Bloco de Constitucionalidade Alberto Ribeiro Mariano Junior

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BLOCO DE CONSTITUCIONALIDADE: CONSEQUÊNCIAS DO SEU

RECONHECIMENTO NO SISTEMA CONSTITUCIONAL BRASILEIRO .

Alberto Ribeiro Mariano Júnior 1

Resumo: O presente trabalho discute algumas das consequências resultantes do bloco de constitucionalidade no Brasil. Inicialmente, aborda a origem e evolução, e em seqüência as classificações da Constituição. Após, destaca-se o sistema constitucional, analisando os princípios, regras e preceitos fundamentais. E por fim, aborda-se a evolução do bloco de constitucionalidade no Brasil, sua utilidade e princípios que fundamentam sua existência, e suas conseqüências do seu reconhecimento. Palavras-chave: Bloco de Constitucionalidade, Origem, Evolução, Utilidade e Consequências.

Abstract: This article discusses some of the consequences resulting from the block of constitutionality in Brazil. Initially, addresses the origin and evolution, and sequence the ratings of the constitution. After, there is the constitutional system, examining the principles, rules and fundamental principles. Finally, discusses the evolution of the block of constitutionality in Brazil, its usefulness and principles that underlie its existence, and its consequences for recognition. Keywords: Block Constitutionality, Origin, Evolution, Utility and Consequences.

Sumário: INTRODUÇÃO; 1 Bloco de Constitucionalidade; 1.1 Origem e Evolução; 4 Evolução do Bloco de Constitucionalidade no Brasil; 4.1 Utilidade e Princípios que fundamentam a sua existência; 5 Consequências do reconhecimento, 5.1 Modificação da classificação constitucional, 5.2 Resolução do conflito entre normas constitucionais, 5.3 Ampliação da atuação do poder reformador no bloco de constitucionalidade; 6 Considerações Finais; Referências.

Introdução

O presente trabalho aborda o bloco de constitucionalidade e algumas das suas

consequências resultantes do seu reconhecimento no Brasil, no sentido de fazer uma

reflexão sobre tal tema, o qual tem grande relevância na sociedade brasileira.

A doutrina majoritária defende que o bloco de constitucionalidade surgiu na França a

partir da decisão de 16 de julho de 1971 que elevou a liberdade de associação ao patamar de

princípios fundamentais. O bloco francês é formado pela Constituição de 1958, Declaração

dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, o Preâmbulo da constituição de 1946 e os

1 Advogado. Pós-Graduando em Direito do Estado pela Universidade Federal da Bahia. Turma 2009.2.

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Princípios Fundamentais reconhecidos pelas leis da República, sendo as disposições

constitucionais, direitos, liberdades publicas e direitos fundamentais expandidos.

O bloco de constitucionalidade é o conjunto de normas de nível constitucional que

tem o papel de ampliar o paradigma do controle de constitucionalidade. Acontece que, tais

normas com nível constitucional, não necessariamente, precisam está expressa na

Constituição, uma vez que a Carta Magna deve ser interpretada em função da realidade.

O sistema constitucional apresenta as normas como gênero e os princípios e regras

como espécies. Estes têm o papel de ser o vetor da interpretação constitucional sempre

pautado no contexto social, econômico, político. Já as regras são aplicadas ao caso concreto,

de imediato, sendo estas fundamentadas pelos princípios.

Com a existência do bloco de constitucionalidade possibilita o intérprete ampliar a

circunferência das normas constitucionais através dos princípios fundamentados em tal

bloco, haja vista que não se limita aos enunciados prescritos no ordenamento jurídico. Sendo

assim, o tema estudado tem o papel de aumentar a quantidade de normas que são utilizadas

como paradigma do controle de constitucionalidade.

A alteração na classificação constitucional, compatibilização do conflito entre

normas constitucionais e a atuação do poder reformador são algumas das consequências do

reconhecimento do bloco de constitucionalidade no Brasil.

Insta, destacar que, o objetivo deste trabalho não é exaurir a discussão acerca das

conseqüências nem tampouco do bloco de constitucionalidade, mas sim, dar a oportunidade

aos operadores do Direito realizar um estudo aprofundando sobre tal tema.

1 Bloco de Constitucionalidade

Antes de adentrar numa conceituação jurídica do Bloco de Constitucionalidade, é

interessante buscar no dicionário o significado de bloco. A palavra bloco2 significa algo

duro, sólido, compacto, dessa forma fazendo a união entre bloco com constitucionalidade

podemos concluir de forma simplória que Bloco de Constitucionalidade é um conjunto de

normas constitucionais que faz parte de uma estrutura compacta, única que serve de ponto de

referencia para as inferiores.

Pois, no ordenamento jurídico, há normas jurídicas de cunho constitucionais e

infraconstitucionais, servindo as superiores como base de julgamento, não querendo dizer

2 HOUAISS. Dicionário de Língua Portuguesa. 2001.

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que, tais normas necessariamente precisam está expressa na Constituição, pois o Tribunal

Superior Competente, no caso brasileiro, o Supremo Tribunal Federal pode ter inserido como

norma constitucional nos seus julgados.

Portanto, acaba sendo um empilhado de princípios que estão num nível hierárquico

superior constitucionalmente que servirá de parâmetro para as decisões que envolvam os

temas nele inseridos.

