma nova geração da família ad-
quiriu a Granfina e a transformou na In-
dústria Cachaça Água Boa Ltda. Antônio
Augusto da Silva passou a ser o diretor.
Uma das primeiras decisões foi o regis-
tro da marca. “Quando fomos procurar
o órgão responsável, descobrimos que
a Granfina já havia sido registrada. Fica-
mos muito tristes, porque tínhamos mais
de 50 anos de história com a marca”. Por
uma peça do destino, a Granfina aposen-
tou-se, sendo substituída pela Branqui-
nha de Minas. “É um sinônimo de cacha-
ça. A gente normalmente diz: desce uma
branquinha aí!”, explica o diretor.
Além da mudança do nome, os ges-
tores resolveram modernizar o restante
do processo produtivo da fazenda, tudo
quando a gente se entretinha, ele metia
o canudo na bimbarra e se esbaldava na
nossa cachaça”, conta seu Vinícius.
O pioneirismo da cachaça Granfina
naquela região de Vista Alegre, Jequitaí e
Montes Claros contou com a ajuda dos
filhos de Dermeval dos Santos Silva. Em
meados da década de 1980, o filho Mar-
celo dos Santos Reis assumiu a gestão da
fazenda e buscou modernizar a produção
do alambique, visando a melhorar ainda
mais a marca. “Essa época coincide com
a criação da Ampaq e com todo aquele
movimento de valorização da cachaça
Seu Vinícius e Antônio Augusto da Silva colocaram Claro dos Poções no roteiro das cachaças de qualidade
73
para colocar a cachaça de Claro dos Po-
ções no roteiro das cachaças de quali-
dade. “A nossa ideia era dar um caráter
mais profissional à produção na Fazen-
da Coração de Jesus. Compramos novas
máquinas, passamos a fazer análises
químicas regularmente, como também a
ter maior cuidado com a matéria-prima
e a higiene. A limpeza é fundamental na
fabricação da cachaça”, afirma Antônio
Augusto. As mudanças em busca de qua-
lidade resultaram na obtenção, em 2009,
do selo de qualidade Inmetro, vinculado
ao Programa Nacional de Certificação da
Cachaça (PNCC), ação do Sebrae Nacio-
nal, Inmetro e Ministério da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento (Mapa). “Nós
já havíamos feito muitas mudanças es-
truturais em 2003, por esse motivo ti-
vemos somente que redefinir normas
de trabalho e registrar as tarefas diárias
para receber a certificação”.
A principal mudança com a certi-
ficação é a ênfase na qualidade, me-
lhorando-se ainda a produtividade e
reduzindo-se o nível de perda de ma-
teriais, como o fermento. Há também
maior controle dos padrões de acidez,
de teor alcoólico e da composição quí-
mica. Além do padrão de qualidade do
produto, a certificação possibilitou à
Branquinha de Minas um aumento de
produção da ordem de 30%.
Atualmente, a Indústria Cachaça
Água Boa Ltda. consegue vender 80% da
produção anual no norte de Minas, Re-
gião Metropolitana de Belo Horizonte, e
nos estados de São Paulo, Rio de Janei-
ro, Mato Grosso, Rio Grande do Norte,
Bahia e Rio Grande do Sul. A principal
forma de comercialização da marca tem
sido por meio de distribuidores, além da
venda direta. Entre as ações de divulga-
ção, destaca-se a participação em feiras
do setor como a Feira e Festival Inter-
nacional da Cachaça (ExpoCachaça) e a
Feira do Food Service em Minas Gerais
(Technobar). De acordo com o produtor
Antônio Augusto, a previsão é ampliar a
produção da Fazenda Coração de Jesus
nos próximos anos, alcançando o volu-
me estimado de 300 mil litros.
A cachaça Branquinha de Minas tem
teor alcoólico de 38%, com coloração
dourada após envelhecimento em bar-
ris de castanheira-do-pará durante dois
anos. É uma aguardente suave, com
baixo teor de acidez, resultado do con-
trole de todo o processo de produção.
“A Branquinha de Minas busca unir a
tradição dos alambiqueiros da época do
meu avô Dermeval com a tecnologia e a
qualidade deste novo tempo. Tudo para
que a cachacinha desça suave e praze-
rosa. E que não traga consequências no
outro dia”, brinca Antônio.
ficHa tÉcNicaCidade: Claro dos PoçõesRegião: Norte de MinasProdutor: Antônio Augusto da Silva, Indústria
Cachaça Água Boa Ltda.(31) 3241-1965 Início da produção: 1940Volume: 100 mil litros por anoTeor alcoólico: 38% Envelhecimento: um a dois anos em barril de casta-
nheira-do-pará
74
A marca da brasilidade
A Verde Amarela faz parte do grupo
de cachaças artesanais fabricadas
por uma nova geração de produ-
tores de Minas que têm investido, desde o
princípio, em qualidade técnica e na profis-
sionalização do setor para inserir o destila-
do de cana-de-açúcar no mercado mundial.
A história da marca começa em 2002 quan-
do os irmãos Wellington Braga Júnior e Mile-
na Braga resolvem montar um engenho nas
terras da família em Marilac, no Vale do Rio
Doce. A ideia era aproveitar parte dos 210
hectares da fazenda Alvorada, tradicional
produtora de leite na macrorregião de Go-
vernador Valadares, para o fabrico de aguar-
dente. “O meu pai Wellington Braga é pro-
dutor de leite há mais de 20 anos na região,
e nós queríamos diversificar os negócios da
fazenda. Naquela época a cachaça estava
sendo muito valorizada e consumida pelas
classes A e B. Sabíamos que, além do inves-
timento inicial, tínhamos de trabalhar pela
qualidade do produto”, conta Milena Braga.
Mas, antes de começar o plantio da cana e
a construção do alambique, os irmãos bus-
caram conhecimento com o curso de Pós-
Graduação em Tecnologia da Cachaça, pela
Universidade Federal de Lavras; e o Curso
de Mestre Alambiqueiro, no Centro de Tec-
nologia da Cachaça (CTC) em Itaverava, com
os engenheiros José Carlos Ribeiro e Arnal-
do Ribeiro. Na montagem do engenho da
Verde Amarela, destaque para as dornas e
tubulações de aço inox, decantador e filtros
para retirada de impurezas, envazadora com
capacidade para 800 garrafas por dia; e ade-
ga com 150 barris de carvalho de 200 litros
cada, três tonéis de jequitibá-rosa de 20 mil
litros cada e mais três dornas de recepção
de aço inox de 20 mil litros cada.
Com capacidade produtiva anual de 60
mil litros, a Verde Amarela é vendida desde
2005 na versão ouro (um blend envelhecido
durante um ano em carvalho e mais um ano
em jequitibá rosa) e na versão prata (armaze-
nado nas dornas de recepção de aço inox).
Wellington Júnior explica que a escolha do
blend foi uma estratégia para a comercializa-
ção da marca. “Nós queríamos oferecer uma
cachaça diferenciada para o mercado. Por
isso optamos pelo envelhecimento em duas
madeiras, o que resultou num paladar úni-
co”. A qualidade técnica também está pre-
sente no engenho da Fazenda Alvorada, co-
meçando pelo controle rigoroso da higiene,
com assepsia diária das dornas e tubulações
de inox feita por vapor; lavagem semanal do
alambique e limpeza da caldeira a cada três
dias. As análises químicas são feitas regular-
mente para manter o teor de acidez e teor
“Nós queríamos oferecer uma cachaça diferenciada para o mercado. Por isso optamos pelo envelhecimento em duas madeiras, o que resultou num paladar único.”Wellington Braga Júnior, produtor da cachaça Verde Amarela
76
de cobre como estabelecido pelo Minis-
tério da Agricultura, Pecuária e Abasteci-
mento (Mapa). A graduação alcoólica da
Verde Amarela é de 40 GL.
Na parte ambiental, o engenho da fa-
mília Braga é responsável pelo reaprovei-
tamento dos recursos hídricos de mais
de 80%, sendo que a água usada no res-
friamento do alambique é encaminhada
para um tanque e misturada com o vi-
nhoto, e dali bombeada para a lavoura
e piquetes para alimentar o gado. Além
disso, o bagaço gerado pela moagem da
cana vai para a caldeira e também serve
como adubo natural.
Os produtores da cachaça Verde Ama-
rela vendem a bebida no próprio Vale do
Rio Doce, na Região Metropolitana de
Belo Horizonte, e nos estados de São
Paulo, Rio de Janeiro e Bahia. De acordo
com o produtor Wellington Braga Júnior,
a venda é o maior desafio do setor de-
vido à alta tributação e à informalidade.
“Na nossa região do Vale do Rio Doce,
devem existir mais de 100 alambiques
informais e o produtor que está dentro
de todos os padrões técnicos e legaliza-
do tem de competir com esse pessoal. O
que atrapalha o mercado da cachaça é a
informalidade”, argumenta.
Para reverter esse quadro, os irmãos
têm investido em várias estratégias para
a consolidação da Verde Amarela no
mercado: participação em feiras – Fei-
ra e Festival Internacional da Cachaça
(ExpoCachaça) e feiras agropecuárias
ficHa tÉcNicaCidade: Marilac Região: Vale do Rio DoceProdutor: Oliveira Braga Indústria e Comércio
de Bebidas(33) 9979-1171 Início da produção: 2005Volume de produção: 60 mil litros por anoTeor alcoólico: 40%Envelhecimento: Dois anos em carvalho e jequitibá
(Verde Amarela Ouro). Armazena-mento em dornas de inox durante um ano (Verde Amarela Prata)
de Governador Valadares –, venda di-
reta por meio do site, negociação com
distribuidores de São Paulo e Rio de Ja-
neiro, e diversificação do produto – a
cachaça é vendida em embalagens di-
ferenciadas, como estojos de madeira,
kits personalizados para presente e ró-
tulos temáticos. Uma ação que deu cer-
to foi a venda dos garrafões de 15 litros
da Verde Amarela em bares e restauran-
tes de Governador Valadares. “Nós faze-
mos parcerias com os proprietários dos
estabelecimentos, deixando a cachaça
consignada; apenas quando o públi-
co consome é que recebemos. Porém,
também estamos fazendo marketing di-
reto na nossa região”, afirma Milena. No
caso do mercado externo, a Verde Ama-
rela já exportou duas remessas para os
EUA. Idealizada para ser uma cachaça
símbolo da cultura do Brasil, a Verde
Amarela também explora o quesito
brasilidade. Nos últimos anos, sempre
que ocorre um evento esportivo maior
como os Jogos Olímpicos e a Copa do
Mundo, os produtores aproveitam e
buscam soluções criativas para ampliar
as vendas. Em 2010, as garrafas estão
sendo vendidas com uma bandeira do
Brasil presa ao gargalo, contendo uma
receita de coquetel ou uma informação
sobre a Copa. “Queremos aproveitar os
bons momentos para tentar novas ex-
portações; e a Copa de 2014 será no
Brasil, o que dará visibilidade ao país”,
diz Milena.
77
O canto do Uirapuru chega à China
Uirapuru é um pássaro raro
que contagia toda a floresta
quando começa a cantar. A
lenda sobre a ave inspirou os irmãos
pecuaristas Adalto e Geraldo Pinto no
batismo da cachaça que produzem no
Vale do Rio Doce. Eles procuravam um
nome-marca que simbolizasse o Brasil e
pudesse ter boa circulação no exterior.
“Diz a lenda que quem ouvir o canto
desse pássaro viverá feliz para sempre.
Uma dose da Uirapuru é garantia de fe-
licidade eterna”, brinca Adalto.
A história da cachaça Uirapuru teve
seu início em 1992 quando o pai, seu
João Batista de Andrade, resolveu com-
prar um pequeno alambique para pro-
duzir a própria cachaça na fazenda Vista
Nova, localizada no distrito de Córrego
dos Rodrigues, em São Geraldo da Pie-
dade. Com experiência de muitos anos
na criação de gado leiteiro e de corte,
ele queria fabricar aguardente seguindo
a receita dos parentes alambiqueiros de
Guanhães. Ele e os filhos, Adalto e Ge-
raldo, fizeram o plantio da cana, monta-
ram a sala de fermentação, compraram o
maquinário para moenda e começaram
a produção. O problema é que a receita
não dava certo. “Meu pai queria fazer a
cachaça artesanal igual à da família. Mas
no início, ele teve dificuldade de acertar
a padronização da garapa e o fermento
não trabalhava direito”, conta Adalto.
Ao longo de uma década, Adalto e
Geraldo Andrade, após grande aprendi-
zado e já com experiência, resolveram
montar uma estrutura completa de en-
genho, até colocar no mercado as pri-
meiras garrafas com as marcas Uirapuru
e Expresso Cana, que passaram a ser
comercializadas em Governador Valada-
res e região. Foi então que perceberam
o potencial de mercado da cachaça, que
se transformou num negócio lucrativo.
Fizeram o curso de Tecnologia e Pro-
dução de Cachaça em Guanhães e, em
2002, registraram as marcas Uirapuru e
Expresso Cana. No mesmo ano, surgiu
a oportunidade da primeira exporta-
ção e para um mercado pouco comum
aos produtores de aguardente, a China.
“Mandamos dois contêineres para os
chineses, cerca de mil caixas, num total
de 12 mil garrafas”, conta Adalto.
Depois do negócio, os irmãos no-
taram que investir em qualidade repre-
sentava o principal diferencial para uma
marca conquistar espaço no mercado.
Eles então fizeram as últimas adequa-
“Diz a lenda que quem ouvir o canto desse pássaro viverá feliz para sempre. Uma dose da Uirapuru é garantia de felicidade eterna” Adalto Andrade, produtor da cachaça Uirapuru
Além da área destinada ao cultivo de cana e à produção de cachaça, a fazenda Vista Nova possui uma reserva legal de 40 hectares e uma mata nativa
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UIR
AP
UR
U
79
ções na estrutura da fazenda Vista Nova
para colocar a Uirapuru na linha de fren-
te das cachaças artesanais de qualidade.
