AVALIAÇÃO DO USO DE MEDICAMENTOS ENTRE IDOSOS … · LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Medicamentos...

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS INSTITUTO LEÔNIDAS E MARIA DEANE - FIOCRUZ UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ MESTRADO EM SAÚDE, SOCIEDADE E ENDEMIAS NA AMAZÔNIA AVALIAÇÃO DO USO DE MEDICAMENTOS ENTRE IDOSOS ATENDIDOS EM CENTROS DE REFERÊNCIA EM MANAUS AM. Bruna Monteiro Rodrigues MANAUS-AM 2013

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS

    INSTITUTO LENIDAS E MARIA DEANE - FIOCRUZ

    UNIVERSIDADE FEDERAL DO PAR

    MESTRADO EM SADE, SOCIEDADE E ENDEMIAS NA AMAZNIA

    AVALIAO DO USO DE MEDICAMENTOS ENTRE IDOSOS

    ATENDIDOS EM CENTROS DE REFERNCIA EM

    MANAUS AM.

    Bruna Monteiro Rodrigues

    MANAUS-AM

    2013

  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS

    INSTITUTO LENIDAS E MARIA DEANE - FIOCRUZ

    UNIVERSIDADE FEDERAL DO PAR

    MESTRADO EM SADE, SOCIEDADE E ENDEMIAS NA AMAZNIA

    Bruna Monteiro Rodrigues

    AVALIAO DO USO DE MEDICAMENTOS ENTRE IDOSOS

    ATENDIDOS EM CENTROS DE REFERNCIA EM

    MANAUS AM.

    Dissertao apresentada ao Programa de

    Ps-Graduao em Sade, Sociedade e

    Endemias na Amaznia, em convnio

    com UFAM/Fiocruz/UFPA, como requisito

    obteno do ttulo de Mestre em Sade,

    Sociedade e Endemias na Amaznia.

    Orientadora: Profa. Dra. Ana Cyra dos Santos Lucas

    Manaus-AM

    2013

  • BRUNA MONTEIRO RODRIGUES

    AVALIAO DO USO DE MEDICAMENTOS ENTRE IDOSOS

    ATENDIDOS EM CENTROS DE REFERNCIA EM

    MANAUS AM.

    Dissertao apresentada ao Programa de

    Ps-Graduao em Sade, Sociedade e

    Endemias na Amaznia, em convnio

    com UFAM/Fiocruz/UFPA, como requisito

    obteno do ttulo de Mestre em Sade,

    Sociedade e Endemias na Amaznia.

    Aprovado em 25 de junho de 2013.

  • Ao meu esposo pelo total apoio, meu

    pai e minha me pelo amor, minhas

    irms pelo aprendizado e aos amigos

    pelo incentivo perseverana na

    realizao deste trabalho.

  • AGRADECIMENTOS

    A Deus pelo amor concedido, sabedoria transmitida e pelas promessas

    fiis que nos fez por meio de Jesus Cristo.

    Aos meus pais por sempre me apoiarem e me ensinarem o melhor

    caminho a seguir.

    Ao Leandro Rodrigues pelo apoio incondicional e constante.

    A minha orientadora, Prof. Dra. Ana Cyra dos Santos Lucas, pela

    orientao, pelo imenso aprendizado e amizade.

    A Prof. Dra. Rosana Cristina Pereira Parente, pelas orientaes na

    elaborao do projeto.

    Ao Prof. Dr. Igor Rafael dos Santos Magalhes pelas contribuies durante

    todo o trabalho.

    Aos membros do grupo de Toxicologia, especialmente Adriana Carla e Ana

    Jacqueline pelas contribuies durante o trabalho.

    Aos amigos do mestrado: Andrea, Andria, Andria, Eric, Gabriel, Ivany,

    Joyce, Joyce, Luena, Marcuce, Marluce, Mirlia, Rainer, Snia, Tllio e Wagner.

    s amigas: Adriana, Ana, Claire, Fernanda, Gianne, Larissa, Rosie e Slvia.

    Ao Dr. Pritesh Lalwani pelas contribuies no resumo.

    Gleici Jane Cruz pelas contribuies na anlise dos dados.

    Secretaria de Estado da Sade (SUSAM) pelas informaes concedidas.

    Aos funcionrios dos CAIMI pela colaborao durante a coleta de dados.

    Aos idosos que participaram da pesquisa e nos acolheram com grande

    compreenso e esprito de colaborao.

    AGRADEO

  • Eu, a sabedoria, moro com a

    prudncia, e tenho o conhecimento que

    vem do bom senso. Provrbios 8:12.

  • RESUMO

    O envelhecimento populacional uma realidade mundial, decorrente da reduo da

    mortalidade infantil e da fecundidade, do aumento da expectativa de vida e dos

    avanos tecnolgicos na rea da sade, o aumento da incidncia de doenas

    crnico-degenerativas, as quais necessitam de tratamentos prolongados e/ou

    contnuos, o que torna os idosos grandes consumidores de medicamentos. O uso de

    medicamentos pode representar riscos ao paciente, principalmente se realizado de

    maneira inadequada, e por isso tornou-se uma preocupao para sade pblica.

    Assim, o objetivo deste trabalho foi identificar o perfil do uso de medicamentos entre

    idosos atendidos nos Centros de Ateno a Melhor Idade (CAIMI) em Manaus-AM.

    Realizou-se estudo descritivo-observacional de recorte temporal no qual foram

    entrevistados 355 pacientes idosos nas trs unidades que fornecem servio de

    ateno exclusivo e especializado para pacientes idosos. Os dados sobre os

    medicamentos utilizados nos ltimos sete dias foram coletados por meio de um

    formulrio, e estes medicamentos foram classificados de acordo com o Anatomical

    Therapeutical Chemical Classification System. Para obteno de informaes sobre

    interaes medicamentosas foi utilizado o Micromedex e os medicamentos

    inapropriados foram classificados de acordo com a atualizao do Critrio de Beers

    realizado pela American Geriatrics Society. Foram analisadas a ocorrncia de

    polifarmcia, redundncia e automedicao. Dentre os entrevistados, a maioria eram

    mulheres (83,1%), entre a faixa etria de 60 e 69 anos (62,5%), casados (43,7%) e

    possuam filhos (95,5%). A prevalncia do uso de medicamentos foi de 80,3% e os

    medicamentos mais consumidos foram os para sistema cardiovascular (43,7%). A

    prevalncia de polifarmcia foi de 19,3%, sendo superior nas mulheres (78,9%), a

    redundncia foi verificada em 14,7% e automedicao em 13% dos idosos.

    Possveis interaes medicamentosas foram verificadas em 42,5% dos usurios de

    medicamentos e dentre o total de medicamentos, 122 (14,7%) foram considerados

    inapropriados para uso em idosos. Embora com padro elevado de uso de

    medicamentos foram baixas as prevalncias de automedicao, polifarmcia, uso

    redundante e uso de medicamentos inapropriados. Os resultados positivos em

    relao ao uso dos medicamentos indica que os servios de sade especializados e

    exclusivos para os idosos, com atendimento multiprofissional, podem promover

    melhor qualidade de vida e uso correto dos medicamentos, em virtude do melhor

    atendimento e ateno sade.

    Palavras-chave: Uso de medicamentos, Sade do Idoso, Farmacoepidemiologia.

  • ABSTRACT

    Population aging is a global reality, due to the reduction in child mortality and fertility,

    increased life expectancy and technological advances in healthcare. On the other

    hand, elderly people have become largely dependent on drugs/medicine due to the

    increasing incidence of chronic diseases, which require prolonged and/or continuous

    treatment. Excessive and improper intake of medications may pose risks to the

    patient and is a concern for public health. The objective of this work was to identify

    the profile of drug use among elderly patients in the Centros de Ateno a Melhor

    Idade (CAIMI) in Manaus-AM. We conducted a descriptive observational study in

    which we interviewed 355 elderly patients in the three different units that provide

    unique and specialized care for elderly patients. Data on drug use in the past seven

    days was collected through a form, and these drugs were classified according to the

    Anatomical Therapeutic Chemical Classification System. To obtain information about

    drug interactions was used Micromedex and inappropriate drugs were classified

    according to the update of the Beers Criteria conducted by the American Geriatrics

    Society. We then analysed the occurrence of polypharmacy, redundancy and self-

    medication. Among the most respondents, 83.1% were women, aged between 60

    and 69 years (62.5%), married (43.7%) and had children (95.5%). The prevalence of

    drug use was 80.3% and was the most drugs were for cardiovascular system

    (43.7%). The prevalence of polypharmacy was 19.3%, being higher in women

    (78.9%), redundancy was observed in 14.7% and 13% of self-medication in the

    elderly. Potential drug interactions were observed in 42.5% of the users of drugs and

    medicines within the total, 122 (14.7%) were considered inappropriate for use in the

    elderly. Although with high standard of medication use were low prevalence of self-

    medication, polypharmacy, use redundant and inappropriate use of drugs was

    observed. Our study demonstrates positive results regarding the use of drugs, a

    specialized and exclusive health services for the elderly in combination with

    multidisciplinary care, can promote better quality of life and correct use of drugs

    associate with improved health care.

    Key words: Drug Utilization, Health of Elderly, Pharmacoepidemiology.

  • LISTA DE QUADROS

    Quadro 1 Medicamentos Potencialmente Inapropriados para Idosos de

    acordo com o Critrio de Beers atualizado pela American

    Geriatrics Society. Fonte: AGS (2012). ................................. 45

    Quadro 2 Nmero de entrevistados por unidade de sade. .................... 54

    Quadro 3 Critrios para codificao dos indivduos abordados durante a

    pesquisa. .............................................................................. 58

    Quadro 4 Classificao da gravidade de interaes medicamentosas.

