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DETERMINAÇÃO DAS CARACTERÍSTICAS RESISTENTES DE BETÕES PRODUZIDOS COM AGREGADOS GROSSOS RECICLADOS Brito*, J. de; Santos**, J. R.; Gonçalves***, A. P.; Branco****, F. A. *professor Associado. DECivil, Instituto. Superior Técnico, Lisboa - Portugal **Assistente. DECivil, Instituto Superior Técnico, Lisboa - Portugal ***Eng.a Civil, Mestre em Construção (IST) ****professor Catedrático. DECivil, Instituto Superior Técnico, Lisboa - Portugal RESUMO Os agregados reciclados, tanto os utilizados na execução da camada de sub-base em estradas como os usados como substitutos nos agregados naturais no fabrico de betões, podem dar uma contribuição importante na diminuição das repercussões negativas que a produção e deposição dos resíduos da construção e demolição actualmente têm no ambiente. No âmbito da investigação que tem vindo a ser realizada no Instituto Superior Técnico neste domínio, apresentam-se neste artigo os resultados de dois programas de ensaiõs. No primeiro, visava-se a demonstração da sustentabilidade da reciclagem repetitiva de agregados pétreos grossos obtidos da demolição de• betão no fabrico de novo betão sem qualquer introdução de agregados naturais. A segunda campanha de ensaios permitiu obter valores do módulo de elasticidade à compressão de betões com agregados grossos reciclados e compará-los com os valores correspondentes em betões de referência. 1. INTRODUÇÃO A produção e deposição de resíduos da construção e demolição (vulgarmente designados por RCD) tem-se vindo a acen tuar nas últimas décadas, sobretudo em países ainda em. ciclo de forte desenvolvi mento, como é o caso de Portugal. Esta situação tem elevados custos am bientais e energéticos. Os vazadouros a céu aberto, com frequência em situação ilegal, são um ataque à estética ambiental, um des respeito pelo direito público e privado, res ponsáveis pela diminuição de solo arável e potencialmente conducentes à poluição do ar, água freática e solo (ainda que os RCD se integrem na classe de resíduos menos prejudicial ao ambiente). Indirectamente, o não aproveitamento dos agregados dos RCD contribui para a continuação da delapidação de recursos naturais nas pedreiras, autênticas feridas na paisagem rural. Do ponto de vista energético, é des perdiçada toda a energia necessária ao cor te e trituração dos agregados naturais. Um dos grandes objectivôs da recicla gem dos RCD é o reaproveitamento da par cela inorgânica não-metálica neles contidos como agregados no fabrico de novos mate riais de construção, visando dois intuitos 33

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DETERMINAÇÃO DAS CARACTERÍSTICAS RESISTENTES DEBETÕES PRODUZIDOS COM AGREGADOS GROSSOS RECICLADOS

Brito*, J. de; Santos**, J. R.; Gonçalves***, A. P.; Branco****, F. A.

*professor Associado. DECivil, Instituto. Superior Técnico, Lisboa - Portugal**Assistente. DECivil, Instituto Superior Técnico, Lisboa - Portugal

***Eng.a Civil, Mestre em Construção (IST)****professor Catedrático. DECivil, Instituto Superior Técnico, Lisboa - Portugal

RESUMOOs agregados reciclados, tanto os utilizados na execução da camada de sub-base emestradas como os usados como substitutos nos agregados naturais no fabrico de betões,podem dar uma contribuição importante na diminuição das repercussões negativas que aprodução e deposição dos resíduos da construção e demolição actualmente têm no ambiente.No âmbito da investigação que tem vindo a ser realizada no Instituto Superior Técnico nestedomínio, apresentam-se neste artigo os resultados de dois programas de ensaiõs. Noprimeiro, visava-se a demonstração da sustentabilidade da reciclagem repetitiva deagregados pétreos grossos obtidos da demolição de• betão no fabrico de novo betão semqualquer introdução de agregados naturais. A segunda campanha de ensaios permitiu obtervalores do módulo de elasticidade à compressão de betões com agregados grossos recicladose compará-los com os valores correspondentes em betões de referência.