Hoje o engenho conta com três alambi-
ques, dornas de aço inox para fermen-
tação, envazadora e uma adega com
capacidade para 85 mil litros, composta
de dois tonéis de 20 mil litros cada de
jequitibá-rosa, um tonel de 20 mil litros
de cerejeira, um tonel de 20 mil litros de
grápia, e um menor de 5 mil litros de car-
valho brasileiro. Além disso, o processo
de fermentação é todo natural, e o plan-
tio da cana sem agrotóxicos.
A empresa Andrade Agroindústria,
responsável pela marca Uirapuru, tam-
bém investe em ações ambientais. Fora
o reaproveitamento dos resíduos da pro-
dução – o vinhoto é usado para irrigar a
lavoura de cana, e o bagaço vai para a
caldeira –, a fazenda Vista Nova possui
uma reserva legal de 40 hectares e mais
uma mata nativa de três hectares, com
espécies como peroba, angico, sapucaia
e sucupira. Existem também seis nascen-
tes protegidas. Na área de 200 hectares,
pouco mais de 30% são destinados ao
plantio de cana, e outra parte é usada
para a criação e pastagem das 350 cabe-
ças de gado da raça mestiço holandês,
que produzem 450 litros de leite por dia.
Com produção anual de 180 mil litros
de cachaça, sendo 80 mil da Uirapuru
ficHa tÉcNicaCidade: São Geraldo da PiedadeRegião: Vale do Rio DoceProdutor: Andrade Agroindústria Ltda.(33) 3277-7308 e (33) 9989-4570 Início da produção: 2002Volume: 180 mil litros por anoTeor alcoólico: 40% Envelhecimento: seis meses a um ano em carvalho,
jequitibá e cerejeira (Uirapuru Ama-rela) e grápia (Uirapuru Prata)
e 100 mil da Expresso Cana, os irmãos
Adalto e Geraldo Andrade transformaram
o alambique no carro-chefe da fazenda.
Adalto Andrade explica que o volume
total da safra é comercializado hoje no
Vale do Rio Doce, na Região Metropolita-
na de Belo Horizonte, e nos estados de
São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco
e Bahia. Em 2005, a Uirapuru recebeu o
convite do Sebrae para participar de uma
feira em Recife; lá os produtores firma-
ram parceria com um representante local
e passaram a vender para o Nordeste.
No mesmo ano, a Andrade Agroindústria
se associou ao Sindicato das Indústrias
de Cerveja e Bebidas em Geral do Estado
de Minas Gerais (Sindbebidas), que tem
fornecido informações e suporte técnico
à empresa, além de ajudar em ações de
divulgação da marca.
O investimento dos irmãos Andrade
na estrutura técnica do alambique e na
qualidade da cachaça Uirapuru foi reco-
nhecido, em 2009, com os certificados
do Instituto Mineiro de Agropecuária
(IMA) e do Inmetro, este último pelo Pro-
grama Nacional de Certificação da Ca-
chaça (PNCC). “Quando o mercado co-
meçar a exigir produtos certificados para
a comercialização, vamos ver um aumen-
to de qualidade da cachaça artesanal. E
quem saiu na frente como a Uirapuru, vai
beber água limpa”, garante Adalto.
80
Flores de sucesso brotam em Salinas
As folhas da tabua, erva aquáti-
ca da família das tifáceas, são
usadas por artesãos para tecer
esteiras e cestos, podendo também dar
celulose de papel. Por feliz coincidên-
cia, Tabúa se tornou o nome de uma das
cachaças artesanais mais festejadas de
Minas, não por acaso produzida
na fazenda de mesmo nome.
A aguardente tem sua
produção comandada
por José Lucas Men-
des de Oliveira. For-
mado em Filosofia
e pós-graduado em
Bioética e Adminis-
tração Hospitalar, ele
começou a produção
muito cedo, influencia-
do pelo pai e pelo avô,
em Salinas, sua terra natal.
Em 2003, resolveu criar a pró-
pria marca e formou sociedade
com o sogro, César Portela. Para sobres-
sair num mercado tão concorrido, ado-
tou uma receita simples: “Temos um bom
produto, uma empresa sólida e transpa-
rente, com objetivo claro”.
Para José Lucas, o apoio do Sebrae
é muito importante para o sucesso do
“Temos um bom produto, uma empresa sólida e transparente, com objetivo claro.” José Lucas Mendes de Oliveira, produtor da cachaça Tabúa
produto, que foi destacado com o selo
do Inmetro. “Essa parceria nos coloca
diante da realidade de que somos uma
empresa, e nos faz pensar com os pés
no chão. Além disso, nos estimula a
conhecer nosso potencial e como colo-
cá-lo em prática”, reconhece, acrescen-
tando que o selo de qualidade
sinaliza que estão no
caminho certo.
No momento,
a empresa inves-
te na divulgação
da marca Ta-
búa, buscando
parcerias com
empresas que
acreditem no
potencial de uma
boa cachaça arte-
sanal. O projeto em-
presarial foi elaborado
sob orientação da Fundação
Estadual do Meio Ambiente de Minas
Gerais (Feam). Antes de iniciar a produ-
ção em escala industrial, os dois sócios
verificaram a profundidade do lençol
freático em suas terras para evitar in-
filtrações que pudessem contaminar a
água da região.
81
ficHa tÉcNicaCidade: Salinas (Taiobeiras)Região: Norte de MinasProdutor: José Lucas Mendes de Oliveira(11) 4021-4822 Início da produção: 2004Volume: 250 mil litros por anoTeor alcoólico: 41%Envelhecimento: Dois anos em tonéis de umburana
(Flor de Ouro 600ml) e cinco anos em bálsamo (Flor de Ouro 700ml) e um ano em tonéis de jequitibá (Flor de Prata)
Também foram mapeadas a malha
hídrica e a afloração de nascentes,
garantindo-se a devida proteção às
matas ciliares da propriedade. A pre-
ocupação ambiental e a consequente
adoção de técnicas da chamada “pro-
dução limpa”, que visam a preservar a
natureza, agregaram valor ao diferen-
cial do produto.
A Tabúa é comercializada com os
rótulos Flor de Ouro e Flor de Prata. O
primeiro se refere a uma cachaça ama-
rela, armazenada por dois anos em to-
néis de umburana (600ml) e cinco anos
em bálsamo (700ml). O segundo apre-
senta uma aguardente branca e mais
suave, guardada em tonéis de jequitibá,
sendo ideal para caipirinhas, batidas e
coquetéis em geral.
As duas cachaças foram destaque no
Circuito Brasileiro de Jet Ski, em Cabo
Frio (RJ) e Itanhaém (SP). Também par-
ticiparam da feira da Associação Brasi-
leira de Supermercados Portal (Abras),
no Rio de Janeiro, e da 42ª Equipotel,
o maior evento de hotelaria e gastro-
nomia da América Latina, realizado em
São Paulo. A fábrica tem financiamen-
tos do Banco do Brasil e cobertura da
Seguradora Brasileira de Crédito à Ex-
portação (SBCE), já que seus produtos
visam também o mercado externo.
DIV
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TA
Bú
A
viagem litográfica
Coleção Lotus Lobo, 85
Coleção José Maurílio Silva, 108
83
84
85
As reproduções de rótulos de cachaça apresen-
tadas nesta parte integram a coleção da artista
plástica Lotus Lobo, uma das mais importan-
tes litógrafas do país, referência na arte contemporânea
brasileira. São 89 rótulos de cachaças produzidas em
Minas, sobretudo nos anos 40 e 50, e que integram um
acervo composto por quase 500 exemplares de peças
originais impressas na Litografia e Estamparia União In-
dustrial, da cidade mineira de Juiz de Fora.
A maior parte do acervo é de autoria do alemão Gui-
lherme Rüdiger. Nascido em Nürenberg, em 1887, ele
se formou como técnico em desenho para litografia e
se mudou para o Brasil aos 26 anos, fixando residência
em Juiz de Fora. Rüdiger trabalhou na União Industrial,
de 1918 a 1966, quando foi decretada a falência da em-
presa. Lotus o conheceu três anos depois, quando ele
preparava uma exposição. Em 1977, a artista plástica
recebeu de suas mãos a coleção que integrava seu ál-
bum de trabalhos, produzidos ao longo de décadas.
Nesta coleção, há raridades que permitem acompa-
nhar visualmente uma parte da história da bebida em
Minas, como exemplares produzidos nos chamados ci-
clos de Ponte Nova, Januária e Curvelo: Tentadora, Ver-
gonha, Cascata, Dominante, Januarense, Januária, Porto
Januária, Correinha, Excelsior, Florisbella, Marcolina e
Sarobá. A riqueza do acervo está, também, na diver-
sidade, incluindo litografias de cachaças alambicadas
em mais de 35 cidades e distritos, no tempo em que
Bambuhy e Dôres do Indayá eram grafadas com “y”, La-
fayette dobrava o “t” e Sete Lagôas usava chapéu.
Em torno de 20% do acervo são de rótulos de ca-
chaças produzidas na região da Zona da Mata, não só
em razão da localização da indústria onde Rüdiger tra-
balhava, mas justificada também pela concentração de
muitos engenhos na região. Números do Anuário Estatís-
tico de Minas Gerais para os anos de 1922/25, levantados
pelo professor Marcelo Magalhães Godoy no estudo No
país das minas de ouro a paisagem vertia engenhos de cana e
casas de negócio, revelam que a Zona da Mata apresentava
o maior número de engenhos no período, 8.504 ou 26%
do total de unidades em Minas.
Coleção Lotus Lobo
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8787
88
89
90
91
9292
93
94
95
96
97
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99
100
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102
103
104
105
106
107
108
109
Em Curvelo, encontramos esta rara coleção do funcio-
nário público aposentado José Maurílio Silva. Em dois
cadernos antigos, ele preserva mais de mil rótulos de
cachaças, produzidas em diversos estados brasileiros em várias
décadas do século XX. José Maurílio iniciou a coleção há mais
de 30 anos, motivado pela concentração de inúmeros produto-
res e engarrafadores da bebida na região. Ele costumava visitar
as empresas e comprar as peças dos lavadores de garrafa, que
tinham prática em descolar os rótulos sem prejudicá-los.
Nesta edição, uma amostra de rótulos temáticos e curiosos
de todas as regiões de Minas. De Paraopeba, a Alterosa e a
Lambadinha, duas raridades. A última é o exemplar mais raro,
da época em que o colecionador tinha apenas 12 anos, ou
seja, nos anos 1950. O cinema é homenageado pela cachaça
E O Vento Levou (Curvelo) ou Luzes da Ribalta (Contria). Na
coleção, há também nomes e expressões pitorescas como Vin-
gança (Leopoldina), Chica Brava (Pedro Leopoldo), Alegria de
Pobre (Além Paraíba), Leite de Onça (Governador Valadares),
Perna Bamba (Bom Despacho), Chora no Copo (Uberlândia),
Chiquita Bacana (São João Del Rei), Canelinha (Pará de Minas)
e Gangorra (Jequiri).
Pela coleção desfilam ainda o Al Capone de Itaverava, o JK de
Uberlândia, a Luana de Alfenas, a Maria Bonita de Descoberto, a
Gilda de Machado, a Princesa do Egito, de Betim, e a Rainha do
Sertão, de Itabirito. São ao todo 66 exemplares que mostram a
diversidade da arte da rotulagem.
Coleção José Maurílio Silva
110
111
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113
114
115
116
117
118
119
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127
128
129
de salinas aPoço fundo
SALINAS
Um mar de aguardente, 133
ARAçUAí
O rio das araras grandes, 157
POçO FUNDO
Da Roseira de Paiolinho a Colinas do Sul, 165
131
A cidade produz 5 milhões de litros de cachaça todo ano
133
Um mar de aguardente
S alinas, no Norte de Minas, tem
tanta cachaça que se os donos de
alambiques da região abrissem os
tonéis de uma só vez, o sertão viraria um
mar de aguardente. Parece exagero, mas
todo ano eles produzem em torno de 5 mi-
lhões de litros do destilado orgânico e arte-
sanal. O produto é responsável pela maior
parte do ICMS do município.
A terra e o clima da região são adequa-
dos à produção de cana de boa qualidade,
matéria-prima das melhores aguardentes.
Destacam-se no município 25 produtores
que integram a Associação dos Produtores
Artesanais de Cachaça de Salinas (APACS),
donos de 51 marcas de sucesso. Outros
109 produtores, também ligados à entida-
de, formam a Coopercachaça, cooperativa
da agricultura familiar responsável pelo blend
da aguardente Terra de Ouro. A marca abriga
dois tipos da bebida, sendo um envelhecido
em tonéis de bálsamo e outro ideal para cai-
pirinhas e coquetéis.
A maioria dos alambiques de Salinas é
registrada no Ministério da Agricultura e os
proprietários contam com o apoio do Se-
brae-MG num projeto que visa a melhorar o
controle de qualidade e a comercialização
da cachaça. A exemplo dos fabricantes do
Vale dos Vinhedos, no Rio Grande do Sul, os
salinenses entraram, em 2009, com um pe-
dido de Indicação Geográfica de Procedên-
cia da região de Salinas, no Instituto Nacio-
nal de Propriedade Industrial (INPI).
A persistência em garantir o padrão da
bebida fez com que a produção de cachaça
se tornasse a segunda atividade em fatura-
mento no município. A região ainda produz
leite e carne de sol, e também se destaca
pela diversidade e criatividade do seu arte-
sanato. Boa parte da mão de obra local tra-
balha em alambiques e plantações de cana.
A aguardente ícone é a Havana (hoje Anísio
Santiago), criada na década de 1940 e reco-
nhecida como Patrimônio Cultural Imaterial
da cidade. A bebida costuma figurar entre
as primeiras posições nas classificações de
tradicionais publicações brasileiras e é con-
siderada a melhor cachaça envelhecida do
Brasil por alguns especialistas.
salinas
indiCação geográFiCa
O reconhecimento de uma in-dicação geográfica origina-se do esforço de um grupo de produtores ou de prestadores de serviço que se organizam para defender seus pro-dutos ou serviços, motivados por um lucro coletivo. O produto ou o serviço portador de indicação geográfica tem identidade própria e inconfundível. Fonte: Instituto Nacional da Proprie-dade Industrial (INPI).
