Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos...

25
Novembro/2019 Sessões de 1º a 30 de novembro de 2019 94 número

Transcript of Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos...

Page 1: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

1

Novembro/2019

Sessões de 1º a 30 de novembro de 2019

94 número

Page 2: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

2

Novembro de 2019

Compilação dos Informativos nos 958 a 961

Data de divulgação 05 de dezembro de 2019

O Informativo por Temas apresenta todos os resumos de julgamentos divulgados pelo

Informativo STF concluídos no mês a que se refere e é organizado por ramos do Direito e por

assuntos.

SUMÁRIO

Direito Administrativo

Concurso Público

Cumulação de títulos de magistério e aplicação retroativa de nova interpretação de norma

administrativa – 2

Direito Constitucional Competência

Prescrição de delito e fixação de competência – 2

Foro de ajuizamento de ação contra a União

Direitos e garantias fundamentais

Execução provisória da pena e trânsito em julgado – 2

Receita Federal e compartilhamento de dados com o Ministério Público – 2

Organização dos Poderes

Possibilidade de vinculação das verbas do Fundef ao pagamento de honorários advocatícios

contratuais

Competência do STF e ação ordinária contra ato do CNJ – 3

Tribunal de Contas da União

TCU e competência para fiscalizar os recursos do Fundo Constitucional do Distrito Federal

TCU: decadência e suspensão de pagamentos de contratos – 3

Direito Financeiro Dívida Pública

Plano Real: Nota do Tesouro Nacional e índice de correção – 2

Direito Penal Aplicação da Lei Penal

Dupla persecução penal em âmbito internacional

Legislação Penal especial

Tráfico privilegiado de drogas e revaloração de fatos e provas – 2

Pena

Regime semiaberto e execução provisória da pena

Direito Processual Civil

Reclamação

Cabimento de reclamação e precedente de repercussão geral – 2

Direito Processual Penal Habeas Corpus

Execução provisória e prisão domiciliar – 2

Expulsão de paciente que tem filho sob a sua guarda e dependência econômica – 3

Expulsão de estrangeiro que possui filho brasileiro – 2

Page 3: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

3

Nulidades e Recursos em geral

Assistente de acusação: tempestividade de recurso e coisa julgada – 2

Recursos em geral

Revisão criminal e cabimento

Page 4: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

4

DIREITO ADMINISTRATIVO

Concurso Público

Cumulação de títulos de magistério e aplicação retroativa de nova interpretação de norma

administrativa – 2 A Primeira Turma, em conclusão de julgamento e por maioria, denegou a ordem em mandados de

segurança impetrados contra decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que, em procedimento de

controle administrativo, determinou a comissão de concurso público que afastasse a possibilidade do

cômputo acumulado de títulos alusivos ao exercício do magistério superior com e sem prévio concurso

público de admissão. Além disso, o órgão estabeleceu que fosse considerado, na hipótese, apenas o título

de maior pontuação apresentado pelos candidatos e republicada a lista final de classificação (Informativo

955).

Os impetrantes sustentavam que o CNJ teria dado nova interpretação a normas relativas ao

concurso público, sendo inviável sua aplicação retroativa.

Prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes. A seu ver, ao contrário do que alegado pelos

impetrantes, não há comprovação de que o CNJ tenha efetivamente surpreendido os candidatos com

qualquer mudança de entendimento.

Segundo o ministro, os documentos juntados aos autos demonstram que, ainda em 2016, houve

pronunciamento do Plenário do CNJ sobre a validade do concurso em questão, quando também assentada

a impossibilidade de acumulação de títulos de exercício de magistério decorrentes de vínculos diversos.

No ato ora coator, essa interpretação foi reiterada, inclusive, com o registro de que o entendimento no

sentido da impossibilidade de acumulação fora fixado antes da divulgação do resultado da fase de títulos

do mencionado certame.

Dessa maneira, concluiu não haver ilegalidade praticada pelo CNJ.

Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que deferiu a ordem para assentar a insubsistência do

pronunciamento do CNJ e a possibilidade da cumulação da pontuação dos títulos.

MS 35992/RS, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento

em 12.11.2019. (MS-35992)

MS 36218/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento

em 12.11.2019. (MS-36218) (Informativo 959, Primeira Turma)

Page 5: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

5

DIREITO CONSTITUCIONAL

Competência

Prescrição de delito e fixação de competência – 2 O habeas corpus não é sede processual adequada para discussão sobre a correta fixação da

competência, bem como sobre a existência de transnacionalidade do delito imputado.

Com base nesse entendimento, a Primeira Turma, em conclusão de julgamento e por maioria,

negou provimento a agravo regimental em habeas corpus no qual se sustentava que a prescrição da

pretensão punitiva em relação a delito que fundamenta a atração da competência da Justiça Federal – no

caso, evasão de divisas – ensejaria o deslocamento da competência para a Justiça estadual (Informativo

939).

Vencido o ministro Marco Aurélio, que votou pelo provimento do agravo para que o writ tenha

sequência. Segundo o ministro, o habeas corpus deve ser julgado pelo Colegiado, não sendo observável

o Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, nem o Código de Processo Civil, no que autorizam o

relator a indeferir, liminarmente, a impetração.

HC 151881 AgR/SP, rel. Min. Rosa Weber, julgamento em 12.11.2019. (RE-151881) (Informativo

959, Primeira Turma)

Foro de ajuizamento de ação contra a União O art. 109, § 2º, da Constituição Federal (CF) (1) encerra a possibilidade de a ação contra a União

ser proposta no domicílio do autor, no lugar em que ocorrido o ato ou fato ou em que situada a coisa, na

capital do estado-membro, ou ainda no Distrito Federal.

Com base nesse entendimento, a Segunda Turma negou provimento a agravo regimental em

recurso extraordinário com agravo no qual se discutiu o foro competente para ajuizamento de demanda

contra a União.

No caso, a ação foi proposta em decorrência de supostos fatos ocorridos nas terras da autora

localizadas no estado do Pará. O feito tramitou inicialmente em São Paulo, até o acolhimento da exceção

de incompetência e, em seguida, retornou para a Vara Federal deste estado. O tribunal de origem, a partir

do conjunto probatório dos autos, entendeu estar a agravada sediada na cidade de São Paulo.

O Colegiado considerou que, para concluir de forma diversa do acórdão recorrido, seria necessário

o reexame de fatos e provas, procedimento incabível em recurso extraordinário.

(1) CF: “Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: (...) § 2º As causas intentadas contra a União poderão ser

aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda

ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito Federal.”

ARE 1151612 AgR/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 19.11.2019. (ARE-1151612)

(Informativo 960, Segunda Turma)

Direitos e Garantias fundamentais

Execução provisória da pena e trânsito em julgado – 2

O Plenário, em conclusão de julgamento e por maioria, julgou procedentes pedidos formulados em

ações declaratórias de constitucionalidade para assentar a constitucionalidade do art. 283 do CPP (1)

(Informativo 957).

Prevaleceu o voto do ministro Marco Aurélio (relator), que foi acompanhado pelos ministros Rosa

Weber, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Dias Toffoli.

O relator afirmou que as ações declaratórias versam o reconhecimento da constitucionalidade do

art. 283 do CPP, no que condiciona o início do cumprimento da pena ao trânsito em julgado do título

condenatório, tendo em vista o figurino do art. 5º, LVII, da CF (2).

Page 6: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

6

Assim, de acordo com o referido preceito constitucional, ninguém será considerado culpado até o

trânsito em julgado de sentença penal condenatória. A literalidade do preceito não deixa margem a

dúvidas: a culpa é pressuposto da sanção, e a constatação ocorre apenas com a preclusão maior.

O dispositivo não abre campo a controvérsias semânticas. A CF consagrou a excepcionalidade da

custódia no sistema penal brasileiro, sobretudo no tocante à supressão da liberdade anterior ao trânsito em

julgado da decisão condenatória. A regra é apurar para, em virtude de título judicial condenatório

precluso na via da recorribilidade, prender, em execução da pena, que não admite a forma provisória.A

exceção corre à conta de situações individualizadas nas quais se possa concluir pela aplicação do art. 312

do CPP (3) e, portanto, pelo cabimento da prisão preventiva

O abandono do sentido unívoco do texto constitucional gera perplexidades, observada a situação

veiculada: pretende-se a declaração de constitucionalidade de preceito que reproduz o texto da CF.

Ao editar o dispositivo em jogo, o Poder Legislativo, por meio da Lei 12.403/2011, limitou-se a

concretizar, no campo do processo, garantia explícita da CF, adequando-se à óptica então assentada pelo

próprio STF no julgamento do HC 84.078, julgado em 5 de fevereiro de 2009, segundo a qual “a prisão

antes do trânsito em julgado da condenação somente pode ser decretada a título cautelar”.

Também não merece prosperar a distinção entre as situações de inocência e não culpa. A execução

da pena fixada por meio da sentença condenatória pressupõe a configuração do crime, ou seja, a

verificação da tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade. Assim, o implemento da sanção não deve

ocorrer enquanto não assentada a prática do delito. Raciocínio em sentido contrário implica negar os

avanços do constitucionalismo próprio ao Estado Democrático de Direito.

O princípio da não culpabilidade é garantia vinculada, pela CF, à preclusão, de modo que a

constitucionalidade do art. 283 do CPP não comporta questionamentos. O preceito consiste em

reprodução de cláusula pétrea cujo núcleo essencial nem mesmo o poder constituinte derivado está

autorizado a restringir.

A determinação constitucional não surge desprovida de fundamento. Coloca-se o trânsito em

julgado como marco seguro para a severa limitação da liberdade, ante a possibilidade de reversão ou

atenuação da condenação nas instâncias superiores.

Em cenário de profundo desrespeito ao princípio da não culpabilidade, sobretudo quando

autorizada normativamente a prisão cautelar, não cabe antecipar, com contornos definitivos – execução da

pena –, a supressão da liberdade. Deve-se buscar a solução consagrada pelo legislador nos arts. 312 e 319

(4) do CPP, em consonância com a CF e ante outra garantia maior – a do inciso LXVI do art. 5º:

“ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem

fiança”.

