Beira 116

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ISSN 1982-5994 UFPa • aNo XXViii • N. 116 • deZeMBro e JaNeiro, 2013 Camapu estimula memória e raciocínio Química Páginas 10 e 11 Lei não diminui índices Memorial do livro Violência doméstica Literatura Pesquisa traz números dos últimos três anos.Páginas 12 e 13 UFPA reúne acervo de escritores e intelectuais paraenses. Página 14

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Beira do Rio edição 116

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ISSN

198

2-59

94

UFPa • aNo XXViii • N. 116 • deZeMBro e JaNeiro, 2013

Camapu estimula memória e raciocínio

Química

Páginas 10 e 11

Lei não diminui índices

Memorial do livro

Violência doméstica

Literatura

Pesquisa traz números dos últimos três anos.Páginas 12 e 13

UFPA reúne acervo de escritores e intelectuais paraenses. Página 14

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JORNAL BEIRA DO RIOcientifi [email protected]ção: Prof. Luiz Cezar Silva dos SantosEdição: Rosyane Rodrigues (2.386-DRT/PE)Reportagem: Amanda Pinho, Marcus Passos e Vitor Barros (Bolsistas), Walter Pinto (013.585-DRT/MG)Fotografi a: Alexandre Moraes e Laís TeixeiraFotografi a da capa: Alexandre MoraesIlustrações: Benelton Lobato / CMP/AscomCharges: Walter PintoProjeto Beira On-Line: danilo SantosAtualização Beira On-Line: Rafaela AndréRevisão: Júlia Lopes e Cintia MagalhãesProjeto gráfi co e diagramação: Rafaela AndréMarca gráfi ca: Coordenadoria de Marketing e Propaganda CMP/AscomSecretaria: Silvana VilhenaImpressão: Gráfi ca UFPATiragem: Mil exemplares

UniVeRSidAde FedeRAL dO PARÁ

Reitor: Carlos Edilson ManeschyVice-Reitor: Horácio SchneiderPró-Reitor de Administração: Edson Ortiz de MatosPró-Reitor de desenvolvimento e Gestão de Pessoal: João Cauby de Almeida JúniorPró-Reitora de Ensino de Graduação: Marlene Rodrigues Medeiros FreitasPró-Reitor de Extensão: Fernando Arthur de Freitas NevesPró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação: Emmanuel Zagury TourinhoPró-Reitora de Planejamento: Raquel TrindadePró-Reitor de Relações Internacionais: Flávio Augusto Sidrim NassarPrefeito: Alemar dias Rodrigues Junior

Assessoria de Comunicação Institucional - ASCOM/UFPACidade Universitária Prof. José da Silveira NettoRua Augusto Corrêa n.1 - Prédio da Reitoria - TérreoCEP: 66075-110 - Guamá - Belém - ParáTel. (91) 3201-8036www.ufpa.br

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Esta edição traz reportagem com o Grupo de Pesquisa em Bioprospecção e Moléculas Ativas da Flora Amazônica, sobre a descoberta das propriedades neurogênicas de substâncias produzidas pela Physalis angulata, popularmente conhecida como camapu. O estudo inédito comprovou que a planta pode ser utilizada para elevar as capacidades de raciocínio e de me-mória, além de induzir o crescimento neuronal. O próximo passo é realizar o experimento em grande escala para responder aos questinamentos da indústria farmacêutica.

Implantada em 2006, a Lei Maria da Penha ainda não conseguiu diminuir os índices de violência contra a mulher. No Brasil, de 2001 a 2011, 50 mil mulheres foram assassinadas. O cenário paraense não é diferente: os números são alarmantes e os casos são igualmente perversos. O texto de Vitor Barros traz os resultados da pesquisa realizada pela Faculdade de Enfermagem sobre o assunto.

O Projeto Memorial do Livro, a Verdade Cínica de Michel Foucault e o professor Adriano Rodrigues falando sobre os pa-radigmas da Comunicação no século XXI também estão nesta edição. Boa leitura!

Rosyane RodriguesEditora

Índice

Michel Foucault e a verdade cínica ....................................4

Língua, cultura e meio ambiente ......................................5

Transversalizando as ciências ...........................................6

Cientistas atentos ao senso comum ......................................8

Camapu induz produção de neurônios .............................. 10

Lei não diminui casos de violência ................................... 12

Espaço para belas palavras ............................................ 14

À margem esquerda do Rio Xingu e ao centro da Rodovia Transamazônica, está instalado, desde 1987, o Campus

Universitário de Altamira, atendendo também aos municípios da região, como São Félix do Xingu, Itaituba e Novo Repartimento.

A imagem de Alexandre Moraes retrata um pouco da vida ribeirinha no município.

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OpiniãO

Michel Foucault e a verdade cínica

Ernani Chaves

Professor da Faculdade de Filosofia/IFCH

[email protected]

ALEX

ANd

RE M

ORA

ES

Nos seus últimos anos de vida, o filósofo francês Michel Foucault (1926-1984) empreendeu um retorno à Antiguidade Clássica. Isso não quer dizer que o seu interesse pelas questões próprias de nossa época, às quais dedicou seus grandes estudos sobre a loucura, a prisão, a sexualidade, tenha diminuído ou se tornado

secundário. Muito pelo contrário, essa “atenção ao presente” ganhou uma nova perspectiva com esse retorno. A Antiguidade Clássica parecia a Foucault não apenas o contraponto mais adequado para entendermos “ne-

gativamente” o nosso presente (não somos mais gregos!), mas também, justamente o contrário, seu contraponto necessário, uma vez que, sem ela, não podemos compreender o que se passa agora. Seus últimos livros, seus últimos cursos no Collège de France, suas entrevistas, palestras e intervenções públicas do período de 1980-1984 são banhados pelo sol da Hélade, pelo reencontro, feliz e sereno, com uma imagem da filosofia e do filósofo, que se opunha àquelas construídas pela filosofia tradicional.