134
Origem no sal da terra
S alinas tem suas origens em 13
de junho de 1554, quando o
desbravador Francisco Bruzza
Espinosa deixa Porto Seguro, na Bahia,
com destino ao norte de Minas, chegan-
do aos rios Pardo e Jequitinhonha, Serra
das Almas e Itacambira. Em 1663, o ter-
ceiro Conde da Ponte inicia a ocupação
das terras da região.
Na década de 1690, o bandeiran-
te Antônio Luís dos Passos estabele-
ce uma fazenda de criação de gado às
margens do rio Pardo. Conta-se que
ele percorria as terras habitadas pelos
índios Tapuias à procura de jazidas de
sal, produto escasso e muito valorizado
na época, chegando às margens do rio
Salinas. No início do século XVIII, o pri-
meiro aglomerado de casas da região dá
lugar à Comarca do Serro Frio.
Segundo Felisbello Freire, no livro
História Territorial do Brasil, a primeira con-
cessão de sesmaria em Salinas ocorreu
em 16 de janeiro de 1734, em nome do
capitão Inácio de Souza Ferreira, funda-
dor do sítio São José. Numa petição de
5 de abril de 1830, o capitão-mor Theo-
doro de Sá e sua consorte se declararam
donos da fazenda Pé da Serra (Matrona)
e apresentaram escrituras datadas de
1735. Ainda em abril de 1830, a Câmara
Municipal de Minas Novas comunicava
a Sua Majestade Imperial que “o povo
da Fazenda da Salinas ergueu uma casa
de oração sem licença do prelado e sem
provisão imperial em 1828”.
Em 20 de agosto de 1833, o povoado
em torno da capela de Santo Antônio de
Salinas transforma-se no distrito de Rio
Pardo de Minas, que até então perten-
cia a Minas Novas. Na véspera do Natal
de 1838, um recenseamento no arraial
conta apenas 248 habitantes. Em 16 de
maio de 1855, a Lei de número 730 eleva
o distrito à condição de freguesia.
Já em 18 de dezembro de 1880, a Lei
2.725, assinada pelo presidente da pro-
víncia de Minas Gerais, Joaquim José de
Sant’Anna, eleva o antigo arraial à cate-
goria de vila, sendo esta pertencente à
comarca de Grão Mogol. A ela são incor-
porados os distritos de Águas Vermelhas,
Pajaú (Cachoeira de Pajeú), Catinga (Pe-
dra Azul) e, mais tarde, Bom Jardim das
Taiobeiras (Taiobeiras).
Sete anos depois, a Lei 3.485 eleva
a vila à categoria de cidade. O estatuto
do município de Santo Antônio de Sali-
nas é aprovado quatro anos mais tarde
e a comarca é finalmente instalada em
Vila
Povoação de categoria superior à de aldeia ou arraial e inferior à de cidade. Con-junto de pequenas habitações independen-tes, em geral idênticas, e dispostas de modo que formem rua ou praça interior, por via de regra sem caráter de logradouro público. Fonte: Novo Aurélio – O Dicionário da Lín-gua Portuguesa – Século XXI. Editora Nova Fronteira, 3ª edição, 1999.
Freguesia
Povoação, sob o aspecto eclesiástico, o conjunto de paroquianos. Nas cidades e províncias portuguesas, a menor das divi-sões administrativas. Fonte: Novo Aurélio – O Dicionário da Língua Portuguesa – Sé-culo XXI. Editora Nova Fronteira, 3ª edição, 1999.
Iniciativa para conquistar mercados
O Sebrae-MG desenvolve, desde 2005, o Projeto de Comer-
cialização da Cachaça em Salinas e Região. A iniciativa visa a
apoiar a Associação dos Produtores Artesanais de Cachaça de
Salinas (APACS) na identificação de novos mercados e expan-
são das vendas para outros estados e para o exterior. Naquela
época, a região de Salinas produzia 4 milhões de litros de ca-
chaça. A comercialização ainda é o grande desafio, ressalta a
técnica do Sebrae-MG, Kênia Cardoso. Isso porque a cachaça
artesanal made in Minas precisa se impor num cenário no qual
outras bebidas já têm mercado consolidado.
Das plantações de cana ao balcão das lojas, longo é o ca-
minho percorrido pelo produto até o consumidor. Para alcan-
çar sucesso, é preciso ter capricho, conhecimento e profis-
sionalismo para colher bons resultados. Depois de se fazer
um diagnóstico dos canaviais, a primeira meta alcançada pelo
projeto do Sebrae-MG foi o aumento na fabricação de cacha-
ças artesanais na região, importante polo produtor da bebida
que melhor representa o Brasil. Além da qualidade, o destila-
do local passou a se destacar pela quantidade, sendo preciso
criar condições para superar dificuldades comerciais e escoar
a produção.
Formada em Comunicação Social e pós-graduada em Co-
mércio Exterior, Kênia é a técnica responsável pelo projeto,
que já viabilizou a participação dos produtores salinenses em
feiras do setor de bebidas, criando agendas de relacionamen-
to em exposições e encontros de difusão do destilado regional
nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Pernambuco.
Depois dessas iniciativas, a cachaça salinense tem sido en-
contrada em diferentes pontos do país, distribuída ou revendida
por grandes redes, no atacado e no varejo. O objetivo agora é
conquistar novos parceiros para aumentar as vendas.
1892. Em 7 de setembro de 1923, a cida-
de adota o nome de Salinas e empossa
Clemente Medrado Fernandes como pri-
meiro prefeito nomeado.
A cidade tem cerca de 40 mil habi-
tantes e integra um importante polo
de educação regional, tendo na Escola
Agrotécnica Federal o curso de Tecnó-
logo em Produção de Cachaça, primeiro
e único no mundo. O padroeiro dos sa-
linenses é Santo Antônio, festejado em
13 de junho. Não sem motivos, além da
tradicional festa junina, o evento mais
importante do município é o Festival
Mundial da Cachaça.
136
137
A capital da cachaça
A Associação dos Produtores Ar-
tesanais de Cachaça de Salinas
(APACS) teve um papel essencial
na transformação de Salinas em capital
mundial da cachaça. Fundada em 2001,
a APACS congregou os produtores da re-
gião para valorizar e promover a bebida
dentro e fora do estado. A organização
do setor teve o apoio do Sebrae-MG, por
meio da metodologia da Gestão Estraté-
gica Orientada para Resultados (GEOR).
Com ela, os produtores participam de
programas de capacitação e recebem su-
porte técnico na comercialização, na par-
ticipação em feiras e em contatos com
representantes comerciais.
Antes da APACS, a região de Salinas
produzia cerca de 1,5 milhão de litros de
cachaça. A bebida começou a ser produ-
zida com os primeiros fazendeiros que se
estabeleceram na cidade; alguns deles sa-
íram da Bahia no século XIX com cabeças
de gado e escravos para plantar cana no
norte de Minas. A aguardente já gerava
uma receita extra em meados do século
XX. Hoje, a produção de cachaça é a se-
gunda atividade econômica da região.
“Nossa produção se tornou mais or-
ganizada, obedecendo a um único pa-
drão de qualidade. A criação da APACS
também facilitou o aumento de recursos
e o apoio de entidades especializadas
para auxiliar boas práticas de fabrica-
ção”, afirma Eilton Santiago Soares, pro-
dutor da cachaça Canarinha, atual pre-
sidente da entidade. Técnico agrícola e
vereador em Salinas, Eilton se associou
à APACS em 2004. Ao assumir a presi-
dência, em 2006, a associação contava
com apenas 12 associados. Hoje, já são
51 marcas, graças a um trabalho de mo-
bilização e conscientização dos coope-
rados. Segundo ele, além de promover a
união dos produtores, a APACS divulga
Salinas como a principal região produto-
ra de cachaça artesanal do país.
A associação agregou a Cooperca-
chaça, fundada também em 2001 por
109 produtores da agricultura familiar
com o objetivo de melhorar o lucro, ge-
rar trabalho e ajudar na diminuição do
êxodo rural. Os cooperados produzem
a cachaça Terra de Ouro e participaram
do Brazilian Taste Festival, evento gas-
tronômico de promoção de produtos
brasileiros realizado na Alemanha, du-
rante a Copa do Mundo de 2006. Além
da APACS, a cooperativa conta com o
apoio da Câmara de Comércio e Indús-
tria Brasil-Alemanha e da Associação
139
Mineira dos Produtores de Aguardente
de Qualidade (Ampaq).
Para Eilton, os maiores desafios dos
donos de alambiques são a inserção no
mercado internacional e a redução da
carga tributária. A popular caninha ainda
é pouco conhecida fora do país e chega
aos supermercados brasileiros com im-
postos que correspondem até a 83% do
valor da garrafa, segundo dados do Cen-
tro de Referência da Cachaça. Sobrinho
de Anísio Santiago, criador da legendária
cachaça Havana, Eilton acredita que a
obtenção do selo de Indicação Geográ-
fica de Procedência vai garantir um con-
trole ainda maior do produto salinense.
As cachaças de Salinas também ga-
nharão visibilidade com uma nova ini-
ciativa no município, a criação do Mu-
seu da Cachaça. Eilton Soares foi um
dos que mais defenderam a construção
do espaço e seus olhos brilham quando
fala no assunto. “Será um museu dife-
rente, com espaço de lazer, estandes
de venda, exposições permanentes,
auditórios, jardins, sala de degustação,
sala de essências aromáticas, engenho,
moenda e até um canavial de verda-
de”, anuncia. A construção, orçada em
R$ 7 milhões, foi erguida num terreno
de 13.120 metros quadrados no bairro
São Geraldo. Com apoio do governo
estadual, o projeto foi elaborado pela
arquiteta Jô Vasconcelos, tendo 2,2 mil
metros quadrados de área construída.
O presidente da APACS enaltece o
apoio do Sebrae-MG às iniciativas em
prol da cachaça de Salinas. “A cidade deve
muito à entidade, que abriu caminhos em
outros mercados e tem sido muito impor-
tante na nossa luta pelo selo de Indicação
Geográfica de Procedência. Sem isso não
teríamos alcançado tantas conquistas
e seria quase impossível realizar nossos
projetos”, reconhece. Entre essas iniciati-
vas, ele destaca a Feira Mundial da Cacha-
ça, realizada sempre no mês de julho, com
público superior a 35 mil pessoas. Outro
evento importante deverá ser a mostra
Salinas em Paris, com o objetivo de divul-
gar a cachaça no exterior. Eilton também
aponta a existência em sua cidade do
curso de Tecnólogo em Produção de Ca-
chaça, oferecido pelo Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia do Norte
de Minas (IFNMG), campus Salinas com a
finalidade de qualificar mão de obra para a
fabricação e comercialização da bebida.
(38) [email protected]
Desde 2001, a APACS valoriza e promove a bebida dos associados dentro e fora do estado
140
Agro Indústria Monte Alto Ltda.Cachaça: Monte Alto
Agroindústria Três Irmãos Ltda.Cachaça: Majestade
Cooperativa dos Produtores de Cachaça de Alambique da Microrregião de Salinas (Coopercachaça) Cachaças: Terra de Ouro
Gel. Brasil Indústria e Comércio e Exportação de Bebidas Ltda.Cachaça: Fabulosa
associados da aPacs
141
Engarrafadora e distribuidora de Aguardente de Cana Indiana Ltda.Cachaças: Indiana, Cana de Ouro, Cana de Prata, Dona Moça, Sabor de Salinas, Segredo de Salinas e Memória de Salinas
associados da aPacs
142
Indústria, Comércio e Exportação de Cachaça Meia Lua Ltda.Cachaças: Meia Lua e Beleza de Minas
Indústria, Comércio e Exportação de Cachaça Salinas Ltda.Cachaças: Salineira e Valiosa
Indústria, Comércio e Engarrafamento de Aguardente de Cana EcológicaCachaça: Fascinação
associados da aPacs
143
Indústria, Comércio, Importação e Exportação de Cachaça JN Ltda.Cachaças: Cachoeira, Asa Branca e Hanavilhana
Indústria e Comércio de Aguardente de Cana Beija-Flor Ltda.Cachaças: Beija-Flor, Salivana e Indaiazinha
associados da aPacs
144
associados da aPacs
Indústria e Comércio de Aguardente de Cana ArtistaCachaças: Artista e Salimel
Indústria e Comércio de Aguardente Lua Cheia Ltda.Cachaças: Lua Cheia e Só Luar
145
associados da aPacs
Indústria e Comércio de Aguardente Menago Ltda.Cachaças: Anísio Santiago – Havana
Indústria e Comércio de Aguardente Preciosa Ltda.Cachaças: Sabinosa, Brinco de Ouro, Puricana e Brinco de Prata
146
Indústria e Comércio de Aguardente de Cana SabiáCachaças: Sabiá e Flor de Salinas
Indústria e Comércio de Aguardente Salicana Ltda.Cachaças: Salicana e Salinense
associados da aPacs
147
Indústria de Aguardente São Fidelis Ltda.Cubana
J.P. Indústria e Comércio Aguardente de Cana Ltda.Erva Doce e Canardente
associados da aPacs
Indústria e Comércio e Exportação de Bebidas Samers Ltda.Cachaças: Sabor de Minas e Baluarte
148
associados da aPacs
Santiago SoaresCanarinha
Indústria e Comércio e Exportação de Cachaça Sobrado Ltda.Cachaças: Sabor da Cana e Sobradinha
Peladinha Indústria e Comércio Ltda.Cachaça: Peladinha
149
associados da aPacs
Seleta e Boazinha Indústria e Comércio Importação e Exportação Ltda.Cachaças: Seleta, Boazinha e Saliboa
Tabúa Indústria e Comércio de Cachaça Ltda.Cachaças: Tabúa Flor de Ouro, Tabúa Flor de Prata e Salideira
Oswaldo Santiago conduz o legado deixado pelo pai, o produtor Anísio Santiago
151
Pioneirismo da Havana
Um dos associados da APACS é
Oswaldo Mendes Santiago, filho
de Anísio Santiago (1912-2002)
e hoje à frente da empresa fundada pelo
pai. O patriarca, que viveu 90 anos, só be-
bia cerveja, mas criou a cachaça Havana
no início da década de 1940. O produto
se tornaria conhecido como a melhor ca-
chaça do mundo, ficando várias vezes em
primeiro lugar na classificação de cacha-
ças das revistas Veja e Playboy.