Uma vez realinhada a sistemática da prisão à literalidade do art. 5º, LVII, da CF – no que direciona

a apurar para, em virtude de título judicial condenatório precluso na via da recorribilidade, prender, em

execução da pena –, surge inviável, no plano da lógica, acolher o requerimento formalizado, em caráter

sucessivo, nas ADCs 43 e 54, concernente ao condicionamento da execução provisória da pena ao

julgamento do recurso especial pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), como se esse tribunal fosse um

“Supremo Tribunal de Justiça”, nivelado ao verdadeiro e único Supremo.

A ministra Rosa Weber esclareceu que, diante do indeferimento das medidas cautelares nessas

ações declaratórias e da tese fixada em repercussão geral segundo a qual a execução antecipada da pena

não compromete a presunção de inocência, adotou, em momento anterior, o entendimento majoritário da

Corte. Entendimento este mantido em processo de feição subjetiva, como no caso de habeas corpus.

Porém, ao se julgar o mérito das ADCs, processo de índole objetiva, explicou estar apta a reapreciar o

tema de fundo.

Asseverou que o 5º, LVII, da CF, além de princípio, representa também regra específica e

expressamente veiculada pelo constituinte – a fixar, objetivamente, o trânsito julgado como termo final da

presunção de inocência, o momento em que passa a ser possível impor ao acusado os efeitos da atribuição

da culpa.

Para a ministra, o texto do art. 283 do CPP guarda higidez frente à ordem objetiva de princípios,

valores e regras inscritos na Carta constitucional de 1988.

Page 7: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

7

A Constituição de 1988 não assegura uma presunção de inocência meramente principiológica.

Ainda que não o esgote, ela delimita o âmbito semântico do conceito legal de culpa, para fins de

condenação criminal, na ordem jurídica por ela estabelecida. E o faz ao afirmar categoricamente que a

culpa supõe o trânsito em julgado.

Considerada a conformação específica dada pela Constituição brasileira ao princípio da presunção

de inocência – qual seja, a de assegurá-la até o trânsito em julgado ou a irrecorribilidade do título

condenatório –, não se justifica qualquer tentativa de assimilação da ordem jurídica pátria a razões de

direito comparado em relação a ordenamentos jurídicos que, por mais merecedores de admiração que

sejam, não contemplam figura normativa-constitucional análoga.

De outra parte, ainda que se pretendesse relativizar a densidade normativa do art. 5º, LVII, da CF,

despindo-o da sua literalidade, não seria possível identificar, no art. 283 do CPP, qualquer ofensa a este

ou a qualquer outro preceito constitucional.

Em face de ato normativo editado pelo Poder Legislativo com exegese plenamente compatível

com o parâmetro constitucional de controle, a tônica do exame de constitucionalidade deve ser a

deferência da jurisdição constitucional à interpretação empreendida pelo ente legislativo.

Não cabe ao Poder Judiciário, no exercício do controle jurisdicional da exegese conferida pelo

Legislador a uma garantia constitucional, simplesmente substituí-la pela sua própria interpretação da

Constituição.

O direito processual penal tem como norte a maior das garantias constitucionais, que é a

observância, na tutela constitucional da liberdade, do devido processo legal. A Constituição assegura,

expressamente, que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal

condenatória”. Uma vez adotado, pelo legislador infraconstitucional, marco normativo que, longe de a

ela se contrapor, visa assegurar a máxima efetividade da garantia constitucional da presunção de

inocência e guarda absoluta consonância com a Lei Fundamental, não pode o intérprete da norma

constitucional ceifar-lhe o potencial humanizador.

Embora fortes razões de índole social, ética e cultural amparem seriamente a necessidade de que

sejam buscados desenhos institucionais e mecanismos jurídico-processuais cada vez mais aptos a

responder, com eficiência, à exigência civilizatória que é o debelamento da impunidade, não há como, do

ponto de vista normativo-constitucional vigente – cuja observância irrestrita também traduz em si mesma

uma exigência civilizatória –, afastar a higidez de preceito que institui garantia, em favor do direito de

defesa e da garantia da presunção de inocência, plenamente assimilável ao texto magno.

O ministro Ricardo Lewandowski pontuou que a presunção de inocência integra a cláusula pétrea

alusiva aos direitos e garantias individuais que representa a mais importante das salvaguardas do cidadão.

Segundo o ministro, é vedado, até mesmo aos deputados e senadores, ainda que no exercício do

poder constituinte derivado do qual são investidos, extinguir ou minimizar a presunção de inocência,

plasmada na Constituição de 1988, porquanto foi concebida como um antídoto contra a volta de regimes

ditatoriais. Com maior razão não é dado aos juízes fazê-lo por meio da estreita via da interpretação, eis

que esbarrariam nos intransponíveis obstáculos das cláusulas pétreas, verdadeiros pilares das instituições

democráticas.

Afirmou que não se mostra possível superar a taxatividade do inciso LVII do art. 5° da CF, salvo

em situações de cautelaridade, por tratar-se de comando constitucional absolutamente imperativo,

categórico, com relação ao qual não cabe qualquer tergiversação. Ademais, o texto do dispositivo

constitucional, além de ser claríssimo, jamais poderia ser objeto de uma inflexão jurisprudencial para

interpretá-lo in malam partem, ou seja, em prejuízo dos acusados em geral.

Por fim, a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, elaborada sob os auspícios da

Organização das Nações Unidas e subscrita pelo Brasil, de observância obrigatória por todos os Estados

que a assinaram, consagrou, em seu art. 30, o princípio da proibição do retrocesso em matéria de direitos

e garantias fundamentais, plenamente aplicável à espécie.

O ministro Gilmar Mendes destacou que, nos últimos anos, o CPP sofreu alterações, com o

objetivo de se adequar à CF/1988. No mesmo sentido, o STF tem se posicionado contra a prisão abusiva,

como, por exemplo, a fundada no clamor público, ou a prisão aplicada de modo automático, sem

fundamentação.

A execução penal antes do trânsito em julgado não é compatível com a CF, e a ordem de prisão

decretada antes desse marco processual deve se revestir dos requisitos da prisão preventiva, sob pena de

ofensa ao princípio de presunção de não culpabilidade.

Page 8: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

8

Esse postulado tem a feição de garantia institucional do réu, para que não seja tratado da mesma

forma durante o trâmite do processo. Assim, a lei pode impor a ele tratamento diferenciado ao longo da

marcha processual, conforme são preenchidos determinados requisitos.

Ainda que existam graves disfuncionalidades no sistema processual penal, que levam à prescrição

e à não aplicação da pena, elas não legitimam a prática de medidas abusivas por parte do Poder

Judiciário, como prisões processuais infundadas ou baseadas na manutenção da ordem pública e na

gravidade do delito, como a denominada “prisão provisória de caráter permanente”.

A problemática da prescrição, ademais, pode ser solucionada de maneira mais satisfatória a

depender de medidas administrativas tomadas pelos tribunais. Desse modo, é preciso tornar o sistema

mais eficiente; e não promover a ablação de uma norma constitucional.

Frisou que o combate a qualquer tipo de criminalidade deve sempre ser feito dentro dos limites da

Constituição e da lei.

O ministro Celso de Mello, ao acompanhar essa orientação, o fez com os seguintes fundamentos:

a) a presunção de inocência qualifica-se como direito público subjetivo, de caráter fundamental,

expressamente contemplado na CF (art. 5º, LVII); b) o estado de inocência, que sempre se presume,

cessa com a superveniência do efetivo e real trânsito em julgado da condenação criminal, não se

admitindo, por incompatível com a cláusula constitucional que o prevê, a antecipação ficta do momento

formativo da coisa julgada penal; c) a presunção de inocência não se reveste de caráter absoluto, em

razão de constituir presunção juris tantum, de índole meramente relativa; d) a presunção de inocência não

se esvazia progressivamente, à medida em que se sucedem os graus de jurisdição, pois só deixa de

subsistir quando resultar configurado o trânsito em julgado da sentença penal condenatória; e) o

postulado do estado de inocência não impede que o Poder Judiciário utilize, quando presentes os

requisitos que os legitimem, os instrumentos de tutela cautelar penal, como as diversas modalidades de

prisão cautelar (entre as quais, p. ex., a prisão temporária, a prisão preventiva ou a prisão decorrente de

condenação criminal recorrível) ou, então, quaisquer outras providências de índole cautelar diversas da

prisão (CPP, art. 319); f) a Assembleia Constituinte brasileira, embora lhe fosse possível adotar critério

diverso (como o do duplo grau de jurisdição), optou, conscientemente, de modo soberano, com apoio em

escolha política inteiramente legítima, pelo critério técnico do trânsito em julgado; g) a exigência de

trânsito em julgado da condenação criminal, que atua como limite inultrapassável à subsistência da

presunção de inocência, não traduz singularidade do constitucionalismo brasileiro, pois foi também

adotada pelas vigentes Constituições democráticas da República Italiana de 1947 (art. 27) e da República

Portuguesa de 1976 (art. 32, n. 2); h) a execução provisória (ou antecipada) da sentença penal

condenatória recorrível, por fundamentar-se, artificiosamente, em uma antecipação ficta do trânsito em

julgado, culmina por fazer prevalecer, de modo indevido, um prematuro juízo de culpabilidade,

frontalmente contrário ao que prescreve o art. 5º, LVII, da CF; i) o reconhecimento da possibilidade de

execução provisória da condenação criminal recorrível, além de inconstitucional, também transgride e

ofende a legislação ordinária, que somente admite a efetivação executória da pena após o trânsito em

julgado da sentença que a impôs (LEP, arts. 105 e 147; CPPM, arts. 592, 594 e 604), ainda que se trate de

simples multa criminal (CP, art. 50; LEP, art. 164); j) as convenções e as declarações internacionais de

direitos humanos, embora reconheçam a presunção de inocência como direito fundamental de qualquer

indivíduo, não estabelecem, quanto a ela, a exigência do trânsito em julgado, o que torna aplicável,

configurada situação de antinomia entre referidos atos de direito internacional público e o ordenamento

interno brasileiro e em ordem a viabilizar o diálogo harmonioso entre as fontes internacionais e aquelas

de origem doméstica, o critério da norma mais favorável (Pacto de São José da Costa Rica, art. 29), pois

a CF, ao proclamar o estado de inocência em favor das pessoas em geral, estabeleceu o requisito

adicional do trânsito em julgado, circunstância essa que torna consequentemente mais intensa a proteção

jurídica dispensada àqueles que sofrem persecução criminal; k) a exigência do trânsito em julgado

vincula-se à importância constitucional e político-social da coisa julgada penal, que traduz fator de

certeza e de segurança jurídica (res judicata pro veritate habetur); e l) a soberania dos veredictos do júri,

que se reveste de caráter meramente relativo, não autoriza nem legitima, por si só, a execução antecipada

(ou provisória) de condenação ainda recorrível emanada do Conselho de Sentença.

