Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

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1 PROJETO: “ IMPLANTAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DE LABORATÓRIO DE GESTÃO DE OPERAÇÕES E DA CADEIA DE SUPRIMENTOS DA INDÚSTRIA DE CONSTRUÇÃO NAVAL” PR-011 PROTRAN - Programa Tecnológico de Transpetro Convênio FINEP: 01.05.0931.00 Instituições Participantes: Universidade de São Paulo/ Universidade Estadual de Campinas/ Universidade Federal de Pernambuco/ Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo DOCUMENTO: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos em indústrias selecionadas: lições para a construção naval no Brasil Elaborado por: Rodrigo Sabbatini, José Augusto Ruas, Fernando Sarti e Marcos Barbieri NEIT-IE-UNICAMP Clésio Xavier IE-UFU Novembro de 2007

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PROJETO: “ IMPLANTAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DE LABORATÓRIO DE GESTÃO DE

OPERAÇÕES E DA CADEIA DE SUPRIMENTOS DA INDÚSTRIA DE CONSTRUÇÃO NAVAL”

PR-011 PROTRAN - Programa Tecnológico de Transpetro

Convênio FINEP: 01.05.0931.00

Instituições Participantes: Universidade de São Paulo/ Universidade Estadual de Campinas/ Universidade Federal de Pernambuco/ Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo

DOCUMENTO: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos em indústrias selecionadas: lições para a construção naval no Brasil

Elaborado por:

Rodrigo Sabbatini, José Augusto Ruas, Fernando Sarti e Marcos Barbieri NEIT-IE-UNICAMP

Clésio Xavier IE-UFU

Novembro de 2007

Page 2: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

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Índice

A) Sumário Executivo ..................................................................................................................................3 B) Apresentação ...........................................................................................................................................6 1. Melhores práticas na indústria mundial: cadeia automobilística e construção naval................................7

1.1 A experiência internacional na cadeia de suprimentos da indústria automobilística ..........................7 1.1.1 O sistema de produção enxuta da indústria automobilística japonesa .........................................7 1.1.2 Modularização na cadeia de suprimentos na indústria automobilística mundial nos anos 90 ...11

1.2 A experiência internacional recente da indústria naval ....................................................................16 1.2.1 Diferenças entre a indústria automobilística e a indústria naval................................................16 1.2.2 Produção enxuta na indústria naval ...........................................................................................17 1.2.3 A prática do outsourcing na indústria naval mundial ................................................................19 1.2.4 A indústria de navipeças em nível mundial ...............................................................................25 1.2.5 Fornecedores e conteúdo local na indústria naval: Japão, Coréia do Sul e China. ....................27

1.3 Uma breve síntese.............................................................................................................................29 2. Melhores práticas na cadeia aeronáutica ................................................................................................31

2.1 O padrão de concorrência e estrutura de mercado da indústria aeronáutica mundial .......................31 2.2 A Inserção da Embraer na indústria aeronáutica mundial ................................................................33

2.2.1. Características gerais da Embraer.............................................................................................33 2.2.1 A Embraer e seus mercados.......................................................................................................35 2.2.3. A capacitação tecnológica da Embraer.....................................................................................39 2.2.4. Os investimentos da Embraer ...................................................................................................39 2.2.5. A internacionalização produtiva da Embraer............................................................................40 2.2.6. Riscos da inserção competitiva da Embraer .............................................................................40 2.2.7. As vantagens competitivas da Embraer e as suas potencialidades ...........................................41

2.3 Embraer: evolução da relação com seus fornecedores .....................................................................43 2.3.1. Origem da Embraer - uma empresa horizontal .........................................................................43 2.3.2. Anos 70-80: Embraer - relação direta com os fornecedores.....................................................44 2.3.3. Anos 90: Embraer – criação das parcerias de risco ..................................................................45 2.3.4. Anos 2000: Embraer – expansão das parcerias de risco ...........................................................49 2.3.5. Parcerias de risco: conclusões ..................................................................................................54

2.4. Recomendações para indústria naval...............................................................................................56 3.Cadeia de suprimentos na indústria automobilística brasileira................................................................60

3.1 Breve histórico: dos anos 50 à crise dos anos 80..............................................................................60 3.2 A reestruturação dos anos 90 e seus efeitos......................................................................................64 3.3 Conclusões: lições para a construção naval......................................................................................73

4. Cadeia de suprimentos na indústria naval no Brasil: práticas atuais e fatores críticos ...........................77 4.1 Indústria naval brasileira e a indústria de navipeças: um renascimento ...........................................77 4.2 Importância da nacionalização da cadeia de suprimentos para indústria naval ................................79

5. Conclusões e recomendações de políticas ..............................................................................................82 C) Bibliografia Utilizada ............................................................................................................................86

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A) Sumário Executivo

As principais conclusões deste estudo são:

1. A indústria naval mundial tem procurado avançar em práticas de gestão da

produção e da cadeia de suprimentos que se aproximam da chamada lean

production, desenvolvida inicialmente pela indústria automobilística. Os

melhores e mais competitivos estaleiros do mundo estão bastante

avançados neste sentido, reduzindo custos e encurtando prazos de entrega.

2. A indústria aeronáutica brasileira se reinventou competitivamente a partir

de novas práticas de gestão da cadeia de suprimentos. Fornecedores diretos

se tornaram parceiros de risco e, através de radical global sourcing,

incrementaram fortemente a competitividade da então semi-falida Embraer

que, uma década depois da introdução destas práticas, se tornou o terceiro

maior player do setor no mundo.

3. A indústria automobilística brasileira também se reestruturou nos anos 90

a partir da reconfiguração de sua cadeia de suprimentos. Desverticalização

da produção, outsourcing, modularização da produção e aumento do

conteúdo importado (partes e componentes) permitiu que a indústria

nacional eliminasse a defasagem competitiva em relação ao estado-da-arte

mundial, no que se refere ao desempenho tecnológico e design de seus

produtos finais. Uma nova onda de investimentos, inclusive fora do eixo

tradicional, intensificou estes processos e contribuiu para ampliar a

competitividade através de redução de custos, aumento de produtividade e

melhor desempenho dos veículos. No entanto, deve-se ressaltar que os

ganhos de competitividade do elo das montadoras foi contrabalançado por

relativo desadensamento da cadeia, em especial por desmobilização de

fornecedores de autopeças e forte retração no número de empregos.

4. A cadeia de construção naval do Brasil, após 20 anos de

desindustrialização, parece dar indícios de recuperação, ao menos nos elos

de construção propriamente dita, graças ao poder de compra da Petrobras e

da Transpetro. Não há indícios, entretanto, da recuperação dos segmentos

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fornecedores de navipeças, ainda muito desarticulados. Da mesma

maneira, os estaleiros nacionais ainda estão muito distantes das melhores

práticas de produção e gestão da cadeia de suprimentos observados nos

casos paradigmáticos do segmento (por exemplo, estaleiros líderes sul-

coreanos).

5. As principais lições que a reestruturação das indústrias aeronáutica e

automobilística pode oferecer para a retomada da construção naval no

Brasil são:

a. reorganizar a cadeia de suprimentos em direção a uma maior

participação do segmento fornecedor é crucial para o aumento da

competitividade da montagem (edificação) final;

b. eleger um nicho de mercado e se especializar através de ampliação

de escala para atender tanto o mercado doméstico em crescimento,

quanto o exterior através de exportações para mercados

semelhantes, é uma vantagem competitiva que amplia rentabilidade

e cria defesas naturais com relação às importações;

c. deter capacitação de projeto é fundamental para comandar a cadeia

de maneira mais eficiente;

d. o uso de insumos importados permite produzir o bem final de

maneira mais eficiente, tanto em relação a custos, quanto em

relação a desempenho;

e. novos investimentos permitiram romper com a ineficiente, ao

menos no início dos anos 90, característica anterior (plantas

desatualizadas, verticalização excessiva, alto conteúdo nacional,

proximidade com mercado e com fornecedores, etc). Casos de

sucesso, com o da Ford na Bahia ou o novo processo de

“docagem” de aviões da expansão da Embraer, parecem indicar

que o advento do estaleiro Atlântico Sul em Suape-PE, pode

contribuir fortemente para o êxito da reconstrução da indústria

naval no Brasil.

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6. Para que estas lições sejam melhor aproveitadas, o estudo entende que é

preciso decidir que tipo de construção naval se deseja re-instalar no Brasil:

uma indústria concentrada na montagem (lançando mão de alto conteúdo

importado e presidindo de uma densa rede de fornecedores locais de

equipamentos) ou uma que progressivamente vá adensando a montante a

cadeia produtiva no Brasil.

7. O estudo recomenda que a segunda opção seja perseguida pelos policy

makers, através da implementação de diversas ações, todas elas voltadas

para o desenvolvimento de fornecedores locais e competitivos de

navipeças, através de aprofundamento da política de compras de empresas

nacionais de transporte aquaviário e mobilização de órgãos públicos de

planejamento (MDIC, MME, MT) e de financiamento (BNDES, FINEP,

BNB), além de entidades do terceiro setor (SEBRAE, SENAI, associações

empresariais como ABIMAQ ou ONIP). Em suma, o conteúdo nacional

exigido pelo poder de compra de demandantes públicos não deveria ficar

restrito ao aço e à agregação de mão de obra na montagem final.

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B) Apresentação

O presente relatório pretende responder os seguintes questionamentos:

• Quais os procedimentos adotados na evolução recente da cadeia de

suprimentos da indústria em geral e que impactos tais processos têm causado

(quantitativos em redução de custos e qualitativos em qualidade e prazo)?

Qual a importância de uma moderna gestão dessa cadeia?

• Quais as tendências para o futuro na gestão da cadeia de suprimentos na

indústria mundial?

• No caso da construção naval mundial, existe uma convergência em direção a

uma gestão da cadeia de suprimentos que utilize as melhores práticas da

indústria como um todo?

• Quais são as práticas atualmente utilizadas nos estaleiros benchmarks e na

média da indústria naval?

Para abordar tais temas o relatório se divide em quatro seções. A primeira

discutirá as atuais práticas correntes na indústria mundial, destacando os casos

específicos da indústria naval e automobilística. A segunda seção discutirá as

características da indústria aeronáutica, discutindo em especial o caso da Embraer e de

suas práticas na gestão cada cadeia de suprimentos. A terceira seção discutirá as

relações na cadeia de suprimentos na indústria automobilística no Brasil, com destaque

para as novas formas adotadas em plantas mais recentes e descentralizadas. A

comparação entre estes setores e a construção naval, destacando as formas de

organização da cadeia produtiva, mostrou-se extremamente adequada para apontar

rumos para a retomada da construção naval no Brasil. Em primeiro lugar, por mostrar os

avanços já obtidos em outras estruturas industriais que, em muitos casos, são ou vêm se

tornando realidade nos países com indústria naval desenvolvida. Em segundo lugar, por

mostrar que o potencial nacional para desenvolvimento competitivo de fornecedores

tem precedente e pode ser reproduzido, com devidas mediações setoriais, na indústria

naval brasileira. Nesse sentido, a quarta seção discutirá as práticas da cadeia de

suprimentos na indústria naval brasileira, descrevendo os processos atuais e apontando

lições que poderiam ser aproveitadas dos casos anteriormente descritos.

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1. Melhores práticas na indústria mundial: cadeia automobilística e construção naval

Esta seção refere-se à análise da cadeia de suprimentos da indústria

automobilística internacional, comparando-a com a indústria naval. O estudo se valeu

de pesquisa bibliográfica recente a respeito da relação entre fabricantes e fornecedores

no Japão, EUA países europeus, e no tocante à indústria naval foi utilizado um precioso

levantamento de informações realizado por pesquisa de campo em vários estaleiros

asiáticos - considerados benchmark da indústria naval, assim como bem como diversos

relatórios e estudos internacionais1.

1.1 A experiência internacional na cadeia de suprimentos da indústria automobilística

1.1.1 O sistema de produção enxuta da indústria automobilística japonesa

O sistema de produção enxuta se constituiu em fator determinante da obtenção de

vantagem absoluta de competitividade na indústria automobilística japonesa,

particularmente dos princípios aplicados à produção pela Toyota, logo no início da

década de 80 quando Japão ultrapassou os EUA, transformando-se no maior produtor

mundial de automóveis em 1981. De imediato é preciso ressaltar que tal sistema de

produção foi desenvolvido adotando inicialmente um princípio básico da produção

fordista - a linha de montagem - e, através de tentativa e erro no “chão de fábrica” ao

longo do tempo, a Toyota constatou a viabilidade de obtenção simultânea de controle

total de qualidade (TQC), baixo custo, just in time (JIT), ou seja, entrega de peças e

componentes em tempo real, resultando em eliminação de perdas e forte encurtamento

dos fluxos de produção (FUJIMOTO & TAKEISHI, 2001).

Em segundo lugar, a produção enxuta na indústria automobilística japonesa

possui, desde sua origem, uma característica fortemente sistêmica e não fragmentada,

envolvendo:

• Coordenação e cooperação entre todos os agentes envolvidos no sistema,

ou seja: fornecedores diretos do mesmo grupo, fornecedores indiretos de

1 Com destaque para Balance Technology Consulting (2000), Fleischer, Kohler e Lamb (1999) e Bongiorni & Lamb (1998).

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unidades subcontratadas fora do grupo, trabalhadores, gerentes e

engenheiros;

• Polivalência e elevação dos requisitos de qualificação da mão-de-obra,

com a conseqüente redução da distância hierárquica entre produção,

gerência e engenharia e maior co-responsabilização dos agentes

envolvidos na obtenção de metas de qualidade total e encurtamento de

prazos; e

• A elevada interação entre fornecedores e fabricante, de um lado, e

entre fabricante e usuário, de outro lado, através da integração entre

atividades de P&D, desenho, engenharia e marketing, possibilitada pela

adoção de sistemas flexíveis de automação como CAD (Computer Aided

Design), CAE (Computer Aided Engineering) e CIM (Computer

Integrated Manufacturing), permitiu viabilizar a “customização em

massa” na oferta de produtos (PINE, 1993, apud SAKO, 2002, p.17),

atendendo à diferenciação de produtos exigida pelas preferências dos

diferentes usuários, mas sem perder de vista a escala de produção.

WOMACK, JONES & ROOS (1997, p. 85) chamam a atenção para que os

aspectos organizacionais da produção enxuta (alterações nas relações de trabalho,

coordenação e cooperação com fornecedores, entre outros) tenham precedência à

introdução da automação de alta tecnologia, na busca de obtenção plena dos resultados

positivos deste tipo de organização da produção.

Em terceiro lugar, é necessário destacar que a experiência da produção enxuta da

indústria automobilística japonesa, incluindo a cadeia de suprimentos, somente foi

possível graças à presença absolutamente imprescindível de grupos multisetoriais

ultradiversificados. Em geral, os grandes grupos japoneses atuam no complexo

eletrônico, na informática, nas telecomunicações, em bens de capital, em produtos

petroquímicos, na automação industrial, em software, na indústria automobilística entre

outros.

Em quarto lugar, no mesmo sentido, somente graças à fortíssima vinculação

existente entre bancos e indústria no Japão foi possível minimizar os riscos inerentes às

inovações tecnológicas e gerenciais adotadas pelos fabricantes de carros, principalmente

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nos estágios iniciais de implantação. Ou seja, os bancos submetiam seus interesses

imediatos aos objetivos do grupo, propiciando fontes de financiamento de longo prazo

com juros menores aos projetos de longo prazo dos fabricantes de veículos do mesmo

grupo.

Disso se depreende que, a experiência da produção enxuta na indústria

automobilística japonesa depende de características prévias da estrutura industrial, não

podendo, portanto, ser simplesmente transportada integralmente para outras regiões.

Neste sistema de produção enxuta, destaque especial deve necessariamente ser

atribuído à rede de fornecedores, pois a montagem final de um automóvel envolve

apenas 15% do processo de fabricação total, o qual inclui entre projeto e fabricação

mais de 10 mil peças distintas, e sua montagem em aproximadamente 100 grandes

componentes como motores, transmissões, sistemas de direção, suspensões, entre

outros. Dessa forma, a forma de estruturação da rede de fornecedores de peças e

componentes se constitui em um aspecto estratégico na obtenção de indicadores

positivos de qualidade, produtividade e competitividade da indústria automobilística.

O dilema entre a produção interna e a compra externa de peças e componentes

jamais se colocou para a Toyota, pois o fundamental era como a montadora e os

fornecedores poderiam atuar em cooperação, diante do objetivo de redução de custos e

melhoria de qualidade, pouco importando se o tipo de relação contratual existente era

hierárquica (com produção verticalizada) ou simplesmente mercantil (FUJIMOTO &

TAKEISHI, 2001).

Na perspectiva da produção enxuta, o suprimento de peças e componentes para

indústria automobilística envolveu os seguintes aspectos (idem):

a) Organização dos fornecedores em diferentes níveis funcionais,

qualquer que fosse a relação contratual com a montadora, sendo que os

fornecedores de primeiro nível eram responsáveis pelos sistemas de maior

complexidade que interferiam no desempenho do automóvel (direção,

frenagem, elétrico, etc.), participando plenamente do desenvolvimento de

novos produtos e encomendando peças e componentes dos sistemas a

fornecedores de segundo nível e assim por diante. Além disso, como tais

fornecedores de primeiro nível eram especializados em determinados

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sistemas e não concorriam entre si, foram estimulados a trocarem

informações e experiência de modo a obter melhorias nos projetos;

b) Participação acionária cruzada entre montadora e os fornecedores:

apesar dos fornecedores de primeiro nível serem empresas quase-

independentes, a Toyota manteve parte do controle acionário de tais

fornecedores. Adicionalmente, atuava como banco deste grupo de

fornecedores, financiando a aquisição de máquinas para o

desenvolvimento de novos produtos;

c) Compartilhamento de recursos humanos entre a montadora e os

fornecedores de primeiro nível através de empréstimo de pessoal nos

momentos de picos na produção e transferência de engenheiros seniores

para posições estratégicas nas firmas fornecedoras;

d) Finalmente, a coordenação do fluxo de peças e componentes passou a ser

regulada pelo sistema just-in-time, onde a produção de peças de uma

etapa do processo produtivo era suficiente apenas para suprir a

necessidade imediata da etapa subseqüente, impedindo assim a formação

de estoques. Neste sistema de suprimentos, onde cada caixa ou container

vazio devolvido pela montadora aos fornecedores sinaliza a necessidade da

produção adicional de peças, é fundamental a estabilidade e uniformização

do volume de produção, mesmo diante da flexibilidade exigida pela

mudança do mix de produtos (FUJIMOTO & TAKEISHI, 2001).

Portanto, diante de tais características, pode-se concluir que o sistema de

produção enxuta na indústria automobilística japonesa não é integralmente replicável

para diferentes países, pois que depende de especificidades locais e/ou regionais como a

diversificação setorial dos grupos econômicos e a forte interação banco/indústria. Além

disso, explicitou-se a precedência e importância das mudanças organizacionais,

incluindo o novo tipo de relação com fornecedores, em relação às inovações

tecnológicas para o êxito da produção enxuta. Por último, a coordenação da rede de

fornecedores envolve, acima de tudo, relações hierárquicas e interpenetração

patrimonial e de recursos financeiros e humanos para viabilizar os resultados positivos

em termos de encurtamentos de prazos, melhorias de qualidade e redução de custos.

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1.1.2 Modularização na cadeia de suprimentos na indústria automobilística mundial nos anos 90

Em meados da década de 90, a economia japonesa interrompe seu longo período

de crescimento sustentado e entra em um ciclo de estagnação, explicitando algumas

“falhas” e limitações presentes na produção enxuta, mais especificamente na cadeia de

suprimentos da indústria automobilística.