Mais do que aquele que procura a verdade, que quer estabelecer as condições necessárias para o conhecimento, que tenta delimitar com clareza e distinção a fron-teira entre o verdadeiro e o falso, a realidade e a ilusão, a filosofia é, antes de tudo, uma forma de vida, uma prática mais do que uma elaboração racional e o filósofo, aquele que se contrapõe ao poder, aos excessos do déspota. A filosofia é uma forma específica de “parresia”, isto é, do “dizer verdadeiro”. Mas não apenas isso, pois, entre o que é dito e a vida daquele que diz, deve haver uma ligação necessária e indissociável. Não pode haver cisão entre o pensar e o agir, assim como as formas de subjetivação estão sempre ligadas às ações políticas, às intervenções no espaço público.

Meu livro dedica-se a estudar a forma mais radical que a prática filosófica assumiu na Antiguidade, qual seja, a do cinismo, objeto do último curso de Foucault no Collège de France, intitulado “A coragem da verdade”. Os cínicos antigos, que se diziam discípulos de Sócrates, levaram ao extremo a exigência radical da filosofia, de se constituir em uma crítica efetiva de sua época. Eles compreendem a verdade como inseparável de uma espécie de pensamento que nasce, atra-vessa e se expressa no corpo, anunciando, na sua pedagogia e na sua ética, uma forma de reconciliação entre o homem e a natureza e, com isso, atacam frontalmente todas as formas de sociabilidade de sua época: sua arma é o riso, a insolência, a blasfêmia, a heresia, no combate a todas as formas da hipocrisia social.

Mas não se trata apenas de estudar o cinismo antigo e sua relação com a herança socrático-platônica. Trata-se, também, de indicar, na posteridade da história do Ocidente, as reverberações, os ecos do cinismo antigo, incluindo a sua concepção negativa, desqualificadora, que procurou retirar sua importância da história da filosofia e con-denou, moral e patologicamente, as formas de expressão ditas “cínicas”. Foucault lembra-nos, em contraposição, de que, no ascetismo cristão medieval, nas práticas revolucionárias dos séculos XVIII e XIX e nas proposições formais, teóricas e políticas dos artistas “modernos”, a partir da segunda metade do século XIX, os ecos do cinis-mo antigo se fazem ouvir. destaco e enfatizo a relação entre arte moderna e cinismo, a partir da referência de Foucault ao poeta Charles Baudelaire, aproximando sua leitura daquela efetuada por Walter Benjamin, tendo como pano de fundo seus debates com Sartre, com Marx e com o marxismo, assim como sua inspiração em Nietzsche. E pergunto, ao final, qual o alcance que suas proposições podem ter ainda nos nossos dias, ou seja, pergunto – para responder positivamente – acerca do potencial crítico do cinismo.

Este livro é dedicado à memória de Benedito Nunes, por ter, entre tantas ou-tras coisas, me apresentado duplamente a Michel Foucault. Primeiro, quando da visita de Foucault a Belém, em novembro de 1976; na ocasião, como monitor da disciplina “Introdução à Filosofia”, fiquei encarregado de recolher as assinaturas dos presentes às conferências de Foucault no auditório do então Centro de Letras e Artes. Segundo, quando me sugeriu, alguns anos depois, em 1980, que fizesse do pensamento de Foucault o tema de minha Dissertação de Mestrado. n

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Cultura

Ensino da língua alemã ajuda a reinserção social

Língua, cultura e meio ambienteALEXANdRE MORAES

Metodologia é interdisciplinar e aborda os conteúdos a partir de temáticas transversais, facilitando o aprendizado.

O Programa utiliza uma me-todologia interdisciplinar com a abordagem de temáticas transversais no ensino dos conteúdos. A transver-salidade é fator motivador do diálogo com diferentes culturas e valores sociais, para que as crianças constru-am uma identidade própria perante o conhecimento de outras culturas. Essa prática viabilizou ações e par-cerias com professores brasileiros e alemães, que ministram palestras e oficinas sobre variados temas, como é o caso da professora Sylvia Henkel, que vem ministrando oficinas para

as crianças atendidas pelo projeto. Hoje, o projeto atende 36

meninas em situação de vulnerabili-dade social. São 18 crianças de 6 a 9 anos (do 1° e 2° ano), no horário da tarde; e 18 crianças de 10 a 12 anos de idade (do 3° e 4° ano), no horário da manhã. A equipe é formada por professores da UFPA, três monitores voluntários e dois bolsistas. Este projeto acaba por se unir a outros projetos em andamento na Institui-ção Nossa Senhora das Graças, como as aulas de Ballet, Música, Leitura, Esporte, entre outras.

“A importância do programa é garantir a reinserção dessas crian-ças na comunidade, fazendo com que elas recuperem a autoestima e se reencontrem por meio do ensino-aprendizagem de uma nova língua”, avalia a professora Rosanne Castelo Branco.

Quem tiver interesse em ob-ter mais informações sobre o projeto pode visitar o blog Amazonien: kinder lernen Deutsch, criado em 2011, com o objetivo de divulgar e ampliar as atividades desenvolvidas e trocar ideias com outros projetos sociais. n

Saiba maiS

A Instituição Nossa Senhora das Graças mantém-se por meio de doações de empresas e de voluntários. Todas as suas ações são acompanhadas pelo Ministério Público e Conselho Tutelar.

n Marcus Passos

Aprender outro idioma e entrar em contato com uma nova cultura é uma experiência

importante tanto pessoalmente quanto para o mercado de traba-lho. Nessa perspectiva, o Projeto “Aprendendo Alemão na Amazônia: interculturalidade e consciência ambiental”, coordenado pela pro-fessora Rosanne Castelo Branco, da Universidade Federal do Pará (UFPA), tem como proposta o ensino da língua alemã para crianças em situação de vulnerabilidade social.