Por fim, o ministro Dias Toffoli demonstrou indicadores no sentido de que a morosidade da

justiça, que porventura leva à impunidade de criminosos, tem relação com erros, omissões e abusos

cometidos em diversas fases, processuais e pré-processuais, e não se pode imputar esse fenômeno

exclusivamente ao intervalo entre a condenação em segundo grau e o trânsito em julgado, que tem um

papel residual nesses números. A estatística é ainda mais alarmante em relação aos procedimentos

relativos a processo e julgamento pelo tribunal do júri, tendo em vista sua inerente complexidade.

Além disso, existem mecanismos processuais à disposição das partes e do juiz, que podem ser

aplicados para que se evite a superveniência da prescrição.

Page 9: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

9

Registrou, ainda, o elevado e crescente número de presos no país cujo decreto prisional não está

fundado em decisão condenatória transitada em julgado.

Assim, cabe ao Legislativo dispor sobre a temática de maneira diversa da que está no art. 283 do

CPP, desde que o faça em respeito ao postulado da presunção de inocência. Enquanto não houver essa

mudança, a prisão que não estiver fundada nos requisitos de prisões cautelares somente poderá subsistir

se baseada no trânsito em julgado do édito condenatório. Em outras palavras, a presunção de inocência

não impede a prisão em qualquer fase, processual ou pré-processual, desde que preenchidos os requisitos

da prisão cautelar.

Vencidos os ministros Edson Fachin, que julgou improcedentes os pedidos formulados; e os

ministros Alexandre de Moraes, Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia, que julgaram os pedidos

parcialmente procedentes, no sentido de dar interpretação conforme ao art. 283 do CPP. Admitiram a

execução da pena após decisão em segundo grau de jurisdição, ainda que sujeita a recurso especial ou

extraordinário.

(1) CPP: “Art. 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da

autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou

do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva”. (2) CF: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos

estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos

seguintes: (...) LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;” (3) CPP: “Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por

conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e

indício suficiente de autoria.” (4) CPP: “Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão: I – comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas

condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II – proibição de acesso ou frequência a determinados lugares

quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; III – proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva

o indiciado ou acusado dela permanecer distante; IV – proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente

ou necessária para a investigação ou instrução; V – recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; VI – suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza

econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; VII – internação provisória

do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; VIII – fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o

comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial;

IX – monitoração eletrônica.”

ADC 43/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 7.11.2019. (ADC-43)

ADC 44/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 7.11.2019. (ADC-44)

ADC 54/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 7.11.2019. (ADC-54) (Informativo 958,

Plenário)

Receita Federal e compartilhamento de dados com o Ministério Público – 2

O Plenário, em conclusão e por maioria, ao apreciar o Tema 990 da Repercussão Geral, deu

provimento a recurso extraordinário para restabelecer a sentença condenatória de 1º grau. Discutiu-se a

possibilidade de compartilhamento com o Ministério Público, para fins penais, dos dados bancários e

fiscais do contribuinte, obtidos pela Receita Federal no legítimo exercício de seu dever de fiscalizar, sem

autorização prévia do Poder Judiciário (Informativo 960).

No caso, a Receita Federal, após procedimento administrativo e constituição do débito tributário,

encaminhou, ao Ministério Público Federal, Representação Fiscal Para Fins Penais (RFFP), com dados

regularmente obtidos no curso da fiscalização e remetidos em caráter sigiloso.

De posse destes elementos, e finalizado o procedimento preparatório de investigação, o Parquet

ofereceu denúncia contra os recorridos pela prática de crime contra a ordem tributária. Os acusados foram

condenados nas penas do art. 1º, I, da Lei 8.137/1990 (1) e absolvidos do crime previsto no art. 1º, II, do

mesmo diploma legal.

O tribunal de origem, ao dar parcial provimento à apelação interposta, reconheceu a ilicitude da

prova apresentada e invalidou a ação penal desde o início. Considerou que a materialidade delitiva foi

demonstrada exclusivamente com base no aludido procedimento administrativo fiscal da Receita Federal,

o qual foi encaminhado, mediante requisição, a membro do Ministério Público para a formação da opinio

Page 10: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

10

delicti, sem prévia autorização judicial. Concluiu, portanto, pela impossibilidade de a Receita Federal,

sem prévia autorização judicial, compartilhar dados obtidos pelo fisco com o Ministério Público Federal,

inclusive da RFFP

Inicialmente, o Plenário, por decisão majoritária, rejeitou preliminar suscitada pela Procuradoria-

Geral da República (PGR), no sentido de restringir a matéria discutida à questão debatida pelas instâncias

ordinárias, ou seja, o compartilhamento com o ministério público, de dados obtidos pela Receita Federal.

Vencidos os ministros Rosa Weber, Cármen Lúcia, Marco Aurélio e Celso de Mello, que não

admitiram a expansão do tema de repercussão geral — o compartilhamento pela Unidade de Inteligência

Financeira (UIF) dos relatórios de inteligência financeira (RIF) com órgãos de persecução penal para fins

criminais —, especialmente, por não haver debate prévio pelas instâncias de origem.

Quanto ao mérito, prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes.

Afirmou ser importante o exame da possibilidade ou não do compartilhamento nas duas hipóteses

(Receita e UIF). O mecanismo de compartilhamento e o destinatário para fins penais, a legislação

aplicada e os compromissos internacionais são os mesmos. A exclusão de uma análise poderia gerar mais

dúvidas do que certeza jurídica. Ademais, não raras vezes a atuação da Receita começa com informações

dadas pela UIF. Ainda que não houvesse o compartilhamento da UIF com o Ministério Público, a Receita,

quando o faz, compartilha o que obteve e o que a UIF houvera obtido.

Segundo o ministro, a regra constitucional é a proteção à inviolabilidade da intimidade e da vida

privada (art. 5º, X), bem assim à inviolabilidade de dados (art. 5º, XII), que incluem os dados financeiros,

sigilos bancário e fiscal. Entretanto, ela não é absoluta. Seja no direito constitucional brasileiro, seja no

direito comparado, os direitos fundamentais não podem servir como escudo protetivo à prática de

atividades ilícitas, de atividades criminosas. Não é essa a finalidade das garantias individuais, das

liberdades públicas. Em virtude de não se permitir um desvio de finalidade, não há mais dúvidas de que

existe a possibilidade de relativização dessas inviolabilidades se existirem situações excepcionais,

razoáveis e proporcionais.

A proteção lícita do exercício dos direitos fundamentais é prevista na Declaração Universal dos

Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU). Em seu art. XXIX, o documento afirma

tanto a finalidade quanto a relatividade dos direitos individuais. Na finalidade, sujeita o exercício dos

direitos e liberdades individuais às limitações estabelecidas pela lei.

O ministro Alexandre de Moraes sublinhou inexistir inconstitucionalidade em excepcionais

restrições às liberdades públicas, inclusive à intimidade, à vida privada e ao sigilo de dados, se a

finalidade for a garantia de direitos e liberdades dos demais membros da sociedade às justas exigências da

moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática. A excepcional relativização das

liberdades públicas, dentro de critérios razoáveis, é possível no âmbito dos três Poderes, salvo quando

exista expressamente cláusula de reserva jurisdicional, que não é a situação em apreço.

Nos sigilos financeiros, principalmente, há uma finalidade internacional da defesa da probidade,

combate à criminalidade organizada e à corrupção. A espécie trata de lei que relativiza o sigilo de dados e

o sigilo financeiro na área tributária [Lei Complementar (LC) 105/2001] e de outra norma que formatou a

inteligência financeira (Lei 9.613/1998).

Principiou a análise pelo compartilhamento da Receita Federal. Observou que, ao julgar em

conjunto ações diretas de inconstitucionalidade, o STF declarou ser possível à Receita o acesso a dados

genéricos e, se houver indícios de irregularidades e presentes os pressupostos legais, a instituição de

procedimento fiscalizatório, admitida a quebra do sigilo fiscal e bancário, para verificar se há ou não

ilicitude. Na ocasião, a Corte entendeu que a relativização da LC 105/2001, referente ao sigilo financeiro

e ao sigilo de dados, atendia aos requisitos de excepcionalidade, razoabilidade e proporcionalidade.

Cumpridos os padrões internacionais, esse compartilhamento, mecanismo de inteligência financeira, tinha

dupla finalidade: evitar o descumprimento de normas tributárias e combater práticas criminosas.

Posteriormente, ao apreciar o Tema 225 da Repercussão Geral (RE 601.314), o STF reiterou esse

posicionamento. Contudo, de forma mais impositiva, assinalou que o art. 6º da LC 105/2001 permite que,

instaurado o procedimento administrativo fiscal, a Receita Federal pode, atendidos os requisitos legais,

obter todos os dados, inclusive sigilosos, de transações bancárias e fiscais sem intermediação do Poder

Judiciário.

O ministro explicitou que, em ambos os julgados, o STF placitou a atuação da Receita Federal em

dois estágios importantes e sequenciais. O primeiro estágio — LC 105/2001, art. 5º (2) — é a

possibilidade de acesso às operações bancárias limitado aos dados genéricos e cadastrais dos correntistas,

vedada a inclusão de qualquer elemento que permita identificar a origem ou natureza dos gastos

efetuados. É acesso amplo ou sistêmico. Se, desses dados genéricos, surgirem informações indicativas da

Page 11: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

11

prática de um ilícito tributário, passa-se ao segundo estágio. No segundo — LC 105/2001, art. 5º, § 4º, e

art. 6º (3) —, há um acesso incidental. Neste, a Receita poderá requisitar as informações e os documentos

necessários, realizar fiscalização, auditoria, para a adequada apuração dos fatos. Percentualmente, o

número de procedimentos que chegam ao segundo estágio é muito pequeno. No âmbito da administração

tributária, é preciso haver a instauração de procedimento administrativo fiscal por ordem de superior

hierárquico e com prévia intimação do contribuinte. As provas produzidas nesse procedimento são lícitas.

Se não o instaurar, a Receita não poderá quebrar o sigilo. Para evitar-se abusos, há normatização.