As Constituições são dotadas de carga axiológica superior às demais normas, de

modo que, reflete na elaboração das normas inferiores a observância dos valores

constitucionais. Tendo em vista, a necessidade de haver uma compatibilidade das normas,

Canotilho defende um parâmetro constitucional:

Todos os actos normativos devem estar em conformidade com a Constituição (art. 3º/3). Significa isso que os actos legislativos e restantes actos normativos devem estar subordinados, formal, procedimental e substancialmente, ao parâmetro constitucional. Mas qual é o escalão normativo de acordo com o qual se deve controlar a conformidade dos actos normativos? As respostas a este problema oscilam fundamentalmente entre duas posições: (1) o parâmetro equivale à constituição escrita ou leis com valor constitucional formal, e daí que a conformidade dos actos normativos só possa ser aferida, sob o ponto de vista da sua constitucionalidade ou inconstitucionalidade, segundo as normas e princípios escritos na constituição (ou entre as leis formalmente constitucionais); (2) o parâmetro constitucional é a ordem constitucional global, e, por isso, o juízo de legitimidade constitucional dos actos normativos deve fazer-se não apenas segundo as normas e princípios escritos das leis constitucionais, mas também tendo em conta princípios não escritos integrantes da ordem constitucional global. Na perspectiva (1), o parâmetro da constitucionalidade (=normas de referência, bloco de constitucionalidade) reduz-se às normas e princípios da constituição e das leis com valor constitucional; para a posição (2), o parâmetro constitucional é mais vasto do que as normas e princípios constantes das leis constitucionais escritas, devendo alargar-se, pelo menos, aos princípios reclamados pelo espírito ou pelos valores que informam a ordem constitucional global3.

A ideia de constitucional ou inconstitucional é delimitada pelo parâmetro de

confronto sendo considerada a eficácia subordinante aos elementos referenciais que compõe

o bloco de constitucionalidade. O mesmo tem a capacidade de extrapolar os limites

expressos na Constituição, de modo que, busca valores que circundam a norma

constitucional inserida, servindo como paradigma para o controle de constitucionalidade.

3 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 1998. p. 811/812.

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O Supremo Tribunal Federal, seguindo tal linha de raciocínio, vem proclamando nos

seus julgados, que a Constituição Federal deve ser interpretada em função da realidade, não

sendo apenas o conjunto de normas e princípios positivados.

1.1 ORIGEM E EVOLUÇÃO

A expressão “Bloco de Constitucionalidade” foi construída pelos franceses com a

teoria do “bloco legal”, especialmente utilizada por Maurice Hauriou para aludir à atuação

do Conselho de Estado no controle dos atos administrativos.

Entendia que a Constituição era um conjunto de regras relativas ao governo e a vida

da comunidade estatal contendo normas relativas à ordem individualista, às liberdades

individuais, organização política e ao funcionamento do governo.

Segundo a doutrina, acredita-se que a partir da divisão entre normas gerais e

específicas surgiu os rumores do bloco de constitucionalidade. As regras com a

superlegalidade constitucional regulam as matérias constitucionais por leis especiais, mas

que somente em suas formas são chamadas Constituições escritas ou Constituições rígidas.

O bloco de constitucionalidade ganhou destaque a partir da decisão sobre a liberdade

de associação do Conselho Constitucional Francês em 16 de julho de 1971. Louis Favoreu e

Loïc Philip entendem que tal decisão teve grande importância, haja vista consagrar o valor

jurídico do Preâmbulo, alargando a noção de conformidade com à Constituição, aplicando os

princípios fundamentais reconhecidos pelas Leis da República, afirmando o papel do

Conselho como protetor das liberdades fundamentais, fazendo a liberdade de associação uma

liberdade constitucional.

Em tal decisão, o Conselho Constitucional inovou invocando os “princípios

fundamentais reconhecidos pelas Leis da República”, considerando a liberdade de

associação como uma liberdade constitucional devidamente protegida. Diante de tal

concepção, o Conselho consagrou o valor jurídico do Preâmbulo, alargando o paradigma da

constitucionalidade das leis assumindo um papel de defensor das liberdades fundamentais e

elevando a liberdade de associação ao patamar de princípios fundamentais reconhecidos pela

lei da República, passando a compor o Bloco de Constitucionalidade, uma vez que o art. 2º

da Lei de 1901 considerava que as associações de pessoas poderão se formar livremente sem

autorização nem declaração prévia.

O Conselho Constitucional com a referida decisão permitiu ampliação do rol de

disposições e princípios que passaram a fazer parte integrante do Bloco de

Constitucionalidade e inseriu na Constituição um conjunto de princípios e regras relativos

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aos direitos e liberdades fundamentais ocasionando a alteração da própria natureza da

Constituição.

O bloco de constitucionalidade tem a capacidade de expandir as disposições com

cunho constitucional, direitos, liberdades públicas, resultando na ampliação e sedimentando

os direitos fundamentais do homem.

Os primeiros rumores de criação do bloco de constitucionalidade surgiram na França,

contudo tendo em vista as particularidades de cada ordenamento jurídico dos países, não

podemos afirmar que o bloco de constitucionalidade nasceu na França. Sendo assim, iremos

analisar brevemente, a evolução do bloco de constitucionalidade na França e Espanha, e, em

capítulo posterior, a evolução do bloco no Brasil.

Como já dito linhas acima, o bloco de constitucionalidade, na França, iniciou-se a

partir da importante decisão de 16 de julho de 1971 a respeito da liberdade de associação. O

bloco de constitucionalidade francês é formado pela Constituição de 1958, a Declaração dos

Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, o Preâmbulo da Constituição de 1946, e os

Princípios Fundamentais reconhecidos pelas leis da República.

As previsões estabelecidas na Constituição de 1958 tem grande importância nas

decisões do Conselho Constitucional, de maneira que, representa quantidade significativa do

conteúdo do bloco de constitucionalidade francês, apresentando sempre uma igualdade entre

as normas, não havendo uma hierarquização normativa.

