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Dissertação - Artigo de Revisão Bibliográfica Mestrado Integrado em Medicina 2012/2013 AVALIAÇÃO DO RISCO TROMBOEMBÓLICO NA MULHER GRÁVIDA Isabel Furtado Pereira da Silva

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Dissertação - Artigo de Revisão Bibliográfica Mestrado Integrado em Medicina 2012/2013

AVALIAÇÃO DO RISCO TROMBOEMBÓLICO NA MULHER GRÁVIDA

Isabel Furtado Pereira da Silva

Isabel Furtado Pereira da Silva

Avaliação do Risco Tromboembólico na Mulher Grávida

Dissertação de candidatura ao grau de

mestre em Medicina submetida ao

Instituto de Ciências Biomédicas Abel

Salazar.

Orientador: Dr. Manuel Araújo Campos

Categoria: Médico Especialista de Hematologia Clínica, Professor Auxiliar Convidado de Medicina-Hematologia do 5º ano do ICBAS/UP, Chefe de Serviço de Hematologia Clínica – Unidade de Trombose e Hemostase

Afiliação: Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar

Co-Orientador: Dra. Graça Buchner

Categoria: Médica Especialista de Ginecologia-Obstetrícia, Assistente Hospitalar de Obstetrícia no Centro Hospitalar do Porto

Afiliação: Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar

Avaliação do Risco Tromboembólico na Mulher Grávida

Tese de Mestrado Integrado em Medicina – Junho 2013 3

RESUMO

Introdução: O tromboembolismo venoso na gravidez e puerpério é uma causa

importante de mortalidade e morbilidade materna, sendo a embolia pulmonar a principal

responsável pelos casos fatais. Estima-se que uma grande parte das vítimas mortais por

tromboembolismo pulmonar durante a gravidez tenha algum fator de risco identificável.

Só a identificação destes fatores de risco permitirá reduzir a incidência de trombose

venosa neste período.

Objetivos: O objetivo desta revisão bibliográfica é esclarecer e avaliar os fatores de risco

para fenómenos tromboembólicos na gestação e puerpério, através da análise do atual

conhecimento relativamente ao tema.

Desenvolvimento: Inúmeros fatores de risco foram estudados por diversos autores na

tentativa de estabelecer uma análise que permitisse ao clínico inferir sobre a necessidade

de introduzir tromboprofilaxia na gravidez a grupos de mulheres com risco aumentado de

tromboembolismo venoso. Entre eles, a história pregressa de fenómenos

tromboembólicos, principalmente se o primeiro evento ocorreu durante a gravidez, a

presença de trombofilia hereditária, a raça negra, a obesidade, o tabagismo, a anemia

falciforme, a fertilização in vitro (devido à hormonoterapia com estrogénio e progesterona

em altas doses), a gravidez múltipla, bem como o parto cesáreo, foram associados a um

aumento significativo do risco para tromboembolismo venoso durante a gravidez ou

puerpério. Existe uma preocupação mundial em estabelecer normas que orientem o

clínico na avaliação do risco de trombose na mulher grávida bem como a sua orientação,

sendo as principais as propostas pela American College of Chest Physicians e a Royal

College of Obstetricians and Gynaecologists. É universalmente aceite que todas as

mulheres grávidas devem ser precocemente avaliadas para o risco de complicações

tromboembólicas nesse período. Estas normas são apenas orientadoras, devendo a

mulher ser informada e ser a principal interveniente na tomada de decisão.

Conclusão: Muitas das recomendações apresentadas nas normas de orientação

baseiam-se em níveis de evidência baixos (nível C), sendo reconhecida pelos autores a

possibilidade de outro tipo de abordagens, tendo a mulher um papel principal na tomada

de decisão.

PALAVRAS-CHAVE

Gravidez; Tromboembolismo Venoso; Fatores de Risco; Score de Risco;

Tromboprofilaxia.

ABREVIATURAS

TEV – Tromboembolismo Venoso; IMC – Índice de Massa Corporal; ACCP – American

College of Chest Physicians; RCOG – Royal College of Obstetricians and Gynaecologists

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Tese de Mestrado Integrado em Medicina – Junho 2013 4

SUMMARY

Introduction: Venous thromboembolism during pregnancy and puerperium is an

important cause of maternal death and morbidity. Most of the fatal causes are due to

pulmonary embolism. It is estimated that a great part of the mortal victims have an

identifiable risk factor. The lowering of the incidence of venous thromboembolism during

this period requires the identification of these risk factors.

Objective: The goal of this review is to clarify and evaluate the risk factors for

thromboembolic events during pregnancy and puerperium. To achieve this, the current

knowledge regarding this issue will be analyzed.