Baseado no tripé acadêmico ensino, pesquisa e extensão, o pro-jeto tornou-se pioneiro na Região Norte do Brasil por ser formador e fomentador do ensino-aprendi-zagem de línguas estrangeiras em comunidades carentes.

Iniciado em 2000, por meio do programa piloto “Uma expe-riência pedagógica do ensino do alemão na escola fundamental”, o projeto atendeu 40 alunos da Escola Municipal de Ensino Funda-mental e Infantil Paulo Freire, em Icoaraci. Na ocasião, as atividades eram coordenadas pela professora Helga André e também envolvia uma equipe de seis professores colaboradores e quatro monitores.

Em 2008, as atividades fo-ram retomadas por meio da parce-ria estabelecida com a Instituição filantrópica Pia Nossa Senhora das Graças e da vinculação do pro-grama ao projeto pedagógico da Faculdade de Línguas Estrangeiras Modernas (Falem). O programa tem ações previstas até 2014, com expectativa de renovação diante dos resultados positivos que vem apresentando.

“Inicialmente, houve bas-tante resistência por parte da comunidade acadêmica, por conta dos estereótipos pré-estabelecidos de que o alemão é uma língua di-fícil. Porém as pessoas esquecem

que a língua é trabalhada pedago-gicamente de forma lúdica, sem deixar de lado o compromisso com o conteúdo, e as crianças atendidas não possuem ideias e valores pré-concebidos acerca do alemão”, afirma Rosanne Castelo Branco.

O objetivo é estabelecer o diálogo entre a língua e os aspec-tos socioculturais e ambientais da Alemanha e da Amazônia. Outra preocupação é formar profissionais comprometidos com a responsa-bilidade social, os quais assumam um papel trans(formador), como vem ocorrendo com as professoras, monitoras e bolsistas ligadas ao programa.

São 36 alunas com idade entre seis e 12 anos

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Ensino

Grupo propõe aproximação entre Psicologia e Ciências Sociais

Transversalizando as ciências

A professora Flávia Lemos

realizou análise documental

dos relatórios gerados pelo Unicef para as políticas

desenvolvidas no Brasil.

ALEXANdRE MORAES

n Walter Pinto

Criado há pouco mais de cinco anos, o “Transversalizando” é um dos mais recentes gru-

pos de pesquisa da área de Psicolo-gia da UFPA. Apesar dos poucos anos de existência, ele vem se firmando como uma referência em estudos transdisciplinares, ao promover a articulação entre a Psicologia e as Ciências Sociais. O grupo é com-posto por estudantes e profissionais

de várias áreas, com atuação na graduação e no Programa de Pós-Graduação em Psicologia, dentro da linha de pesquisa Psicologia, Sociedade e Saúde.

Os estudantes ligados ao “Transversalizando” estão inseri-dos numa rede de pesquisa que os coloca em intercâmbio permanente com professores e estudantes de outras instituições. desta forma, há maior disponibilidade para troca de informações, ajuda mútua e possi-

bilidade de publicação conjunta. O grupo, que se reúne todas as terças-feiras, também possui um blog voltado ao ativismo político e à defesa dos direitos humanos.

O grupo é resultado da expe-riência da professora Flávia Cristina Silveira Lemos como orientanda do filósofo e historiador Hélio Rebello Cardoso Júnior, em seu doutorado realizado na Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Assis, interior de São Paulo. Naquela ocasião, Hélio Rebello inseriu a orientanda numa rede de pesquisa organizada por ele. Desde então, a psicóloga social Flávia Lemos pas-sou a entender que não é possível fazer pesquisa sem trabalhar com uma rede de estudantes em inter-câmbio com outros professores.

Há seis anos, quando in-gressou para o quadro docente da Faculdade de Psicologia da UFPA, Flávia Lemos trouxe a ideia do desenvolvimento de estudos transdisciplinares e, também, o interesse pela análise documental, uma metodologia pouco difundida na Psicologia.

Tema original e metodologia interdisciplinar Flávia Cristina Silveira Le-

mos observa que a maioria dos pesquisadores de Psicologia prio-riza a entrevista em seus estudos. Por isso, a pesquisadora tenta mostrar aos alunos que a entre-vista é também um documento, que encontra correspondência nas Ciências Sociais, nos relatos da História Oral. “Isso me leva ao emprego da Epistemologia e da Teoria da História para pensar o trabalho com documentos com eles”, explica.

Sua ligação com a disciplina História e com o estudo de docu-mentos começou ainda no Mestra-do em Psicologia Social, quando a professora analisou documentos de uma instituição local, o Conselho

Tutelar, sobre infância e adoles-cência. Já nesta etapa, Flávia Lemos foi coorientada por Hélio Rebello, especialista em Michael Foucault e Gille Deleuze.

Decidida a ampliar seus estudos com documentos relativos aos direitos da criança e dos ado-lescentes, durante o doutorado, Flávia Cristina Lemos teve acesso a relatórios do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), produzidos, especificamente, so-bre a realidade brasileira.

“Aqueles documentos me chamaram atenção, porque per-tenciam a um organismo inter-nacional, multilateral, ligado à Organização das Nações Unidas, e porque interferiam diretamente

na criação das políticas públicas brasileiras para crianças e adoles-centes”, lembra a professora.

