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Bioterrorismo e Transporte Marítimo: Potencial Barreira de Acesso a Mercados
Autores: Luciana Marelli Mofati, Cláudia Augusta Choeypant, Cristina Gomes de
Souza e Ricardo Alexandre Amar de Aguiar
Resumo
O transporte de cargas se dá majoritariamente através da modalidade marítima
que atende mais de 70% do comércio internacional. A logística dos portos vem
ganhando destaque nos últimos anos a partir da globalização e abertura dos mercados,
tornando-se fator de competitividade e de acesso a mercados. Além de aspectos
tradicionais como custos, localização e aduana, outro fator passou a ser considerado de
grande relevância a partir do atentado de 11 de setembro: a segurança. O temor da
ocorrência de outros incidentes fez com que a Organização Marítima Internacional
(IMO) da Organização das Nações Unidas (ONU) criasse o Código Internacional para
Proteção de Navios e Instalações Portuárias – ISPS CODE que agregará novos
procedimentos e informações ao comércio internacional. O objetivo do artigo é
discorrer sobre o ISPS CODE e apresentar a metodologia – no caso, matriz de risco – a
ser implementada nos portos do Brasil para priorizar os pontos a serem adequados às
regras do referido código. O trabalho foi desenvolvido com base em pesquisa
bibliográfica e documental.
Introdução
O volume do tráfego marítimo internacional sempre foi importante na
economia mundial. Desde a Antigüidade, o transporte de cargas dependia das frotas,
portos e segurança das rotas de navegação. Apesar do advento da aviação – em função
de seu alto custo – o transporte marítimo continuou como principal modalidade de
movimento de cargas, sendo atualmente responsável por mais de 70% do volume
transportado.
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Até o dia 11 de setembro de 2001, as preocupações do comércio marítimo se
situavam na esfera dos acordos internacionais de rotina. Contudo, a partir desta data, o
fator “segurança” passou a ganhar primazia, principalmente em decorrência dos
incidentes posteriores relativos a “utilização de agentes químicos e biológicos para fins
de contaminação da população” ocorridos nos EUA (CAMBOIM, 2003)1.
Esta preocupação, particularmente para os Estados Unidos, refletiu-se na
implementação de uma medida de caráter compulsório – a implementação da Lei do
Bioterrorismo, Public Health Security and Bioterrorism Preparedness and Response
Act of 2002 (USC, 2002)2 – cuja determinação objetiva a “identificação de todos os
participantes que integram a cadeia de abastecimento alimentar daquele país”, através
de ações relativas às “atividades de produção ou processamento, empacotamento e
armazenagem de alimentos para consumo humano e animal, destinados ao mercado
norte-americano” (CAMBOIM, 2003).
A adoção desta medida, implementada pelo departamento americano de
controle sobre alimentos e drogas em geral, US Food and Drugs Administration (FDA),
implica, além de uma série de novos registros alfandegários, o acesso aos dados das
empresas, o que representa uma questão legal sobre o sigilo das empresas. Além disso,
o controle efetivo das instalações destas empresas registradas, quando localizadas em
outros paises, pode representar uma questão de soberania nacional.
Ainda, no âmbito do comércio internacional, representa uma barreira técnica
ao comércio, uma vez que, segundo Camboim (2003) citando estimativas da própria
FDA, foram previstos para 2003 o número de 421.676 registros de instalações,
montante considerado excluindo-se 16% das empresas estrangeiras que, conforme
estimativa do próprio órgão, não conseguirão cumprir as exigências de caráter técnico
determinadas pela lei.
Apesar de impor-se sobremaneira aos Acordos Gerais da Organização Mundial
do Comércio (OMC), a justificativa técnica para a implementação de uma medida
restritiva de acesso ao mercado norte americano pauta-se na interpretação ampla do
Acordo sobre Barreiras Técnicas da OMC, que em seu artigo 2º, item 2.2, trata das
1 Annalina Camboim é assessora da Coordenação-geral de Articulação Internacional do Inmetro e coordenadora do
Ponto Focal do Acordo sobre Barreiras Técnicas ao Comércio da Organização Mundial do Comércio. Artigo também disponível no banco de artigos técnicos: http://www.inmetro.gov.br/barreirastecnicas.
