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1.1 A Biblioteca Escolar 2.0: novas funções para o professor bibliotecário A biblioteca escolar, para além de ser um espaço que contém recursos documentais organizados, tem vindo a constituir-se como uma estrutura transversal à escola, particularmente pela dinâmica na motivação para a leitura. “[Desempenha] um papel central no suporte às aprendizagens, no desenvolvimento de competências de informação e na formação de leitores, as bibliotecas instaladas pela RBE têm deixado uma marca de qualidade, reconhecida na maioria das escolas” (RBE, 2008, p. 2). Para além deste papel, a biblioteca deparou-se nos últimos anos com um novo desafio formativo. Ajudar professores e alunos a aprenderem através de recursos variados, em papel, vídeo, e online. Saber pesquisar, avaliar a qualidade da informação encontrada e sintetizar ideias, passaram a ser consideradas competências cruciais. No entanto, os alunos têm particular dificuldade em sintetizar ideias, optando muitas vezes pelo processo mais simples: copiar e colar a informação. Para além de os orientar nessa tarefa, nenhum professor bibliotecário pode deixar que um aluno da sua escola termine aí a escolaridade sem saber distinguir citar de plagiar 1 . Monereo (2005), parte destas competências, mas perspectiva-as como quatro competências sócio-cognitivas que podem e devem ser rentabilizadas na Internet: aprender a procurar informação e a aprender, aprender a comunicar, aprender a colaborar e aprender a participar na sociedade (cf. quadro 1). Elas são importantes e o professor bibliotecário deve tê-las presente no apoio e nas orientações que dá aos alunos e aos professores. “Internet es um escenario apropriado para enseñar esas competências porque, dado el estado actual de crecimiento y expansión entre los jóvenes, se está convirtiendo em el médio de socialización “natural” y, com toda segurydad, em um médio privilegiado para su desarrollo Professional.” (Monereo, 2005, p. 18) 1 URL sobre Plagiarism http://www.plagiarism.org/

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1.1 A Biblioteca Escolar 2.0: novas funções para o professor bibliotecário

A biblioteca escolar, para além de ser um espaço que contém recursos documentais

organizados, tem vindo a constituir-se como uma estrutura transversal à escola,

particularmente pela dinâmica na motivação para a leitura. “[Desempenha] um papel

central no suporte às aprendizagens, no desenvolvimento de competências de

informação e na formação de leitores, as bibliotecas instaladas pela RBE têm deixado

uma marca de qualidade, reconhecida na maioria das escolas” (RBE, 2008, p. 2).

Para além deste papel, a biblioteca deparou-se nos últimos anos com um novo desafio

formativo. Ajudar professores e alunos a aprenderem através de recursos variados, em

papel, vídeo, e online. Saber pesquisar, avaliar a qualidade da informação encontrada

e sintetizar ideias, passaram a ser consideradas competências cruciais. No entanto, os

alunos têm particular dificuldade em sintetizar ideias, optando muitas vezes pelo

processo mais simples: copiar e colar a informação. Para além de os orientar nessa

tarefa, nenhum professor bibliotecário pode deixar que um aluno da sua escola

termine aí a escolaridade sem saber distinguir citar de plagiar1.

Monereo (2005), parte destas competências, mas perspectiva-as como quatro

competências sócio-cognitivas que podem e devem ser rentabilizadas na Internet:

aprender a procurar informação e a aprender, aprender a comunicar, aprender a

colaborar e aprender a participar na sociedade (cf. quadro 1). Elas são importantes e o

professor bibliotecário deve tê-las presente no apoio e nas orientações que dá aos

alunos e aos professores.