A marca inaugurou uma tradição nos
anos 1950, e transformou Salinas num
dos mais importantes polos de produção
de cachaça artesanal do país. Em 2001,
Anísio perdeu na justiça o direito de usar
o nome Havana, isso porque a empresa
Havana Club Holding, de propriedade da
francesa Pernod Ricard S/A, registrou no
Brasil a marca Havana Club visando ao
comércio de rum. O patriarca passou o
bastão para os filhos e morreu em 2002.
Desde então, Oswaldo e os irmãos lutam
na justiça para reaver o direito de uso da
marca da cachaça, que passou a se cha-
mar Anísio Santiago.
“Meu pai começou praticamente do
nada. Não tinha ambição por dinheiro e
queria fazer uma cachaça de qualidade”,
afirma Oswaldo, que desde os seis anos
acompanhava o velho na lida da Fazenda
Havana, na Serra dos Bois. A exemplo de
Anísio, ele e os irmãos preferem a quali-
dade à quantidade. A produção da Ha-
vana – Anísio Santiago raramente ultra-
passa a marca de 12 mil litros por safra.
Os filhos aprenderam com o pai que a
paciência é a alma do negócio. “O suces-
so do nosso produto estimulou o surgi-
mento de outras marcas”, diz Oswaldo.
“Salinas produz algumas das melhores
cachaças artesanais do país e fazer parte
da APACS nos deixa muito orgulhosos”.
152
O voo da águia Seleta
D e barba longa e rabo de ca-
valo, boina basca ou chapéu
de couro, Antônio Eustáquio
Rodrigues, maior produtor mineiro de
cachaça de alambique em volume, é a
prova viva de que filosofia e cachaça an-
dam de mãos dadas. Dono de um esti-
lo pessoal que o transformou num dos
principais personagens da indústria de
bebidas do país, ele é um dos associados
da APACS que mais se destacam no mer-
cado. “Mestre não é quem mais ensina, é
quem mais aprende”, costuma dizer.
Produtor das marcas Boazinha, Se-
leta e Saliboa, o empresário prepara o
lançamento da Cachaça do Coronel,
envelhecida em tonéis de carvalho. Ele
é dono também da Tanoaria Padre Eus-
táquio, onde fabrica os próprios tonéis,
e tem 3 milhões de litros de cachaça
armazenados em 465 deles. Sua pro-
dução começou com a Boazinha, nome
de uma aguardente produzida pelo con-
terrâneo Lau. “Ele fazia uma pequena
quantidade e a procura era maior que
a demanda”, recorda. “Para atender a
todos, começou a comprar outras mar-
cas, mas os clientes queriam sempre
‘da boazinha’”. Anos depois, quando a
aguardente não era mais fabricada, An-
tônio buscou-a no fundo da memória e
batizou sua primeira cachaça.
Antônio emprega quase 100 pessoas e
afirma que a base do sucesso é a honesti-
dade. Para ele, a comercialização e os altos
impostos continuam sendo os principais
desafios dos donos de alambique. Mesmo
assim, é preciso conquistar novos merca-
dos. No entanto, consumidor e distribuidor
não investem num produto desconhecido
e não podem pagar pelos erros do fabri-
cante. “Mas não é fácil ser produtor e in-
termediário ao mesmo tempo”, alerta. “É
preciso distinguir investimento e despesa.
Investimento dá retorno; despesa, não. O
intermediário é quem mais investe, pois
pega o produto pronto para lapidá-lo”.
O produtor Antônio Eustáquio Rodrigues é um dos principais
personagens do ramo
154
Trabalho da moenda ao comércio
Além dos produtores e seus fa-
miliares, muita gente em Sali-
nas sobrevive da cachaça. No
auge da produção, cerca de 2 mil mo-
radores encontram trabalho direto ou
indireto no município, conforme núme-
ros da Associação dos Produtores Arte-
sanais de Cachaça de Salinas (APACS).
Boa parte dessa gente é formada por
jovens de ambos os sexos, alguns já
no ramo há vários anos. Para o prefeito
José Antônio Prates, a produção de ca-
chaça envolve um processo ético e cul-
tural que é uma verdadeira bênção. “A
tradição teve início pelas mãos humil-
des de personagens como Anísio, Noé,
Joãozinho da Lua Cheia, e hoje continua
com os mais jovens”, ressalta.
Joana Pereira de Melo aprendeu na
prática tudo o que sabe, e agora está
cursando Administração à distância,
pela Universidade do Norte do Para-
ná (Unopa). Há 10 anos ela trabalha na
empresa Seleta e Boazinha, de Antônio
Eustáquio Rodrigues. Casada e mãe de
dois filhos, exerce as funções de gerente
de produção e comanda 23 funcionários,
entre engarrafadores, tanoeiros, carrega-
dores e motoristas. Conheceu o marido
na tanoaria e hoje ele é caminhoneiro.
155
“A cachaça representa nossa sobrevivên-
cia”, reconhece. “Além dela, Salinas tem
poucas oportunidades de trabalho”.
Um dos profissionais comandados
por Joana é o tanoeiro Francino Pereira
da Silva França. Surdo-mudo, começou
como aprendiz na Tanoaria Padre Eus-
táquio e há mais de três anos vive da
profissão. Ele e mais dois colegas fazem
em média um tonel de 10 mil litros por
semana. Todos eles aprenderam o ofí-
cio graças à oportunidade oferecida por
Antônio Eustáquio Rodrigues. O patrão
é exigente, mas ensina tudo o que sabe
com paciência e respeito. Ele sabe que
os funcionários são parceiros importan-
tes e por isso precisam ser estimulados
para que o trabalho seja bem realizado.
A história de Darlene Pereira dos
Santos é um pouco diferente. Natural
de Taiobeiras, ela foi para Montes Cla-
ros com a finalidade de fazer um curso
preparatório para o vestibular. Queria
aprender uma profissão ligada às ciên-
cias biológicas e ficou sabendo do cur-
so de Tecnólogo em Produção de Ca-
chaça, oferecido pelo Instituto Federal
de Educação, Ciência e Tecnologia do
Norte de Minas (IFNMG), campus Sali-
nas. “O mercado da cachaça estava em
franco crescimento e eu me interessei
pelo curso”, recorda.
Darlene foi uma das primeiras que se
formaram na nova profissão e imediata-
mente iniciou uma pós-graduação em
Tecnologia da Produção de Cana, Açúcar
e Álcool. Em 2009, começou a trabalhar
na Associação dos Produtores Artesanais
de Cachaça de Salinas (APACS), emprego
que muito lhe tem ensinado, completan-
do o aprendizado teórico. Ela auxilia na
parte administrativa e técnica, devendo
também cuidar do site da entidade e da
venda de cachaças por meio dele. A for-
mação escolar lhe deu argumentos para
defender as qualidades do produto.
Darlene afirma que o avô materno
chegou a ter um alambique, que fun-
cionou em condições precárias devido
à falta de conhecimento técnico, mas
admite que nunca havia imaginado que
um dia trabalharia com cachaça. “Reco-
mendo o curso aos mais jovens, pois
ele abriu para mim uma oportunida-
de de trabalho na própria região onde
moro”, reconhece. Segundo ela, o curso
possibilita ao profissional atuar na ad-
ministração de uma fábrica de cachaça,
na orientação técnica durante o plantio
e a colheita da cana, no gerenciamento
de lojas especializadas e até em labora-
tórios. O curso tem aulas de alimenta-
ção, biologia, física, química, topografia
e outras matérias relacionadas à produ-
ção de cachaça.
A cachaça faz parte da cultura de Salinas e mobiliza em torno de 2 mil pessoas no auge da produção, a maioria jovens de ambos os sexos
157
O rio das araras grandes
O nome Araçuaí é de origem in-
dígena e significa “rio das ara-
ras grandes”. As aves se foram,
mas o rio continua sendo um dos mais
importantes do Vale do Jequitinhonha,
onde fica a cidade. No século XVIII, o
município foi ligada à comarca do Serro
Frio e, mais tarde, a Minas Novas.
No século XIX, o padre Carlos Perei-
ra de Moura fundou a Aldeia do Pontal,
na confluência dos rios Araçuaí e Jequi-
tinhonha. Ali aportavam canoeiros que
traziam mercadorias da Bahia. A presen-
ça desses homens atraiu muitas mulhe-
res. Expulsas pelo padre, elas seguiram
rio acima, achando abrigo na Fazenda
Boa Vista, de Luciana Teixeira, na mar-
gem direita do ribeirão Calhau. O lugar
deu origem à atual Araçuaí, entre 1830 e
1840. Além das mulheres, a aguardente
de cana já fazia a festa dos aventureiros
em seus momentos de descanso.
A Lei Provincial de 13 de julho de
1857 elevou o lugarejo à condição de
sede de distrito. A instalação do nome
de Villa de Arassuahy ocorreu em 1° de
julho de 1871. Em 21 de setembro do
mesmo ano, a Lei 1870 transformou o
lugar em cidade, cujo nome passou a
ser escrito com a grafia atual. A cidade
cresceu às margens do rio Araçuaí, prin-
cipal afluente do Jequitinhonha. Com a
abertura da estrada de rodagem, o movi-
mento de ônibus e caminhões substituiu
a navegação, pondo fim à atividade dos
canoeiros, homenageados com uma es-
tátua na praça da Matriz.
Até 1891, Araçuaí era a capital do
nordeste de Minas, ocupando o quarto
lugar entre os municípios mineiros em
número de comerciantes. Por ali passou
a estrada de ferro Bahia– Minas. A esta-
ção de trem da cidade começou a fun-
cionar em 1942 e hoje está desativada.
A agricultura e a pecuária são as princi-
pais atividades econômicas do municí-
pio e sempre enfrentaram dificuldades
devido ao clima quente e seco. O sub-
solo da região, no entanto, é rico em
minérios e pedras preciosas como tur-
araçuaí
A produção de cachaça é alternativa econômica do município
Além do subsolo rico em minérios e pedras semipreciosas, a região apresenta dinamismo na agricultura e na pecuária
158
malina, água-marinha, berilo, topázio,
crisólita, lítio, feldspato, cassiterita e
quartzo. A cidade é também conhecida
pela qualidade de sua cachaça e pelo
talento de seus artesãos.
Ao longo de muitos anos, Araçuaí
funcionou como entreposto comercial
de grande movimento. Por ali passavam
mercadorias oriundas do Serro, Ferros,
Peçanha, Minas Novas, Salinas e outras
cidades do norte e nordeste do estado.
Os armazéns do município viviam abar-
rotados de sal e outros produtos de
beira-mar, que aguardavam os tropeiros
para trocá-los por carne-seca, queijo e
produtos agrícolas nas fazendas da re-
gião. O auge dessa atividade se deu na
década de 1880, quando as tropas mu-
daram sua rota para o sul do estado.
O comércio araçuaiense foi perden-
do a força no final do século XIX, in-
fluenciando a decadência da navegação
do Jequitinhonha. A importação foi des-
locada da Bahia para o Rio de Janeiro.
A estrada de ferro Bahia–Minas passou
a transportar os produtos até Teófilo
Otoni, onde eram recebidos pelos tro-
peiros. A estrada de rodagem, aberta no
meio da mata entre aquela cidade e São
Miguel do Jequitinhonha, propiciou a
comunicação direta entre a estação de
trem e os distritos mais férteis do muni-
cípio do norte do estado.
Essas mudanças enfraqueceram
a economia de Araçuaí, que contudo
ainda mantém um comércio expressi-
vo. O mercado municipal é uma praça
movimentada, na qual os lavradores da
região vendem ou trocam seus produ-
tos pelos artigos de que necessitam. A
atividade comercial concentrou-se qua-
se toda em torno das feiras e a cidade
tem hoje grandes armazéns. Em 1901,
na Fazenda da Barra do Piauí, começou
a extração de pedras coradas, que ain-
da atrai compradores de vários lugares.
No entanto, a única indústria extrativa
de minério no município é a Companhia
Brasileira de Lítio (CBL).
Araçuaí adentrou o século XXI como
um dos principais municípios do Vale
do Jequitinhonha, apesar da fama de
“cidade do já teve”. A cidade encontrou
na produção de cachaça artesanal uma
alternativa econômica. A escola agríco-
la mantida pela diocese do município
contribuiu significativamente para me-
lhorar o cultivo da cana e a produção
de cachaça na região. A cidade hoje tem
perto de 40 mil habitantes.
pedras Coradas
Pedras preciosas e semipreciosas. Existem quase 80 tipos de pedras ou gemas coradas brasileiras catalogadas pelo boletim de preços do Ministério das Minas e Ener-gia, entre elas o rubi, a safira, a esmeralda, a água-marinha, a turmalina, o topázio impe-rial, a ametista, o crisoberilo olho de gato e a alexandrita. Fonte: Ministério das Minas e Energia.
Coração do Vale tem a qualidade atribuída não apenas ao processo de qualidade na produção, mas ao tipo de solo e ao clima da região
160
A cachaça do Coração do Vale
S e os tropeiros ainda cruzassem
o Vale do Jequitinhonha, como
fizeram até meados do sécu-
lo XX, provavelmente levariam em suas
bruacas muitas garrafas da aguardente
Coração do Vale, feita pela Cooperativa
de Produção de Cachaça de Alambique
de Araçuaí e Região (Cachaçaboa). Esse
mesmo produto certamente seria trans-
portado também pelos antigos canoei-
ros, que ainda naquela época subiam e
desciam o rio Araçuaí levando e trazen-
do toda sorte de mercadorias. A tradição
de se produzir cachaça na região vem de
longe. O clima semi-árido, bem como o
tipo de solo do lugar, favorecem o plan-
tio da cana-de-açúcar, desde cedo usada
na produção das melhores aguardentes.
A qualidade da cachaça produzida
em Araçuaí está relacionada ao tipo de
solo, à cana utilizada nos alambiques e
ao próprio clima da região. É o que ga-
rante o presidente da Cooperativa Ca-
chaçaboa, Antônio Luiz Moreira Santos,
mais conhecido como Toninho. Seu avô
paterno, Nuno dos Santos, foi produ-
tor da cachaça Sarajá, que chegou a ser
muito apreciada na cidade. Mas o pai e
os tios não deram continuidade à tradi-
ção que ele resolveu retomar.