    Fonte: MICROMEDEX, 2013. ............................................... 61

  • LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 Distribuio socioeconmica dos idosos atendidos em centros

    de referncia, Manaus, AM, 2012. ........................................ 84

    Tabela 2 Distribuio das variveis ler e escrever, escolaridade e classe

    econmica entre idosos, Manaus, AM, 2012. ....................... 85

    Tabela 3 Anlise bivariada entre fatores socioeconmicos e uso de

    medicamentos entre idosos, Manaus, AM, 2012. ................. 86

    Tabela 4 Distribuio de variveis relacionadas sade de idosos

    atendidos em centros de referncia, Manaus, AM, 2012. ..... 87

    Tabela 5 Anlise bivariada entre renda e automedicao entre idosos

    atendidos em centros de referncia, Manaus, AM, 2012. ..... 90

    Tabela 6 Anlise bivariada entre escolaridade e automedicao entre

    idosos atendidos em centros de referncia em Manaus, AM,

    2012. ..................................................................................... 90

    Tabela 7 Anlise bivariada entre automedicao e sexo, faixa etria e

    classe social entre idosos, Manaus, AM, 2012. .................... 90

    Tabela 8 Anlise bivariada entre polifarmcia e sexo, faixa etria, estado

    civil e classe social entre idosos, Manaus, AM, 2012 ........... 91

    Tabela 9 Anlise bivariada entre polifarmcia e percepo da sade entre

    idosos atendidos em centros de referncia, Manaus, AM,

    2012. ..................................................................................... 92

    Tabela 10 Anlise bivariada entre redundncia e sexo, faixa etria e

    classe social entre idosos atendidos em centros de referncia,

    Manaus, AM, 2012. ............................................................... 92

    Tabela 11 Anlise bivariada entre uso de medicamentos considerando

    polifarmcia e redundncias entre idosos atendidos em

    centros de referncia em Manaus-AM. ................................. 93

    Tabela 12 Principais medicamentos envolvidos em interaes

    medicamentosas entre idosos em Manaus, AM, 2012. ........ 94

  • Tabela 13 Quantidade de possveis interaes medicamentosas frmaco-

    frmaco entre idosos em Manaus, AM, 2012........................ 94

    Tabela 14 Anlise bivariada entre percepo da sade e possveis

    interaes medicamentosas entre idosos atendidos em centos

    de referncia em Manaus, AM, 2012. ................................... 95

    Tabela 15 Fonte da informao sobre interaes medicamentosas

    obtidas entre idosos, Manaus, AM, 2012. ............................. 95

    Tabela 16 Interaes medicamento-etanol e a classificao de gravidade

    da interao em idosos atendidos em centros de referncia,

    Manaus, AM, 2012. ............................................................... 96

    Tabela 17 Distribuio de medicamentos inapropriados e as variveis

    sexo e faixa etria de idosos atendidos em centros de

    referncia, Manaus, AM, 2012. ............................................. 97

    Tabela 18 Medicamentos potencialmente inapropriados para uso em

    idosos de acordo com o critrio de Beers encontrados entre

    idosos em Manaus, AM, 2012............................................... 98

    Tabela 19 Frequncia de medicamentos que atuam no (SNC) utilizados

    por idosos de centros de referncia, Manaus, AM, 2012. ... 100

    Tabela 20 Medicamentos psicotrpicos utilizados por idosos atendidos

    em centros de referncia em Manaus, AM, 2012. .............. 101

    Tabela 21 Uso de lcool e tabaco entre idosos atendidos em centros de

    referncia em Manaus, AM, 2012. ...................................... 102

    Tabela 23 - Distribuio do uso de tabaco por sexo entre idosos atendidos

    em centros de referncia, Manaus, AM, 2012. ................... 103

    Tabela 24 Uso na vida de substncias psicoativas entre idosos atendidos

    em centros de referncia, Manaus, AM, 2012. ................... 104

  • LISTA DE ABREVIATURAS

    AGS American Geriatrics Society

    ANVISA Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria

    ATC Anatomical Therapeutical Chemical Classification

    AUDIT Alcohol Use Disorders Identification Test

    CAGE Cutdown, Annoyed, Guilty e Eye-opener

    CAIMI Centros de Ateno a Melhor Idade

    DCB Denominao Comum Brasileira

    DEF Dicionrio de Especialidades Farmacuticas

    DUR Drug Utilization Review

    MAI Medicaton Appropriateness Index

    MAST Michigan Alcoholism Screening Test

    MIP Medicamentos Potencialmente Inapropriados

    SAAST Self-Administered Alcoholism Screening Test

    STOPP Screening Tool of Older Persons Potentially

    Inappropriate Prescriptions.

    TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

    TFV Teste de Fluncia Verbal

    WHO World Health Organization

  • SUMRIO

    1. INTRODUO ....................................................................................... 15

    2. JUSTIFICATIVA ..................................................................................... 19

    3. REVISO DA LITERATURA .................................................................. 21

    3.1. Importncia da caracterizao socioeconmica em sade ............. 22

    3.2. Aspectos relacionados sade do idoso ........................................ 26

    3.3. Morbidades em idosos .................................................................... 28

    3.4. Aspectos relacionados ao uso de medicamentos ........................... 30

    3.4.1. Medicamentos psicotrpicos ............................................... 36

    3.4.2. Reaes adversas e interaes medicamentosas .............. 38

    3.4.3. Medicamentos potencialmente inapropriados ..................... 39

    3.5. Aspectos relacionados ao uso de demais substncias ................... 48

    4. OBJETIVOS ........................................................................................... 51

    5. MATERIAIS E MTODOS ..................................................................... 52

    5.1. Tipo de Estudo ................................................................................ 52

    5.2. Populao em Estudo ..................................................................... 52

    5.3. Critrios de Incluso ....................................................................... 52

    5.4. Critrios de Excluso ...................................................................... 52

    5.5. Local de Estudo .............................................................................. 53

    5.6. Amostragem ................................................................................... 53

    5.7. Instrumento de coleta de dados ...................................................... 54

    5.8. Estudo Piloto ................................................................................... 56

    5.9. Calibrao ....................................................................................... 56

    5.10. Levantamento de dados ............................................................... 57

    5.11. Estratgia para tratamento dos dados .......................................... 60

    5.12. Aspectos ticos ............................................................................. 61

  • 6. RESULTADOS ....................................................................................... 62

    6.1. Artigo .............................................................................................. 63

    6.2. Fatores socioeconmicos ............................................................... 84

    6.3. Aspectos relacionados sade ...................................................... 86

    6.4. Aspectos relacionados ao uso de medicamentos ........................... 88

    6.4.1. Automedicao .................................................................... 89

    6.4.2. Polifarmcia ......................................................................... 91

    6.4.3. Redundncias ...................................................................... 92

    6.4.4. Interaes medicamentosas ................................................ 93

    6.4.5. Medicamentos potencialmente inapropriados para Idosos .. 97

    6.4.6. Medicamentos que atuam no Sistema Nervoso Central ...... 99

    6.4.7. Uso de outras substncias psicoativas .............................. 102

    7. DISCUSSO ........................................................................................ 105

    8. CONCLUSO ...................................................................................... 117

    9. REFERNCIAS.................................................................................... 119

    10. ANEXOS..............................................................................................143

    10.1. Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ............................ 143

    10.2. Formulrio ................................................................................... 145

    10.3. Normas para submisso - Cadernos de Sade Pblica ............. 152

  • 15

    1. INTRODUO

    Antes considerada uma tendncia somente de pases desenvolvidos, o

    envelhecimento populacional , atualmente, uma realidade verificada em todos os

    pases no mundo em velocidades e caractersticas variadas. A reduo da

    fecundidade e da mortalidade infantil, o aumento da expectativa de vida e os novos

    conhecimentos e avanos cientficos na rea sade contribuem para que esta

    realidade se torne cada vez mais frequente (VERAS, 2009).

    De acordo com o World Health Organization (WHO) a estimativa da

    populao idosa no mundo em 2025 de 1,2 bilhes de pessoas, valor que

    corresponde ao dobro da populao idosa verificada no ano 2000. A proporo de

    idosos ir dobrar de 11% em 2006 para 22% em 2050. Considerando os dados da

    Amrica Latina e Caribe, o percentual de 9%, verificado em 2006, alcanar 24% em

    2050 (WHO, 2007; WHO, 2009).

    Ao analisar os dados nacionais, o Brasil passou de 3 milhes de idosos

    em 1960 para 7 milhes em 1975, e em 2008 apresentou uma populao de 20

    milhes de idosos o que representa um aumento de quase 700% em menos de 50

    anos. As projees apontam que em 2020 o Brasil ser o sexto pas com a maior

    populao idosa, com um nmero superior a 30 milhes de pessoas (VERAS, 2009;

    CARVALHO & GARCIA, 2003, LIMA-COSTA & VERAS, 2003).

    Em Manaus, os idosos residentes representam 6% da populao do

    municpio. Comparando-se os anos de 2000 e 2010, houve um aumento de 39,6%

    nessa populao, o que deixou a capital na 7a posio de cidade brasileira mais

    populosa e maior cidade da Regio Norte do pas. Dos 108.902 idosos residentes

    em Manaus, 56,2% so mulheres (DATASUS, 2013; IBGE, 2013).

  • 16

    Acompanhando este cenrio de envelhecimento populacional, verifica-se

    aumento na incidncia e doenas crnicas e degenerativas, que geralmente

    necessitam de tratamentos prolongados e contnuos. De acordo com Cruz et al.

    (2006) as doenas neurolgicas e psiquitricas tambm acompanharam este

    processo. Portanto, o aumento da populao idosa no Brasil traz desafios cada vez

    maiores aos servios e profissionais de sade, uma vez que h aumento da

    demanda de usurios e consequentemente aumento dos gastos em sade.

    Os idosos se tornaram grandes consumidores de medicamentos, sendo

    considerado por Rozenfeld (2003) o grupo etrio mais medicalizado da sociedade. A

    presena de mltiplas doenas requer o uso concomitante de vrios medicamentos,

    o que se torna uma preocupao, principalmente para os pacientes idosos. O uso de

    medicamentos pode representar riscos, principalmente quando realizado de maneira

    incorreta, tornando importante a educao teraputica e o uso racional de

    medicamentos para este grupo.

    Segundo Cramer (1991) diversos fatores podem influenciar no uso de

    medicamentos, como os relacionados ao paciente (sexo, idade, etnia, estado civil,

    escolaridade e nvel socioeconmico); doena (cronicidade, ausncia de sintomas

    e consequncias tardias); s crenas de sade, hbitos de vida e culturais

    (percepo da seriedade do problema, desconhecimento, experincia com a doena

    no contexto familiar e autoestima); ao tratamento (desconhecimento, falta do

    medicamento, esquecimento); qualidade de vida (custo, efeitos indesejveis,

    esquemas teraputicos complexos); instituio (poltica de sade, acesso ao

    servio de sade, tempo de espera, tempo de atendimento) alm do relacionamento

    com a equipe de sade.

  • 17

    Dentre os frmacos mais utilizados em idosos, destacam-se: anti-

    hipertensivos, estrgenos e progesteronas, antidepressivos e ansiolticos, trato

    alimentar e metabolismo (BUENO et al., 2009; RIBEIRO et al., 2008; LOYOLA

    FILHO et al., 2006; PEREIRA et al., 2004; FLORES,2003). Alm desses, Fleming &

    Goetten (2005) tambm citam os antiulcerosos.

    O uso de medicamentos visando modificar comportamento, humor e

    emoes tambm tem se mostrado expressivo em idosos, sendo utilizados para

    modificar o comportamento normal produzindo estados alterados ou para alvio de

    enfermidades mentais (BALDESSARINI, 1995). Porm, estudos demonstram que o

    uso de psicotrpicos tem sido associado a problemas importantes entre idosos: risco

    de reaes adversas, intoxicaes, dficit cognitivo e aumento das taxas de

    acidentes, quedas e fraturas (LVARES et al., 2010; NBREGA & KARNIKOWSKI,

    2005; DAAL & VAN LIESHOUT, 2005; CHAIMOWICZ et al., 2000; APA, 1990).

