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1 Ano 7 . Número 13 . Julho / Agosto / Setembro / 2011 Do Escritório Professor René BOLETIM TRIMESTRAL DIREITOS E GARANTIAS DO CLIENTE RENÉ ARIEL DOTTI Entre as definições do dicionário Houaiss, uma delas afirma que o cliente é “a pessoa que confia a defesa de seus in- teresses ou direitos a um advogado, procu- rador ou tabelião. Constituinte”. No seu ministério privado, o Advo- gado presta serviço público e exerce função social. A Constituição o considera indispensável” à administração da Justi- ça. A lei e os regulamentos estabelecem seus direitos e deveres perante clientes, a sociedade e os poderes públicos. Mas, sob outro aspecto, a procuração assina- da para a representação judicial ou ex- trajudicial é o instrumento do mandato, ou seja, do contrato que prevê direitos e garantias em favor do constituinte. Eis alguns deles: (1º) Ser ouvido detalha- damente sobre a natureza e as circuns- tâncias da causa que apresenta; (2º) Ser orientado sobre a viabilidade legal do direito ou do interesse que supõe existir em seu favor; (3º) Ser informado com eficiência e presteza sobre o andamento do processo em que é parte; (4º) Ter a liberdade de tomar decisões para acor- EDITORIAL René Ariel Dotti . Rogéria Dotti . Julio Brotto . Patrícia Nymberg . Alexandre Knopfholz . Fernanda Pederneiras . Francisco Zardo . Vanessa Scheremeta José Roberto Trautwein . Fernando Welter . Gustavo Scandelari . Murilo Varasquim . Rafael de Melo . Vanessa Cani . Cícero Luvizotto . Mariana Guimarães Luis Otávio Sales . Guilherme Alonso . Thais Guimarães . Alisson Nichel . Laís Bergstein . Gilliane Pombo . André Meerholz . Renata Steiner dos em se tratando de direito disponível, como os patrimoniais, após devidamen- te orientado pelo Advogado sobre as res- pectivas vantagens e desvantagens; (5º) Ter respeitada a sua dignidade humana independentemente da concepção ex- terna a respeito de sua conduta, rela- tiva ou não à causa; (6º) Ser protegido, como cidadão, contra qualquer forma de sensacionalismo dos meios de comuni- cação social acerca de fato ou conceito que lhe seja atribuído e ajustando com o seu advogado a necessidade e oportuni- dade de resposta ou retificação; (7º) Ser atendido em dia e horário previamente agendados e ser correspondido; (8) Ter mantida a sua inviolabilidade da inti- midade, da vida privada, da honra e de sua imagem nas relações oriundas do mandato; (9º) Receber relatórios sobre a situação da causa e prestação de con- tas de valores pagos, como honorários e custas contratuais; (10) Compreender que a advocacia deve ser sempre uma atividade de empenho e, quando possí- vel, de resultado.

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Ano 7 . Número 13 . Julho / Agosto / Setembro / 2011

Do Escritório Professor RenéB O L E T I M T R I M E S T R A L

DIREITOS E GARANTIAS DO CLIENTE

RENÉ ARIEL DOTTI

Entre as definições do dicionário

Houaiss, uma delas afirma que o cliente

é “a pessoa que confia a defesa de seus in-

teresses ou direitos a um advogado, procu-

rador ou tabelião. Constituinte”.

No seu ministério privado, o Advo-

gado presta serviço público e exerce

função social. A Constituição o considera

“indispensável” à administração da Justi-

ça. A lei e os regulamentos estabelecem

seus direitos e deveres perante clientes,

a sociedade e os poderes públicos. Mas,

sob outro aspecto, a procuração assina-

da para a representação judicial ou ex-

trajudicial é o instrumento do mandato,

ou seja, do contrato que prevê direitos

e garantias em favor do constituinte. Eis

alguns deles: (1º) Ser ouvido detalha-

damente sobre a natureza e as circuns-

tâncias da causa que apresenta; (2º) Ser

orientado sobre a viabilidade legal do

direito ou do interesse que supõe existir

em seu favor; (3º) Ser informado com

eficiência e presteza sobre o andamento

do processo em que é parte; (4º) Ter a

liberdade de tomar decisões para acor-

EDITORIAL

René Ariel Dotti . Rogéria Dotti . Julio Brotto . Patrícia Nymberg . Alexandre Knopfholz . Fernanda Pederneiras . Francisco Zardo . Vanessa Scheremeta

José Roberto Trautwein . Fernando Welter . Gustavo Scandelari . Murilo Varasquim . Rafael de Melo . Vanessa Cani . Cícero Luvizotto . Mariana Guimarães

Luis Otávio Sales . Guilherme Alonso . Thais Guimarães . Alisson Nichel . Laís Bergstein . Gilliane Pombo . André Meerholz . Renata Steiner

dos em se tratando de direito disponível,

como os patrimoniais, após devidamen-

te orientado pelo Advogado sobre as res-

pectivas vantagens e desvantagens; (5º)

Ter respeitada a sua dignidade humana

independentemente da concepção ex-

terna a respeito de sua conduta, rela-

tiva ou não à causa; (6º) Ser protegido,

como cidadão, contra qualquer forma de

sensacionalismo dos meios de comuni-

cação social acerca de fato ou conceito

que lhe seja atribuído e ajustando com o

seu advogado a necessidade e oportuni-

dade de resposta ou retificação; (7º) Ser

atendido em dia e horário previamente

agendados e ser correspondido; (8) Ter

mantida a sua inviolabilidade da inti-

midade, da vida privada, da honra e de

sua imagem nas relações oriundas do

mandato; (9º) Receber relatórios sobre

a situação da causa e prestação de con-

tas de valores pagos, como honorários

e custas contratuais; (10) Compreender

que a advocacia deve ser sempre uma

atividade de empenho e, quando possí-

vel, de resultado.

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Em tempos primitivos, quando os israelitas ainda estavam no Egito, eles tinham as suas próprias leis. Segundo a Bíblia, os primeiros magistrados regula-res foram reconhecidos através do con-selho de Jetro (sogro de Moisés), que, ao observar que a força de um só homem não era proporcional à tarefa de julgar uma nação inteira, disse-lhe que mais homens deveriam ser selecionados para tal função (Êx. 18, 14-26).

Moisés foi o primeiro desses magistra-dos civis que julgava e declarava os esta-tutos de Deus e de suas leis para os que o procuravam por alguma razão. A partir do conselho dado por Jetro – que deixa a entender que Moisés se encontrava sobrecarregado – homens capacitados e selecionados de acordo com os critérios da época eram escolhidos para ajuda-lo, julgando somente as causas mais simples, conforme texto bíblico citado no livro de Êxodo 18; 22: “e julguem eles o povo em todo o tempo. Que a ti tragam toda causa grave, mas toda causa pequena eles mes-mos a julguem; assim a ti mesmo te alivia-rás da carga, e eles a levarão contigo”.

Em 19/05/2011 o SUPREMO TRIBU-NAL FEDERAL declarou inconstitucional o art. 78 do Ato das Disposições Consti-tucionais Transitórias (ADCT), acrescen-tado pela Emenda nº 30/2000. A redação original do art. 100 da Constituição Fede-ral previa que os débitos constantes dos precatórios judiciários apresentados até 1º de julho seriam pagos pela Fazenda Pública até final do exercício seguinte.

A Emenda n° 30/2000 mudou essa regra, dispondo, por meio do art. 78 do ADCT, que os precatórios pendentes na data de sua promulgação e os que de-corram das ações judiciais ajuizadas até 30/12/1999 seriam pagos em até dez

Não há registros de como aqueles juízes eram nomeados, nem a forma cor-reta da sucessão, mas se pode entender claramente que eles possuíam grande autoridade e que os negócios públicos podiam prosseguir conforme as deci-sões por eles tomadas, independente-mente de qualquer corpo legislativo.

Pode-se, assim, entender que desde os primórdios o homem sempre teve a no-ção da Justiça, do Direito e da importân-cia dos códigos e das leis em geral para a organização de uma sociedade mais justa em que pudesse viver harmoniosamente com seus pares. Mesmo naquele tempo em que ainda era pouco culto e civilizado e vivia com dificuldades de toda ordem, já concebia e mantinha os valores morais tão necessários à construção de uma so-ciedade mais justa e humana.