Toninho tem 13 irmãos e foi o único
de sua geração que se interessou pela
produção de aguardente de cana. Ele as-
sumiu a presidência da Cooperativa de
Produção de Cachaça de Alambique de
Araçuaí e Região (Cachaçaboa) em 2009,
e desde então vem se empenhando na
melhoria e na divulgação da cachaça Co-
ração do Vale, lançada no mesmo ano,
mediante parceria com o Sebrae-MG, a
Prefeitura Municipal de Araçuaí, o Ins-
tituto Evaldo Lodi (IEL)/Federação das
Indústrias do Estado de Minas Gerais
(Fiemg) e o Sindicato das Indústrias de
Cerveja e Bebidas em Geral do Estado de
Minas Gerais (Sindbebidas-MG). O pro-
duto foi lançado durante a Expocachaça
(festival realizado anualmente em Belo
Horizonte), e num evento de degustação
realizado no Mercado Central, também
na capital mineira. A nova cachaça, um
blend elaborado a partir da produção dos
25 cooperados da Cachaçaboa, tem sido
aprimorada a cada dia e a Cooperativa
busca também melhorar sua imagem,
usando embalagens diferenciadas e per-
seguindo a padronização do produto.
“A Coração do Vale é produzida e co-
mercializada segundo todas as normas le-
gais”, garante Toninho, que se refere tanto
BruaCa
Saco ou mala de couro cru, para trans-porte de objetos e mercadorias sobre bestas. Bolsa de couro. Fonte: Novo Aurélio - O Di-cionário da Língua Portuguesa - Século XXI. Editoria Nova Fronteira, 3ª edição, 1999.
161
à legislação federal, que dispõe de requi-
sitos para a padronização, classificação,
registro, inspeção, produção e fiscaliza-
ção inerentes à cachaça brasileira, quan-
to aos licenciamentos necessários para a
atividade. Um dos diferenciais da cachaça
de Araçuaí é o fato de ser envelhecida em
tonéis de jequitibá, madeira muito encon-
trada no Vale do Jequitinhonha. A princi-
pal dificuldade dos produtores são as
barreiras para entrar no mercado. “Nosso
problema é a falta de distribuição e de di-
vulgação junto aos consumidores nacio-
nais e internacionais”, analisa. Toninho se
diz otimista com relação à parceria com o
Sebrae-MG, que acarretou uma série de
iniciativas, entre elas a capacitação dos
produtores para o associativismo e o co-
operativismo. Todo esse trabalho possi-
bilitou o aprimoramento dos cooperados
em métodos gerenciais relacionados à
administração, finanças, armazenamen-
to, estocagem, produção, custos e meio
ambiente. “Sabemos produzir e a entida-
de está nos ajudando a vencer os obstá-
culos comerciais”.
Para elaborar a Coração do Vale, os
produtores utilizam as melhores práticas
de produção nos processos de plantio,
corte e moagem da cana, fermentação e
destilação do caldo. Eles dedicam espe-
cial atenção à separação das frações de
cachaça, fazendo uso apenas do “cora-
ção” – a parte boa da bebida, isenta de
elementos químicos que podem prejudi-
car o sabor e a qualidade da aguardente.
Quem degusta a cachaça sente no olfato
e no paladar as propriedades da bebida.
A cooperativa buscou também melhorar
a imagem do produto, mediante a utili-
zação de rótulo e embalagens diferen-
ciados que se adequaram à padroniza-
ção da nova marca de aguardente.
Por essas e outras, a técnica do Se-
brae-MG na microrregião, Kênia Cardo-
so, afirma que Araçuaí tem o projeto de
cooperativa da cachaça mais bem estru-
turado de que tem notícia. “O projeto é
financiado pelo BNDES e a cidade produz
Toninho está à frente da Cachaçaboa, que desenvolve
iniciativas para unir os produtores em torno da
produção e venda da bebida
162
uma excelente cachaça”, afirma. O desa-
fio agora é desenvolver estratégias de co-
mercialização do novo produto. Em 2010,
além do planejamento de marketing, o pro-
jeto desenvolvido na região contempla a
busca de mercados potenciais, especial-
mente nas cidades de São Paulo e Rio de
Janeiro. A expectativa é que a produção
da Cooperativa Cachaçaboa atinja pelo
menos 300 mil litros em 2010.
Surgida inicialmente em 1999 como
um projeto para organizar a atividade
dos produtores, a Cachaçaboa foi forma-
lizada como cooperativa em 2004 devido
à necessidade de unir forças para levar à
frente um produto de qualidade. A en-
tidade foi estruturada com uma planta
industrial para o beneficiamento secun-
dário da cana, visando à produção de
1,2 milhão de litros de cachaça por ano.
Reúne 25 produtores, cada um deles em-
pregando de quatro a cinco pessoas na
região. Cada unidade de produção rural
tem capacidade para destilar até 40 mil
litros, sendo que três delas podem che-
gar a 100 mil litros de cachaça por ano. A
mão de obra é basicamente familiar e o
subproduto é utilizado na pecuária local
e na produção de adubo orgânico, além
de servir como base energética de com-
bustível para a destilação.
(33) [email protected]
A terceira vida de Rainer
Natural de Osnabrück, no norte da Alemanha, Heinrich Nicolaus Busselmann vive em Araçuaí o que chama de sua “terceira vida”. Ele morou em Berlim e em várias cidades do mundo, estudou agronomia e sociologia, ajudou a fundar o Par-tido Verde em seu país e chegou ao Brasil em 1987 por meio de um convênio do governo ale-mão com a diocese de Araçuaí. Foi trabalhar na escola agrícola do município, com a missão de adaptar o sistema de produção europeu à agri-cultura familiar de subsistência, típica do Vale do Jequitinhonha.
Rainer, como é conhecido na cidade, adaptou-se tanto à vida do lugar que chegou a ser secre-tário municipal de Agricultura. Casou-se com a jo-vem filha de um garimpeiro, com quem teve dois filhos, e vive da produção de cachaça e da criação de cabras e galinhas em sua pequena proprieda-de, às margens do rio Araçuaí. Morava na Alema-nha quando provou cachaça pela primeira vez. Sua irmã, que trabalhava como assistente social da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater-MG), no município de Salinas, levou-lhe de presente uma garrafa de Havana.
Enquanto o criador da famosa marca, Anísio San-tiago, preferia beber cerveja, Rainer, que não enten-dia nada sobre a bebida típica de seu país, acabou se transformando num produtor de boa cachaça. Ainda na Alemanha, chegou a conhecer peque-nas fábricas de destilados à base de trigo e batata. Curioso pelos processos de destilação, estudou o assunto com amigos do sul da Bavária, produtores de destilados feitos de pera e ameixa, muito tradi-cionais na região. Morando na índia, muito antes de pensar no Brasil, conheceu uma bebida feita de ar-
roz. Pouco a pouco, foi se tornando um especialista em destilados.
Um dos fundadores da Cooperativa Cachaçaboa, Rainer tem muito a oferecer no quesito comercial. Ainda na Alemanha, acompanhou de perto a inte-gração da economia nacional na então Comunidade Europeia, cujo mercado tinha a produção agrícola como carro-chefe. “Quem não atingia os objetivos e regras previamente estabelecidos era automatica-mente excluído do processo”, recorda.
Rainer participou da luta para salvar a agricul-tura familiar, que até então predominava em boa parte da Europa. Lembra-se de que em países como a França uma boa estratégia foi patentear como patrimônio histórico e cultural os produtos feitos artesanalmente, como o queijo, o vinho e o conhaque. “Essa ideia pode salvar os pequenos produtores brasileiros de alimentos e bebidas”, acredita. Na sua opinião, o pequeno produtor não tem como competir na quantidade ou no preço, mas pode oferecer como diferencial a qualidade de seus produtos.
O alemão começou a produzir cachaça em 1999. Até então, plantava cana para alimentar o gado de leite. Um amigo seu, Darlan Nepomuceno, sugeriu produzirem aguardente em parceria e montou um alambique em sua pequena fazenda. “Acompanhei de perto todo o processo e aprendi as manhas do negócio”, lembra Rainer. Naquela época, ele era secretário de Agricultura e enfrentava o problema da informalidade no setor de produção de cachaça. Como fabricante e bom bebedor, ele diz que a ca-chaça acalma o espírito, alimenta a boa prosa com os amigos e tem tudo para ajudar no crescimento econômico de Araçuaí.
163
165
Da Roseira de Paiolinho a Colinas do Sul
O município de Poço Fundo, no
sul do estado, tem apenas 15,9
mil habitantes, distribuídos
numa área de 474 km². Em toda a região,
no entanto, há 15 alambiques, média de
um para cada mil moradores. A maioria,
no entanto, concentra-se no distrito de
Paiolinho, de onde surgiu a tradição da
produção da cachaça das mãos de seu
Quinzinho Rosa (Joaquim Francisco da
Costa), ainda nos anos 1950. Ele foi o
primeiro produtor rural da região e mon-
tou nessa época uma engenhoca na fa-
zenda do Brejo Grande para a produção
de rapadura e cachaça.
Quinzinho Rosa gastava horas e ho-
ras ao lado da caldeira e do alambique.
Com paciência, cuidava da qualidade da
bebida, a Roseira, cachaça que ficou afa-
mada na redondeza. Chegou a produzir
80 litros por dia. Nos anos 1970, o pa-
triarca passou o alambique para os qua-
tro filhos, Olívio, Zico Rosa, Darílio e Ari.
Quem seguiu com a produção da Roseira
foi seu Olívio e o filho, Joaquim (mesmo
nome do avô), que se recorda de quan-
do, ainda jovem, se envolveu com o ne-
gócio. Ele cangava os bois de madrugada
para vender dois barris de 100 litros de
cachaça em Poço Fundo, a 10 km da fa-
zenda. “A gente chegava na cidade e ti-
nha de parar na entrada e passar sabão
nos eixos do carro de boi para não fazer
barulho. O carro cantava e a polícia não
deixava a gente passar no calçamento. A
gente tinha que subir pela rua da cadeia,
mas sem fazer barulho”.
Com a morte de Olívio na década
de 1990, seus filhos resolveram dividir
a fazenda. Daí, cada neto de Quinzinho
Rosa seguiu seu rumo, mas produzindo
a própria marca de cachaça, atividade
impregnada no DNA da família. Seu Jo-
aquim continuou a produção da Roseira
em sociedade com o irmão Naro; dona
Augusta produz a Paiolinho, e a irmã Is-
mair, a cachaça Izaltina. Todos carregam
na memória e no jeito de falar a rotina de
sul do estado
Colinas do Sul surgiu a partir da união de cooperados de Poço Fundo e de Machado, em 2004, em torno da Coopercasul
166
quem cresceu no meio do canavial, ao lado
das dornas de fermentação e do calor da
caldeira. Os irmãos garantem que o cheiro
que vem do berço é o da cachaça. Hoje, os
bisnetos de Quinzinho Rosa, Luiz (filho de
dona Augusta) e Anderson (filho de Joaquim)
já fizeram do ofício a cachaça de cada um.
Neste momento, a região se prepara para
um novo ciclo de expansão, após a profis-
sionalização da atividade. Desde 2004, os
produtores perceberam a necessidade de
criar uma associação (ou cooperativa) para
fortalecer a produção regional de cachaça.
O caminho pareceu a solução ideal para
agregar valor à produção e inserir os produ-
tores num novo patamar de qualidade para
alcançar novos mercados. Criada com os
alambiqueiros de Poço Fundo e da cidade
de Machado, a iniciativa ganhou corpo em
março de 2005, quando os produtores ru-
rais começaram a participar de palestras de
sensibilização sobre cooperativismo, a con-
vite do Sebrae-MG.
A primeira etapa das ações do Sebrae-
MG, chamada “linha de campo”, compre-
endeu um diagnóstico da produção de cada
um dos 60 cooperados, com fotos, avaliação
da cachaça – aparência, sabor, aroma e aná-
lise de elementos –, e normas técnicas que
deveriam ser adequadas junto ao Ministério
da Agricultura. Essa primeira ação serviu de
suporte aos produtores para que eles deixas-
sem a informalidade, buscassem o registro e
fizessem as adequações necessárias.
Por meio do projeto Gestão Estratégi-
ca Orientada para Resultados (GEOR), o
Sebrae-MG entrou como parceiro da Coo-
percasul em 2005. No início havia muitos
alambiques fora dos padrões, com estrutura
rudimentar, equipamentos incompletos (au-
sência de filtros e decantadores, por exem-
plo), sendo que alguns produtores ainda
usavam a queima da lenha e jogavam o vi-
nhoto diretamente nos cursos d’água.
Para mudar esse quadro, ficou estabele-
cido como pré-requisito para participar da
Coopercasul, desde a sua fundação, a ade-
quação do engenho às normas de produ-
ção do Ministério da Agricultura, Pecuária
e Abastecimento (Mapa). O presidente da
cooperativa, Anderson da Costa (bisneto
de Quinzinho Rosa), explica que essa de-
terminação foi inscrita no estatuto e apro-
vada por todos os cooperados, sendo que
apenas os produtores que estão dentro
das normas podem fornecer cachaça para
a Coopercasul.
“O levantamento que fizemos mostrou
que parte dos alambiques do sul de Minas
produzia a cachaça de ‘bica corrida’, isto é,
aquela em que não se faz a separação do
coração, da cabeça e da cauda. Hoje essa
situação mudou. Todos os nossos 30 coope-
rados, de 21 municípios da região, utilizam a
parte nobre da cachaça, fora as adequações
ambientais e de higiene”, afirma Anderson.
Em dois anos, o Sebrae-MG identificou
uma melhora significativa da qualidade dos
Os produtores Zico Rosa e Joaquim da Costa, de Paiolinho, seguiram os passos do patriarca,
Seu Quinzinho Rosa
168
alambiques e da produção, todos os coo-
perados fazendo um esforço muito grande
para se adequarem. Correções na estrutu-
ra do engenho, procedimentos certos de
aproveitamento sustentável – bagaço e
vinhoto –, separação dos álcoois superio-
res. Tudo isso passou a ser padrão entre os
cooperados.