Segundo FUJIMOTO & TAKEISHI, (2001, p. 12), o sistema de produção enxuta

era um sistema de produção superior, mas parcialmente dependente do crescimento da

produção que ocorreu durante mais de quatro décadas no Japão. Em meados dos anos

90, com a estagnação da demanda doméstica de automóveis e com as dificuldades de

crescimento das exportações japonesas em função da reorganização das montadoras

americanas e européias, os gargalos dos fabricantes japoneses aparecem

simultaneamente: insatisfação da força de trabalho, especialmente jovens com as

reduções das horas trabalhadas, preocupações ambientais e excesso de “gordura” nas

atividades de design do produto, design da planta e sistema de distribuição. Constata-se,

nesse momento, uma inércia e fragilidade na gestão das montadoras japonesas no

sentido de busca e/ou adoção de inovações organizacionais.

Em relação à cadeia de suprimentos, enquanto a maior parte dos produtores

japoneses ainda continua comprando a maior parte dos componentes de fornecedores

pertencentes ao mesmo grupo industrial (STURGEON & FLORIDA, 1999, p.61), os

fabricantes americanos e europeus de automóveis têm adotado estratégias locais e

globais de outsourcing no fornecimento de peças e componentes, denominadas de

modularização.

De acordo com STURGEON & FLORIDA (1999, p.67), as crescentes taxas de

salários de trabalhadores alocados na montagem de veículos, induziu os fabricantes

europeus e norte-americanos à formulação de uma estratégia de busca, junto aos

fornecedores externos e internos, de ampliação das atividades de design e de

submontagem de automóveis, externalizando trabalho do processo final de montagem.

As duas figuras abaixo ilustram este processo de crescimento da externalização de

atividades produtivas por parte das montadoras européias e norte-americanas:

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Figura 1.1 - Crescimento de Outsourcing na Produção de Automóveis - Montadoras Européias

Selecionadas (% do valor dos veículos)

Fonte: The Economist Intelligence Unit apud VELOSO (2000).

A Figura 1.1 mostra o crescimento do outsourcing na indústria automobilística

européia, especificamente nas montadoras francesas PSA (Peugeot) e Renault e na

italiana FIAT, constatando níveis de externalização fortemente significativos. Segundo

VELOSO (2000), isso é resultado do afastamento das montadoras de atividades como

engenharia de manufatura e montagem de sistemas completos ou módulos (sistemas de

freios, por exemplo), transferindo-as para os fornecedores de primeiro nível. Embora as

montadoras tenham claro que os custos de desenvolvimento de produtos dos

fornecedores sejam mais elevados que os custos da produção internalizados, adotam a

estratégia de concentrar suas compras em um número reduzido de grandes fornecedores

(Figura 1.2), os quais, por sua vez, procuram diluir seus custos ofertando tais

sistemas/módulos para várias montadoras.

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Figura 1.2 - 100 Maiores Fornecedores da Indústria Automobilística dos EUA por Faixa de

Faturamento

Fonte: Automotive News

O tamanho dos fornecedores da indústria automobilística norte-americana teve a

seguinte evolução: enquanto em 1992 existiam apenas 28 fornecedores com faturamento

entre 1 e 5 bilhões de dólares e 5 fornecedores com faturamento superior a US$5bi, em

1998 o número de fornecedores na mesma faixa de faturamento é de 47 e 13

respectivamente, revelando o aumento do tamanho médio dos fornecedores na produção

de carros.

Figura 1.3 - Tendência de Redução no Número de Fornecedores em Fabricantes Selecionados

Fonte: The Economist Intelligence Unit apud VELOSO (2000).

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A Figura 1.3 acima mostra que a redução do número de fornecedores é uma

estratégia geral adotada por todos os fabricantes norte-americanos e europeus ao longo

da década de 1990. Entretanto, apesar de ser uma estratégia generalizada, comporta

diferenças entre fabricantes no tocante à sua intensidade:

• A Renault (e também a Volkswagen) adota a estratégia conhecida como

2+1 fornecedores: para cada sistema completo de componentes e para cada

região onde a montadora tem uma planta produtiva, são selecionados dois

fornecedores que mantêm uma parceria estratégica com a montadora; além

disso, existe um terceiro fornecedor, com um grau de responsabilidade

menor, embora com capacidade suficiente para assumir o lugar de

fornecedor estratégico;

• A Ford adota uma estratégia mais agressiva, selecionando apenas um

fornecedor para cada módulo ou subsistema de componente. Para isto,

possui um banco de dados com o benchmark de custo na oferta de cada

componente ou sistema integrado, viabilizando maior poder de mercado da

montadora nas negociações com os fornecedores.

De uma forma geral, de acordo com VELOSO (2000), a crescente importância da

cadeia de suprimentos da indústria automobilística no fim da década de 90 e início dos

anos 2000, está alterando a estrutura desta indústria, com a nova configuração

consistindo em:

• Systems Integrator: fornecedores diretos atuam em escala global e são

especializados em sistemas complexos ou responsáveis pela integração

entre vários subsistemas de componentes diferentes. Além disso, tais

fornecedores diretos são responsáveis pelo design e engenharia destes

sistemas, coordenando uma rede de fornecedores de componentes

necessários a fabricação e montagem final de tais sistemas;

• Global Standardizer: esse grupo de fornecedores também atua em escala

global, desenhando e produzindo componentes padronizados e entregando-

os diretamente aos fabricantes ou indiretamente aos Systems Integrator;

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• Component Specialist: fornecedores que desenham e fabricam

componentes específicos para um dado tipo de carro a ser produzido em

uma determinada plataforma. Estas firmas são fornecedoras dos Systems

Integrator e do Global Standardizer; e

• Raw Material Supplier: fornecedores de matéria-prima diretamente ao

fabricante ou aos outros níveis de fornecedores.

Essa nova configuração hierárquica da rede de fornecedores da indústria

automobilística européia e japonesa pode ser visualizada na tipologia abaixo (Figura 1.4

abaixo), construída a partir dos critérios como o foco do negócio, mercado de atuação,

capacitação e tipo de componente ou sistemas envolvidos em cada grupo de

fornecedores:

Figura 1.4 - Tipologia dos Fornecedores da Indústria Automobilística

Raw Material

Supplier Standardizer Component Specialist Integrator

Foco Fornece matéria prima

Define padrão, em bases globais, para um componente ou sistema específico

Responsável pelo design e manufatura de componentes específicos à um automóvel ou plataforma de produção

Responsável pelo design e montagem de módulos completos ou sistemas

Mercado de Atuação

Local, regional ou global global

Global para primeiro elo, e regional ou local para subcontratados

global

Capacitações

• Ciência de materiais;

• Engenharia de processo;

• Pesquisa, design, engenharia;

• Montagem e capacitações para administração da cadeia de fornecedores;

• Pesquisa, design, Engenharia de Processo;

• Capacitações de manufatura em diversas tecnologias;

• Marcas;

• Design de produto e Engenharia;

• Montagem e capacitações para administração da cadeia de fornecedores;

Tipos de Componentes ou sistemas

• Aço; • Alumínio; • Polímeros;

• Pneus; • ABS; • Unidades de

Controle Eletrônico;

• Estaparia/Pintura; • Componentes do motor; • Injection Molding;

• Interiores; • Portas; • Chassis;

Fonte: Elaboração Própria a partir de VELOSO (2000).

A modularização da fabricação de carros ainda se encontra em estágio inicial de

implantação nas montadoras européias e norte-americanas, mas no limite exigiria uma

simplificação da produção de automóveis para permitir uma modularização semelhante

ao que ocorre coma produção de computadores. De outro lado, constata-se uma inércia

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e fragilidade organizacional dos fabricantes de veículos japoneses em lidar com a

permanente flutuação dos volumes de produção a partir do final da década de 1990.

Permanece absolutamente em aberto, todavia, o grau de aceitação dos consumidores

diante desta inovação radical de produto (“o carro em módulos”) decorrente da

modularização.

1.2 A experiência internacional recente da indústria naval

1.2.1 Diferenças entre a indústria automobilística e a indústria naval

Em que medida as experiências internacionais dos novos métodos de organização

da cadeia de suprimentos da indústria automobilística mundial - produção enxuta

japonesa ou modularização recente na Europa e EUA - pode ser transplantada para a

indústria naval?

De acordo com LIKER & LAMB (2001, p.3): “Shipbuilding is clearly different

from automobiles. One does see a ship coming off the assembly line every minute with

relatively standard configurations. Ships are built to order, one or a few at a time over

weeks or months and are often highly customized “.

Em outros termos, uma das principais diferenças entre a indústria automobilística

e a indústria naval reside exatamente em um maior grau de customização da produção

de navios em atendimento às especificações dos usuários. Trata-se, na verdade, de um

bem de capital sob encomenda, o que condiciona fortemente a organização da produção,

a relação com os fornecedores e a obtenção de escalas mínimas de produção. Mesmo

que a escala de produção e a padronização de boa parte do design e montagem sejam

elementos centrais para a competitividade na indústria de construção naval2, a

flexibilidade e necessidade de se trabalhar a interação da cadeia produtiva com o

consumidor final exigem mediações importantes para comparações com a indústria

automobilística.

Diante dessa característica estrutural da indústria naval, os referidos autores

formulam a questão da viabilidade da adaptação dos princípios da produção enxuta à

indústria naval e respondem positivamente, sublinhando dois fatores essenciais:

a) Eliminação de perdas de tempo e recursos durante o processo produtivo; e

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b) Navios de qualidade mundial obtido graças a design do estaleiro que

permite um fluxo de produção contínuo e padronizado e entrega de

matéria-prima em tempo real.

Os autores supracitados expressaram isso diretamente da seguinte forma:

“... is the model of “lean manufacturing” worth considering? The answer is clearly yes. First, the basic principles of giving customers what they want with shortened lead times by eliminating waste apply to any process, high volume or low volume, customized or standardized. Second, Japanese shipyards are among the most efficient and have used relatively standardized, modular designs to create what some call ship factories - factories in which there is a constant flow of basic and intermediate products, built in most cases on moving lines, and material is carefully sequenced and shifted through the yard in a carefully orchestrated flowing pattern - Just in time” (Idem).

1.2.2 Produção enxuta na indústria naval

Embora se reconheça as especificidades setoriais da indústria naval, é possível

adaptar os princípios da produção enxuta da indústria automobilística, de modo a

viabilizar o atendimento às especificações dos compradores de navios, pois

encurtamento dos prazos de produção e entrega e redução de perdas de tempo, recursos

e material durante o processo de produção, são princípios gerais de redução de custos

que devem ser buscados permanentemente pela indústria naval. As possíveis perdas de

tempo e recursos na indústria naval podem ser visualizadas na figura abaixo:

Figura 1.5 - Leadtime na Indústria Naval

Fonte: LIKER & LAMB (2001)

2 Especialmente na produção de embarcações com mercado secundário mais desenvolvido.

Page 18: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

18

A localização e o reconhecimento da existência de perdas durante o processo de

construção naval é fator primordial para eliminação das fontes de perdas, sendo que esta

última é definida como sendo qualquer parte que não contribui para atender a uma

necessidade do usuário do navio. As fontes de perdas mais comuns são:

• excesso de material intermediário, antes do momento de sua utilização;

• produtos defeituosos, interrompendo os fluxos de produção;

• estoques de material com ocupação de espaço, custo financeiro e fonte

potencial de acidentes;

• movimentação de peças e trabalhadores que não adicionam valor ao

produto;

• processamento adicional, não essencial à adição de valor do ponto de vista

do usuário;

A utilização de métodos de produção enxuta na indústria naval deve, portanto, ter

como escopo central o fluxo de valor adicionado e a eficiência de todo o sistema

produtivo, envolvendo sincronização, alinhamento das e estabilidade das operações

produtivas no interior do estaleiro.

Em segundo lugar, é parte da produção enxuta o sistema just in time que exige um

fluxo contínuo de peças denominado one piece flow, onde são identificados as peças e

componentes que possuem processos de produção semelhantes que podem utilizar a

mesma linha de produção para aquela família de bens intermediários. Tal processo tem

sido utilizado para grandes volumes de produção na indústria automobilística japonesa,

mas está sendo adaptado para a indústria naval asiática exatamente através da

similaridade das partes dos vários navios que estão sendo montados, constituindo uma

“família de peças” (LIKER & LAMB, 2001, p.17-18).

Com o processamento one piece flow, diminui fortemente as fontes potenciais de

perdas durante as várias etapas do processo produtivo, pois são reduzidos o estoque e a

movimentação de peças nas etapas de pré-montagem, submontagem e montagem final.

Utiliza-se apenas quantidade de matéria-prima suficiente para atender as necessidades

das etapas subseqüentes. A figura abaixo permite a comparação entre um sistema

Page 19: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

19

tradicional denominado batch processing e o sistema one piece flow no corte de chapas

de aço, submontagem e montagem final do bloco de um navio:

Figura 1.6 - Batch Processing e One Piece Flow no Corte de Chapas de Aço na Indústria

Naval

Fonte: LIKER & LAMB (2001)

Contudo, lean manufacturing depende não apenas do processo de produção dentro

do estaleiro, mas, sobretudo da integração coma rede de fornecedores, como no caso das

chapas de aço que são entregues diariamente aos estaleiros japoneses e coreanos, e

várias vezes durante o dia, para atender o fluxo continuo na medida exata da demanda

da etapa seguinte sem formação de estoques. Tal processo somente é viável com

interação permanente, fluxos de informação e aprendizado recíproco entre fornecedores

e estaleiros (Idem, p. 46).

1.2.3 A prática do outsourcing na indústria naval mundial

De acordo com Schank et all (2005) o outsourcing na indústria naval, pode ser

subdividido em:

a) Peak outsourcing: subcontratação de mão-de-obra com custos inferiores

para atender as variações imprevistas da demanda;

Page 20: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

20

b) Total outsourcing: subcontratação de sistemas completos (elétricos,

aquecimento, pintura, blocos etc.) com montagem no próprio estaleiro ou

externamente.

Figura 1.7 - Uso do Outsourcing em Estaleiros da Inglaterra - 2002

Fonte: Schank et all (2005).

Conforme pode ser observado na Figura 1.7 acima, o uso do outsourcing pleno na

Inglaterra ainda não é generalizado, apresentando variações quanto à intensidade entre

os estaleiros e também entre as principais atividades da fabricação naval. Nota-se, por

outro lado, que a maioria dos estaleiros ingleses adotam a prática do peak outsourcing,

isto é, com utilização da subcontratação de mão-de-obra como forma de atender às

variações imprevistas da demanda.

A mesma constatação pode ser percebida no caso dos estaleiros americanos e

europeus (conforme Figura 1.8 abaixo), embora os estaleiros europeus apresentem uma

maior intensidade no uso do outsourcing em relação aos estaleiros americanos. Do

ponto de vista das atividades de fabricação naval, pintura, motores de distribuição

elétrica, ar condicionado, acomodações e cozinha apresentam um maior grau de

utilização de outsourcing total.

Page 21: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

21

Figura 1.8 - Uso do Outsourcing em Estaleiros na Europa e Estados Unidos - 2002

Fonte: Schank et all (2005).

A figura 1.9 apresenta as principais razões para o uso do outsourcing na indústria

naval inglesa, européia e norte-americana. Enquanto na Inglaterra e nos Estados Unidos,

a principal razão da adoção de práticas de outsourcing está relacionada à uma estratégia

de curto prazo de redução de custos em comparação com a produção internalizada, na

Europa, o uso do outsourcing se deve menos à redução de custos e mais às estratégias

corporativas da indústria naval no sentido de desenvolver e estabelecer uma interação

de longo prazo com parcela dos fornecedores.

Page 22: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

22

Figura 1.9 - Razões do Uso do Outsourcing na Inglaterra, Europa e Estados Unidos -

2002

Fonte: Schank et all (2005).

A tabela 1.1 abaixo procura sintetizar os resultados em termos de diminuição de

custos associados à prática da utilização do outsourcing em estaleiros e regiões

selecionadas, onde se constata uma forte e significativa redução de custos na

experiência coreana e japonesa e uma pequena redução dos custos no caso dos

construtores norte-americanos.

Tabela 1.1 -Outsourcing e Impactos nos Custos em Países Selecionados

Origem Outsourcing

(% de redução de mão-de-obra)

Samsung/Coréia do Sul 45%

Mitsui/Japão 30%

Construtores japoneses médios 30% – 50%

Construtores-EUA 10% (redução de custos)

Fonte: Elaboração própria.

Page 23: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

23

Uma boa síntese da prática do outsourcing em geral pode ser bem compreendida

através do método sofisticado de categorização de fornecedores desenvolvido pela John

Deere (Fleischer et all, 1999), onde os produtos e seus respectivos fornecedores são

agrupados em quatro categorias de acordo com a intensidade e diferentes tipos de risco

e valor. Tal estratégia pode ser mais bem visualizada através do quadro 1.1.

Quadro 1.1 -Tipologia de Fornecedores na Prática do Outsourcing

Fonte: Fleischer et alli, 1999.

Nessa metodologia deve ser ressaltada a importância decisiva dos acordos de

longo prazo (dez anos) para “produtos críticos” em qualquer estratégia exitosa de

outsourcing. O método adequado deste tipo de outsourcing deve envolver uma redução

do número de fornecedores e uma parceria efetiva entre a indústria e este grupo

específico de fornecedores, em relação aos quais o desempenho do estaleiro tem elevada

Alto “Produtos específicos” “Produtos Críticos” • Estratégia: Fornecedores responsáveis

pelo design, especificações e diferenciação; • Fatores Críticos: Custos de fabricação;

elevados em caso de problemas de qualidade/custo; Dependência do fornecedor;

• Horizonte Temporal: Variável • Gestão: Engenharia conjunta e parcerias

com fornecedores; • Método: Reduzir no de

produtos/fornecedores; • Contratos: Longo Prazo • Táticas: Reduzir especificidade do

produto

• Estratégia: Parcerias Estratégicas; design customizado, criar diferenciação;

• Fatores Críticos: Custos de fabricação elevados em caso de problemas de qualidade/custo; Dependência do fornecedor;

• Horizonte Temporal: Acima de 10 anos; • Gestão: Parcerias com fornecedores; • Método: Reduz\ir número de

fornecedores; • Contratos: Longo Prazo; • Táticas: Elevar papel dos fornecedores;

Genéricos Commodities

RISCO (disponibilid

ade, qualidade)

• Estratégia: Consolidar Padrão

• Fatores Críticos: Custo de Aquisição

• Horizonte Temporal: Acima de 1 ano

• Gestão: Contratos de sistemas, compras de chapas;

• Método: Reduzir número de compras

• Contratos: Ordem de compra ou mercado spot

• Táticas: Incrementar tecnologicamente o produto

• Estratégia: “Alavancar” fornecedores preferenciais;

• Fatores Críticos: Custos dos Materiais Dependência do fornecedor;

• Horizonte Temporal: Acima de 5 anos; • Gestão: Volume contratado; Algumas

Parcerias com fornecedores; • Método: Reduzir número de

Fornecedores; • Contratos: Ordem de Compra ou longo

Prazo; • Táticas: Elevar compras com menor

número de fornecedores; Baixo VALOR (custo, administração de serviços de inovação) Alto

Page 24: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

24

dependência. Em outras palavras, a prática de outsourcing para este grupo de produtos

envolve o binômio elevado risco e elevado valor, fazendo com que as táticas

preferenciais em relação à este tipo de fornecedor seja a elevação de sua importância

nos processos de desenvolvimento de produto e diferenciação.

Segundo Fleischer et all, 1999 (p. 15), uma aplicação para o caso de “produtos

críticos” na indústria naval é adotada pela empresa européia Fincantieri, que estabelece

um “frame agreement” com seus fornecedores estratégicos, determinando uma forte

estabilidade na oferta de componente, independentemente de preços e prazos. Esta

estratégia, segundo autor, capacita a empresa a realizar ofertas aos compradores sem

preocupar-se com futuras negociações de preço e quantidades com fornecedores. Além

disso, a ausência de negociações permite uma redução do tempo de entrega, já que a

produção pode iniciar-se com maior facilidade. Outro exemplo deste tipo de relação na

indústria naval refere-se à americana NASSCO, que mantém uma parceria com os FOS

(Fabricated Outside Services), entre as quais uma subsidiária da própria empresa -

NASSCO subsidiária.

Inversamente, para o grupo de produtos “genéricos”, a estratégia de outsourcing

deve envolver um horizonte de curto prazo (1 ano) e redução do número de aquisições,

quando da existência de custos de aquisição de material elevados. Nesse caso, a adoção

crescente do uso de tecnologia deve ser a principal tática utilizada pela indústria.