2 Documento complementar à seção 319 do "Public Health Service Act", United States Code - Title 42 of the, Section 243, et seq.
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exceções ao cumprimento do acordo, especificando os objetivos legítimos para o seu
descumprimento:
“for inter alia such reasons as national security requirements; the
prevention of deceptive practices; protection for human health or safety,
animal or plant life or health, or the environment; fundamental climatic
or other geographical factors; fundamental technological problems”
(OMC, 2004)3.
Com base na justificativa de expandir as ações implementadas unilateralmente
pelos Estados Unidos e contextualizado-se em um cenário de comércio marítimo
crescente – além de preocupações de segurança prementes, sobretudo em funções de
guerras localizadas e ameaça constante de terrorismo internacional – o temor da
ocorrência de outros incidentes fez com que a Organização Marítima Internacional
(IMO) decidisse, após intensas negociações internacionais, implementar uma série de
medidas para aumentar a segurança, tanto no âmbito dos navios em deslocamento
quanto das áreas portuárias.
A IMO, que possui a competência de regulamentar o modal
internacionalmente, é um organismo afiliado à Organização das Nações Unidas - ONU,
com grande representatividade mundial. E a partir de um acordo multilateral efetuado
entre os seus 161 países membros, concebeu o Código Internacional para Proteção de
Navios e Instalações Portuárias – ISPS CODE.
O ISPN CODE especifica uma série de cuidados relativos à segurança das
cargas que devem ser implementadas pelas autoridades portuárias e pelas companhias
de navegação e que agregará novos procedimentos e informações ao comércio
internacional.
E o objetivo deste artigo consiste em discorrer sobre o ISPS CODE e
apresentar a metodologia – no caso, matriz de risco – que será implementada nos portos
do Brasil para priorizar os pontos a serem adequados às regras do referido código.
A metodologia prevê que através da matriz de risco poderá ser efetuado um
estudo de ameaças selecionando cenários em uma graduação de atos mais graves até
3 O Acordo sobre Barreiras Técnicas é um documento que visa assegurar que nenhum regulamento técnico, norma ou
procedimento de avaliação da conformidade para produtos, serviços e processos constituam-se em um obstáculo desnecessário ao comércio internacional. Ele é parte constituinte dos Acordos que compõem a Organização Mundial do Comércio, conjunto de acordos internacionais que regulam as questões sobre barreiras tarifárias e não
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atos menos graves, relacionando as conseqüências destes atos com a vulnerabilidade das
instalações. Ressalte-se que esta argumentação está pautada em pesquisa bibliográfica e
documental.
I. Os Portos na Logística de Transporte
A logística empresarial trata de todas as atividades de movimentação e
armazenagem que facilitam o fluxo de bens e serviços, desde o ponto de aquisição de
matéria-prima até o ponto de consumo final. Trata também dos fluxos de informação
que colocam os produtos em movimento tendo como propósito prover serviços
adequados aos clientes a custo razoável (BALLOU, 1995).
Devido à sua importância econômica, tanto as atividades de transporte como
as de manutenção de estoques são consideradas atividades primárias da logística
empresarial. Enquanto o transporte adiciona valor de lugar ao produto (o termo
“produto” é aqui utilizado no sentido lato, incluindo tanto bens como serviços), o
estoque agrega valor de tempo.
O transporte passou a representar atividade de grande importância do ponto de
vista econômico, pois segundo Fleury (1992), absorve, em média, de um a dois terços
dos custos logísticos nas empresas. Conforme Ballou (1995), as atividades de transporte
estão presentes: no suprimento físico (relacionado à movimentação interna de materiais
ou produtos, das fontes ao comprador); no planejamento e controle da produção (fluxo
de materiais, desde o recebimento da matéria-prima, passando pelas etapas de
fabricação e processamento, até o estoque de produtos acabados); e na distribuição
física (diz respeito à movimentação externa dos produtos, do vendedor ao cliente ou
consumidor).