1. INTRODUÇÃO

A produção e deposição de resíduos daconstrução e demolição (vulgarmentedesignados por RCD) tem-se vindo a acentuar nas últimas décadas, sobretudo empaíses ainda em. ciclo de forte desenvolvimento, como é o caso de Portugal.

Esta situação tem elevados custos ambientais e energéticos. Os vazadouros a céuaberto, com frequência em situação ilegal,são um ataque à estética ambiental, um desrespeito pelo direito público e privado, responsáveis pela diminuição de solo arável epotencialmente conducentes à poluição doar, água freática e solo (ainda que os RCD

se integrem na classe de resíduos menosprejudicial ao ambiente). Indirectamente, onão aproveitamento dos agregados dosRCD contribui para a continuação dadelapidação de recursos naturais naspedreiras, autênticas feridas na paisagemrural.

Do ponto de vista energético, é desperdiçada toda a energia necessária ao corte e trituração dos agregados naturais.

Um dos grandes objectivôs da reciclagem dos RCD é o reaproveitamento da parcela inorgânica não-metálica neles contidoscomo agregados no fabrico de novos materiais de construção, visando dois intuitos

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de carácter ambiental: a redução dovolume de resíduos levados a vazadouro ea diminuição da extracção de agregadosnaturais, um recurso não renovável. hiserese portanto esta investigação na temáticageral da Construção $ustentável.

Tem vindo a ser desenvolvida noInstituto Superior Técnico uma campanhade ensaios experimentais no domínio da reciclagem dos resíduos de construção e demolição, com particular ênfase na produçãode betão com agregados grossos recicladosa partir de betão. Deste trabalho resultou jáuma Dissertação de Mestrado emConstrução, intitulada “Análise do Desempenho de Betões Obtidos a Partir de InertesReciclados Provenientes de Resíduos daConstrução” [2J, cujos resultados serãoparcialmente analisados neste artigo.

Deve-se referir aqui que esta investigação não abarca mais do que uma pequena parcela da necessária neste vasto domínio. Sem se pretender ser fastidioso, basta referir que o fabrico de betões não é aúnica ou sequer a principal utilização dosagregados reciclados, actualmente mais vocacionados para a execução de bases e sub-bases de estradas e para a recuperação paisagística de pedreiras e minas abandonadas.Os agregados podem ser obtidos a partir deresíduos da demolição de peças de betão (ocaso aqui apresentado), de elementos dealvenaria cerâmica (tijolos e telhas) nãoargamassados, de uma mistura de alvenariacom argamassa cimentícia ou de resíduosda demolição não triados. Destas diversashipóteses resulta o tipo de agregadosreciclados: pétreos (caso em estudo),cerâmicos, mistura de ambos ou mistura deelementos cimentícios, cerâmicos com detritos de diversas origens (madeira, plásticos, vidro, etc.).

Por sua vez, os agregados recicladospoderão corresponder apenas à parcela degrossos (caso em estudo), dos finos ou aambos. Finalmente, a substituição dos agre

gados naturais pela parcela equivalente deagregados reciclados poderá ser total (casoem estudo) ou parcial.

O conhecimento do desempenho técnico dos betões produzidos com agregados reciclados está longe de ter sido atingido ao se investigar as característicasmecânicas (resistência à compressão emódulo de elasticidade) dos mesmos,como é reportado no presente artigo. Ocomportamento térmico, acústico ehigrométrico dos betões e argamassasproduzidos com este tipo de agregadosexige muito trabalho de investigação, omesmo se passando com a durabilidadedos mesmos, em investigação no IST noâmbito de uma Tese de Doutoramento.

Outros domínios envolvendo os RCDincluem a elaboração de directrizes para aprodução e normalização de RCD reciclados, bem como de especificações técnicase métodos de ensaio específicos para suaaplicação em argamassas e betões, a viabilidade técnica e económica do recurso aagregados reciclados, a definição de umapolítica de aterros consequente, a questãolegislativa (fundamental para a viabilizaçãode uma política sustentável para os RCD) ea sua implementação e fiscalização.

Assim sendo, reporta-se neste artigounicamente duas campanhas de ensaio emque foram analisadas a resistência à compressão, o módulo de elasticidade e a trabalhabilidade de betões produzidos com umasubstituição total dos agregados grossospor agregados pétreos reciclados obtidosda trituração de elementos de betão.