    Quando se trata do uso de medicamentos entre idosos, alguns fatores

    merecem destaque porque podem influenciar diretamente na qualidade da terapia

    medicamentosa, assim como podem influenciar negativamente na adeso ao

    tratamento entre idosos: uso em dosagens inadequadas (CORRER et al., 2007), uso

    de associaes medicamentosas (ROZENFELD, 2003), redundncias (GONTIJO et

    al., 2012), uso de medicamentos sem valor teraputico (GAVA, 2010),

    automedicao (DAINESI, 2005), polifarmcia (VITOR et al., 2008), ocorrncia de

    interaes medicamentosas (JUURLINK et al., 2003) e uso de medicamentos

    potencialmente inapropriados (AGS, 2012).

    Uma vez que a promoo de sade ao idoso apresenta contexto complexo

    e que os servios de sade precisam estar preparados para atender s demandas

    sempre crescentes desta parcela da populao, criou-se a Poltica Nacional de

  • 18

    Sade do Idoso, na qual foram definidas como diretrizes essenciais: a promoo do

    envelhecimento saudvel, ateno integral sade, capacitao dos recursos

    humanos especializados, cooperao na divulgao de conhecimentos cientficos

    nacionais e internacionais, bem como apoio a estudos e pesquisas (BRASIL, 2006).

    Como a populao idosa reconhecidamente utiliza mais os servios de sade, o

    acesso a servios especializados se faz importante, uma vez que pacientes idosos

    requerem cuidados especializados em maior intensidade (TRAVASSOS & VIACAVA,

    2007).

    Deste modo, considerando os diversos fatores que influenciam no uso de

    medicamentos e o risco que o uso de forma inadequada representa para a

    populao idosa, estudos epidemiolgicos que informem o perfil do uso de

    medicamentos na populao idosa so de extrema importncia em termos de Sade

    Pblica.

    Neste trabalho, foram estudados idosos atendidos em centros de sade de

    referncia - os Centros de Ateno a Melhor Idade (CAIMI) na cidade de Manaus,

    em relao s caractersticas socioeconmicas, perfil de sade e uso de

    medicamentos.

  • 19

    2. JUSTIFICATIVA

    O aumento da populao idosa e consequente aumento da prevalncia de

    doenas crnico-degenerativas e psiquitricas tm gerado diversas discusses

    sobre polticas pblicas em relao implicao social e sade (VERAS, 2007).

    fato que os idosos se encontram em situao de maior vulnerabilidade

    em relao aos problemas de sade. Por isso, importante considerar que com o

    passar dos anos, os idosos apresentam mudanas fisiolgicas, metablicas e

    bioqumicas importantes, que devem ser consideradas pelos profissionais de sade,

    principalmente no que se refere terapia medicamentosa. comum verificar para

    este grupo o uso concomitante de vrios frmacos (prescritos ou no) que devem

    ser cuidadosamente analisados, a fim de promover o uso racional de medicamentos,

    evitando a ocorrncia de interaes medicamentosas ou reaes indesejadas

    (COELHO FILHO et al., 2004, SILVA, 2004).

    Problemas relacionados aos medicamentos podem influenciar

    negativamente na capacidade funcional, psicomotora e cognitiva em idosos,

    aumentando o risco de acidentes, ferimentos, isolamento e internao,

    principalmente no que se refere ao uso de psicotrpicos (HULSE, 2002).

    Em geral, o objetivo do tratamento mdico a cura, mas muitas

    enfermidades presentes em idosos so passveis de tratamento para controle e por

    isso h necessidade de tratamentos prolongados ou contnuos. Desta forma, a

    estratgia do tratamento mdico para idosos deve ser promover maior adeso

    terapia e manuteno da qualidade de vida do paciente (ALMEIDA et al., 2007).

    Segundo Cramer (1991), dentre os principais fatores relacionados ao uso,

    ou no, de medicamentos, citam-se os fatores relacionados ao paciente (sexo,

    idade, escolaridade e nveis socioeconmicos), patologia (tipo, cronicidade,

  • 20

    ausncia de sintomas e consequncias tardias), ao tratamento (custo, efeitos

    adversos, adeso, esquemas complexos), hbitos de vida (uso de lcool e tabaco) e

    at mesmo institucionais (acesso aos sistemas de sade e fatores que dificultam o

    acesso).

    Em Manaus, os idosos contam com servios especializados atravs de

    atendimento nos CAIMI Centros de Ateno a Melhor Idade, que promovem

    atendimento exclusivo para populao idosa. Dividido em trs unidades nas zonas

    norte, sul e oeste; o servio disponibiliza atendimento ambulatorial, com nfase no

    manejo das doenas prevalentes e aes preventivas, sendo por estes motivos

    escolhidos como local de estudo.

    Considerando a falta de estudos epidemiolgicos sobre o uso de

    medicamentos em idosos no estado do Amazonas e a relevncia de tais

    informaes para a gesto dos servios de sade, avaliou-se a prevalncia do uso

    de medicamentos na populao idosa atendida em centros de sade de referncia

    em Manaus Centros de Ateno ao Idoso (CAIMI) e suas relaes com demais

    fatores relacionados ao uso de medicamentos.

  • 21

    3. REVISO DA LITERATURA

    Assim como em outros pases, o envelhecimento populacional ocorre de

    forma acentuada no Brasil, como consequncia da reduo da fecundidade e da

    mortalidade infantil, alm do aumento da expectativa de vida. O tema vem sendo

    bastante enfatizado no que se refere s suas implicaes sociais, econmicas,

    sanitrias, culturais e polticas, visto que so necessrios gastos diferenciados, com

    novos recursos e estruturas para atender ao perfil epidemiolgico e demogrfico que

    se consolida (PEREIRA et al., 2006; LOYOLA FILHO et al., 2005; SIQUEIRA et al.,

    2002).

    Conforme a populao envelhece, novos paradigmas de sade surgem.

    Antes, somente a presena ou ausncia de doenas era um indicador de sade

    importante. Hoje, necessrio avaliar o grau de capacidade funcional do indivduo.

    O processo de envelhecimento sem doenas envolve graus de perda funcional, mas

    tambm importante avaliar como essa perda pode ser acentuada em virtude de

    fatores genticos e ambientais (RAMOS, 2009).

    Em um pas de dimenses continentais e em contextos de importantes

    desigualdades regionais e sociais, o sistema pblico de sade e previdncia no

    capaz de atender a necessidades da populao idosa. Os problemas de sade

    tpicos da idade, como a presena de doenas crnicas, perda de autonomia e

    aumento das incapacidades acabam por diminuir a qualidade de vida. Assim,

    questes relacionadas capacidade funcional e autonomia em idosos se tornam

    mais relevantes do que as prprias morbidades, pois esto diretamente ligadas

    qualidade de vida (CHAIMOWICZ, 1997).

    Em virtude do aumento da populao idosa, verifica-se simultaneamente o

    aumento de patologias com diversificada sintomatologia, principalmente crnicas

  • 22

    degenerativas, que frequentemente necessitam de terapias prolongadas e

    contnuas, o que torna esse grupo um grande consumidor de medicamentos

    (ANDRADE et al., 2004). Por isso, os idosos so, possivelmente, o grupo etrio mais

    medicalizado da sociedade (ROZENFELD, 2003; MOSEGUI et al., 1999).

    A problemtica de sade do idoso no tange apenas o uso de

    medicamentos. reconhecido que essa populao utiliza mais servios de sade,

    apresenta internaes hospitalares mais frequentes, alm de maior tempo de

    ocupao de leitos em hospitais, quando comparados a outras faixas etrias

    (VERAS, 2002).

    Tendo em vista que este um problema multifatorial, que a sade um

    direito universal e que a reduo das desigualdades prioridade das polticas

    pblicas, o acesso aos servios de sade, em seus diversos graus de especialidade,

    deve priorizar no somente o tratamento, mas deve fornecer uma verdadeira rede de

    suporte social, com nfase na equidade e na integralidade (LOUVISON et al, 2008).

    3.1. Importncia da caracterizao socioeconmica em sade

    Segundo Duarte et al. (2002) a situao socioeconmica exerce papel

    central na sade dos indivduos e da populao. Durante muito tempo, essa

    caracterizao permitiu que fossem tomadas medidas em termos de sade pblica

    que auxiliassem atividades de preveno e controle de algumas doenas, bem como

    acompanhamento da populao, planejamento e at certo ponto, avaliao das

    aes de sade desenvolvidas (CESAR et al., 1996).

    O conceito de classe social em sade antes era utilizado na tentativa de

    ampliar o entendimento do processo sade-doena na perspectiva da sua

    determinao social, porm, estudos epidemiolgicos tm demonstrado que

  • 23

    doenas e limitaes no so consequncias inevitveis do envelhecimento, mas

    que so fatores influenciados tambm pelo acesso aos servios de sade, reduo

    dos fatores de risco, mudana de hbitos, sociedade na qual o individuo se insere,

    bem como suas condies socioeconmicas (BRETAS, 2003; CESAR et al., 1996)

    Alguns estudos de base populacional demonstraram que idosos com

    melhores condies socioeconmicas apresentam melhores condies de sade

    (ALVES et al., 2010; GIACOMIN et al., 2005; KNESEBECK et al., 2003; PARKER et

    al., 1999; BERKMAN & GURLAND, 1998). Em contrapartida, outros autores

    demonstraram que associao entre condies de sade e indicadores

    socioeconmicos no so significativos quando analisados entre a populao idosa

    (DUNCAN et al. 2002, BECKETT, 2000).

    Em estudo realizado no Brasil baseado em amostra da PNAD Pesquisa

    Nacional por Amostra de Domiclio, Lima-Costa et al. (2003) verificaram que idosos

    com renda mais baixa apresentaram piores condies de sade (pior percepo da

    sade, interrupo de atividades por problemas de sade, ter estado acamado e

    relato de algumas doenas crnicas), pior funo fsica e menor uso de servios de

    sade (menor procura e menos visitas a mdicos e dentistas).

    Para que sejam planejadas polticas pblicas especficas para a terceira

    idade, o conhecimento das condies de sade e a influncia da situao

    econmica devem ser considerados, buscando corrigir distores por classe social

    (BERQU, 1999). As aes devem ser realizadas com base pesquisas que

    determinem um diagnstico bsico atravs dos seguintes indicadores: idade, sexo,

    nvel educacional, condies socioeconmicas, descrio dos problemas e

    necessidades bsicas para promoo de sade e bem-estar, alm de dados sobre

    morbidade e incapacidade (KALACHE, 1993).

  • 24

    Outro importante fator que deve ser analisado o nvel de escolaridade.

    Segundo Meireles et al. (2007) baixos nveis de escolaridade associados a fatores

    socioeconmicos e culturais podem influenciar no aparecimento de doena, uma vez

    que podem dificultar a obteno de informaes e a conscientizao das pessoas

    sobre a relevncia dos cuidados com a sade ao longo da vida, bem como interferir

    na adeso ao tratamento e na manuteno de hbitos saudveis.

    A estrutura demogrfica, sexo, fatores socioeconmicos,

    comportamentais, culturais, o perfil de morbidade, polticas governamentais e

    propaganda tambm podem influenciar no padro do uso de medicamentos em

    determinadas regies. Por isso necessrio que se investigue qual a relao entre

    esses fatores e sua influncia no uso de medicamentos por idosos (BATISTA et al.,

    2008; ARRAIS, 2009; ARRAIS et al., 2005; BERTOLDI et al., 2004; LOYOLA FILHO

    et al., 2002).