A administração da distribuição física é desempenhada em 3 níveis:
estratégico (a alta administração da companhia irá tomar decisões de longo prazo, de
modo a definir como deverá ser constituído e estruturado o sistema de distribuição);
tático (a gerência de nível médio irá tomar decisões de curto prazo relativas a
otimização do sistema de distribuição); e operacional (o pessoal de chefia, supervisão e
os postos subordinados colocarão em prática a movimentação das mercadorias).
tarifárias ao comércio (tanto para bens quanto para serviços). Documento legal estabelecido ao final da Rodada do
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Normalmente, as atividades de distribuição física são estrategicamente
interligadas às funções de produção e marketing da empresa, devendo ainda, segundo
esta nova perspectiva, agregar novos setores às demandas logísticas.
Desta feita, muitas empresas têm caminhado para maior abrangência de suas
políticas, de forma que ultrapassem as atividades de processamento industrial e os
projetos de ciclo de vida de produtos e embalagens, se estendendo às atividades
logísticas como distribuição física e suprimento. A tendência atual é que as políticas
englobem todos os elos da cadeia de suprimentos demandando a ampliação da
perspectiva econômica e introduzindo questões relativas a gestão do território no âmbito
dos estudos logísticos. Isto porque num contexto globalizado – onde os acordos de
comércio em âmbito multilateral, bilateral ou regional são a tônica e onde cada vez
maiores contratos são negociados – o comércio marítimo se reveste de importância cada
vez maior.
II. Os portos e sua contextualização no cenário atual
O avanço tecnológico tem acarretado mudanças significativas na produção
com relação aos fatores determinantes de competitividade, entre os quais gestão da
qualidade: marketing e inovação tecnológica, gerenciamento de recursos humanos,
tecnologia da informação e gestão financeira. Tais fatores também afetam diretamente a
logística empresarial em níveis mais abrangentes que a manutenção da oferta,
introduzindo serviços que priorizam a qualidade, o desempenho em custo e o tempo de
entrega.
A perspectiva de uma cadeia logística de suprimentos expõe a fragilidade de
um sistema que não se vincula apenas à ruptura do tempo e à garantia da entrega
“imediata”, mas que depende fundamentalmente de uma infra-estrutura que deve ser
expandida a níveis globais ou que, ao menos, deve estar pontuada em locais
considerados estratégicos à difusão do capital e de seu mercado. Nesse contexto a
questão portuária passa a ser estratégica, haja vista sua grande capacidade enquanto
modal e transporte, e suas novas atribuições enquanto fator de produção.
Em outras palavras, se os sistemas de transporte são considerados como
Uruguai e acordado pelos 148 países membros da OMC.
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fatores de produção, então passam a agregar vantagens competitivas ao produto além de
novos mecanismos de produção do capital. Ou seja, além de atender a demanda, os
sistemas de transporte potencializam a própria atividade, pois mais do que simplesmente
seu valor de uso, também representam valor de troca incorporados aos bens de produção
a que se associam (VASCONCELLOS, 1996).
Essa característica é fundamental para o transbordo marítimo, principalmente
se forem consideradas as atividades desenvolvidas atualmente nos grandes portos que
praticamente se fundem à empresa (como é o caso da indústria pesqueira moderna).
Acrescenta-se a inovação no sistema de transporte de cargas com a introdução do
container, que permite um transbordo multimodal efetivo, ampliando o escopo de sua
atuação a um nível regional.
Tal multifuncionalidade e abrangência ampliam as redes produtivas, mas
também tornam estas áreas extremamente vulneráveis a uma complexidade de variáveis
que vão desde a dificuldade de controle efetivo do produto à questão de segurança
nacional ou mesmo mundial. A segurança, portanto, passa a ser instrumento de
barganha nas negociações internacionais, seja como fator de vantagem competitiva, seja
como elemento restritivo ao comércio internacional. E a questão que hoje se coloca é:
como dar segurança à cadeia logística, a partir da produção, para tentar determinar
falhas no processo como um todo?
Caso seja possível, as novas tendências em estudos logísticos se fundem a
cenários mais amplos, vinculados à própria gestão do território, cuja dinâmica de análise
envolve o entendimento da sociedade e seus meios de produção, bem como dos atores
envolvidos neste processo.