2. RECICLAGEM REPETITWA DEAGREGADOS

A primeira campanha de ensaios aquireferida visava demonstrar a sustentabílidade técnica da reciclagem repetitiva debetão para a produção de agregados grossos a serem utilizados no fabrico de novoselementos de betão. Para tal, tentou-se reproduzir as condições em que na prática

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este tipo de procedimento poderá ser tentado, ou sej a, recolheu-se um determinadovolume de betão de origem mais ou menosdesconhecida, conhecendo-se apenas a suaresistência à compressão, a qual indicavatratar-se de. um C32/40. Este material foitriturado e, no fabrico de um conjunto decubos de ensaio, substituiu-se a totalidadedos agregados grossos naturais por agregados grossos obtidos da trituração.

2.1 Sequência dos ensaios

Um dos preconceitos associados aosbetões produzidos com agregados reciclados é o de terem uma fraca resistência mecânica. Para o pôr em causa, recorreu-sedeliberadamente a um betão de origem relativamente resistente (C32/40) e estabeleceu-se uma composição do novo betão quedesse algumas garantias em relação à suafutura capacidade mecânica. Realce-se, noentanto e desde já, que não era objectivodesta campanha de ensaios estabelecercomparações entre o betão produzido comagregados naturais e o produzido comagregados reciclados.

O betão de origem era constituído porum conjunto de 71 cubos de ensaio com 15cm de aresta gentilmente cedidos peloLNEC. A sua capacidade resistente à compressão era conhecida (em todos os cubosentre 40 e 45 MPa), mas não a sua composição, origem dos materiais componentesou trabalhabilidade, até porque eram originários de mais de uma obra.

Estes cubos foram conduzidos a umacentral de reciclagem fixa onde foram triturados, tendo-se recolhido a totalidade dosprodutos dessa trituração. foi determinadaa percentagem desse material susceptívelde ser reciclada (tendo em conta que apenasos agregados grossos os retidos nopeneiro n.° 4: 4.76 mm - o seriam e que amáxima dimensãõ do agregado ficôulimitada aos 31.1 mm).

Foram retiradas amostras da parcelareciclada para se proceder à sua análise

granulométrica. Traçou-se a respectiva curva granulométrica (fig. 1) assim como ada areia natural.

,-,“

—“-—-i:

60,0 — — — — — — — — -

50,0 —— —— — — — — - —— — — -

40,0 —- — — — —

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30,0 — — — - — -—

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10,0 — — —

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Um dos problemas identificados maisimportantes nos agregados reciclados é asua absorção de água, substancialmentesuperior à dos agregados naturais. Por essarazão, determinou-se essa característicaseguindo-se a seguinte sequência (NP 581):retirou-se uma amostra de agregadosreciclados que foi imersa em água (Fig. 2)

CURVA GRANULOMÉTRICA -AGREGADOS RECICLADOS -?SÉRIE DE CUBOS DO IST (LOBSE)

3-ei

E

0,1- 1 10 100

abertura das malhas mm)

Fig. 1 - Curva granulométrica da parcela de grossosdos agregados reciclados do 1° ciclo

Fig. 2 - Aspecto dos agregados reciclados imergidos em água para determinação da sua absorção

Fig. 3 - Determinação da massa dos agregadosmergulhada em água

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1.6 1 de adjuvante plastificante.

até à sua saturação; procedeu-se à secagemda sua superfície com um pano seco e àdeterminação da massa na condiçãosaturado superfície seca (SS$); a amostrafoi depois pesada dentro de água (Fig. 3), oque permitiu posteriormente adeterminação da massa volúmica; aamostra foi então colocada numa estufa(Fig. 4) a. 105 °C até à sua secagem eestabilização da massa; a absorção de aguaé obtida como uma relação entre as duasmassas referidas.

A composição do betão foi feita atravésdo método das curvas de referência deFaury. Nesta composição, para além doobjectivo acima referido de obter umaclasse de betão semelhante à do betão deorigem, pretendia-se também conseguiruma trabalhabilidade aceitável (abaixamento no cone de Abrams entre 20 a 40mm) sem recorrer a uma relação água /cimento (a/e) muito elevada (paracompensar a grande absorçãà dosagregados). Pretendia-se desta formaacautelar a durabilidade do betão de umaforma indirecta, conhecida a influêncianegativa que uma relação a/c elevada temnessa característica.