Foi da humildade de Moisés, ao reco-nhecer que o conselho de seu sogro era muito valioso, que se originou a divisão da responsabilidade com outros homens para conhecer e sentenciar, assim como ocorre ainda hoje na estrutura e serviços do Poder Judiciário nas diversas instân-

cias. Os prédios dos fóruns em geral – e com destaque para os tribunais – melho-raram as suas estruturas físicas e eletrôni-cas; o Poder Judiciário estimulou a teoria e a prática do Direito e aprimoraram-se as áreas com especializações respecti-vas. Mas, como o homem é imperfeito, sabe que as leis sociais são mutáveis, que deve se atualizar conforme a evolu-ção dos costumes e a modernização dos tempos. Deve ser por isso que livros tão antigos como a Bíblia continuam descre-vendo de modo simples algumas verda-des que, tanto nas organizações sociais quanto no comportamento dos homens, ainda se constatam.

Todos, sobretudo os juízes, mesmo com todo o acesso à informação e tantas outras facilidades estruturais, precisam ter a consciência de que nem só de pão vive o homem (Mateus 4,4); que os valores mo-rais e espirituais são bússolas a nortearem a trajetória do homem em busca do equilí-brio e da verdade, para melhor compreen-der e aplicar a justiça de forma que a priori-dade seja a valorização da vida, como nos ensinam as Sagradas Escrituras.

FRANCISCO ZARDO

JUÍZES NAS SAGRADAS ESCRITURAS

DIREITO ADMINISTRATIVO

MARLI LEALSecretária Executiva

MARCELE MALLMANN Acadêmica de Secretariado Executivo

prestações anuais.Segundo o Supremo, ao modificar o

regime dos precatórios anteriores à sua promulgação, a Emenda nº 30 “violou o direito do beneficiário do precatório, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. “Aten-tou ainda contra a independência do Po-der Judiciário, cuja autoridade é insuscetí-vel de ser negada, máxime no concernente ao exercício do poder de julgar os litígios que lhe são submetidos e fazer cumpridas as suas decisões, inclusive contra a Fazen-da Pública, na forma prevista na Constitui-ção e na lei”.

Trata-se de um importante preceden-te, que poderá balizar o pronunciamento

do STF sobre a constitucionalidade da Emenda nº 62/2009. Por meio dessa Emen-da, incluiu-se o art. 97 no ADCT, segundo o qual os precatórios vencidos serão pagos em até 15 (quinze) anos ou à medida da disponibilidade financeira dos Estados e Municípios, que deverão destinar para esse fim de 1% a 2% de sua receita líquida.

Em Ação conjunta, a OAB e as Asso-ciações dos Magistrados e dos membros do Ministério Público requereram a de-claração de inconstitucionalidade desse dispositivo. O julgamento pelo plenário do STF foi iniciado no dia 16/06/2011, mas foi suspenso após a análise das preli-minares pelo relator, Min. AYRES BRITTO.

STF SUSPENDE A EFICÁCIA DE EMENDA CONSTITUCIONAL QUE PERMITIU O PARCELAMENTO DE PRECATÓRIOS

DIREITO ADMINISTRATIVO

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CONTRATO ADMINISTRATIVO: MANUTENÇÃO DOS REQUISITOS DE HABILITAÇÃO MARIANA GUIMARÃES

DIREITO ADMINISTRATIVO

Em tese, todos têm o direito público subjetivo de participar de licitações pro-movidas pelo Poder Público. Contudo, isso está condicionado à demonstração de idoneidade e de condições de executar o futuro contrato. Para tanto os proponen-tes devem preencher os requisitos de ha-bilitação previstos na lei e no edital, quais sejam (a) capacidade jurídica, (b) qualifi-cação técnica, (c) qualificação econômico-financeira, e (d) regularidade fiscal (Lei nº 8.666/93, art. 27 e ss.). E, a partir de 2012, também deverá ser comprovada a regula-

ridade trabalhista (Lei nº 12.440/2011). Essa verificação é feita no curso da

disputa, mas aí não se esgota. Isso pois é “obrigação do contratado de manter, durante toda a execução do contrato, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação” (Lei nº 8.666/93, art. 55, XIII). Como obrigação contratual, seu des-cumprimento implicará na rescisão do ajuste, sem prejuízo da aplicação de ou-tras sanções.

Além disso, o TCU entende ser neces-sária a “inclusão, em editais e contratos de execução continuada ou parcelada, de cláusula que estabeleça a possibilidade de subordinação do pagamento à compro-vação, por parte da contratada, da manu-tenção de todas as condições de habilita-ção” (Ac. 837/08-Plenário).

Portanto, o particular deve observar o preenchimento das condições de ha-bilitação não só para se sagrar vencedor da disputa e celebrar o contrato, mas também para mantê-lo.

O uso de tecnologia de acesso remo-to nas assembleias dos fundos de inves-timentos esbarrava na falta de regula-mentação específica quanto ao repasse de informações dos cotistas às empresas prestadoras do serviço. Nesta lacuna ha-veria um potencial conflito com o direito ao sigilo das informações, assegurado pela Lei Complementar nº 105/01.

No processo RJ2010/12738, a CVM supriu a lacuna mencionada, nos ter-mos do voto do Diretor Relator OTÁVIO YAZBEK: “Não encontro óbice legal para o prestador de serviços técnicos especializa-

A PARTICIPAÇÃO VIA ACESSO REMOTO EM ASSEMBLEIAS DE FUNDOS DE INVESTIMENTOS

ANDRÉ MEERHOLZ

dos, contratado pelo administrador fundo e signatário de termo de confidencialida-de, possa ter acesso àquelas informações individuais com o fim de estruturar plata-forma eletrônica nos moldes propostos. Entendo, porém, em especial ante a con-sideração do disposto no art. 40, III e §1º, da Instrução CVM 409, de 18.08.2004, que o compartilhamento daquelas informa-ções e a própria prestação do serviço pela Consulente, devem ser previamente comu-nicados aos cotistas. Considero desneces-sária, todavia, a obtenção de anuência de cada um deles para a adoção, de tal solu-

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR: EXIGÊNCIA DE PROVA ROBUSTA PARA PUNIR

ALISSON NICHEL

O poder de punir por meio de Pro-cesso Administrativo Disciplinar conferi-do ao Poder Público, direito sancionador por essência, está limitado e condicio-nado pelo princípio constitucional da presunção de inocência, segundo o qual ninguém será considerado culpado até que se prove o contrário (CF, art. 5º, LVII). Uma das decorrências imediatas desta garantia fundamental é a de que o ônus

da prova cabe, sempre, a quem acusa.Isto é: para punir, o Poder Público de-

verá provar (após assegurar ao acusado o direito ao contraditório e à ampla de-fesa) que as denúncias feitas no Processo são procedentes.

Simples indícios e provas indiretas não têm o condão de afastar a presunção de inocência, exigindo-se, para tanto, provas robustas. Este é o entendimento

do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA: “A proporcionalidade da sanção aplicada resta comprometida quando não se vis-lumbram, no conjunto de provas colacio-nado aos autos, elementos de convicção que desafiem a persistência de dúvidas ou incertezas quanto ao fato típico imputado ao agente” (STJ, 3ª Seção, Mandado de Se-gurança nº 12957, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO).

ção. A manutenção da responsabilidade nos detentores originais das informações justifica, a meu ver, tal posição”.

Frise-se que a decisão interessa ain-da as sociedades por ações, dado o teor do §único no art. 127 da Lei nº 6.404/64, acrescido pelo art. 6º da Lei nº 12.431/11: “Nas companhias abertas, o acionista pode-rá participar e votar a distância em assem-bleia geral, nos termos da regulamentação da Comissão de Valores Mobiliários.” Deste modo, a decisão da CVM pode ser uma di-retriz de como a questão poderá ser regu-lamentada no âmbito destas sociedades.

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IMPOSSIBILIDADE DE SEQUESTRO CIVIL DO BEM DE FAMÍLIA

O sequestro, para o Direito Proces-sual, é uma medida cautelar específica que objetiva garantir a integridade de um bem (móveis, imóveis, rendimentos, dentre outros) que é objeto de discussão judicial. Igualmente, visa garantir a efeti-vidade de futura execução contra o de-vedor. Quando deferido o pedido de se-questro, esse bem permanece vinculado ao processo até que se encerre a discus-são acerca de sua posse ou propriedade.