“Internet es um escenario apropriado para enseñar esas competências

porque, dado el estado actual de crecimiento y expansión entre los

jóvenes, se está convirtiendo em el médio de socialización “natural” y, com

toda segurydad, em um médio privilegiado para su desarrollo

Professional.” (Monereo, 2005, p. 18)

1 URL sobre Plagiarism http://www.plagiarism.org/

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Competências sócio-cognitivas básicas Descrição

Aprender a procurar informação e a aprender

Implica uma aprendizagem permanente, autónoma, auto-regulada, não formal e estratégica.

Aprender a comunicar Inclui dominar a linguagem específica de cada disciplina, utilizar simultaneamente diferentes meios para comunicar e dar primazia aos aspectos semânticos da comunicação.

Aprender a colaborar Pressupõe uma série de estratégias que facilitam o trabalho em equipa, aprendendo de forma cooperativa e colaborativa2; aprender em rede movimentando-se em diferentes redes, desenvolver instituições que aprendam.

Aprender a participar na sociedade Fazer do cidadão um elemento activo que participa na vida pública, cria clima de diálogo e respeito pela diversidade, tem uma visão crítica e reflexiva perante a comunicação social, os políticos, etc.

Quadro 1 – Competências sócio-cognitivas básicas (traduzido e adaptado de Monereo, 2005, p.

14-17)

A biblioteca escolar, através dos professores bibliotecários tem assim um papel crucial

no desenvolvimento das literacias e na aquisição de competências de informação,

nomeadamente: “capacidade de entender suas necessidades de informação e de

localizar, seleccionar e interpretar informações, utilizando-as de forma crítica e

responsável” (Campello, 2009, p. 13).

A RBE tem tido o cuidado de promover iniciativas que fomentem a literacia da

informação, tal como acontece com as organizações internacionais de professores

bibliotecários como a Americana (AASL), a Australiana (ASLA), a Teachernet, School

Library, entre outras. Como refere Campello (2009) utilizando a expressão letramento

informacional, a literacia da informação constitui um passo à frente na trajectória da

profissão bibliotecária, “na busca de maior espaço para exercer seu papel educativo”

(p. 7).

2 O autor só refere cooperativo, mas o colaborativo também é imprescindível.

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Um dos aspectos que tem preocupado os bibliotecários é a pesquisa elaborada de

forma disciplinada, sendo um dos modelos de literacia informacional mais conhecidos

o Big63 da autoria de Michael Eisenberg e Robert Berkowitz, de 1987, que tem tido

grande aceitação e funciona como andaime metacognitivo (Campello, 2009). Este

modelo tem seis partes e encontra-se um exemplo online em português na Escola de

Alvide: Definição da tarefa, Estratégias para procurar a informação, Localização e

formas de acesso, Utilização da Informação, Síntese e Avaliação. Michael Marland, no

Reino Unido, também propôs um modelo com nove passos apresentados sob a forma

de questões (cf. Campello, 2009, p. 16-174). A AASL conjuntamente com a AECT

(Association for Educational Communications and Technology) no documento

Information Power, de 1998, destinado a alunos do ensino básico, definem nove

parâmetros de literacia informacional, que se apresentam em três segmentos:

- Competência informacional, centra-se na capacidade de aceder, avaliar

e usar informação;

- Aprendizagem independente, consiste na capacidade de procurar e

usar informação de maneira independente;

- Responsabilidade social, surgindo este último pela primeira vez neste

tipo de modelos, “explora o uso social da informação, abordando a atitude

ética com relação à informação e ao compartilhamento de práticas

informacionais” (Campello, 2009, p. 21-22).

A AASL (2007, s. p.) considera que as bibliotecas escolares são essenciais no

desenvolvimento de capacidades de aprendizagem:

“School libraries provide equitable physical and intellectual access to the

resources and tools required for learning in a warm, stimulating, and safe

environment. School librarians collaborate with others to provide

instruction, learning strategies, and practice in using the essential

learning skills needed in the 21st century.”