Após algumas tentativas, conseguiu-seatingir estes vários objectivos com aseguinte composição (por m3 de betão):

• 450 kg de cimento;

• 730 kg de areia natural;

Determinou-se a trabalhabilidade dasamassaduras (abaixamento no cone deAbrams - Fig. 5), três em cada ciclo de reciclagem, e iniciou-se o preenchimentocom o betão fresco de 30 moldes metálicoscúbicos de 15 cm de aresta (previamentelimpos e aspergidos com óleo descofrante).Após a compactação da massa até à eliminação de bolhas de ar, os cubõs foram deixados no laboratório durante 24 horas,após o que foram marcados para identificação (Fig. 6), descofrados e levados para acâmara de cura, onde foram mantidos durante 27 dias à temperatura de 20 °C e comum teor de humidade de cerca de 100%.

• 1040 kg de agregados grossos reciclados;

• 202.5 1 de água (a/e = 0.45);

Fig. 4 - Estufa para secagem dos agregados

Fig. 5 - Ensaio do cone de Abrams feito ao betãocom agregados grossos reciclados

Fig. 6 - Aspecto dos cubos de ensaio após a suamarcação e imediatamente antes da sua desço

fragem e colocação na câmara de cura

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Após esse período, os cubos foramsubmetidos ao ensaio de determinação datensão de rotura à compressão numa prensa(Fíg. 7) de acordo com a EspecificaçãoLNEC E226. Foram determinados osseguintes valores: média, desvio padrão,coeficiente de variação e valorcaracterístico, correspondente ao quantil de5% numa distribuição normal de Gauss.Com isto se encerrou aquilo que sedesignou por 1° ciclo de reciclagem.

O 2° ciclo iniciou-se com a trituraçãodos cubos na mesma central de reciclagem,tendo-se repetido os passos descritós parao l ciclo. Realça-se o facto de ter sidomantida a composição do betão, nãoobstante o aumento registado na absorçãoà água dos agregados grossos reciclados(pela 2 vez). Uma vez que a capacidade dabetoneira obrigava à realização de trêsamassaduras por ciclo, ensaiaram-sealgumas variações em relação àcomposição de base, ainda que comresultados pouco conclusivos.

Houve ainda um 3° ciclo de reciclagem,idêntico aos anteriores excepto no facto dese terem triturado os cubos do cicloanterior numa trituradora de menoresdimensões do Laboratório doDepartamento de Minas do IST (Fig. 8).

2.2 Análise dos resultados principais

Os resultados principais dos três ciclosde reciclagem são a trabalhabilidade dasamassaduras (traduzida pelo abaixamento

respectivo no cone de Abrams, A), aresistência à compressãõ do betão(traduzida peÏo valor característico datensão de rotura à compressão, fk, e pelaclasse de resistência atribuída) e a absorção.de água dos agregados grossos reciclados(traduzida em percentagem por caa). Passa--se à apresentação e justificação dosvalores obtidos.

O valor médio de A nas trêsamassaduras foi de 2.8, 5.3 e 3.3 cm,respeÇtivamente no 1°, 2° e 3° ciclos.Tendo-se mantido a composição do betão enomeadamente a relação água / cimentoaparente (a/c 0.45) nos três ciclos, etendo em conta que, como se verá deseguida, a absorção de água dos agregadosreciclados foi sempre aumentando, seria deesperar que a . trabalhabilidade dasamassaduras e, consequentemente, o valorde A fosse diminuindo de ciclo para ciclo.O valor do 2° ciclo foge claramente destatendência, o que é explicado pelascondições atmosféricas do dia da respectivabetonagem, particularmente húmidas, o quepoderá ter influenciado o teor de águacontido, quer na brita, quer na areia (nestecaso, o teor superficial, em face da baixacapacidade de absorção das areias).