Quando utilizado como garantia da execução, não se admite que o objeto do sequestro seja um bem de família. Foi isso que decidiu o Superior Tribunal

de Justiça em abril deste ano ao julgar o Recurso Especial n° 1245466. Para o re-lator, Ministro MAURO CAMPBELL MAR-QUES, quando a lei excepcionou o bem de família da penhora, ela também o protegeu, indiretamente, “...das medidas acauteladoras que se destinam a resguar-dar, no patrimônio do devedor, a solvência da dívida.”

No julgamento do aludido Recurso, o STJ adotou o entendimento de que se determinado bem, na execução, não po-derá ser objeto de penhora, não haveria sentido ou utilidade em se admitir o seu sequestro, já que, de qualquer sorte esse

JULIO BROTTO

ROGÉRIA DOTTI

SUCUMBÊNCIA RECURSAL:UM DESESTÍMULO AOS RECURSOS PROTELATÓRIOS

DIREITO CIVIL

DIREITO CIVIL

bem não poderá ser objeto de futura expropriação. Raciocínio diverso impli-caria em afronta aos princípios da menor onerosidade e da “estrita necessidade das medidas constritivas”, segundo o qual so-mente se deve determinar a constrição de bens ou direitos quando isso for im-prescindível ao fim útil do processo.

O precedente em referência é rele-vante pois, embora reconheça a distin-ção existente entre os institutos jurídicos – penhora e sequestro – acaba por equi-pará-los no plano prático, ao menos no que concerne aos seus fins últimos.

Está em tramitação no Congresso Nacional o projeto de um novo Código de Processo Civil. Dentre as alterações almejadas, uma diz respeito a uma maior efetividade processual através do deses-tímulo aos recursos infundados e mera-mente protelatórios. Trata-se da sucum-bência recursal, ou seja, da possibilidade de nova condenação de honorários ad-vocatícios contra a parte que recorreu e teve seu recurso desprovido.

Independentemente da polêmica que a questão por si só provoca – au-mento dos ônus processuais, por exem-plo – a ideia em sua origem é muito boa: gerar um desestímulo aos recursos me-ramente protelatórios. Isto porque, se por um lado é verdade que muitos recur-sos decorrem do inconformismo da par-te com a decisão que lhe é desfavorável,

por outro não há como negar que gran-de parte dos recursos (principalmente aqueles dirigidos aos Tribunais Superio-res) são interpostos apenas com o intui-to protelatório. E, tal cultura de protela-ção gera dois problemas gravíssimos e intimamente interligados: o acúmulo de trabalho nas cortes de julgamento e o atraso na prestação jurisdicional.

A sucumbência recursal já é uma realidade no âmbito restrito dos Juiza-dos Especiais. Lá, caso queira recorrer, a parte tem ciência que tal recurso – na hipótese de improvimento – pode gerar uma condenação em honorários advo-catícios. A questão seria, portanto, im-plementar esse novo modelo em nosso sistema geral de recursos.

A discussão certamente trará argu-mentos a favor e contra. Mas uma coisa

é certa: algo precisa ser feito para se as-segurar ao cidadão brasileiro uma justiça mais ágil e eficiente.

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No julgamento do Recurso Especial nº 903258/RS, a Quarta Turma do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ), por meio de voto da Ministra MARIA ISABEL GALLOTI, inaugurou novo entendimento na Corte, determinando que o termo inicial dos juros de mora em reparação por danos morais deve ser a partir da fixação do va-lor da indenização.

Até então, prevalecia o entendimento de que, nos casos de responsabilidade ex-tracontratual, os juros de mora fluem des-de a data do evento danoso (Súmula 54).

Segundo divulgação no site do STJ (o acórdão ainda não foi publicado), a

STJ DECIDE QUE JUROS DE MORA SOBRE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL INCIDEM DESDE O ARBITRAMENTO

DIREITO CIVIL

PATRÍCIA NYMBERG

Ministra esclareceu no seu voto que, no caso de pagamento de indenização em dinheiro por dano moral puro, “não há como considerar em mora o devedor, se ele não tinha como satisfazer obrigação pe-cuniária não fixada por sentença judicial, arbitramento ou acordo entre as partes”. O entendimento está de acordo com o artigo 1.064 do Código Civil de 1916 e artigo 407 do atual CC, que estabelecem que os juros de mora são contados des-de que seja fixado o valor da dívida.

No TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARA-NÁ, a 10ª Câmara Cível há tempos adota a mesma posição da Ministra GALLOTTI

quanto ao termo inicial dos juros. Nes-te aspecto, cita-se o que constou do acórdão proferido na Apelação Cível nº 477.904-0, julgada em 04/12/2008, lavrado pelo relator Des. MARCOS DE LUCA FANCHIN: “A Súmula 54 do STJ foi idealizada para os danos materiais, não os morais. Não se justifica, em se tratando de danos morais, retroagir à data do evento, pois não se pode dizer que há mora a par-tir deste marco. Somente a partir da ma-nifestação jurisdicional, repita-se, é que se materializa e se conhece a obrigação, conferindo-lhe valor certo.”

A Segunda Turma do SUPERIOR TRI-BUNAL DE JUSTIÇA entendeu que o prazo para impetração de mandado de segurança passa a correr da data em que o candidato de concurso público foi eliminado do certame, e não da data da mera publicação do edital. No caso, a norma editalícia exigia a apresentação de diploma logo após a aprovação nas provas de conhecimentos específicos,

mas antes das demais fases. Como bem destacado no voto do Relator, Ministro CASTRO MEIRA, no momento da publi-cação do edital o candidato tinha mera expectativa de ser aprovado. A regra do edital somente passou a interferir con-cretamente no seu direito subjetivo no momento em que ele foi aprovado na primeira fase e impedido de prosseguir nas outras por não ter apresentado o di-

PRAZO PARA IMPETRAÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO QUE ELIMINA CANDIDATO DE CONCURSO PÚBLICO CONTA DA ELIMINAÇÃO

ploma. Assim, considerando ainda que o STJ já pacificou seu entendimento de que “O diploma ou habilitação legal para o exercício do cargo deve ser exigido na posse e não na inscrição para o concurso público”(Súmula 266), o prazo deve ser contado da reprovação, pois é neste mo-mento que surge a violação do direito (Recurso Especial nº 1.230.048/PR, julga-do em 17/05/2011, DJe 02/06/2011).

O art. 19 da Lei de Locações estabele-ce que o locador ou o locatário, “após três anos de vigência do contrato ou do acordo anteriormente realizado, poderão pedir re-visão judicial do aluguel, a fim de ajustá-lo aos termos do mercado”.

O art. 45, por sua vez, prevê a nuli-dade absoluta da cláusula do contrato de locação que elidir os objetivos da Lei nº 8.245/1991.

A partir daí surgiu o entendimento de que seria ilícita a disposição contratu-

al na qual uma das partes renuncia ao di-reito de ajuizar a Ação Revisional de Alu-guel, já que a manutenção do valor do aluguel aos níveis de mercado durante a vigência do vínculo locatício seria um dos objetivos da supracitada Lei.

A jurisprudência, porém, já vem ad-mitindo a licitude da renúncia quando o valor do aluguel tenha sido fixado propo-sitadamente a fim de conceder a um dos contratantes uma compensação em vir-tude da concessão de vantagem à outra

A RENÚNCIA DO DIREITO DE AJUIZAR AÇÃO REVISIONAL DE ALUGUEL JOSÉ ROBERTO TRAUTWEIN

parte (TJ/SP, Ap. s/ Rev. nº 495.493-00/4).O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTI-

ÇA, por ocasião do Recurso Especial nº 127.355-SP, concluiu que a questão en-volve direitos patrimoniais e que “Esta renúncia contratual não se inclui nas vedações implícitas e explícitas do art. 45 da Lei nº 8.245/91 que por óbvio, não restou violado”.

Ou seja, prevalece a livre manifestação da vontade das partes e o princípio de que os contratos devem ser cumpridos.

VANESSA SCHEREMETA

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DIREITO CIVIL

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É usual constar nas apólices de segu-ro de automóvel uma cláusula estabele-cendo não haver cobertura quando “o motorista do veículo estiver sob efeito de álcool ou drogas”. Essa questão não pro-porciona grandes discussões quando há identidade entre a figura do motorista e do segurado na ocasião do sinistro. Isso porque o art. 768 do Código Civil prevê que “o segurado perderá o direito à ga-rantia se agravar intencionalmente o risco objeto do contrato”.

Entretanto, como normalmente a própria apólice permite que o veículo se-gurado seja conduzido por terceiros, os tribunais passaram a discutir a validade

da referida cláusula quando o condutor do automóvel, embriagado na hora do acidente, não for o segurado.