    Em estudo sobre uso de medicamentos e polifarmcia em idosos

    residentes em comunidade, Linjakupum et al. (2002) verificou que idosos do sexo

    feminino, mais velhos e vivos consomem mais medicamentos. J Chen et al. (2001)

    verificou que idosos em pior situao econmica consomem mais medicamentos.

    Em estudo sobre o perfil de uso de medicamentos em idosos no nordeste

    brasileiro, Coelho Filho et al. (2004) verificaram que o uso de medicamentos

    prescritos apresentou associao com idade avanada, sexo masculino, e nvel

    socioeconmico. J o uso de medicamentos no prescritos estava associado ao

    nvel de comprometimento funcional e nvel socioeconmico. Os autores concluram

    que as desigualdades se deram em virtude dos diferentes nveis socioeconmicos.

    Em pesquisa de base populacional em Minas Gerais, na cidade de

    Bambu, Loyola Filho et al. (2005) verificaram que o consumo de medicamentos

  • 25

    prescritos esteve associado ao sexo feminino, idade (70-79 e 80 anos), renda

    familiar(maior), estado de sade (pior) e nmero de consultas mdicas (maior). O

    uso de medicamentos no prescritos apresentou associao negativa com consulta

    mdica e associao positiva com sexo (feminino) e consulta a um farmacutico.

    Em outro estudo sobre uso de medicamentos em idosos, desta vez na

    regio metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, Loyola Filho et al. (2006)

    verificaram que o consumo de qualquer numero de medicamento apresentou

    associao independente com o sexo feminino, idade (80 anos ou mais), ter visitado

    um mdico e apresentar alguma condio crnica.

    Os resultados encontrados por Silva et al. (2010) verificaram que a

    correlao entre idade, estado civil e com quem mora esteve estatisticamente

    associado ao uso de medicamentos. J em inqurito postal nacional, Silva et al.

    (2012) verificaram associao com o uso de medicamentos para as variveis: sexo

    feminino, benefcio recebido via INSS (Instituto Nacional do Seguro Social),

    participao em plano de sade privado e maior nmero de consultas mdicas.

    Para definir os critrios considerados para caracterizao socioeconmica,

    escolheu-se o Critrio de Classificao Econmica Brasil (CCEB), que foi

    desenvolvido pela Associao Brasileira de Empresas de Pesquisa. Este critrio

    divide a populao segundo padres e potenciais de consumo.

    Em virtude da facilidade de aplicao, a classificao socioeconmica

    bem aceita. Realizada por meio da atribuio de pesos a um conjunto de itens, so

    avaliados desde o conforto domstico e at o nvel de escolaridade do chefe de

    famlia. O critrio atribui pontos em funo de cada caracterstica domiciliar e realiza

    a soma destes pontos. feita ento uma correspondncia entre faixas de

  • 26

    pontuao do critrio e estratos definidos por A1, A2, B1, B2, C1, C2, D, E; quanto

    maior a pontuao, melhor a situao socioeconmica (ABEP, 2012).

    3.2. Aspectos relacionados sade do idoso

    O envelhecimento saudvel depende da interao de diversos fatores, que

    influenciam no estado de sade do indivduo e devem ser analisados conjuntamente.

    Assim, a caracterizao da sade requer inqurito sobre mltiplas informaes

    referentes a diferentes aspectos da vida dos idosos (ALVES & RODRIGUES, 2005;

    PORTRAIT et al., 2001).

    Tornou-se importante conhecer no s os aspectos socioeconmicos, mas

    tambm obter informaes sobre o estado de sade, restries de atividades da vida

    diria, necessidades percebidas de sade e o uso de servios, bem como de gastos

    com bens e servios de ateno sade. Portanto, variaes nas condies de

    sade, bem-estar, capacidade funcional e necessidades de cuidado distinguem

    diferentes grupos de idosos (CREWS & ZAVOTKA, 2006; DACHS, 2002).

    Bailis et al. (2003) sugerem que uma forma de realizar esses estudos o

    levantamento de informaes sobre a percepo dos idosos sobre seu prprio

    estado de sade. Embora esta mensurao seja difcil, visto que uma varivel

    multifatorial, em geral tem se mostrado um mtodo confivel.

    Segundo Appels et al. (1996) a autopercepo se associa fortemente ao

    estado real ou objetivo de sade das pessoas e pode ser utilizada como uma

    representao das avaliaes objetivas de sade. Para Blaxter (1990) a

    autopercepo de sade, alm de ser um dado fcil de ser coletado, apresenta

    concordncia de 80% entre a autoavaliao do estado de sade e a avaliao

    clnica da presena ou ausncia de condio crnica.

  • 27

    Como a autoavaliao em sade um indicador importante sobre o

    comportamento da populao em relao busca por servios de sade,

    principalmente no caso dos idosos, este um dado tradicionalmente coletado e que

    de certa forma permite qualificar informaes mais diretamente relacionadas

    limitao de atividades causadas por problemas de sade de longa durao

    (STURGIS et al., 2001).

    Outro importante aspecto a prtica de atividade fsica. fato que a

    relao entre atividade fsica, sade, qualidade de vida e envelhecimento vem sendo

    cada vez mais analisada cientificamente. Tornou-se consenso que a atividade fsica

    um fator determinante no processo de envelhecimento e que sua prtica indica

    certo grau de independncia e capacidade funcional. Capaz de exercer efeitos

    positivos contra o aumento e evoluo de doenas crnico-degenerativas, o

    exerccio proporciona melhora no estado geral de sade da populao,

    especialmente a idosa (SILVA et al., 2012; MATSUDO et al., 2001).

    Considerando o conceito de capacidade funcional como a habilidade fsica

    e mental para que se mantenha uma vida independente e autnoma, define-se que

    incapacidade funcional a inabilidade ou dificuldade no desempenho de

    determinadas atividades bsicas da vida cotidiana, que so indispensveis para uma

    vida independente na comunidade (YANG & GEORGE, 2005; RAMOS et al., 1993).

    Da mesma forma, a relao do idoso com os servios de sade deve ser

    avaliada. reconhecido que o idoso necessita de ateno em sade especializada,

    utiliza mais servios de sade, enfrenta frequentes internaes hospitalares, alm de

    maior tempo em ocupao de leitos quando comparado a outras faixas etrias

    (VERAS, 2002).

  • 28

    Desta forma, informaes obtidas sobre manifestao de doenas ou

    sintomas ao longo da vida, a presena de doena nos ltimos 12 meses e a busca

    por servios de sade so dados importantes. A Organizao Mundial de Sade

    considera que a presena de doena nos ltimos 12 meses o indicador mais

    adequado para monitoramento da sade da populao (WHO, 1990).

    O Brasil possui um sistema de sade nico no mundo, o SUS Sistema

    nico de Sade, que legalmente garante atendimento gratuito e igualitrio, mas que

    no consegue atender as demandas de toda a populao. Na realidade, o modelo

    de ateno sade predominante caracteriza-se pela fragmentao do cuidado,

    centralizao do poder no profissional mdico e dificuldade de acesso da populao

    com menor poder aquisitivo. Desta forma, no se tem conseguido atender

    adequadamente aos diversos e complexos problemas de sade, principalmente da

    populao idosa, pela necessidade de atendimento especializado (MARIN et al.,

    2008; VERAS, 2003).

    3.3. Morbidades em idosos

    De acordo com Rodrigues et al. (2008) a literatura brasileira demonstra

    que o aumento de doenas crnicas no transmissveis est intimamente

    relacionado com o aumento da demanda de idosos.

    Para Amaral et al. (2004) e Almeida et al. (2002) as doenas crnicas so

    a principal causa de incapacidade, a maior razo para a demanda aos servios de

    sade e so responsveis por considerveis gastos efetuados no setor de sade,

    principalmente para atendimento de idosos, uma vez que os tratamentos

    prolongados e a recuperao mais lenta e complicada onerosa para os servios de

    sade.

  • 29

    Neste contexto, o conceito de morbidade tem sido utilizado para designar

    um conjunto de casos de uma mesma doena ou a soma de agravos de sade que

    atingem um determinado grupo de indivduos, em tempo e lugar especfico.

    Tambm se considera que a ocorrncia, frequncia e desvio de bem estar esto

    associados ao termo morbidade (MINARI, 1997).

    Quando associadas ao prprio envelhecimento, as morbidades podem

    resultar em perdas das funes fsicas e mentais, interferindo na capacidade

    funcional. Assim, o nmero de comorbidades um fator fortemente associado s

    incapacidades funcionais, bem como dependncia de cuidados em sade

    (RAMOS, 2003; ROSA et al., 2003). Estudos demonstram associaes importantes

    entre doenas crnicas e incapacidade funcional em idosos (KATTAINEN et al.,

    2004; ROSA et al., 2003; BARDAGE & ISACSON, 2001).

    Conhecer as doenas que afetam a populao idosa no pas, bem como

    as necessidades de ateno em sade, pode auxiliar na promoo de polticas

    pblicas diferenciadas para atendimento das demandas assistenciais de forma

    adequada. Do mesmo modo, estratgias preventivas mais eficazes podem reduzir os

    custos com servios de sade e diminuir a carga sobre a famlia (ALVES et al., 2007;

    DUARTE, 2003).

    De acordo com Almeida et al. (2002) estudos tm sido feitos para validar

    informaes sobre morbidade ou estado de sade autorreferido, com o intuito de

    permitir interpretaes e anlises obtidas em inquritos domiciliares mais fidedignas.

    Para Barreto & Figueiredo (2009) estudos epidemiolgicos frequentemente utilizam

    informaes autorreferidas pela relativa simplicidade e baixo custo na coleta dos

    dados.

  • 30

    Para Viacava (2002) coletar dados sobre doenas crnicas uma questo

    arbitrria, visto que algumas doenas crnicas s podem ser reconhecidas a partir

    de um diagnstico mdico, assim, os inquritos podem subestimar a prevalncia de

    algumas enfermidades.

    A sugesto da OMS para coleta de tais dados que os pases devem

    selecionar as doenas de maior impacto em cada realidade, porm sugere que

    algumas doenas crnicas estejam presentes nos inquritos, tais como: hipertenso,

    asma, bronquite, problemas com tireoide, diabetes, doena crnica de pele, doena

    crnica de corao, cistite crnica, problema dental crnico, dor nas costas crnica,

    artrite e acidente vascular cerebral (WHO, 1990).

    3.4. Aspectos relacionados ao uso de medicamentos

    O uso de drogas para os mais diversos fins antigo. O desenvolvimento

    de medicamentos representa um grande avano na histria, visto que contribui de

    forma relevante para melhoria da qualidade de vida da populao (FERNNDEZ-

    LLIMS et al., 2004; SAYD et al., 2000).

    Apesar do uso de medicamentos apresentar vantagens, h possibilidade

    de produzir danos sade em decorrncia da utilizao incorreta. Mesmo quando os

    frmacos so utilizados em doses preconizadas e com correta indicao mdica, h

    riscos associados ao uso de medicamentos (QATO et al., 2008; CIPOLLE et al.,

    2006).