Em geral, quanto maior a especificidade do produto (produtos específicos ou

críticos) maior a necessidade de interação entre estaleiro e fornecedor no que tange aos

aspectos de engenharia e design. Nesse sentido, as parcerias e os contratos de longo

prazo são recomendáveis. Nos produtos de menor risco, onde a disponibilidade no

mercado spot e os requisitos de qualidade do produto são menos rígidos, as estratégias

envolvem a consolidação de padrões e fornecedores preferenciais.

Finalmente, no mesmo sentido, de acordo com Schank et all (2005), as atividades

de instalação de tubulações, equipamentos e outros componentes, antes da montagem

final nos diques e cais de acabamento - denominadas pré-outfiting - somadas às

instalações de “sistemas completos” no próprio estaleiro - conhecidas como outfiting -

por fornecedores diretos que se responsabilizam pelo design, compras de materiais e

Page 25: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

25

mão-de-obra têm permitido uma redução média de 25% no total de horas trabalhadas na

experiência internacional.

Todavia, a figura abaixo ilustra os fatores que dificultam a utilização do pré-

outfiting e do outfiting na indústria naval da Inglaterra, Europa e dos Estados Unidos,

constatando que deficiências de ajustamento de informação no design e lacunas no

fornecimento de material são os principais limitantes do uso desta prática na experiência

destes estaleiros, indicando, justamente, que as dificuldades no relacionamento com

fornecedores, sejam técnicas, contratuais ou logísticas, podem implicar em significativa

dificuldade de aproveitar as mencionadas reduções de custo.

Figura 1.10 - Limitações do Uso do Outfiting na Indústria Naval.

Fonte: Schank et all (2005).

1.2.4 A indústria de navipeças em nível mundial

Sendo a construção naval essencialmente uma indústria montadora, intensiva em

mão-de-obra, e absolutamente vinculada à rede de fornecedores de insumos como aço e

componentes como motores, material elétrico e eletrônico e outros equipamentos e

acessórios (FADDA, 2000), a organização da indústria de navipeças cumpre um papel

determinante na competitividade e desempenho da indústria naval.

A experiência internacional recente da indústria de navipeças – principalmente

Japão, Coréia do Sul e China que têm o domínio absoluto do mercado mundial naval -

tem demonstrado que a interação a jusante com a cadeia naval possui dois vetores: de

um lado, através da difusão de inovações organizacionais, como a redução do número

Page 26: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

26

de fornecedores diretos aos estaleiros e fornecimento just in time de sistemas e blocos

completos; no mesmo sentido, a adoção de novas tecnologias em componentes

relacionados à propulsão, comunicações e navegação tem permitido ganhos de

produtividade à indústria naval.

Por outro lado, também no plano internacional, as estratégias de outsourcing dos

estaleiros, permitindo a obtenção de economias de escala através da padronização e

redução de custos, têm atuado na direção de redução do número de fornecedores diretos,

os quais atuam na montagem e instalação de sistemas e blocos completos de alto valor

agregado dentro do estaleiro com utilização de mão-de-obra própria e com participação

direta na elaboração dos projetos e desenvolvimento de componentes, diminuindo os

prazos de entrega e maximizando o atendimento às especificações, o que termina por

resultar em contratos de fornecimento de longo prazo.

Entretanto, constata-se uma hierarquização da indústria de navipeças, pois, além

dos fornecedores diretos, existem também os fornecedores de componentes de baixo

valor agregado, os quais não mantêm relações comerciais com os estaleiros, mas apenas

com os fornecedores diretos.

Em qualquer situação, a proximidade física com os estaleiros e com outros

fornecedores, gera externalidades positivas para a indústria de navipeças resultando em

aumento de produtividade par a cadeia produtiva e se constituindo em fator

determinante da competitividade.

Em função desse fator determinante da competitividade – proximidade física

entre fornecedores e estaleiro - ensina a experiência internacional, que é

imprescindível e absolutamente fundamental para a existência, estruturação e

competitividade da cadeia produtiva naval, que a indústria de navipeças possua um

elevado índice de conteúdo local, como forma de maximizar o aproveitamento das

sinergias existentes entre fornecedores e a indústria montadora de navios. De acordo

com MAFFIOLI, DAIDOLA & OLIVIER (2001, p.20):

Competitiveness is based on continuous product engineering and facility

improvement which are to be accomplished by one’s own company and/or in

cooperation with competent suppliers. Ship design, particularly the design of

complex ships, is strongly influenced by relations between builders and

suppliers. External costs for the complex ship are, for example, typically more

Page 27: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

27

than 75% of the total cost of the ship. Competent suppliers know the systems

but do not know the ship and vice versa. The best results ate obtained when the

shipbuilder cooperates in teaming with chosen suppliers.

1.2.5 Fornecedores e conteúdo local na indústria naval: Japão, Coréia do Sul e China.

As empresas asiáticas entrevistadas em 2006 corroboram a assertiva acima acerca

da importância crucial de um elevado nível de conteúdo local da indústria de navipeças.

Senão vejamos.

O estaleiro japonês SHI (Sumitomo Heavy Industries), entrevistado em

Maio/2006, revela que a sua montagem de navios envolve apenas 200 a 250

fornecedores, número este que apresenta tendência de diminuição, e que sua produção

possui um índice de conteúdo local de 80% a 90%. Ainda segundo a entrevista, o

sistema de padronização e montagem “toyotista” permitiu concentração de

fornecedores, com contratos de relacionamento de longo prazo (ainda que pagamentos

sejam contra entrega de material, envolvendo cada vez mais turn key, e sistema just in

time, inclusive blocos);

Segundo os entrevistados, tal estratégia, focada no binômio especialização-

padronização-montagem, será mantida pelos próximos 3 anos, no mínimo;

adicionalmente, todos no estaleiro foram unânimes no reforço à idéia de que uma rede

de fornecedores locais bem estabelecida é fundamental para a competitividade.

Uma segunda entrevista, também realizada em maio/2006 com o CEO e principal

acionista da Yantai Raffles, Yantai, Shandong, estaleiro localizado na China, ressalta

uma forte intensificação de uma relação mais integrada com fornecedores nos últimos 4

anos, com desempenho positivo em engenharia/projeto e risco compartilhado, embora

ressalte que gostaria que seu cliente também diluísse riscos em atividades conjuntas.

Nessa entrevista, o principal executivo do estaleiro chinês foi questionado acerca

da viabilidade atual da indústria naval no Brasil e afirmou categoricamente que isso é

possível apenas e tão somente no caso da existência prévia de uma “sólida cadeia de

suprimentos”. Vale dizer, aponta que há uma clara precedência da rede de

fornecedores e da indústria de navipeças no que tange à competitividade da indústria

naval.

Page 28: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

28

Em terceiro lugar, a visita ao estaleiro da Samsung na Coréia do Sul constatou

que, do total de 16.000 trabalhadores, aproximadamente 50% são vinculados à rede de

fornecedores, número este que apresenta tendência sistemática de aumento. Por outro

lado, em função de salários menores na subsidiária da China - 1/6 a 1/8 dos salários na

Coréia do Sul, o estaleiro tem importado 10% dos blocos maiores de um navio.

Finalmente, também foi entrevistada a empresa DSME (Daewoo Shipbuilding) da

Coréia do Sul, considerado benchmark da indústria naval. O estaleiro possui cerca de

940 fornecedores, metade dos quais é constituído de empresas estrangeiras

(principalmente França, Japão e Itália) que realizam a montagem de componentes na

própria Coréia do Sul.

No caso dos navios de grande porte (LNG, entre outros), o estaleiro coreano

DSME utiliza a quase totalidade dos fornecedores em operações locais e realizam

entrega no sistema turn key, embora parte dos funcionários da DSME tenham

participação na montagem final dentro do navio, com rateio da comissão entre

trabalhadores contratados pelos fornecedores e trabalhadores do estaleiro.

Finalmente, também no caso do estaleiro coreano DSME deve ser ressaltada

importância dos ganhos de aglomeração, pois os principais fornecedores estão

instalados bastante próximos dos estaleiros, onde realizam a montagem de blocos e

sistemas para a DSME e também para outras empresas como a Samsung.

A tabela 1.2 abaixo procura sintetizar os resultados das entrevistas e visitas

realizadas em Maio de 2006 com os principais executivos dos estaleiros asiáticos –

Japão, China e Coréia do Sul – acerca do conteúdo local utilizado nestas empresas:

Tabela 1.2 - Conteúdo Local de Estaleiros Asiáticos Selecionados – 2006 (em %)

EEssttaalleeiirrooss//PPaaííss Conteúdo Local -2006

Daewoo - Coréia do Sul 80%

Samsung – Coréia do Sul 90%

Yantai Raffles - China 80%

Sumitomo - Japão 80%

Fonte: Visitas/Entrevistas realizadas em Maio de 2006

Portanto, em todos os estaleiros visitados nos países asiáticos, os quais

concentram aproximadamente 85% do market share global da indústria naval,

Page 29: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

29

constatou-se a importância estratégica da presença de uma rede de fornecedores

fisicamente próxima dos estaleiros como fator determinante da competitividade desta

indústria, envolvendo, naturalmente, um elevado índice de conteúdo local na cadeia

produtiva, ainda que a propriedade do capital das empresas fornecedoras seja externa.

1.3 Uma breve síntese

A comparação internacional entre a indústria automobilística e a indústria naval,

ressaltando as diferenças intersetoriais per se já revela o grau de dificuldade e a

impossibilidade de uma transferência integral dos princípios de um setor para outro,

embora isso possa ocorrer parcialmente. No mesmo sentido, a absorção das best

practice depende sempre das características concretas de cada país, sobretudo a

estrutura industrial prévia.

Conforme visto anteriormente, a experiência dos estaleiros asiáticos indica a

necessidade imperiosa de uma rede física de fornecedores locais como elemento central

da competitividade da indústria naval, indicando que não deve ocorrer trade-off entre

importação de componentes e conteúdo local, à medida que os fornecedores devem ser

predominantemente locais e próximos dos estaleiros, bem como dos demais

fornecedores.

Ressalte-se que a interação entre fornecedores e indústria naval, não subtrai a

possibilidade de importação de parcela de determinados componentes (aço, motores,

entre outros). Todavia, é essencial a proximidade entre fornecedores e estaleiros porque

permite ganhos de aprendizado com conseqüente diminuição de custos no design,

fabricação e montagem dos componentes e blocos no próprio navio, além da forte

diminuição nos níveis de estoques, como assim o demonstra a experiência dos países

asiáticos.

Dessa maneira, é mais que razoável a tentativa de indução da indústria brasileira

de navipeças através da exigência de conteúdo nacional de 65% de máquinas e

equipamentos para a construção naval, excetuando outros itens da embarcação como o

casco do navio, por exemplo. Tal exigência é parte PROMEF (Programa de

Modernização e Expansão da Frota) da subsidiária da Petrobrás – Transpetro.

Page 30: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

30

As razões para a fragilidade atual da indústria fornecedora de componentes para a

indústria naval situam-se, sobretudo, na escala absolutamente insuficiente da produção

local, acarretando um elevado sobrecusto à produção doméstica em relação aos países

asiáticos que exercem a liderança no mercado mundial. Algumas estimativas desse

sobrecusto, que pode variar entre 17-21%, são apresentadas na seção 4.3 deste estudo.

A ausência de uma escala mínima eficiente na produção de navios de carga em

geral, petroleiros e gaseiros, afeta diretamente a rede de fornecedores, impedindo a

produção local dos componentes de maior valor adicionado. Utilizando os custos

descritos nos orçamentos-padrão apresentados pelos estaleiros para as embarcações de

grande porte recentemente encomendadas no Brasil, valores próximos a 58% do custo

podem ser associados aos componentes (materiais como aço, peças e equipamentos) e

entre 18 e 22% para a mão-de-obra.

Se, por um lado, o índice da utilização de componentes não se distancia em

demasia dos índices da utilização de componentes dos países asiáticos, pois os maiores

estaleiros japoneses possuíam percentuais de 65% e os coreanos situavam-se

ligeiramente abaixo deste índice (61%), por outro lado, os custos com mão-de-obra

superam ligeiramente estes mesmos custos nos estaleiros japoneses (24%) e

significativamente os custos coreanos (30%).

Finalmente, por se tratar de um bem de capital, a interação para frente entre a

indústria naval e usuário é muito mais intensa, exigindo maior fluxo de informações

antes da montagem final do navio por parte do usuário e maior capacidade de

atendimento às especificações dos usuários por parte dos estaleiros e da rede de

fornecedores.

Page 31: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

31

2. Melhores práticas na cadeia aeronáutica

2.1 O padrão de concorrência e estrutura de mercado da indústria aeronáutica mundial

O padrão de concorrência da indústria aeronáutica mundial está centrado nas

inovações tecnológicas, particularmente no que se refere ao desenvolvimento de novas

aeronaves, e; nas condições de financiamento, que vão desde o desenvolvimento até a

comercialização das aeronaves.

Ao longo das últimas décadas, a crescente incorporação de avanços tecnológicos

tem resultado em maiores custos de desenvolvimento, produção e financiamento da

indústria aeronáutica como um todo. Este elevado dinamismo tecnológico tem sido o

principal determinante das estratégias das empresas produtoras de aviões, fazendo com

que estas passem a atuar globalmente, mas em segmentos definidos, de forma a poder

bancar os custos de desenvolvimento, produção e comercialização das novas aeronaves.

Estas novas estratégias empresarias, são ao mesmo tempo determinadas e

determinantes da profunda reestruturação produtiva por que tem passado a indústria

aeronáutica mundial, sendo caracterizadas pelos seguintes movimentos:

• Maior internacionalização: nenhum país, fora os EUA, possui um

mercado com dinamismo e magnitude suficiente para bancar os custos de

desenvolvimento de novos aviões, por isso, a necessidade de atuação

global;

• Maior concentração: as últimas duas décadas foram marcadas por um

amplo processo de reestruturação patrimonial (fusões, aquisições e

falências), que levou a uma crescente concentração nesta indústria, como

pode ser observado no quadro 2.1;

• Maior especialização: as fabricantes de aeronaves têm se tornado

grandes sistematizadoras, concentrando seus esforços nas atividades de

projeto, montagem e comercialização de aeronaves, demandando um

amplo conjunto de serviços e produtos de empresas fornecedoras;

Page 32: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

32

• Criação de Alianças Estratégicas: formação de alianças, tanto

horizontais, com as empresas concorrentes, quanto verticais, com os

fornecedores, de forma a repartir os custos de desenvolvimento e

aproveitar as competências específicas.

Quadro 2.1- Concentração da Indústria Aeronáutica Mundial de Aeronaves Comerciais, 1980-

2007

Fonte: Embraer.

Cabe ainda destacar o papel do Estado, cuja importância é crescente dentro da

estrutura de concorrência da indústria aeronáutica, através do:

a) apoio as atividades de P&D inerentes ao processo de desenvolvimento de

novas aeronaves e seus respectivos componentes;

b) fornecimento de crédito aos fabricantes e financiamento às vendas, tanto

nacionais, quanto às externas;

c) incentivos e subsídios fiscais e tributários;

d) proteção seletiva de determinados segmentos de mercados;

e) utilização do poder de compra, particularmente no que se refere as

encomendas de aeronaves militares.

Page 33: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

33

Desta maneira, pode-se concluir que, atualmente, a indústria aeronáutica apresenta

dimensão global, caracterizando-se como um oligopólio concentrado em nível mundial,

isto é, um pequeno número de atores globais (global players) que atua em segmentos

bastante definidos.

O subitem 2.2 apresenta alguns determinantes importantes da estratégia da

Embraer e de sua inserção no mercado mundial de aeronaves. Destaca sua estratégia

recente de diversificação e suas vantagens competitivas para fazê-lo. A compreensão

destes elementos faz-se importante para destacar alguns pontos de convergência e

divergência em relação à dinâmica de concorrência na indústria naval. Nesse sentido,

sua compreensão torna-se complementar à análise pura das relações da Embraer com

seus fornecedores, descrita a partir do tópico 2.3.

2.2 A Inserção da Embraer na indústria aeronáutica mundial

2.2.1. Características gerais da Embraer

No Brasil, a produção aeronáutica está concentrada em uma única firma, a

Embraer - Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A, uma empresa de capital nacional

com sede em São José dos Campos, São Paulo. Depois de mais de uma década de

intensa disputa com a empresa canadense Bombardier, a Embraer atingiu recentemente

a liderança no mercado de jatos regionais, se consolidando como a terceira maior

fabricante de aviões comerciais do mundo, atrás apenas da Boeing norte-americana e do

consórcio europeu Airbus. Esta bem sucedida estratégia empresarial se reflete no

excepcional desempenho financeiro desta empresa, cuja receita líquida saltou de R$ 1,5

bilhão, em 1998, para R$ 8,3 bilhões, em 2006, um crescimento de 453% em 8 anos.

Page 34: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

34

Fundada em 1969, como empresa estatal de capital misto, a Embraer foi

privatizada em 1994. O controle da empresa ficou dividido entre a Cia. Bozano e os

fundos de pensão Previ e Sistel, que detinham 60% das ações ordinárias. Em 1999, a

Embraer formalizou uma aliança estratégica com um grupo formado pelas maiores

companhias aeroespaciais francesas, que adquiriram 20% do capital votante da empresa.

Apesar desta parcial desnacionalização, o grupo de controle continuou nas mãos dos

três sócios nacionais, além do governo federal, que possui uma ação que lhe confere

poderes especiais (golden share). Em março de 2006, a Embraer realizou uma ampla

reestruturação societária, que a transformou na primeira companhia brasileira de grande

porte com capital totalmente pulverizado, sendo estabelecidas as seguintes diretrizes:

a) nenhum acionista ou grupo de acionistas terá direito a voto superior a 5%,

desestimulando a concentração de ações em poucos controladores;

b) os acionistas estrangeiros, seja isoladamente ou em grupo, terão seu direito

limitado a 40% do total de votos, de forma a evitar a desnacionalização da

empresa;

c) qualquer acionista ou grupo de acionistas está proibido de adquirir uma

participação igual ou superior a 35% do capital da Embraer, salvo com

expressa autorização da União, na qualidade de detentora da golden share,

e sujeita à realização de uma Oferta Pública de Aquisição (OPA).

Atualmente, a Embraer é o único global player que o Brasil possui na área de alta

tecnologia, fazendo com que a indústria aeronáutica tenha uma grande importância para

o país, tanto do ponto de vista econômico quanto estratégico. Além disso, esta forte

atuação internacional da Embraer tem contribuído para promover a própria imagem do

Brasil no exterior. A importância desta empresa também se estende à geração de

empregos de alto nível3 e à produção de consideráveis superávits comerciais. Quanto a

este último aspecto, observa-se que a Embraer realiza mais de 95% das suas vendas no

exterior, fazendo com que ela se posicione como uma das maiores exportadoras

brasileiras.

3 A Embraer possui mais de 20 mil funcionários, sendo que aproximadamente 1/3 deste possui nível universitário (EMBRAER. Embraer em Números, 2006).

Page 35: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

35

2.2.1 A Embraer e seus mercados

O segmento de mercado onde a Embraer mais se destaca é o dos jatos regionais,

que como pode ser visto no gráfico abaixo representa mais de 60% do seu faturamento.

Além disso, a empresa brasileira também atua na produção de aviões militares e

aeronaves executivas.

A opção da Embraer pelo mercado regional, onde a empresa brasileira atua com

uma linha completa de aeronaves modernas e de baixos custos, forneceu uma

importante vantagem competitiva para a companhia. No contexto da crise do mercado

de aviação comercial, agravado ainda mais pelo terrorismo, o segmento de aeronaves

regionais foi um dos menos afetados. Isto se deve ao fato das modernas aeronaves deste

segmento apresentarem menores custos de operação e aquisição, além de oferecerem

uma capacidade mais adequada a um mercado em retração.