Development: Many risk factors have been studied by numerous authors who tried to

create an analysis that helped the clinicians to establish which women would benefit from

thromboprophylaxis. Previous history of venous thromboembolism, especially if the first

event was pregnancy-related, black race, obesity, smoking, sickle cell anemia, in vitro

fertilization, multiple pregnancy and cesarean delivery were associated with higher risk for

venous thromboembolism during pregnancy or puerperium. There is a world-wide concern

to establish guidelines that conduct clinicians during the risk evaluation for venous

thromboembolism in pregnant women. The two main guidelines are suggested by the

American College of Chest Physicians and by the Royal College of Obstetricians and

Gynaecologists. It is accepted that all women should undergo a documented risk

assessment for venous thromboembolism in early pregnancy or before pregnancy. It is

recognized that these guidelines are only clinical guides and that women should be

informed and should take the main role in the decision making.

Conclusion: As many of the guidelines’ recommendations come up from low grading

evidences (grade C), it is recognized that alternative approaches may be reasonable,

especially if women have the main role in the decision making.

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INTRODUÇÃO

O tromboembolismo venoso (TEV) continua a ser uma causa importante de mortalidade e

morbilidade materna, sobretudo nos países desenvolvidos, sendo a embolia pulmonar a

principal responsável pelos casos fatais(1). Para além disso, a morbilidade associada ao

tromboembolismo na gravidez e puerpério é significativa, podendo estar associada a

síndrome pós-flebítico, desde edema e alterações cutâneas até trombose recorrente e

úlceras(2). Os fenómenos tromboembólicos poderão ainda estar associados a

consequências fetais, tais como aborto, restrição de crescimento intra-uterino, pré-

eclâmpsia e síndrome de HELLP, fenómenos explicados pela inadequada circulação

útero-placentária(3).

A gravidez é conhecida por ser, naturalmente, um estado de hipercoagulabilidade e

constitui, por si só, um fator de risco para tromboembolismo(4). Estima-se que a mulher

grávida, em geral, tenha um risco 4 a 5 vezes superior de desenvolver TEV

comparativamente a uma mulher não grávida(2), sendo a incidência de TEV durante a

gravidez e puerpério cerca de 0.76-1.72/1000(2, 5-7). Heit, et al. (2005) apresenta taxas de

incidência bastante superiores (3.37/1000), sendo a forma abrangente de seleção de

casos proposta como possível justificação para a discrepância em relação a outros

estudos(8).

A informação documentada relativamente ao período da gravidez em que os fenómenos

tromboembólicos são mais frequentes é discrepante. Alguns autores relatam incidências

mais altas no período pré-natal(4, 9, 10), outros apresentam o puerpério como o período

com incidências mais altas(8, 11), e alguns não relatam diferenças nas incidências por

período(5, 6).

O Confidential Enquiry into Maternal and Child Health (2007) estima que 79% das

mulheres grávidas que morreram por tromboembolismo pulmonar entre 2003-2005 no

Reino Unido tinham algum fator de risco identificável para este tipo de eventos(12). Só a

identificação desses fatores de risco permitirá reduzir a incidência de TEV durante a

gravidez e puerpério, bem como reduzir a morbilidade que lhe está associada(13). Só

assim será possível ponderar a necessidade de realização de tromboprofilaxia durante a

gravidez, tendo em atenção o risco absoluto de trombose e os riscos potenciais desta

terapêutica tanto para a mulher, (hemorragia, a trombocitopenia induzida pela heparina e

a osteoporose), como para o feto, (teratogenicidade, hemorragia e morte fetal)(14, 15). O

uso de um score de risco pode ajudar no processo de decisão de implementação segura

e efetiva de tromboprofilaxia na gravidez(14). Neste sentido, foram já propostos alguns

scores de avaliação de risco e normas de orientação para acompanhamento de grávidas

com risco aumentado de TEV(14, 16-21), sendo necessário, no entanto, um maior número de

estudos que permitam validar a sua utilização.

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OBJETIVOS

O objetivo desta revisão bibliográfica é esclarecer e avaliar os fatores de risco para

fenómenos tromboembólicos na gestação e puerpério, através da análise do atual

conhecimento relativamente ao tema.

FATORES DE RISCO PARA TROMBOEMBOLISMO NA GRAVIDEZ E PUERPÉRIO

Antecedentes pessoais de Tromboembolismo

Um dos principais fatores de risco para tromboembolismo durante a gravidez é a

existência de antecedentes pessoais de fenómenos tromboembólicos. Segundo James,

A. H. (2008), 15 a 25% dos eventos tromboembólicos na gravidez são eventos

recorrentes(22). Pabinger, I., et al. (2005), em estudo de coorte retrospectivo que pretendia

avaliar o risco de TEV na gravidez, em mulheres com história prévia de trombose venosa,

demonstrou que existe probabilidade de 6.2% de recorrência destes eventos em

mulheres grávidas não sujeitas a tromboprofilaxia(23). Num outro estudo do mesmo tipo,

que incluiu tanto mulheres grávidas como puérperas, encontrou-se uma taxa de

recorrência da ordem dos 12.2% (5.8% no período pré-natal e 8.3% no puerpério)(24).