O TJ/PR e o STJ têm entendido “(...) que a culpa exclusiva de terceiro na ocor-rência de acidente de trânsito, por dirigir embriagado, não é causa de perda do di-reito ao seguro, por não configurar agra-vamento do risco, que deve ser imputado à conduta direta, comprovadamente cul-posa ou dolosa, do próprio segurado” (TJ/PR – Apelação Cível nº 534198-0, 8ªCC, Relator DESEMBARGADOR CARVÍLIO DA SILVEIRA FILHO, 13/05/2010).

Os mesmos tribunais compreendem que “a presunção de que o contratante-

segurado tem por obrigação não permitir que o veículo segurado seja conduzido por pessoa em estado de embriaguez é válida e esgota-se, efetivamente, até a entrega do veículo a terceiro” (STJ – Embargos de De-claração no Resp nº 995861/SP, 4ªT, Minis-tro FERNANDO GONÇALVES, 18/08/2009).

Assim, até mesmo nos casos em que o filho do segurado esteja embriagado e cause um acidente, as seguradoras de-vem pagar o valor estabelecido na apó-lice, exceto quando for comprovado que o descendente já havia cedido aos en-cantos do Dionísio ou Baco no momento em que recebeu as chaves do veículo do seu genitor.

MURILO VARASQUIM

SEGURADO NÃO É OBRIGADO A FISCALIZAR TERCEIROS QUE DIRIJAM SEU AUTOMÓVEL PARA RECEBER O VALOR DA APÓLICE

Dentre os deveres do condômino previstos em Lei, o primeiro e mais fun-damental é o de contribuir para as des-pesas do condomínio. Descumprida essa obrigação e esgotados os esforços ami-gáveis para regularização da pendência, compete ao condomínio promover ação judicial de cobrança, para a qual se prevê o rito sumário.

Nesse caso, eleger corretamente contra quem demandar é providência que exige certa cautela, já que, na rotina do foro, tem se visto muitas ações de co-brança condominial serem extintas por equívoco na definição da parte passiva.

Na atual movimentação jurispru-dencial, entende-se que o locatário do imóvel é parte ilegítima para responder à ação de cobrança, ainda que ocupe o bem há muitos anos e que tenha as-sumido contratualmente perante o lo-cador a obrigação de pagar a taxa de condomínio. Assim, via de regra, a ação

de cobrança deve ser proposta contra o proprietário do bem, que é aquele em cujo nome o imóvel acha-se registrado no ofício imobiliário.

Diz-se “via de regra” porque casos existem - não raros - em que o bem já foi de fato vendido a terceiro, mas a trans-ferência da propriedade no registro de imóveis não se operou, seja porque a es-critura pública não foi levada a registro, seja em razão de o negócio ter se realiza-do por documento particular. Nessa hi-pótese, se a alienação for do inequívoco conhecimento do condomínio (que, por exemplo, obteve cópia do instrumen-to de compra e venda), deve a ação ser proposta contra o adquirente, ainda que o vendedor continue como proprietário no registro imobiliário.

Uma ação mal direcionada, além de onerar o condomínio com as despesas da sucumbência (custas processuais e honorários advocatícios), pode resultar

COBRANÇA JUDICIAL DE TAXAS CONDOMINIAISFERNANDO WELTER

na prescrição parcial ou total do crédito quando da propositura de nova deman-da contra o verdadeiro responsável pe-los débitos.

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OS DEVERES ANEXOS DOS CONTRATOS

plo do que ocorre nos demais dispositivos do CDC, a preocupação do legislador no que concerne ao direito à informação, é garantir ao consumidor hipossuficiente o máximo conhecimento das peculiaridades do negócio, para, atenuando a vulnerabi-lidade de informações existente perante o fornecedor, possibilitar o conhecimento de circunstâncias que podem, antes mesmo da contratação, fazê-lo desistir da celebra-ção do negócio, negociar as condições do contrato e, sobretudo, evitar a frustração das suas expectativas.” (Recurso Especial nº 988.595/SP, julgado em 19.11.2009, de relatoria da Ministra NANCY ANDRIGHI).

O descumprimento de dever ane-xo, deste modo, implica no ressarci-mento à parte lesada pelos danos so-fridos, cujo valor atribuído a título de indenização não estará atrelado ao do negócio celebrado.

Independentemente da vontade das partes, os contratos geram obrigações acessórias decorrentes da boa-fé objeti-va (art. 422 do Código Civil) que, se não observadas, acarretam em inadimple-mento contratual. Dentre esses deveres estão, por exemplo, o de informação, o de probidade, o de cooperação, o de le-aldade e o de segurança.

O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, ao apreciar pedido de indenização por danos morais de consumidora que, em virtude de ausência de informação por parte de uma companhia aérea, teve negado o seu direito de ingresso no país que pretendia visitar, ao ser instado a analisar a existência de falha na presta-ção de serviço decorrente de obrigação acessória, acolheu o pleito com amparo no art. 6º, III do Código de Defesa do Consumidor, asseverando, que “A exem-

VANESSA CANI

DIREITO CIVIL

O ATRASO NOS VOOS GERA DEVER DE INDENIZAR

CÍCERO LUVIZOTTO

A supervalorização do real frente às moedas estrangeiras e a época de fé-rias escolares, fez com que aumentasse a procura por viagens internacionais.

Lamentavelmente, a falta de es-trutura dos aeroportos brasileiros, somada aos mais diversos tipos de problemas (técnicos, overbooking, etc) têm transformado momentos de alegria em decepção e agonia, ante a falta de informação e desprezo com o consumidor, que por vezes tem que esperar muitas horas em situação de-gradante, sem qualquer assistência das companhias aéreas.

Atenta a esta realidade, a ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) elaborou material informativo que permanece disponível em seu site (www.anac.gov.br) no qual elenca as obrigações das companhias aéreas quantos os atrasos ultrapassarem 1 (uma) hora do previsto.

Dependendo do tempo de atra-so o passageiro tem direito de aces-sar meios de comunicação, alimen-tação e hospedagem ou reembolso do valor despendido com a compra da passagem.

O Poder Judiciário vem seguindo a mesma linha prestigiando o consu-midor e compelindo as empresas de transporte a indenizá-los pelos aba-los suportados, afastando, inclusive, as alegações de caso fortuito e força maior aduzidas pelas companhias aéreas sob o argumento de que tais situações devem ser encaradas como “risco inerente a atividade” (Recurso Especial nº 134394-1/RJ).

A IMPORTÂNCIA DO TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO

LAÍS BERGSTEIN

A medicina, que começou como arte, é hoje uma ciência altamente de-senvolvida e especializada. Esta mudan-ça, contudo, não é percebida apenas nos instrumentos existentes à disposição dos médicos para o exercício da sua pro-fissão, mas repercute também nas rela-ções mantidas com os pacientes, na me-dida em que a sociedade moderna, dita sociedade de consumo, é caracterizada pela massificação tanto da produção quanto das relações sociais.

Assim, considerando-se que houve sensível mudança nas relações entre médicos e pacientes, é necessária a ado-ção de algumas medidas para resguar-dar as partes envolvidas, a exemplo da subscrição dos termos de consentimen-to informado. O Código de Ética Médica ressalta, no seu artigo 22, a necessidade de consentimento do paciente ou repre-

sentante legal acerca do procedimento que será realizado, salvo nos casos de risco iminente de morte.

É importante que o médico se preo-cupe em redigir, em linguagem acessí-vel, um termo de consentimento claro e o mais completo possível, uma vez que é direito do paciente o acesso à informa-ção adequada sobre os tratamentos que lhe serão ministrados, principalmente no que tange os riscos envolvidos. Reco-menda-se, ainda, que o próprio médico apresente o termo de consentimento ao paciente, não deixando esta tarefa a encargo de um preposto, para que, na eventualidade de surgirem outras dúvi-das, possa esclarecê-las imediatamente.

Com isso, é possível evitar lides desne-cessárias, que se originam não por imperícia ou negligência no atendimento, mas se ba-seiam apenas na carência de informações.

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DIREITO CIVIL

Tramita perante o SUPREMO TRIBU-NAL DE JUSTIÇA (STF) Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI nº 4275), in-terposta pela Procuradoria Geral da Re-pública em defesa do direito dos transe-xuais à alteração do nome e do sexo no registro civil, independentemente de cirurgia de transgenitalização, dando aplicação, conforme a Constituição ao art. 58 da Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/73, com a redação dada pela Lei nº 9.708/98).