“Concluí minha tese com êxito, tanto pela originalidade do tema quanto pela inovação no uso de fontes (documentos) e de método analítico, com apropriação de ferramentas metodológicas e teoria de autores de outras áre-as, com destaque para Foucault, na Teoria da História”, avalia a pesquisadora. Foi essa experiência que motivou a criação, na UFPA, do Grupo “Tranversalizando”, que, além de estudos sobre o Unicef, trabalha questões relacionadas aos direitos humanos, por meio de pesquisa histórica e documental, baseada em Michel Foucault. n

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EnsinoUnicef propõe políticas para o Brasil

Nos seus primeiros 25 anos, a atuação do Unicef limitava-se à for-ma de recomendação. Entretanto, a partir de 1970, a atuação foi am-pliada, passando ao financiamento de programas e intervenção direta nas políticas públicas. Um exemplo dessa orientação é o Programa Es-tratégia Saúde da Família, perten-cente ao Ministério da Saúde, mas inteiramente pautado, concebido e financiado pelo Unicef, que também faz o acompanhamento.

Por trás da atuação do Uni-cef, há a pressão de bancos inter-nacionais dos países considerados ricos. Segundo Flávia Cristina Silvei-ra Lemos, existem muitos estudos na Ciência Política apontando para a influência do bloco capitalista du-rante a guerra fria na pauta de todos os organismos ligados à ONU. “Isso me levou a observar que, apesar dos benefícios das políticas do Unicef, há, sempre, algum tipo de interesse econômico em jogo”, explica.

É neste sentido que aponta uma das conclusões da sua tese de doutorado, ao constatar que toda política do Unicef é calculada em termos de impacto econômico rela-cionado à segurança mundial. “Não há uma preocupação específica com a criança e com o adolescente. Mas, sim, uma preocupação mais ampla em que a criança e o adolescente acabam sendo instrumentalizados dentro de um objetivo político maior.” n

Basicamente, Flávia Cristina Silveira Lemos vem estudando os di-reitos da criança e do adolescente nos últimos vinte anos, por meio de pes-quisas documentais. Ela observa que, além de propor políticas públicas para o Brasil, o Unicef monitora as políticas implementadas e exerce pressão sobre o País, visando à redução das violações dos direitos de crianças e adolescen-tes. “Minha atenção foi direcionada ao fato de um organismo internacional ter uma intervenção tão intensiva no País, positiva em alguns aspectos, negativa em outros”, afirma.

De positivo, ela aponta a pres-são política exercida pelo Unicef, sem a qual, entende que, dificilmente, o Brasil teria avançado na área. Para efetivar sua atuação, o organismo infiltrou-se nos Ministérios da Saúde, da Educação e da Justiça. No entanto seus tentáculos vão além do plano federal: por intermédio de uma rede pulverizada de base, ele chega aos Estados e municípios, onde financia projetos locais e faz acompanhamen-to por meio de escritórios mantidos em quase todas as capitais do País.

Dentro desse quadro, a pes-quisadora tentou entender como o Unicef consegue operacionalizar a articulação política e promover uma agenda, evidentemente, pactuada pelo próprio país, na medida em que o Brasil participa das conferências internacionais e ratifica documentos ligados àquele organismo.

O Unicef foi criado em 1945, dentro do sistema da Organização das Nações Unidas (ONU), logo após o fim da Segunda Guerra Mundial, com o objetivo de atender, basicamente, às mulheres viúvas e crianças órfãs de guerra. Inicialmente, seu foco era a área materno-infantil, mas, rapida-mente, a agenda foi ampliada para as

temáticas de proteção de crianças e adolescentes. Esta guinada - acredita a pesquisadora - está relacionada à concepção que vem ganhando força no Liberalismo, segundo a qual, pensar no desenvolvimento de um país implica cuidar das crianças e dos adolescentes, sobretudo das crianças de zero a seis anos.

Pauta atende aos interesses dos países ricos

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Entrevista

Para Adriano Rodrigues, essa é a grande mudança no século XXI

Cientistas atentos ao senso comumadrianO duarte rOdrigueS

LAíS TEIXEIRA

n Walter Pinto

Professor Catedrático da Universidade Nova de Lisboa, Adriano duarte

Rodrigues é autor de uma longa obra que o tornou referência na área da Comunicação Social. durante o mês de outubro, ele esteve, pela terceira vez, em Belém, onde ministrou seminá-rios e palestras para alunos e professores da Faculdade de Co-municação e da Pós-Graduação Comunicação, Cultura e Amazô-nia da Universidade Federal do Pará (PPGCOM). Em entrevista ao Beira do Rio, Adriano Duarte fala sobre o desenvolvimento do curso de Pós-Graduação em Comunicação na UFPA e avalia como promissora a vertente que busca interagir com a área ecológica. A seguir, leia a síntese dessa conversa.

Pós-Graduação

O que considero mais importan-te nas transformações ocorri-das no curso de Comunicação Social da UFPA é, certamente, o desenvolvimento do curso de pós-graduação. Isso, para mim, é algo novo. Das vezes anteriores que aqui estive, não havia pós-graduação. En-tão, as minhas intervenções eram extremamente pontuais, porque não havia uma infraes-trutura de pós-graduação que justificasse a minha perma-nência mais demorada, como ocorreu desta vez.Por que considero esta trans-formação importante? Porque uma universidade só pode ser considerada plenamente uni-versidade quando possui cursos de pós-graduação. O curso que não possui pós-graduação é, quando muito, um curso médio superior. A universidade é um espaço de criação do conhe-cimento e o conhecimento só

se cria ao nível pós-graduado. A graduação é mais uma trans-missão, às novas gerações, de conhecimentos que outros produziram.A pós-graduação abre novos caminhos, novas pistas, novos horizontes à compreensão do

mundo. Concretamente, esse processo de comunicação faz dos seres humanos aquilo que eles realmente são, inseridos socialmente numa rede de in-terações com os outros e com o mundo à volta. Essa é a grande transformação que a área da

Comunicação Social da UFPA está vivenciando.