Ainda nestes estudos, procurou-se avaliar as condições em que surgiram os primeiros

eventos e de que forma isso poderia condicionar a probabilidade de recorrência na

gravidez. Foram avaliados os seguintes parâmetros: presença de trombofilia hereditária

ou adquirida, presença de outros fatores de risco transitórios como o uso de

anticoncecionais orais durante o primeiro evento, bem como um primeiro evento durante

a gravidez ou puerpério. No entanto, apenas De Stefano, et al. (2006) conseguiu tirar

conclusões. A presença de trombofilia no primeiro evento não foi associada a um risco

aumentado de tromboembolismo durante o período pré natal. Se o primeiro evento

ocorreu durante a gravidez ou puerpério ou esteve associado ao uso de anticoncecionais

orais, demonstrou-se que o risco de recorrência durante o período pré natal é de cerca de

7%. Quando se comparou os mesmos parâmetros com o risco de recorrência durante o

puerpério os resultados foram diferentes. A taxa de recorrência de tromboembolismo no

puerpério foi de 15.5% em mulheres com o primeiro evento relacionado com a gravidez,

7.1% em mulheres com outros fatores de risco transitórios durante o primeiro evento e

3.1% em mulheres com um primeiro episódio não provocado(24). O autor avança que esta

tendência de replicação de fenómenos durante a gravidez e puerpério pode ser

explicada, pelo menos em parte, pelas características anatómicas individuais que

favoreçam a compressão dos vasos pélvicos pelo útero gravídico ou por alterações-

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padrão hormonais individuais relacionadas com a gravidez que favoreçam a

hipercoagulabilidade(24).

Knight, M. (2008) analisou apenas a incidência e fatores de risco para embolia pulmonar

no período pré natal. Ao fazê-lo, observou que 4% das mulheres com diagnóstico de

embolia pulmonar durante a gravidez tinham antecedentes de tromboembolismo

venoso(25).

Trombofilia

Além da história prévia de tromboembolismo, o fator de risco mais importante para

trombose venosa durante a gravidez é a trombofilia(5, 22, 26). As principais formas de

trombofilia hereditária são a deficiência de antitrombina, de proteína C e de proteína S, os

polimorfismos do gene da protrombina, a mutação de fator V de Leiden e a homozigotia

para metilenotetroidrofolato redutase C677T. As formas mais comuns de trombofilia

adquirida são os anticorpos antifosfolípidos, nomeadamente os anticoagulantes lúpicos e

altas concentrações de anticorpo anticardiolipina(27). Existem cada vez mais evidências

que associam a trombofilia não só a eventos tromboembólicos durante a gravidez mas

também a outros problemas vasculares como o abortamento, pré-eclâmpsia, síndrome de

HELLP e restrição de crescimento intrauterino(3). De facto, estima-se que 65% das

mulheres com pré-eclâmpsia, restrição de crescimento intrauterino, morte fetal

inexplicada ou descolamento precoce da placenta tenham uma forma de trombofilia

hereditária ou adquirida(27).

Robertson, et al. (2005), em estudo sistemático de revisão que estima o risco de TEV em

mulheres grávidas com trombofilia, conclui que todas as trombofilias hereditárias, com

exceção da homozigotia para metilenotetroidrofolato redutase C677T, estão associadas a

um risco aumentado de trombose na gravidez(15, 27). O mesmo autor acrescenta que a

homozigotia para Fator V de Leiden parece ser a anomalia genética que confere o maior

risco de TEV na gravidez associada a trombofilia com um risco absoluto de 3,4%, o que

constitui, no entanto, um valor modesto(27). Consistente com este valor, Dizon-Townson,

et al (2005), em estudo de coorte que incluiu 4885 mulheres grávidas sem história de

TEV prévio, identificou 134 mulheres portadoras de mutação para factor V de Leiden

(2.7%). Entre estas não houve nenhum episódio de TEV. De facto, os únicos episódios

de fenómenos tromboembólicos (três embolias pulmonares e uma trombose venosa

profunda), ocorreram em mulheres não portadoras do gene mutado para fator V de

Leiden. Segundo este estudo, a heterozigotia para fator V de Leiden está associada a

baixo risco de tromboembolismo na mulher grávida sem história de tromboembolismo

prévio(28). Noutros estudos de coorte, o risco absoluto de TEV associada à gravidez

esteve entre 9%-16% em homozigotos para factor V de Leiden, enquanto o risco para

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duplos heterozigotos para factor V de Leiden e variante G20210A da protrombina foi de

aproximadamente 4%(29).