Tais disposições, na maioria, tratavam-se da regulamentação dos poderes públicos,

contudo algumas se referiam aos direitos e liberdades fundamentais como: o artigo 2º refere

à liberdade religiosa, liberdade de consciência, a não discriminação por razão de origem; o

artigo 3º, aos direitos cívicos; o artigo 4º, partidos políticos; o artigo 64º, independência da

magistratura; e o artigo 66ª que trata da liberdade individual e da proteção pela autoridade

individual.

A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, a partir da decisão de

1971, teve reconhecido o seu valor constitucional sedimentado, de maneira que, não há

dúvida hoje acerca do seu caráter normativo. Pontua-se ainda que, serviu como parâmetro de

controle em 27 de dezembro de 1973, quando o Conselho fundamentou uma decisão a

respeito da declaração de inconstitucionalidade de uma lei de finanças, tendo em vista violar

expressamente o seu art. 6º. Ademais, o Conselho Constitucional salientou a importância de

tal Declaração declarando a sua força normativa equivalente pelo menos à reconhecida no

Preâmbulo da Constituição de 1946 que era uma declaração de direitos econômicos e sociais

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que completava a Declaração de Direitos de primeira geração de 1789, tendo sua primeira

aplicação numa decisão de 15 de janeiro de 1975.

Os princípios fundamentais da República vêm sendo reconhecido progressivamente

aplicando-os como norma constitucional os seguintes princípios: liberdade de associação;

direito de defesa; liberdade individual; liberdade de cátedra; liberdade de consciência;

competência exclusiva da jurisdição administrativa em matéria de anulação de atos de

autoridade pública; autoridade judicial como guardiã da propriedade privada.

Sendo assim, os princípios fundamentais reconhecidos pelas leis da República

compõem o bloco de constitucionalidade, haja vista o Preâmbulo da Constituição de 1958,

mesmo não mencionando expressamente, faz referência ao Preâmbulo da Constituição de

1946, que os reafirma solenemente, atribuindo-lhes um valor equivalente ao dos direitos e

liberdades consagrados na Declaração de 1789.

O bloco de constitucionalidade, na Espanha, não se apresenta com tanta clareza

quanto na França. Formado por normas materialmente e formalmente constitucionais, sendo

estas as previstas no título VIII da Constituição (normas constitucionais primárias) e as que

compõem o corpo central do bloco, as normas que delimitam a competência prevista no

Estatuto de Autonomia (normas constitucionais secundárias) contém uma variedade de

normas com cunho subconstitucional, uma vez que possuem normas expressas na

Constituição, outras estão previstas em alguns Estatutos de Autonomia e outras podem ser

habilitadas pelo legislador.

Tal bloco é a essência da Constituição Total do Estado Espanhol. Logo, a

Constituição Total seria formada por um conjunto de normas positivas de valor superior que

distribui territorialmente o poder entre as instâncias centrais e outras instâncias territoriais,

bem como por todas aquelas normas que impõem limites ao legislador central ou territorial,

isto é, sobre todas as normas que consagram direitos fundamentais. Em conseqüência, o

núcleo essencial está necessariamente integrado pelas normas de delimitação das

competências.

2 Evolução do Bloco de Constitucionalidade no Brasil

O Bloco de Constitucionalidade surgiu, no Brasil, com a promulgação da

Constituição Federal em 05 de outubro de 1988, após o Brasil sair de um período de

ditadura, na qual inúmeros direitos e garantias foram restringidos e cassados.

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Sendo assim, a CF/1988, para dar uma resposta ao período da ditadura militar,

promulgou uma Constituição analítica, detalhista, apesar de ter normas de eficácia limitada,

no sentido de ratificar certos direitos e garantias a todos os brasileiros e aqueles nele

presente.

Diante da inovação, na seara Constitucional, trazendo novos temas e ampliação de

tutelas, a Constituição tornou-se paradigma do controle de constitucionalidade, haja vista a

Constituição Federal/1988 ter introduzido diversas alterações. O segundo período da

evolução do Bloco de Constitucionalidade dar-se com a possibilidade de existência de

normas de emendas constitucionais não incorporadas ao texto principal da CF/1988.

A partir da Emenda Constitucional de nº 02/1992, no seu único artigo, regulou que o

plebiscito referido no artigo 2º do ADCT seria realizado em 21/04/1993, essa matéria, apesar

de ter estatura constitucional não se incorporou ao texto da CF/1988 nem da ADCT.

Esse entendimento continuou nas EC 19, 20, 32, 41, 45, 55 e 62, sendo algumas

emendas mera inovação do texto e outras normas autônomas não incorporadas ao texto

principal, compondo assim o bloco de constitucionalidade.

O STF reconhece a validade e a aplicação destes dispositivos contidos diretamente

nas emendas:

Agravo de instrumento de decisão que negou seguimento a RE, a, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que julgou improcedente o recurso do ora agravante, sob o fundamento de que a Medida Provisória nº2.102-27, ainda está em vigor, apesar das modificações trazidas ao artigo 62 da Constituição pela Emenda Constitucional 32/01, entre as quais a vedação de edição de medidas provisórias sobre processo civil. Alega o RE violação do art. 62, §1º, “b”, na redação da EC 32 de 11.09.2001: aduz que o referido dispositivo constitucional teria revogado a Medida Provisoria ora em discussão, uma vez que vedou a edição de medidas provisórias sobre matéria processual civil. Decido. É inviável o RE. O fundamento do agravante é de total impertinência, uma vez que não tem sentido afirmar que a EC 32/01 teria revogado a MP 2.102-27/2001, se o art. 2º da referida emenda resguardou a vigência das medidas provisórias anteriormente editadas. Nego provimento ao agravo4.