Perspectivas

A experiência que tive na UFPA foi a de uma grande pujança. Encontrei jovens muito mo-

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tivados, com projetos não só interessantes, como também diversificados, com grande abertura e com uma cultura notável para um curso de pós--graduação ainda recente. Isso é extremamente encorajador. Foi uma grande satisfação a possibilidade de estabelecer diálogo e interlocução com esses jovens, uma experiên-cia positiva e reveladora da grande motivação em cada um deles. Para não falar dos professores, com os quais tive a oportunidade de conviver mais de perto. Todas essas experiências são extremamente encorajadoras e, certamente, este projeto vai se consolidar com o acú-mulo de novos conhecimentos.

Interdisciplinaridade

A comunicação é uma área re-lativamente recente em nível universitário. Podemos dizer que ela tem, atrás de si, uma pré-história muito longa, que remonta aos gregos, de onde vamos buscar, muitas vezes, inspiração para aulas e artigos, assim como na lógica medieval. Então, como em qualquer ci-ência, temos uma pré-história longa. Em termos institucionais acadêmicos, podemos dizer que a Comunicação se conso-lida no século XX. É, portanto, muito recente. Atualmente, estamos retoman-do uma articulação interdisci-plinar forte, com paradigmas que vêm de várias disciplinas e, aqui, na Região Amazônica, vejo uma articulação muito interessante da Comunicação com os estudos ecológicos. Isso vem retomar uma tradição nos estudos da Comunicação, que remonta ao princípio do século XX, com a Escola de Chicago ou o Colégio Invisível, de Gregory Bateson, da Escola de Palo Alto.Há um retomar desta via, eu diria numa perspectiva intera-cional da comunicação, sobre-tudo no Brasil, depois de uma época em que os estudos da comunicação se voltaram mais

Entrevista

“O que os cientistas fazem é

explicitar as leis que regulam os fenômenos”

“A pós--graduação abre novos caminhos

para a compreensão do mundo.”

para uma profissionalização com vista a uma mobilização em torno de projetos políticos e culturais do País. Hoje, percebo essa mudança em que se valorizam os estu-dos interacionais, a busca por uma lógica comunicacional entre indivíduos, comunidades e culturas. Não sei se me en-gano, mas é essa perspectiva que começo a pressentir, um pouco, nas margens dos grupos de pesquisa, que estão cada vez mais a tomar um terreno que acho muito promissor, positivo e importante.

relação aos pesquisadores, no entanto, se quisermos ser realistas, infelizmente, nem sempre eles estão abertos à experiência interdisciplinar.Ainda persiste uma espécie de rivalidade, jeitos próprios de as equipes se defende-rem. No entanto, à medida que o número de professores titulares se torne suficiente, essa concorrência, digamos, profissional deixará de estar em jogo, então, a interação interdisciplinar dará frutos. Se a comunicação der esse salto, penso que se firmará como ciência, experiência, saber, investigação e projeto.

Senso comum

Um dos aspectos mais inte-ressantes na pesquisa em Comunicação é a capacidade que temos, hoje, de valorizar o senso comum, aquilo que eu chamaria conjunto de conhe-cimentos partilhados por uma comunidade. Durante muito tempo, as ciências positivas viveram a demarcação em relação ao senso comum. Hoje, se há coisas que os es-tudos da Comunicação podem trazer de novo à discussão é a atenção aos mecanismos de construção do senso comum. Este, talvez, seja o ponto cen-tral da mudança de paradigma que está a ocorrer na Comuni-cação no século XXI: fazer os cientistas se preocuparem não em descobrir as coisas nas cos-tas das pessoas, mas formular aquilo que elas sabem sobre as suas experiências. Costumo dizer aos meus alunos que não existe nada que eles não saibam já. Eles já sabem sob a forma inconsciente, implícita.O que os cientistas fazem é explicitar as leis que regulam os fenômenos. E este aspecto é, talvez, o ponto mais impor-tante que a Comunicação pode dar, hoje, ao meio científico: a descoberta da humildade do cientista perante o homem comum, do qual ele recebe as condições para pensar, para

racionalizar e para encontrar a razão de ser das coisas.

Inclusão linguística

Constantemente, estamos va-riando os registros da fala. Costumo distinguir as coisas, uma coisa é o discurso, outra coisa é a gramática. São domí-nios diferentes. Claro que eu utilizo a gramática para for-mular discursos, mas o discurso nem sempre é feito de frases gramaticais.Quando atendo ao telefone, digo “alô”, que não vem na gramática, mas é uma forma discursiva indicativa de que estou disponível para falar. Não me passa pela cabeça perguntar para um gramático se “alô” está gramaticalmente bem construído ou não. É uma forma discursiva. Quando fala-mos, não formulamos frases, dizemos enunciados, fazemos coisas, formulamos pedidos e nunca da mesma maneira.Costumo dizer que só um es-trangeiro fala gramaticalmente bem o português. Os nativos estão sempre inventando novas formas e contribuindo para a renovação da língua. Eles adap-tam a experiência linguística à situação concreta vivenciada. O estrangeiro, como não do-mina suficientemente a língua, apoia-se nas regras gramaticais para falar de maneira correta.Mas a língua é algo vivo como o meu coração, que bate todos os dias. n

Resistência

Em todos os meus trabalhos, venho buscando incentivar o diálogo das equipes de Co-municação com antropólo-gos, sociólogos, historiadores, economistas e linguistas, pois entendo que é fundamental a interação entre equipes e disciplinas. Infelizmente, as universidades nem sempre apoiam a iniciativa. Embora, no plano do discurso, favore-çam a interação, na prática, torna-se muito difícil aprovar projetos interdisciplinares. E por que é difícil? Porque é bas-tante complexa a constituição de equipes de avaliação e de equipes interdisciplinares. No entanto é impensável elaborar um projeto de investigação em Comunicação que prescinda de pessoas experientes de áreas disciplinares diferentes. Em

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Química

Para responder aos

questionamentos da indústria

farmacêutica, os pesquisadores

buscam parcerias para

realizar o experimento em

grande escala.