Outros autores afirmam que o risco de TEV na gravidez associado à deficiência de

antitrombina, embora varie de acordo com o tipo, parece ser muito alto e superior às

outras trombofilias(20). Num estudo de coorte retrospetivo recente que incluiu mulheres de

famílias com deficiência hereditária de antitrombina, proteína C e proteína S, foram

objetivados 12 episódios de TEV na gravidez em 162 mulheres grávidas (7%), dois terços

destes no período pós-parto(20, 30). Num estudo de coorte prospetivo em famílias com

deficiência de antitrombina, proteína C e proteína S ou portadoras de fator V de Leiden,

encontrou-se incidência semelhante(31). Observaram-se dois episódios de TEV em 28

mulheres grávidas que não receberam profilaxia (7%), enquanto não se verificou nenhum

episódio nas 43 mulheres que receberam profilaxia(31). Numa revisão de 2008, em

mulheres com défice de antitrombina, proteína C ou proteína S e pelo menos um familiar

de primeiro grau com sintomatologia associada à trombofilia, a incidência de um primeiro

episódio de tromboembolismo associado à gravidez foi de cerca de 4.1%. Mais uma vez,

esta incidência foi maior durante o período pós-parto(20, 32).

As trombofilias adquiridas não estão tão bem estudadas, mas a elevação persistente de

anticorpos antifosfolípidos (anticoagulantes lúpicos ou anticorpos anticardiolipina) está

provavelmente associada a um risco aumentado de TEV na gravidez. Então, mulheres

com estes anticorpos aumentados e sem história prévia de trombose deverão

provavelmente ser orientadas com vigilância clínica apertada ou até ser medicadas

profilaticamente durante a gravidez(21).

Segundo De Stefano, et al. (2006), pelo menos 50% dos casos de TEV durante a

gravidez estão associadas a alguma forma de trombofilia hereditária ou adquirida(33). No

entanto, os fenómenos tromboembólicos ocorrem apenas em cerca de 0.1% das

mulheres grávidas. Assim sendo, a presença de trombofilia isolada, mesmo no contexto

de hipercoagulabilidade típica da gravidez, não resulta frequentemente em evento

tromboembólico. Então, dada a raridade de trombofilias hereditárias e de eventos

tromboembólicos na gravidez, o rastreio universal deste tipo de anomalias genéticas tem

relação custo-benefício desajustada. Para além disso, o rastreio de trombofilia tem valor

limitado em mulheres com diagnóstico estabelecido de TEV na gravidez porque não vai

alterar o curso imediato da doença nem o seguimento da doente. No entanto, o rastreio

deve ser ponderado no final da gravidez e assim que o uso de anticoagulantes for

descontinuado, uma vez que os resultados podem modificar o modo de ação em gravidez

futura(34).

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Fatores de Risco pré-existentes

Vários estudos procuraram relacionar a incidência de fenómenos tromboembólicos na

gravidez com uma série de fatores de risco não relacionados com este período, desde

características da mulher, como a idade, raça e paridade, às condições clínicas pré-

existentes, como a doença cardíaca e a obesidade. Em geral, as características do

doente e as condições clínicas pré-existentes que conferem risco aumentado de

tromboembolismo na população em geral são também fatores de risco para

tromboembolismo na gravidez(35). Seria de esperar então que quanto maior a idade do

doente, maior o risco de tromboembolismo(36). No entanto, nem todos os estudos que

relacionam a idade com a incidência de tromboembolismo na gravidez são compatíveis

com esta afirmação. De facto, Heit, et al. (2005), observa a maior taxa de incidência de

fenómenos tromboembólicos durante a gravidez entre o grupo das mulheres mais jovens

(15-19 anos)(8). Durante o puerpério, ainda neste estudo, a incidência de TEV aumenta à

medida que aumenta a idade da mulher, sendo maior no grupo de mulheres mais velhas

(> 35 anos). Outros estudos relacionam o aumento do risco com o aumento da idade da

mulher, associando um risco mais elevado em mulheres com idade superior a 35 anos(5,

6). James, et al. (2006) estima um risco de TEV de 1.64 por cada 1000 nascimentos em

mulheres com idade inferior a 35 anos e um risco de 2.27 por cada 1000 nascimentos em

mulheres com idade superior ou igual a 35 anos (valor 38% superior)(5).