Gráfico 2.2 - Embraer: distribuição da receita por segmento, 2006 (em %)

Comercial64%Defesa

6%

Corporativo16%

Outros14%

Fonte: EMBRAER.

A Embraer atua no mercado comercial com duas famílias4 de jatos regionais: a)

família ERJ-135/145 de 35 a 50 assentos, um sucesso comercial com mais de 900

unidades entregues desde o início de sua produção, em 1996, e; b) A família EMB-

170/190, aeronaves com capacidade entre 70-108 passageiros, lançada recentemente. O

novo desafio da empresa brasileira no segmento de jatos regionais é que seus modelos

4 Família de Aeronaves: versões derivadas de um modelo básico que permitem atender demandas específicas, além de propiciar menores custos e maior disponibilidade para os operadores.

Page 36: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

36

de maior capacidade passaram a competir diretamente com as menores aeronaves

produzidas pelas duas grandes fabricantes mundiais (Boeing e Airbus).

O grande sucesso das aeronaves regionais da Embraer se deve: a) tendência

histórica de ampliação das dimensões das aeronaves regionais; b) substituição dos

aviões de grande porte por menores em rotas onde existe excesso de capacidade

(assentos); c) mercado não atendido pelos demais fabricantes, existindo uma lacuna na

oferta, particularmente no segmento de 70-110 passageiros, onde a Embraer é a única

produtora mundial; d) estabelecimento das parcerias de risco juntamente com seus

principais fornecedores.

Ainda dentro do segmento de aeronaves regionais, a Embraer têm procurado

expandir suas vendas para novos mercados, novas regiões. Contudo, observa-se que a

empresa ainda é muito dependente do mercado americano, que responde por quase 60%

do seu faturamento.

Gráfico 2.3 - Embraer: distribuição da receita por região, 2006 (em %)

Américas57%

Europa22%

Brasil4%

Outros17%

Fonte: EMBRAER.

Buscando diversificar suas atividades, a Embraer tem por objetivo se tornar um

dos grandes fabricantes de jatos executivos do mundo, nos próximos 10 anos, e para

isto tem adotado um conjunto de estratégias bastante agressivas que visam ocupar todos

os segmentos deste mercado, seja através de aeronaves derivadas dos jatos comerciais,

seja com o lançamento de aviões projetados exclusivamente para este segmento. Desde

2002, a Embraer atua no mercado de jatos executivos com o Legacy-600, um moderno

Page 37: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

37

jato derivado do ERJ-135, cujas vendas têm apresentado um bom desempenho. Em

2006, a Embraer anunciou o lançamento de dois novos produtos para as categorias de

jatos muito leves (VLJ – Very Light Jets), designados Phenom-100 e 300, para 4 e 9

ocupantes, respectivamente5. Estas aeronaves visam atender principalmente as empresas

de táxi aéreo e operadores de propriedade compartilhada, que buscam aviões modernos

e com preços competitivos. Por fim, a Embraer também anunciou, em 2006, o

lançamento de um jato executivo de grande porte, o Lineage-1000, derivado do EMB-

190, para até 18 ocupantes, sendo um dos maiores aviões executivos “em série” do

mundo.

Dentro de sua estratégia de diversificação, a Embraer tem buscado ampliar a sua

atuação no segmento de aviões militares. Apesar de ter sido criada no final da década

de 60 para atender prioritariamente a demanda da FAB – Força Aérea Brasileira, a

atuação da Embraer no mercado de aeronaves militares não acompanhou o crescimento

da empresa. No final dos anos 90, a Embraer foi contratada para fornecer as aeronaves

de monitoramento do SIVAM - Sistema de Vigilância da Amazônia. Estas aeronaves,

derivadas do modelo regional EMB-145, estão entre as mais sofisticadas do mundo no

que se refere à vigilância eletrônica, tendo sido exportadas para as forças aéreas da

Grécia e do México. Nos últimos anos, a Embraer tem se dedicado a produção das

aeronaves de treinamento militar Super Tucano para a FAB, havendo a expectativa de

que este novo avião repita o sucesso no mercado internacional do seu antecessor, a

aeronave Tucano. A Embraer também tem participado em conjunto com a empresa

israelense Elbit dos programas de modernização dos atuais caças, F-5 e AMX, da FAB.

Recentemente, a Embraer apresentou ao público seus estudos para o desenvolvimento

de um jato de transporte militar de médio porte, denominada previamente de EMB C-

390.

5 “Os dois jatos são menores e bem mais baratos que o Legacy, que custa US$ 25 milhões. O Phenom 100 tem espaço para quatro passageiros e preço de US$ 2,85 milhões. O Phenom 300 transporta até nove pessoas e custa US$ 6,65 milhões” (Folha de São Paulo, 03/12/2006).

Page 38: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

38

Quadro 2.2 - Embraer - Mercados de Atuação - 2007

MERCADOS CARACTERÍSTICAS GERAIS

Regional A aviação regional é o principal mercado da Embraer, que produz duas famílias de jatos:

• ERJ 135/145 (35-50 assentos)

• EMB 170/190 (70-110 assentos).

Executivo Iniciando a atuação neste mercado com a adaptação dos modelos regionais e recentemente, lançando uma linha de pequenos aviões executivos (VLJ):

• Linage 1000 (18 assentos)

• Legacy 600 (13 assentos)

• Phenom 100 e 300 (6-9 assentos)

Militar

Segunda geração de aeronaves de treinamento turboélice

• Super Tucano

Lançamento de modelos de vigilância e guerra eletrônica:

• EMB 145 AEW&C e RS/AGS

Estudo para avião de transporte militar

• EMB C 390 (capacidade - 20 tons.)

Fonte: Elaboração Própria.

A Embraer também está buscando ampliar a sua atuação no segmento de

prestação de serviços aeronáuticos. Inicialmente, estes serviços estavam voltados para

manutenção e treinamento de suas próprias aeronaves. Entretanto, nos últimos anos, esta

área de serviços tem apresentado uma participação crescente dentro dos negócios da

Embraer, passando também a fornecer serviços de manutenção e modernização para

aeronaves de outros fabricantes, além de ser subcontratada para a produção de estruturas

e sistemas aeronáuticos. Outro elemento que tem contribuído para expansão da Embraer

no segmento de serviços aeronáuticos é a sua entrada no segmento de jatos executivos.

Apesar das semelhanças técnicas com os aviões regionais, o mercado de jatos

executivos apresenta como um dos fatores competitivos determinantes a existência de

uma rede de serviços pós-venda de escala global6.

6 Na área de defesa, as forças aéreas possuem suas estruturas de manutenção de aeronaves e no mercado de aviação comercial, muitas companhias aéreas possuem subsidiárias voltadas para a prestação de serviços em suas próprias aeronaves.

Page 39: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

39

2.2.3. A capacitação tecnológica da Embraer

A destacada competência tecnológica da Embraer foi alcançada graças aos

esforços cumulativos de desenvolver as tecnologias-chaves que determinam o avião

como um produto final: a) Produto: projetos de novas aeronaves; b) Processo:

montagem das aeronaves, a capacidade de integração de sistema; c) Serviço:

gerenciamento, comercialização e assistência pós-venda. Em suma, as vantagens

tecnológicas da Embraer concentram-se no projeto e montagem final de novas

aeronaves. A Embraer utiliza estas competências tecnológicas nos diferentes mercados

em que atua, de forma cumulativa, isto é, as tecnologias obtidas na produção de

determinados aviões são posteriormente utilizadas no desenvolvimento e produção de

novas aeronaves. Um dos exemplos foi a produção do caça tático a jato AMX, nos anos

80 e 90, em conjunto com as empresas italianas, mesmo tendo sido um fracasso nas

exportações este projeto permitiu a Embraer o domínio de diversas tecnologias, depois

utilizadas no desenvolvimento da família de jatos regionais ERJ-145, que como visto,

foi um grande sucesso comercial.

2.2.4. Os investimentos da Embraer

Observa-se que o sucesso comercial e a competência tecnológica da Embraer

estão assentados nos grandes investimentos realizados pela empresa. Mesmo com a

estagnação econômica das últimas décadas, a Embraer foi uma das poucas empresas

brasileiras que manteve elevados níveis de investimento. Nos últimos 5 anos, a empresa

investiu uma média de US$ 250 milhões/ano, nas seguintes áreas: i) novos produtos,

mais especificamente na família EMB-170/190; ii) desenvolvimento de novas

tecnologias, principalmente de produto; iii) capacitação produtiva: a. modernização da

estrutura produtiva com a incorporação de novas tecnologias de processo; b. novos

sistemas administrativos e de engenharia, com a completa informatização da empresa; c.

renovação do parque produtivo de São José dos Campos; d. nova unidade industrial,

instalada a partir de setembro de 1999, no município de Gavião Peixoto, destinada a

produção das aeronaves militares e corporativas, segmento que a Embraer elegeu para

ampliar suas atividades.

Page 40: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

40

2.2.5. A internacionalização produtiva da Embraer

As elevadas economias de escala e escopo existentes na indústria aeronáutica

fazem com que os fabricantes busquem concentrar suas atividades produtivas em

poucas plantas industriais. Mesmo assim, a Embraer tem adotado uma estratégia de

progressiva internacionalização de suas atividades, onde se destaca a constituição, em

2003, da HEAI - Harbin Embraer Aircraft Industry, uma joint-venture entre a Embraer e

a empresa chinesa AVIC II - Aviation Industry of China II. Esta joint-venture tem como

objetivo a montagem final, venda e assistência técnicas das aeronaves de 37-50 lugares

destinadas ao mercado chinês.

No final de 2004, foi adquirida a OGMA - Indústria de Aeronáutica de Portugal

S.A. e, no ano seguinte, iniciou-se a construção de novas instalações para a manutenção

de aeronaves na Unidade de Nashville, nos Estados Unidos, a EAMS – EMBRAER

Aircraft Maintenance Services, Inc.

A internacionalização produtiva da Embraer visa, no caso joint-venture chinesa,

superar as barreiras de ordem legal, e nos outros dois casos estabelecer uma rede de

assistência técnica de escala global, que como visto, apresenta uma importância ainda

mais significativa para o segmento de aeronaves executivas. Por fim, existe a

possibilidade da subsidiária portuguesa vir a se tornar responsável pela produção de

partes e peças dos aviões da Embraer.

2.2.6. Riscos da inserção competitiva da Embraer

Apesar do grande sucesso comercial da Embraer, ela é uma empresa com atuação

pouco diversificada, concentrando, aproximadamente, 60% da sua produção em um

único segmento e em um único mercado, os jatos regionais para o mercado americano.

A Embraer divide praticamente pela metade, com sua concorrente canadense, o

mercado mundial de aeronaves regionais, cujas vendas totais estão estimadas em US$ 6

bilhões/ano. Mesmo tendo avançado sobre sua concorrente, com o lançamento de uma

nova família de aeronaves, é difícil que ela consiga ampliar continuamente sua

participação neste segmento, ao contrário, a expectativa é de que com a eventual entrada

de novos concorrentes esta participação possa vir a diminuir. Além disso, existe um teto

para a expansão do próprio segmento de aviões regionais, já que as suas maiores

Page 41: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

41

aeronaves concorrem diretamente com os menores jatos da Boeing e da Airbus, as duas

maiores fabricantes de aeronaves do mundo.

A estratégia de diversificação da Embraer busca ampliar sua atuação nos

segmentos de aeronaves executivas e militares, contudo, a expansão nestes dois

mercados apresenta limitações que precisam ser superadas. O mercado de aviação

executiva tem como fator competitivo chave a maior sofisticação das aeronaves, que se

reflete na marca/tradição destas. Apesar das excelentes qualidades técnicas das

aeronaves executivas produzidas pela Embraer, esta empresa ainda não tem tradição de

atuação neste mercado. Além disso, este segmento apresenta uma estrutura de mercado

menos concentrada, havendo um grande número de empresas concorrentes já

estabelecidas, onde se destacam a Bombardier, a Dassault, a Gulfstream, a Cessna e a

Raytheon.

Por sua vez, o segmento de defesa representa uma grande oportunidade para a

Embraer expandir suas atividades. Entretanto, este mercado depende basicamente do

poder de compra do Estado, além da atuação do governo brasileiro junto a outras nações

visando a exportação desta categoria de aviões. As restrições orçamentárias, agravadas

ainda mais por uma política fiscal que visa a obtenção de crescentes superávits

primários, fizeram com que o programa de reequipamento da Força Aérea Brasileira

sofresse significativos cortes e atrasos. Em relação às exportações de aeronaves

militares, apesar do apoio do Itamaraty, deve-se destacar que na totalidade das vezes,

estas foram precedidas por grandes encomendas das forças armadas brasileiras,

retornando-se assim a questão orçamentária.

2.2.7. As vantagens competitivas da Embraer e as suas potencialidades

A Embraer é atualmente a líder mundial no segmento de aeronaves regionais de

propulsão a jato, tendo vencido sua concorrente canadense, Bombardier, não apenas na

OMC – Organização Mundial do Comércio, mas principalmente no lançamento de uma

nova família de aeronaves. Enquanto os aviões da Embraer já estão sendo vendidos

desde 2004, a Bombardier desistiu, pelo menos temporariamente, de lançar uma nova

família de aeronaves para operar neste segmento7. Outros potenciais concorrentes, como

a empresa russa Sukhoi, a japonesa Mitsubishi e a chinesa AVIC I, além de não terem

7 Entretanto, a Bombardier está lançando uma versão alongado de 100 assentos da família CRJ voltada inicialmente para 50 passageiros.

Page 42: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

42

experiência na comercialização de aeronaves no ocidente, ainda estão na fase de

projeto/teste. Desta maneira, a Embraer continuará, por um bom tempo, a ser a única

fabricante mundial de aeronaves a jato com capacidade entre 70 e 110 passageiros,

havendo excelentes perspectivas de venda destas aeronaves. Por sua vez, a família de

jatos na faixa de 30 a 60 assentos atingiu sua fase de maturidade, havendo uma

desaceleração das vendas no último ano, mas a perspectiva é que a linha de produção

continue ativa por vários anos, com especial atenção para China, onde a Embraer

mantém uma unidade de montagem destas aeronaves.

Apesar das boas perspectivas na aviação comercial, a Embraer está buscando

diversificar suas operações para outros mercados, de forma a ampliar seus ganhos e

diminuir os riscos de concentrar suas vendas em apenas um único segmento. A Embraer

está adotando uma estratégia bastante agressiva para se tornar, até 2015, um dos grandes

players do mercado de jatos executivos do mundo. Para isto, ela está aproveitando as

sinergias existentes e lançando modelos derivados dos seus médios e grandes jatos

comerciais. Além disso, ela está entrando numa nova categoria que apresenta excelente

perspectiva de crescimento, a dos VLJ – Very Light Jets. De maneira geral, observa-se

que a Embraer está procurando atender a todas as faixas de mercado existentes na

aviação executiva.

O mercado de aviões militares é de grande importância para Embraer, não apenas

para diversificar suas atividades, mas como forma de acesso a novas tecnologias, que

posteriormente são utilizadas no desenvolvimento e produção de aeronaves civis. Com

relação aos aviões de militares de primeira linha, os caças supersônicos, observa-se que

atualmente, a FAB está optando por modernizar seus antigos caças, na própria Embraer.

Entretanto, a vida remanescente destas aeronaves é pequena e, em pouco mais de uma

década, todos os esquadrões de caça da FAB terão de ser substituídos, criando-se assim

uma boa expectativa de que a Embraer participe do fornecimento destes aviões, em

conjunto com a empresa vencedora da provável concorrência. Além disso, a Embraer

também possui boas perspectivas de exportação de aeronaves turbohélice de

treinamento e de vigilância eletrônica, nos próximos anos. Ambos os tipos são de

aeronaves modernas, que além de terem sido adquiridas pela Força Aérea Brasileira em

grande número, recentemente receberam as primeiras encomendas do exterior. Por fim,

o novo modelo em estudo, a aeronave de transporte militar EMB C-390 encontra

grandes chances de sucesso, pois as aeronaves atualmente em uso neste segmento têm

Page 43: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

43

idade avançada e estão perto da desativação, não havendo, por outro lado, aeronaves

modernas que possam substituí-los.

2.3 Embraer: evolução da relação com seus fornecedores

2.3.1. Origem da Embraer - uma empresa horizontal

Dentro da indústria aeronáutica mundial, a Embraer pode ser considerada uma

empresa recente, mesmo tendo sido criada no final dos anos 60, pois a maioria dos seus

concorrentes já estava estabelecida neste período. Nesta época, a elevada da

complexidade tecnológica e altos custos dos novos projetos aeronáuticos fizeram com

que, a Embraer fosse concebida como uma montadora final, que se dedicaria

exclusivamente ao projeto e montagem de aeronaves. Desde o início de suas

atividades a Embraer buscou desenvolver as tecnologias-chaves que determinam o avião

como um produto final, de forma que o fornecimento de componentes sempre foi

realizado por outras empresas nacionais ou estrangeiras.

Esta nova concepção de indústria aeronáutica implicou em renunciar ao sonho dos

anos 40 e 50, que era o de construir, no Brasil, uma indústria aeronáutica completa e

integrada, com avião, motores, componentes, peças e aviônicos totalmente

nacionalizados. Este sonho estava de acordo com a baixa complexidade dos projetos

aeronáuticos do imediato pós-guerra, onde era possível se internalizar a maioria das

etapas da cadeia produtiva. Outros países, como a Argentina8, haviam adotado esta

estratégia, passando a produzir localmente, não apenas os aviões, como também muitos

de seus componentes.

Entretanto, o caso brasileiro seguiu direção oposta, pois na Embraer os esforços

foram direcionados para a capacitação na área de projetos e montagem de aviões e na

integração de sistemas. Cabe destacar que, inicialmente, a Embraer buscou parcerias

estratégicas para desenvolver estas capacitações, entre estas parcerias destacam-se o

acordo tecnológico com a italiana Aermacchi, para produção de um avião de

treinamento militar, e a fabricação dos aviões da Piper Aircraft norte-americana. A

primeira parceria foi fundamental para a capacitação em projetos de aeronaves e a

segunda, para aprender a produzir aviões em série.

Page 44: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

44

A Embraer não tinha interesse de produzir internamente os componentes e

sistemas, por inúmeras razões: escala, mercado, confiabilidade tecnologia e,

principalmente, porque estas atividades não faziam parte do seu core business. Assim, a

maioria destes foi adquirida no mercado, particularmente dos grandes fornecedores

internacionais. Apenas os componentes de menor complexidade tecnológica passaram a

ser fabricados no Brasil por empresas subcontratadas.

Segundo Dagnino (1994:59), se as autoridades do setor aeronáutico tivessem

perseguido a “miragem do índice de nacionalização, nos anos 90 ela poderia ter

chegada próximo aos 50%, mas este fator teria implicado na adoção de uma estratégia

tecnológica completamente diferente. Os custos seriam talvez até mesmos proibitivos e

o tempo de entrada no mercado seria seguramente maior, pois, tal estratégia implicaria

na reprodução de todo o ciclo de desenvolvimento dos países centrais. Basta lembrar,

por exemplo, que o número de países que fabricam motores aeronáuticos com

tecnologia própria não é superior a cinco”.

2.3.2. Anos 70-80: Embraer - relação direta com os fornecedores As décadas de 1970 e 1980 marcam o início das atividades da Embraer e a sua

consolidação como uma empresa aeronáutica de atuação internacional. Nos anos

setenta, o objetivo prioritário era a operacionalização da Embraer como uma produtora

de aeronaves. O Estado fez sua parte, primeiramente ao criar a empresa, pois a Embraer

surgiu como uma empresa estatal vinculada ao Ministério da Aeronáutica,

posteriormente por garantir as demandas desta empresa através da FAB – Força Aérea

Brasileira que, inicialmente, realizou uma encomenda de 80 aviões Bandeirante e 112

jatos de treinamento Xavante. Cabe destacar que o Bandeirante foi o primeiro avião

projetado pela Embraer e também foi utilizado pela aviação regional, enquanto os jatos

de treinamento foram produzidos sob licença da empresa italiana Aermacchi. Além

disso, o Ministério da Aeronáutica decidiu também transferir para a Embraer o

programa do avião agrícola Ipanema, que estava sendo desenvolvido com verbas

fornecidas pelo Ministério da Agricultura. Por fim, o Ministério da Aeronáutica criou

8 A FMA – Fábrica Militar de Aviones foi criada pelo governo argentino em 1927, atingindo seu auge nos anos 40 e 50, tendo sido adquirida nos anos 90 pela norte-americana Lockheed Martin, passando a se chamar Lockheed Martin Aircraft Argentina SA.