Planta eleva capacidade de raciocínio e de memória

Camapu induz produção de neurônios

FOTOS ALEXANdRE MORAES

n Amanda Pinho

Espécie de herbácea caracte-rística da Amazônia, a Physalis angulata produz um fruto

amarelo, o camapu, amplamente conhecido na região. A planta tem propriedades curativas e já é, in-clusive, estudada por produzir subs-tâncias que ajudam no tratamento da leishmaniose. Recentemente, o Grupo de Pesquisas Bioprospecção de Moléculas Ativas da Flora Ama-zônica, da Universidade Federal do Pará (UFPA), descobriu, também, a existência de propriedades neuro-gênicas em substâncias produzidas pela planta.

“descobrimos que tanto o extrato aquoso da planta quanto a substância purificada apresentam atividade neurogênica, ou seja, eles estimulam o crescimento de neurô-nios”, explica o professor Milton

Nascimento, integrante do Grupo de Pesquisa.

Com apoio da Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (PRO-PESP) e do governo do Estado, o gru-po, que também é composto pelos pesquisadores Alberto Arruda, Mara Arruda, Consuelo Yumiko, Gilmara Tavares, Raquel Carvalho Montene-gro e José Luiz do Nascimento, além dos alunos de Pós-Graduação Danila Alves e Marcos Vinícius Lebrego, busca convencer a indústria farma-cêutica da viabilidade da droga. O professor Milton Nascimento lembra, também, que os responsáveis pela pesquisa já patentearam os proces-sos de obtenção e farmacológico, tanto no mercado nacional quanto no internacional.

Ao relembrar o início da pes-quisa, em 2011, Milton Nascimento compara os resultados obtidos pela professora Gilmara Bastos com os de

Alexander Fleming, médico escocês que, acidentalmente, descobriu a penicilina. “Você faz um experi-mento olhando para um lado e, de repente, o experimento te revela outro, e foi o que aconteceu, espe-cificamente, com o extrato dessa planta”, explica.

Tratando-se de uma pesquisa completamente inédita, a proprie-dade neurogênica da substância produzida pela Physalis angulata pode vir a ser utilizada visando à elevação das capacidades de raciocí-nio e de memória, além de sinalizar uma possível reversão de morte neuronal que ocorre em pacientes com quadros de depressão, já que a substância induz o nascimento de novos neurônios. “Isso é uma coisa fantástica! O mundo vem buscando drogas capazes de induzir o cres-cimento neuronal”, comemora o professor.

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Do laboratório para a indústria farmacêuticaComprovada a eficácia e a eficiência da Physalis angulata, agora, o grupo irá pesquisar a capacidade produtiva e a sazonalidade da planta.

O grupo de pesquisa en-contra-se “no limite da produção acadêmica”, buscando responder aos questionamentos da indústria farmacêutica, quanto à capacidade de produção anual, à quantidade de biomassa necessária para se atingir tal produção e à área plantada exi-

gida para se alcançar tal quantidade de biomassa. Em laboratório, só se pode manusear alguns miligramas, enquanto, para atender as deman-das da indústria, a produção deve chegar à casa dos quilogramas. de acordo com Milton Nascimento, nesta etapa, o grupo pretende estabelecer

parcerias, justamente para superar tais dificuldades.

“Mais do que produzir a pes-quisa, queremos transformá-la em benefício: um produto da UFPA, um produto da Amazônia. Por isso, estamos buscando parcerias para res-ponder a essas perguntas”, conclui. n

Com a eficácia e a eficiência da droga comprovadas, os pesquisa-dores aguardam a segunda fase da pesquisa que, segundo o professor Milton Nascimento, é a saída da área acadêmica para a da indústria.

A pesquisa também deve gerar publicações, o que, na ava-liação do professor, é bom para o pesquisador, para a instituição e para os programas de pós-graduação envolvidos. “O grupo todo entende essa pesquisa como algo importante para a nossa instituição e para o Estado também”, afirma.

Apesar dos avanços, ainda há muito a ser feito nessa segunda fase

do projeto. No momento, os pesqui-sadores envolvidos estão trabalhan-do para oferecer mais subsídios que irão agregar valor à pesquisa. depois de comprovados os efeitos da droga, foram levantados questionamentos relativos à capacidade produtiva da planta e a sua sazonalidade, assim como a necessidade da execução de testes clínicos.

Milton Nascimento afirma que o processo se torna ainda mais delicado por se tratar de um pro-duto natural complexo, incapaz de ser sintetizado em laboratório, por exemplo. “Hoje, estamos fazendo o estudo de viabilidade, verificando

a capacidade produtiva da planta e sua sazonalidade, com o intuito de saber quanto material orgânico pode ser gerado por hectare plantado”, exemplifica o professor.

De acordo com o pesquisador, para o estudo sazonal da Physalis angulata, é necessário avaliar o metabolismo da planta e identificar, por exemplo, se a substância isolada está presente em todo o seu ciclo ve-getativo, em que momento do ciclo é atingido o auge da produção dessa substância e, assim, como observar se há diferença de comportamento nessa produção entre os períodos seco e chuvoso, típicos da região.

Grupo está “no limite da produção acadêmica”

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12 - Beira do rio - Dezembro e Janeiro, 2013

Feminicídio

Ao comparar as ocorrências

registradas nas delegacias

com os números do IML, Grupo verifi cou alto

índice de mortalidade

entre mulheres vítimas de violência.