É fato que a inovação do transporte de carga introduzida pelo container
ampliou o transbordo multimodal. Da porteira ao porto, a abrangência espacial dessas
áreas consideradas “de controle” é expandido para as áreas de produção. Mesmo o
cultivo e posterior armazenamento devem ser controlados e hoje a vigilância eletrônica
expande-se para os silos e armazéns de estocagem. A monitoração nas estradas é feita
por satélite, estando sujeita às limitações da capacidade infra-estrutural de cada país e a
estocagem e as novas funções portuárias também devem ser monitoradas, assim como o
navio durante todo o período em que permanece nas imediações do porto (Revista Veja,
2004).
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A Figura 1 apresenta um esquema da cadeia logística e das novas atribuições
dos portos modernos, como demonstrativo das complexidades que este processo
alcança. Esta complexidade se soma à redefinição do papel do Estado no setor (de
provedor de serviços para regulador) e à revisão de um amplo conjunto de normas e
regulamentos essenciais relacionadas ao conjunto de atividades desenvolvidas nos
portos.
Figura 1 - Gerência Setorial da Logística de Cargas: As atividades realizadas nos portos discriminando os serviços
prestados ao navio e às cargas/usuários. Fonte: BNDES, 2004
As atividades realizadas nos portos estão divididas segundo as seguintes
atribuições por competências (BNDES, 2000): a definição das filas e a dragagem do
canal de acesso e dos berços de atracação são de responsabilidade das companhias
docas; os serviços de auxílio à navegação e de praticagem são realizados pela
corporação dos práticos; os rebocadores pertencem a empresas privadas; e as operações
a bordo são realizadas pela corporação dos estivadores; as operações de carga e
descarga dos navios; a movimentação da carga dentro dos terminais; a armazenagem e o
recebimento e despacho estão sendo transferidos para os novos operadores privados e a
movimentação ferroviária no interior do porto, se houver, é realizada pelas docas.
Segundo Lima e Velasco (1997), essas novas competências atribuídas aos
portos, em função “da expansão do comércio exterior a taxas superiores às do produto
mundial, da relocação de plantas industriais e da reestruturação dos processos
produtivos” (genericamente denominadas “globalização”), têm imprimido novas
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exigências, obrigando-os a “superar o simples papel de elo entre as matrizes de
transportes nacional e internacional”. A diversificação dos serviços oferecidos pelo
porto, fora dos limites de suas linhas de cais, pátios e armazéns (com agregação ou não
de valor), exige a estruturação de uma comunidade portuária com o estreitamento de
seus vínculos com a cidade e seus usuários, de maneira a transformá-lo numa
plataforma de logística de comércio, um porto de 3ª geração, conforme definição da
UNCTAD (United Nations Conference for Trade and Development) – Conferência das
Nações Unidas para Comércio e Desenvolvimento.
Conforme Lima e Velasco (1997), “os grandes portos europeus, especialmente
no mar Báltico, já atuam como portos de 3ª geração há bastante tempo”. Já os novos
portos do Mediterrâneo, com destaque para o de Barcelona, “começam a se reestruturar
para esses novos tempos e métodos, com reflexos extremamente positivos sobre os
índices de emprego”, daí a importância da certificação ISPS para que não haja prejuízo
para as atividades.
III. ISPS CODE
Depois do ataque ao território americano em 11 de setembro de 2001, a IMO,
preocupada com a segurança do comércio marítimo internacional, delegou ao Maritime
Safety Committee (Comitê de Segurança Marítima) e ao seu Intersessional Working
Group (Grupo de Trabalho Interseccional) a responsabilidade de dar subsídios para a
realização de uma conferência internacional sobre o aspecto da segurança dos navios e
portos. O trabalho culminou com a Conferência de Londres em dezembro de 2002.
Participaram do evento 108 países que haviam assinado a Convenção SOLAS (Safety of
Life at Sea Convention – Convenção sobre Segurança da Vida no Mar), em 1974. A
Conferência também contou com a presença de observadores de agências
governamentais, não-governamentais e da própria ONU.
