BELINI. A variação lingüística

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO FACULDADE DE LETRAS LINGUÍSTICA I – 2012/1 Professora: Talita Moreira de Oliveira BELINI. A variação lingüística. 1. As línguas variam Cariocas, paulistas, baianos e gaúchos falam diferentes, mas podemos entender tudo o que falam. Ainda que o falante possa não saber o significado de um vocábulo ou de outro, ao ouvi-lo pela primeira vez, ele reconhece os sons que participam de sua constituição e também reconhece o seu padrão silábico. Variação linguística: a variável linguística é um conjunto de duas ou mais variantes. Variantes linguísticas são diferentes formas linguísticas que veiculam um mesmo sentido. Variação fonética – “menino” e “minino”: formas diferentes de se pronunciar um mesmo vocábulo. Variação morfológica – “cantá” e “cantar”: presença ou ausência de morfemas, por exemplo, para expressar a noção gramatical de “infinitivo” ou de número (“casa” e “casas”). Variação no léxico – “jerimum” e “abóbora”: vocábulos diferentes usados para fazer referência a um mesmo elemento do mundo. Variação sintática – “eu não vou sair agora” e “eu não vou sair agora não”: construções sintáticas diferentes que expressam o mesmo sentido. Variação diatópica – variações conforme o lugar - região. Variação diafásica – variações conforme a situação - mais formal ou mais informal. Sociolinguística: procura desvendar como a heterogeneidade se organiza, como a variação é regulada. 2. Os limites da variação 2.1. Até que ponto as línguas variam?

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIROFACULDADE DE LETRASLINGUÍSTICA I – 2012/1Professora: Talita Moreira de Oliveira

BELINI. A variação lingüística.

1. As línguas variam

Cariocas, paulistas, baianos e gaúchos falam diferentes, mas podemos entender tudo o que falam. Ainda que o falante possa não saber o significado de um vocábulo ou de outro, ao ouvi-lo pela primeira vez, ele reconhece os sons que participam de sua constituição e também reconhece o seu padrão silábico.Variação linguística: a variável linguística é um conjunto de duas ou mais variantes. Variantes linguísticas são diferentes formas linguísticas que veiculam um mesmo sentido.

Variação fonética – “menino” e “minino”: formas diferentes de se pronunciar um mesmo vocábulo.Variação morfológica – “cantá” e “cantar”: presença ou ausência de morfemas, por exemplo, para expressar a noção gramatical de “infinitivo” ou de número (“casa” e “casas”). Variação no léxico – “jerimum” e “abóbora”: vocábulos diferentes usados para fazer referência a um mesmo elemento do mundo.Variação sintática – “eu não vou sair agora” e “eu não vou sair agora não”: construções sintáticas diferentes que expressam o mesmo sentido.

Variação diatópica – variações conforme o lugar - região. Variação diafásica – variações conforme a situação - mais formal ou mais informal.

Sociolinguística: procura desvendar como a heterogeneidade se organiza, como a variação é regulada.

2. Os limites da variação2.1. Até que ponto as línguas variam?

Toda língua possui um conjunto de regras de combinação de fonemas, morfemas, palavras na frase e frases no texto. Tais regras podem pertencer a línguas diferentes. Por exemplo, semelhanças gramaticais entre o português e o espanhol (existência de morfemas flexionais para marcar número e pessoa verbais em concordância com o sujeito). Um mesmo indivíduo opera com regras variáveis. Assim, a língua pode ser vista como um sistema inerentemente variável.

2.2. A comunidade de fala

Embora o indivíduo possa utilizar variantes, é no contato linguístico com outros falantes de sua comunidade que ele vai encontrar os limites para a sua variação individual. Como o indivíduo vive inserido numa comunidade, deverá haver semelhanças entre a língua que ele fala e a que os outros membros da comunidade falam. As atitudes

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linguísticas não estão delimitadas apenas por fronteiras geográficas, mas também por fronteiras sociais.

3. Estudar a variação: quantificar as diferenças

Além de diferenças categóricas, somos capazes de perceber distinções mais sutis, que se revelam não na presença ou ausência de uma determinada forma linguística, mas na quantidade com que tal forma aparece na fala de um indivíduo ou de um grupo.A teoria da variação vai prestar atenção a basicamente dois fatos: a) falantes que compartilham os mesmos números (pesos relativos) quando aplicam uma regra de acordo com os contextos linguísticos, ainda que possam apresentar números diferentes dentro do quadro geral – os falantes envolvidos apresentam identidade estrutural, revelando uma mesma gramática; eb) falantes que apresentam pesos diferentes, com relação aos contextos linguísticos, mas tem um mesmo comportamento dentro do quadro geral – os falantes estão usando gramáticas diferentes, pois os efeitos de contexto linguístico são diferentes.Os pesos relativos são valores que vão de zero a um que indicam matematicamente o peso com que um fator (linguístico ou extralinguístico) influencia o uso de uma variante, em relação a todos os fatores levados em conta na observação de um fenômeno de variação linguística. Quando o peso relativo de um fator é próximo de zero, significa que tal fator desfavorece o uso da variante. Quando o peso relativo é igual a 0.50, significa que ele não está correlacionado ao uso da variante (neutro). Finalmente, quanto mais próximo for de 1, maior será o peso com que o fator favorece o uso da variante. Os valores dos pesos relativos são obtidos a partir de fórmulas estatísticas complexas em que se comparam as porcentagens com que os dados se distribuem pelos diferentes fatores.Para a teoria variacionista, diferenças entre comunidades de fala deverão corresponder a diferenças gramaticais, ou seja, diferenças nos efeitos dos contextos linguísticos sobre o uso das variantes. As diferenças que percebemos entre indivíduos de uma mesma comunidade são diferenças no nível geral de usar um fenômeno variável. Podemos estudar a língua de uma comunidade inteira partindo da fala de alguns de seus membros, pois os pesos relativos que vão definir os usos de formas variantes pelos falantes são os mesmos pesos relativos que definem a comunidade inteira, ainda que possa haver diferenças nas quantidades de dados de cada falante, dentro do quadro geral de variação.

3.1. Desenvolvendo um estudo variacionista

A Sociolinguística Variacionista faz análise quantitativa de dados linguísticos. Tais dados, o corpus, é obtido através de gravações de conversas entre falantes de um determinado lugar. Quanto à análise quantitativa, existem programas estatísticos especialmente elaborados para o tratamento de dados linguísticos, como o VARBRUL, por exemplo. Tal programa fornece os pesos relativos com que cada fator linguístico e extralinguístico está correlacionado ao uso de uma variante. Antes de submeter os dados à análise, eles devem ser isolados e codificados.