Apenas um estudo procura relacionar o risco de TEV na gravidez com a raça ou etnia da

mulher. Neste estudo, o risco de TEV foi significativamente inferior em mulheres asiáticas

e mulheres hispânicas, com taxas de 1.07 e 1.25 por cada 1000 nascimentos,

respetivamente, comparativamente às mulheres de raça caucasiana (1.75 por cada 1000

nascimentos). A taxa de incidência para mulheres negras foi de 2.64 por cada 1000

nascimentos, valor cerca de 64% superior ao valor para todas as outras raças (1.61 por

1000 nascimentos). Quando a análise foi feita por idades, a incidência foi superior em

mulheres negras em todas as faixas etárias(5). O mesmo autor, em trabalho que pretendia

avaliar os fatores de risco para enfarte agudo do miocárdio durante a gravidez, encontrou

resultados semelhantes: 11.4 por cada 1000 nascimentos em mulheres de raça negra,

7.6 por cada 1000 nascimentos em mulheres de raça caucasiana, 4.2 por cada 1000

nascimentos em mulheres hispânicas(37).

A obesidade (IMC> 30Kg/m2) está associada a um risco aumentado de trombose venosa

entre homens e mulheres não grávidas(38, 39). No entanto, apenas alguns estudos

procuraram relacionar a obesidade com o risco de tromboembolismo durante a gravidez

ou puerpério. Tanto Larsen, et al. (2006) como James, et al. (2006) encontraram

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resultados que favorecem a afirmação da obesidade como fator de risco para TEV

durante a gravidez(5, 39). Larsen, et al. (2006) vai mais longe e demonstra que o risco

conferido pela obesidade é mais acentuado durante a gravidez do que durante o

puerpério e que a obesidade parece estar associada a um risco mais acentuado de

embolia pulmonar do que de trombose venosa profunda(39). De facto, mulheres grávidas

com diagnóstico de tromboembolismo pulmonar têm cerca de duas vezes mais

probabilidade de ter Índice de Massa Corporal (IMC) maior ou igual a 30Kg/m2, do que

IMC entre 20-24.9Kg/m2(25). Jacobsen, et al (2008), em estudo que pretendia analisar os

fatores de risco pré e pós parto para trombose venosa na gravidez, confirma que o IMC

elevado é fator de risco para trombose venosa na gravidez e acrescenta que a obesidade

associada a imobilização no pré-parto (definida como repouso confinado ao leito durante

uma semana ou mais antes do parto) tem efeito multiplicativo no risco, comparativamente

aos riscos isolados conferidos pela imobilização e pelo IMC elevado (40).

Larsen, T. B., et al (2004), em estudo que pretendia avaliar possíveis associações entre o

grupo sanguíneo (ABO) e o risco de TEV na gravidez, concluiu que mulheres grávidas ou

puérperas com grupo sanguíneo A ou AB, têm risco aumentado de tromboembolismo na

gravidez, comparativamente às mulheres com sangue do grupo O. Este risco parece

estar presente tanto durante a gravidez como no puerpério. Para além disso, os grupos

sanguíneos A e AB estão associados a um risco aumentado tanto de trombose venosa

profunda como de embolia pulmonar. O grupo B não foi associado a aumento do risco de

fenómenos tromboembólicos(41).

O tabagismo é também um fator de risco para tromboembolismo entre homens e

mulheres não grávidas(39). Durante a gravidez, está ainda associado a complicações,

como gravidez ectópica, descolamento da placenta, placenta prévia, rutura prematura de

membranas, pré-eclâmpsia e diabetes gestacional. Os estudos que procuraram

relacionar o tabagismo com o risco de tromboembolismo durante a gravidez

estabeleceram que o tabagismo é um fator de risco significativo para TEV tanto durante a

gravidez como durante o puerpério(5, 39, 40). Jacobsen, A. F., et al (2008) refere ainda que o

tabagismo parece ter um efeito dose-dependente no aumento do risco de

tromboembolismo na gravidez(40).

A existência de doença cardíaca prévia à gravidez parece também estar relacionada com

um aumento do risco de trombose venosa durante este período(5). De facto, a incidência

de tromboembolismo na gravidez em mulheres com cardiopatia congénita é de

aproximadamente 1 por cada 50 mulheres, valor significativamente superior à incidência

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em mulheres grávidas sem cardiopatia(42). As valvulopatias podem também condicionar

aumento do risco de tromboembolismo na gravidez. Para além disso, a necessidade de

colocação de prótese valvular cardíaca em mulheres em idade fértil constitui um desafio

devido ao maior risco de complicações tromboembólicas na gravidez e aos riscos

inerentes à anticoagulação nesta fase(43).

A anemia falciforme, uma doença causada por uma mutação que origina hemoglobina

estruturalmente anormal, e que cursa com episódios imprevisíveis de vasoclusão

microvascular(44), foi também associada a aumento do risco de fenómenos

tromboembólicos na gravidez(5).