    A falta de estudos epidemiolgicos sobre sade do idoso, principalmente

    no que se refere terapia medicamentosa e efetividade do tratamento, dificulta a

    implementao de uma poltica de assistncia farmacutica adequada a real

  • 31

    necessidade da populao, assim como impede a melhoria da qualidade da ateno

    ao idoso no Brasil (RIBEIRO et al., 2005).

    Com o crescimento de avanos tecnolgicos e o desenvolvimento de

    formulaes cada vez mais potentes e de custo elevado, a venda de frmacos

    movimenta um mercado milionrio (CALIXTO & SIQUEIRA JR, 2008). Porm, em

    termos de sade pblica, a preocupao com a sade e o bem estar do indivduo

    devem estar acima de interesses financeiros.

    Pereira & Freitas (2008) demonstram que o acompanhamento

    farmacacoteraputico pode promover melhor controle das patologias, por promover

    melhor relao entre os pacientes e os medicamentos e melhor comunicao entre

    as equipes de sade, contribuindo para reduo de erros de medicao e reaes

    adversas.

    Posto isto, pesquisas sobre avaliao do uso de medicamentos so

    importantes para conhecer quais fatores podem influenciar no consumo de

    medicamentos. Do mesmo modo, Sayd et al. (2000) consideram que pesquisas

    devem ser realizadas para que se conhea a motivao e os fatores determinantes

    para o uso de medicamentos, tanto em relao prescrio quanto

    automedicao.

    Problemas diversos podem ser decorrentes do mau uso e abuso de

    consumo de medicamentos, principalmente na populao idosa. Esses fatores,

    aliados a no adeso terapia tm provocado impacto sobre medidas pblicas para

    preveno de agravos e promoo da sade, assim como influencia nos gastos

    envolvidos na prestao de servios de sade (GOMES et al., 2007).

    A adeso fica ainda mais comprometida quando os tratamentos so

    longos ou quando h alteraes no estilo de vida, o que frequente na populao

  • 32

    idosa (SILVEIRA & RIBEIRO, 2005). Segundo Vasconcelos et al. (2005), fatores

    como capacidade de ler e escrever, desconhecimento sobre o medicamento, nmero

    de comprimidos consumidos diariamente, local de armazenamento e o contexto

    familiar influenciam no correto tratamento medicamentoso.

    Sayd et al. (2000) consideram que tambm so critrios de uso de

    medicamentos o hbito, aceitao propagandas da indstria farmacutica, atrao

    por novas frmulas e at mesmo a falta de conhecimento pode induzir a um uso

    incorreto de medicamentos, que poderia levar a um aumento de complicaes

    iatrognicas e a gastos desnecessrios para o tratamento.

    Em relao quantidade de medicamentos utilizados, Rozenfeld (2003)

    afirma que a maioria dos idosos consome pelo menos um medicamento e cerca de

    um tero faz uso de cinco ou mais simultaneamente. Assim, a mdia de consumo

    entre idosos varia entre dois e cinco princpios ativos, dependendo da condio

    socioeconmica e do seu estado de sade.

    Em diferentes estudos verificou-se que os frmacos mais consumidos

    normalmente consistem naqueles utilizados em doenas crnicas prevalentes na

    terceira idade. Dentre esses, destacam-se os medicamentos para o sistema

    cardiovascular, sistema nervoso e trato alimentar e metabolismo (NETO et al. 2012;

    SILVA et al., 2012; LOYOLA FILHO et al., 2006; NBREGA et al., 2005; CASTRO,

    2001; MOSEGUI et al., 1999; MIRALLES & KIMBERLIN, 1998).

    Ribeiro et al. (2008) tambm verificaram que os medicamentos mais

    utilizados por idosos atuavam sobre os sistemas cardiovascular, nervoso e trato

    alimentar e metabolismo, sendo o consumo superior entre as mulheres, tornando-as

    mais vulnerveis aos prejuzos de polifarmcia tais como risco de interaes e uso

    inadequado.

  • 33

    Dentre os principais indicadores da qualidade da terapia medicamentosa

    para idosos, destacam-se: nmero de medicamentos empregados, a proporo de

    frmacos contraindicados para a idade, assim como associaes que podem causar

    interaes medicamentosas potencialmente perigosas e as redundncias

    farmacolgicas (ROZENFELD, 1997).

    Interaes medicamentosas so tipos especiais de respostas

    farmacolgicas, em que os efeitos de um ou mais medicamentos so alterados pela

    administrao simultnea ou anterior de outro frmaco, alimento, bebida ou algum

    agente qumico ambiental (HOEFLER & WANNMACHER, 2010; OGA & BASILE,

    1994). Como a populao idosa reconhecidamente faz uso de diversos frmacos

    simultaneamente, se faz necessrio avaliar a possibilidade de ocorrncia de

    interaes entre frmacos.

    Quanto maior o nmero de frmacos utilizados, maior o risco de interao

    frmaco-frmaco. De acordo com Juurlink et al. (2003) os idosos so particularmente

    suscetveis interao medicamentosa em virtude da polifarmcia, presena de

    comorbidades e tratamento por vrios mdicos. Goldberg et al. (1996) em estudo

    com 205 pacientes verificou que interaes medicamentosas ocorriam em 13% dos

    pacientes tomando dois medicamentos e em 85% dos pacientes que consumiam

    mais de seis medicamentos.

    Como respostas decorrentes de interao podem ocorrer: potencializao

    do efeito teraputico, reduo da eficcia, surgimento de reaes adversas com

    distintos graus de gravidade ou ainda, no causar nenhuma modificao no efeito

    desejado do medicamento (OGA & BASILE, 1994). Assim, a interao entre

    medicamentos pode ser benfica, ou ainda pode causar respostas indesejadas no

  • 34

    previstas no regime teraputico (reao adversa) ou apresentar pouco significado

    clnico (SECOLI, 2001).

    Revela-se importante tambm a redundncia, que a utilizao de mais

    de um medicamento pertencente mesma classe teraputica e que, portanto,

    possuem o mesmo mecanismo de ao. Embora se utilize a redundncia na terapia

    de algumas patologias, como por exemplo, o diabetes, prefervel recorrer

    monoterapia, a fim de reduzir os riscos ao paciente (GONTIJO et al., 2012; AGUIAR

    et al., 2008; RUMEL et al., 2006; MOSEGUI et al. 1999).

    Dentre outros problemas relacionados ao uso, encontram-se as

    associaes em doses fixas e o uso de medicamentos sem valor teraputico. Estes

    no apresentam eficcia clnica quando comparados a outros medicamentos j

    disponveis no mercado, enquanto aqueles no so recomendados em virtude da

    maior probabilidade de ocorrncia de reaes adversas, bem como pela

    impossibilidade de individualizao da dose de cada medicamento (GAVA et al.,

    2010; ROZENFELD, 2003).

    Existem associaes em doses fixas que representam potencial de causar

    reaes adversas. Esses medicamentos s podem ser recomendados caso haja

    vantagens acumuladas, maior eficcia, melhor cumprimento da prescrio mdica e

    reduo de custos (NBREGA et al., 2005). Pode ser necessria a monitorizao

    teraputica dos nveis sanguneos do frmaco para realizar eventuais ajustes de

    dose (ROSA et al., 2006).

    Outro problema frequentemente relatado no Brasil a automedicao, que

    ocorre quando um indivduo faz o consumo de medicamentos sem prescrio por

    profissional habilitado (mdico ou dentista) ou indicado por balconistas de farmcia,

    farmacuticos, leigos (parentes, vizinhos ou amigos), por conta prpria ou refazendo

  • 35

    terapias anteriores, o que representa um grave problema de sade pblica, visto que

    nenhum medicamento isento de riscos (OLIVEIRA et al., 2012; DAINESI, 2005).

    Para Coelho Filho et al. (2004) o conhecimento do perfil de utilizao de

    medicamentos de fundamental importncia para o delineamento de estratgias de

    prescrio e de uso racional de frmacos, a fim de garantir a qualidade da terapia

    medicamentosa na populao idosa. Para Rocha et al. (2008) o conhecimento sobre

    o uso de medicamentos pode auxiliar na identificao de problemas relacionados ao

    uso entre idosos, o que pode interferir na adeso prescrio mdica e na

    conscientizao da farmacoterapia responsvel.

    A preocupao com o uso racional de medicamentos por idosos se mostra

    relevante, visto que em virtude de mudanas fisiolgicas, a prescrio do idoso deve

    considerar peculiaridades farmacocinticas e farmacodinmicas, assim como o custo

    para manuteno da terapia e eventuais dificuldades para adeso ao tratamento

    (ANDRADE et al., 2004). Essas mudanas podem influenciar negativamente na

    capacidade funcional, bem como na habilidade psicomotora e cognitiva, aumento o

    risco de acidentes, ferimentos, isolamento e institucionalizao (HULSE, 2002).

    Em relao ao consumo de medicamentos psicotrpicos, verifica-se um

    aumento expressivo do uso em idosos, fato decorrente da ampliao da indicao

    teraputica, do lanamento de novos frmacos com menor perfil de toxicidade e do

    reconhecimento de determinados quadros clnicos que necessitam do uso desses

    medicamentos (NOIA, 2010).

    O estudo do uso de medicamentos entre idosos importante, pois apesar

    da necessidade do uso de medicamentos, h eventuais riscos relacionados ao uso,

    principalmente quando este se faz inadequado. Os idosos so particularmente

    vulnerveis, pois como utilizam mltiplos medicamentos, aumentam os riscos da

  • 36

    ocorrncia de reaes adversas (TEIXEIRA & LEFVRE, 2001). Analisar os fatores

    relacionados ao uso e adeso da terapia pode auxiliar os profissionais de sade a

    promover melhorias na ateno sade do idoso.

    3.4.1. Medicamentos psicotrpicos

    Os medicamentos psicotrpicos so modificadores seletivos do Sistema

    Nervoso Central e podem ser classificados, segundo a Organizao Mundial de

    Sade em: ansiolticos e sedativos, antipsicticos, antidepressivos, estimulantes

    psicomotores, psicomimticos e potencializadores da cognio (RANG et al., 2001).

    Dentre os mais utilizados entre idosos, destacam-se os ansiolticos e sedativos

    (FIRMINO et al., 2011; SANTOS et al., 2009; ROZENFELD, 2003).

    Em estudo transversal de base populacional realizado em idosos de 75

    anos ou mais em So Paulo, Noia et al. (2010) verificaram prevalncia 12,2%

    (n=136) de uso de psicotrpicos: 7,2% de antidepressivos; 6,1% de

    benzodiazepnicos; e 1,8% de antipsicticos.