3 http://www.big6.com/ - Information and technology literacy model: Task definition, Info seeking, strategies, Location and Access, Use of Info, Synthesis, and Evaluation. 4 O modelo de Michael Marland inclui as seguintes nove questões: O que preciso fazer?, Aonde posso ir?, Onde consigo a informação?, Que recursos devo usar?, Como devo usar os recursos?, O que devo registar?, Tenho a informação de que preciso?, Como devo fazer a apresentação?, O que obtive?.

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E se inicialmente o papel educativo do bibliotecário se centrava na promoção da

leitura, esse papel tem vindo a diversificar-se para um uso mais eficiente da variedade

de recursos educativos na aprendizagem, tendo como objectivo preparar os alunos

para se tornarem capazes de aprender autónoma e criticamente (Campello, 2009).

“School libraries can provide a flexible place for learning where project

work, individual study, group research, reading and the teaching of ICT

can all take place. By supporting and giving access to a broad range of

information sources, the school library can stimulate learning and motivate

pupils by providing the means to freely pursue subjects which engage

them.” (TeachersNet, School Libraries, s. p.)

O Information Power, de 1998, atrás referido, constitui um documento de orientação do

trabalho do bibliotecário, que se alicerça em três ideias: colaboração, liderança e

tecnologia (apud Campello, 2009).

- A colaboração é essencial e significa o envolvimento do bibliotecário com os

professores na planificação, implementação e na avaliação das actividades relacionadas

com a biblioteca. A colaboração entre o bibliotecário, os professores e a Direcção da

Escola, isto é, a equipa pedagógica, torna-se essencial para o êxito da biblioteca como

recurso de aprendizagem;

- O bibliotecário deve exercer uma liderança visível na escola; esclarecendo

como se pode aprender tirando partido da diversidade informacional, proporcionando

uma acção didáctica articulada em torno da biblioteca;

- O bibliotecário surge como dinamizador e perito da tecnologia, aconselhando

os professores na integração da tecnologia para uma melhor rentabilização de

estratégias de ensino ou de aprendizagem (idem).

“A colaboração se torna especialmente importante quando o bibliotecário

desempenha funções directamente ligadas à aprendizagem e desenvolve

actividades com os estudantes.” (Campello, 2009, p. 55)

Montiel-Overall (2005 apud Campello, 2009) definiu quatro níveis para caracterizar o

processo de colaboração entre o bibliotecário e os membros da equipa pedagógica:

coordenação, cooperação, instrução integrada e currículo integrado. Cada um dos níveis

se caracteriza por um nível de complexidade crescente.

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A coordenação é o nível mais simples. Por exemplo, palestras para os alunos que estão

a ingressar na escola apresentando a biblioteca, localização dos materiais, regulamentos,

normas e os recursos disponíveis. A colaboração com os professores limita-se a (i)

estabelecer horários e organizar o esquema das palestras; (ii) combinar horários para os

alunos irem à biblioteca escolher livros, ouvir histórias ou procurar informação para um

trabalho escolar; ou ainda (iii) organizar exposições, encontros com escritores ou feiras

de livros.

No nível de cooperação, o professor informa o bibliotecário dos objectivos do trabalho

solicitado aos alunos. Neste caso, o bibliotecário “separa o material adequado, auxilia os

alunos na localização e no uso das diversas fontes de informação, fornece instruções

para a normalização do trabalho escrito” (Campello, 2009, p. 56). Pessoalmente, parece-

me uma estratégia a ser seguida numa fase inicial de aprendizagem, mas depois é

preciso ajudar os alunos a crescer, a tornarem-se independentes na pesquisa, devendo o

bibliotecário, tal como o professor, passar para um papel de orientador ou de supervisor,

ajudando se necessário, mas permitindo a criação de autonomia.