A primiparidade, de uma forma geral, parece também constituir um fator de risco para

tromboembolismo durante a gravidez(6, 9). Jacobsen, et al. (2008) relata maior risco de

eventos tromboembólicos durante a gravidez em mulheres primigestas(6). No entanto,

num estudo que procurou estimar a incidência e estudar os fatores de risco para

tromboembolismo pulmonar durante a gravidez, foram encontrados resultados diferentes.

Neste estudo, os casos confirmados de tromboembolismo pulmonar foram mais

frequentes em mulheres multíparas, não havendo diferença significativa entre mulheres

secundigestas e mulheres com mais do que duas gestações prévias(25).

Fatores de Risco relacionados com a gravidez e o parto

Vários autores estudaram o impacto de fatores relacionados com a gravidez e o parto no

risco de tromboembolismo durante a gravidez e o puerpério. Os fatores de risco mais

estudados foram o tipo de inseminação, o tipo de parto, a gravidez múltipla, a

necessidade de transfusão, a hiperémese, o descolamento da placenta, a placenta

prévia, a pré-eclâmpsia e a infeção durante a gravidez.

A fertilização in vitro favorece fenómenos trombogénicos devido à hormonoterapia com

estrogénio e progesterona em altas doses utilizada nestes casos(9). Embora sejam raros,

os eventos tromboembólicos após hiperestimulação ovariana são graves. Estes

fenómenos ocorrem mais frequentemente nos membros inferiores, mas podem também

ocorrer em locais pouco frequentes como as veias jugulares, subclávias, axilares,

umerais e vasos mesentéricos(45, 46). Jacobsen, et al (2008), em artigo que tinha por

objetivo estudar os fatores de risco para trombose venosa durante a gravidez e durante o

puerpério, associou a reprodução medicamente assistida a um aumento do risco

significativo de trombose venosa sobretudo durante a gravidez e não no puerpério,

confirmando os resultados avançados pelo mesmo autor em trabalho anterior(6, 40). O

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autor avança ainda que grande parte dos eventos tromboembólicos após reprodução

medicamente assistida estão relacionados com síndrome de hiperestimulação ovariana

grave, condição que ocorre em 0.56-6.55% de todas as hiperestimulações. Esta

síndrome cursa com ascite e por vezes com derrame pleural e está associada a

hemoconcentração e níveis elevados de estradiol(6). Esta apresentação clínica,

combinada com a imobilização e hipercoagulabilidade típica da gravidez, torna estas

mulheres particularmente suscetíveis a fenómenos tromboembólicos(6). Os case-reports

apresentados na literatura mundial confirmam estes resultados(47).

A gravidez múltipla parece também ser um fator de risco para TEV durante a gravidez.

Estudos publicados relatam um aumento do risco deste tipo de fenómenos em gravidez

gemelar(5, 6). Kalil, et al (2008) sugere que o útero gravídico volumoso pode condicionar

maior compressão da veia cava inferior, resultando em redução do fluxo venoso,

aumentando a propensão para formação de trombos venosos(9).

Liu, et al (2009), em estudo populacional que pretendia estudar a epidemiologia do TEV

associado à gravidez no Canadá, concluiu que a hiperémese, os distúrbios hidro

eletrolíticos e a transfusão sanguínea durante a gravidez condicionam aumento do risco

de fenómenos tromboembólicos durante este período, resultados compatíveis com o

estudo realizado por James, et al (2006)(2, 5). Entre eles, a transfusão sanguínea parece

condicionar o maior risco de fenómenos tromboembólicos. Ambos os autores avançam

que a condição de base que motiva a transfusão, nomeadamente a anemia e a

hemorragia pré ou pós parto, poderá estar na base da predisposição para fenómenos

tromboembólicos. Existem evidências que sugerem que o armazenamento e preservação

das hemácias aumentam a sua agregabilidade, o que pode contribuir para um aumento

do risco de trombose(5).

A pré-eclâmpsia e a eclâmpsia parecem também constituir fatores de risco para TEV,

sobretudo no período pós-parto. De facto, Jacobsen, et al (2008), demonstrou que a pre-

eclâmpsia é um fator de risco significativo no período pós-parto mas não no período pré

natal(6). A mesma autora, em estudo posterior, confirmou este achado e acrescenta que a

associação de pré-eclâmpsia com restrição do crescimento intra-uterino, ambos

associados a patologia da circulação útero-placentária, tem um efeito aditivo no risco de

tromboembolismo no período pós-parto(40). Num estudo populacional que pretendia

avaliar a epidemiologia do enfarte agudo do miocárdio na gravidez, James, et al (2006),

demonstrou que algumas complicações obstétricas, nomeadamente a pré-eclâmpsia,

transfusão, hemorragia e infeção pós-parto, conferem um risco significativamente

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aumentado para enfarte agudo do miocárdio durante a gravidez e puerpério(37). Mais

ainda, a disfunção endotelial que acompanha a pré-eclâmpsia e contribui para a

patogénese da doença cardiovascular, persiste pelo menos durante um ano em mulheres

com história de pré-eclâmpsia, o que pode explicar a sua predisposição para doenças

cardiovasculares futuras(48). Consistentemente com isto, o mesmo autor acrescenta ainda

que a pré-eclâmpsia, especialmente se associada a parto pré-termo, confere maior risco

de enfarte do miocárdio e mortalidade por doença cardiovascular pelo resto da vida(37).