Discorreu que é necessário passar pelos dois estágios para a informação chegar ao Ministério

Público. No segundo estágio, faz-se outro filtro. Há afunilamento gigantesco em todas as etapas,

verdadeiro rigor procedimental. Apenas o que for imprescindível poderá ou não ser compartilhado para

fins penais. Demais disso, é dever da Receita encaminhar as representações fiscais para fins penais ao

Parquet, consoante o art. 83 da Lei 9.430/1996, se constatada possível prática de ilícito penal.

Para o ministro, não permitir a informação da íntegra do procedimento fiscalizatório, com todos os

dados fiscais e bancários a partir dos quais verificada a materialidade e indícios de autoria, vai contra o

mecanismo legal de relativização. Não há sentido em se produzir prova lícita, obtida de acordo com a

Constituição e a legislação, e não permitir o compartilhamento com o titular da ação penal, que é outro

órgão de fiscalização. O compartilhamento dessa prova, obtida mediante procedimento regular, nada mais

é que típica prova emprestada, lícita. Somente serão enviadas as informações imprescindíveis. Deverá ser

encaminhada a prova lícita, produzida durante o procedimento que ensejou o lançamento definitivo do

tributo e trouxe indícios de autoria de um crime material contra a ordem tributária. Isso porque apenas a

partir do lançamento definitivo, conforme o Enunciado 24 da Súmula Vinculante do STF, a materialidade

do delito fica constatada.

A Receita pode enviar tudo — dados, provas, informações — que a fez chegar ao lançamento

definitivo do tributo e embasá-lo, por ser necessário à constituição da materialidade na infração penal. O

restante, como já é feito, ou se devolve ao contribuinte ou se destrói. Eventual excesso, qualquer desvio

formal ou material dessa atuação, deve ser combatido e poderá ser afastado pelo Poder Judiciário. Não há

inconstitucionalidade ou ilegalidade no compartilhamento entre Receita e Ministério Público das provas e

dados imprescindíveis à conformação e ao lançamento do tributo.

Na situação dos autos, a receita embasou e declarou o tributo. Enviou o que produziu ao Ministério

Público. Os denunciados foram acusados por suprimirem o recolhimento de imposto de renda de pessoa

física, mediante a omissão ao Fisco de obtenção de receitas tributáveis.

O ministro acentuou que o Brasil tem aprendido a importância da inteligência no combate à

corrupção e que o compartilhamento de dados, uns mais sigilosos que outros, exige a manutenção do

sigilo.

Entendeu ser constitucional o compartilhamento pela UIF dos seus relatórios com os órgãos de

persecução penal para fins criminais. Pontuou que a unidade recebe informações dos bancos, seguradoras,

cartórios, joalherias e produz relatórios. Cruza os dados, não checa a veracidade e não abre investigação.

A legislação estabelece as hipóteses em que a UIF deve ser obrigatoriamente comunicada. São as que

saem do normal do sistema financeiro, do sistema bancário. A Unidade produz relatórios, informações,

não só para estabelecer na via administrativa e legislativa novos mecanismos de prevenção, mas também

para punir quem eventualmente estiver praticando atividades ilícitas. A UIF não pode quebrar o sigilo

bancário e fiscal por conta própria. Pode trabalhar a informação, produzir relatório, identificar a

irregularidade e mandar para os demais órgãos, como a Receita a o Parquet.

Asseverou que a atuação da UIF, de ofício ou a pedido, é apenas nos limites legais. Se um órgão

pedir informação, a UIF deve devolver a resposta nos exatos limites que poderia realizar se fosse

espontaneamente. Não pode extrapolar e sequer tem poderes para isso. A UIF irá buscar no banco de

dados, que é preexistente e renovado diariamente, verificar e informar o que possui. Dessa maneira, o

ministro vislumbrou inexistir ilegalidade na atuação da UIF seja espontânea, seja em face de eventual

pedido.

Frisou que, se as informações forem enviadas ao Ministério Público, este, ao recebê-las, deverá

oficializar. O que chega do antigo Coaf, equivale a peças de informação, nos termos do Código de

Processo Penal (CPP). Caso o Parquet entenda ser preciso complementação, irá instaurar PIC ou

requisitar inquérito policial. Na hipótese de arquivamento, deverá promovê-lo consoante o CPP. Qualquer

peça de informação deve ter o mesmo tratamento dos relatórios de inteligência. Do contrário, o controle

jurisdicional do sistema acusatório previsto no CPP estará sendo ferido.

Page 12: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

12

Para o ministro, o Tribunal não deve fixar, desde logo, que taxativamente as informações são

meios de obtenção de prova. A UIF produz informações, não tem por finalidade produzir provas, mas

eventualmente as peças por ela produzidas podem ser utilizadas dentro do contraditório.

Vencidos os ministros Marco Aurélio e Celso de Mello, que negaram provimento ao recurso

extraordinário.

O ministro Marco Aurélio afirmou que somente órgão investido do ofício judicante pode afastar o

sigilo de dados.

O ministro Celso de Mello esclareceu que a questão discutida nestes autos consiste em saber se a

Receita Federal, com base nos documentos e informações obtidos das instituições financeiras, pode

compartilhá-los, ou não, com o Ministério Público ou com a autoridade policial para fins penais, sem

prévia autorização judicial.

Pontuou que que a noção de privacidade leva em consideração as múltiplas dimensões em que essa

ideia nuclear se desenvolve, projetando-se no plano da privacidade financeira, que se revela comum tanto

às pessoas físicas quanto às pessoas jurídicas.

Esse tema ganha maior relevo se se considerar o círculo de proteção que o ordenamento

constitucional estabeleceu em torno das pessoas em geral, notadamente dos contribuintes do Fisco e

daquelas sujeitas a investigação criminal, objetivando protegê-los contra ações eventualmente arbitrárias

praticadas pelos órgãos estatais. Isso confere especial importância ao postulado da proteção judicial

efetiva, que torna inafastável a necessidade de autorização judicial para efeito de exposição e revelação de

dados protegidos pela cláusula do sigilo bancário.

A reserva de jurisdição traduz inestimável garantia institucional de proteção a direitos, liberdades e

prerrogativas fundamentais das pessoas em geral, cuja integridade merece tutela especial do Estado,

concretizada mediante respeito à cláusula constitucional da proteção judicial efetiva.

Em havendo situação de colidência entre princípios impregnados de qualificação constitucional,

como pode ocorrer entre as prerrogativas institucionais da administração tributária, de um lado, e os

direitos e garantias básicas dos contribuintes, de outro, a resolução desse estado de antagonismo deverá

constituir objeto de um pertinente juízo de ponderação, a ser exercido não por um dos sujeitos parciais da

relação litigiosa, que certamente atuaria “pro domo sua”, mas, isso sim, por um terceiro juridicamente

desinteressado, como os órgãos integrantes do Poder Judiciário.

A submissão do Fisco, da autoridade policial e do Ministério Público às limitações decorrentes da

cláusula da reserva de jurisdição não desampara o legítimo exercício de suas atividades institucionais,

pois estes sempre poderão pretender o acesso às contas bancárias e aos dados existentes em instituições

financeiras, referentes aos contribuintes e as pessoas em geral, desde que o façam por intermédio do

Poder Judiciário, expondo a sua postulação ao controle e à supervisão dos juízes e tribunais.

Asseverou que a estrutura de normatividade que conforma, no plano doméstico, o exercício da

missão pública e do papel institucional atribuídos, no âmbito internacional, à UIF, não se ressente de

qualquer eiva de inconstitucionalidade senão que apenas reflete, como precedentemente assinalado, o fiel

cumprimento de obrigações assumidas pelo Estado brasileiro, seja no domínio global, seja na esfera

regional.

O ministro Dias Toffoli (relator) retificou o voto.

O Tribunal deliberou fixar a tese de repercussão geral em assentada posterior.

Por fim, a Corte revogou tutela provisória anteriormente concedida.

(1) Lei 8.137/1990: “Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e

qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: I – omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias; II

– fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;”

(2) LC 105/2001: “Art. 5º O Poder Executivo disciplinará, inclusive quanto à periodicidade e aos limites de valor, os

critérios segundo os quais as instituições financeiras informarão à administração tributária da União, as operações financeiras efetuadas pelos usuários de seus serviços § 1º Consideram-se operações financeiras, para os efeitos deste artigo: I – depósitos à vista

e a prazo, inclusive em conta de poupança; II – pagamentos efetuados em moeda corrente ou em cheques; III – emissão de ordens de

crédito ou documentos assemelhados; IV – resgates em contas de depósitos à vista ou a prazo, inclusive de poupança; V – contratos de mútuo; VI – descontos de duplicatas, notas promissórias e outros títulos de crédito; VII – aquisições e vendas de títulos de renda

fixa ou variável; VIII – aplicações em fundos de investimentos; IX – aquisições de moeda estrangeira; X – conversões de moeda

estrangeira em moeda nacional; XI – transferências de moeda e outros valores para o exterior; XII – operações com ouro, ativo financeiro; XIII - operações com cartão de crédito; XIV - operações de arrendamento mercantil; e XV – quaisquer outras operações

de natureza semelhante que venham a ser autorizadas pelo Banco Central do Brasil, Comissão de Valores Mobiliários ou outro

órgão competente. § 2º As informações transferidas na forma do caput deste artigo restringir-se-ão a informes relacionados com a identificação dos titulares das operações e os montantes globais mensalmente movimentados, vedada a inserção de qualquer

elemento que permita identificar a sua origem ou a natureza dos gastos a partir deles efetuados. § 3º Não se incluem entre as

Page 13: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

13

informações de que trata este artigo as operações financeiras efetuadas pelas administrações direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. § 4º Recebidas as informações de que trata este artigo, se detectados indícios de falhas,

incorreções ou omissões, ou de cometimento de ilícito fiscal, a autoridade interessada poderá requisitar as informações e os

documentos de que necessitar, bem como realizar fiscalização ou auditoria para a adequada apuração dos fatos. § 5º As informações a que refere este artigo serão conservadas sob sigilo fiscal, na forma da legislação em vigor.”

(3) LC 105/2001: “Art. 6º As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos

Municípios somente poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames

sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente.”