O terceiro período da evolução dar-se com o reconhecimento jurisprudencial de

princípios implícitos em nível de direitos fundamentais sendo concebido através dos

doutrinadores, bem como de decisões reiteradas.

No ano de 2000, o STF reconheceu a presença dos princípios implícitos servindo

como parâmetro para o controle de constitucionalidade de atos:

4 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo de Instrumento nº 534307/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertenece, DJU de 27/04/2006, p. 61.

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Nem com um grande empenho, envolvido interesse próprio, é dado assentar a infringência à Constituição Federal. Ao contrário, o que decidido pela Corte de origem presta homenagem ao Diploma Maior. Coaduna-se com a razoabilidade a glosa da exigência de esforço físico em concurso voltado a preencher cargo de medico. A atuação deste, embora física, não se faz no campo da força bruta, mas a partir de técnica especifica. Alem dos princípios explícitos, a Carta da Republica abrange também os implícitos, entre os quais estão o da razoabilidade, o da proporcionalidade, aplicáveis ao caso concreto. 3. Por tais razoes, conheço deste agravo, mas desacolho o pedido nele formulado, mantendo integra a decisão que resultou na negativa de transito extraordinário5.

A partir de 2002, o STF começou a utilizar dos princípios não escritos nas suas

decisões tornando-se pacifico a sua incidência e inclusão consequente no bloco de

constitucionalidade:

[...] Cabe ressaltar, de outro lado, que, no julgamento plenário do RE 201.465-MG, esta Corte – considerados os termos do debate suscitado no contexto da Lei nº 8.200/91 – afirmou não assistir, às empresas contribuintes, direito à indexação real fundado em bases constitucionais, reconhececendo-se, em consequência, ao legislador, a possibilidade de determinar a atualização de valores segundo elementos, critérios e fatores definidos em sede meramente legal, desde que respeitado, no processo de produção normativa, tratando-se, ou não, de matéria tributaria, o necessário coeficiente de razoabilidade, pois, como se sabe, todas as normas emanadas do Poder Publico devem ajustar-se à clausula que consagra, em sua dimensão material, o principio do “substantive due processo of law” (CF, art. 5º, LIV), eis que, no tema em questão, o postulado da proporcionalidade qualifica-se como parâmetro de aferição da própria constitucionalidade material dos atos estatais (RTJ 160/140-145 – ADI 1.063 – DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.), consoante tem proclamado a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal: “O Estado não pode legislar abusivamente. A atividade legislativa está necessariamente sujeita à rígida observância de diretriz fundamental, que, encontrando suporte teórico no principio da proporcionalidade, veda os excessos normativos e as prescrições irrazoáveis do Poder Publico. O principio da proporcionalidade – que extrai a sua justificação dogmática de diversas clausulas constitucionais, notadamente daquela que veicula a garantia do substantive due processo f law – acha-se vocacionado a inibir e a neutralizar os abusos do Poder Publico no exercício de suas funções, qualificando-se como parâmetro de aferição da própria constitucionalidade material dos atos estatais. A norma estatal, que não veicula qualquer conteúdo de irrazoabilidade, presta obsequio ao postulado da proporcionalidade, ajustando-se à cláusula que consagra, em sua dimensão material, o principio do substantive due process of law (CF, art. 5º, LIV). Essa clausula tutelar, ao inibir os efeitos prejudiciais decorrentes do abuso de poder legislativo, enfatiza a noção de que a prerrogativa de legislar outorgada ao Estado constitui atribuição jurídica essencialmente limitada, ainda que o momento de abstração instauração normativa possa repousar em

5 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Agravo de Instrumento nº 278127/MA, rel. Min. Marco Aurelio. DJU de 26/09/2000, p. 56.

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juízo meramente politico ou discricionário do legislador.” (RTJ 176/578-580, Rel. Min. CELSO DE MELO, Pleno)6

O quarto período dar-se com a possibilidade dos tratados internacionais, que tratam

de direitos humanos tornar-se uma norma, no Brasil, com dimensão constitucional.

Inicialmente, com a promulgação da Carta Magna de 1988, o legislador permitiu a

possibilidade da abertura material da Constituição a novos direitos fundamentais derivados

de tratados subscritos pelo Brasil, na forma do Art. 5º, parágrafo segundo.

Acontece que, apesar do legislador constituinte permitir a ampliação dos direitos e

garantias fundamentais, o Supremo Tribunal Federal entendia que qualquer tratado, seja de

direitos humanos ou não, apenas ingressaria no ordenamento jurídico em nível de norma

infraconstitucional. Veja:

Prevalência da Constituição, no Direito brasileiro, sobre quaisquer convenções internacionais, incluídas as de proteção aos direitos humanos, que impede, no caso, a pretendida aplicação da norma do Pacto de São José: motivação. II. A Constituição do Brasil e as convenções internacionais de proteção aos direitos humanos: prevalência da Constituição que afasta a aplicabilidade das cláusulas convencionais antinômicas. 1. Quando a questão - no estágio ainda primitivo de centralização e efetividade da ordem jurídica internacional - é de se r resolvida sob a perspectiva do juiz nacional - que, órgão do Estado, deriva da Constituição sua própria autoridade jurisdicional - não pode ele buscar, senão nessa Constituição mesma, o critério da solução de eventuais antinomias entre normas internas e normas internacionais; o que é bastante a firmar a supremacia sobre as últimas da Constituição, ainda quando esta eventualmente atribua aos tratados a prevalência no conflito: mesmo nessa hipótese, a primazia derivará da Constituição e não de uma apriorística força intrínseca da convenção internacional. 2. Assim como não o afirma em relação às leis, a Constituição não precisou dizer-se sobreposta aos tratados: a hierarquia está ínsita em preceitos inequívocos seus, como os que submetem a aprovação e a promulgação das convenções ao processo legislativo ditado pela Constituição e menos exigente que o das emendas a ela e aquele que, em conseqüência, explicitamente admite o controle da constitucionalidade dos tratados (CF, art. 102, III, b). 3. Alinhar-se ao consenso em torno da estatura infraconstitucional, na ordem positiva brasileira, dos tratados a ela incorporados, não implica assumir compromisso de logo com o entendimento - majoritário em recente decisão do STF (ADInMC 1.480) - que, mesmo em relação às convenções internacionais de proteção de direitos fundamentais, preserva a jurisprudência que a todos equipara hierarquicamente às leis ordinárias. 4. Em relação ao ordenamento pátrio, de qualquer sorte, para dar a eficácia pretendida à cláusula do Pacto de São José, de garantia do duplo grau de jurisdição, não bastaria sequer lhe conceder o poder de aditar a Constituição, acrescentando-lhe limitação oponível à lei como é a tendência do relator: mais que isso, seria necessário emprestar à norma convencional força ab-rogante da Constituição mesma,

6 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 265.780/PE. rel. Min. Celso de Mello, DJU de 07/ 08/2002, p. 65.

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quando não dinamitadoras do seu sistema, o que não é de admitir. (STF, RHC 79.785, Rel. Min. Sepulveda Pertence, julgamento em 29-3-00, DJ de 22-11-02).

A Emenda Constitucional de nº 45/2004 incluiu o §3º no Art. 5º com a seguinte

redação: “Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem

aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos

dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”.

Diante da nova previsão constitucional, os tratados internacionais que versem sobre

direitos humanos e sejam aprovados com os devidos quóruns passam a gozar de dimensão

constitucional. Já os demais tratados, podem ser ratificados pelo Brasil com nível

infraconstitucional, por óbvio, não pode derrogar quaisquer preceitos constitucionais.

Com a inovação trazida pela Emenda Constitucional nº 45/2004 surge um problema:

os tratados anteriores que versem sobre direitos humanos anteriores a tal emenda serão

normas infraconstitucionais ou terão dimensão constitucional?

O Supremo Tribunal Federal seguindo orientação do Ministro Gilmar Mendes

reconheceu que os tratados internacionais que versam sobre direitos humanos possuem

dimensão supralegal que é um estágio intermediário entre a Constituição Federal e as normas

legais, de maneira que, revoga materialmente e hierarquicamente as normas. Veja decisão

seguindo tal linha de raciocínio:

PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO INFIEL EM FACE DOS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS. INTERPRETAÇÃO DA PARTE FINAL DO INCISO LXVII DO ART. 5O DA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988. POSIÇÃO HIERÁRQUICO-NORMATIVA DOS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO. Desde a adesão do Brasil, sem qualquer reserva, ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (art. 11) e à Convenção Americana sobre Direitos Humanos - Pacto de San José da Costa Rica (art. 7º, 7), ambos no ano de 1992, não há mais base legal para prisão civil do depositário infiel, pois o caráter especial desses diplomas internacionais sobre direitos humanos lhes reserva lugar específico no ordenamento jurídico, estando abaixo da Constituição, porém acima da legislação interna. O status normativo supralegal dos tratados internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil torna inaplicável a legislação infraconstitucional com ele conflitante, seja ela anterior ou posterior ao ato de adesão. Assim ocorreu com o art. 1.287 do Código Civil de 1916 e com o Decreto-Lei n° 911/69, assim como em relação ao art. 652 do Novo Código Civil (Lei n° 10.406/2002). ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. DECRETO-LEI N° 911/69. EQUIPAÇÃO DO DEVEDOR-FIDUCIANTE AO DEPOSITÁRIO. PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR-FIDUCIANTE EM FACE DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. A prisão civil do devedor-fiduciante no âmbito do contrato de alienação fiduciária em garantia

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viola o princípio da proporcionalidade, visto que: a) o ordenamento jurídico prevê outros meios processuais-executórios postos à disposição do credor-fiduciário para a garantia do crédito, de forma que a prisão civil, como medida extrema de coerção do devedor inadimplente, não passa no exame da proporcionalidade como proibição de excesso, em sua tríplice configuração: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito; e b) o Decreto-Lei n° 911/69, ao instituir uma ficção jurídica, equiparando o devedor-fiduciante ao depositário, para todos os efeitos previstos nas leis civis e penais, criou uma figura atípica de depósito, transbordando os limites do conteúdo semântico da expressão "depositário infiel" insculpida no art. 5º, inciso LXVII, da Constituição e, dessa forma, desfigurando o instituto do depósito em sua conformação constitucional, o que perfaz a violação ao princípio da reserva legal proporcional. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (STF, RE nº 349703/RS, Pleno, rel. Min. Carlos Brito, DJe 104, publicado em 05/06/2009)

Diante do exposto, concluímos que o Supremo Tribunal Federal reconhece a

dimensão constitucional dos tratados internacionais que versem sobre direitos humanos,

respeitando sempre os princípios da proporcionalidade, razoabilidade e a relatividade dos

direitos fundamentais.

2.1 Utilidade e Princípios que fundamentam a sua existência

O sistema constitucional brasileiro permite o intérprete ampliar o horizonte das

normas constitucionais por meios dos princípios fundamentados na existência do bloco de

constitucionalidade, uma vez que não se limita aos enunciados prescritos no ordenamento

jurídico.

Como já estudado nas linhas acima, os princípios têm o papel vetorial do sistema

constitucional, tendo a capacidade de influenciar as demais normas, bem como até

materializar-se como uma norma jurídica.