Apenas um estudo demonstra associação positiva entre a diabetes gestacional e o

tromboembolismo no período pré-natal, bem como a associação de placenta prévia com

tromboembolismo no puerpério(6). Somente um estudo associou positivamente a infeção

no período pós-parto com o risco aumentado de trombose, mostrando um risco 4 vezes

superior deste tipo de eventos em mulheres com infeção(5).

A cesariana foi associada ao dobro do risco de trombose venosa comparativamente ao

parto vaginal. Este autor questiona a recomendação de tromboprofilaxia em mulheres

submetidas a cesariana, atendendo aos resultados acima referidos, sugerindo que o

dobro do risco poderá não ser suficiente para justificar a tromboprofilaxia a não ser que

estejam presentes outros fatores de risco (5). Noutro estudo, apenas a cesariana de

emergência e não a cesariana eletiva constitui fator de risco independente para trombose

durante o puerpério(40). De facto, estima-se que o risco de TEV após cesariana de

emergência é o dobro daquele após cesariana eletiva. Mais ainda, a combinação de

cesariana de emergência com outros fatores de risco como a idade superior a 35 anos,

poderá aumentar o risco tanto de trombose venosa profunda como de tromboembolismo

pulmonar(21). Num estudo de coorte norueguês, 5 de 1067 mulheres submetidas a

cesariana tinham diagnóstico sintomático e objetivamente confirmado de TEV (0.47%), e

todas elas tinham algum fator de risco acrescido incluindo gravidez gemelar, obesidade,

pré-eclâmpsia grave, cirurgia, imobilização ou placenta prévia(49). Nos países

desenvolvidos tem sido relatado um aumento contínuo na taxa de cesarianas ao longo

das últimas décadas, muitas vezes à custa de partos cesáreos com pouca ou sem

indicação médica formal. Para além disso, apesar de a mortalidade materna ser hoje em

dia um evento raro, a taxa de mortalidade materna nos últimos 20 anos não mostra

grande evolução nos países desenvolvidos, sendo o tipo de parto um fator de risco de

morte materna modificável(50). Deneux-Tharaux, et al (2006), em estudo que pretendia

estimar o risco de morte materna diretamente relacionada com parto cesáreo,

comparativamente com o parto vaginal, demonstrou que o risco é cerca de 3.6 vezes

superior após cesariana do que após parto vaginal, sendo o TEV uma das principais

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causas(50). Por outro lado, as mulheres submetidas a parto vaginal também estão em

risco, e cerca de 55% das mortes maternas por TEV durante o puerpério que ocorreram

no Reino Unido entre 1997 e 2005 ocorreram em mulheres submetidas a parto vaginal(12).

SCORES DE RISCO PROPOSTOS

Para melhorar a sobrevida, evitar a recorrência, prevenir as complicações e reduzir os

custos, o risco de trombose venosa na gravidez deve ser calculado. Várias normas de

orientação clínica foram desenvolvidas neste sentido, na tentativa de fornecer algoritmos

que ajudem a identificar mulheres que podem beneficiar da tromboprofilaxia(51). Entre elas

destacam-se as normas mais recentes, propostas pelas organizações da América do

Norte e do Reino Unido incluindo: a American College of Chest Physicians (ACCP) (21) e a

Royal College of Obstetricians and Gynaecologists (RCOG) (20) (Anexo 1 e 2).

As normas de orientação propostas por estas organizações têm pontos em comum e

pontos de divergência. De uma forma geral, é aceite que todas as mulheres devem ser

avaliadas para o risco de TEV no início na gravidez ou até no período pré-concecional. A

RCOG acrescenta que o risco deve ser recalculado caso a mulher seja admitida no

hospital por qualquer razão ou se houver alguma complicação (ex: pré-eclâmpsia)(51). É

ainda recomendado que qualquer mulher com mais do que um fator de risco conhecido

adicional para trombose venosa (ex, imobilização, idade> 35 anos, obesidade), deve ser

considerada para iniciar tromboprofilaxia.