RE 1055941/SP, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 27 e 28.11.2019. (RE-1055941)

(Informativo 961, Plenário)

Parte 1 -

Parte 2 -

Organização dos Poderes

Possibilidade de vinculação das verbas do Fundef ao pagamento de honorários advocatícios

contratuais A Primeira Turma, por maioria, negou provimento a agravo regimental em recurso extraordinário

com agravo em que discutido se os recursos destinados ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do

Ensino Fundamental e de Valoração do Magistério (Fundef) poderiam ser utilizados para o pagamento de

honorários advocatícios contratuais.

O Colegiado, na linha de precedente do STF (RE 1.102.885), entendeu que a matéria possui

natureza infraconstitucional. O acórdão impugnado considerou viável a retenção do valor de honorários

advocatícios contratuais da verba executada, na forma do art. 22, § 4º da Lei 8.906/1994 (1), de modo que

não há matéria constitucional a ser analisada.

Vencidos os ministros Alexandre de Moraes e Luiz Fux, que proveram o agravo por entenderem

que a utilização das verbas destinadas ao Fundef para o pagamento de honorários advocatícios contratuais

viola diretamente o art. 60 do ADCT (2). Portanto, trata-se de matéria de cunho constitucional que deve

ser examinada pela Corte.

(1) Lei 8.906/1994: “Art. 22. A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários

convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência. (...) § 4º Se o advogado fizer juntar aos autos o seu contrato de honorários antes de expedir-se o mandado de levantamento ou precatório, o juiz deve determinar que lhe sejam pagos

diretamente, por dedução da quantia a ser recebida pelo constituinte, salvo se este provar que já os pagou. ”

(2) ADCT: “Art. 60. Nos dez primeiros anos da promulgação da Constituição, o Poder Público desenvolverá esforços, com a mobilização de todos os setores organizados da sociedade e com a aplicação de, pelo menos, cinquenta por cento dos recursos a

que se refere o art. 212 da Constituição, para eliminar o analfabetismo e universalizar o ensino fundamental. ”

ARE 1066359 AgR/AL, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 26.11.2019. (ARE-1066359)

(Informativo 961, Primeira Turma)

Competência do STF e ação ordinária contra ato do CNJ – 3 A Segunda Turma, em conclusão e por maioria, negou provimento a agravo regimental em

reclamação para determinar a competência do STF para apreciar ação ordinária ajuizada contra ato do

Conselho Nacional de Justiça (CNJ) (Informativos 796 e 809).

Na espécie, o CNJ anulou resolução administrativa de tribunal e determinou a suspensão de

processo de escolha de desembargador no âmbito daquela Corte. A justiça comum de primeira instância,

então, deferiu liminar em ação ordinária ajuizada para suspender a referida decisão do CNJ.

O Colegiado afirmou que a Constituição Federal de 1988 (CF) conferiu ao CNJ a competência para

exercer o controle da atuação administrativa do Poder Judiciário (CF, art. 103-B, § 4º, II) (1). Outrossim,

o julgamento das questões relativas ao desempenho das atribuições daquele órgão compete ao STF, não

havendo, conforme inferido do disposto no art. 102, I, r, da CF, restrição ao instrumento processual a ser

utilizado, como ocorre com as autoridades mencionadas na alínea d do mesmo dispositivo constitucional

(2).

Vencidos os ministros Teori Zavascki e Celso de Mello, que deram provimento ao agravo.

Page 14: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

14

(1) CF: “Art. 103-B. O Conselho Nacional de Justiça compõe-se de 15 (quinze) membros com mandato de 2 (dois) anos, admitida 1 (uma) recondução, sendo: (...) § 4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder

Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas

pelo Estatuto da Magistratura: (...) II – zelar pela observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo

para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência do Tribunal de Contas da

União;” (2) CF: “Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I –

processar e julgar, originariamente: (...) d) o ‘habeas corpus’, sendo paciente qualquer das pessoas referidas nas alíneas anteriores; o

mandado de segurança e o ‘habeas data’ contra atos do Presidente da República, das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, do Tribunal de Contas da União, do Procurador-Geral da República e do próprio Supremo Tribunal Federal; (...) r) as ações

contra o Conselho Nacional de Justiça e contra o Conselho Nacional do Ministério Público.”

Rcl 15551 AgR/GO, rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 26.11.2019. (Rcl-15551) (Informativo

961, Primeira Turma)

Tribunal de Contas da União

TCU e competência para fiscalizar os recursos do Fundo Constitucional do Distrito Federal

O Tribunal de Contas da União (TCU) é o órgão competente para fiscalizar os recursos

decorrentes do Fundo Constitucional do Distrito Federal.

Com base nesse entendimento, a Segunda Turma negou provimento a agravo regimental em

mandado de segurança.

No caso, o agravante sustentava que os recursos do mencionado fundo, por disposição do art. 21,

XIV, da Constituição Federal (CF) (1), traduziriam receitas obrigatórias, e, por conseguinte, pertenceriam

ao Distrito Federal, razão pela qual sua fiscalização estaria a cargo da corte de contas distrital.

A Turma afirmou que os recursos destinados ao custeio dos serviços públicos previstos no referido

dispositivo constitucional pertencem aos cofres federais.

Rememorou que compete à União legislar sobre a organização das Polícias Civil e Militar e do

Corpo de Bombeiros no âmbito do Distrito Federal, justamente porque caberá a ela – União – suportar os

ônus correspondentes, com recursos do Tesouro Nacional.

Assim, os recursos destinados à manutenção da segurança pública e execução de serviços públicos

do Distrito Federal pertencem ao Tesouro Nacional, de modo que é inafastável a conclusão no sentido de

que a fiscalização de sua aplicação compete ao TCU (CF, art. 70, parágrafo único, e 71, VI) (2).

(1) CF: “Art. 21. Compete à União: (...) XIV – organizar e manter a polícia civil, a polícia militar e o corpo de bombeiros

militar do Distrito Federal, bem como prestar assistência financeira ao Distrito Federal para a execução de serviços públicos, por meio de fundo próprio;

(2) CF: “Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da

administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder. Parágrafo

único. Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza

pecuniária. (...) Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da

União, ao qual compete: (...) VI – fiscalizar a aplicação de quaisquer recursos repassados pela União mediante convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos congêneres, a Estado, ao Distrito Federal ou a Município”.

MS 28584/DF, rel. orig. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ o ac. Min. Edson Fachin, julgamento

em 29.10.2019. (MS-28584) (Informativo 958, Segunda Turma)

TCU: decadência e suspensão de pagamentos de contratos – 3 Em conclusão de julgamento, a Primeira Turma negou provimento a agravo regimental interposto

de decisão que denegou a ordem em mandado de segurança impetrado contra ato do Tribunal de Contas

da União (TCU) (Informativos 922 e 943).

Na espécie, o relator do processo no TCU concedeu medida cautelar para determinar ao Banco

Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), ao BNDES Participações S.A.

(BNDESPAR) e à Agência Especial de Financiamento Industrial (Finame) a suspensão temporária dos

pagamentos dos contratos de confissão de dívida celebrados com a Fundação de Assistência e Previdência

Social do BNDES (Fapes) até a deliberação definitiva sobre a questão.

Page 15: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

15

A Fapes (impetrante) sustentava ser inviável, em face do art. 54 da Lei 9.784/1999 (1), a pretensão

de invalidar contratos de confissão de dívida firmados em 2002 e 2004, por meio de processo

administrativo iniciado em 23.11.2016. Ademais, alegava que o TCU não tem a prerrogativa de,

diretamente, sustar ou anular contratos. Apontava ofensa ao art. 71, IX, X e § 1º, da Constituição Federal

(CF); ao art. 45, § 2º, da Lei 8.443/1992 e ao art. 54 da Lei 9.784/1999.

Inicialmente, o Colegiado afastou a decadência administrativa, haja vista a inaplicabilidade do

prazo decadencial quinquenal, previsto no art. 54 da Lei 9.784/1999, para regular a atuação da autoridade

impetrada em processo de tomada de contas, regido pela Lei 8.443/1992, que consubstancia norma

especial. No ponto, citou precedentes do STF: MS 25.641; MS 33.414 AgR; MS 26.297 AgR.

Aduziu que o ato impugnado no mandado de segurança foi proferido em representação que pode

ser convertida em tomada de contas especial, circunstância a conjurar, por si só, a pretendida aplicação

linear do disposto no art. 54 da Lei 9.784/1999.

Ressaltou que, ao contrário do que sustenta a Fapes, a tese chancelada pelo STF nos precedentes

mencionados não foi meramente a da ausência de “decadência intercorrente”, mas a de que o prazo

decadencial para anulação de atos de que decorram efeitos favoráveis aos administrados, previsto no art.

54 da Lei 9.784/1999, não se aplica aos processos de tomada de contas.

A compreensão de que o prazo decadencial quinquenal é impróprio para regular a atuação da Corte

de Contas em processo que pode resultar na apuração de prejuízo ao erário e na correlata imputação de

débito aos responsáveis é consentânea com o entendimento firmado pelo STF no julgamento do RE

852.475 (Tema 897 da repercussão geral), em que assentada a seguinte tese: “São imprescritíveis as ações

de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade

Administrativa”.

Frisou, ainda, que o estágio primitivo das apurações conduzidas pela autoridade impetrada não

autoriza descartar a configuração de flagrante inconstitucionalidade nos contratos de confissão de dívida,

a qual, se demonstrada, poderá afastar o prazo decadencial da Lei 9.784/1999. O TCU poderá se

pronunciar sobre a compatibilidade dos contratos de confissão de dívida com o previsto no art. 202, § 3º,

da CF (2) somente após a fixação de todos os parâmetros de índole fática — a análise da efetiva

existência dos débitos reconhecidos pelos patrocinadores da Fapes (BNDES, BNDESPAR e Finame) e,

em caso positivo, da data dos respectivos fatos geradores, bem como da natureza das contribuições

vertidas em decorrência dos contratos de confissão de dívida, o que não pode ser feito em mandado de

segurança. Asseverou que não há de se falar em “inconstitucionalidade flagrante presumida” e registrou o

aceno da autoridade impetrada no sentido de que mesmo a demarcação das datas dos fatos geradores das

dívidas em período anterior à EC 20/1998 não é suficiente, por si, para elidir a regra da paridade

contributiva. Isso porque, na espécie, os contratos de confissão de dívida somente foram celebrados após

o prazo previsto nos arts. 5º e 6º da referida emenda (3).