Page 45: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

45

uma reserva de mercado para os aviões leves9, segmento que a Embraer passou a

atender graças a um acordo de cooperação que foi assinado, em 1974, com norte-

americana Piper Aircraft, para produção local de uma extensa linha de monomotores e

bimotores a pistão.

A década de 80 é marcada pelo avanço internacional da Embraer, graças a dois

novos aviões desenvolvidos inteiramente no país, o turbohélice de treinamento militar

EMB-312 Tucano, apresentado em 1980, e o avião regional de 30 assentos EMB-120

Brasília. Depois de uma da grande encomenda inicial da FAB, que adquiriu mais de 130

unidades, o Tucano se consagrou no mercado internacional, sendo exportado para mais

de 10 países, entre eles a França e a Inglaterra10. O Brasília, um bimotor turbohélice de

alto desempenho foi lançado em 1983, conquistando ao longo dos anos 80 uma posição

de destaque no mercado internacional, tendo sido adotado por diversas companhias

aéreas regionais norte-americanas e européias.

Apesar do sucesso comercial e dos avanços tecnológicos obtidos ao longo destas

duas décadas, a estrutura produtiva da Embraer ainda apresentava uma relação direta

com todos os seus fornecedores. Quanto maiores e mais sofisticadas as aeronaves

fossem, maior a complexidade e o custo de se administrar esta relação direta com os

fornecedores. Por exemplo, o EMB-120 Brasília possuía cerca 500 diferentes

fornecedores, com mais de 90% destes localizados no exterior.

2.3.3. Anos 90: Embraer – criação das parcerias de risco

O início dos anos 90 é um período de grave crise econômica na Embraer, as

encomendas do modelo EMB-120 Brasília estavam praticamente esgotadas, e o projeto

CBA-123 havia sido um fracasso11. A crise financeira da empresa foi agravada ainda

mais por dois fatores estruturais: a) a crise fiscal do estado que repercutiu de forma

direta na queda dos investimentos, financiamentos e demanda pública e; b) a falta de

9 Em 1973, as importações de aviões leves mais que dobraram, atingindo 508 unidades, entre outros fatores, devido demanda gerada pela expansão da fronteira agrícola para as regiões centro-oeste e norte do país. Neste contexto de grande expansão da demanda foi estabelecida a política de substituição de importações para este tipo de aeronave. 10 Em 1985, a Embraer em conjunto com a Short Brothers, ganhou a concorrência internacional realizada pela RAF – Royal Air Force, para o fornecimento de um novo avião de treinamento, com a condição que estes novos aviões fossem produzidos sob licença pela sócia britânica. 11 O CBA - Vector, desenvolvido em conjunto com a Argentina, era um avião regional de pequeno porte e tecnologias inovadoras, mas estava totalmente descolado da realidade do mercado, pois além de apresentar custos muito elevados não apresentava demanda que justificasse sua produção. Como conseqüência, foi responsável por um prejuízo de US$ 280 milhões aos cofres da Embraer.

Page 46: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

46

flexibilidade empresarial, principalmente para a captação de recursos, devido ao

gerenciamento estatal focado na lógica tecnológica12.

A solução encontrada pelo governo foi a privatização, que resultou numa

profunda reestruturação na empresa. A nova direção da Embraer passou a focar o

mercado, os resultados financeiros, sem abandonar, entretanto, a excelência tecnológica

que havia caracterizado a empresa enquanto estatal. O ERJ-145 sintetiza esta nova

estratégia da empresa. Antes da privatização já existia o projeto de uma nova aeronave

regional a jato, mas não havia condições financeiras de tirá-la do papel. Depois de

privatizada, a nova direção decidiu levar a frente o projeto da nova aeronave, o ERJ-

145, mesmo não possuindo recursos suficientes para isto. Esta era a única saída para a

Embraer, pois a sua maior concorrente, a canadense Bombardier, já havia lançado um

jato da mesma categoria do ERJ-145, dois anos antes e que estava sendo um sucesso.

Neste contexto de falta de recursos, a Embraer buscou parceiros de risco para o

projeto: na realidade buscou-se empresas fornecedoras que dividissem os riscos

“financeiros” do no avião com a empresa brasileira13.

Quatro foram os parceiros de risco escolhidos pela Embraer para o projeto ERJ-

145:

• Gamesa - Grupo Auxiliar Metalúrgico S.A., responsável pela produção de

asas, naceles do motor, carenagens de junção asa/fuselagem e as portas do

trem de pouso principal. A Gamesa era uma empresa espanhola que passou a

atuar na indústria aeronáutica graças à transferência de tecnologia promovida

pela Embraer14, tanto que mais de 90% do faturamento da Divisão

Aeronáutica da empresa, eram decorrentes da parceria com a empresa

brasileira;

12 Segundo Bernandes (2000:12) “apesar da história de excelência tecnológica da Embraer, sua gestão era excessivamente engineering driven, ou seja, muito direcionada para a técnica e pouco para os resultados financeiros, ou em outros termos, uma ausência de uma consciência de custos e visão negocial”. 13 Segundo a Embraer, os parceiros realizaram um aporte para o projeto ERJ-145 de aproximadamente US$ 100 milhões, o que representou aproximadamente 33% dos investimentos totais no projeto ERJ-145. Cabe destacar que o grande parceiro da Embraer neste empreendimento foi o BNDES, que financiou US$ 155 milhões, mais da metade do investido pela empresa brasileira. 14 Segundo DORNA (2003:6) “Praticamente todos os procedimentos operacionalizados pela Gamesa foram ensinados por funcionários da Embraer enviados à Espanha em 1994. Além disso, praticamente 100% da mão-de-obra contratada pela empresa no intento de atender ao aumento explosivo da demanda pela aeronave é composta por ex-funcionários da Embraer”.

Page 47: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

47

• Sonaca - Société Nationale de Construction Aerospatiale, empresa estatal

belga de médio porte que já no segmento aeronáutico15, ficou responsável

pela construção das fuselagens central e traseira, além dos dois pilones dos

motores e portas (principal, de serviço e de bagagem);

• ENAer - Empresa Nacional de Aeronáutica, estatal chilena que passou a

produzir o conjunto de empenagem horizontal/profundor e a empenagem

vertical. A parceria com a Embraer chegou a responder por mais da metade

do seu faturamento;

• C&D Interiors, empresa norte-americana, uma das maiores do mundo em

sua especialidade - desenvolveu e produziu o interior da cabine de

passageiros e compartimento da bagagem.

O objetivo com os parceiros de risco no projeto ERJ-145 eram estritamente

financeiro, já que a Embraer possuía a tecnologia e, como visto, esta foi transferida para

os parceiros, tanto que 3 dos 4 parceiros de risco do projeto ERJ-145 eram fornecedores

estruturais, atividades produtivas que até o modelo anterior eram realizadas

internamente. Também deve se considerar que dada a crise por que passava a empresa, a

Embraer necessitava de uma capacidade produtiva complementar a sua, precisava dos

funcionários dos seus parceiros de risco já que muitos dos seus haviam sido demitidos

no processo de saneamento da empresa anterior a privatização. Em suma, a Embraer

tinha a competência técnica e necessitava dos recursos financeiros e da capacidade

produtiva dos parceiros. A Figura 2.1 ilustra as partes fornecidas pelos principais

parceiros da Embraer.

15 A SONACA é uma tradicional empresa aeronáutica belga que nos anos 70 participou do programa do caça F-16 para OTAN, em conjunto com empresas européias, sendo responsável pela fabricação de partes da fuselagem e montagem final destas aeronaves. Nos anos 80 foi contratada pela Airbus para produzir bordos de ataque das asas para as famílias de aeronaves A318/320 e A330/340, tornando-se fornecedora exclusiva deste componente.

Page 48: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

48

Figura 2.1 -Embraer – Parceiros de Risco do Projeto ERJ-145

Fonte: Embraer.

Por outro lado, foi uma grande oportunidade para as parceiras de risco da

Embraer, particularmente das fornecedoras estruturais, pois a empresa brasileira

transferiu toda a tecnologia do projeto, permitindo que estas empresas se consolidassem

como fornecedoras da indústria aeronáutica. Cabe destacar que as três fornecedoras

estruturais eram empresas de médio porte que possuíam uma participação muito restrita

no segmento aeronáutico, uma delas, a Gamesa, sequer atuava nesta indústria. Desta

maneira, a parceria com a Embraer permitiu que estas empresas se alavancassem, não

apenas do ponto de vista tecnológico, mas também financeiro, dado que o sucesso deste

projeto robusteceu o faturamento destas16. Além disso, estes três fornecedores

localizavam-se em países com pouca tradição aeronáutica, havendo assim, um apoio do

governo destes países para que suas empresas participassem do projeto brasileiro17.

Além dos parceiros de risco o projeto ERJ-145 contou com 350 fornecedores,

constituído em sua maioria por grandes e médias empresas estrangeiras que possuem

recursos e capacitação técnica para fornecer matérias-primas, peças, partes e também

subsistemas que atendam às especificações requisitadas pela Embraer.

Por fim, encontram-se as companhias subcontratadas que em geral são pequenas e

médias empresas nacionais que prestam serviços aeronáuticos: fornecem peças

16 Segundo entrevista realizada na Sobraer: “A Embraer é responsável por mais de 40% do faturamento do grupo Sonaca, sendo o principal cliente da empresa belga, juntamente a européia Airbus”. 17 Cabe destacar que nos casos da Gamesa e da Sonaca, os incentivos fiscais vieram principalmente dos governos regionais do País Basco (Espanha) e da Valonia (Bélgica), respectivamente.

Page 49: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

49

usinadas, estampadas e de material composto, a partir de especificações e matérias-

primas fornecidas pela Embraer. Também existem algumas empresas subcontratadas

para serviços de engenharia de projetos e sistemas. A maioria das empresas

subcontratadas apresenta uma relação de alta dependência da Embraer, pois mais de

90% de sua receita provem da prestação de serviços para essa empresa.

2.3.4. Anos 2000: Embraer – expansão das parcerias de risco

O sucesso internacional do ERJ-145, juntamente com a crescente demanda por

aviões regionais, levou a Embraer a desenvolver um projeto que atendesse as

necessidades dos clientes: aeronaves maiores, mais modernas, com maior conforto e

baixo consumo de combustível. Desta maneira surgiu uma nova família de aeronaves a

EMB-170/190, com quatro novos modelos, de 70 a 110 passageiros.

O projeto EMB-170/190 foi marcado pela rapidez com que a Embraer desejava

lançar esta nova família aeronave no mercado, pois o objetivo central era o de estar a

frente dos concorrentes e ocupar um espaço onde nenhuma outra empresa atuava, o

segmento de aeronaves a jato de 70-110 assentos. O projeto todo, da concepção ao vôo,

estava previsto para ser realizado num prazo de apenas 38 meses, um período

extremamente curto para o padrão atual da indústria aeronáutica.

Neste contexto a Embraer buscou parceiros de risco para o novo projeto, mas

agora com um aprofundamento das parcerias, tanto no número de parceiros (16

parceiros) como na intensidade desta parceria (participação na concepção técnica em

conjunto com a Embraer). Diferente do projeto ERJ-145, onde os parceiros de risco

contribuíram apenas financeiramente, na nova família de aeronaves, a seleção dos novos

parceiros teve como objetivo central a capacidade de agregação de valor tecnológico ao

projeto. Desta maneira, somente foram selecionadas como parceiras de risco, empresas

que possuíam uma posição consolidada na indústria aeronáutica mundial, como pode ser

visto na tabela 1.

Page 50: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

50

Figura 2.2 - Embraer – Parceiros de Risco do Projeto EMB-170/190

Fonte: Embraer.

Além dos fabricantes de estruturas e interiores, empresas produtoras de motores

aeronáuticos, aviônicos, trens de pouso, sistemas hidráulicos e elétricos também foram

selecionadas como parceiras da Embraer no novo projeto. Cabe destacar que três das

quatro parceiras de risco da família ERJ-145 se mantiveram no projeto EMB-170/190,

demonstrando que a transferência de tecnologia ocorrida no primeiro projeto permitiu

que estas se capacitassem no desenvolvimento de nova tecnologia.

Page 51: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

51

Neste novo modelo de cooperação com a Embraer, os parceiros de risco passaram

a ter obrigações financeiras e tecnológicas. Com relação ao financiamento do programa,

os parceiros tiveram de realizar um aporte para fazer parte do projeto, mas agora este

financiamento inclui não apenas recursos, mas também os materiais e equipamentos

utilizados no desenvolvimento do novo projeto. No caso do EMB-170/190 os parceiros

bancaram aproximadamente US$ 300 milhões, representando mais de 1/3 do total do

projeto, estimado em US$ 850 milhões. Ao todo foram construídos 4 modelos de

aeronaves (EMB 170, 175, 190 e 195), que foram lançados quase que simultaneamente,

com o objetivo de ocupar todas as faixas deste segmento de uma única vez.

Com relação ao desenvolvimento tecnológico, a Embraer não havia chegado às

especificações completas da aeronave, de forma que os fornecedores precisaram

desenvolvê-las em conjunto com a Embraer. Entretanto, não houve uma transferência de

tecnologia como no projeto anterior, aqui o que houve foi o desenvolvimento conjunto

coordenado e delineado pela Embraer. O corpo técnico dos fornecedores trabalhou em

conjunto e sob a supervisão da empresa brasileira, mais de 400 engenheiros dos

fornecedores trabalharam em conjunto, pelo período de aproximadamente um ano.

Existiam mais de 100 estações de trabalho para os fornecedores estrangeiros, todas

localizadas num mesmo prédio construído especificamente para isto18. Cabe destacar

que a interface da Embraer com seus diversos parceiros de risco no desenvolvimento

das novas aeronaves foi em muito facilitada pela existência do CRV – Centro de

Realidade Virtual, criado pela empresa brasileira19.

A transferência para os parceiros de risco da responsabilidade pela integração de

diversos sistemas, foi outra iniciativa que aprofundou a relação da Embraer com seus

parceiros. Esta estratégia reduziu de forma drástica o número de fornecedores que se

relacionava com a Embraer, enquanto na família ERJ-145 eram mais de 300 empresas,

no projeto EMB-170/190 apenas 22 fornecedores passaram a manter contato

diretamente com a empresa brasileira. A relação com os demais fornecedores passou a

ser feita pelas parceiras de risco, estabelecendo-se uma clara relação de hierarquia

dentro de sua cadeia de suprimentos.

18 A utilização do software CATIA, foi pré-requisito para todos os fornecedores exigido pela Embraer. Segundo Bernades (2000:22) este software permite a “realização do projeto em 3D, e eliminando a necessidade da construção do protótipo, uma vez que, ele reproduz virtualmente no computador as condições necessárias para a realização de quase todos os testes de ajustes para a finalização do produto”. 19 O software do CRV foi fornecido pela conceituada empresa norte-americana Silicon Grafics.

Page 52: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

52

Dado que a totalidade dos parceiros de risco do projeto EMB-170/190 é formado

por empresas estrangeiras, a Embraer implantou, em 2000, o Programa de Expansão da

Indústria Aeroespacial Brasileira – PEIAB, com o objetivo de ampliar o adensamento

da cadeia produtiva aeronáutica através do estimulo aos seus parceiros a se instalarem

no Brasil20. Este programa visava aumentar a agregação de valor realizada pela indústria

nacional, facilitando assim, a elaboração conjunta de projetos e a entrega de partes e

peças das aeronaves. Como resultado, diversos parceiros de risco instalaram unidades

produtivas no país: Aernnova21, Sobraer22, Latecoére, C&D Interiors, Parker Hannifin,

Pilkington Aerospace23 e a KAB - Kawasaki Aeronáutica do Brasil. Cabe esclarecer que

a maioria destas empresas não transferiu para o país todas as etapas produtivas, mas

apenas as etapas finais, trazendo produtos semi-acabados do exterior e realizando a

montagem final no Brasil.

Neste período também foi estabelecida a única fornecedora da qual a Embraer

possui participação, a ELEB – Embraer Liebherr Equipamentos do Brasil S.A., uma

joint venture entre a Embraer e o grupo suíço Liebherr, criada em 1999. Porém sua

história remonta ao ano de 1984, quando iniciou suas atividades de engenharia e

manufatura, na época como uma Divisão da Embraer – chamada EDE (Embraer Divisão

Equipamentos), concebida para fornecer os trens de pouso do caça AMX, aeronave

desenvolvida e produzida em conjunto com as empresas italianas Aermacchi e

Aeralitalia.

As demais empresas nacionais do setor aeronáutico se encontram na base da

pirâmide da cadeia produtiva, em geral, são pequenas empresas, com menos de 50

funcionários, altamente especializadas e com elevada capacidade tecnológica nas áreas

de serviços de engenharia, usinagem e tratamento de superfícies, que prestam serviços

para a Embraer e seus parceiros de risco.

20 Desde 2003, o BNDES tem apoiado e incentivado esta política de adensamento da cadeia produtiva da indústria aeronáutica. 21 A Aernnova é a antiga Gamesa Aeronáutica. 22 A Sobraer, criada em 2000, é uma subsidiária integral da Sonaca belga que está voltada para produção de componentes estruturais para os aviões da Embraer. Recentemente esta subsidiária brasileira também passou fornecer peças à Airbus, Sonaca e Latecoére. A Sobraer também controla outras duas empresas, criadas em 2004, a Sopeçaero (66% do capital) e a Pesola (33% do capital), A primeira subsidiária, Sopeçaero, voltada para produção de peças de alumínio e a Pesola, destinada à fabricação de peças usinadas. A Sopeçaero foi criada como parte da pauta de offsets, associado à compra pela FAB do novo avião presidencial. 23 A Pilkington, uma tradicional produtora de vidros para a construção civil e automotiva, instalou uma subsidiária para fornecedor os vidros blindados das janelas das aeronaves.

Page 53: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

53

Dada a baixa escala produtiva e a excessiva dependência da Embraer, em 2003, 15

destas subcontratadas da região de São José dos Campos formaram um consórcio

voltado para exportação denominado HTA - High Technology Aeronautics. Em 2004,

este consórcio, com o apoio da Agência de Promoção de Exportações do Brasil –

APEX, fechou o primeiro contrato de exportação para a EADS/CASA (Espanha), como

parte da pauta de offsets, associado à compra pela FAB de 12 aeronaves de transporte

militar CASA-295.

Apesar de vantajoso a criação deste consórcio não foi suficiente para superar as

deficiências de escala destas pequenas e médias empresas. Estas deficiências estão

sendo superadas nos últimos anos através de um processo de consolidação do setor, com

destaque para aquisição da Autômata Indústria de Pecas Ltda pelo grupo alemão

ThyssenKrupp24 e para criação da Graúna Aeroespace SA25, resultado da fusão de três

PMEs empresas nacionais. Cabe destacar Graúna Aerospace é a maior fornecedora de

capital nacional da Embraer e que recentemente também passou a fabricar peças de

turbinas para Pratt & Whitney Canadá.

24 Em 2005 a Autômata teve 80% do seu capital adquirido pela alemã ThyssenKrupp, passando a se chamar ThyssenKrupp Autômata Industria de Pecas Ltda. 25 Com sede em Caçapava/SP e filial em Botucatu/SP, a Grauna Aeroespace SA possui cerca de 600 funcionários, sendo especializada em usinagem de precisão. Criada em abril de 2005, esta firma é resultante da fusão de três pequenas empresas fundadas por ex-funcionários da Embraer: Grauna Usinagem, SPU Indústria e Comércio de Peças, e Bronzeana. Todas elas atuavam como fornecedoras da Embraer desde os anos 90.