    Entre idosos de instituies de longa permanncia, lvares et al. (2010)

    verificaram prevalncia de consumo de psicotrpicos de 59,7% (n=145). Em estudos

    internacionais, Hosia-Randell & Pitkl (2005) verificaram que entre os idosos

    participantes de 65 anos ou mais, 79,7% usam medicamentos psicotrpicos

    regularmente. Mann et al. (2009) verificaram a prevalncia do uso de psicotrpicos

    em 74,6% e Bergman et al. (2007) verificaram que os sedativos hipnticos e os

    antidepressivos estavam entre os dez medicamentos mais prescritos, com

    prevalncias de 55,1 e 51% respectivamente, o que demonstra que os psicotrpicos

    so amplamente utilizados em instituies de longa permanncia e asilos.

    O uso de medicamentos psicotrpicos tem sido considerado um

    importante fator de risco para acidentes e quedas. Dentre os frmacos que

  • 37

    representam os maiores riscos, encontram-se: benzodiazepnicos, neurolpticos,

    sedativos, hipnticos, antidepressivos e antiparkinsonianos. Alm dos psicotrpicos,

    outras classes ou medicamentos tm sido associadas ao risco de acidentes e

    quedas, tais como diurticos, antiarrtmicos, anti-hipertensivos e digoxina

    (COUTINHO & SILVA, 2002; BRITO et al., 2001; LEIPZING et al., 1999a, 1999b).

    O uso desses medicamentos pode provocar acidentes porque podem

    diminuir as funes motoras, causar fraqueza muscular, fadiga, vertigem ou

    hipotenso postural, provocando perda da autonomia, da qualidade de vida, entre

    outras perdas (ANDRADE et al., 2004; FABRCIO et al., 2004).

    Verifica-se que se faz uso cada vez maior de medicamentos psicotrpicos

    em idosos, visto que sndromes psiquitricas so entidades frequentes na psiquiatria

    geritrica (ROCHA et al., 1997). Dados demonstram que a prevalncia de

    transtornos mentais em idosos variada, porm estima-se que 25% 9 milhes de

    pessoas no mundo tm sintomas psiquitricos significativos. A expectativa de que

    o nmero de pessoas idosas com transtorno mental dobre at a metade do sculo

    XXI, constituindo um grave problema clnico e de sade pblica (SADOCK &

    SADOCK, 2007).

    Estudos sobre a prevalncia de transtornos psiquitricos no Brasil so

    escassos. Almeida (1999) em estudo realizado em idosos atendidos em emergncia

    psiquitrica verificou que o transtorno de humor era o diagnstico sindrmico mais

    comum entre os idosos (40,0%), sendo 2,24 vezes mais frequente nas mulheres.

    Transtornos mentais de origem orgnica so a segunda causa mais frequente de

    atendimento mdico (19,2%) e demncia o principal diagnstico entre esses casos

    (14%). Outros diagnsticos frequentes so transtornos ansiosos (15,4%) e

    esquizofreniformes (14,4%), alcoolismo (4,1%) e abuso de sedativos (2,6%).

  • 38

    Para Garrido & Menezes (2002) e Irigaray & Schineider (2007) os

    problemas mentais mais prevalentes na populao idosa so as sndromes

    depressivas e demenciais. Sua importncia se d porque esto relacionados s

    perdas de autonomia e ao agravamento de quadros patolgicos existentes.

    A escassez de estudos sobre prevalncia de transtornos psiquitricos no

    Brasil, principalmente em idosos, pode ser explicada pela dificuldade de

    determinao do padro de normalidade para idosos. Em muitas ocasies difcil

    distinguir entre normalidade e doena mental, o que no permite definio clara de

    diagnstico psiquitrico (STELLA et al., 2002; PAOLIELLO, 2001).

    Aliado a isso, diferenas entre psiquiatras quanto a critrios diagnsticos e

    a forma de obteno das informaes dos indivduos podem variar, necessitando

    assim de instrumentos padronizados para que diferentes investigadores possam

    realizar a comparao de resultados (MENEZES et al., 2000).

    3.4.2. Reaes adversas e interaes medicamentosas

    fato que a teraputica medicamentosa essencial para o controle da

    maioria das doenas, porm importante considerar que no existem frmacos

    seguros, visto que seu uso pode desencadear reaes adversas (PASSARELLI et

    al., 2007).

    A reao adversa a medicamentos considerada como uma resposta

    nociva e no intencional ao uso de um medicamento que ocorre em associao a

    doses normalmente empregadas em seres humanos para profilaxia, diagnstico e

    tratamento de doenas e/ou para a modificao de funes fisiolgicas, excludos os

    casos de falha teraputica (EDWARD & ARONSON, 2000).

    Diversos estudos tm colaborado para demonstrar que alguns

    medicamentos especficos ou categorias de medicamentos devem ser evitados ou

  • 39

    utilizados com cautela, visto que no organismo do idoso podem induzir reaes

    indesejadas (NBREGA & KARNIKOWSKI, 2005).

    Alm do risco da ocorrncia de reaes adversas, comum verificar o uso

    simultneo de vrios medicamentos (polifarmcia) entre idosos, o que os expe a

    interaes medicamentosas. Entende-se como interao medicamentosa a alterao

    na atividade farmacolgica o que resulta em modificaes na velocidade ou na

    extenso de absoro, distribuio, metabolismo ou excreo, de um determinado

    medicamento pela administrao prvia ou concomitante de outro medicamento

    (KAWANO et al., 2006; HOEFLER, 2005).

    Reconhece-se que tambm possvel ocorrer interaes entre

    medicamento-alimento, medicamento-etanol, medicamento-tabaco, medicamento-

    teste de laboratrio, medicamento-gravidez, medicamento-lactao, duplicao de

    princpio ativo e alergia. Como forma de auxiliar os profissionais em relao essas

    informaes, a ferramenta Micromedex, fornece informaes baseadas em

    evidncias sobre as drogas, o manejo da doena, toxicologia, a dosagem neonatal,

    medicinas alternativas, e educao do paciente (MICROMEDEX, 2013).

    3.4.3. Medicamentos potencialmente inapropriados

    O fato do organismo do idoso apresenta mudanas em suas funes

    fisiolgicas, bem como particularidades farmacocinticas e farmacodinmicas,

    presena de mltiplas doenas e a necessidade de uso de vrios frmacos de forma

    contnua possibilitam que este grupo apresente risco mais elevado de ocorrncia de

    reaes adversas, principalmente quando se faz uso de medicamentos

    potencialmente inapropriados para idosos (FICK et al., 2008; PASSARELLI &

    JACOB FILHO, 2007; NBREGA & KARNIKOWSKI, 2005; GURWITZ, 2004).

  • 40

    Deve-se tambm considerar o fato de que tais alteraes fisiolgicas

    podem resultar em durao mais longa da atividade de frmacos, efeitos maiores ou

    menores e aumento do risco de intoxicao (HAYES et al., 2007).

    Em virtude desses problemas, algumas categorias de medicamentos

    passaram a ser considerados imprprios para uso em idosos, seja por falta de

    eficcia teraputica comprovada ou pelo risco aumentado de efeitos adversos, o que

    justifica seu impedimento de uso (NBREGA & KARNIKOWSKI, 2005).

    Como exemplo de medicamentos contraindicados para uso em idosos, os

    antidepressivos como amitriptilina e doxepina, em virtude de suas propriedades

    anticolinrgicas e sedativas no so a melhor escolha. Os antipsicticos

    frequentemente so txicos e podem provocar sedao, distrbios do movimento e

    efeitos colaterais anticolinrgicos (MERK, 2002).

    Para Gallagher et al. (2008a) o uso de medicamentos inapropriados em

    pacientes idosos uma prtica comum e se associa a efeitos adversos, mortalidade

    e consequentemente maiores gastos pblicos nos servios de sade. Assim, o tema

    se tornou alvo de especialistas e diversos mtodos de adequao da terapia

    farmacolgica para idosos foram propostos.

    Os primeiros a criar um conjunto de critrios para identificar medicamentos

    inadequados para uso em idosos foram Beers et al. (1991). Neste estudo, diferentes

    aspectos puderam ser abordados para definir a qualidade do uso de medicamentos:

    prtica da polifarmcia, ou seja, uso concomitante de vrias classes teraputicas,

    substituio de frmacos e uso indevido de alguns medicamentos. Considerou-se

    um frmaco inadequado quando este apresenta mais riscos do que benefcios.

    O critrio de Beers j sofreu quatro revises, sendo a ltima no ano de

    2012 pela American Geriatrics Society - AGS. Alm do apoio da AGS, o estudo foi

  • 41

    conduzido por um painel interdisciplinar de 11 especialistas em cuidados geritricos

    e farmacoterapia, aplicando uma verso modificada do mtodo Delphi para reviso

    sistemtica e classificao.

    Como resultado, 53 medicamentos ou classes foram considerados

    inadequados para uso em idosos, divididos em 3 categorias: 1) medicamentos

    potencialmente inapropriados para idosos, 2) medicamentos potencialmente

    inapropriados para idosos na presena de doenas ou sndromes e 3)

    medicamentos a serem utilizados com precauo (AGS, 2012). A descrio dos

    medicamentos potencialmente inapropriados para idosos encontra-se no Quadro 1.

    Outros critrios para a identificao de medicamentos inapropriados para

    idosos so considerados importantes para a literatura. McLeod et al. (1997),

    identificaram 38 prticas inadequadas para prescrio em idosos. Knapp (1991)

    desenvolveu o DUR Drug Utilization Review, no qual se considerou como critrio

    avaliativo a qualidade e o custo dos medicamentos.

    No estudo de Lipton et al. (1993) foram definidas seis categorias de

    problemas com prescries aps painel realizado com cinco clnicos e dois

    farmacuticos clnicos.

    Hanlon et al. (1992) props o uso da ferramenta MAI Medicaton

    Appropriateness Index, que consiste em um instrumento semelhante ao

    desenvolvido por Lipton et al. e foi elaborado como parte de um ensaio clinico para

    avaliao de servios de sade nos Estados Unidos. A principal diferena que o

    MAI um modelo mais abrangente, j submetido a estudos de confiabilidade e

    validade.

  • 42

    Medicamentos Inapropriados para Idosos Justificativa para Inapropriao

    Anticolinrgicos Anti-histamnicos de Primeira Gerao (como agente nico ou em combinao) Bronfeniramina, Carbinoxamina, Clorfeniramina, Clemastina, Ciproeptadina, Dexbronfeniramina, Dexclofeniramina, Difenidramina (oral), Doxilamina, Hidroxizina, Prometazina, Triprolidina

    Altamente anticolinrgicos. Diminuio do clearance com a idade avanada e desenvolvimento de tolerncia quando usado como hipntico. Risco aumentado de confuso, boca seca, constipao e outros efeitos anticolinrgicos e txicos.

    Agentes Antiparkinsonianos Benztropina (oral), Triexifenidil

    No recomendados para preveno de sintomas extrapiramidais com antipsicticos.

    Antispasmdicos Alcalides de Belladonna, Clordiazepxido-Clinidium, Diciclomina, Hiosciamina, Propantelina, Escopolamina

    Altamente anticolinrgicos, eficcia no comprovada.

    Antitrombticos Dipiridamol, oral de ao curta (no se aplica a de liberao prolongada em combinao com cido acetilsaliclico), Ticlopidina

    Podem causar hipotenso ortosttica. Alternativas mais seguras esto disponveis.