Os valores de fk obtidossequencialmente nos três ciclo foram de42, 40 e 46 MPa, correspondendo àsseguintes classes de resistência do betão:C32/40 (idêntica à do betão de origem sócom agregados naturais), C32/40 e C35/45.

fig. 7 - Ensaio de rotura à compressão dos cubos Fig. 8 - Trituradora de menores dimensões usadaapenas no 3° ciclo de reciclagem

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Registou-se portanto alguma oscilação,ainda que não muito significativa, em tomodo valor de 42 MPa, ou seja, a resistênciado betão tendeu a manter-se constante aolongo dos ciclos de reciclagem. Pensa-seque essa tendência só foi ligeiramentealterada pelas condições atmosféricas, àsquais as características dos betõesproduzidos com agregados recicladosparecem ser bastante sensíveis. Estasensibilidade teria sido provavelmenteeliminada, ou pelo menos fortementeatenuada, se se tivesse mantido a relaçãoágua / cimento efectiva constante, ou seja,tendo em conta a absorção crescente dosagregados reciclados, por os mesmos teremsido utilizados na condição seco ao ar.Existe um outro factor que poderá terafectado os resultados do 3° ciclo: avariação na curva granulométrica, maisbem distribuída, resultado do diferenteprocesso de trituração.

Um aspecto muito interessante a registare que contradiz um pouco algumabibliografia sobre esta matéria que reportauma variabilidade significativa dasresistências obtidas com agregadosreciclados, foi o facto do coeficiente devariação obtido nos ensaios de resistência àcompressão nos três ciclos terem sidoparticularmente baixos (não obstantecorresponderem a duas ou trêsbetonagens): 3.4%, 2.6% e 1.8%. Mesmotratando-se de betonagens efectuadas emcondições de laboratório, estes resultadosvêm demonstrar que os betões produzidoscom agregados reciclados podem ser tãofiáveis como os produzidos apenas comagregados naturais.

Em termos de absorção de água dosagregados grossos, foram os seguintes osvalores de Caa obtidos ao longo dos trêsciclos: 6.3, 7.6 e 8.5. Verifica-se portantoque a parcela de argamassa que fica aderente aos agregados pétreos em cada trituração faz com que a absorção dos mesmosvá aumentando. Não é possível, com o número de ciclos efectuados, concluir defini-

tivamente se esta tendência crescente se vaiou não manter indefinidamente. É, noentanto, claro tratar-se este do problemaprincipal da utilização dos agregadosreciclados, já que a absorção dos agregadosgrossos naturais raramente ultrapassa 1%.

Ao condicionar a trabalhabilidade dobetão fresco, a absorção de água pelosagregados conduz a uma de duasconsequências, se se pretender manter afluidez da amassadura: mantendo osrestantes componentes, haverá queaumentar a quantidade de água, com todasas consequências negativas que o aumentoda relação água / cimento tem nasresistências a longo prazo e, sobretudo, nadurabilidade; para manter a relação água /cimento, terá de se aumentar a dosagem decimento, recorrer a plastificantes ousuperpiastificantes ou tomar ambas asmedidas (como foi feito nesta campanha deensaios, o que explica a forte dosagem decimento utilizada - 450 kg/rn3 - e o recursoa um plastificante). Pensa-se que estasegunda estratégia é a mais adequada, sebem que implique custos acrescidos naprodução do betão. Realce-se que, nareciclagem repetitiva, esta necessidade,válida na passagem de apenas agregadosnaturais para a substituição mesmo queparcial por agregados reciclados, não se fazsentir, pelo menos de urna forma tãoevidente. As quantidades adicionais decimento e adjuvante poderão ser diminuídasrecorrendo a um cimento de melhorqualidade e a um superpiastificante.

2.3 Algumas variações aos ensaios

No decurso dos ciclos de reciclagem eurna vez que cada um correspondia a trêsarnassaduras, foram feitas algumas variações em relação aos dados padrão. Assim,no 2° ciclo e em face do elevado abaixamento registado no cone de Abrams, fez-seduas das amassaduras com urna posologiamenor de adjuvante: 1.6 l/m3. Ao contráriodo que seria de esperar, não se registouuma diminuição na trabalhabilidade.

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Registou-se, no entanto, uma redução maisfácil de explicar, de fk de 40 MPa para 3$MPa. Como se referiu, as condiçõesatmosféricas, muito húmidas, terãoafectado os resultados, pelo que ainfluência deste factor necessita de sermelhor investigada.