Pesquisa levantou dados em delegacias, IML e imprensa local

Lei não diminui casos de violênciaELZA FIÚZA/ AGÊNCIA BRASIL

n Vitor Barros

Mesmo com a implantação da Lei Maria da Penha, em 2006, um dos marcos legais mais

avançados no mundo, em se tratan-do de coibição da violência contra as mulheres, o Brasil é o sétimo país no ranking mundial por crimes praticados contra mulheres. Dados do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) indicam que, de 2001 a 2011, 50 mil mulheres foram assassinadas. Segundo o Mapa da

Violência 2013, as principais vítimas foram mulheres entre 15 e 24 anos, isto é, em idade produtiva. Segundo pesquisa apresentada em audiência da Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos deputados, ocorrem cinco mil casos de assassi-nato de mulheres (feminicídio) por ano, no Brasil.

Esses são alguns dos números estarrecedores, sem contar os casos de agressão, abuso sexual, invali-dez por violência e outros crimes cometidos contra essa parcela da

população. Na Amazônia e, espe-cificamente, em Belém do Pará, essa realidade não é diferente e os casos chocam pela perversidade com que essas mulheres são tra-tadas pelos maridos, namorados e ex-companheiros. Pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA) têm-se debruçado nesse fenômeno, buscando apontar suas causas e defi -nindo estratégias que visam diminuir os casos de violência.

O Grupo de pesquisa “Vio-lência contra a mulher e o discurso da mídia paraoara”, coordenado pela professora Vera Lúcia Lima, da Faculdade de Enfermagem da UFPA, é a versão atual de um projeto que se iniciou em 2010, fazendo levan-tamentos de casos nas Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAM).

Na versão atual, o projeto faz um estudo quali-quantitativo das narrativas da mídia a partir da análise de conteúdo. O objetivo é compreender a magnitude do fenô-meno em números ofi ciais e intervir com estratégias de prevenção de violência utilizando a ação exten-sionista.

Reeducação de profi ssionais é necessáriode acordo com a professora

Vera Lúcia Lima, os estudos reali-zados constataram que a violência compromete as necessidades psico-lógicas e psicossociais de mulheres vítimas de violência. Mulheres que sofreram agressão têm a au-toestima, sexualidade e visão de seus relacionamentos amorosos alteradas. Isso pode ser percebido no momento em que as vítimas precisam decidir denunciar ou não os agressores.

Os resultados também re-velam que são necessárias ações de reeducação da população e dos profissionais da saúde para que eles sejam capazes de diagnosti-car, intervir e reduzir os índices de

violência doméstica. “Esse tema merece uma discussão multiprofi s-sional, envolvendo a Academia e as autoridades do Estado, buscando o fortalecimento de Políticas Pú-blicas e a implementação das leis que regem o problema. Além disso, devemos pensar meios e estratégias de conscientizar essas mulheres so-bre os seus direitos e incentivá-las a buscar ajuda para que não cheguem a sofrer uma violência extrema”.

Na pesquisa de campo feita na dEAM, foram entrevistadas 300 mulheres, cujo perfil é bastante peculiar. Segundo o levantamento, 23% delas estavam na faixa etá-ria entre 26 e 30 anos, 78% eram solteiras, 33,67% tinham o ensino

fundamental incompleto, nesse caso, a dependência fi nanceira em relação ao parceiro é maior. Outros dados destacam o estado físico em que essas mulheres chegam à dele-gacia. Muitas delas, vítimas de abuso sexual, com contusões, hematomas e outras agressões. Cerca de 80% dos casos aconteceram dentro de casa.

Segundo a professora, a vio-lência é um círculo que começa com discussões, chegando a casos de violência extrema, como esquarte-jamentos, cortes profundos, mortes por armas de fogo e outras agressões letais. “O círculo da discussão e do espancamento ocorre repetidas ve-zes, até chegar à violência máxima, que é a morte”, afi rma.

perFiL daS VÍtimaS

23% entre 26 e 30 anos

78% solteiras33,67% com ensino

fundamental incompleto

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Dezembro e Janeiro, 2013 - Beira do rio - 13

Feminicídio

Ações de prevenção em Icoaraci e Guamá

Uma das ações do projeto levou os participantes a investigar, nas delegacias, ocorrências em um período de três anos e comparar com as entradas no Instituo Médico Legal (IML), com a fi nalidade de verifi car se essas mulheres tinham morrido nesse intervalo de tempo. “Nós constatamos

que, nesse período, muitas mulheres foram vítimas de feminicídio, apesar de terem feito o registro nas delega-cias especializadas ou nas delegacias do bairro”, afi rma Vera Lúcia Lima.

É na ex tensão que a Universidade pode intervir nessa re-alidade. Segundo a professora, “indo

para as ruas, com ações de cons-cientização, conseguiremos atingir não apenas as mulheres vítimas de violência, mas também a população de um modo geral”. O grupo já visitou vários bairros, como Icoaraci e a co-munidade do Riacho Doce, no Guamá, com palestras e fóruns. n

Assassinatos de mulheres no Brasil

Fonte: Ipea* Ano de promulgação da lei

MARCELO CAMARGO/ AGÊNCIA BRASIL

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14 - Beira do rio - Dezembro e Janeiro, 2013

Literatura

Memorial do Livro reúne bibliotecas de intelectuais paraenses

Espaço para belas palavrasIGOR LIMA

O acervo do livreiro Raimundo

Jinkings faz parte do projeto.

Saiba maiS

Acesse o blog do projeto http://

morongueta.tumblr.com/

Entre os autores cujos acervos e bibliotecas farão parte do Memo-rial, destacam-se: Eneida de Moraes, cuja biblioteca comporta uma grande quantidade de autógrafos e dedica-tórias; José da Silveira Neto; Vicente Sales; Anunciada Chaves; Max Mar-tins; Clóvis Moraes Rego; Raimundo Jinkings e outros que ainda estão em fase de negociação.