Na instrução integrada, o bibliotecário e o professor planificam, implementam e

avaliam as actividades em conjunto, com objectivos comuns e partilhados. Pretende-se

tirar partido dos conhecimentos de cada um, a nível do conteúdo e da tecnologia para os

alunos poderem usufruir de aprendizagens inovadoras. Cabe neste nível a recomendação

da utilização de ferramentas da Web 2.0 que são fáceis de usar. O impacto que tem para

os alunos um conteúdo estruturado, por exemplo, no Google sites ou mesmo num

blogue será diferente de material em fotocópias. Na mesma ordem de ideias, conceber

juntamente com o professor ou ajudá-lo a disponibilizar online uma Caça ao Tesouro,

será por certo muito mais aliciante e importante na aprendizagem dos alunos.

No currículo integrado, espera-se que a colaboração do bibliotecário exista com todos

os professores e que as actividades da biblioteca estejam integradas na escola,

abarcando todas as turmas. O envolvimento com a Direcção da Escola é fundamental.

Scheirer (2000, s. p.) sintetiza o novo papel do professor bibliotecário:

“Teacher-librarians are curriculum development leaders as well as a

collaborative teaching and planning partners for the classroom teacher. They

can be leaders into integrating technology into instruction in the school.

They are the information specialists who provide both physical and

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intellectual access to material through teaching the knowledge, skills and

values required to use information and to communicate knowledge ethically

and effectively. (…)

The teacher-librarian must be a catalyst for change and be involved in their

changing role by continuing to provide quality resources for teachers and by

becoming a positive role model for using technology. They can both

support and help to train teachers.”

A diversidade de recursos em diferentes formatos é indispensável na formação dos

alunos, particularmente os recursos que surgem na Web, que sendo do seu agrado

exigem mais critérios de avaliação do que os da Galáxia Gutenberg.

Por outro lado, os repositórios de acesso livre ampliam as possibilidades de pesquisa

sobre temas variados, podendo ser feitos apontadores num marcador social como o

Delicious ou o Connotea. A diversidade de recursos online e de ferramentas da Web 2.0

trazem ao bibliotecário uma enorme diversidade de possibilidades para criar, reutilizar e

disponibilizar exercícios de correcção automática, jogos, actividades para serem

concebidas por professores e resolvidas por alunos como a WebQuest ou a Caça ao

Tesouro.

“Related to social software is the idea of “Library 2.0”, or enhancing library

resources and services using social software, to reach users outside the

walls of the traditional library” (Bejeune & Ronan, 2008, p. 11).

As ferramentas da Web 2.0 permitem que o bibliotecário também diversifique o modo

de apresentar o seu trabalho. Por exemplo, ao ensinar os alunos a usar a biblioteca,

mostrando como ela se organiza, proporcionando-lhes familiaridade e autonomia,

podendo tirar partido dos podcasts em áudio. Ao gravar essas orientações elas serão, por

certo, do agrado dos que gostam de aprender independentemente, ouvindo. Deste modo,

vai transformando a sua biblioteca na biblioteca 2.0.

Como documentam Bejeune & Ronan (2008) no estudo realizado, várias bibliotecas

estão a usar o software social, sobretudo o Facebook e o MySpace; para partilhar os

media outras bibliotecas usam o Flickr, YouTube, iTunes; os marcadores sociais usados

são o Connotea, Delicious e o LibraryThing. Existem bibliotecas que usam wikis,

blogues, chat/mensagens instantâneas para apoio ao aluno. Algumas têm sites com RSS,

outras já têm a biblioteca no Second Life e outras optam por integrar widgets, como o

Meebo5. Claro, que cada biblioteca escolhe as suas ferramentas, para os propósitos que

5 É um widget para mensagens instantâneas.

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se propõe ou para as actividades que está a desenvolver. E aos poucos vai enriquecendo

o seu espaço online com apontadores para recursos da Web. Deste modo, a biblioteca

online tornar-se-á apelativa para os alunos da chamada geração Net.

(Excerto incluído num módulo de formação produzido para a RBE pela Drª Ana Amélia

Cardoso – Universidade do Minho)