A segunda etapa de conformação da
Coopercasul tratou do seu estatuto e da
eleição dos diretores. Em seguida, os coo-
perados contaram mais uma vez com con-
sultoria do Sebrae-MG para estabelecer o
padrão de qualidade da marca que iria re-
presentar dali para a frente a cooperativa:
a Colinas do Sul.
A meta da Cooperativa é vender a ca-
chaça Colinas do Sul em todo o território
nacional e, paralelamente, no mercado in-
ternacional. Por esse motivo, a cooperativa
estabeleceu um padrão rigoroso de quali-
dade, que contou com a colaboração dos
técnicos da Universidade Federal de Lavras
(UFLA) e do Ministério da Agricultura.
Para se ter ideia, o teor de acidez máxi-
mo estabelecido pelo Mapa é de 150 mg/100
ml de álcool anidro; a cooperativa exige um
teor abaixo dos 90 mg. A taxa de cobre é de
4 mg/l e a graduação alcoólica 47 GL. Além
disso, é cobrado do produtor o uso de cai-
xas de fermentação apenas de aço inox ou
aço carbono; separação dos álcoois supe-
riores e rigoroso controle ambiental.
Todos os cooperados tiveram ainda que
se adequar a um projeto de controle am-
biental, o qual recomenda o controle do
vinhoto, do bagaço, das cinzas da caldeira
e a outorga do uso da água, fora as licenças
convencionais solicitadas nos órgãos com-
petentes.
Ao produtor cabe entregar a cachaça
dentro do padrão estabelecido; a coo-
perativa faz todo o restante do processo
– transporte, análises químicas, engarrafa-
mento e venda.
(35) 3283-1023 / (35) [email protected]
O produtor Avelino José Capela, de Cambuí, é um dos cooperados
da Coopercasul
Novas perspectivas no mercado
A Coopercasul está fechando uma par-ceria com a Cooperativa dos Produtores de Cachaça de Alambique da Região Cen-tro-Oeste de Minas Gerais, com o objetivo de fortalecer as duas regiões produtoras e ampliar o mercado das marcas Colinas do Sul e Real.
O vice-presidente da Coopercasul, Ivan Vilela, explica que a parceria ampliará para mais de 60 o número de produtores, com capacidade produtiva estimada de 2 mi-lhões de litros de cachaça por ano. “O co-operativismo agrega valor ao produto, ofe-rece infraestrutura para comercialização e representa os produtores junto aos órgãos governamentais”.
Vilela defende ainda a cooperativa como solução para os pequenos produtores. Se-gundo dados da Associação Comercial de Poço Fundo, a cooperativa do sul de Minas gera hoje cerca de 500 empregos diretos e mais de 100 indiretos, sendo a maioria ocu-pação de mão de obra familiar.
“Com um número maior de cooperados após a fusão, teremos dinheiro e caixa para contratar um gestor e manter uma coope-rativa-empresa. Estamos buscando uma visão moderna, com estrutura para comer-cialização, que ofereça sede com melhores equipamentos e vendedores nas regiões. A nossa ideia é consolidar a marca em Minas e depois partir para os outros estados”, afirma o vice-presidente.
Joaquim Silvério é alambiqueiro da propriedade
de dona Augusta Costa
170
As cachaças de Minas Gerais
Por todo o estado a produção da
cachaça de alambique mobiliza
milhares de famílias. Em alguns
casos, como em Salinas, a bebida tem
fundamental importância na economia
local, sobretudo na geração de emprego
e renda. É uma síntese da realidade bra-
sileira, que reúne atualmente mais de 40
mil produtores de 4 mil marcas, segun-
do o Instituto Brasileiro da Cachaça. E
as microempresas correspondem a 99%
do total de produtores. No Brasil, o setor
da cachaça é responsável pela geração
de mais de 600 mil empregos, diretos e
indiretos. Minas Gerais se destaca como
polo de produção de cachaça artesanal.
Com capacidade instalada de produ-
ção de mais de 1,7 bilhão de litros, uma
parcela mínima da bebida é destinada ao
mercado externo. Em 2009, segundo nú-
meros do Ministério de Desenvolvimen-
to, Indústria e Comércio, apenas 10,8
milhões de litros foram exportados, ge-
rando uma receita de apenas US$ 15,58
milhões. O principal destino é a Alema-
nha (terra da cerveja), responsável por
24% dessa fatia. São aproximadamente
180 empresas exportadoras, que enviam
a bebida para mais de 60 mercados. Ou
seja, há uma avenida de crescimento no
mercado internacional.
Nesta edição, destacamos 81 mar-
cas diferentes de cachaça artesanal de
Minas Gerais. São produtos de exce-
lência de associações e cooperativas
de produtores que desenvolvem, jun-
tamente com o Sebrae-MG, ações de
melhoria da qualidade do produto, de
organização do setor e de ampliação do
mercado, dentro e fora do país. Cachaças
– Minas Gerais registrou também as his-
tórias dos produtores que obtiveram,
até o final de 2009, o selo do Inmetro,
um atestado que garante essencialmen-
te o padrão de qualidade da bebida
que chega ao consumidor. Os produtos
estão distribuídos em 17 cidades das
cinco macrorregiões de Minas, confor-
me divisão geográfica utilizada pelo Se-
brae-MG em seus projetos.
171
172
BELO VALEGavião do Vale
Região Central
BETIMMinha Deusa e Vale Verde
BRUMADINhOÁgua da Bica e Sonhadora
MORRO DA GARÇAProsa & Viola e Terra de Minas
ESMERALDASPrazer de Minas
Belo Vale
Betim
Brumadinho
Morro da Garça
Esmeraldas
173
Região Leste
MARILACCachaça Verde Amarela
GOVERNADOR VALADARESUirapuru
Marilac
Governador Valadares
174
ARAxáCachaça Carnaval e Segredo de Araxá
Região Oeste
CONqUISTAP.O. de Minas
UBERABACachaça Lenda do Chapadão
Araxá
Conquista
Uberaba
175
BOA ESPERANÇASerra da Boa Esperança
Região Sul
PIRANGUINhODedo de Prosa
POÇO FUNDOColinas do Sul
SÃO GONÇALO DO PARáCachaça DJ
Boa Esperança
Piranguinho
Poço
Fundo
São Gonçalo
do Pará
176
Região Norte
Araçuaí Claro dos Poções
Salinas
177
ARAÇUAíCoração do Vale
CLARO DOS POÇõESBranquinha de Minas
SALINASAnísio Santiago e Havana
SALINASArtista
SALINASAsa Branca
SALINASBrinco de Ouro e Brinco de Prata
SALINASBeija-Flor
SALINASBaluarte
SALINASBeleza de Minas
SALINASBoazinha
SALINASCachoeira
SALINASCana de Ouro
e Cana de Prata
SALINASCanarinha
SALINASCanardente
SALINASDona Moça
178
SALINASErva Doce
SALINASFabulosa
SALINASFlor de Salinas
SALINASHanavilhana
SALINASMeia Lua
SALINASIndaiazinha
SALINASIndiana
SALINASLua Cheia
SALINASMajestade
SALINASMemória de Salinas
SALINASMonte Alto
SALINASPeladinha
SALINASPuricana
SALINASRio Salinas
SALINASSabiá
SALINASSabinosa
SALINASSabor de Cana
SALINASSabor de Minas
179
SALINASSalideira
SALINASSabor de Salinas
SALINASSaliboa
SALINASSalicana
SALINASSalimel
SALINASSalineira
SALINASSalinense
SALINASSalivana
SALINASSegredo de Salinas
SALINASSeleta
SALINASSobradinha
SALINASSó Luar
SALINASTabua Flor de Ouro
e Tabua Flor de Prata
SALINASTerra de Ouro
SALINASSalideira
SALINASSalineira
SALINASValiosa
saideira
Cachaça de A a Z, 183
Museu da Cachaça, 185
Raridades em Caeté, 186
Xico da Kafua, 187
Musa dos Sambistas, 188
Oração do Pau-d’Água, 188
Novo colecionador, 188
Inspiração literária, 189
Leveduras selecionadas, 190
Clube Mineiro da Cachaça, 191
A arte da tanoaria, 192
Engenho Boa Vista, 193
Degustação de cachaça, 194
Berços de boa madeira, 195
Dicas de leitura, 196
181
Abrideira BadaloCaiana Danada Elixir Faísca
Garapa HomeopatiaIsca JurubitaKatiassa LindinhaMé Nó-cego OrontanjePrego Queima-pé Rama Saideira TalagadaUmazinha Vexadinha
White water Ximbica Zuninga
Abençoada
AtitudeBagaceira
Cumbica Dengosa
Marvada
Santinha
Xixi-de-gato
TragoÓbsessão
ZombeteiraUca
ImaculadaGororoba Januária
Limpa-goelaNão-sei-quê
Endiabrada
Purgante
Tremedeira
Jinjibirra
Levanta-velho
Mulatinha
Uísque-de-pobreTiúba
183
Trago
A . Abençoada, abrideira, aça, acalma-nervo, acuicui, água-benta, água de briga, água de cana, água-doce, água-maluca, água que passarinho não bebe, aguardente, aguarrás, aguinha, amansa-corno, aman-sa-sogra, amarelinha, anacuíta, antibió-tico, antioxidante, apaga-tristeza, aquela que matou o guarda, arapari, ardosa, ariranha, arrebenta-peito, arrupiada, asso-vio de cobra, atentada, atitude, azinhavre, azougue, azuladinha, azulzinha.
B . Badalo, bafo de tigre, bagaceira, bagaço, bambu-amigo, baronesa, bebida de po-bre, bicarbonato de soda, bicha, bichinha, bico, birinaite, birinata, birita, boa, boa ideia, boazinha, boinha, borbulhante, boresca, bota-fora, braba, branca, bran-quinha, brasa, braseira, brasileira, brava.
C . Cabreira, cachorro de engenheiro, café branco, cascabulho, caiana, calibrina, calorenta, cana, canguara, canha, canica, canicilina, caninha, canjebrina, capote de pobre, capim-santo, cascavel, catinguen-ta, catuaba, catuta, cauim, cavalo-arriado, caxaramba, caxiri, caxirim, cem-virtudes, chá de cana, champanha da terra, cha-
Cachaça de A a Z
A cachaça, desde as suas origens no Brasil Colônia, ganhou uma infinidade de apelidos. Em cada região do país, ou em
diferentes grupos sociais, o destilado de cana que melhor representa a alma brasileira pode ser identificado por meio de
expressões solenes ou bem-humoradas, que já fazem parte do folclore nacional. De A a Z, a grande variedade de nomes
da bebida revela a criatividade dos bons bebedores. A seguir, listamos quase 300 denominações distintas.
puletada, chibatada, chica-boa, chicote, chinelada, chora-menina, chorinho, choro, cobertor de pobre, cobreira, comadre, cumulaia, congonha, consolação, conso-la-corno, cumbeca, cumbica, cura-tudo.
D . Danada, de colarzinho, dengosa, depura-tivo, desabafa-peito, desmancha-samba, desmanchadeira, distinta, ditadura, doi-dinha, dona-branca, dengosa, dindinha, douradinha.
E . Elixir, endiabrada, engasga-gato, engor-da-marido, entorta-pé, espanta-moleque, espírito, esquenta-peito, esquenta por dentro, estricnina.
F . Faísca, fanta, faz-dodó, faz-xodó, fecha-corpo, filha de senhor de engenho, fogo, fogo-molhado, fogosa, forra-peito, fruta.
G . Garapa, garapa-doida, gás, girgolina, giribita, glostora, goró, gororoba, goro-robinha, gramática, grogue, generosa, gengibirra, gororoba, guampa.
h .Homeopatia.
184
I . Iaiá me sacode, imaculada, imbiriba, incha-cara, injeção, isca.
J . Januária, jeribita, jinjibirra, jura, jurubita, jurupinga.
K .Katiassa.
L . Lágrima de virgem, lamparina, lanterneta, lapada, lebreia, legume, levanta-velho, limpa-goela, lindinha, lisa.
M . Maçangana, malafo, malunga, malvada, mamadeira, mamãe de aluana, mamãe-sacode, mandureba, mangaba, mania, marafo, maria-branca, maria-teimosa, martelada, marvada, mata-bicho, matu-aba, mé, mijo de câo, mijo-santo, moça-branca, moça-loura, monjopina, mulati-nha, meu-consolo.
N . Não sei quê, nó-cego.
O . Obsessão, óleo de cana, omim-fum-fum, orontanje, otim-fifum, otim-fim-fim.
P. Parati, parda, parnaíba, passa-raiva, pa-trícia, pechincha, pela-goela, penicilina, perigosa, piloia, pilora, pindaíba, pinga,
piribita, pitu, porongo, preciosa, prego, proletária, pura, purgante.
q . Quebra-gelo, quebra-goela, quebra-mu-nheca, queima-pé.
R . Rama, remédio, restilo, retrós, roxo-forte.
S . Saideira, samba, santinha, semente de arenga, sete-virtudes, sinhazinha, sumo da cana, suor de alambique, sururuca.
T . Tafiá, talagada, tapa no beiço, teimosa, tenebrosa, terebintina, tiguara, tiquira, tira-juízo, tira-prosa, tira-teima, tiúba, tome-juízo, trago, tremedeira.
U . Uca, uísque de pobre, umazinha, uminha, urina de gato, urina de santo.
V . Velha-aroeira, vexadinha, venenosa, vir-gem, virtude.
W . White water.
x . Xarope de bebo, ximbica, xinapre, xixi de anjo, xixi de gato.
Z . Zombeteira, zuninga.