O ilustre Canotilho afirma que a Constituição não deve ter apenas regras positivadas,

ou seja, confirma a função e existência dos princípios no sistema constitucional, de maneira

que, é um elemento essencial para todo ordenamento jurídico. Até porque, ainda que alguns

princípios não estejam prescritos expressamente, estes podem influenciar, conduzir, servir de

paradigma para o controle de constitucionalidade.

O Supremo Tribunal Federal, em suas decisões, vem reconhecendo a importância e

funcionalidade dos princípios constitucionais para com o sistema constitucional, de modo

que, utiliza-os como paradigma para o controle de constitucionalidade.

Nesse ínterim, seguem abaixo, decisão do Supremo Tribunal Federal reconhecendo

os princípios como paradigma:

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Ementa: agravo de instrumento - concurso público - exame psicotécnico - exigência de rigor científico - necessidade de um grau mínimo de objetividade - direito do candidato de conhecer os critérios norteadores da elaboração e das conclusões resultantes dos testes psicológicos que lhe tenham sido desfavoráveis - possibilidade de impugnação judicial de tais resultados - princípio constitucional da inafastabilidade do controle jurisdicional dos atos da administração pública - recurso improvido. - O exame psicotécnico, especialmente quando possuir natureza eliminatória, deve revestir-se de rigor científico, submetendo-se, em sua realização, à observância de critérios técnicos que propiciem base objetiva destinada a viabilizar o controle jurisdicional da legalidade, da correção e da razoabilidade dos parâmetros norteadores da formulação e das conclusões resultantes dos testes psicológicos, sob pena de frustrar-se, de modo ilegítimo, o exercício, pelo candidato, da garantia de acesso ao Poder Judiciário, na hipótese de lesão a direito. Precedentes. (STF, AI-AgR 625617/DF, Rel. Min. Celso de Mello, publicado no DJ 03/08/07).

Com a utilização dos princípios constitucionais nos julgamentos demonstra a sua

capacidade detentora de uma legitimidade material, seja automática ou através do Supremo

Tribunal Federal, de normas jurídicas com caráter materialmente constitucionais, o que basta

para a admissão do bloco de constitucionalidade no ordenamento jurídico brasileiro.

O bloco de constitucionalidade tem condão prático de aumentar a quantidade de

normas que sejam utilizadas como paradigma para fins de controle de constitucionalidade.

Ou seja, são grupos de normas que servem de parâmetro para as demais normas do sistema

inferiores a tais.

Em suma, pontua-se que, é diretamente proporcional a ampliação da delimitação dos

limites de paradigma das normas constitucionais com o controle de constitucionalidade das

normas infraconstitucionais. Tendo em vista que, havendo um maior alargamento das

normas constitucionais ocorrerá uma maior vinculação dos administrados, administradores e

julgadores à Constituição.

3 Consequências do reconhecimento

O presente trabalho não tem o escopo de esgotar a matéria sobre as consequências do

reconhecimento do bloco de constitucionalidade, sendo assim, enumeramos três

consequências: modificação da classificação constitucional, resolução do conflito entre

normas constitucionais e a atuação do poder reformador no bloco de constitucionalidade.

3.1 Modificação da classificação constitucional

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Conforme já analisado em capítulos anteriores, a doutrina brasileira classifica a

Constituição quanto ao conteúdo constitucional, em sentido formal e material.

Sendo, em sentido material da Constituição, as normas que tratam dos direitos

fundamentais e estruturais do Estado como: a organização dos seus órgãos, os direitos e

garantias fundamentais. O sentido formal são normas que criam o processo de formação de

tais, não tendo a capacidade de legislar sobre o conteúdo das mesmas, pois apesar de ser

criadas através de um processo solene, especial, é constitucional apenas por está inserida na

Constituição.

Tendo em vista essa classificação, a Constituição Federal/1988 era classificada como

uma constituição 7formal, pois no seu bojo contém normas que não tem o caráter

constitucional. Acontece que, com a Emenda Constitucional 45/2004, com a inserção do § 3º

no art. 5º da Constituição Federal tal distinção merece destaque em relação aos tratados

internacionais de direitos humanos, haja vista que os mesmos são normas de caráter

materialmente constitucionais, afinal enunciam normas que instituem de direitos e garantias,

contudo, a partir do momento que atenderem as formalidades formalmente constitucionais

passa a ter um sentido “misto”, tendo em vista que foi inserida na Constituição através de um

rito solene, especial.

Nesse sentido, Pedro Lenza salienta que:

Cabe observar (...) que, com a introdução do art. 5º, § 3º, pela EC n. 45/04, passamos a ter uma espécie de conceito misto já que a nova regra só confere a natureza de emenda constitucional (norma formalmente constitucional) aos tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos (matéria), desde que observadas as formalidades de aprovação (forma)8.

O ilustre doutrinador Pinto Ferreira entende que a Constituição pode ser classificada

como reduzida ou variada sob o critério da sistemática. Quanto à reduzida são aquelas

normas existentes, sistematizada em um único texto, em apenas um código. Enquanto que, a

Constituição variada contém normas espalhadas em diversos diplomas legais9.

Até o advento da Emenda Constitucional nº 45/2004, os doutrinadores que defendia

este critério sustentavam que a presente Constituição apresentava-se como reduzida, ou seja,

suas normas encontravam-se em um único texto. Todavia, a partir da inclusão do §3º no art.

5º, a Constituição Federal passou a ser classificada como variada, haja vista que as normas 7 DA SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 26º ed. São Paulo: Malheiros Ed., 2006. 8 LENZA, Pedro. Direito Constitucional. 12. ed., 2008. p. 62. 9 FERREIRA, Pinto. Curso de Direito Constitucional. 1999.

