Barroso, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de Suas Normas.

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Barros, Luís Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas: limites e possibilidades da Constituição brasileira. 7. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. P. 75 CAP 4 – A EFETIVIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS 1. As normas jurídicas constitucionais Norma jurídica: conceito material de lei. Ato jurídico emanado do Estado. Regra geral, abstrata e obrigatória, com o fim de ordenamento da vida coletiva. Forma de conduta imposta aos homens por um poder soberano e cuja observância é por este garantida e tutelada. P. 76 Revestem-se de uma característica: a imperatividade. P. 77 Duas grandes categorias: COGENTES – são preceptivas (obrigam a uma conduta) ou proibitivas (vedam conduta). Essência: impor-se à vontade de seus destinatários. Não há margem à vontade individual. DISPOSITIVAS – destinatários tem liberdade de disporem de maneira diversa da situação tipificada na norma, somente aplicada na obscuridade ou omissão da vontade dos interessados. Não há ausência de imperatividade, mas uma graduação de seu teor. Normas dispositivas: imperatividade, conforme vontade do legislador, dependente de uma condição. A Constituição é um sistema de normas jurídicas. Institui o Estado, organiza o exercício do poder político, define direitos fundamentais e traça os fins públicos. P. 78 “É constitucional toda e qualquer norma inscrita em uma Constituição rígida, que, dotada de supremacia, situa-se no vértice do ordenamento jurídico, servindo de fundamento de validade de todas as demais normas”.

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Barros, Luís Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas: limites e possibilidades da Constituição brasileira. 7. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.

P. 75

CAP 4 – A EFETIVIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

1. As normas jurídicas constitucionais

Norma jurídica: conceito material de lei. Ato jurídico emanado do Estado. Regra geral, abstrata e obrigatória, com o fim de ordenamento da vida coletiva. Forma de conduta imposta aos homens por um poder soberano e cuja observância é por este garantida e tutelada.

P. 76

Revestem-se de uma característica: a imperatividade.

P. 77

Duas grandes categorias: COGENTES – são preceptivas (obrigam a uma conduta) ou proibitivas (vedam conduta). Essência: impor-se à vontade de seus destinatários. Não há margem à vontade individual. DISPOSITIVAS – destinatários tem liberdade de disporem de maneira diversa da situação tipificada na norma, somente aplicada na obscuridade ou omissão da vontade dos interessados.

Não há ausência de imperatividade, mas uma graduação de seu teor. Normas dispositivas: imperatividade, conforme vontade do legislador, dependente de uma condição.

A Constituição é um sistema de normas jurídicas. Institui o Estado, organiza o exercício do poder político, define direitos fundamentais e traça os fins públicos.

P. 78

“É constitucional toda e qualquer norma inscrita em uma Constituição rígida, que, dotada de supremacia, situa-se no vértice do ordenamento jurídico, servindo de fundamento de validade de todas as demais normas”.

Normas constitucionais: espécie de norma jurídica. Atributo essencial: imperatividade. São um mandamento, prescrição, ordem, com força jurídica e não apenas moral. Tem um caráter hierarquicamente superior.

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“Até hoje não se elaborou um mecanismo para neutralizar os excessos do constituinte, originário ou revisional, sem que com isso se comprometa o caráter normativo do Texto”.

2. Existência, validade e eficácia dos atos jurídicos em geral.

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“As regras de direito, portanto, consistem na atribuição de efeitos jurídicos aos fatos da vida, dando-lhes um peculiar modo de ser”.

“Os fatos jurídicos resultantes de uma manifestação de vontade denominam-se atos jurídicos”. Atos jurídicos: comportam análise cientifica em três planos distintos e inconfundíveis: existência, validade e eficácia.

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Existência: presentes os elementos constitutivos definidos pela lei como causa eficiente de sua incidência. Comuns (agente, objeto e forma) e específicos.

A ausência, deficiência ou insuficiência dos pressupostos materiais torna o ato inexistente.

Validade: elementos do ato preenchem atributos, requisitos legais.

Elemento: agente público. Atributo: competente. Forma: verbal/escrita, pública/privada. Objeto: lícito e possível.

“Se presentes os elementos agente, forma e objeto, suficientes à incidência da lei, o ato será existente”.