    Antibitico Nitrofurantona

    Potencial toxicidade pulmonar. Alternativas mais seguras esto disponveis.

    Cardiovascular Bloqueadores Alfa-1 Doxazosina, Prazosina, Terazosina

    Risco elevado de hipotenso ortosttica, no recomendado como tratamento de rotina para hipertenso, outras alternativas com risco-benefcio superior esto disponveis.

    Agonistas Alfa, Central Clonidina, Guanabenzo, Guanfacina, Metildopa, Reserpina (> 0,1 mg/d)*

    Risco elevado de efeitos adversos no Sistema Nervoso Central, podem causar bradicardia e hipotenso ortosttica, no recomendados para tratamento de rotina para hipertenso

    Antiarrtmicos (Classes Ia, Ic, III) Amiodarona, Dofetilida, Dronedarona, Flecainida, Ibutilida, Procainamida, Propafenona, Quinidina, Sostalol

    Dados sugerem que o controle rende melhor equilbrio dos benefcios. A amiodarona est associada com toxicidades mltiplas, desordens pulmonares e prolongamento do intervalo QT.

    Disopiramida

    Disopiramida um potente inotrpico negativo e, portanto pode induzir insuficincia cardaca em adultos mais velhos; fortemente anticolinrgico; outros antiarrtmicos so preferidos.

    Dronedarona Piores resultados foram relatados em pacientes com fibrilao atrial permanente ou falncia cardaca.

  • 43

    Digoxina > 0,125 mg/d Na insuficincia cardaca, dosagens elevadas esto associadas a nenhum benefcio adicional e podem aumentar o risco de toxicidade.

    Nifedipino, liberao imediata Potencial efeito hipotensor, risco de isquemia miocrdica.

    Espironolactona > 25 mg/d

    Na insuficincia cardaca, o risco de hipercalemia maior em idosos, especialmente para uso >25mg/d ou uso concomitante de antiinflamatrio no esteroidal, inibidor de enzima conversora de angiotensina ou suplemento de potssio.

    Sistema Nervoso Central Antidepressivos Tricclicos (em combinao ou no) Amitriptilina, Clordiazepxido-amitriptilina, Clomipramina, Doxepina > 6 mg/d, Imipramina, Perfenazina-amitriptilina, Trimipramina

    Altamente colinrgico, sedativo e causa hipotenso ortosttica.

    Antipsicticos de Primeira Gerao (convencionais) Clorpromazina, Flufenazina, Haloperidol, Loxapina, Molindona, Perfenazina, Pimozida, Promazina, Tioridazina, Tiotixeno, Trifluoperazina, Triflupromazina Antipsicticos de Segunda Gerao (atpicos) Aripiprazolem, Asenapina, Clozapina, Iloperidona, Lurasidona, Olanzapina, Paliperidona, Quetiapina, Risperidona, Ziprasidona

    Risco aumentado de acidente vascular cerebral e mortalidade em pessoas com demncia. Risco aumentado de acidente vascular cerebral e mortalidade em pessoas com demncia.

    Tioridazina, Mesoridazina

    Altamente anticolinrgico e risco de prolongamento do intervalo QT.

    Barbituratos Amobarbital, Butabarbital, Butalbital, Mefobarbital, Pentobarbital, Fenobarbital, Secobarbital

    Altas taxas de dependncia fsica; tolerncia aos benefcios sedativos; risco de overdose em baixas dosagens.

    Benzodiazepnicos De ao curta e intermediria Alprazolam, Estazolam, Lorazepam, Oxazepam, Temazepam,Triazolam Ao prolongada Clorazepato, Clordiazepxido, Clordiazepxido-amitriptilina, Clidinium-clordiazepxido, Clonazepam, Diazepam, Flurazepam, Quazepam

    Em geral, todos os benzodiazepnicos aumentam o risco de comprometimento cognitivo, delrio, quedas, fraturas e acidentes veiculares em idosos. Podem ser apropriados para distrbios como movimento rpido dos olhos, distrbios do sono, abstinncia de benzodiazepnicos e etanol, severo distrbio de ansiedade generalizado, anestesia periprocedural e cuidados de fim de vida.

    Cloral hidratado

    Ocorre tolerncia dentro de 10 dias e os riscos superam os benefcios em relao overdose com 3 vezes a dose recomendada.

  • 44

    Meprobamato Alta taxa de dependncia fsica; muito sedativo.

    Hipnticos no-benzodiazepnicos Eszopiclona, Zolpidem, Zaleplona

    Os eventos de reao adversa so similares ao uso de benzodiazepnicos em idosos (delrio, quedas, fraturas); melhoria mnima na durao e latncia do sono.

    Mesilato de ergotamina, Isoxsuprina Falta de eficcia comprovada.

    Endcrino Andrgenos Metiltestosterona, Testosterona

    Risco para problemas cardacos e contra indicado para homens com cncer de prstata.

    Tireide dessecada

    Preocupaes sobre os efeitos cardacos, alternativas mais seguras esto disponveis.

    Estrgenos com ou sem progesterona

    Evidncia de potencial carcinognico (mama e endomtrio), falta de efeito cardioprotetor e proteo cognitiva entre idosas. Evidncias demonstram que estrgenos vaginais para tratamento de secura vaginal seguro e efetivo em mulheres com cncer de mama.

    Hormnio do crescimento

    O efeito sobre a composio corporal pequeno e associado com edeme, atralgia, sndrome do tnel do carpo, ginecomastia, glicose alterada em jejum.

    Insulina, escala mvel Risco aumentado de hipoglicemia sem melhora no manejo da hiperglicemia.

    Megestrol

    Efeito mnimo sobre o peso; aumenta os riscos de eventos trombticos e possibilidade de morte entre idosos.

    Sulfonilurias, longa durao Clorpropamida, Glibenclamida

    Clorpropamida: meia-vida prolongada em idosos; pode causar hipoglicemia prolongada; causa sndrome da secreo inapropriada de hormnio antidiurtico. Glibenclamida: maiores riscos de hipoglicemia prolongada severa em idosos.

    Gastrointestinal Metoclopramida

    Pode causar efeitos extrapiramidais incluindo discinesia tardia; risco pode ser ainda maior entre idosos.

    leo Mineral, oral Risco de aspirao e efeitos adversos, alternativas mais seguras esto disponveis.

  • 45

    Trimetobenzamida Um dos menos eficazes antiemticos; pode causar efeitos adversos extrapiramidais.

    Dor Meperidina

    No um analgsico eficaz para dosagens comumente usadas para uso oral; pode causar neurotoxicidade; alternativas mais seguras esto disponveis.

    Antiinflamatrios no estereoidais no seletivos, oral cido acetilsaliclico > 325 mg/d, Diclofenado, Diflunisal, Etodolaco, Fenoprofeno, Ibuprofeno, Cetoprofeno, Meclofenamato, cido Mefenmico, Meloxicam, Nabumetona, Naproxeno, Oxaprozina, Piroxicam, Sulindaco, Tolmetina

    Aumentam os riscos de sangramento gastrointestinal e lcera pptica nos grupos de risco; o uso de inibidor de bomba de prtons ou misoprostol reduzem, mas no eliminam os riscos.

    Indometacina Cetorolaco, inclui parenteral

    Aumentam os riscos de sangramento gastrointestinal e lceras ppticas nos grupos de risco. De todos os antiinflamatrios no estereoidais, a indometacina a que mais tem efeitos adversos.

    Pentazocina Analgsico opiide que causa efeitos adversos no Sistema Nervoso Central, incluindo confuses e alucinaes, mais comum do que em outros narcticos. Alternativas mais seguras esto disponveis.

    Relaxantes do msculo esqueltico Carisoprodol, Clorzoxazona, Ciclobenzaprina, Metaxalona, Metocarbamol, Orfenadrina

    A maioria dos relaxantes musculares so mal toleradas por idosos por causa dos efeitos adversos anticolinrgicos, sedao, risco de fratura; eficcia em doses toleradas em idosos questionvel.

    Quadro 1 Medicamentos Potencialmente Inapropriados para Idosos de acordo com o

    Critrio de Beers atualizado pela American Geriatrics Society. Fonte: AGS (2012).

    Aps estudo conduzido com 715 pacientes, Gallagher & OMahony

    (2008b) apresentaram o Critrio STOPP - Screening Tool of Older Persons

    Potentially Inappropriate Prescriptions. Tendo seu uso indicado para pacientes

    idosos hospitalizados, quando comparado ao critrio de Beers, o critrio STOPP

    identifica uma proporo significativamente maior de pacientes que necessitam de

    hospitalizao em virtude do uso de medicamentos inapropriados.

  • 46

    Diante do exposto em tantos estudos, segundo Nbrega & Karnikowski

    (2005) a prescrio adequada para idosos deve: considerar o estado clnico,

    minimizar o uso de drogas, iniciar com doses menores e adequ-las conforme

    resposta, evitar o uso de medicamentos considerados imprprios pela literatura e em

    caso de necessidade, realiz-lo com cautela e monitoramento constante.

    No Brasil, um dos primeiros estudos que avaliou o uso de medicamentos

    inapropriados foi Mosegui et al. (1999). Realizado entre idosas no Rio de Janeiro,

    verificou-se que 17% dos medicamentos utilizados eram inapropriados para uso.

    Tambm foi verificado que 14% faziam uso de medicamentos redundantes e 16%

    estavam expostas a interaes medicamentosas.

    Em artigo publicado em 2003, Rozenfeld descreve vinte frmacos

    potencialmente contraindicados para os idosos, entre os quais foram citados: os

    benzodiazepnicos e os hipoglicemiantes orais de meia-vida longa, os barbituratos

    de curta durao, os antidepressivos com forte ao anticolinrgica, os analgsicos

    opioides, as associaes em doses fixas de antidepressivos e antipsicticos, a

    indometacina e alguns relaxantes musculares - como a orfenadrina e o carisoprodol

    (ROZENFELD, 2003).

    Coelho Filho et al. (2004) em perfil sobre uso de medicamentos em idosos

    em rea urbana do Nordeste brasileiro verificou que os benzodiazepnicos de longa

    durao foram os medicamentos inadequados mais utilizados (7%), seguido de

    clorpropamida (4%), laxantes (1,5%) e outros.

    Em estudo sobre reaes adversas e uso de medicamentos inapropriados

    para idosos, Passarelli & Jacob Filho (2007) verificaram que de 115 pacientes idosos

    internados, 61,8% apresentaram no mnimo uma reao adversa durante o tempo de

    internamento. Os fatores de risco considerados significativos para a ocorrncia de

  • 47

    reaes adversas foram: nmero de diagnsticos, o nmero de medicamentos e o

    uso de medicamento inapropriado para idosos.

    Em pesquisa sobre uso de drogas e polifarmcia em 800 indivduos de 60

    anos ou mais residentes na cidade do Rio de Janeiro, Rozenfeld et al. (2008)

    verificaram que 10,4% dos entrevistados faziam o uso de medicamentos

    considerados inapropriados, sendo que os mais encontrados foram os relaxantes

    musculares, anti-histamnicos e os benzodiazepnicos de longa durao.