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podem ser encontradas em diversos diplomas legais ampliando o paradigma do bloco de

constitucionalidade.

Como já dito capítulos anteriores, o sistema constitucional brasileiro é aberto tendo

as respostas dos problemas supervenientes serem obtidas em outros ordenamentos jurídicos,

considerando sempre os costumes, valores, realidade social, política, economia, afinal o

sistema jurídico precisa ser coordenado, coeso e harmônico.

3.2 Resolução do conflito entre normas constitucionais

O bloco de constitucionalidade dar-se através do conjunto de regras e princípios

constitucionais tendo a capacidade de ordenar o sistema normativo.

Tendo em vista, o bloco de constitucionalidade ser formado por normas

constitucionais implícita ou expressa, em vários ou único documento legal, podendo

enunciar dispositivos conflitantes entre si, acaba resultando no fenômeno jurídico

denominado Antinomia jurídica.

A antinomia jurídica pode ser classificada em reais ou aparentes, sendo aparente

aquela em que a solução dos conflitos encontra-se no próprio ordenamento jurídico,

enquanto que a antinomia real exige a edição de outras normas para solucionar o conflito.

Dentro do ordenamento jurídico, utiliza-se como critério da solução de antinomias o

caráter hierárquico, lei superior derroga lei inferior; o cronológico, lei posterior derroga lei

anterior; e o da especialidade, lei especial derroga lei geral

A incompatibilidade das normas se dar com algumas características como, ambas as

normas serem jurídicas; vigentes e pertencentes a um mesmo ordenamento; devem emanar

de autoridades competentes num mesmo âmbito normativo, prescrevendo ordens ao mesmo

sujeito; devem ter operadores opostos e os seus conteúdos devem ser a negação interna um

do outro; o sujeito, a quem se dirigem as normas conflitantes deve ficar numa posição

insustentável. Quando as normas jurídicas conflitantes tenham o mesmo status, nível

hierárquico, determinados princípios devido a sua fundamentalidade permite se apresentar

como superiores.

Alguns doutrinadores entendem que havendo conflito entre princípios e regras

constitucionais, tal norma constitucional prevalecerá em detrimento dos princípios quando

da necessidade no momento da aplicação dos princípios sejam verificadas as possibilidades

fáticas e jurídicas existentes.

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Humberto Ávila considera:

os princípios as “normas imediatamente finalísticas, primariamente prospectivas e com pretensão de complementaridade e de parcialidade, para cuja aplicação se demanda uma avaliação de correlação entre o estado de coisas a ser promovido e os efeitos decorrentes da conduta havida como necessária à sua promoção[...]se houver um conflito real entre um princípio e uma regra de mesmo nível hierárquico, deverá prevalecer a regra e, não, o princípio, dada a função decisiva que qualifica a primeira10.

Apesar de ter sido constatado linhas acima que, a diferença entre regras e princípios

tem como caracterizadores o grau de abstração, não se pode concluir que as regras são

superiores ou fundamentais aos princípios por este motivo.

Humberto Ávila utiliza-se da “argumentação jurídica” como vetor de influência na

tomada de decisão de um conflito entre as normas constitucionais, apresentando a atividade

interpretativa divisão de “argumentação institucional” ou “argumentação não-institucional”.

Sendo a argumentação institucional aquela materializada apenas sobre argumentos

positivados juridicamente e a argumentação não-institucional aquela que se utiliza de

argumentos de natureza prática, na qual depende de uma reflexão do intérprete sob a

realidade social, econômica, política.

Para Alexandre Santos de Aragão, o conflito entre regras e princípios constitucionais

deve ser resolvido através da atuação do próprio legislador ou com o constituinte, veja:

Em um conflito entre regras e princípios da mesma hierarquia normativa, deve prevalecer aquela, que tem a natureza de uma prévia ponderação dos valores envolvidos feita pelo poder político a priori legitimado para tanto, o próprio Constituinte ou o Legislador. Apenas a ausência de regra constitucional e legal específica pode abrir ao Poder Judiciário ou à Administração a possibilidade de efetuar a sua ponderação dos valores envolvidos11.

Canotilho, Celso Antônio e Paulo Bonavides defendem a supremacia dos princípios

constitucionais, tendo em vista o grau de fundamentalidade, importância e superioridade

arraigada nos princípios.

O ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal Eros Graus compartilha desse

entendimento sedimentando que:

10 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 2005. p. 70-83. 11 DE ARAGÃO, Alexandre Santos. A “Supremacia do Interesse Público” no Advento do Estado de Direito e na Hermenêutica de Direito Público Contemporâneo. p. 11.

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logo, como observei em uma outra oportunidade, não se manifesta jamais antinomia jurídica entre princípios e regras jurídicas. Estas operam como concreção daquelas. Em conseqüência, quando em confronto dois princípios, um prevalecendo sobre o outro, as regras que dão concreção ao que foi desprezado são afastadas: não se dá a sua aplicação a determinada hipótese, ainda que permaneçam integradas, validamente no ordenamento jurídico12.

Celso Antônio Bandeira de Mello defende que a violação de um principio é muito

mais grave e prejudicial do que a transgressão de uma regra, essa violação implica numa

subversão dos valores fundamentais do sistema jurídico.

Para o autor, os princípios são:

Mandamentos nucleares de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para a sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico13.

Seguindo em defesa de que os princípios são vetores de condução do sistema sendo

atribuída identidade e estrutura ao sistema jurídico, seus efeitos se irradiam por todo o

círculo de sua atuação. Não resta dúvida que, os princípios se sobrepõem as regras em caso

de choque entre essas normas com mesmo nível hierárquico, tendo em vista a incorporação

de valores fundamentais nos princípios originados pelo bloco de constitucionalidade, que

resulta numa unidade constitucional harmoniosa e coesa.