185
Que tal conhecer as cachaças Iracema, Amansa Sogra, Consolo de Corno ou Granfina? Estas marcas fa-zem parte do acervo de mais de 1500 garrafas do Museu da Cachaça. Inau-gurado em 1989 no Vale Verde Alam-bique e Parque Ecológico, no municí-pio de Betim, Região Metropolitana de Belo Horizonte, o museu teve iní-cio quando o empresário e produtor da cachaça Vale Verde, Luiz Otávio Pôssas Gonçalves, adquiriu uma co-leção com cerca de 350 marcas. Na-quela época, ele pensou em construir um espaço para contar a história das bebidas e, em especial, da cachaça, que é hoje parte do legado cultural e gastronômico de Minas. No Museu da
Museu da Cachaça
Cachaça, o visitante pode fazer uma viagem no tempo pelos painéis que ilustram a história da bebida, desde os primeiros relatos no Egito Antigo com o surgimento da cerveja até os dias atuais. Há também peças que fa-zem parte da história da cachaça mi-neira, como o alambique de cerâmica, precursor dos alambiques de cobre; a máquina usada para encher com aguardente as garrafas e garrafões; e uma antiga moenda, que funcionava com tração animal. O acervo do Mu-seu da Vale Verde conta com algumas raridades: a cachaça Chita, por exem-plo, com rótulo datado de 1935; e a Pelé Caninha, dedicada ao jogador de apenas 17 anos, que conquistaria a
Museu da CaChaça
Vale Verde alamBique e parque eCológiCo
Rodovia MG 50, km 39 – Bairro Vianópolis. Entrada de segunda a sábado: R$10,00 (adulto) e R$ 5,00 (criança). Entrada aos domingos e feriados: R$ 15,00 (adulto) e R$ 7,50 (criança). Mais informações: (31) 3079-9171, www.valeverde.com.br ou www.cachacavaleverde.com.br .
Copa de 1958 com a Seleção Brasileira de Futebol. Na época, Pelé não gos-tou da homenagem por ter seu nome vinculado a uma bebida alcoólica. Por meio de uma ação judicial, todas as garrafas foram retiradas do mercado. Apenas cinco unidades teriam sobrado nas mãos de colecionadores e uma de-las faz parte deste acervo.
BÁ
RB
AR
A M
ON
TE
IRO
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Museu da CaChaça de Caeté
Sítio Vale do Ipê. Estrada da Fazenda Ouro Fino – Caeté. Visita mediante agendamento prévio. Mais informações: (31) 3651-2024, 3651-8757, 9999-6960 ou www.museudacachacamg.com.br .
Raridades em Caeté
O médico Paulo Diogo Monteiro de Barros mantém um tributo à cachaça brasileira em Caeté, na Região Me-tropolitana de Belo Horizonte. Numa área de 100 m², ele preserva mais de 8,7 mil marcas diferentes de aguar-dente. Localizada no Sítio Vale do Ipê, ao pé da Serra da Piedade, a coleção foi iniciada despretensiosamente, na década de 1970, quando Paulo Diogo trabalhava em João Pinheiro (MG), onde decidiu comprar todas as 13 marcas expostas na prateleira de um boteco, e 67 marcas encontradas nas cidades de Paracatu, Patos de Minas e Pirapora. Além de contar com uma Pelé na coleção, o acervo tem rari-dades como uma antiga Jurema, de
1905, produzida por Júlio Laender, de Teófilo Otoni; uma antiga Havana, da primeira safra, além das principais marcas produzidas nos tempos áure-os de Ponte Nova, Curvelo e Januária. De Salinas, são mais de 80 garrafas de diferentes produtores e épocas. Há também curiosidades como O Ba-bão (aguardente de quiabo) e Tiquira, esta última uma aguardente de man-dioca produzida no Maranhão, muito apreciada pelos norte-americanos na época em que estiveram na base montada na região, durante a Segun-da Guerra. O acervo encanta pela di-versidade e as garrafas são o retrato vivo da história da produção de ca-chaça no Brasil.
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Um dos principais acervos em Belo Horizonte está aberto à visitação no restaurante Xico da Kafua. O proprie-tário é Murai Caetano de Oliveira, um aficionado da aguardente nacional. Natural de Dores do Indaiá (MG), ele começou a colecionar cachaças em 1984, quando adquiriu o restaurante. A partir daí, passou a comprar duas garrafas de cada marca, uma para servir e outra para o acervo pessoal. Pouco a pouco, tornou-se conheci-do pelos donos de alambiques, que passaram a presenteá-lo. Cada vez mais interessado no assunto, Murai foi descobrindo outros coleciona-dores e passou a frequentar feiras, exposições e eventos de degustação em várias partes do país. “Conserva-mos exemplares raros, de safras que muitas vezes nem os produtores têm mais.” Hoje, os fregueses do Xico da Kafua têm a oportunidade de ver de perto cerca de 2 mil garrafas de di-ferentes marcas e safras de cacha-ça, além de equipamentos usados em alambiques. Entre as raridades, o comerciante destaca um exemplar da marca Botica, que, segundo ele, produz desde 1853 em Passos, no sul do estado, uma das melhores ca-chaças do país. Outras raridades são as garrafas de Pingo de Ouro, pro-duzida em Santo Antônio do Grama, na Zona da Mata Mineira. Além das
Xico da Kafua
garrafas expostas, o museu do Xico da Kafua mantém exemplares de 20 marcas ofertadas por fabricantes es-pecialmente para degustação. Bom bebedor, Murai define a cachaça como “um espírito de liberdade, um bem precioso que compõe a nossa vida na cultura, na gastronomia e nas alegrias de encontros festivos”. Para ele, “uma boa cachaça é aquela que degustamos com calma e concentra-ção, sentindo seu aroma e suas par-ticularidades”.
XiCo da Kafua
Avenida Itaú, 1.195, bairro João Pinheiro. Mais informações: (31) 3375-2030 ou www.xicodakafua.com.br
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Musa dos sambistas Samba e cachaça sempre fizeram parceria. Pro-
va disso é o CD Cachaça dá samba!, de Alfredo Del-Penho e Pedro Paulo Malta, sambistas da nova geração da Lapa boêmia, no Rio de Janeiro. Produ-zido em 2006 pelo músico e pesquisador Henrique Cazes com direção artística de João Augusto, o dis-co reúne 14 composições sobre a aguardente na-cional. Do centenário poeta da Vila, Noel Rosa, aos contemporâneos Moacyr Luz, Aniceto do Império e Zeca Pagodinho, vários bambas cantaram e decan-
taram a cachaça. O disco reúne sambas de primeira, registrando também uma seresta satírica, uma embo-lada e a antológica Malvada pinga (Moda da pinga), de Laureano, imortalizada pela caipiríssima Inezita Barro-so. Outro clássico que não poderia faltar é Cachaça, de Héber Lobato, Lúcio Girão e Marinósio Filho (“Você pen-
sa que cachaça é água?”). Preço: R$ 27,90.Outro projeto musical que merece destaque é
o álbum duplo Cachaça Fina, produzido em 2003. São nada menos que 35 faixas falando de coisas do Brasil – incluindo a cachaça, naturalmente. Des-tacam-se no repertório Meu Molequim, com Eudes Fraga; Samba, Seresta & Baião, com Consuelo de Paula; Graal, com Jiripoca Band; e Amor de Feiran-te, com Morena & Nelson Câmara. Preço: R$ 20.
Oração do Pau-d’Água
Santa Cana que se extrai da roça, purificado seja o vosso caldo / Aguardente sem mistura, venha a nós o vosso líquido, a ser bebido à nossa vontade, assim no boteco como em qualquer lugar / Cinco litros por dia, nos dai hoje / Perdoai o dia em que bebemos de menos, assim como perdoamos o mal que a “marvada” nos faz / Não nos deixeis cair atordoados e livrai-nos da rádio-patrulha. Amém... Hic!
Novo colecionador
Ex-presidente do Tribunal de Justiça de Minas Ge-rais, o desembargador Sérgio Resende começou a sua coleção de cachaça em 2006. Porém, ele nunca comprou uma única garrafa. Nas viagens pelo estado, Sérgio passou a ganhar de presente dos amigos uma aguardente da região visitada. Resende já formou um acervo com mais de 500 marcas, algumas raridades, como uma antiga Havana, de Salinas. O curioso é que Sérgio Resende não é um degustador de cachaça, o que pode ser garantia de vida longa à coleção. “Gosto de colecionar por causa dos rótulos, dessa memória que faz parte da cultura mineira. Tenho, por exemplo, a P.O. de Minas original, produzida por Oto Rezende da Cunha em Capinópolis, no Triângulo Mineiro. Essa cachaça faz parte da memória da minha família”, ex-plica Sérgio.
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A cachaça serviu de tema para a ficção e a poesia, inspirando vários escritores em diferentes épocas. Na obra A Cachaça no Folclore de Minas Gerais, João Dornas Filho registrou, por exemplo, uma quase ode à aguardente nacional:
A cachaça é minha prima, o vinho é meu parente.
Não há festa nem festejo que meus parentes não entre. Vou mandar fazer um bicame
de madeira de canela, pra passar toda cachaça
dos quintos pra minha goela. No fim da minha vida
quero morrer de fartura. O quinto será meu caixão, o alambique, a sepultura.
No seu famoso Dicionário Folclórico da Cachaça, Mário Souto Maior resgata o pensamento do poeta Carlos Drummond de Andrade sobre a bebida:
Queiram ou não queiram seus adversários, a cachaça é uma utilidade pública
brasileira, dado histórico nacional (...)Não lhe faço a apologia, de que não precisa.
Registro sua presença cultural, seu fascínio sobre a mente do povo.
Outro bom mineiro que não poderia deixar de se refe-rir à aguardente nacional foi Guimarães Rosa. No roman-ce Grande Sertão: Veredas, por exemplo, ele menciona indiretamente o ciclo de produção de Januária. Em deter-minado ponto da narrativa, Riobaldo afirma:
“Ali, o tempo, a rapaziada suava, cuidando nos alambiques, como perfeito se faz. Assim essas ca-chaças – a vinte-e-seis cheirosa – tomando gosto e cor queimada, nas grandes dornas de umburana”.
Enquanto isso, o “sabiá da crônica”, Rubem Bra-ga, inspirou-se num estapafúrdio projeto de lei que tentava proibir a fabricação, o transporte, a venda, a compra e o uso da cachaça. Isso em pleno século XX. Ele escreveu A cachaça também é nossa, com o título lembrando o mote “O petróleo é nosso”, crôni-ca de protesto contra tal absurdo: “O Brasil é o único país do mundo que não leva a sério sua bebida na-cional”, constatou.
E com visão futurista sugeriu: “Por que não es-tudar seriamente o problema da aguardente de vá-rios pontos de vista, desde o da saúde pública até o da exportação?... Uma associação de produtores, amparada pelo governo, poderia dar dignidade à indústria da cachaça, estabelecendo padrões de idade e qualidade (como se faz em outros países com o uísque, o conhaque, o vinho etc.), que te-riam de ser respeitados, punindo-se severamente as fraudes”.
Contudo, o autor que melhor abordou a cachaça do ponto de vista ficcional foi Jorge Amado, em A Morte e a Morte de Quincas Berro d’Água, novela escrita em 1959 e publicada no volume intitulado Os Velhos Marinheiros – duas histórias do cais da Bahia. Com o estilo humorístico que lhe era pecu-liar, o romancista baiano narra as aventuras de um homem dado à bebedeira, que se afoga no mar da Bahia. Levado pelos companheiros de cachaça numa espécie de despedida, o defunto percorre os pontos de boemia que frequentou para só depois ser sepultado.
Inspiração literária
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Leveduras selecionadas
A pesquisadora e professora da Universidade Federal de Lavras (UFLA), Rosane Freitas Schwan, começou em 1997 um estudo pioneiro no Brasil relacionado às leveduras selecionadas, que são microorganismos com ele-vada capacidade produtiva para transformar o açúcar do mosto da cana-de-açúcar em álcool. O objetivo da pesquisa era oferecer aos produtores de cachaça artesanal uma tecnologia que já vem sendo usada pelas princi-pais marcas de bebidas do mundo. “O uísque escocês utiliza as leveduras selecionadas da cevada há mais de 40 anos. Já o vinho, que é resultado da fermentação da uva, também tem sua levedura. Essa tecnologia é um selo internacional de qualidade”, explica Rosane. No Brasil, até o final da década de 1990, não havia um estudo sobre a fermentação da cachaça, e a realidade para a maioria dos produtores que usavam apenas o fermento caipira (como o fubá, o milho e o farelo de arroz) era de perdas durante o processo produtivo. Naquela época, a pesquisadora e uma equipe de alunos do Departamento de Biologia da Ufla coletaram o total de 1,8 mil leveduras naturais, retiradas de amostras de caldos de cana de alambi-ques de Minas Gerais e Goiás. Em seguida, eles isolaram em laboratório a espécie Saccharomyces cerevisiae, denominada UFLA-CA11 e que possui características superiores.
Rendimento e qualidade
Os benefícios da UFLA-CA11 são muitos, desde o alto rendimento na produção de etanol e ésteres. Na prática, a levedura produz mais cachaça com a mesma quantidade de cana; passando pelo aprovei-tamento de quase 100% dos elementos resultantes da quebra de sacarose na fermentação – glicose e frutose –, até o alto poder de sedimentação, o que elimina a necessidade de centrífuga, reduzindo o custo do alambique. A levedura selecionada ainda se destaca por não produzir os aldeídos na mesma quantidade que as leveduras usadas pela indústria atual. Esses elementos são responsáveis pela de-sagradável ressaca do dia seguinte. Os primeiros alambiques a utilizar a UFLA-CA11 foram os das cachaças Bocaina (Lavras), Prazer de Minas (Esme-raldas) e Da Boa (Boa Esperança). O produtor Anto-nio Claret Sales conta que conseguiu aumentar em 30% a produção da Bocaina com a levedura, além de ter reduzido o teor de acidez do seu produto de 140 mg por 100 ml de álcool anidro para 23mg. Em 2008, a Ufla resolveu fazer a transferência da tecno-logia com o objetivo de atender um número maior de produtores. A empresa LNF Latino Americana (Bento Gonçalves, RS) atua como parceira no de-senvolvimento da levedura selecionada na versão seca e desidratada, facilitando o manuseio e dimi-nuindo o tempo de estocagem. Segundo a profes-sora Rosane Schwan, o último levantamento da uni-versidade revelou que cerca de 1,2 mil alambiques em Minas Gerais já fazem uso da UFLA-CA11, sen-do o produto comercializado também nos estados do Tocantins, Santa Catarina, Bahia e São Paulo. A Universidade Federal de Ouro Preto e a Universida-de Federal de Minas Gerais também desenvolvem pesquisas sobre leveduras selecionadas.