A então procuradora-geral, DÉBORA DUPRAT, sustenta que o não reconhe-cimento do direito dos transexuais à substituição do prenome e do sexo de acordo com sua identidade de gênero, afronta preceitos constitucionais funda-mentais, como os princípios da dignida-

de humana, da vedação à discriminação odiosa, da igualdade, da liberdade e da privacidade.

O artigo da lei estabelece que “o prenome será definitivo, admitindo-se todavia a sua substituição por apelidos públicos notórios”. Segundo a procura-dora, se o objetivo da norma é “proteger o indivíduo contra humilhações, constran-gimentos e discriminações em razão do uso de um nome, essa mesma finalidade deve alcançar a possibilidade de troca de prenome e sexo dos transexuais”.

Defende a procuradora que não é a cirurgia que concede à pessoa a con-dição de transexual, e que, por isso, a alteração deve ser garantida indepen-dentemente do procedimento, mas de acordo com alguns requisitos, como a

ALTERAÇÃO DO REGISTRO CIVIL DOS TRANSEXUAIS FERNANDA PEDERNEIRAS

PENHORA ONLINE E EFETIVIDADE DA SATISFAÇÃO DO CRÉDITO

RENATA STEINER

Desde 2006, com a edição de Lei nº 11.382, a possibilidade de penhora on-line de valores disponíveis em contas bancárias passou a ser prevista de forma expressa pelo Código de Processo Civil (CPC, art. 655-A). Em que pese o dinheiro em espécie ser preferível na ordem de penhora, muito se discutiu desde então sobre a utilização do bloqueio de valores sem esgotamento dos demais meios de satisfação do valor devido.

O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA tem firmado entendimento consolidado de que a penhora online está albergada pela legislação e de acordo com a ordem legal prevista no art. 655 do CPC, privile-giando-se este modo de constrição judi-cial. Com efeito, trata-se de modo mais

ágil e prático de satisfação do crédito, em atenção ao direto constitucional à tu-tela jurisdicional efetiva e em tempo ra-zoável. Com o convênio Bacenjud, é pos-sível que o órgão judicial tenha acesso a informações relevantes, tais como em que bancos o devedor possui contas e qual o numerário dispo-nível, possibilitando que a penhora recaia sobre o exato valor devido.

Conforme enten-dimento exposto no julgamento do Recurso Especial nº 1.093.415-MS, o STJ reafirma este posicionamento, ressal-tando que a penhora

online pode ser aplicada também aos processos julgados antes de 2006, apli-cando esta regra processual a todos aqueles em trâmite, independentemente do ano de seu processamento. Esta forma de penhora há, portanto, de ser deferida sempre de maneira preferencial.

DIREITO DE FAMÍLIA

avaliação por um grupo de especialistas que atestem aspectos psicológicos, mé-dicos e sociais.

No mês de junho do corrente ano o Instituto Brasileiro de Direito de Famí-lia – IBDFAM foi admitido como amicus curie da ação.

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DIREITO DE FAMÍLIA

ADOÇÃO POR CASAIS HOMOAFETIVOSTHAIS GUIMARÃES

Em 24 de maio do corrente ano o TRI-BUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS, na Apelação Cível nº 1.0480.08.119303-3/001, reconheceu a possibilidade de casais do mesmo sexo adotarem uma criança.

No caso dos autos, duas mulheres, que já conviviam em união homoafeti-va há 9 (nove) anos, com a intenção de constituir família, optaram por adotar uma criança, à época com 1 (um) mês de idade, ocasião em que conseguiram a guarda provisória do menor, hoje com 2 (dois) anos de idade.

O relator do recurso, Desembargador ARMANDO FREIRE, ressaltou que o rol

do art. 266 da Constituição Federal não é taxativo, pois existem outras formas de entidade familiar que merecem ser protegidas pelo direito, tal qual a união entre pessoas do mesmo sexo.

Reconhecendo o direito das duas mães e salvaguardando o melhor inte-resse da criança, afirmou ainda que “é de se dizer que consta dos autos, que não há sexo para o afeto. O afeto que se dispensa a essa criança e, mais do que isso, temos que reconhecer a luta que essas mães têm empreendido para poder educar, tratar e cuidar dessa criança, coisa que a sua mãe natural não o fez. (...) Pai e mãe, na realida-

de, não é aquele que gera, pai e mãe, na re-alidade, é aquele que aconchega, é aquele que aninha como nesse caso”.

Em que pese a existência de decisões anteriores neste sentido nos tribunais nacionais, esta se mostra importante na medida em que consolida o recente entendimento do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, que estendeu às uniões ho-moafetivas os efeitos da união estável prevista no art. 1.723 do Código Civil, ba-seando-se no afeto como fundamento da relação familiar, independentemente da diversidade de sexos.

PERDA DA PROPRIEDADE POR ABANDONO DO LAR CONJUGAL

GILLIANE POMBO

Foi publicada no último dia 16 de ju-nho a Lei nº 12.424/2011, que, além de regular o programa “Minha Casa, Minha Vida”, incluiu o art. 1.240-A ao Código Ci-vil, com o seguinte teor: “Aquele que exer-cer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusivi-dade, sobre imóvel urbano de até 250 m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural”.

Trata-se de nova modalidade de usucapião. O cônjuge que ocupar o bem comum de forma contínua, por dois anos, sem oposição daquele que abandonou o imóvel, poderá se tornar seu titular exclusivo.

Apesar do evidente intuito de prote-

ção do direito à moradia, a novel disposi-ção legal acarretará implicações negati-vas no âmbito do direito de família.

Isso porque, diante da habitual ani-mosidade do fim do relacionamento é co-mum o afastamento de um dos cônjuges do lar, a fim de possibilitar que a ruptura ocorra da forma menos traumática pos-sível. No entanto, esta será uma prática arriscada, haja vista que os processos de dissolução, na forma litigiosa, usualmen-te ultrapassam dois anos, e o afastamento do lar durante este período poderá ser in-terpretado como abandono e acarretar a perda da propriedade do imóvel.

Além disso, a perda da propriedade do bem será em verdade uma penalida-de àquele que abandonou o lar conju-gal, e vem na contramão dos novos pa-radigmas do direito de família, segundo os quais, a “culpa” pelo fim do relaciona-mento é figura extinta.

Ademais, como será perquirido o abandono? Qual será o procedimento para dita “oposição”? Segundo MARIA BERENICE DIAS, “a lei criou muito mais problemas do que uma solução para ga-rantir o direito constitucional à moradia”.

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OS 25 ANOS DA LEI DOS CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL

ALEXANDRE KNOPFHOLZ

As novas regras inseridas no Código de Processo Penal pela Lei nº 12.403 de 4 de maio de 2011, trouxeram ao ordenamen-to uma igualdade de tratamento entre ho-mens e mulheres no âmbito dos conflitos relacionados à violência doméstica.

Até então, a legislação previa a adoção de medidas cautelares protetivas somente em caso de violência contra mulheres, pois assim estabelecia a Lei Maria da Penha.

Com as novas disposições sobre as medidas cautelares, o ordenamento jurí-dico brasileiro não mais faz distinção de gênero, garante a adoção de medidas como a “proibição de acesso ou frequên-cia a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas in-frações”, ou a ainda, “proibição de manter

contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela perma-necer distante”, que visam a proteção da vítima, independente do seu sexo.

Inequivocamente, permite-se afirmar que no presente aspecto a nova disposição representa uma evolução do ordenamento, ampliando a todas as pessoas a proteção contra violência no seio doméstico familiar.

OS REFLEXOS DAS NOVAS REGRAS PROCESSUAIS NOS CONFLITOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

RAFAEL DE MELO

No último dia 16 de junho, a Lei nº 7.492/86, que define as infrações penais contra o Sistema Financeiro Nacional, completou 25 anos de vigência. Ela traz em seu bojo os chamados crimes do co-larinho branco, tais como a gestão frau-dulenta (art. 4º), a operação de institui-ção financeira sem autorização (art. 16), a obtenção fraudulenta de financiamen-to (art. 19), a evasão de divisas através de operação de câmbio não autorizada (art. 22) e a manutenção de depósitos no exterior sem declaração aos órgãos pú-blicos competentes (art. 22, parágrafo

único, parte final).Por expressa previsão constitucio-

nal (CF, art. 109, IV) e legal (art. 26), a competência para o processamento e o julgamento dos crimes contra o Sis-tema Financeiro Nacional é da Justiça Federal. Dada a complexidade da ma-téria, existem, hoje, duas varas espe-cializadas no julgamento de tais deli-tos em Curitiba/PR.