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Presentes os requisitos competência, forma e licitude: será válido.

Ausência de requisitos conduz á invalidade. Maior ou menor gravidade da violação, nulidade ou anulabilidade.

Lei que contraria a CF, por vício formal/material, não é inexistente. É norma inválida, por desconformidade com regramento superior. Não se confunde com validade técnico-formal, que designa a vigência de uma norma, sua existência jurídica e aplicabilidade.

Eficácia: aptidão para a produção de efeitos. Atinge a finalidade para a qual foi gerado. Jurídica: qualidade de produzir seus efeitos típicos. Diz respeito à aplicabilidade, exigibilidade ou Executoriedade da norma.

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3. Conceito de Efetividade

Distinção eficácia jurídica e social. Eficácia social: é a concretização do comando normativo, sua força operativa no mundo dos fatos.

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Eficácia social, mecanismos para real aplicação da norma, para sua efetividade.

Efetividade. Kelsen. “Fato real de ela ser efetivamente aplicada e observada, da circunstância de uma conduta humana conforme à norma se verificar na ordem dos fatos”.

“Realização do Direito, o desempenho concreto de sua função social”.

Efetividade das normas depende da eficácia jurídica. “Se o efeito jurídico pretendido pela norma for irrealizável, não há efetividade possível”.

“A efetividade das normas jurídicas resulta, comumente, do seu cumprimento espontâneo”.

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“o Direito existe para realizar-se”.

“É precisamente a presença da sanção que garante a eficácia de uma norma jurídica”. (...)

Direito Constitucional as sanções podem ser uma pena, execução civil ou a da responsabilização política.

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“A perspectiva de um Direito Constitucional timbrado pela efetividade conduz a pressupostos que assim se resumem”:

1. CF tem vocação prospectiva e transformadora, mas de ter limites razoáveis quantos as relações das quais cuida;

2. Normas CF têm sempre eficácia jurídica, imperativas e não observá-las enseja a coação;

3. Normas CF devem estruturar-se e ordenar-se de modo a pronta identificação da posição jurídica dos jurisdicionados;

4. Posições devem ser resguardadas por instrumentos de tutela adequados, aptos à sua realização prática.

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CAP V - UMA TIPOLOGIA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

1. Algumas classificações existentes.

JAS

a. Eficácia plena e aplicabilidade imediatab. Eficácia contida e aplicabilidade imediatac. Eficácia limitada. Dependentes de integração infraconstitucional

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Celso Ribeiro Bastos. Quanto ao modo de incidência: integração ou de mera aplicação. Quanto a produção de efeitos: parcial ou plena.

Bandeira de Mello. Distintas posições em que os administrados se veem investidos em decorrência das regras contidas na Lei maior: concessivas de poderes jurídicos; de direitos; indicadoras de finalidade a ser atingida.

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2. A sistematização proposta

“O objetivo visado é, sobretudo, reduzir a discricionariedade dos poderes públicos na aplicação da Lei fundamental e propiciar um critério mais científico à interpretação constitucional pelo Judiciário, notadamente no que diz respeito aos comportamentos omissivos do Executivo e do Legislativo”.

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“uma Constituição organiza o exercício do poder político, define os direitos fundamentais dos indivíduos e traça os fins públicos a serem alcançados pelo Estado”.

A. NORMAS CONSTITUCIONAIS DE ORGANIZAÇÃO: têm por objeto organizar o exercício do poder político;

B. NORMAS CONSTITUCIONAIS DEFINIDORAS DE DIREITOS: seu objeto é fixar os direitos fundamentais dos indivíduos;

C. NORMAS CONSTITUCIONAIS PROGRAMÁTICAS: têm por objeto traçar os fins públicos a serem alcançados pelo Estado.

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3. Normas constitucionais de organização

“a Constituição contém o arcabouço da organização política do Estado”. Ela institui os órgãos, competências e formas e processos de exercício do poder político.

“Há, portanto, em toda Lei fundamental, uma específica categoria de regras, com uma estrutura normativa própria, destinada à ordenação dos poderes estatais, à criação e estruturação de entidades e órgãos púbicos, á distribuição de suas atribuições bem como à identificação e aplicação de outros atos normativos”.