Além disso, mesmo que se admitisse a submissão do TCU aos ditames do art. 54 da Lei

9.784/1999, a etapa embrionária das apurações empreendidas não autorizaria juízo antecipado sobre a

configuração da decadência, ante a possível identificação de má-fé ou de medida impugnativa apta a

impedir o decurso do prazo decadencial (Lei 9.784/1999, art. 54, caput, parte final, e § 2º,

respectivamente).

A Turma esclareceu não se estar a presumir a má-fé. Na decisão agravada, consta apenas que a

má-fé, ou a adoção de medida impugnativa apta a impedir o decurso do prazo decadencial, poderá ser

evidenciada pelo TCU quando do julgamento definitivo da representação. Isso também impede o

enquadramento linear do ato como eivado de ilegalidade ou abuso de poder com a liquidez e a certeza

exigidas em sede mandamental.

Não vislumbrou direito líquido e certo à incidência do prazo quinquenal, considerados os

precedentes do STF que: (a) não admitem a submissão de processo de tomada de contas especial ao

estabelecido no art. 54 da Lei 9.784/1999; (b) afastam a aplicação desse dispositivo legal se evidenciada

flagrante inconstitucionalidade; e (c) asseveram a possibilidade de apuração de má-fé e a de indicação de

medida impugnativa ao longo do processo administrativo.

Noutro passo, o Colegiado rejeitou a apontada ofensa ao art. 71, § 1º, da CF (4). Embora o TCU

não possa, diretamente, sem prévia submissão da matéria ao Congresso Nacional, determinar a sustação

ou a anulação de contrato, pode determinar às unidades fiscalizadas que adotem medidas voltadas à

anulação de ajustes contratuais, com base no art. 71, IX, da CF (5). Ademais, as atribuições

constitucionais conferidas ao TCU pressupõem a outorga de poder geral de cautela àquele órgão. Ambas

as prerrogativas conduzem ao reconhecimento da legitimidade do ato impugnado e afastam a

configuração de ilegalidade ou de abuso de poder.

Page 16: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

16

Se a autoridade impetrada pode vir a determinar que o BNDES, o BNDESPAR e a Finame anulem

os contratos de confissão de dívida, atrelado a essa possível determinação está o poder geral de cautela de

impor a suspensão dos repasses mensais decorrentes dessas avenças, como forma de assegurar o próprio

resultado útil da futura manifestação da Corte de Contas.

Por fim, a possibilidade de o TCU impor a indisponibilidade de bens contempla a prerrogativa de

decretar a indisponibilidade de créditos devidos pelos aludidos patrocinadores, como decorrência do

contrato de confissão de dívida.

(1) Lei 9.784/1999: “Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos

favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé. § 1º No

caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento. § 2º Considera-se

exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.” (2) CF: “Art. 202. O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação

ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e

regulado por lei complementar. (...) § 3º É vedado o aporte de recursos a entidade de previdência privada pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, suas autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista e outras entidades

públicas, salvo na qualidade de patrocinador, situação na qual, em hipótese alguma, sua contribuição normal poderá exceder a do

segurado.” (3) EC 20/1998: “Art. 5º O disposto no art. 202, § 3º, da Constituição Federal, quanto à exigência de paridade entre a

contribuição da patrocinadora e a contribuição do segurado, terá vigência no prazo de dois anos a partir da publicação desta

Emenda, ou, caso ocorra antes, na data de publicação da lei complementar a que se refere o § 4º do mesmo artigo. Art. 6º As entidades fechadas de previdência privada patrocinadas por entidades públicas, inclusive empresas públicas e sociedades de

economia mista, deverão rever, no prazo de dois anos, a contar da publicação desta Emenda, seus planos de benefícios e serviços, de

modo a ajustá-los atuarialmente a seus ativos, sob pena de intervenção, sendo seus dirigentes e os de suas respectivas patrocinadoras responsáveis civil e criminalmente pelo descumprimento do disposto neste artigo.”

(4) CF: “Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da

União, ao qual compete: (...) § 1º No caso de contrato, o ato de sustação será adotado diretamente pelo Congresso Nacional, que solicitará, de imediato, ao Poder Executivo as medidas cabíveis.”

(5) CF: “Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da

União, ao qual compete: (...) IX – assinar prazo para que o órgão ou entidade adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, se verificada ilegalidade;”

MS 35038 AgR/DF, rel. Min. Rosa Weber, julgamento em 12.11.2019. (MS-35038) (Informativo

959, Primeira Turma)

Page 17: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

17

DIREITO FINANCEIRO

Dívida Pública

Plano Real: Nota do Tesouro Nacional e índice de correção – 2 É constitucional o art. 38 (1) da Lei 8.880/1994, não importando a aplicação imediata desse

dispositivo violação do art. 5º, XXXVI (2), da Constituição Federal (CF).

Com base nesse entendimento, a Primeira Turma, em conclusão de julgamento e por maioria,

negou provimento a recurso extraordinário em que se discutia a incidência da norma de correção

monetária prevista no art. 38 da Lei 8.880/1994 a negócio jurídico formalizado antes da sua vigência

(Informativo 904).

No caso, as partes pactuaram Notas do Tesouro Nacional (NTN), com vencimento em 1º.11.1994,

fixando o Índice Geral de Preços de Mercado (IGPM) como indexador de atualização do valor nominal. O

tribunal de origem, ao reformar a decisão do juízo, afastou o critério de correção monetária determinado e

consignou a aplicabilidade do art. 38 da Lei 8.880/1994, norma superveniente.

A Turma afirmou que o Plenário, ao julgar a ADPF 77, concluiu pela constitucionalidade do

referido dispositivo legal.

Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que deu provimento ao recurso para restabelecer o

entendimento contido na sentença, que utilizou o IGPM previsto na Lei 8.249/1991. Para o ministro, se as

NTNs foram contratadas de acordo com a legislação da época, tem-se como configurado ato jurídico

perfeito a revelar relação jurídica projetada no tempo.

(1) Lei 8.880/1994: “Art. 38. O cálculo dos índices de correção monetária, no mês em que se verificar a emissão do Real de

que trata o art. 3º desta lei, bem como no mês subseqüente, tomará por base preços em Real, o equivalente em URV dos preços em

cruzeiros reais, e os preços nominados ou convertidos em URV dos meses imediatamente anteriores, segundo critérios estabelecidos

em lei. Parágrafo Único. Observado o disposto no parágrafo único do art. 7º, é nula de pleno direito e não surtirá nenhum efeito a aplicação de índice, para fins de correção monetária, calculado de forma diferente da estabelecida no caput deste artigo.”

(2) CF: “Art. 5º: (...) XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;”

RE 307108/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em

12.11.2019. (RE-307108) (Informativo 959, Primeira Turma)

Page 18: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

18

DIREITO PENAL

Aplicação da Lei Penal

Dupla persecução penal em âmbito internacional A Segunda Turma concedeu a ordem em habeas corpus para determinar o trancamento de ação

penal movida contra o paciente, denunciado pela suposta prática do crime de lavagem de capitais, em

razão de haver transferido dinheiro oriundo de tráfico de drogas da Suíça para o Brasil, utilizando-se de

contrato de fachada para dar aparência de licitude aos ativos em solo brasileiro.

No caso, o paciente já teria sido processado e julgado na Suíça pelos mesmos fatos, o que

culminou em condenação transitada em julgado e cômputo de período de encarceramento de caráter

preventivo como execução antecipada da pena naquele Estado.

De acordo com o Superior Tribunal de Justiça, o fato de o crime também ter sido cometido no

Brasil, uma vez que a execução e os efeitos da lavagem de dinheiro ocorreram em território nacional,

permite a persecução penal pela justiça brasileira, independentemente de outra condenação no exterior.

Dessa forma, adota-se o princípio da territorialidade, nos termos do art. 5º do Código Penal (CP) (1),

segundo o qual aplica-se a lei brasileira a qualquer crime cometido no Brasil.

Inicialmente, a Turma reconheceu que os fatos apreciados pela justiça brasileira são coincidentes

com os já analisados pelo Estado suíço.

Ademais, apontou que a redação do art. 5º do CP contém a ressalva de que devem ser observados

convenções, tratados e regras de direito internacional. Desse modo, deve-se cotejar a redação dos arts. 5º,

6º e 8º do CP (2) com o que dispõe a Lei 13.445/2017 (Lei de Migração), a qual elenca o rol de casos em

que o Estado brasileiro não concede extradição, notadamente o disposto no art. 82, V (3). O art, 100,

caput, (4) do mesmo diploma legal exige a observância do princípio do ne bis in idem.

A proteção ao indivíduo selada por esses dispositivos é muito cara ao direito brasileiro. Revela-se

evidente garantia contra nova persecução penal pelos mesmos fatos, de modo a se consagrar a proibição

de dupla persecução penal também entre países, no âmbito internacional.

Por outro lado, de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), assentou-se o

status normativo supralegal aos tratados internacionais de direitos humanos, ou seja, abaixo da

Constituição, mas acima das leis infraconstitucionais.

Portanto, consagrou-se que o controle de convencionalidade pode ser realizado sobre as leis

infraconstitucionais. Assim, o CP deve ser aplicado em conformidade com os direitos assegurados na

Convenção Americana de Direitos Humanos e com o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos.

Em relação à proibição de dupla persecução penal, tais diplomas o fazem de forma expressa

(CADH, art. 8.4; PIDCP, art. 14.7) (5).

O STF já teve a oportunidade de se manifestar a respeito dessas regras, e, ao fazê-lo obstou o

prosseguimento de processo penal quanto a fatos já julgados por jurisdição diversa (Ext 1.223).

Assim, o exercício do controle de convencionalidade, tendo por paradigmas os dispositivos do art.

14.7, do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e do art. 8.4, da Convenção Americana de

Direitos Humanos, determina a vedação à dupla persecução penal, ainda que em jurisdições de países

distintos.

Por sua vez, o art. 8º do CP deve ser lido em conformidade com os preceitos convencionais e a

jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), vedando-se a dupla persecução

penal por idênticos fatos.

Por fim, a vedação à dupla persecução penal em âmbito internacional deve ser ponderada com a

soberania dos Estados e com as obrigações processuais positivas impostas pela CIDH.

Em casos de violação de tais deveres de investigação e persecução efetiva, o julgamento em país

estrangeiro pode ser considerado ilegítimo, como em precedentes em que a própria CIDH determinou a

reabertura de investigações em processos de Estados que não verificaram devidamente situações de

violações de direitos humanos.