As principais decisões da Conferência foram a implementação de uma série de
Emendas ao SOLAS de 1974 e a adoção do ISPS CODE (International Ship and Port
Facility Security Code), que deveria ser totalmente implementado até julho de 2004
(IMO, 2004). É importante mencionar que o endurecimento da lei americana se
antecipou à Conferência de Londres, o que é compreensível uma vez que os EUA foram
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atacados e continuavam sob ameaças terroristas, tendo sido promulgado o Maritime
Transportation Security Act of 2002 (Ato sobre Segurança do Transporte Marítimo) em
25 de novembro de 2002 (MTSA, 2004). Como conseqüência desta antecipação, todos
os portos americanos já estão adaptados às regras do ISPS CODE, mas, no resto do
mundo, somente os portos de Rotterdam e Hamburgo estão.
Os principais objetivos do ISPS CODE são: efetuar a detecção e tentar impedir
a execução de ameaças à segurança em escala internacional; estabelecer os papéis e
responsabilidades do pessoal envolvido; possibilitar a coleta e a troca de informações de
segurança; criar uma metodologia para a avaliação da segurança; e assegurar que
medidas de segurança adequadas sejam implementadas. Para as autoridades dos
complexos portuários, as obrigações são: coletar e avaliar informações; manter
protocolos de comunicação; restringir o acesso e não permitir o acesso de armas não
autorizadas; ter sistemas que permitam soar alarmes em situações atípicas; implementar
planos de segurança para os navios e para o complexo portuário; e assegurar atividades
de treinamento e de exercícios.
Depois da Conferência da IMO de dezembro de 2002, uma segunda
Conferência foi realizada em Londres, entre 28 de maio e 6 de junho de 2003, durante a
qual foram divulgados mais detalhes sobre as regras de implementação do ISPS CODE.
Não houve mudança de nenhuma regra, mas foram publicadas recomendações de como
o Código deveria ser interpretado por parte das autoridades portuárias e pelos
armadores, assim como foram dadas indicações sobre futuras Emendas que o ISPS
CODE poderia vir a sofrer depois de sua implementação.
IV. Situação dos principais portos brasileiros: breve relato
Nos últimos anos, o Brasil vem firmando seu papel como exportador de
produtos agrícolas, minerais e manufaturados. Sendo assim, o não credenciamento ou o
atraso do credenciamento dos principais portos brasileiros em relação ao ISPS CODE
pode gerar sérias conseqüências para a balança comercial do país. O prazo dado pela
Conferência de Londres para que os portos mundiais se adaptassem ao ISPS
CODEinicialmente foi até julho de 2004 embora este tenha sido flexibilizado pela IMO.
A Tabela 1 mostra os maiores portos do país em termos de movimentação:
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Porto Toneladas Percentagem
1) Tubarão / ES 72.610.733 15,2 2) Itaqui / MA 58.551.672 12,2 3) São Sebastião / SP 45.695.189 9,5 4) Santos / SP 43.084.383 9,0 5) Sepetiba / RJ 39.830.861 8,3 Soma Cinco Primeiros 198.178.267 41,4 Brasil 478.059.521 100,0
Tabela 1- Maiores portos em movimentação. Fonte: ABCT (2000).
É necessário cuidado ao se analisar diferentes portos brasileiros, não se
devendo compará-los apenas com base nos valores de movimentação global. Por
exemplo, o Porto de Tubarão, com 72 milhões de toneladas anuais não deve ser
comparado com o Porto de Santos, com 43 milhões de toneladas. Tubarão, porto
privado da Vale do Rio Doce, é especializado na exportação de minérios (granéis
sólidos), que representam aproximadamente 100% de sua movimentação. Santos, porto
público, opera um conjunto diferenciado de produtos (45% de granéis sólidos, 22% de
granéis líquidos e 33% de carga geral), sendo o porto responsável pela movimentação
da maior parte do nosso comércio externo de produtos industrializados (carga geral).
Dessa forma, é necessário que a formulação de políticas para a modernização
dos portos seja baseada em análises específicas para cada porto, de acordo com suas
especializações e com suas diferentes vocações regionais. Isso ilustra que o tratamento
dos portos brasileiros é complexo, pois cada um apresenta suas próprias especificidades
e cada uma destas terá que ser considerada na implementação do ISPS CODE. Além
disso, ao analisar uma classificação, é preciso estar atento se esta se refere aos portos
públicos ou privados, isoladamente, ou a ambos, já que o porto público possui um maior
diferencial de produtos, estando sujeito a uma maior complexidade no controle efetivo
de sua carga. A Tabela 2 mostra o volume por tipo de carga movimentada nos portos
brasileiros.