Page 54: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

54

2.3.5. Parcerias de risco: conclusões

Observa-se que ao longo dos projetos houve um aprofundamento da

“terceirização” de suas atividades. Como visto, a Embraer já nasce como uma empresa

montadora, e no projeto ERJ-145, transfere parte destas atividades de montagem para

seus parceiros de risco. Na família EMB-170/190, esta relação se aprofunda e os

parceiros passaram a ser co-responsáveis pelo desenvolvimento, montagem e integração

de sistemas. Esta evolução pode ser visto na tabela 3.

Em suma, a Embraer transferiu boa parte do seu core business para seus parceiros

de risco implicando numa parcial perda de controle de suas atividades chaves,

particularmente no que se refere à montagem e integração de sistemas das aeronaves, de

acordo com a figura 2.3. Esta perda de controle de parte do core business gerou alguns

sérios problemas para a empresa:

a) Na fase de desenvolvimento, surgiram várias dificuldades de se gerenciar

o relacionamento com os diversos parceiros de risco e, principalmente, o

relacionamento destes com seus fornecedores. Segundo a Embraer, nem

todos os seus parceiros de risco estavam capacitados para realizar a

integração de sistemas, levando assim a diversos conflitos;

Page 55: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

55

b) Outra importante crise foi causada, pelos constantes atrasos nas entregas

das asas dos modelos EMB-190/195, produzidas no Brasil pela KAB -

Kawasaki Aeronáutica do Brasil, fazendo com que a Embraer assumisse as

atividades deste parceiro de risco26. Este exemplo mostra que o

rompimento de uma parceria de risco não é fácil nem rápido, implicando

em sérios prejuízos para a empresa, tanto no que se refere ao custo de

“aquisição” das atividades do parceiro, mas principalmente no atraso

provocado nas entregas das aeronaves27;

Figura 2.3 -Embraer – Evolução da relação com os Fornecedores

Fonte: Embraer.

c) Por fim, a transferência do core business para os parceiros de risco pode

possibilitar o surgimento de novos concorrentes a médio e longo prazo.

Algumas parceiras de risco podem vir a se tornar fabricantes de aeronaves,

ou então, transferir a tecnologia adquirida da Embraer para outros

fabricantes. Estas preocupações se concentram principalmente nos

26 Cabe esclarecer que a Kawasaki Heavy Industries continuará a fornecer outras peças para esses aviões, como a superfície de controle das asas e das portas do trem de pouso, com fornecimentos "a partir do Japão”. 27 Por conta dos atrasos na cadeia de suprimentos, a Embraer foi obrigada a reduzir sua meta de entregas para 2006. Ela foi reduzida de 145 unidades para 130. O impacto dessa redução fica claro nos resultados financeiros da empresa. Todas as leituras ficaram, em 2006, abaixo do registrado em 2005 (Valor Econômico, 2007).

Page 56: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

56

fornecedores de componentes estruturais, como partes da fuselagem, asas e

superfícies de controle.

Por outro lado, as parcerias de risco permitiram elevar a capacidade competitiva

da Embraer, graças a estes os custos foram reduzidos, pois passaram a ser repartidos

com os parceiros, além de obter uma maior agilidade, pois são diversas empresas

trabalhando no mesmo projeto ao mesmo tempo. Mais do que a redução do tempo e do

custo de desenvolvimento das novas aeronaves, as parcerias de risco permitiram a

sobrevivência da própria empresa. Foram estas parcerias que permitiram a decolagem

do projeto ERJ-145 e a rapidez necessária no lançamento da família EMB-170/190.

2.4. Recomendações para indústria naval

Em resumo, seria possível reproduzir elementos da reestruturação da cadeia

aeronáutica na recriação da indústria naval brasileira? Indícios positivos seriam:

• Desempenho da Embraer pós articulação com seus parceiros de risco é

um tremendo incentivo;

• É possível criar fornecedores locais (e com baixa escala) quase do zero;

• Articulação através do planejamento do principal ator da cadeia, no caso

a Embraer (Transpetro poderia exercer este comando?);

• Decisivo incentivo do setor público: exemplos: Aernnova e Sobraer,

apoiados pelos governos da Espanha e Bélgica, respectivamente.

Por outro lado, não faltam indícios negativos:

• Situação financeira dos estaleiros é, quase sempre, muito mais crítica do

que a da Embraer durante a reestruturação;

• Desconcentração patrimonial dificulta (inviabiliza?) reprodução do papel

catalisador/planejador da Embraer no desenvolvimento de fornecedores;

• Estaleiros não dominam projeto e demais etapas de P&D, grandes ativos

da Embraer na organização de seus parceiros de risco e demais

fornecedores;

Page 57: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

57

• Baixa escala e descontinuidade da demanda: só mercado interno talvez

não seja suficiente para articular a cadeia, Embraer contou com mercado

externo.

De qualquer forma, a indústria naval apresenta características estruturais próximas

ao da sua congênere aeronáutica pelo fato de ambas atuarem na produção de material de

transporte sob encomenda. Ao longo das últimas décadas estas duas indústrias passaram

por reestruturações produtivas que aprofundaram as semelhanças no padrão de

concorrência:

• Customização dos produtos: empresas destas duas indústrias passaram a

oferecer modelos básicos que podem ser customizados de acordo com as

necessidades dos clientes;

• Globalização: empresas destas duas indústrias buscam atuar de maneira

global, mas em segmentos de mercado específicos;

• Escalas Crescentes: busca de maiores ganhos de escala para se contrapor aos

crescentes custos de desenvolvimento de novos produtos e os prazos de

entrega cada vez menores;

• Dinamismo Estrutural: amplo processo de concentração patrimonial (fusões,

aquisições e falências), além do surgimento de novos atores globais com

estratégias inovadoras, como a coreana Hyundai, na indústria naval;

• Especialização: as empresas destes dois segmentos têm se tornado grandes

sistematizadoras, concentrando seus esforços nas atividades de projeto,

montagem e comercialização dos seus produtos, demandando um amplo

conjunto de empresas fornecedoras.

Dada a elevada proximidade estrutural que existe entre as duas indústrias,

algumas estratégias de mercado vitoriosas poderiam ser copiadas e adaptadas por

empresas da outra indústria. No caso específico da indústria aeronáutica brasileira,

verificou-se que a Embraer adotou uma bem sucedida estratégia de parceria de risco

junto aos seus fornecedores estratégicos, permitindo que ela reduzisse os custos de

desenvolvimento e produção, além de diminuir os prazos de lançamento dos novos

produtos. Como concluído anteriormente, as parcerias de risco permitiram elevar a

capacidade competitiva, tanto da Embraer individualmente, como da indústria

aeronáutica brasileira como um todo.

Page 58: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

58

A adoção da estratégia de parcerias de risco pela indústria naval brasileira

poderia permitir uma ampliação da capacidade competitiva dos estaleiros

nacionais. A grande diferença é que no caso da indústria aeronáutica, a estratégia de

parcerias de risco foi adotada por uma empresa consolidada, com 25 anos de atividade e

que já atuava de maneira destacada no mercado doméstico e internacional. Como visto,

a Embraer possuía tecnologia de projeto e produção, e num momento de crise buscou

empresas que dividissem os riscos “financeiros” do novo projeto. Somente num

segundo momento os parceiros foram convidados a participar do desenvolvimento de

novos produtos. No caso da indústria naval brasileira, a situação é bastante diferente,

pois esta ainda busca se consolidar a partir das recentes encomendas realizadas pela

Transpetro. Uma parte dos estaleiros envolvidos no PROMEF está sendo reconstruída

neste momento, restando muito pouco da capacidade produtiva e tecnológica dos anos

70, quando esta indústria atingiu seu auge no Brasil.

A constatação de que, no Brasil, estas duas indústrias se encontram em fases de

evolução tão diferenciadas, não significa recomendar que a indústria naval teria que

seguir exatamente as mesmas etapas da indústria aeronáutica para que daqui a 25 anos

pudesse adotar a estratégia de parcerias de risco. Entretanto, para que esta estratégia

pudesse ser copiada, adaptada e implementada com sucesso pela indústria naval

brasileira, esta teria de ser acompanhada por um conjunto de medidas:

• Apoio do Estado: financiamento as empresas (estaleiros e fornecedores) e as

atividades de P&D e, também através de poder de compra, como as da

Transpetro e da Marinha de Guerra;

• Seleção de empresas: as encomendas devem estar concentradas em poucas

empresas, de forma que estas tenham uma escala mínima de produção para

desenvolverem tecnologia e enfrentarem a concorrência internacional;

• Escolha dos segmentos e nichos de mercado: definição de quais segmentos

de mercado os estaleiros brasileiros poderão atuar de forma competitiva,

baseando-se nas demandas locais e na estrutura competitiva do mercado

internacional;

• Desenvolvimento tecnológico: deve se buscar o desenvolvimento das

tecnologias-chaves para que os estaleiros possam construir vantagens

competitivas de forma cumulativa;

Page 59: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

59

• Atuação global: as estratégias dos estaleiros devem estar voltadas

inicialmente para o mercado interno, mas visando adquirir competência para

posteriormente se tornarem Global Players;

• Baixa verticalização: desde o início de suas atividades os estaleiros devem

ser constituídos como empresas pouco verticalizadas, se valendo da

repartição das responsabilidades produtivas com fornecedores selecionados.

A adoção destas estratégias de políticas públicas permitiria a constituição de

estaleiros competitivos, de forma que a implementação das parcerias de risco junto aos

seus fornecedores estratégicos seria mais um elemento na construção de vantagens

competitivas destas empresas. Em suma, a adoção de estratégias baseadas nas parcerias

de risco seria importante, mas não o suficiente para a constituição de estaleiros

competitivos, como mostra o exemplo da indústria aeronáutica brasileira.

Page 60: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

60

3.Cadeia de suprimentos na indústria automobilística brasileira

3.1 Breve histórico: dos anos 50 à crise dos anos 80

A indústria automobilística sempre esteve associada ao desenvolvimento

industrial brasileiro. Ícone da industrialização por substituição de importação a partir

dos anos 50, capitaneou a instalação no Brasil da indústria de bens de consumo durável

e, desde então, vem sendo um dos atores mais dinâmicos de todo o complexo metal-

mecânico no país. A instalação desta cadeia produtiva explicita a própria configuração

da industrialização tripartite realizada no país. Por um lado, o Estado provedor da infra-

estrutura necessária (estradas de rodagem, energia), dos insumos básicos (empresas

estatais siderúrgicas) e formulador de política econômica promotora da indústria

nascente. De outro, empresas européias e estadunidenses que, motivadas pela

necessidade de ampliar espaço de acumulação no pós-guerra, internacionalizam a

produção de veículos em direção de mercados potencialmente atraentes e protegidos por

políticas protecionistas. Por fim, o empresariado de capital nacional que assume funções

de apoio à montagem de veículos, ao adensar paulatinamente produção de autopeças.

Entre o final dos anos 50 e a segunda metade dos anos 70 a produção doméstica

anual de automóveis cresceu mais 600 vezes, de forma concentrada no ABC paulista e

capitaneado pelas três maiores montadoras estrangeiras, GM, Ford e Volkswagen (ver

Gráfico 3.1) . Tais empresas produziam veículos com alto conteúdo nacional e com

elevado grau de verticalização, em plantas com escalas elevadas, mas de produtividade

estagnada. Além disto, as filiais aqui operavam de forma desarticulada (“stand alone”)

com o restante da corporação, em especial em relação às matrizes. Esta desarticulação

contribuiu para uma crescente defasagem tecnológica e mercadológica (em especial

design) em relação aos países de origem das montadoras.

Page 61: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

61

Gráfico 3.1 – Brasil: produção de automóveis e autoveículos*, 1957-2006 (em unidades)

1.165.174

2.611.034

0

500.000

1.000.000

1.500.000

2.000.000

2.500.000

3.000.00019

57

1959

1961

1963

1965

1967

1969

1971

1973

1975

1977

1979

1981

1983

1985

1987

1989

1991

1993

1995

1997

1999

2001

2003

2005

Automóveis Autoveículos

*Automóveis, comerciais leves, caminhões e ônibus

Fonte: ANFAVEA (2007)

Em 1976, com a inauguração da fábrica da Fiat em Betim-MG inicia-se uma nova

fase, caracterizada pela descentralização regional da produção final e também de

fornecedores de autopeças. No entanto, não ocorreram mudanças significativas no

modus operandi da indústria, ainda dependente de projetos importados, produzindo de

forma verticalizada, com baixa produtividade e com defasagem tecnológica crescente

em relação às matrizes. O mercado doméstico protegido era o destino quase que

exclusivo da produção: entre 1970 e 1989 foram exportados pouco mais de 2,7 milhões

de veículos, ou 15,4% da produção acumulada neste período (Gráfico 3.2).

Page 62: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

62

Gráfico 3.2 – Brasil: exportação de autoveículos*, 1970-2006 (em unidades)

842.812

0

100.000

200.000

300.000

400.000

500.000

600.000

700.000

800.000

900.000

1.000.00019

70

1972

1974

1976

1978

1980

1982

1984

1986

1988

1990

1992

1994

1996

1998

2000

2002

2004

2006

Automóveis Autoveículos

*Automóveis, comerciais leves, caminhões e ônibus

Fonte: ANFAVEA (2007)

Por sua vez, o setor de autopeças sempre esteve subordinado de forma

heterogênea às empresas montadoras. Sempre coexistiram grandes empresas de capital

nacional e estrangeiro (estas foram atraídas pelo investimento direto de seus clientes na

Europa ou EUA), além de pequenas e médias empresas de capital nacional, que

orbitavam em torno das montadoras no ABC paulista. As plantas montadoras se

relacionavam com até 500 fornecedores diretos o que permitiu a sobrevivência e o

crescimento de diversas empresas de autopeças, com grande dispersão de escalas e

capacidade competitiva. Durante os anos 80 a indústria brasileira de autopeças

empregava em torno de 260 mil empregados (com relativamente baixa produtividade) e

faturava cerca de US$ 7 bilhões ao ano, ou cerca de três vezes menos que o segmento de

montagem.

De qualquer forma, o desempenho segmento de autopeças permitia afirmar que a

cadeia automobilística brasileira era bastante densa, compondo um tecido industrial

complexo que, por sua vez, contribui fortemente para o desenvolvimento de outros

ramos da metal-mecânica no país, a montante e a jusante da cadeia. Num contexto de

baixa concorrência externa e crescimento do mercado doméstico (anos 70) a cadeia

automobilística brasileira contribuía fortemente para a geração de emprego e renda no

estado de São Paulo e no Brasil e assumia a liderança da dinâmica industrial do país.

Page 63: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

63

Os anos 80 mudaram este quadro. A excessiva dependência do mercado

doméstico acabou por implicar na estagnação da indústria automobilística no Brasil

durante a chamada “década perdida”. A contração do crédito interno e externo, a

desaceleração do crescimento e a hiperinflação contribuíram para a estagnação da

indústria automobilística, explicitada pela queda da produção (Gráfico 3.1) e do

faturamento líquido do setor (Gráfico 3.3). Isto é, a crise da economia brasileira

significou também a estagnação da indústria de autoveículos que, com o conseqüente

encolhimento dos investimentos, ampliou sua defasagem competitiva (em termos de

preço, design e desempenho técnico) em relação às matrizes e às outras filiais das

corporações aqui instaladas.

Gráfico 3.3 – Brasil: faturamento líquido real e empregados no setor de autoveículos*, 1966-

2006 (em US$ milhões constantes de 2006 e unidades)

0

20.000

40.000

60.000

80.000

100.000

120.000

140.000

160.000

0

5.000

10.000

15.000

20.000

25.000

30.000

35.000

40.000

1966

1968

1970

1972

1974

1976

1978

1980

1982

1984

1986

1988

1990

1992

1994

1996

1998

2000

2002

2004

2006

Empr

ego

(em

uni

dade

s)

Fatu

ram

ento

Real

(US$

milh

ões d

e 20

06)

Faturamento Real Emprego

*Automóveis, comerciais leves, caminhões e ônibus

Fonte: ANFAVEA (2007)

Em resumo, ao final dos anos 80, a indústria automobilística brasileira poderia ser

caracterizada:

• Pelo comando da cadeia por montadoras de capital transnacional desarticuladas em relação a outras unidades da corporação;

• Pela relativa concentração regional da produção;

Page 64: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

64

• Pela produção com alto conteúdo nacional, excessivamente verticalizada (mas com elevado número de fornecedores diretos) e realizada em unidades de grande escala, mas com baixa produtividade;

• Pela defasagem tecnológica e pela baixa capacidade de inovação e;

• Pela estagnação de um mercado pouco internacionalizado (baixas exportações e menores ainda importações).

É neste contexto de crise e estagnação que a liberalização comercial iniciada em

1990 impõe forte necessidade de reestruturação da cadeia automobilística no Brasil.

3.2 A reestruturação dos anos 90 e seus efeitos

A liberalização comercial da cadeia automobilística deu início a uma profunda

reestruturação da cadeia. Rapidamente, as filiais das montadoras estrangeiras

responderam ao acirramento da concorrência com investimentos em modernização das

plantas e na linha de produtos, procurando estreitar a então defasagem tecnológica e

mercadológica em relação às suas matrizes. Desnecessário afirmar que, ao contrário das

práticas efetivadas entre os anos 50 e 80, aprofundou-se o grau de integração entre as

matrizes e outras filiais da corporação. As práticas do tipo “stand alone” deram espaço a

uma integração complexa que, limitou autonomia das filiais, mas as aproximaram do

estado-da-arte dos produtos comercializados nos mercados centrais. No caso da

indústria automobilística difundiu-se o conceito de linha global de produtos, com

produção fracionada por filiais altamente especializadas (e com custos ou outras

vantagens competitivas em relação ao restante das plantas mundiais da corporação),

inclusive componentes estratégicos do power train. O movimento resultou em

especializações regionais, cujos mercados são complementados por produtos produzidos

em outras filiais, o que, por sua vez, contribui para o aumento generalizado dos fluxos

de comércio exterior intra-setorial e intra-firma.

Além disto, tais empresas empreenderam mudanças intensas na gestão da

produção e da cadeia de suprimentos, com franca desverticalização, contração de

fornecedores diretos e forte aumento do conteúdo importado. O outsourcing e o global

sourcing empreendidos permitiram que fossem reduzidos custos ao mesmo tempo em

que se ampliava a qualidade técnica dos veículos, que passaram a incorporar, através

destes componentes importados, atributos de desempenho no estado-da-arte mundial.

Page 65: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

65

De fato, enquanto a produção nacional de veículos cresceu a uma taxa de 3,4% ao ano

entre 1989-2006, as importações de autopeças foram incrementadas a uma taxa média

anual de 14,2% no mesmo período (ver Gráfico 3.4 abaixo)

Gráfico 3.4 – Brasil: produção de autoveículos e importação de autopeças, 1989-2006 (em

índices, 1989=100)

0

200

400

600

800

1.000

1.200

1989

1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

Indí

ces,

1989

=100

Importações de Autopeças Produção de Autoveículos

Fonte: elaboração NEIT-IE-UNICAMP a partir de ANFAVEA (2007) e SINDIPEÇAS (2007)

Vale ressaltar que a significativa apreciação cambial, vigente entre 1993 e 1998, e

a liberalização comercial mais profunda para bens de capital e partes e componentes,

favoreceu este processo de modernização de maquinário, da gestão da produção e do

produto final (agora bem menos defasado em relação aos padrões mundiais de

desempenho e design). E mais, permitiu que as montadoras incrementassem seu

desempenho num ambiente mais competitivo do que nos anos 80, ainda que

relativamente protegido28.

Por outro lado, a estabilização monetária e o crescimento da demanda a partir de

1994 permitiram que houvesse um boom de novos investimentos que foram além da

modernização: permitiram forte ampliação da capacidade produtiva local, tanto pelas

28 O Regime Automotivo, conjunto de leis que envolvem a importação de veículos e peças e componentes, tem implicado na provavelmente maior proteção efetiva da indústria brasileira. De fato, as tarifas de importação de peças, componentes e bens de capital são menores que as tarifas de para veículos, que figuram dentre as mais altas dos produtos manufaturados. Além disto, montadoras aqui instaladas se valem de tarifas menores (o que favorece a complementação do mix de produtos com a importação de veículos de maior valor agregado) do que aquelas praticadas por empresas que não têm plantas produtivas no Brasil e poderiam acirrar a concorrência nestes segmentos de maior sofisticação.