Trata-se de lei pioneira no tratamento dos crimes econômicos no Brasil. Até sua edição, poucos eram os delitos dessa na-tureza previstos em lei. Após, advieram

outras modificações legislativas no orde-namento atinentes à dita “macrocrimina-lidade econômica”, como, por exemplo, a Lei nº 9.613/98 (que dispõe sobre o crime de lavagem de dinheiro). Na atua-lidade, nota-se um expressivo aumento de ações penais relativas aos delitos fi-nanceiros, traduzindo-se em verdadeira revolução copérnica no processo penal, tornando definitivamente ultrapassada a concepção de que o procedimento cri-minal seria dirigido pelo Estado apenas contra as minorias, pessoas de baixa ren-da e classes menos favorecidas.

DIREITO ADMINISTRATIVO

GUSTAVO SCANDELARI

NULIDADE DA SATIAGRAHA:A CORAGEM DE APLICAR A LEI

Acompanhou-se, nos últimos dias, a decisão do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUS-TIÇA (HC 149250) que anulou, desde o início, a ação penal que havia culminado na condenação, em 1ª instância, do ban-queiro DANIEL DANTAS. Dentre as ilega-lidades apontadas pela defesa, a mais contundente foi a participação clandesti-na de agentes da ABIN (Associação Brasi-leira de Inteligência) e de um investigador particular na apuração, que somente po-deria ser realizada pelos órgãos públicos competentes. As provas assim produzidas deram origem a outros indícios – igual-

mente nulos, porque derivaram de atos investigativos ilegais. O próprio Ministé-rio Público Federal oficiante junto à Corte recomendou a anulação.

Dentre todos os fundamentos a favor da decisão tomada, sobressaem os se-guintes, consignados no voto do Magis-trado ADILSON VIEIRA MACABU: “não se trata de mais um caso rumoroso que ficou impune. Não! Na realidade, os eventuais de-litos cometidos pelo ora paciente podem e devem ser investigados e, se comprovados, julgados, desde que observados SEMPRE E EM QUALQUER CASO, a legalidade dos

métodos empregados na busca da verdade real, respeitando-se o Estado Democrático de Direito e os Princípios da Legalidade, da Impessoalidade e do Devido Processo Legal. (...) O juiz deve estrita fidelidade à lei penal, dela não podendo se afastar a não ser que imprudentemente se arrisque a percorrer, de forma isolada, o caminho tortuoso da subjetividade que, não poucas vezes, desem-boca na odiosa perda da imparcialidade. (...) Jamais presenciei, eminentes Ministros, ao defrontar-me com um processo, tamanho descalabro e desrespeito a normas constitu-cionais intransponíveis e a preceitos legais.”

DIREITO CRIMINAL

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A DESCRIMINALIZAÇÃO DO CRIME DE POSSE DE ARMA DE FOGO

A PRÁTICA DA NOVA FIANÇA

LUIS OTÁVIO SALES

GUILHERME ALONSO

O crime de posse de arma de fogo (acondicionamento sem autorização, e, portanto, ilegal, de armamento na re-sidência ou no local de trabalho) teve aplicação postergada por diversas vezes, desde o início da vigência do estatuto do desarmamento, em 23.12.2003 (Lei nº 10.826/03, arts. 30 e 32). Essa lei, em sua redação original, facultava aos possuido-res em situação irregular a entrega das armas ou a regularização delas junto às autoridades competentes, no prazo de 180 dias (descriminalização temporária).

O entendimento dos Tribunais era de que, com a possibilidade legal de entrega voluntária ou de regularização das armas, não se poderia falar na “exis-

tência do crime de posse ilegal dessas ar-mas, presumindo-se a boa-fé, ou seja, a au-sência de dolo daqueles que as possuíam.” (STF, Habeas Corpus nº 99448, Rel. LUIZ FUX, DJ 31.05.2011). O Poder Executivo promoveu sucessivas prorrogações da campanha do desarmamento (MP 253/05 e MP 417/08, por exemplo). A última foi determinada pela Lei n° 11.922/09, que fixou o prazo final para a entrega volun-tária de armas em 31.12.2009.

Porém, recentemente (maio/2011), vieram a lume dois diplomas legais so-bre o tema: a) Portaria nº 797/11; b) De-creto nº 7.473/11. Esses dois atos norma-tivos, do Executivo, têm o escopo nítido de perpetuar a possibilidade de entrega

voluntária de armas – não se definiu um prazo fatal para o descarte. A deno-minada “Campanha Na-cional do Desarmamento 2011 – Tire uma arma do futuro do Brasil” foi lançada ofi-cialmente em 6.5.11. Logo, o cidadão, doravante, pode proceder à entrega do armamento que possui em casa ou no trabalho, sem que isso lhe acarrete, em tese, a instauração de um procedimen-to criminal, ou mesmo sua prisão em flagrante. É dizer: aparentemente, o cri-me de posse de arma de fogo não admite mais apuração.

Os meios de comunicação têm no-ticiado, nos últimos meses, uma revolu-ção na sistemática processual penal, no que diz respeito à prisão preventiva e às medidas cautelares. É que, após a pro-mulgação da Lei nº 12.403/2011, foram instituídas diversas medidas alternativas à prisão que deverão ser aplicadas priori-tariamente à segregação cautelar. Dentre o rol de nove medidas (previstas na nova redação do art. 319, CPP), destacam-se o recolhimento domiciliar, a proibição de acesso a determinados lugares e a fiança.

Essa última, que já existia no nosso ordenamento, sofreu completa refor-mulação. Se, antes, o regime da fiança

era confuso e desconhecido até mesmo para as autoridades, agora, trata-se de medida genérica, de simples compre-ensão e aplicável a boa parte dos casos criminais. Os valores em discussão, por sua vez, aumentaram consideravel-mente: com o salário mínimo atual (R$ 545,00), a fiança poderá variar de apro-ximadamente R$ 180,00 (cento e oiten-ta reais) até R$ 109.000.000,00 (cento e nove milhões de reais).

Embora sejam valores relevantes, há quem entenda que a nova sistemática de medidas cautelares pode ser extre-mamente branda, já que mitiga a aplica-ção da prisão processual. No entanto, os

primeiros exemplos práticos começam a surgir, demonstrando que, no mundo dos fatos, as novas cautelares (em espe-cial a fiança) terão aplicação drástica e, talvez, até mais gravosa que a própria prisão preventiva. Em acidente recente (10.7.11) com vítima fatal envolvendo um veículo PORSCHE em alta velocida-de, as novas regras da fiança já foram severamente aplicadas: a Justiça de São Paulo concedeu a liberdade provisória mediante o pagamento da quantia de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais) e do cumprimento de outras medidas (restri-ções de frequência a casas noturnas, re-colhimento noturno, etc.).

DIREITO ADMINISTRATIVO

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ESPAÇO LIVRE DOS ESTAGIÁRIOS

LEI 12.433/2011:DIMINUIÇÃO DOS DIAS DE PENA PELO ESTUDO

BARBARA SAYURI POFFO TANIGUTI

Acadêmica do 3º ano da Faculdade de Direito de Curitiba

A Lei n.º 12.433, de 29 de junho de 2011, alterou a disciplina da Execução Penal no que tange à remição da pena. Anteriormente, a legislação somente previa a redução de um dia de pena para cada três dias de trabalho, para condena-dos em regime semiaberto ou fechado.

Com as alterações na Lei de Execu-ção Penal (LEP), a remição dos dias de pena também passa a ser possível com o tempo de estudo: a cada 12 horas, di-vididas em, pelo menos, três dias de fre-quência escolar no ensino fundamental, médio, profissionalizante, superior ou de requalificação superior, diminui-se

um dia de pena. Além disto, o benefí-cio foi estendido aos presos em regime aberto, em liberdade condicional e em prisão cautelar.

Uma das principais modificações à LEP foi a nova redação do art. 127, o qual estabelecia que “o condenado que for pu-nido por falta grave perderá o direito ao tempo remido, começando o novo perío-do a partir da data da infração disciplinar”. Com a nova lei, fica expresso que o juiz poderá revogar até 1/3 dos dias traba-lhados e/ou de estudo do preso.