Tipo de Carga 103 Toneladas %
Granéis Sólidos 281.292. 58,0 Granéis Líquidos 154.555 31,9 Carga Geral 48.813 10,1 Total Geral 484.660 100,0
Tabela 2 - Movimentação portuária brasileira por tipo de carga. Fonte: ABCT (2000).
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Atualmente, os containers estão ganhando espaço em volume de unidades
transportadas. O Porto de Santos é responsável pelo manuseio de quase metade dos
containers transportados. Os dados das tabelas 3 e 4, tanto em tonelagem quanto por
tipo de carga movimentada, mostram que, independentemente da classificação que se
analise, o maior volume de movimentação está concentrado na região Sudeste. Nessa
região, os portos estão integrados a outras modalidades de transporte como ferrovias e
rodovias, que também entrarão no escopo das medidas de segurança preconizadas pelo
ISPS CODE.
Porto Toneladas %
Santos (SP) 13.902.767 29,0 Praia Mole (ES) 6.640.694 13,8 Rio de Janeiro (RJ) 4.561.605 9,5 Paranaguá (PR) 3.165.477 6,6 Rio Grande (RS) 1.742.631 2,4 Soma cinco maiores 30.013.174 62,6 Brasil 47.950.236 100,0
Tabela 3 – Maiores portos: carga geral. Fonte: ABCT (1999).
Porto Toneladas %
Santos (SP) 8.651.320 52,8 Rio de Janeiro (RJ) 2.393.120 10,7 Rio Grande (RS) 2.163.425 9,7 Paranaguá (PR) 1.721.099 7,7 S. F. do Sul (SC) 1.443.675 6,5 Soma cinco maiores 16.372.639 73,7 Brasil 22.221.349 100,0
Tabela 4 – Maiores portos: containers. Fonte: ABCT (1999).
V. Aplicação da matriz de riscos para adequação dos portos brasileiros ao ISPS
CODE
O processo de credenciamento dos portos brasileiros com relação ao ISPS
CODE é, segundo a legislação internacional, de responsabilidade do Governo que deve
aprovar o Plano de Segurança das Instalações Portuárias, fazer as avaliações, determinar
o nível de segurança adequado e monitorar sua implementação.
O DPC (Diretoria de Portos e Costas da Marinha), através das suas Comissões
Estaduais de Segurança Pública nos Portos, Terminais e Vias Navegáveis
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(CESPORTOS), é o organismo responsável pelo processo e pela inspeção e certificação
dos navios. Congregando as Comissões Estaduais (CESPORTOS), como órgão
hierarquicamente superior, está a Comissão Nacional de Segurança Pública nos Portos,
Terminais e Vias Navegáveis (CONPORTOS). Durante o processo de certificação, a
CONPORTOS agirá como mediadora e receptora das recomendações das Comissões
Estaduais e tomará as decisões finais.
No caso brasileiro, as autoridades implementarão matrizes de risco para
priorizar os pontos a serem adequados às regras do ISPS CODE. A matriz de risco é
uma técnica muito usada quando se deve priorizar medidas em um ambiente
extremamente complexo, como é o caso, uma vez que o ISPS CODE não se restringirá
aos navios e às instalações portuárias, devendo também contemplar a segurança de
todos os implicados nas atividades dos portos.
Como principais requerimentos de avaliação de riscos portuários podem ser
relacionados: recursos de infra-estrutura; fraquezas na segurança física; fraquezas na
integridade física; procedimentos; sistemas de comunicação; infra-estrutura de
transportes; fornecedores; e pessoal envolvido.
A metodologia a ser utilizada será um estudo de ameaças selecionando os
cenários em uma graduação de atos mais graves até atos menos graves, relacionando as
conseqüências destes atos com a vulnerabilidade das instalações através de uma matriz
de risco. Desse modo, para cada tipo de situação (ameaça de bomba ou de invasão por
favelas, greves, revoluções, riscos físicos, etc.) é feita uma matriz de risco. Define-se
então a ordem das prioridades e com os resultados dessa análise, elabora-se um Plano de
Segurança da Instalação Portuária, denominado Plano de Segurança Pública Portuária –
PSPP.