Page 66: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

66

montadoras já instaladas, quanto pela incorporação de todos os outros players mundiais

que ainda não participavam do mercado nacional (Peugeot-Citroen, Crhysler, Renault,

Toyota, Honda, entre outras). Entre 1994 e 2001 foram investidos cerca de US$ 15

bilhões, ou quase 3 vezes mais do que tudo que foi imobilizado ao longo dos anos 80

(Gráfico 3.5).

Gráfico 3.5 – Brasil: investimentos do setor de autoveículos*, 1980-2006 (em US$ milhões

constantes de 2006)

2.359

1.750

0

500

1.000

1.500

2.000

2.500

1980

1981

1982

1983

1984

1985

1986

1987

1988

1989

1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

*Automóveis, comerciais leves, caminhões e ônibus

Fonte: ANFAVEA (2007)

Os novos investimentos implementaram plantas produtivas de menor escala

relativa: apenas duas das maiores novas plantas (VW no PR e Ford na BA) têm

capacidade para cerca de 250 mil veículos/ano, que já é cerca de metade da capacidade

das plantas do ABC. A maior parte das outras novas plantas opera com capacidades

inferiores a 100 mil veículos/ano. De qualquer forma, todas as plantas têm maior nível

de automação e operam com menor quantidade de mão de obra. E mais, ao se

aproveitarem de uma miríade de agressivos incentivos fiscais nacionais, estaduais e

municipais, as empresas promoveram a descentralização da produção em direção a

regiões com ou sem uma estrutura industrial densa (ver Quadro 3.1).

Page 67: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

67

Mais importante, os novos investimentos formataram uma especialização nacional

em carros de menor volume e baixa cilindrada29. A demanda reprimida por veículos

encontrou campo fértil nestes carros ditos “populares”, que vêm liderando, por larga

margem, o mercado nacional de automóveis. Além de permitir a expansão de produção

que assim encontrava um mercado em expansão, esta especialização serviu também

como uma defesa natural em relação à concorrência externa, uma vez que poucos eram

os produtores estrangeiros capazes de produzir competitivamente (em função de

economias de escala) e ameaçar com importações o mercado brasileiro.

Quadro 3.1 – Brasil: investimentos selecionados no setor de autoveículos, 1996-2001

Empresa Produto Localização Data

Chrysler Comerciais leves Campo Largo-PR 1998*

DaimlerChrysler Automóveis Juiz de Fora-MG 1999

Fiat Automóveis Betim-MG 2000

Ford Automóveis e commerciais leves Camaçari-BA 2001

General Motors Componentes Mogi das Cruzes SP 1999

General Motors Automóveis Gravataí-RS 2000

Honda Automóveis Sumaré-SP 1997

International Caminhões Caxias do Sul-RS 1998

Iveco Motores Sete Lagoas-MG 2000

Iveco Fiat *** Comerciais leves, caminhões e ônibus Sete Lagoas-MG 2000

Mitsubishi Comerciais leves (licenciamento MMC Motores) Catalão-GO 1998

Nissan Comerciais leves (em conjunto com Renault ) São José dos Pinhais-PR 2001

Peugeot Citroën Automóveis e motores Porto Real-RJ 2001

Renault Automóveis e motores São José dos Pinhais-PR 1998

Toyota Automóveis Indaiatuba-SP 1998

Volkswagen Motores São Carlos-SP 1996

Volkswagen Caminhões e ônibus Resende-RJ 1996

Volkswagen Audi Automóveis São José dos Pinhais-PR 1999

Volvo Ampliações do Complexo Industrial Curitiba-PR 1997, 1999 e 2000

*Desativada em 2001 Fonte: NEIT (2002)

Além disto, os novos investimentos aprofundaram as modificações na gestão da

produção e controle da cadeia de suprimentos, inclusive com inovações produtivas

paradigmáticas, com destaque para as fábricas da GM em Gravataí-RS, da Volkswagen

em Resende-RJ e da Ford em Camaçari-BA. Em todas elas implementou-se consórcios

modulares de produção, com crescente importância, inclusive na linha de montagem

29 A legislação nacional do início dos anos 90 reduziu a cobrança de impostos, majoritariamente, IPI, para veículos com motorização de até 1000cc também cumpriu papel fundamental nesta especialização, assim como a barreira natural

Page 68: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

68

final, de empresas fornecedoras e integradoras de sistemas e módulos completos

(“sistemistas” ou 1st tiers). Estes parceiros privilegiados (em geral, grandes empresas

transnacionais de autopeças, com histórico de parceria de longo prazo com as

montadoras) ganham importância não apenas na montagem final, mas também no

comando da cadeia (controlando hierarquicamente fornecedores indiretos de segundo,

terceiro e quarto níveis) e até no desenvolvimento conjunto de projetos.

BOX: o caso da Ford em Camaçari-BA

A reestruturação da indústria automobilística brasileira teve na Ford um protagonista singular. Emergindo dos fatídicos anos 80 em que inclusive rendeu o controle de suas operações para a Volkswagen numa improvável joint-venture (Autolatina, 1987-94), perdeu espaço no mercado brasileiro, tendo atingindo em 1996 um share de 6,8% da produção de automóveis (8,2% em autoveículos, dada a força de sua divisão de veículos comerciais) no Brasil. O faturamento nominal de 1995, de R$ 3,8 bilhões, foi superior ao de 2000, que atingiu pouco mais de R$ 3 bilhões (ver Quadro 2 abaixo). O mau desempenho podia ser atribuído a erros estratégicos durante os anos 90, a saber:

a) a aventura da Autolatina, cujo maior resultado foi dotar a VW de know-how para a produção de caminhões e ônibus;

b) o atraso no desenvolvimento de carro adequado para a nova realidade do mercado (baixa motorização);

c) a aposta no aumento da importação de veículos para suprir mercado doméstico: no momento da desvalorização do rela em 1999, a Ford era a única das grandes que ainda dependia de importações em larga escala o que, ademais, já vinha ocasionando fortes constrangimentos logísticos e problemas com entregas para consumidores;

d) o atraso na reconfiguração da produção em bases modernizadas (inclusive relação com fornecedores), perdendo assim competitividade em relação aos demais rivais.

Grosso modo, a estratégia que recuperou a Ford no Brasil e elevou o status da filial na rede corporativa pretendeu alterar radicalmente o perfil da empresa no país. Dois investimentos foram os principais indutores desta recuperação.

i) o desenvolvimento de projeto de engenharia que agregasse valor a uma linha de produto decadente (primeira geração do Fiesta): nasceu assim o Novo Fiesta e, principalmente, o EcoSport, um utilitário leve cujo design e funcionalidade tiveram grande aceitação no mercado nacional (impulsionando a Ford para um share de quase 1/3 da produção de comerciais leves) e internacional (15,5% das exportações do setor);

ii) a construção de uma nova planta em consórcio modular, fora do eixo do sul-sudeste e, beneficiária de agressivo incentivo tributário para comandar a produção desta nova família de produtos.

O Complexo Industrial Ford Nordeste teve investimentos de US$ 1,9 bilhões, sendo que US$ 700 milhões foram investidos por 25 fornecedores sistemistas e 1st tier, que assumem etapas da montagem final, compartilhando assim a própria linha de produção da Ford. O uso deste consórcio modular, ainda que atrasado em relação aos investimentos brasileiros da VW (Resende-RJ) e da GM (Gravataí-RS), é o primeiro realizado pela Ford no mundo inteiro. É também uma das mais automatizadas plantas do Brasil e da própria corporação mundial, com mais de 500 robôs operando a linha de montagem. Apesar disto, o complexo emprega mais de 8,5 mil empregados, cerca de 56% pertencentes aos sistemistas. Segundo a empresa, a linha de montagem tem alto

Page 69: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

69

conteúdo nacional, o que também se configura num diferencial (ao menos para a densidade produtiva do Brasil).

Os resultados deste esforço são evidentes. O faturamento nominal quase dobrou entre 2000 e 2006, atingindo R$ 5,7 bilhões neste ano*. Mesmo resultado para a produção: entre 1996 e 2006 a produção de autoveículos multiplicou-se por 2, o que resultou num aumento de share total de 8,2% para 12,3%. Domesticamente, a Ford acrescentou outros 3 pontos percentuais de share de mercado, com destaque para a liderança no segmento de veículos comerciais leves (categoria do EcoSport, com quase 1/3 do mercado em 2006). Além disto, a filial ampliou sua participação no total de vendas da Ford mundial de 2,1% em 1996 para mais de 5% em 2006**, tendo auferido lucros por 14 trimestres consecutivos, muito ao contrário da matriz***. Reestruturação a partir de projeto novo, desenvolvido no Brasil, com conteúdo nacional e produção em nova planta moderna e localizada no Nordeste. E com resultado final exitoso para a empresa, para consumidores e para a economia regional. Como será discutido adiante, o caso da Ford em Camaçari lembra em muito a proposta do estaleiro Atlântico Sul. Seria uma lição a ser seguida?

Ford Brasil: desempenho em variáveis selecionadas 1996 e 2006

Produção Em unidades Share (%)

1996 2006 Δ% 1996 2006 Δ%

Automóveis 99.574 176.521 77,3 6,8 8,4 23,6

Comerciais Leves 37.747 122.334 224,1 13,5 32,3 139,0

Comerciais 10.415 21269 104,2 15,8 7,4 -12,5

Total 147.736 320.124 116,7 8,2 12,3 49,7

Vendas Domésticas Em unidades Share (%)

1996 2006 �% 1996 2006 �%

Automóveis 85.000 141.475 66,4 6,8 9,1 33,3

Comerciais Leves 29.414 64.319 118,7 14,2 23,3 64,8

Comerciais 8.261 14671 77,6 15,5 15,3 -1,5

Total 122.675 220.465 79,7 8,1 11,4 40,5

Exportações Em unidades Share (%)

1996 2006 �% 1996 2006 �%

Automóveis 14.215 58.359 310,5 6,7 9,2 36,6

Comerciais Leves 8.003 65.116 713,6 11,3 42,6 277,9

Comerciais 3.007 7188 139,0 35,2 13,3 -62,3

Total 25.225 130.663 418,0 8,5 15,5 82,1

Fonte: elaboração NEIT-IE-UNICAMP a partir de Anfavea (1996 e 2006)

* Exame Maiores e Melhores (vários números)

** Anfavea e Ford Corporation Annual Report 2006

*** Entrevista com CEO da Ford South America: Valor Econômico, 11/10/2007

Page 70: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

70

Como foi observado na Seção 1 acima, a redução de fornecedores diretos e a

adoção destas práticas de gestão da cadeia de suprimentos foram generalizadas na

indústria automobilística mundial, mas intensificadas de forma radical nos novos

investimentos realizados no Brasil. Por exemplo, o caso da fábrica de caminhões da

Volkswagen em Resende é considerado o experimento mundial mais profundo de

repartição da produção entre a montadora e seus poucos fornecedores de módulos

completos. Neste caso, pode-se caracterizar o empreendimento como um verdadeiro

“condomínio industrial”, liderado pela montadora alemã, mas conduzido por reduzido

número de sistemistas que dividem a linha de montagem. Outro caso interessante (ver

Box para aprofundamento) é a nova fábrica da Ford na Bahia, onde 27 fornecedores

diretos foram responsáveis por mais de 1/3 do investimento do complexo e hoje

representam quase metade da mão de obra no local.

Em suma, a reestruturação da indústria automobilística, conduzida pelas principais

montadoras estrangeiras já instaladas e pelas newcomers, promoveu uma modernização

produtiva e gerencial em que a reorganização da cadeia de suprimentos cumpriu

importante papel. Desverticalização da produção, redução do número de fornecedores

diretos e controle de uma cadeia hierarquizada, introdução de consórcios modulares em

novas plantas (de menor escala, mas mais automatizadas) e aumento do conteúdo

importado foram algumas das estratégias que pretenderam reduzir custos, aumentar

produtividade (e receitas e lucros) e reduzir defasagem de desempenho tecnológico e de

design dos produtos finais.

Os resultados alcançados foram heterogêneos na cadeia produtiva. Por um lado, as

montadoras lograram atingir seus objetivos, com grande reflexo positivo para a

competitividade do setor automobilístico brasileiro. De fato, houve aumento do

faturamento (Gráfico 3.3 acima), da produção (Gráfico 3.6), das vendas (Gráfico 3.7),

da produtividade (Gráfico 3.8).

Page 71: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

71

Gráfico 3.6 – Brasil: produção e emprego no setor de autoveículos*, 1989-2006 (em unidades)

0

500.000

1.000.000

1.500.000

2.000.000

2.500.000

3.000.000

0

20.000

40.000

60.000

80.000

100.000

120.000

140.000

1989

1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

Prod

ução

Empr

egos

Produção Emprego

*Automóveis, comerciais leves, caminhões e ônibus

Fonte: ANFAVEA (2007)

Gráfico 3.7 – Brasil: vendas domésticas e exportações de autoveículos*, 1989-2006 (em

unidades)

0

100.000

200.000

300.000

400.000

500.000

600.000

700.000

800.000

900.000

1.000.000

0

200.000

400.000

600.000

800.000

1.000.000

1.200.000

1.400.000

1.600.000

1.800.000

2.000.000

1989

1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

Expo

rtaç

ões

Vend

as d

omés

ticas

Exportações Vendas domésticas

*Automóveis, comerciais leves, caminhões e ônibus

Fonte: ANFAVEA (2007)

Page 72: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

72

Gráfico 3.8 – Brasil: produtividade física do trabalho no setor de autoveículos*, 1989-2006 (em

unidades de produto por empregado e US$ constantes por empregado)

0

50.000

100.000

150.000

200.000

250.000

300.000

350.000

400.000

450.000

0

5

10

15

20

25

30

1966

1968

1970

1972

1974

1976

1978

1980

1982

1984

1986

1988

1990

1992

1994

1996

1998

2000

2002

2004

2006

Fatu

ram

ento

/em

preg

ado

(US$

reais

/em

preg

ado)

Prod

uto/

empr

egad

o (u

nida

des)

Unidades de produto / empregdo Faturamento / Empregado

*Automóveis, comerciais leves, caminhões e ônibus

Fonte: elaboração NEIT-IE-UNICAMP a partir de ANFAVEA (2007)

No entanto, o segmento de autopeças foi bastante penalizado: o aumento do

conteúdo importado e o maior poder de barganha exercido pelos players a jusante

(montadoras e sistemistas) promoveu o esvaziamento da cadeia produtiva, com a

desmobilização industrial e desnacionalização de empresas de autopeças. Além disto, o

nível geral de emprego caiu fortemente: entre 1989 e 2004 foram eliminados 50 mil

empregos diretos apenas nos segmentos de montagem de autoveículos e produção de

autopeças e incontáveis empregos indiretos em demais segmentos da metal-mecânica,

serviços e outros.

Em suma, a reestruturação permitiu o aumento da competitividade da cadeia, além

de permitir o catch-up tecnológico e mercadológico em relação aos mercados centrais.

Foram beneficiados neste processo os consumidores que puderam ter acesso a produtos

melhores e as montadoras que, a despeito da grande ociosidade com que operaram de

2001 a 2005, aumentaram fortemente seu faturamento e lucratividade, muitas vezes na

contramão do desempenho de suas matrizes corporativas. Por outro lado, a cadeia

deixou de liderar a dinâmica produtiva brasileira, com diminuição significativa de seu

efeito multiplicador da renda e de empregos diretos e indiretos. Além disto, esta posição

exitosa das filiais de grandes corporações automotivas é etérea. Desde 2005 as matrizes

Page 73: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

73

de GM, Ford, Fiat e Volkswagen, apenas para ficar no caso das 4 grandes do Brasil,

passam por forte crise, com resultados financeiros alarmantes que, por sua vez têm

imposto tomada de decisões estratégicas radicais, como fechamento de plantas, spin off

de operações, fusões e aquisições mal sucedidas, etc.

Ou seja, num contexto de crise das corporações estadunidenses e européias (as

grandes players no Brasil), acirramento da concorrência e crescimento das montadoras

asiáticas (inclusive chinesas, todas com baixa participação produtiva no Brasil), o atual

posicionamento das filiais na rede das corporações está em risco permanente,

ameaçando, portanto, mesmo os aspectos positivos da reestruturação.

Por fim, cabe perguntar até que ponto é possível afirmar que esta reestruturação

teve efeitos líquidos positivos ou negativos sobre a economia brasileira? E mais

importante, quais seriam as lições que todo este processo de renovação e incremento de

competitividade poderiam ser aproveitadas pela indústria de construção naval brasileira

que agora inicia justamente seu processo de reconstrução? É o que será discutido a

seguir.

3.3 Conclusões: lições para a construção naval

A partir da discussão anterior, é pertinente questionar: até que ponto é possível

reproduzir elementos da reestruturação da cadeia automobilística na recriação da

indústria naval brasileira?

Para responder a esta questão deve-se, inicialmente, apontar indícios positivos,

elementos que estimulariam a adoção de práticas semelhantes de reestruturação de

cadeia produtiva.

Em primeiro lugar, deve-se lembrar que há fortes ganhos de competitividade no

segmento de montagem quando ocorre a adoção de práticas como a redução do número

de fornecedores, o aumento do conteúdo importado, e o fornecimento através de

módulos e sistemas, por exemplo. Ou seja, há um forte incentivo para que estaleiros

exerçam comando da cadeia e alterem a organização da produção de forma semelhante

ao da produção de automóveis.

Page 74: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

74

Em segundo lugar, a experiência da reestruturação da cadeia automobilística

demonstrou que novos investimentos que descentralizaram a produção favoreceram a

ruptura com práticas do passado e, além disto, permitiram intensificar a adoção de

práticas mais eficientes de gestão da produção e da cadeia de suprimentos. E mais,

permitiram atualizar o parque fabril, imobilizando ativos na fronteira tecnológica. O

caso da Ford em Camaçari é sintomático nesta direção: rompeu com o atraso em adotar

tais práticas ao introduzir um modelo radical de desvetrticalização e modularização fora

do eixo tradicional de produção. É impossível não traçar paralelo com a experiência em

curso do estaleiro Atlântico Sul em Suape. Também provoca ruptura com o passado

ineficiente (em especial no controle de capital, com newcomers) e posiciona os ativos

no estado-da-arte da capacidade (dique e içamento) e da gestão da produção (em

especial, layout).

Finalmente, é preciso reconhecer que a especialização da indústria automobilística

nacional em um claro nicho de mercado (veículos menores, de baixa motorização)

permitiu ampliar economias de escala e garantir competitividade tanto no mercado

doméstico em expansão, quanto no mercado externo para países com características

semelhantes (nível de renda, demanda potencial). O êxito nesta estratégia foi

transmitido por toda a cadeia, uma vez que o aumento da escala de produção de veículos

num contexto de intensificação da importância dos fornecedores fortaleceu não apenas

as montadoras, mas também as empresas de autopeças. Firmas que, além disto, foram

beneficiadas com a criação de mercados de reposição nos países que incrementaram

suas importações de carros brasileiros (Gráfico 3.9).

Page 75: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

75

Gráfico 3.9 – Brasil: exportações de autopeças e autoveículos, 1980-2007 (índices, 1980=100)

0

200

400

600

800

1000

1200

1400

1600

1800

2000

1980

1981

1982

1983

1984

1985

1986

1987

1988

1989

1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

Índi

ces,

1980

=100

Autopeças Autoveículos

Fonte: elaboração NEIT-IE-UNICAMP a partir de ANFAVEA (2006) e Sindipeças (2006)

Por outro lado, há fortes indícios que estes incentivos e elementos indutores desta

reestruturação teriam grande dificuldades em ser em absorvidos pela indústria nacional

de construção naval. De fato, os estaleiros atualmente em processo de reconstrução têm

baixo poder de barganha e ainda não estariam preparados tecnicamente para exercer o

binômio controle/cooperação com fornecedores 1st tier.