Essas alterações têm grande rele-vância pública, na medida em que o es-

tudo e o trabalho são indispensáveis à ressocialização após o cumprimento de penas criminais.

NOVA LEI PERMITE FORMAÇÃO DE EMPRESA INDIVIDUAL DE RESPONSABILIDADE LIMITADA

AMANDA TORTELLI BAVARESCO

Acadêmica do 2º ano da Faculdade de Direito de Curitiba

Foi publicada em 12 de julho a Lei nº 12.441/2011 que altera o Código Civil para permitir a constituição de empresa individual de responsabilidade limitada. Com a sanção da nova lei, inclui-se a em-presa individual de responsabilidade limi-tada no inciso VI, art. 44 do Código Civil. Além dessa modificação, a lei acrescenta o art. 980-A ao Livro II da Parte Especial – que dispõe sobre a nova modalidade de empresa – e altera o parágrafo único do art. 1.033 – que trata da dissolução das sociedades.

O objetivo da nova legislação é per-

mitir a criação de uma empresa na qual uma única pessoa possa deter a totalidade do capital social, de modo que haja a se-gregação do patrimônio da empresa do patrimônio pessoal do empresário. Seme-lhante a essa nova configuração de empre-sa, já existia a forma societária do empresá-rio individual, ao qual a lei não permite a segregação do patrimônio, o que significa uma desvantagem ao seu uso.

Para a formação da empresa indivi-dual de responsabilidade limitada foram estabelecidos os seguintes requisitos: o capital social da empresa deve ser igual

ou superior ao valor de cem salários mí-nimos; a participação do empresário fica restrita a apenas uma empresa dessa modalidade; e a expressão EIRELI deve ser incluída após a denominação social da empresa.

A nova lei pode beneficiar, principal-mente, os empresários que atuam na in-formalidade sem a proteção conferida pela separação patrimonial e também aqueles que participam de sociedades limitadas pela obrigação legal, anteriormente vigen-te, da pluralidade de sócios para que hou-vesse a separação do patrimônio.

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A AUSÊNCIA DE APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS NO TRÂMITE DAS INVESTIGAÇÕES E DAS AÇÕES PENAIS

CAROLINA GOSLAR

Acadêmica do 3º ano da Universidade Positivo

e de punir os rompimentos da socie-dade, foram fixados limites, que, com a Constituição Federal de 1988, ganharam força e manifesta importância ante o contexto histórico, o desenvolvimento de políticas e à necessidade da socieda-de como estava organizada a partir da-quele momento.

Tais limites devem, em vista disso, ser respeitados e a leitura e a aplicação dos Códigos Penal e de Processo Penal, bem como das Leis Penais Esparsas devem ser realizadas sob esse foco principioló-gico constitucional.

Nas últimas décadas, diversas opera-ções das Polícias Federal e Civil dos Esta-dos miraram supostos autores de crimes empresariais e financeiro-econômicos.

Não obstante a vigência de prin-cípios constitucionais e de leis espe-ciais, a exemplo a de Interceptações Telefônicas (Lei nº 9.296/96, que com-pletou 15 anos no último dia 24.07), essas autoridades continuam, no per-correr dos anos, fazendo o uso de pro-vas ilícitas, como escutas telefônicas ilegais, quebras de sigilo indevidas e o bloqueio e constrição de bens de

pessoas envolvidas apenas indireta-mente nos casos, o que faz com que a aplicação das leis sob a ótica constitu-cional seja questionada.

Princípios como o da intimidade, da honra, da imagem, da ampla defesa e do contraditório e direitos e garantias como o sigilo de correspondências, das comu-nicações telegráficas e telefônicas, bem como de dados bancários, por vezes têm sido violados durante o trâmite de inves-tigações e instruções criminais.

Quando à Polícia e ao Judiciário fo-ram dadas as prerrogativas de investigar

dependências, de modo a colocar no mesmo plano e lado a lado representan-tes das partes e membros do Ministério Público Federal.

Na instrução criminal, o princípio do contraditório assegura às partes iguais condições de atuação frente ao julgador.

Desde que em vigor a Lei Orgânica do Ministério Público da União, a acusa-ção tem a prerrogativa de sentar-se em posição privilegiada nas audiências da Justiça Federal, no mesmo plano e ao lado direito do juiz. No âmbito estadual, ainda que inexistente previsão legal, a prática é similar.

A evidente afronta à isonomia entre a acusação e a defesa nos atos do pro-cesso foi observada pelo Juiz Federal ALI MAZLOUM, que editou portaria garan-tindo o mesmo tratamento aos defenso-res nas audiências do Juízo em que atua. A partir disso, foi impetrado Mandado de

Segurança por vários Procuradores da República, cuja decisão liminar suspen-deu a portaria.

O magistrado, então, acionou o SU-PREMO TRIBUNAL FEDERAL (Reclama-ção nº 12011), solicitando a declaração da inconstitucionalidade do dispositivo que protege a prática em favor da acu-sação. Para ele, “é perceptível a reação diferenciada de testemunhas quando inda-gadas pelo acusador, sentado no alto e ao lado do juiz, e depois pelo advogado, senta-do no canto mais baixo da sala ao lado do réu. É preciso colocar em pé de igualdade, formal e material, acusação e defesa”.

Acolhido o pedido, todas as audi-ências criminais na esfera da Justiça Federal brasileira deverão adaptar suas

A IGUALDADE ENTRE ACUSAÇÃO E DEFESA NAS AUDIÊNCIAS CRIMINAIS

BRUNO CORREIA

Acadêmico do 5º ano da Faculdade de Direito de Curitiba (Unicuritiba)

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A HIPERTROFIA LEGISLATIVA EM MATÉRIA CRIMINAL

KHALIL VIEIRA PROENÇA AQUIM

Acadêmico do 5º ano da Pontifícia Universidade Católica do Paraná

que é (e deve ser) amplo, o relator da PEC 57/2011 explicita, na justificativa do projeto, que “não se pretende, com o projeto, combater a criminalidade”. Qual seria, então, seu motivo?

A pandemia que se espalha quando o tema versa sobre questões acerca da criminalidade e segurança pública tende sempre a pender contra o acusado, olvi-dando-se não são as penas mais rigoro-sas que garantiriam redução na crimina-lidade, mas a educação. Rememorando a imortal lição de EVANDRO LINS E SILVA, “salvemos o homem, enquanto é tempo, antes que seja tarde demais”.

Desde a promulgação da Lei de Exe-cução Penal, em 1984, tinha-se em men-te que a função da pena (e, por conse-guinte, de toda a persecução penal) era não apenas a retribuição do injusto co-metido pelo agente, mas a reinserção so-cial e a redução da criminalidade como um todo.

Nada obstante, impulsionada pela falsa impressão de segurança promovida pela mídia e pelos inflamados discursos politiqueiros, a população cria uma situ-ação imaginária, de que a solução para todos os problemas se dá pela cadeia.

Neste sentido, veem-se inúmeras

propostas legislativas que, descom-promissadas com qualquer melhora na sociedade, prometem aumentar o rigor das penas, como o recente projeto que previa pena especialmente aumentada para o assassino em série (PL 8088/11). Apesar da gravidade do tema, o sen-sacionalismo que o moveu plantou insanáveis vícios no projeto, como a vedação de progressão de regime, fa-dando-o ao arquivamento.

Outro projeto que busca votos mas sem compromisso com a sociedade é a nova proposta de redução à maioridade penal. Sem entrar no mérito do debate,

RECEBIMENTO DE DENÚNCIA POR JUÍZO INCOMPETENTE NÃO INTERROMPE A FLUÊNCIA O FLUXO DO PRAZO PRESCRICIONAL

FELIPE BRAZ GUILHERME

Acadêmico do 3º ano da Universidade Positivo

A denominada prescrição da preten-são punitiva é observada antes do trânsi-to em julgado da sentença condenatória, ocasionando a perda da pretensão do Estado de lograr uma condenação efeti-va em relação ao crime que a alguém é imputado.

O Código Penal brasileiro elenca, de forma taxativa, as causas que interrom-pem o prazo de prescrição da pretensão punitiva. Uma destas causas é o recebi-mento da denúncia ou queixa, que po-derá ocorrer por decisão do juiz de pri-meiro grau.

O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL se

posicionou recentemente a respeito, durante o julgamento do Habeas Cor-pus nº 104907/PE, de relatoria do MI-NISTRO CELSO DE MELLO. Ao proferir a decisão, o Ministro relator asseverou que o recebimento da denúncia por autoridade incompetente não produ-zirá efeitos, visto que é ato nulo. As-sim, dispõe: “Somente o recebimento da peça exordial pela autoridade efeti-vamente competente para o julgamento do feito é capaz de interromper o fluxo do prazo prescricional”.