3.3 Ampliação da atuação do poder reformador no bloco de constitucionalidade

O poder constituinte derivado reformador consiste na possibilidade de alterar o texto

da Constituição, sendo tais alterações pontuais (Emendas Constitucionais) ou globais

(Revisão Constitucional).

As mudanças podem ser dar através da reforma constitucional (processo formal) ou

mutação constitucional (processo informal). Sendo o processo formal alterações no texto

formal da Lei Maior respeitando determinadas formalidades e a mutação constitucional

alterações que ocorre no sentido e alcance das normas constitucionais, contudo não tem a

capacidade de alterar o texto formal.

Com o advento da Emenda Constitucional de nº 45 de 2004 que inseriu o §3º no Art.

5º na Constituição Federal de 1988, o poder reformador ganhou um importante papel na 12 GRAUS, Eros Roberto. Despesas públicas – conflito entre princípios e eficácia das regras jurídicas. p. 142 13 DE MELLO, Celso Antônio Bandeira. Op. cit. 17ª ed. 2004. p. 842.

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Constituição do bloco de constitucionalidade, haja vista que passou a atuar como fonte

reprodutora das normas dos tratados internacionais que versem sobre direitos humanos e

sejam aprovados com o quórum adequado terá um status constitucional.

O poder reformador tem a função de enunciar as normas contidas na Constituição

Federal, além de consagrar os tratados internacionais de direitos humanos como normas

formalmente constitucionais, conforme procedimento previsto no parágrafo aludido.

Sendo assim, as competências do poder reformador aumentaram possibilitando a

construção do bloco de constitucionalidade através do § 3º, do art. 5º, da Constituição

Federal que prescreve, “os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos

aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos

dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas à Constituição”.

O poder reformador, juntamente com o Supremo Tribunal Federal, vem

implementando a ampliação do paradigma do controle de constitucionalidade no sistema

constitucional brasileiro. Uma vez que, com edições de novas leis com caráter constitucional

pelo poder reformador haverá mais normas com tal supremacia que permite

consequentemente a ampliação do paradigma do controle de constitucionalidade. Uma vez

que, as normas inferiores devem estar em consonância com tais, afinal o sistema jurídico não

permite que uma norma infraconstitucional diverge de uma norma com caráter

constitucional.

4 Considerações Finais

O instituto jurídico denominado bloco de constitucionalidade tem a capacidade de

reconhecer a existência de normas com caráter constitucional não contida expressamente na

Constituição, de maneira que, tem o papel de alargar o paradigma do controle de

constitucionalidade.

A doutrina majoritária afirma que o bloco de constitucionalidade surgiu, na França, a

partir da decisão do Conselho Constitucional Francês, proferida em 16 de julho de 1971,

sobre a liberdade de associação. Nesta decisão, o Conselho Constitucional Francês considerou

o caráter constitucional das normas prescritas na Constituição de 1958, na Declaração dos

Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, no Preâmbulo da Constituição de 1946, e nos

Princípios Fundamentais reconhecidos pelas Leis da República.

O sistema constitucional brasileiro é um conjunto normativo aberto de regras e

princípios que formam uma unidade coordenada, harmoniosa e coesa, pautando sempre numa

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supremacia das normas constitucionais. Apesar do sistema jurídico possibilitar a sua

apresentação de forma aberta, permitindo assim, uma ampliação do paradigma do controle de

constitucionalidade, uma vez que as respostas dos problemas surgidos podem ser obtidos em

normas constitucionais dispersas do ordenamento jurídico.

O bloco de constitucionalidade brasileiro teve seu nascedouro com a promulgação da

Constituição de 1988, haja vista ter trazido em seu bojo ampliação das tutelas, novos direitos

e garantias constitucionais. Desde o ano de 2000, o Supremo Tribunal Federal reconhece a

presença dos princípios implícitos em nível de direitos fundamentais, de maneira que, tornou-

se pacifico a sua incidência e inclusão consequente no bloco de constitucionalidade servindo

então como parâmetro para o controle de constitucionalidade.

Com a edição da Emenda Constitucional nº 45, incluindo o §3º no art. 5º da

Constituição Federal, pacifica o status constitucional do âmbito de validade das normas

constitucionais. Está também a implementar uma Constituição formada por elementos que

impulsionam o campo de atuação das normas constitucionais, ou seja, não entendida apenas

como um documento único, mas dotada de um conjunto de normas constitucionais que

compõe o sistema constitucional.

O sistema constitucional brasileiro constrói o seu bloco de constitucionalidade por

meio da reunião da Constituição de 1988, dos direitos fundamentais sediados nos tratados

internacionais, bem como dos direitos fundamentais implícitos que são extraídos dos próprios

direitos fundamentais e dos direitos decorrentes do regime e dos princípios adotados pela

Constituição. Vale dizer, como a materialidade constitucional é fator determinante da

dignidade da Magna Carta, o sistema constitucional brasileiro acaba por exigir a reunião das

suas normas para efetivar a ótima concretização de sua vontade, construindo, assim, o bloco

de constitucionalidade brasileiro.

O bloco de constitucionalidade está em constante evolução sendo a doutrina e

jurisprudência propulsora de novos valores a serem cristalizados e construídos. Sendo assim,

as reflexões sobre o presente tema é permanente e, sobretudo, um acompanhamento nas

decisões da corte suprema, pois esta que define os parâmetros utilizados para o controle de

constitucionalidade.

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Referências

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