    Em avaliao da prescrio de 149 pacientes idosos internados em um

    servio de clnica mdica de um hospital pblico, Costa (2009) verificou que a

    prevalncia de prescrio de medicamentos inadequados foi 38,9% e os principais

    medicamentos foram: diazepam, dexclorfeniramina e amiodarona. Alm disso, foram

    identificadas 599 interaes medicamentosas potenciais.

    Em estudo sobre medicamentos inapropriados utilizados por idosos

    admitidos em um hospital geral filantrpico realizada por Nassur et al. (2010),

    verificou-se a presena de polifarmcia em 40,6%, o uso de um ou mais

    medicamentos inapropriados em 29,2%, uso de dose incorreta em 42,7%, uso de

    medicamentos de eficcia duvidosa em 20,8%, uso redundante em 7,3%, possveis

    interaes frmaco-frmaco em 6,4% e possveis interaes frmaco-doena em

    5,3%.

    O estudo sobre o uso de medicamentos inapropriados de acordo com o

    critrio de Beers e sua presena no Sistema nico de Sade realizado por Obreli

    Neto & Cuman (2011) encontrou alta prevalncia desses medicamentos,

    representando de 19,6 a 29,6% do total de medicamentos padronizados nas listas

    de medicamentos dos municpios da microrregio de Ourinhos, em So Paulo.

  • 48

    Em estudo do Projeto SABE Sade, Bem-estar e Envelhecimento, com

    1258 idosos que afirmaram fazer uso de medicamentos, Cassoni (2011) constatou

    que 28% deles faziam uso de medicamentos potencialmente inapropriados de

    acordo com o critrio de Beers, utilizando 41 tipos ou classe destes medicamentos.

    3.5. Aspectos relacionados ao uso de demais substncias psicoativas

    Diferentes grupos populacionais tm diferentes riscos de adoecerem,

    sofrerem acidentes ou morrerem. Na presena de determinados fatores, aumenta-se

    a probabilidade da ocorrncia de danos sade. Do ponto de vista da sade pbica,

    o consumo de lcool e o tabagismo so importantes fatores de risco para doenas

    crnicas no transmissveis (MAIA et al., 2006; WHO, 2003).

    Para Levin & Kruger (2000) o uso de lcool entre idosos uma epidemia

    invisvel, pois seus ndices so subestimados e mal identificados. Como o consumo

    de lcool apresentou aumento significativo entre a populao idosa, estudos tm

    sugerido questionrios padronizados a fim de identificar esse problema na

    populao, tais como CAGE Cutdown, Annoyed, Guilty e Eye-opener, AUDIT -

    Alcohol Use Disorders Identification Test , MAST Michigan Alcoholism Screening

    Test e o SAAST Self-Administered Alcoholism Screening Test (SENGER et al.,

    2011; AERTGEERTS et al., 2004).

    O alcoolismo representa um problema de sade pblica, uma vez que

    responsvel por uma parcela significativa de bitos evitveis; seu consumo est

    associado ao aumento da hipertenso arterial, cirrose, acidente vascular

    hemorrgico e aos cnceres da orofaringe, laringe, esfago e fgado (BARROS et al.

    2008; BARROS et al., 2007).

    O tabagismo, caracterizado como uma pandemia pela OMS,

    considerado como a maior causa passvel de preveno de doena, visto que o

  • 49

    cigarro um dos mais potentes agentes carcinognicos (BARROS et al., 2007;

    WHO, 2003).

    Em idosos, o fumo causa catarata e contribui para o desenvolvimento de

    osteoporose, aumentando os riscos de fratura. Tambm um fator de risco para

    ataque isqumico transitrio bem como acidente vascular cerebral (ARAJO et al.,

    2004). Para stbye et al. (2002) o incentivo interrupo do fumo relevante entre

    os idosos, visto que podem ser obtidos diversos benefcios, tais como a reduo do

    risco de adoecer, melhor controle de evoluo de doenas preexistentes, melhora na

    qualidade de vida e aumento da expectativa de vida.

    O consumo de substncias como de lcool, tabaco e outras drogas

    preocupante porque pode causar dficit cognitivo como problemas de memria,

    que interferem na compreenso e esquecimento da terapia estabelecida,

    aumentando os riscos de abandono do tratamento (RAMOS et al., 2010).

    O consumo prolongado dessas substncias tambm pode induzir os

    idosos dependncia. Os sintomas do abuso de lcool e drogas muitas vezes so

    confundidos com sintomas prprios do envelhecimento, tais como demncia e

    depresso, o que dificulta que se submeta o paciente a tratamentos para

    dependncia qumica (RAMOS et al., 2010; BENSHOFF et al., 2003).

    Mudanas na vida dos idosos podem justificar as mudanas no padro de

    utilizao de drogas. Aposentadoria e perda do papel social podem levar ao

    consumo excessivo de lcool e medicamentos como benzodiazepnicos, drogas

    antipsicticas e polifarmcia. Tabaco, lcool e outros sedativos so frequentemente

    utilizados para bloquear solido, dar autoconfiana, animar, ajudar com o sono e

    relaxamento, ou aliviar tenses (KORRAPATI & VESTAL, 1995).

  • 50

    A prevalncia do uso, abuso e dependncia de substncia psicoativa entre

    idosos muito variada, visto que depende do mtodo utilizado para detectar seus

    usos e consequncias, bem como da distribuio geogrfica e da amostra, o que

    dificulta a realizao de comparaes (DUFOUR & FULLER, 1995).

    Recentemente a literatura tem evidenciado a relao entre abuso de

    drogas, dependncia e outras desordens psiquitricas. Os problemas de abuso de

    drogas tm sido explorados, independente das desordens psiquitricas, o que

    dificulta o entendimento de como a dependncia de drogas se associa s

    psicopatologias (WEISS & COLLINS, 1992).

    Segundo Pillon et al. (2010) o uso de substncias psicoativas em idosos

    um problema complexo e pouco explorado, em virtude do baixo nmero de idosos

    que procuram os servios especializados para tratamento do uso de substncias

    psicoativas. necessrio que os profissionais de sade estejam preparados para

    identificao desse problema e recorram a prticas assistncias adequadas para

    tratamento.

  • 51

    4. OBJETIVOS

    Objetivo Geral

    Avaliar o perfil de uso de medicamentos entre idosos atendidos em centros de

    referncia em sade do idoso em Manaus-AM.

    Objetivos Especficos

    Analisar as relaes entre fatores socioeconmicos e o uso de medicamentos

    entre idosos;

    Estimar a prevalncia e o consumo total de medicamentos;

    Identificar as principais classes de medicamentos utilizadas pelos idosos;

    Verificar a fonte da medicao utilizada pelos idosos para identificar a

    ocorrncia de automedicao;

    Verificar a presena de polifarmcia, possveis interaes medicamentosas e

    redundncias farmacolgicas;

    Determinar a prevalncia do uso de medicamentos psicotrpicos;

    Identificar o uso de medicamentos inapropriados para idosos de acordo com o

    Critrio de Beers atualizado;

    Investigar o uso de outras substncias psicoativas.

  • 52

    5. MATERIAIS E MTODOS

    5.1. Tipo de Estudo

    Este trabalho consiste em um estudo transversal do tipo descritivo-

    observacional com recorte temporal de agosto a novembro de 2012.

    5.2. Populao em Estudo

    Foram includas no estudo pessoas com 60 anos ou mais de idade,

    atendidas nos trs centros de sade de referncia em sade do idoso em Manaus -

    CAIMI (Centros de Ateno a Melhor Idade), distribudos nas zonas norte (CAIMI

    Andr Arajo), sul (CAIMI Dr. Paulo Csar Arajo Lima) e oeste (CAIMI Ada

    Rodrigues Viana).

    5.3. Critrios de Incluso

    Foram considerados os seguintes critrios: a) O paciente deveria ter idade

    igual ou superior a 60 anos; b) Ser paciente cadastrado e receber atendimento em

    um CAIMI e c) Os idosos consumidores de medicamentos deveriam apresentar no

    momento da entrevista bula, embalagens ou prescries dos medicamentos

    consumidos na ltima semana.

    5.4. Critrios de Excluso

    Foram excludos da amostra: a) Idosos que receberam atendimento em

    mais de uma unidade dos CAIMI e b) Idosos que no alcanaram os pontos de corte

    determinados pelo mtodo Teste de Fluncia Verbal (TFV) categoria animais

    (BRUCKI et al., 1997) no teste de avaliao da cognio.

  • 53

    5.5. Local de Estudo

    O estudo foi realizado nos CAIMI (Centros de Ateno a Melhor Idade). O

    servio conta com trs unidades distribudas pela cidade nas zonas norte (CAIMI

    Andr Arajo), sul (CAIMI Dr. Paulo Csar de Arajo Lima) e oeste (CAIMI Ada

    Rodrigues Viana) e realiza atendimento ambulatorial, com nfase no manuseio das

    doenas prevalentes da terceira idade e em aes preventivas relativas a polticas

    de sade.

    Nestes centros so oferecidas consultas de Clinica Geral e nas

    especialidades de Cardiologia, Cirurgia Geral, Ortopedia, Gastroenterologia,

    Endocrinologia, Odontologia, Psicologia, Fonoaudiologia, Ginecologia, Nutrio,

    Ginecologia, Urologia e Radiologia, como tambm so realizados alguns exames

    laboratoriais.

    Os pacientes so atendidos por meio de consultas agendadas e o servio

    conta com farmcia de dispensao exclusiva para pacientes cadastrados, com

    presena de farmacutico durante todo o perodo de funcionamento.

    5.6. Amostragem

    Neste estudo, para o clculo do tamanho amostral foram utilizadas

    frmulas aplicadas para varincia populacional desconhecida. Considerou-se o valor

    de de acordo com a prevalncia do uso de psicotrpicos entre idosos em estudos

    anteriores realizados no Brasil. Analisando os estudos de Mosegui et al. (1999),

    Coelho Filho et al. (2004), Flores & Mengue (2005), Loyola Filho et al. (2006), Correr

    et al. (2007), Ribeiro et al. (2008) e Marin et al. (2008), verificou-se que a prevalncia

    do uso de varia de 6,1% a 36%, sendo considerado para clculo o valor de 36,8%

    obtido no estudo de Correr et al. (2007), por haver fornecido a amostra maior.

  • 54

    Estabeleceu-se o nvel de significncia de 5% e o intervalo de confiana

    de 95%. Considerando os idosos cadastrados nas unidades dos CAIMI, foi obtido o

    tamanho de amostra de 353 indivduos. De acordo com o critrio de

    proporcionalidade, o nmero de entrevistas em cada unidade foi dividido conforme

    descrito no Quadro 2.

    No de Entrevistados Unidade de Sade

    146 CAIMI Andr Arajo Cidade Nova

    120 CAIMI Paulo Csar de Arajo Lima Col. Oliveira Machado

    87 CAIMI Ada Rodrigues Viana Compensa

    Quadro 2 Nmero de entrevistados por unidade de sa