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Normas de conduta. Direito destina-se, fundamentalmente, a reger comportamentos, em função de valores cuja preservação foi tida por conveniente. Regras de composição dúplice: fato e consequência jurídica. Reale. Hipótese (ou fato tipo) e dispositivo (ou preceito). É redutível a um juízo ou proposição hipotética.

Normas de organização. “Estas não se destinam a disciplinar comportamentos de indivíduos ou grupos; têm um caráter instrumental e precedem, logicamente, a incidência das demais”.

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“Elas possuem um efeito constitutivo imediato das situações que enunciam”.

São elas traços tipificadores do Direito Constitucional.

Variedade de conteúdo.

A. Decisões políticas fundamentais. Definem forma de Estado e de governo, a divisão orgânica do poder ou o sistema de governo.

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B. Definem as competências dos órgãos constitucionais e das entidades estatais;

C. criam órgãos públicos, autorizam sua criação, traçam as regras à sua composição e funcionamento.

D. estabelecem normas processuais ou procedimentais de revisão da Constituição, defesa da Constituição, aplicação de outras normas, elaboração legislativa, fiscalização.

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Se dirigem, na generalidade dos casos, aos próprios Poderes do Estado e seus agentes. Repercutem na esfera jurídica dos indivíduos.

4. Normas Constitucionais Definidoras de Direitos.

Direitos fundamentais: políticos, individuais, sociais e difusos.

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Políticos: nacionalidade e cidadania.

Individuais: liberdades públicas. “limitações ao poder político, traçando a esfera de proteção jurídica do indivíduo em face do Estado”. Impõem deveres de abstenção aos órgãos públicos, preservando a iniciativa e a autonomia dos particulares.

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Sociais: econômicos, sociais e culturais. Estado tem certos deveres de prestações positivas, visando à melhoria das condições de vida e à promoção da igualdade material. Direitos individuais: escudo protetor em face do Estado. Direitos sociais: “barreiras defensivas do indivíduo perante a dominação econômica de outros indivíduos” (CB Mello).

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Coletivos e difusos. Caracterizam-se por pertencerem a uma série indeterminada de sujeitos e pela indivisibilidade de seu objeto. Satisfação de um dos seus titulares implica na satisfação de todos. Lesão de um só constitui lesão da inteira coletividade.

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Direito subjetivo: o poder de ação, assente no direito objetivo, e destinado à satisfação de certo interesse. Norma jurídica de conduta dirige-se a duas partes: a uma atribui a faculdade de exigir da outra determinado comportamento.

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Um elo entre dois componentes: direito subjetivo e o dever jurídico. Direito subjetivo público: exigibilidade de uma conduta em favor do particular em face do Estado.

Características presentes cumulativamente: dever jurídico correspondente; é violável; ordem jurídica dá um meio jurídico para exigir-lhe o cumprimento.

Normas constitucionais definidoras de direitos enquadram-se no esquema conceitual: dever jurídico, violabilidade e pretensão. “Delas resultam, portanto, para os seus beneficiários – os titulares do direito – situações jurídicas imediatamente desfrutáveis, a serem materializadas em prestações positivas ou negativas”.

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“Modernamente, já não cabe negar o caráter jurídico e, pois, a exigibilidade e acionabilidade dos direitos fundamentais, na sua múltipla tipologia”.

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“Os direitos sociais visam à tutela desses bens jurídicos e, nesse sentido, constituem verdadeiros pressupostos para o exercício dos demais direitos e liberdades”.

“A efetivação dos direitos sociais é, indiscutivelmente, mais complexa do que a das demais categorias”.

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“Esses direitos, como intuitivo, tutelam, em última análise, interesses e bens voltados à realização da justiça social”. Produzem efeitos que investem os jurisdicionados em posições jurídicas que:

a. Geram situações prontamente desfrutáveis, dependem apenas de uma abstenção: O dever jurídico consiste não em uma atuação, mas numa omissão, um não fazer, normalmente dirigido ao Estado. Ex. GREVE.

b. Ensejam a exigibilidade de prestações positivas do Estado. Dever jurídico consiste em uma atuação efetiva. “Os limites econômicos derivam do fato de que certas prestações hão de situar-se dentro da “reserva do possível””.