Portanto, se houver a devida comprovação de que o julgamento em outro país sobre os mesmos

fatos não se realizou de modo justo e legítimo, desrespeitando obrigações processuais positivas, a

Page 19: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

19

vedação de dupla persecução pode ser eventualmente ponderada para complementação em persecução

interna.

Contudo, neste caso concreto, não há qualquer elemento que indique dúvida sobre a legitimidade

da persecução penal e da punição imposta em processo penal na Suíça por idênticos fatos ao agora

denunciado no Brasil. Dessa forma, a proibição de dupla persecução deve ser respeitada de modo integral,

nos termos constitucionais e convencionais.

(1) CP: “Art. 5º. Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime

cometido no território nacional.” (2) CP: “Art. 6º. Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem

como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado. Art. 8º. A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil

pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas.” (3) Lei 13.445/2017: “Art. 82. Não se concederá a extradição quando: (...) V – o extraditando estiver respondendo a

processo ou já houver sido condenado ou absolvido no Brasil pelo mesmo fato em que se fundar o pedido;”

(4) Lei 13.445/2017: “Art. 100. Nas hipóteses em que couber solicitação de extradição executória, a autoridade competente poderá solicitar ou autorizar a transferência de execução da pena, desde que observado o princípio do non bis in idem.”

(5) CADH, art. 8.4: “O acusado absolvido por sentença passada em julgado não poderá ser submetido a novo processo

pelos mesmos fatos”; PIDCP, art. 14.7: “Ninguém poderá ser processado ou punido por um delito pelo qual já foi absolvido ou condenado por sentença passada em julgado, em conformidade com a lei e os procedimentos penais de cada país”.

HC 171118/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 12.11.2019. (HC-171118) (Informativo

959, Segunda Turma)

Legislação Penal especial

Tráfico privilegiado de drogas e revaloração de fatos e provas – 2 A Segunda Turma, em conclusão de julgamento, ante o empate na votação, concedeu a ordem em

habeas corpus no qual discutida a possibilidade de revaloração de fatos e provas para fins de aplicação da

causa especial de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º (1), da Lei 11.343/2006, no caso de

condenação por tráfico transnacional de drogas de réu considerado integrante de organização criminosa

pelo juízo a quo (Informativo 931).

Prevaleceu o voto do ministro Gilmar Mendes, que aplicou o citado redutor do § 4º do art. 33 por

considerar preenchidas as condições do tráfico privilegiado, uma vez que o réu é primário, com bons

antecedentes, sem qualquer indicação de envolvimento em atividades ilícitas.

Asseverou que as provas dos autos não são aptas a demonstrar o envolvimento do paciente em

organização criminosa. A habitualidade e o pertencimento a organizações criminosas deverão ser

comprovados, afastada a simples presunção. Se não houver prova nesse sentido, o condenado fará jus à

redução da pena. Assim, a quantidade e a natureza são circunstâncias que, apesar de configurarem

elementos determinantes na modulação da causa de diminuição, por si sós, não são aptas a comprovar o

envolvimento com o crime organizado ou a dedicação a atividades criminosas.

Vencidos os ministros Ricardo Lewandowski (relator) e Cármen Lúcia, que negaram provimento

ao agravo regimental para denegar a ordem. Reputaram inadequado, em habeas corpus, reexaminar fatos

e provas no tocante à participação do paciente em organização criminosa ou à valoração da quantidade da

droga apreendida, quando utilizados como fundamento para afastar ou dosar a causa de diminuição de

pena aquém do patamar máximo.

(1) Lei 11.343/2006: “Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda,

oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: (...) § 4º Nos delitos definidos no

caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de

direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.”

HC 152001 AgR/MT, rel. orig. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ o ac. Min. Gilmar Mendes,

julgamento em 29.10.2019. (HC-152001) (Informativo 958, Segunda Turma).

Page 20: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

20

Pena

Regime semiaberto e execução provisória da pena A Primeira Turma, por maioria, concedeu a ordem de habeas corpus impetrado contra decisão

monocrática de ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), para afastar a execução provisória de

título condenatório.

No caso, o magistrado de primeiro grau condenou a paciente a quatro anos e dois meses de

reclusão, em regime inicial semiaberto de cumprimento, e ao pagamento de 20 dias-multa, ante a prática

da infração descrita no art. 171 (estelionato) (1), na forma do 71 (continuidade delitiva) (2), do Código

Penal (CP).

Em seguida, o tribunal de origem desproveu a apelação interposta pela defesa e determinou a

expedição de mandado de prisão.

A Turma rememorou que, ao julgar as ADCs 43, 44 e 54, o Plenário fixou entendimento pela

impossibilidade de execução provisória da pena.

Ressaltou que em nenhum momento foi decretada a prisão preventiva. Além disso, apesar da

gravidade do delito, o juízo condenou a paciente ao regime semiaberto.

Vencidos os ministros Roberto Barroso e Luiz Fux, que não conheceram da impetração.

Acolheram a preliminar pelo não cabimento do writ, suscitada pela Procuradoria-Geral da República

(PGR), em razão de o habeas corpus ser substitutivo de recurso ordinário.

(1) CP: “Art. 171 – Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em

erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:”

(2) CP: “Art. 71 – Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como

continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em

qualquer caso, de um sexto a dois terços.”

HC 169727/RS, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 26.11.2019. (HC-169727) (Informativo

961, Primeira Turma)

Page 21: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

21

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Reclamação

Cabimento de reclamação e precedente de repercussão geral – 2 A erronia na observância de pronunciamento do Supremo Tribunal Federal (STF) formalizado, em

recurso extraordinário, sob o ângulo da repercussão geral, enseja, esgotada a jurisdição na origem

considerado o julgamento de agravo, o acesso àquela Corte mediante a reclamação.

Com base nesse entendimento, a Primeira Turma, em conclusão de julgamento, negou provimento

a agravo regimental interposto contra decisão monocrática que julgou procedente reclamação. A decisão

reclamada cassou o acórdão do Superior Tribunal de Justiça que desproveu o agravo protocolado contra o

trancamento do recurso extraordinário, e determinou a sua remessa ao STF para apreciação (Informativo

904).

Rcl 26874 AgR/SP, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 12.11.2019. (Rcl-26874)

(Informativo 959, Primeira Turma)

Page 22: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

22

DIREITO PROCESSUAL PENAL

Habeas Corpus

Execução provisória e prisão domiciliar – 2 A Segunda Turma, em conclusão de julgamento e por maioria, concedeu, de ofício, a ordem de

habeas corpus para declarar a ilegalidade da execução provisória da pena e, assim, revogar a prisão

decretada por tal fundamento, se inexistente outro motivo para a segregação do paciente e se ausentes

fundamentos concretos de prisão preventiva, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal (CPP)

(1) e em conformidade com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) (Informativo 926).

O Colegiado aplicou orientação jurisprudencial acerca da execução provisória da pena, firmada em

recente julgamento de ações declaratórias de constitucionalidade pelo Plenário.

Nesta assentada, o ministro Gilmar Mendes (relator) reajustou o voto anteriormente proferido para

aplicar o entendimento da Corte. A ministra Cármen Lúcia salientou ser hipótese de execução de

condenação confirmada pela segunda instância, pendente de trânsito em julgado. O ministro Ricardo

Lewandowski alertou não vislumbrar distinção, no que diz respeito ao Tribunal do Júri, quanto à decisão

tomada pelo Plenário do STF. Por seu turno, o ministro Celso de Mello asseverou que o fato de ter sido

emanada pelo Tribunal do Júri não pode ser invocado para justificar a possibilidade de execução

antecipada ou provisória da condenação penal recorrível.

Vencido, em parte, o ministro Edson Fachin que, ao acompanhar o posicionamento inicialmente

formulado pelo relator, concedeu parcialmente a ordem pleiteada a fim de, mantida a execução, converter

a prisão em domiciliar, ante a imprescindibilidade do paciente aos cuidados dos netos menores de 12

anos, órfãos de pai e mãe. A seu ver, não se aplica à hipótese o que deliberado no Plenário. O caso chama

à colação o entendimento firmado no HC 118.770, julgado na Primeira Turma, segundo o qual a execução

da condenação pelo Tribunal do Júri não viola o princípio da presunção de inocência ou da não

culpabilidade. Por fim, o ministro acrescentou que ainda não foi apreciado o Tema 1.068 da repercussão

geral (RE 1.235.340), para saber sobre a extensão da dimensão da soberania dos vereditos do Tribunal do

Júri e eventual execução imediata de sentença.

(1) CPC: “Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por

conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer

das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares “

HC 163814 ED/MG, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 19.11.2019. (HC-163814)

(Informativo 960, Segunda Turma)

Expulsão de paciente que tem filho sob a sua guarda e dependência econômica – 3

A Primeira Turma, por maioria e em conclusão de julgamento, não conheceu de habeas corpus,

mas concedeu a ordem de ofício para determinar que o Ministro da Justiça proceda à revisão da portaria

mediante a qual ordenada a expulsão do paciente, tendo em conta as novas provas apresentadas pela

defesa e os termos da Lei 13.445/2017 (Lei de Migração). De igual modo, suspendeu os efeitos do ato

expulsório até ulterior deliberação do referido órgão do Poder Executivo.

Trata-se, na espécie, de estrangeiro que teve sua expulsão determinada depois de transitar em

julgado a decisão em que condenado pela prática de delitos no território nacional (Informativos 929 e

939).

De início, o Colegiado observou que, pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF),

seria hipótese de extinção do habeas corpus sem resolução do mérito, uma vez que impetrado contra

decisão monocrática na qual indeferida a liminar pleiteada em habeas corpus no Superior Tribunal de

Justiça (STJ). Não bastasse isso, sobreveio o julgamento definitivo da impetração naquela Corte.

Sem prejuízo de assim entender, salientou que a atual Lei de Migração não autoriza a expulsão de

estrangeiro quando for comprovada a existência de filho brasileiro que esteja sob sua guarda ou

dependência econômica ou socioafetiva (Lei 13.445/2017, art. 55, II, a).

Assinalou que o STJ, ao denegar a ordem, assentou a absoluta falta de prova de convivência ou de

vínculos afetivos mínimos do paciente com prole brasileira que pudesse impedir sua expulsão. Na mesma

Page 23: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

23

linha, o Ministério da Justiça, ao prestar informações, frisou a inexistência de comprovação de vínculos

afetivos ou materiais mínimos entre o paciente e a prole.