No 3° ciclo de reciclagem, tentou-se na3a amassadura analisar a influência daredução da dosagem de cimento de 450para 400 kg/m3 (para manter a relaçãoadjuvante / cimento, a dosagem do primeiropassou de 2.4 Wm3 para 2.13 um3). Se adiminuição do valor de t de 3.3 cm para1.0 cm era esperada (a necessidade de umavibração mais cuidada prenunciava-o), jé amanutenção do valor de fk em 46 MPa nãotem uma explicação evidente.

Como já referido anteriormente, houveuma alteração no processo de trituração no3° ciclo de reciclagem, tendo-se recorrido auma trituradora de menores dimensões. Oprocesso implicava o recurso a duastriturações com diferentes aberturas damandíbula e. originava aparentemente umamaior percentagem de agregados demenores dimensões dentro dos grossos. Naprática, a curva granulométrica não serevelou muito diferente da obtida com oprocesso de trituração (2 série de cubosIST na Fig. 9), mas trata-se de um factorque certamente merece uma investigaçãomais aprofundada.

:nii—cubos LNEC 7

Ii:1iI0,1 1 10 100

abertura das malhas (mm)

Fig. 9- Curvas granulométricas dos agregadosreciclados utilizados nos ciclos de reciclagem

Ainda relacionado com o processo detrituração, constatou-se que este afecta a

percentagem de aproveitamento dosagregados (aqueles que têm entre omínimo de 4.76 mm e o máximo de 31.1mm): esta passou de cerca de 60% nacentral de reciclagem para cerca de 70% noLaboratório do Departamento de Minas doIST. Mais relevante é o facto de estapercentagem ser mais do que suficientepara produzir um volume de betão idênticoao de origem.

3. AVALIAÇÃO DO MÓDULO DEELASTICIDADE

3.1 Considerações gerais

Nos materiais homogéneos, existe umarelação directa entre massa volúmica emódulo de elasticidade. Já em materiaisheterogéneos multifásicos como o betão, afracção volumétrica, a massa volúmica e omódulo de elasticidade dos principaisconstituintes e as características da zona detransição determinam o comportamentoelástico do compósito. Sendo a massavolúmica inversamente proporcional àporosidade, os factores que afectam aporosidade do agregado grosso, da matrizda pasta de cimento e da zona de transiçãoinfluenciam também o módulo deelasticidade do betão.

Segundo Mehta e Monteiro [4J, é a ri

gidez do agregado grosso que controla acapacidade de restrição da deformação damatriz de cimento e esta rigidez é determinada pela porosidade do mesmo.

Os agregados grossos reciclados debetão apresentam uma camada de argamassa antiga aderida às partículas do agregadoreciclado, tomando-os menos densos, maisporosos e menos rígidos que os naturais e,consequenteménte, também mais deformáveis.

Com base nas características anteriormente descritas, pode-se concluir que osbetões com agregados grossos recicladosde betão apresentam maior deformabilidade

CURVA GRANULOMÉTRICAAGREGADOS RECICLADOSTODOS OS PROVETES

O

E10

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que os produzidos com agregados grossosnaturais. Saiem e Burdette [5] concluíramnos seus estudos que os valores do módulóde elasticidade de betões com agregadosgrossos reciclados de betão eram cerca de9% (7 dias) e 16% (28 dias) inferiores, aosobtidos em betões convencionais.

Hansen e Boegh [3] avaliaram, atravésde ensaios, o módulo de elasticidade aos47 dias de betões com agregados grossosreciclados de betão, obtendo valores 14 a28% inferiores aos obtidos em betões dereferência, produzidos com agregadosnaturais.

3.2 Ensaios de laboratório

Na amassadura referente ao 2° ciclo deensaios, foram moldados provetescilíndricos com 0.15 m de diâmetro e 0.60m de altura, para posterior ensaio paraavaliação do módulo de elasticidade dobetão. Além daqueles, foram tambémmoldados provetes cilíndricos com umbetão de referência, apresentando este amesma composição do reciclado, a menosda substituição, em volume, dos agregadosgrossos por naturais.

Após a retirada da cofragem, os provetescilíndricos passaram por um processo decura htjmida até a data do ensaio. Aavaliação no laboratório do módulo deelasticidade do betão foi feita segundo aespecificação de ensaio LNEC E 397.