As prioridades são elencadas de acordo com a pontuação obtida, priorizando-
se as situações que apresentam conseqüências mais graves e para as quais o porto é mais
vulnerável, ou seja “Alta conseqüência” e “Alta vulnerabilidade”, na grade da matriz de
risco. Esta pontuação depende da sensibilidade e da expertise dos especialistas
envolvidos na análise, pois são os responsáveis pela avaliação das conseqüências e das
vulnerabilidades envolvidas na situação descrita pelos cenários. A Figura 2 apresenta
um esquema da matriz de risco.
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Vulnerabilidade Conseqüência
Alta Média Baixa
Alta
Média
Baixa
Figura 2 – Modelo de matriz de risco
É importante lembrar que os problemas de segurança não se restringem ao
âmbito da área do porto em si, mas permeiam também todas as outras atividades de
apoio, como fornecedores, transportadoras, controle de pessoas que têm acesso à área
portuária, etc. Este tratamento é bastante complexo, já que cada porto tem suas
peculiaridades e, portanto, prioridades diferenciadas.
Depois das análises qualitativas realizadas para construção das matrizes de
risco – que determinarão as prioridades de cada porto – virá a fase das análises
quantitativas, uma vez que o planejamento deverá ser seguido até a implementação das
medidas a serem adotadas o que ficará sujeito a restrições de tempo e orçamento.
Como modelo, após a análise de risco e conseqüente aprovação das respectivas
Comissões de segurança portuária nacionaisl, os portos devem buscar capacitar-se com
treinamentos de pessoal, adoção de obras e sistemas inteligentes de segurança, além de
implementar parcerias com a iniciativa privada, para o efetivo controle de sua retro-área
(ampliadas às instalações continentais como portos secos, etc) e posterior “certificação
ISPS”.
VI. Considerações Finais
Os portos são vitais para o comércio exterior e, consequentemente, para a
economia nacional. Em um cenário globalizado, onde os acordos de comércio em
âmbito multilateral, bilateral ou regional são a tônica e onde cada vez maiores contratos
são negociados, a capacidade portuária constitui-se em importante fator de
competitividade.
Neste contexto, o aumento das exigências técnicas, mesmo que embasadas no
quesito segurança, tornam-se instrumentos de barganha nas negociações internacionais,
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seja como fator de vantagem competitiva, seja como elemento restritivo ao comércio
internacional. Assim sendo, o não credenciamento ou o atraso do credenciamento dos
principais portos brasileiros em relação ao ISPS CODE pode gerar sérias conseqüências
para a balança comercial do país.
A implementação do ISPS CODE nos portos brasileiros será complexa uma
vez que cada porto apresenta suas próprias especificidades variando conforme tipo e
volume de carga, localização e diversidades regionais, natureza do porto se público ou
privado, e integração com outras modalidades de transporte.
No caso brasileiro a metodologia adotada fará uso da aplicação de técnicas
qualitativas focando mais especificamente a matriz de risco que permitirá priorizar
medidas a serem adotadas a partir da elaboração de cenários plausíveis relativos aos
aspectos que deverão ser certificados. Definidos e priorizados os riscos, obtêm-se os
subsídios necessários para a elaboração de um Plano de Segurança que deverá ser
implementado para a obtenção da “certificação ISPS”.
À guisa de conclusão, nesta análise de cunho exploratório, buscou-se a
descrição de uma metodologia de base qualitativa que vem sendo adotada em um
processo de certificação dos portos nacionais.
As metodologias de base qualitativa, de um modo geral, agregam as
complexidades de situações do mundo moderno, muitas delas dependendo da
sensibilidade dos analistas envolvidos, sobretudo quando dizem respeito ao
comportamento humano ou a qualquer outra situação que não se adapte a modelos
matemáticos. Estas também requerem uma abordagem multidisciplinar, que, no cenário
atual abordado pelo trabalho, inserem questões de natureza econômica e territorial.
No escopo dessa interdisciplinaridade, questões de cunho geopolítico somam-
se a estudos prospectivos, sugerindo fortemente a ampliação da perspectiva econômica
através da introdução de questões relativas à gestão do território no âmbito dos estudos
logísticos.
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