No entanto, esclareceu que a defesa fez vir aos autos a notícia do nascimento de filho do

estrangeiro e anexou ao processo cópia de sentença homologatória de acordo firmado entre ele e a mãe do

menor para fixação de guarda, regime de visitas e obrigação alimentar em benefício da criança. Estes

elementos supervenientes não foram objeto de manifestação do Ministro da Justiça, tampouco das

instâncias anteriores que apreciaram a questão.

À vista disso, a Turma vislumbrou forte plausibilidade jurídica no pedido apresentado pelo

impetrante, que, se for realmente comprovado, impede sua expulsão. Se, de um lado, a via restrita do

habeas corpus não se mostra adequada à dilação probatória, do outro, a sumária denegação do presente

writ sujeitaria o paciente a sério risco de imediato cumprimento do ato expulsório.

Considerada a possibilidade de revogação dos efeitos da medida de expulsão, o Colegiado adotou

solução intermediária a fim de assegurar os legítimos interesses dos descendentes do estrangeiro, sem

comprometer os limites processuais da ação constitucional de habeas corpus. Dessa maneira, determinou

a nova manifestação do Ministro da Justiça à luz dos elementos trazidos.

Vencidos os ministros Marco Aurélio (relator) e Alexandre de Moraes, que deferiram a ordem para

afastar o ato de expulsão.

HC 148558/SP, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgamento em

26.11.2019. (HC-148558) (Informativo 961, Primeira Turma)

Expulsão de estrangeiro que possui filho brasileiro – 2 Com os mesmos fundamentos acima mencionados, a Primeira Turma, por maioria e em conclusão

de julgamento, não conheceu de habeas corpus, mas concedeu a ordem de ofício para determinar que o

Ministro da Justiça proceda à revisão da portaria mediante a qual ordenada a expulsão do paciente, tendo

em conta as novas provas apresentadas pela defesa e os termos da Lei 13.445/2017 (Lei de Migração). De

igual modo, suspendeu os efeitos do ato expulsório até ulterior deliberação do referido órgão do Poder

Executivo.

Trata-se, na espécie, de estrangeiro que teve sua expulsão determinada depois de transitar em

julgado a decisão em que condenado pela prática de delitos no território nacional (Informativo 954).

Vencidos os ministros Marco Aurélio (relator) e Alexandre de Moraes, que deferiram a ordem para

afastar o ato de expulsão.

HC 150343/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgamento em

26.11.2019. (HC-150343) (Informativo 961, Primeira Turma)

Nulidades e Recursos em geral

Assistente de acusação: tempestividade de recurso e coisa julgada – 2 A Segunda Turma, em conclusão de julgamento, negou provimento a agravo regimental em

habeas corpus em que se discutia a tempestividade de recurso de agravo manejado pelo assistente de

acusação, por meio do qual deferiu-se seguimento a Recurso Especial (REsp); bem assim a possibilidade

de esse agravo obstar a ocorrência do trânsito em julgado para a acusação (Informativo 950).

No caso, o Ministério Público (MP) e o assistente de acusação insurgiram-se contra a absolvição

do agravante por meio de recursos especiais, que não foram admitidos na origem. Ambos agravaram da

decisão de inadmissibilidade.

O colegiado, inicialmente, apontou que o ato coator deixou consignado que a questão da

tempestividade do agravo do assistente da acusação estava preclusa.

Registrou que o prazo recursal de cinco dias para agravar (Lei 8.038/1990, art. 28) (1) esgotou-se,

para o MP, em 12.11.2012. O parquet protocolou seu recurso em 19.11.2012, intempestivamente,

portanto.

É cediço que a inércia do órgão ministerial faz nascer para o assistente da acusação o direito de

atuar na ação penal, inclusive para interpor recursos excepcionais (Enunciado 210 da Súmula do STF) (2).

Page 24: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

24

A manifestação do promotor de justiça pela absolvição do réu, inclusive, não altera nem anula o direito de

o assistente de acusação requerer a condenação.

O prazo para o assistente de acusação interpor recurso começa a correr do encerramento, in albis,

do prazo ministerial (Enunciado 448 da Súmula do STF) (3). No caso, o prazo do assistente de acusação

se iniciou em 13.11.2012, e o recurso foi protocolado em 19.11.2012 (segunda-feira), de modo que foi

respeitado o quinquídio legal.

Assim, se o acórdão absolutório foi combatido tempestivamente pelo assistente de acusação, não

houve formação de coisa julgada em favor do réu.

(1) Lei 8.038/1990: “Art. 28. Denegado o recurso extraordinário ou o recurso especial, caberá agravo de instrumento, no

prazo de cinco dias, para o Supremo Tribunal Federal ou para o Superior Tribunal de Justiça, conforme o caso”. (2) Enunciado 210: “O assistente do Ministério Público pode recorrer, inclusive extraordinariamente, na ação penal, nos

casos dos arts. 584, § 1º, e 598 do Cód. de Proc. Penal.”

(3) Enunciado 448: “O prazo para o assistente recorrer, supletivamente, começa a correr imediatamente após o transcurso do prazo do Ministério Público.”

HC 154076 AgR/PA, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 29.10.2019. (RE-154076)

(Informativo 958, Segunda Turma)

Recursos em geral

Revisão criminal e cabimento O Plenário, por maioria, não conheceu de revisão criminal ajuizada por senador condenado pela

Primeira Turma do STF à pena de 4 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, pela

prática do delito previsto no art. 20 da Lei 7.492/1986 (1).

Inicialmente, o Colegiado resolveu questão de ordem suscitada pelo ministro Marco Aurélio para

determinar a continuidade do julgamento. De acordo com o suscitante, deveria haver a redistribuição do

processo no tocante ao ministro revisor, que atuou como relator da ação penal discutida nessa revisão

criminal.

No ponto, o Plenário considerou que os arts. 76 e 77 do RISTF (2) se referem à relatoria do

processo, e não à figura do revisor. Além disso, a defesa não se insurgiu em relação a esse fato. Por sua

vez, o novo CPC aboliu a figura do revisor na ação rescisória.

Vencido o suscitante, que entendeu ser necessária a redistribuição, considerada a interpretação

sistemática dos arts. 76 e 77 do RISTF.

Ato contínuo, o Plenário reputou que o condenado não tem o direito subjetivo de perseguir a

desconstituição do título penal condenatório fora da destinação legal do meio de impugnação. Dessa

forma, a coisa julgada penal, excepcionalmente, admite desfazimento, mas desde que preenchidas as

hipóteses taxativamente previstas no art. 621 do CPP (3) e reproduzidas no art. 263 do RISTF.

No âmbito da revisão criminal, é ônus processual do requerente ater-se às hipóteses taxativamente

previstas em lei e demonstrar que a situação processual descrita autorizaria o juízo revisional. Essa ação

não atua como ferramenta processual destinada a propiciar tão somente um novo julgamento, como se

fosse instrumento de veiculação de pretensão recursal. Possui, destarte, pressupostos de cabimento

próprios que não coincidem com a simples finalidade de nova avaliação do édito condenatório.

Portanto, a via da revisão criminal não deve existir para que o Tribunal Pleno funcione como

simples instância recursal destinada ao reexame de compreensões das Turmas.

Nesse sentido, a análise empreendida em sede de revisão criminal cinge-se a aspectos de

legalidade da condenação proferida sem lastro jurídico ou probatório, o que não corresponde à avaliação

encetada em sede de apelação, em que também é possível o reexame aprofundado da suficiência dessas

provas ou ainda da melhor interpretação do direito aplicado ao caso concreto.

Desse modo, a revisão criminal não é apta para equacionar controvérsias razoáveis acerca do

acerto ou desacerto da valoração da prova ou do direito, resguardando-se seu cabimento, em homenagem

à coisa julgada material, cuja desconstituição opera-se apenas de modo excepcional, às hipóteses

taxativamente previstas no ordenamento jurídico.

Fixadas essas premissas, o Colegiado analisou que, no tocante à fixação da reprimenda imposta, a

revisão criminal manejada com a finalidade de desconstituir parcela da dosimetria da pena não permite a

Page 25: Brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 Nº 369 · 2 Novembro de 2019 Compilação dos Informativos nos 958 a 961 Data de divulgação 05 de dezembro de 2019 O Informativo

25

reconstrução da discricionariedade atribuída ao órgão jurisdicional naturalmente competente para essa

análise.

Sob esse enfoque, a revisão criminal não se presta ao escrutínio da motivada avaliação por parte do

órgão competente acerca da exasperação da pena-base.

Além disso, no que se refere à suposta incidência da minorante do arrependimento posterior (CP,

art. 16), o delito em questão é de natureza formal, e prescinde da ocorrência de resultado naturalístico.

Não obstante, o decreto condenatório esclarece que o ato que configuraria o alegado arrependimento é de

autoria de terceiro, e não do interessado. Assim, como esse ato exige pessoalidade e voluntariedade na

reparação implementada para que se aperfeiçoe, ele não ocorreu.

Vencidos os ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Marco Aurélio, que conheceram

da revisão criminal e a julgaram procedente para reduzir a pena imposta. Vencido também o ministro

Dias Toffoli, que se limitou a conhecer do pedido.

(1) Lei 7.492/1986: “Art. 20. Aplicar, em finalidade diversa da prevista em lei ou contrato, recursos provenientes de

financiamento concedido por instituição financeira oficial ou por instituição credenciada para repassá-lo: Pena - Reclusão, de 2

(dois) a 6 (seis) anos, e multa.”

(2) RISTF: “Art. 76. Se a decisão embargada for de uma Turma, far-se-á a distribuição dos embargos dentre os Ministros da outra; se do Plenário, serão excluídos da distribuição o Relator e o Revisor. Art. 77. Na distribuição de ação rescisória e de

revisão criminal, será observado o critério estabelecido no artigo anterior.”

(3) CPP/1941: “Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida: I – quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos; II – quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou

documentos comprovadamente falsos; III – quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.”

RvC 5475/AM, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 6.11.2019. (RvC-5475) (Informativo 958,

Plenário)

Supremo Tribunal Federal

Secretaria de Documentação - SDO

Coordenadoria de Divulgação de Jurisprudência - CDJU