32 dias após a betonagem, os provetescilíndricos foram posicionados numaprensa para aplicação da força decompressão (fig. 10). As extensões foramregistadas através de extensómetros deresistência com base de 10 mm decomprimento, os quais foram coladossuperficialmente ao betão em duasgeratrizes opostas do cilindro. A força decompressão foi registada por intermédio deuma célula de carga colocada junto a uma

das extremidades do provete. Osextensórnetros e a célula de carga foramligados a um data logger do tipo HBMSpider 8.-

3.3 Análise dos resultados

Para o betão produzido com agregadosgrossos reciclados, obteve-se um valorpara o módulo de elasticidade de 29.5 GPa,enquanto que, para o bêtão de referência,se alcançou 39.9- GPa, ou seja, cerca de35% mais. Com os valores registados, querpara as extensões quer para a força decompressão, construiu-se um diagramatensão deformação para os dois tipos debetão (Fig. 11).

— —

0 002 0,04 0,06 0,08 0,1 0,12 014 0,16 0,18 0,2 0,22 0,24

extensão (¾)betão produzido com agregados grossos naturais

betão produzido com agregados grossos recictados de betão

Fig. 11 - Diagrama tensão deformação para o betãoproduzido com agregados grossos reciclados e o

betão de referência

$-

—-

Fig. 10 - Provete cilíndrico posicionado na prensa

45

40

35

30

25

20e— 15

10

40

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5. REFERÊNCIASNo diagrama da Fig. li, nota-se claramente, a partir de uma tensão aplicada de10 MPa, a maior deformabilidade dos betões com agregados grossos reciclados, sendo a mesma resultante dos conceitos anteyiorrnente mencionados.

4. CONCLUSÕES

O processo de reciclagem repetitiva dosagregados pétreos grossos reciclados depeças de betão para fabrico de novo betãotem todas as condições para ser autosustentável sem limitações temporais. Emtermos de resistência, é possível mantê-lanum patamar mais ou menos constante semalterar a composição.

A trabalhabilidade é também susceptível de se manter sem recurso a iim

• aumento da relação água / cimento. Esteúltimo facto dá boas indicações em relaçãoà durabilidade expectável, ainda que paratal se demonstrar seja necessária investigação específica. Finalmente, a sustentabilidade económica está demonstrada numoutro artigo [1], não obstante anecessidadede, no l ciclo (introdução pela primeiravez de parte dos agregados reciclados), serecorrer a maiores dosagens de cimento e aplastificantes.

No tocante ao módulo de elasticidade, amenor deformabilidade dos agregadosgrossos reciclados, aliada a também menorresistência a deformação da pasta impostapelos mesmos (devido à rigidez inferior),implicam num valor inferior daquele parabetões com agregados grossos reciclados,quando comparados com um betão de referência produzido com agregados grossosconvencionais.

[l]Brito, J. de; Gonçalves, A. P. - “Viabilidade Económica de Betão com Agregados Grossos Reciclados”, Ingeniítm, IISérie, n.° 63,2001.

[21 Gonçalves, A. P. - “Análise do Desempenho de Betões Obtidos a Partir deInertes Reciclados Provenientes de Resíduos da Construção”, Dissertação deMestrado em Construção, IST, 2001.

[31 Hansen, T. C. - “Recycling of DemolishedConcrete and Masonry”, RILEM TCReport 6, 316 p., Chaprnan & Hail,London, 1992.

[5J Saiem, R. M.; Burdette, E. G. - “Role ofChernical and Mineral Admixtures onPhysical Properties and frost-resistance ofRecycled Aggregate Concrete”, ACIMaterials Journal, v. 95, n°5, pp 558-563,1998.

[4J Mehta, P.“Concreto:Materiais”,1994.

K.; Monteiro, P. J. M. -

Estrutura, Propriedades e573 p., EU. Pini, São Paulo,

41.

Page 10: BETÕES PRODUZIDOS COM AGREGADOS GROSSOS ...LNEC. A sua capacidade resistente à com pressão era conhecida (em todos os cubos entre 40 e 45 MPa), mas não a sua compo sição, origem

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