A maioria das obras foi doada à UFPA pelas famílias desses auto-res. “A biblioteca do Clóvis Moraes

Rego, por exemplo, vamos tentar reconstruir o ambiente de trabalho dele tal e qual era quando ele parou de trabalhar. A ideia é que seja uma biblioteca memorial”, explica o pró-reitor.

Ocupando provisoriamente as instalações do Fórum Landi, o Memorial do Livro funciona sob os cuidados de uma bolsista e de um casal de voluntários. Posteriormen-te, o Memorial ocupará parte do antigo convento dos padres jesuítas

de Belém, nos fundos do Museu de Arte Sacra. O local passará, ainda, por obras físicas antes de abrigar o Memorial do Livro. O professor considera que se trata de um lo-cal privilegiado, “tendo a vista do Forte do Castelo, da Casa das Onze Janelas, do Ver-o-Peso e da baia do Guajará”.

Flávio Nassar conta um fato interessante: nesse mesmo lugar, por volta dos anos 1700, localizava-se a maior biblioteca da Amazônia. n

n Amanda Pinho

Do papiro ao pergaminho, os registros dos primeiros livros datam de antes mesmo do

nascimento de Cristo. Da mesma maneira que a morte do LP chegou a ser vislumbrada quando da aquisição dos CDs, a decadência do rádio com o surgimento da televisão, atual-mente, debate-se a morte dos livros impressos, sob o argumento de que tal formato encontra-se prestes a ser substituído pelas novas tecnolo-gias e novas mídias digitais.

Flávio Nassar, pró-reitor de Relações Internacionais da Universi-

dade Federal do Pará (UFPA), afirma que o livro “não vai ser mais a única forma e, talvez, já não seja a mais preponderante de transmissão de conhecimento”, mas, ainda assim, detém seu valor e foi graças ao conhecimento difundido por essa plataforma que pudemos configurar a nossa sociedade como a concebe-mos atualmente.

Por esse motivo, a Prointer desenvolve o Projeto Memorial do Livro Moronguetá. O nome, que, na língua indígena, significa “palavras cheias de beleza”, foi escolhido pelo próprio professor, o qual acre-dita que é essa a significação que

os amantes da leitura atribuem aos livros, “acreditamos que os livros contêm palavras cheias de beleza”.

O intuito do projeto é “ho-menagear o livro”, mas também a leitura e os grandes escritores e intelectuais paraenses que con-tribuíram com suas coleções e acervos pessoais para o Memorial. “O Memorial do Livro quer fazer esta homenagem não só ao livro, mas também aos nossos grandes intelectuais do século XX”, explica o professor.

Foi justamente na transição do século XIX para o século XX que os custos de produção e distribuição dos livros diminuíram, possibili-tando que várias pessoas criassem suas bibliotecas particulares. O Memorial contará com bibliotecas e acervo, que incluem anotações, do-cumentos e até mesmo objetos que procuram reconstruir o ambiente de criação desses intelectuais.

“Interessa não apenas sa-ber como Vicente Sales escreveu o Memorial da Cabanagem, mas também o que ele pesquisou, quais anotações fez, o que colecionou, enfim, como ele agia nesse perí-odo. Traçar o caminho intelectual do autor, buscar essas bibliotecas e preservá-las integralmente: as anotações, os papéis, as dedicató-rias. Tudo passa a ter significado”, explica o pró-reitor.

Projeto inclui acervo de Eneida de Moraes

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Dezembro e Janeiro, 2013 - Beira do rio - 15

A História na Charge

Em TempoGuamá Bilíngue IIAlém de ensinar a língua espanhola, o pro-jeto fomenta a formação cidadã, utilizando material didático elaborado especifica-mente para atender demandas de alunos de escolas públicas localizadas em zonas de vulnerabilidade social. O projeto é subsidiado pela Pró-Reitoria de Graduação, por meio do Programa de Apoio a Projetos de Intervenção Metodológica.

ParforEstão abertas as inscrições para o Plano Nacional de Formação de Professores da UFPA. Até o dia 13 de janeiro de 2014, pro-fessores da rede pública podem realizar a pré-inscrição para um dos 18 cursos de licenciatura, entre eles, Pedagogia, História e Artes Visuais. Mais informações na Plataforma Freire < http://freire.mec.gov.br/index/principal>

Guamá Bilíngue Projeto Guamá Bilíngue foi apresentado no Congresso Cátedra Unesco, realizado em novembro, na Argentina. Funcionando desde 2009, o projeto promove a educação em língua espanhola em duas escolas públicas localizadas no bairro Guamá. As aulas ocorrem três vezes por semana, nas salas de aula da Faculdade de Línguas Estrangeiras Modernas (Falem).

Distribuiçãodesde novembro, o Jornal Beira do Rio tem quatro pontos fixos de distribuição da sua versão impressa: Biblioteca, Centro de Convenções, RUs Básico e Profissional. Em cada um desses espaços, foram insta-ladas caixas que receberão exemplares a cada nova edição. Se preferir, o leitor também pode acessar o site http://www.jornalbeiradorio.ufpa.br/novo/

CaminharO Serviço de Crescimento e desenvolvi-mento Caminhar, do Hospital Universitário Bettina Ferro de Souza, está arrecadando brinquedos, jogos, dVds educativos, re-vistas em quadrinhos para realizar o Natal das crianças atendidas pelo Serviço. Os produtos podem ser entregues no Hospital, das 9h às 17h, de segunda a sexta-feira. Informações: (91) 3201-8572.

JustiçaO Laboratório de Justiça Global e Educação em Direitos Humanos na Amazônia, vincu-lado ao Instituto de Ciências Jurídicas da UFPA, firmou parceria com a Universidade de Frankfurt para realizar projeto de pesqui-sa-intervenção. Entre os resultados, está a Série “dHiaLOGOS - Lugar de direitos”, en-contros mensais que propõem a construção de um pensamento acadêmico.

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