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c. Contemplam interesses cuja realização depende da edição de norma infraconstitucional integradora.

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“Constituição não delega ao legislador competência para conceder aqueles direitos; concede-os ela própria. Ao órgão legislativo cabe, tão somente, instrumentalizar sua realização, regulamentando-os”.

“os direitos sociais, nas hipóteses em que não são prontamente desfrutáveis, dependem, em geral, de prestações positivas do Poder Executivo ou de providencias normativas do Poder Legislativo”.

Concretização dos direitos difusos. Trajetória de sucesso: elaboração legislativa; aspecto processual e produção doutrinária.

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Direito. Situações jurídicas que propiciam a exigibilidade efetiva de determinada conduta, correspondente a um dever jurídico de outrem, realizável por prestações positivas ou negativas.

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“Assim, onde se lhe assegura um direito, saber-se-á que se encontra ele investido no poder jurídico de exigir prontamente uma prestação, via Poder Judiciário, sempre que o sujeito passivo deixar de satisfazê-la. Onde se cuidar de um simples programa de ação futura, não será utilizada, por via direta ou indireta, a palavra direito”.

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“direito é direito e, ao ângulo subjetivo, ele designa uma específica posição jurídica. Não pode o Poder Judiciário negar-lhe a tutela, quando requerida, sob o fundamento de ser um direito não exigível. Juridicamente, isso não existe”.

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5. Normas Constitucionais Programáticas

“O Estado, com criação da razão humana, destina-se à consecução de determinados fins”. Bem comum.

Estado intervencionista. Incorporaram-se ao lado dos direitos políticos e individuais, regras para conforma a ordem econômica e social à justiça social e realização espiritual, considerando o indivíduo em sua dimensão comunitária, para protegê-lo das desigualdades econômicas e elevar-lhe as condições de vida, em sentido mais amplo.

Disposições indicadoras de fins sociais a serem alcançados. Objeto: estabelecer princípios ou fixar programas de ação para o Poder Público.

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“Modernamente, a elas é reconhecido um valor jurídico idêntico ao dos restantes preceitos da Constituição, como cláusulas vinculativas, contribuindo para o sistema através do princípios, dos fins e dos valores que incorporam”.

CB Mello: as regras desta categoria apenas explicitam fins, sem indicação dos meios previstos para alcança-los.

“seria errôneo supor que as regras programáticas não sejam dotadas de qualquer valia”. JAS: não há norma constitucional alguma destituída de eficácia jurídica.

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“perspectiva de efetividade, de real concretização do preceito no mundo fático”.

Efeitos diferidos. “Neste segundo grupo, em que a produção de resultados é transposta para um momento futuro, o controle exercitável sobre a efetivação da norma é frágil. Isto porque, dependendo a realização do comando constitucional de uma atividade estatal, a ser desenvolvida segundo critérios de conveniência e oportunidade, a discricionariedade de tal competência exclui a intervenção judicial para sua concreção efetiva. Passa-se diferentemente quanto aos efeitos imediatos, cujo cumprimento é desde logo sindicável”.

Dirigidas aos órgãos estatais, informam a atuação do Legislativo, Administração e do Judiciário.

Delas não resulta para o indivíduo o direito subjetivo de exigir uma determinada prestação, mas fazem nascer um direito subjetivo “negativo”, de exigir do Poder Público que se abstenha de praticar atos que contravenham os seus ditames. Não prescrevem uma conduta exigível, mas indiretamente invalidam determinados comportamentos antagônicos.

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Efeitos imediatos:

a. Revogam atos normativos anteriores em sentido colidente com o princípio que substanciam;

b. Carreiam um juízo de inconstitucionalidade para atos normativos posteriores incompatíveis;

Ângulo subjetivo, de imediato, dão direito ao administrado de:

a. Opor-se judicialmente a cumprir regras ou atos contrários ao disposto constitucional;b. Obter, jurisdicionalmente, interpretação e decisão no mesmo sentido e direção,

sempre que haja interesses constitucionais protegidos;

“O fato de uma regra constitucional contemplar determinado direito cujo exercício dependa de legislação integradora não a torna, só por isto, programática”.