Conforme as lições do Procurador Regional da República EUGÊNIO PACELLI

DE OLIVEIRA, o processo que se desen-volver perante juiz materialmente ou ab-solutamente incompetente “será irreme-diavelmente nulo”, desde o oferecimento da denúncia.

Deste modo, perfaz-se o entendi-mento de que a declaração da nulidade de um ato processual anula concomitan-temente os seus efeitos – ou seja – a de-claração que torna incompetente o juízo anulará a decisão de recebimento da de-núncia, por conseguinte, tornará inválida a interrupção da prescrição da pretensão punitiva do Estado antes apreciada por tal decisão.

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POSSIBILIDADE DE DEMISSÃO DE SERVIDOR PÚBLICO POR ATO DE IMPROBIDADE MEDIANTE PROCESSO ADMINISTRATIVO

LEONARDO KAEJI DE FREITAS

Acadêmico do 3º ano da Faculdade de Direito de Curitiba

A Constituição Federal, no art. 37, es-tabelece que cabe à Administração Públi-ca respeitar os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. O mesmo artigo, em seu § 4º, faz referência às implicações da prática de atos de improbidade administrativa, que confrontam o princípio da moralidade, praticados com desonestidade, má-fé.

A Terceira Seção do SUPERIOR TRIBU-NAL DE JUSTIÇA admitiu que a demissão de servidor público condenado em pro-cesso administrativo por ato ímprobo pode ocorrer antes mesmo de condena-

ção judicial, sob o fundamento de que só seria imprescindível decisão judicial para suspensão de direitos políticos, indispo-nibilidade de bens ou ressarcimento ao erário, previstas na Lei nº 8.429/92, que determina o próprio processo adminis-trativo e posteriormente o judicial.

A situação de fato que ocasionou este entendimento ocorreu em con-tratação motivada por inexigibilidade. Tal certame não poderia ser qualificado como inexigível, pois havia viabilidade de competição. Por esta e outras irregu-laridades, concluiu-se pela ocorrência de

ato de improbidade e pela possibilidade de demissão do servidor responsável pela contratação, o então Subsecretário da Previdência.

Como a própria Constituição da Re-pública prevê no art. 41, § 1º, pode o ser-vidor público perder o cargo em virtude de sentença judicial transitada em julga-do ou por processo administrativo em que é assegurada ampla defesa. Obser-va-se, então, que exigir que a perda de cargo somente ocorra em razão de sen-tença transitada em julgado estaria em desarmonia com o texto constitucional.

A PREVALÊNCIA DO INTERESSE DO CREDOR NA EXECUÇÃO FISCAL

LUIZ FERNANDO DE SOUZA HIGA

Acadêmico do 4° ano da Pontifícia Universidade Católica do Paraná

Em recente julgado, a Segunda Tur-ma do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTI-ÇA (Agravo Regimental n° 1.380.918/PR, julgado em 16/06/2011), negou a uma empresa do Estado do Paraná pedido de substituição de seu imóvel penhorado em execução fiscal, formulado sob a ale-gação de que o bem era essencial para o desenvolvimento de suas atividades.

A FAZENDA NACIONAL havia recu-sado a substituição pretendida pela em-presa, argumentando que o imóvel ofe-recido encontrava-se em uma comarca

distante, no município de Novo Aripua-nã, no Estado do Amazonas.

A decisão foi fundamentada no art. 15 da Lei nº 6.830/80 (Lei de Execuções fiscais), o qual estabelece que o devedor pode obter a substituição da penhora por depósito em dinheiro ou fiança ban-cária, mas, fora dessas hipóteses, a subs-tituição submete-se à concordância do credor (conforme jurisprudência pacífica desta Corte Superior. Exemplos: Recurso Especial nº 1239090/SP, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, Segunda Turma,

DJe 28.4.2011; Agravo Regimental no Ag nº 1378227/RS, Rel. Min. CASTRO MEIRA, Segunda Turma, DJe 14.4.2011; Agravo Regimental no Ag nº 1354656/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, Segunda Tur-ma, DJe 15.3.2011).

Segundo o E. Relator – Min. MAU-RO CAMPBELL MARQUES, “a execução é feita a partir do interesse do credor, pois cabe a ele recusar ou não bens oferecidos à penhora quando estes se situam em ou-tra comarca, o que dificulta a alienação”. A decisão foi unânime.

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Julho / Agosto / Setembro / 2011Ano 7 | Número 13Tiragem: 1.500 exemplares Impressão e acabamento: Gráfica Vitória

Boletim Trimestral do Escritório Professor René DottiProjeto gráfico e diagramação:IEME Comunicaçãowww.iemecomunicacao.com.br

Jornalista Responsável: Taís Mainardes DRT-PR 6380

Publicação periódica de caráter informativo com circulação dirigida e gratuita.

2011. Direitos autorais reservados para Dotti & Advogados Associados.

EXPEDIENTE

E O PROMOTOR DAS GARANTIAS?

THUAN FELIPE GRITZ DOS SANTOS

Acadêmico do 3º ano da Pontifícia Universidade Católica do Paraná

ALTERAÇÃO DO NOME CIVIL

VICTOR LEAL

Acadêmico do 3º ano da Faculdade de Direito de Curitiba

O art. 16 do Código Civil garante a todos o direito ao nome, que é, em regra, imutável, conforme a Lei de Re-gistros Públicos. Todavia, essa imutabi-lidade comporta exceções previstas na mesma lei. A possibilidade de alterar o registro civil pode ser relevante àque-les cujo prenome ou sobrenome causa desconforto. O Min. SÁLVIO DE FIGUEI-REDO TEIXEIRA (STJ), ao citar BENEDITO SILVÉRIO RIBEIRO, afirma “que o que se pretende com o nome civil é a real indivi-dualização da pessoa perante a família e

a sociedade”.Uma das razões para alteração do

nome civil é o erro de registro, o qual nem sempre é facilmente constatado. Isso porque pode ter ocorrido em gerações anteriores, o que não impede que cause dissabores atuais.

O problema pode ser de ordem pessoal e até mesmo dificultar a obten-ção de outra cidadania, por exemplo. Quando o erro não é notório, é necessá-ria ordem judicial para a retificação do registro. Nesse caso, deve o interessado

demonstrá-lo, conforme art. 109 da LRP. Também é necessário, segundo recente entendimento da 8ªC.C. de São Paulo (AC 994060337619, julgado em 25/05/2011), demonstrar que a alteração não causará prejuízo ou insegurança às relações ju-rídicas. O E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ no julgamento de caso análogo (11ª C.C. AC 0352008-5, DJ 18.04.2007), decidiu ser possível alterar o registro civil de pessoas já falecidas para corrigir o so-brenome da família e assim possibilitar a obtenção de cidadania portuguesa.

Com o Projeto de Lei nº 156/09, que será votado em Brasília, um novo Código de Processo Penal está por vir, mais cons-titucionalizado e com mudanças impor-tantes no que diz respeito à imparciali-dade do juiz. Referido texto inova com a figura do Juiz das Garantias, tentando melhor adaptar o magistrado ao Sistema Acusatório, no qual o julgador é equidis-tante das partes, atuando exclusivamen-te como presidente do processo.

Com isso, tem-se que o Juiz das Ga-rantias atuará na fase policial e não po-

derá participar da produção de provas em juízo. Sua presença ocorrerá somente em atos que possam vir a ferir as garan-tias constitucionais do investigado e em aplicações de medidas cautelares, que se perfazem pelo requerimento das partes.

O membro do Ministério Público ainda poderá ser o mesmo, tanto na fase policial quanto na fase judicial. Na teoria, o MP é uma instituição imparcial, que busca a verdade real e não somente a condenação do réu. Assim, conclui-se que a exigência de um representante do

poder público, garantidor das garantias, deve ser imposta não somente ao Juiz, mas também ao Ministério Público.

O agente ministerial ainda atuará e fiscalizará o Juiz Garantidor, vinculando-se significativamente à causa, sendo, por isso, de suma importância que seja aplicado ao membro do órgão estatal acusador que atue na fase preprocessu-al o mesmo impedimento que se dá ao juiz da investigação, com o objetivo de se obter um Processo Penal verdadeira-mente constitucional.