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O tradicional bairro de Santa Tereza, em Belo Horizonte, é sede do Clu-be Mineiro da Cachaça (CMC), criado em 2001 para promover a aguardente produzida nos melhores alam-biques de Mi-nas Gerais. Até o início de 2010, o trabalho do CMC consistia na produção de eventos, participação em feiras, congressos e simpósios sobre cachaça, além da realização de palestras e degusta-ções em diferentes regiões do país. Em janeiro, a entidade abriu um bar na Rua Mármore, 373, em Santa Te-reza, vizinho do famoso restaurante do Bolão.
Para o especialista Murilo Alber-naz, presidente do Clube, a cachaça sempre sofreu com o preconceito que muitos cultivam com relação às coisas genuinamente nacionais. No entanto, reconhece que isso vem di-minuindo graças ao trabalho dos pro-dutores e de suas associações, que atuam em diferentes estados brasi-leiros. Albernaz afirma que o Clube Mineiro da Cachaça está aberto a to-dos aqueles que valorizam “o autên-tico produto nacional, que pode ser comparado aos melhores destilados
Clube Mineiro da Cachaça
do mundo”. O CMC não tem objetivos oficiais, mas contri-bui consideravelmente nos debates para a divulgação, comercialização e consumo
da cachaça mineira, atuando junto a ór-gãos governamen-tais e associações
de produtores. A entidade congrega
cerca de 1,8 mil associados em todo o país, que recebem regularmente informações sobre o universo da ca-chaça e participam de eventos rela-cionados à bebida.
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A arte da tanoaria
A tanoaria é uma arte antiga que consis-te na fabricação de vasilhas de madeira para acondicionar vinhos e aguardentes. Estas vasilhas recebem várias designações, de acordo com suas dimensões e capacidade de armazenagem, como o barril, a cartola e o tonel. O profissional responsável por confec-cionar os vasilhames de madeira é conhecido como tanoeiro. O ofício nasceu na Europa e sempre esteve ligado à produção vinícola. No século XIX, as correntes migratórias trou-xeram alguns desses artesãos para o Brasil, que passaram a produzir barris e tonéis para armazenar a cachaça.
Em Minas Gerais, é possível encontrar pro-fissionais que vivem cercados de madeiras, aduelas, pinos e de uma infinidade de peças e instrumentos que fazem parte da arte da tanoaria. Um exemplo é a Tanoaria Padre Eus-táquio, do produtor da marca Seleta, Antônio Rodrigues, de Salinas. A fábrica é gerenciada por Joana Melo, que aprendeu o ofício de ta-noeiro aos 22 anos. Hoje, ela coordena uma equipe de cinco profissionais que confeccio-nam barris e tonéis de jequitibá, umburana, bálsamo e ipê-amarelo para atender ao mer-cado mineiro, além dos estados de São Paulo e Bahia. Como Joana gosta de dizer, a arte da tanoaria continua viva nas terras de Salinas e das Minas Gerais.
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Um dos dois mais antigos alam-biques do Brasil em funcionamen-to está localizado na Estrada Real, em Coronel Xavier Chaves (MG), a 14 km de São João del-Rei. Na ci-dade mineira está o Engenho Boa Vista, erguido no século XVIII, de propriedade de Rubens Resende Chaves (bisneto de Xavier Chaves e descendente direto dos pais de Ti-
Engenho Boa Vista
radentes), e da esposa Cida Chaves, que produzem 30 mil litros anuais da cachaça Século XVIII. Nas tardes de sábado, o casal recebe visitan-tes, das 10h às 13h, para degusta-ções, acompanhadas de petiscos. A proprietária também faz melado, rapadura e licor de cachaça. A edifi-cação ainda guarda a atmosfera da época.
engenho boa Vista
Sítio Boavista, a 500 m do centro de Co-ronel Xavier Chaves, em direção à Fazen-da do Pombal. Aberto diariamente para visitação, das 9h às 16h. Degustação com petiscos aos sábados, das 10h às 13h. Mais informações: (32) 3357-1238.
Cida Chaves e Rubens Resende Chaves mantiveram a tradição secular da família de Tiradentes
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Degustação de cachaça
Todo produtor de cachaça tem como principal objetivo ter o seu pro-duto reconhecido e aprovado sensorialmente pelo consumidor. Para os especialistas, degustação e análise sensorial são processos distintos. A primeira é uma avaliação subjetiva que consiste em observar, experimen-tar, avaliar (através de uma escala comparativa ou por analogias sempre subjetivas), apreciar e classificar. De modo geral, busca-se apenas expri-mir o prazer ou o desprazer dos sentidos na experimentação. A análise sensorial é uma degustação técnica. É o resultado estatístico da avaliação de grande número de provadores previamente selecionados e treinados. Degustar é uma arte e pede atenção especial para se observar caracte-rísticas sensoriais importantes de uma boa cachaça como aparência, cor, aroma e sabor:• A aparência deve ser límpida e transparente (ausente de partículas).
Incolor ou dourada clara.• Após agitação, formam-se bolhas que se desfazem em aproximada-
mente 15 segundos.
• A boa cachaça deixa no copo uma oleosidade a escorrer lentamente.
• A cachaça deve escorrer em lágrimas brilhantes pelas paredes internas do recipiente.
• O aroma não pode provocar ardor nos olhos ou nariz.• O aroma deve ser agradável.• Quando esfregada na pele (como nos testes de perfume), deixa aroma
agradável.• Se você gosta de cachaça envelhecida, passe um pouco na pele, deixe o
álcool evaporar e sinta o aroma da madeira. Se não tiver aroma, você pode ter sido enganado (a bebida não é envelhecida ou é de má qualidade).
• Queima agradavelmente a boca, deixando sensação de prazer.• Se envelhecida em madeira, deixa suave amargor.• Após ingestão, a sensação do retrogosto é harmoniosa.• O tato na língua é aveludado.
Fonte: Livros “Tecnologia da Cachaça de Alambique” (Sindibebidas e Sebrae), “Cachaça, O Mais Brasileiro dos Prazeres” e “Cachaça artesanal, do alambique à mesa” (Editora Senac).
Tipos de copo
A melhor forma de saborear a bebida é utilizando um recipiente pequeno (cálice ou copo), com volume aproximado de 20ml. Beba sempre em pequenos goles para as papilas da língua avaliarem e transmitirem ao cérebro o teor de acidez. O recipiente mais usual são copinhos de vidro. O ideal é servir a bebida sem transbordar. O limite é um dedo abaixo da borda. Uma boa dica
é intercalar os goles de cachaça com goles de água para manter o “bom relacionamento” da bebida com o organismo. Há médicos, especialistas e mesmo produto-
res de cachaça de alambique que defendem o consumo máximo de uma dose diária. Este seria o limite
ideal para a saúde. Ou seja, o equiva-lente a um copinho de cachaça.
A branca é mais indicada para a caipirinha. Para a elaboração de drinques, as frutas indicadas são as de sabores marcantes, como maracujá, carambola, pitan-ga, abacaxi, morango e limão. A cachaça envelhecida deve ser apreciada pura. Em geral, a cachaça é boa para harmonizar com pratos de tempero forte, bem condimentados, como feijoada, carnes, linguiças e embutidos em geral.
Harmonização
Boa madeira
Conheça algumas das madeiras brasileiras utilizadas em barris para o envelhecimento da cachaça. Assim como o uísque, o rum e o conhaque, a bebida passa por um processo de envelhecimento para adquirir boas propriedades sensoriais de aroma e paladar. Modifica ainda a coloração, de branca para amarelada. Torna a cachaça macia e aveludada, atenuando a sensação desidratante do álcool presente. Cada madeira confere características peculiares de cor, brilho, aroma, sabor e adstringência, em razão das estruturas peculiares de seus taninos e lignina, porosidade ao oxigênio e aos componentes da própria cachaça produzida. Fonte: Associação Mineira dos Produtores de Cachaça de Qualidade (Ampaq), Tecnologia de Cachaça de Alambique, de Amazile Biagioni Maia e Eduardo Campelo, e Fabricação Artesanal da Cachaça Mineira, livro de autoria de José Carlos e Arnaldo Andrade Ribeiro.
AMENDOIM Madeira neu-tra, que não altera a cor da cachaça.
ANGELIM-ARAROBAAngelim-coco, pau-pintado, angelim-doce, urarama, ange-lim-do-pará, angelim-pedra, angelim-rosa, angelim-rajado, angelim-pinima, angelim-de-espinho e angelim-de-fo-lha-larga (acapu). Ocorre da Bahia até o Rio de Janeiro e Minas Gerais.
BáLSAMOCabriúva, cabriúva-do-cam-po, cabriuva-parda, cabrué, cabureíba, óleo-cabureíba, óleo-pardo, pau-bálsamo. Re-sulta numa cachaça de gosto forte. Confere tom amarelado à bebida.
CARVALhOOcorrência do carvalho brasilei-ro da Bahia até Santa Catarina. Madeira uni-versalmente utilizada para ar-mazenagem de bebidas destiladas.
CEREJEIRACereja-galega, cereja-dos-passarinhos, cerejeira-da-europa. Madeira branco-avermelhada ou amarelada e avermelhada.
FREIJÓ (FREI JORGE)Madeira castanha com listras escuras, opacas e pulveru-lentas
GARAPAFornece madeira de lei de cerne amarelado e ondeado. Amarelinha, garapa-amarela, garapiapunha ou grapiapu-nha. Ocorrência da Bahia ao Rio Grande do Sul e Mato Grosso.
IPê-AMARELOGarante uma cachaça que desce macio num tom alaranjado.
JATOBá O tronco produz um óleo tido pela cultura popular como medicinal.
JEqUITIBáJequitibá-rosa, jequitibá-vermelho e jequitibá-branco. Madeira róseo-acastanhada ou bege-rosada. Ocor-rência do Nordes-te ao Sul do país. Elimina o leve gosto de ba-gaço de cana sem alterar a cor.
UMBURANACumbaru-das-caatingas, cumaré, ambu-rana, imburana-de-cheiro. Baixa a acidez e diminui o teor alcoólico da cachaça, que fica mais suave.
VINháTICO Excelentes madeiras ama-relas: vinhático-da-mata e vinhático-do-campo. Aranha-gato. Confere cor amarelo-ouro e gosto próximo ao da cachaça pura. Fornece cor amarelo-ouro e gosto próxi-mo ao da cachaça pura.
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Dicas de Leitura
Erwin Weimann. Editora Terceiro Nome, 2009. Com gravuras, mapas, fotos e uma coletânea de rótulos, os textos apontam a trajetória da cachaça desde o seu início, nos canaviais e engenhos brasi-leiros do século XVI. O livro aborda ainda o processo de fabricação sem tecni-cidades tediosas e leva o leitor a conhecer diferentes tipos de cachaça e alambi-ques, as regiões produto-ras, a presença da bebida nas mesas humildes e nas sofisticadas, a utilização da cachaça na gastronomia e no preparo de aperitivos e, ainda, faz uma compa-ração de caráter científico, entre as bebidas destiladas fabricadas no mundo e a tradicional cachaça.
CAChAÇA, A BEBIDA BRASILEIRA
Jairo Martins da Silva. Editora Anhembi Morumbi, 2006. Este livro apresenta a his-tória, elaboração, serviço e degustação da cachaça. A cachaça é a bebida destila-da mais consumida no Bra-sil. Sua origem está envolta em fatos históricos, socio-lógicos e econômicos que caracterizam o país desde o seu descobrimento. Saída dos engenhos de cana, no tempo da colonização portuguesa, transformou-se na bebida de todas as classes sociais, vencendo os preconceitos que sempre a acompanharam desde a sua criação. De norte a sul do país, o autor faz um mape-amento das principais cida-des produtoras e respectivas características regionais. No capítulo sobre degustação, orientações para análise do produto, incluindo modelos de fichas técnicas de degus-tação. Há ainda capítulos com receitas à base da bebida, informações sobre mercado e legislação.
CAChAÇA, O MAIS BRASILEIRO DOS PRAZERES
Roberto Carlos Morais Santiago. Edições Cuatiara, 2006. O livro aborda a história de sucesso da mais fa-mosa e tradicional marca de cachaça artesanal do Brasil, a ‘Havana – Anísio Santiago’. Produzida em Salinas, norte de Minas Gerais, desde a década de 1940, pelo produtor Anísio Santiago (1912-2002), agora pelos sucessores, tornou-se marca lendária em todo o país. É consi-derada Patrimônio Cultural Imaterial de Salinas e ícone da cachaça artesa-nal mineira e brasileira em face de sua qualida-de, história, notoriedade e fama em mais de 60 anos de produção. O livro aborda, ainda, aspectos relevantes da economia, cultura e história da cacha-ça brasileira, mineira e de Salinas. Possui, também, glossário da cachaça para que o leitor possa enten-der o mundo fantástico da sua alquimia.
O MITO DA CAChAÇA hAVANA – ANíSIO SANTIAGO
Luís da Câmara Cascudo.Editora Itatiaia (em sebos) e Global Editora (edição mais recente, de 2006).Resultado de minuciosa pesquisa do folclorista Luís da Câmara Cascudo, que recorreu a objetos, docu-mentos e fontes as mais diversas. O autor refaz uma viagem na linha do tempo para oferecer aos estu-diosos e interessados um detalhado levantamento de etnologia, história e socio-logia da cachaça, a conhe-cida ‘água que passarinho não bebe’. No livro há des-de informações históricas sobre o início da produção de cachaça no Brasil até a chegada das primeiras mudas da cana Cayenne ao Rio de Janeiro, oriunda da Guiana Francesa, daí cana caiana. Na publicação, um passeio pela cultura brasilei-ra com informações sobre cerimoniais que incluem a cachaça até o uso da bebi-da nas guerras do Império. “Há uma tradição de que a cachaça misturada com pól-vora provoca a coragem”.
PRELUDIO DA CAChAÇA
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