No mesmo sentido agiria a demanda radicalmente intermitente dos últimos anos

que desarticulou o setor de navipeças. Esta desarticulação, associada à grande

heterogeneidade de competitividade, de tamanho e de interesse pelo setor naval por

parte de efetivos e potenciais fornecedores de navipeças, tornam o desafio de

reorganizar a cadeia algo improvável de ser vencido na próxima década.

De fato, a baixa escala e a descontinuidade da demanda acrescentam novos

desafios: parece igualmente improvável ser possível mobilizar sistemistas estrangeiros

para deslocarem produção para o Brasil: Neste mesmo sentido, a baixa atratividade da

construção naval de longo curso impõe significativas dificuldades para converter

empresas bem sucedidas da metal-mecânica em fornecedores da indústria naval e,

assim, desenvolver fornecedores 1st tier no Brasil. Não por falta de competência técnica

ou competitividade, mas por estrita falta de interesse, dada a baixa demanda potencial e

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76

as muito específicas exigência de certificação que, assim, anulam economias de escala e

escopo destas empresas metal-mecânicas.

Finalmente, cabe mencionar que o caso bem sucedido da Ford não esteve

associado apenas à ruptura com as práticas atrasadas de gestão da produção e da cadeia

de suprimentos, mas também ao fato da empresas ter integrado ao investimento no novo

parque fabril , o desenvolvimento de um projeto automotivo próprio. Projeto que criou

um novo veículo (bem aceito pelos mercados externos e locais) a partir de linha de

montagem pré-existente, mas, no seu nascedouro já previu um sistema de produção

modular com repartição dos riscos e da produção com fornecedores de primeiro nível

selecionados. Não há indícios de que o estaleiro Atlântico Sul tenha repartido os custos

de instalação em Suape nem que, sem ter o domínio da tecnologia de produto e processo

produtivo, ambos licenciados em condições provavelmente leoninas com parceiro

internacional, inclusive no que se refere ao vendor list, possa reproduzir este

compartilhamento produtivo com fornecedores selecionados.

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4. Cadeia de suprimentos na indústria naval no Brasil: práticas atuais e fatores críticos

Esta subseção tem o objetivo de apresentar uma análise sintética das práticas

atuais e fatores críticos à competitividade da cadeia de suprimentos da indústria naval

brasileira, utilizando como base as lições aprendidas nos casos anteriores, resultados

preliminares de entrevistas com estaleiros e informações coletadas em relatórios e na

mídia especializada. Em linhas gerais, a compreensão da dinâmica e dos fatores críticos

à competitividade do setor fornecedor de navipeças enfrenta dificuldades em relação à

qualidade das informações disponíveis, sua confiabilidade, e comparabilidade com

outros países. Este problema, que não é restrito ao Brasil30, tem como grande indutor o

fato de que as empresas desta ampla classificação são extremamente heterogêneas em

relação a tamanho, faturamento, técnicas de produção, mercados de atuação e

dependência em relação ao mercado naval.

No Brasil, essa dificuldade é reforçada pela própria característica (re) nascente da

indústria nacional. Nesse sentido, cabe um destaque inicial para a necessidade de que

associações de produtores de equipamentos, de estaleiros, ou mesmo de grandes

consumidores como a Transpetro levem a cabo esforços junto às empresas

fabricantes/fornecedoras para sistematização de informações de desempenho

operacional (faturamento, custos, produtividade), de comércio exterior, de

investimentos, mercados de atuação e inovação tecnológica. A disponibilidade de tais

informações certamente constituirá um impulso ao debate acerca de políticas (públicas e

privadas) voltadas ao desenvolvimento da cadeia de fornecedores no Brasil.

4.1 Indústria naval brasileira e a indústria de navipeças: um renascimento

Os últimos anos têm sido de enorme transformação na produção naval brasileira.

A retomada da demanda, levada a cabo inicialmente por demanda da produção offshore

nacional (embarcações de apoio e plataformas) e, mais recentemente, pela grande

demanda de petroleiros, gaseiros e outras embarcações encomendadas plea Transpetro

no âmbito do PROMEF, tende a movimentar os investimentos estaleiros e na indústria

30 Uma descrição das dificuldades para padronização de estatísticas da cadeia de fornecedores de equipamentos e serviços para construção naval e para realização de estudos e entrevistas com participação de estaleiros na Europa pode ser encontrada em Balance (2000).

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de navipeças. Segundo estimativas do Sindicato da Indústria de Construção e Reparação

Naval e Offshore (Sinaval), os estaleiros brasileiros faturaram em 2006

aproximadamente US$ 2,5 bilhões e devem fechar esse ano com o mesmo valor. Ainda

segundo esta fonte, atualmente existe no país US$ 8 bilhões de encomendas em carteira,

sendo US$ 5 bilhões em navios e US$ 3 bilhões em plataformas. Ainda que estes dados

sejam reduzidos quando comparados às carteiras dos grandes estaleiros31, a expectativa

de crescimento e de geração de 36 mil postos de trabalho32 impõe uma pressão pela

geração de oferta de equipamentos e mão de obra qualificada, em um setor que há dez

anos atrás estava praticamente reduzido a reparos em embarcações (Jornal do

Commercio, 01/10/2007).

É justamente o cenário negativo que se estendeu desde meados da década de 1980

até o início da década atual um dos principais fatores que dificultam a reorganização do

segmento de navipeças no país. Os segmentos mais dependentes das demandas do setor

naval foram extintos. Aqueles que conseguiram sobreviver pela possibilidade de vender

a outros mercados33, ainda que possam retomar as atividades com maior velocidade têm

um problema em comum em relação aos fornecedores que têm de ressurgir: a

defasagem tecnológica e em relação aos procedimentos específicos de gestão da cadeia

de suprimentos naval que, como visto nas seções iniciais, têm passado por

transformações significativas nos últimos anos.

Um dos principais estímulos à produção da cadeia de suprimentos da indústria

naval no país é o índice de nacionalização proposto pelos contratos fechados pela

Petrobrás, de 65%. A discussão sobre a adequação deste índice varia entre dois pólos

distintos. Alguns, como a ABIMAQ, entidade representante de produtores brasileiros de

máquinas e equipamentos, argumentam que tal índice é insuficiente e desperdiça

potencial de desenvolvimento de equipamentos nacionais. Em extremo oposto, pode se

argumentar que a menor qualidade e o maior custo dos equipamentos nacionais podem

se tornar um empecilho à competitividade dos navios construídos no país – indicando a

necessidade de importar para viabilizar o business no país. Nesse sentido, uma breve

discussão sobre nacionalização do setor de navipeças é apresentada na subseção 4.2

31 A Carteira do Samsung Heavy Industries, por exemplo, é de US$ 10 bilhões em 2007 (SINAVAL, 2007). 32 Durante a década de 1970 o setor chegou a empregar 39.150 funcionários, segundo o DIEESE. 33 Alguns fabricantes de compressores, bombas, válvulas, caldeiras, escotilhas, guinchos, guindastes, mobiliário, por exemplo.

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79

4.2 Importância da nacionalização da cadeia de suprimentos para indústria naval

Como apresenta a seção 1 deste estudo, diversos estudos apontam para a

importância de uma gestão adequada das relações entre estaleiros e seus fornecedores.

Um dos elementos notados por estudos do setor é justamente a proximidade física e a

formação de arranjos produtivos locais, com concentração de empresas em torno de

estaleiros. A figura 4.1 ilustra a distribuição das empresas fornecedoras na Europa.

Figura 4.1 – Localização geográfica de fornecedores da indústria naval na Europa

Fonte: Balance (2000)

O relatório produzido pela Balance (2000) chama a atenção para a concentração

de fornecedores em torno de estaleiros, com destaque para fornecedores de

equipamentos e serviços especializados. Esse mesmo relatório, inclusive, chama atenção

para as dificuldades que a indústria de navipeças européia deverá sofrer ao longo das

próximas décadas por conta da perda de importância dos estaleiros desta região em

relação aos asiáticos, fato destacável ao longo das últimas décadas.

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Dois conjuntos de fatores podem ser associados às vantagens da mencionada

proximidade geográfica. O primeiro conjunto de fatores pode ser caracterizado por

elementos associados à logística da produção e, em maior ou menor grau, são de mais

fácil identificação. Um dos requisitos mais importantes na concorrência entre estaleiros

é o tempo de entrega da mercadoria. Além disso, como destaca a Seção 1 deste estudo, a

redução dos períodos de inatividade no estaleiro e a redução dos estoques também

constituem importantes armas de concorrência. A proximidade em relação aos

fornecedores permite a adoção de um conjunto de melhores práticas capazes de

interferir diretamente nestes aspectos.

A “produção enxuta”, discutida em seções anteriores, é dependente da capacidade

de entrega de partes, componentes e módulos de acordo com as necessidades do fluxo

de produção de estaleiros. A adoção de mecanismos informatizados para auxiliar na

sincronia destes agentes é central, mas é extremamente potencializada pela proximidade

geográfica. Essa é uma das lições das aprendidas com a indústria automobilística e que

ainda tem bastante campo a para ser desenvolvida na indústria naval, inclusive em

países com produção extremamente desenvolvida.

A nacionalização da cadeia de suprimentos, se estimulada, deve levar em

consideração estes aspectos para incrementar a competitividade dos estaleiros no que

tange à sua logística de produção. Os próprios custos de transporte e custos de transação

relacionados à importação favorecem essa substituição por fornecedores locais. Além

disso, como observado em visitas à estaleiros coreanos, a presença de mão de obra de

fornecedores dentro do próprio estaleiro tem se mostrado crescente e, obviamente, é

facilitada pela proximidade geográfica.

O segundo conjunto de fatores diz respeito à construção de ativos intangíveis, de

aproveitamento de externalidades relacionadas à atuação mais próxima entre estaleiros

e fornecedores e entre diferentes fornecedores. A literatura relacionada ao tema chama

atenção para a importância do fluxo de conhecimento e para a construção de laços

informais e formais de empresas que, imersas em um mesmo ambiente econômico, com

determinações similares, problemas correlacionados, podem vir a buscar soluções

conjuntamente. Em linhas gerais, esses são benefícios que podem ser identificados em

diversas formas de aglomerações produtivas locais.

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No setor de navipeças, estas características podem se manifestar no fluxo de mão

de obra entre empresas do setor, facilitando a transferência de experiências e acelerando

a transição pela curva de aprendizado. Ainda em relação à mão de obra, a proximidade

de fornecedores pode estimular a formação de instituições públicas e privadas voltadas

ao treinamento coletivo. A presença concentrada de determinadas categorias amplia a

efetividade de ações desse perfil. De maneira similar, a concentração de empresas da

cadeia de suprimento e estaleiros em uma mesma região, pelos próprios impactos que

gera sobre a atividade econômica regional podem potencializar o apelo por políticas de

construção de infra-estrutura voltada para a atividade. Em termos de infra-estrutura

privada, a proximidade geográfica e de relações entre empresas pode facilitar

procedimentos de compra e estocagem conjunta de matéria-prima como aço.

Estes benefícios, de difícil mensuração, compõem um leque de fatores que, em

conjunto com os aspectos logísticos, podem ser enumerados para defesa da

nacionalização da cadeia de suprimentos nacional. Cabe observar que aqui não foram

mencionados benefícios macroeconômicos como a geração de emprego e renda locais,

que também compõem objetivos de uma política de governo. Foram apresentados

apenas argumentos microeconômicos, que interferem diretamente sobre a

competitividade da indústria naval, especialmente no que tange aos seus determinantes

de longo prazo, quando os efeitos de aprendizado e aproximação das empresas são

potencializados.

A despeito dessa defesa da nacionalização, a extensão deste processo deve ser

analisada com bastante cuidado. O próprio ressurgimento e sobrevivência do setor de

navipeças, especialmente no médio e longo prazo, estão associados à manutenção da

demanda por navios nacionais. A nacionalização “a qualquer custo”, defendida por

alguns agentes da cadeia, pode ser míope quando se considera uma estratégia de

desenvolvimento sustentável. A perda de competitividade causada pela utilização de

equipamentos e serviços inadequados às condições da acirrada concorrência

internacional em termos de qualidade e/ou custo pode reduzir as próprias perspectivas

positivas para a indústria naval, que precisará, na próxima década, ampliar suas

exportações para compensar esperada redução da demanda nacional por navios – inflada

pelo programa de renovação da frota da Transpetro. A subseção 4.3 pretende contribuir

para avaliação do processo de nacionalização, apresentando uma análise sobre a

competitividade da cadeia de suprimento no país. Essa análise foi efetuada a partir de

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informações coletadas por entrevistas com empresas nacionais, relatórios do Programa

de Mobilização da Indústria de Petróleo (PROMINP), informações da própria

Transpetro, do perfil das encomendas relacionadas aos projetos de cada embarcação do

programa de renovação da frota e, por fim, informações coletadas junto à mídia

especializada.

5. Conclusões e recomendações de políticas

As principais conclusões deste estudo são:

A indústria naval mundial tem procurado avançar em práticas de gestão da

produção e da cadeia de suprimentos que se aproximam da chamada lean production,

desenvolvida inicialmente pela indústria automobilística. Os melhores e mais

competitivos estaleiros do mundo estão bastante avançados neste sentido, reduzindo

custos e encurtando prazos de entrega.

A indústria aeronáutica brasileira se reinventou competitivamente a partir de

novas práticas de gestão da cadeia de suprimentos. Fornecedores diretos se tornaram

parceiros de risco e, através de radical global sourcing, incrementaram fortemente a

competitividade da então semi-falida Embraer que, uma década depois da introdução

destas práticas, se tornou o terceiro maior player do setor no mundo. Paulatinamente,

têm sido adotadas medidas para adensar a montante a cadeia produtiva no Brasil, por

exemplo, através da composição de consórcios de pequenas e médias empresas

industriais e de serviços de engenharia. O poder de compra da empresa pode, nos

próximos anos, constituir no Brasil um sólido elo fornecedor. Espera-se que, no futuro,

estaleiros competitivos possam exercer o mesmo papel que a Embraer pretende agora

(ainda que lentamente) cumprir.

A indústria automobilística brasileira também se reestruturou nos anos 90 a partir

da reconfiguração de sua cadeia de suprimentos. Desverticalização da produção,

outsourcing, modularização da produção e aumento do conteúdo importado (partes e

componentes) permitiram que a indústria brasileira eliminasse a defasagem competitiva

em relação ao estado-da-arte mundial, no que se refere ao desempenho tecnológico e

design de seus produtos finais. Uma nova onda de investimentos, inclusive fora do eixo

tradicional, intensificou estes processos e contribuiu para ampliar a competitividade

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83

através de redução de custos, aumento de produtividade e melhor desempenho dos

veículos. No entanto, deve-se ressaltar que os ganhos de competitividade do elo das

montadoras foi contrabalançado por relativo desadensamento da cadeia, em especial por

desmobilização de fornecedores de autopeças e forte retração no número de empregos.

Isto explicita o dilema que aflige aos policy makers interessados em reconstruir a

indústria naval brasileira: constituir uma indústria fundamentada na importação de

equipamentos e partes, com apenas o aço e a mão de obras agregadas localmente, ou

uma indústria crescentemente adensada, com desenvolvimento competitivo tanto dos

estaleiros quanto de empresas fornecedoras de navipeças?

Em parte esta pergunta pode ser respondida pela própria dinâmica de

reestruturação. A cadeia de construção naval do Brasil, após 20 anos de

desindustrialização, parece dar indícios de recuperação, ao menos nos elos de

construção propriamente dita, graças ao poder de compra da Petrobras e da Transpetro.

Não há indícios, entretanto, da recuperação dos segmentos fornecedores de navipeças,

ainda muito desarticulados. Da mesma maneira, os estaleiros nacionais ainda estão

muito distantes das melhores práticas de produção e gestão da cadeia de suprimentos

observados nos casos paradigmáticos do segmento (por exemplo, estaleiros líderes sul-

coreanos).

De qualquer forma, este estudo pôde concluir que as principais lições que a

reestruturação das indústrias aeronáutica e automobilística pode oferecer para a

retomada da construção naval no Brasil são:

a. eleger um nicho de mercado (carros “populares” e jatos regionais

de até 100 lugares) e se especializar através de ampliação de escala

para atender tanto o mercado doméstico em crescimento, quanto o

exterior através de exportações para mercados potenciais, é uma

vantagem competitiva que amplia rentabilidade e cria defesas

naturais com relação às importações;

b. reorganizar a cadeia de suprimentos em direção a uma maior

participação do segmento fornecedor, através da co-

responsabilidade da produção de módulos e sistemas e da

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repartição dos riscos do investimento, é uma estratégia crucial para

o aumento da competitividade da montagem (edificação) final;

c. deter capacitação de projeto é fundamental para comandar a cadeia

de maneira mais eficiente, com atestaram os casos da Embraer e da

Ford com o EcoSport em Camaçari;

d. o uso de insumos importados permite produzir o bem final de

maneira mais eficiente, tanto em relação a custos, quanto em

relação a desempenho, ainda que produza efeitos colaterais que

reduzem o efeito indutor de renda e emprego no país;

e. novos investimentos permitiram romper com a ineficiente, ao

menos no início dos anos 90, característica anterior (plantas

desatualizadas, verticalização excessiva, alto conteúdo nacional,

proximidade com mercado e com fornecedores, etc). Casos de

sucesso, com o da Ford na Bahia ou o novo processo de

“docagem” de aviões da expansão da Embraer, parecem indicar

que o advento do estaleiro Atlântico Sul em Suape-PE, pode

contribuir fortemente para o êxito da reconstrução da indústria

naval no Brasil.

Para que estas lições sejam melhor aproveitadas, o estudo entende que é preciso

decidir que tipo de construção naval se deseja re-instalar no Brasil: uma indústria

concentrada na montagem (lançando mão de alto conteúdo importado e presidindo de

uma densa rede de fornecedores locais de equipamentos) ou uma que progressivamente

vá adensando a montante a cadeia produtiva no Brasil.

O estudo recomenda que a segunda opção seja perseguida pelos policy

makers. Caberia ao Estado e aos principais demandantes como a Transpetro

coordenarem uma articulação que permita a reestruturação dos estaleiros de

forma concomitante ao fortalecimento da cadeia de suprimentos.

Diversas ações podem ser implementadas neste sentido. Destacam-se:

• Mobilizar órgãos do executivo (MDIC, MME, MT, por exemplo) para

traçar estratégia comum de desenvolvimento, que envolva política

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comercial, poder de compra, promoção de exportações e financiamento.

Replicar experiências comandadas pela Secretaria de Desenvolvimento

da Produção do MDIC para instituir um Fórum de Competitividade da

Cadeia Produtiva da Construção Naval;

• Os demandantes deveriam participar ativamente da definição de vendor

lists, privilegiando soluções que contribuam para o desenvolvimento de

fornecedores locais;

• Ampliar a iniciativa do Prominp, incorporando especificidades da cadeia

produtiva de construção naval de longo curso, estimulando a circulação

de conhecimento e definindo metas (e trajetórias) mais ambiciosas de

nacionalização de navipeças.

• Coordenar e ampliar o envolvimento de instituições de ensino e pesquisa

tecnológicas com as empresas produtoras de navipeças (existentes e

potenciais), estaleiros e órgãos de financiamento, para estimular o

desenvolvimento tecnológico que seja efetivamente aplicado em novos

produtos e processos demandados pelos produtores;

• Neste mesmo sentido, deveriam ser criadas linhas especiais de

financiamento no BNDES, seja para produção local, seja incentivando

exportações de embarcações e navipeças (e.g. usar FMM para articular

cadeia como um todo e não os estaleiros);

• Por fim , deveriam ser criadas linhas especiais de financiamento e

articular ações para o desenvolvimento de projetos, de produtos e de

APLs, articulando uma Rede de Fornecedores de Navipeças, que

incluiria empresas de todos os portes (Transpetro, BNDES, FINEP,

SEBRAE, Governos Locais, Sindicatos e Associações de Empresas,

entre outros).

Page 86: Benchmarks e melhores práticas da cadeia de suprimentos (Relatório)

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