Prevenção Secundária

Para mulheres com história de TEV prévio, as recomendações diferem de acordo com as

circunstâncias em que ocorreu o primeiro episódio, isto é, se é considerado provocado

(associado a algum fator de risco conhecido), não provocado, ou relacionado com o

estrogénio (durante gravidez anterior ou uso anticoncecionais orais)(51). Assim, se o

primeiro episódio é considerado não provocado, ou relacionado com o estrogénio, é

mandatária a realização de profilaxia no período pré natal. A ACCP refere que o

acompanhamento apenas com vigilância clínica pode ser considerado(21, 52). Se o primeiro

episódio esteve relacionado com algum fator de risco conhecido, e que no momento da

avaliação já não está presente, é consensual que as mulheres podem ser orientadas

apenas com profilaxia durante 6 semanas no período pós-parto(20, 21, 52). É também

consensual que qualquer mulher com história de TEV, independentemente das

circunstâncias em que ocorreu o primeiro evento, deve fazer pelo menos seis semanas

de profilaxia no período pós-parto(20, 21, 52).

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Tese de Mestrado Integrado em Medicina – Junho 2013 15

No caso da presença de trombofilia hereditária ou adquirida, e história prévia de TEV, as

guidelines propostas são unânimes. Assim, no caso de mulheres com trombofilia e com

história documentada de TEV, a tromboprofilaxia deve ser proposta, tanto no período pré

natal como no período pós parto(51). No entanto, os Americanos da ACCP deixam aberta

a hipótese de acompanhamento destas mulheres apenas com vigilância clínica,

recomendando que, caso a trombofilia seja considerada de alto risco (deficiência de

antitrombina, anticorpos antifosfolípidos ou trombofilias compostas), então sim, a

tromboprofilaxia deve ser preferida(52).

Quando há história de tromboembolismo recorrente não medicada com anticoagulantes,

as recomendações concordam e recomendam anticoagulação no período pré-natal, pelo

menos em dose profilática(52).

Prevenção Primária

No caso de mulheres com trombofilia documentada, sem história de TEV (trombofilia

assintomática), tanto a ACCP como a RCOG recomendam que não deve ser proposta

profilaxia por rotina, favorecendo a avaliação individual do risco. No entanto, para

portadores assintomáticos de deficiência de antitrombina, considerada uma trombofilia de

alto risco, as guidelines recomendam que seja proposta à mulher a profilaxia com

anticoagulantes no período pré-natal. Neste caso, a heparina de baixo peso molecular

pode não ser tão eficaz na prevenção de eventos tromboembólicos, uma vez que a sua

ação é antitrombina-dependente(20). Alguns autores referem que poderão ser necessárias

doses mais altas de heparina para obter níveis protetores de anticoagulação(53). Para

além disso, estão descritos casos utilizando uma grande variedade de abordagens,

incluindo o uso de heparina isoladamente ou associada a concentrados de antitrombina,

o plasma fresco congelado e a varfarina(54). Não existem estudos que permitam validar

nenhuma das abordagens. A RCOG recomenda, neste caso, a profilaxia com heparina de

baixo peso molecular, bem como a monitorização dos níveis de anti-Xa, tendo como

objetivo os valores de 0.35-0.5U/mL, 4 horas após a administração(20).

A RCOG considera que a tromboprofilaxia poderá ser proposta se estiverem presentes

mais do que uma anomalia trombofílica (incluindo a homozigotia para fator V de Leiden,

homozigotia para protrombina G20210A e heterozigotos compostos) ou se estiverem

presentes outros fatores de risco(20, 52).

Relativamente à presença de fatores de risco adquiridos, a RCOG recomenda que se

estiverem presentes 3 ou mais fatores de risco no período pré-natal, ou 2 ou mais fatores

de risco se a mulher estiver internada, deverá ser considerada a profilaxia com

anticoagulantes no período pré natal. No puerpério, a presença de 2 ou mais fatores de

risco implica a proposta de profilaxia durante pelo menos 7 dias(20).

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Relativamente à cesariana, a ACCP não recomenda a tromboprofilaxia farmacológica

após o procedimento em mulheres sem outros fatores de risco para TEV(51). A RCOG

recomenda o mesmo, a não ser que a cesariana não seja eletiva, recomendando neste

caso a profilaxia com anticoagulantes durante pelo menos 7 dias após o parto(20).

Apesar da existência destes scores, os próprios autores afirmam que estas

recomendações são apenas linhas orientadoras para os clínicos e que, devido ao facto

de várias recomendações terem níveis de evidência baixos (evidência nível C), são

aceites abordagens alternativas, particularmente após discussão com a mulher em causa

e com o especialista na área da trombose na gravidez(20).

Em última instância, a tomada de decisão vai requerer que os clínicos informem as

doentes acerca das opções de tratamento, incluindo a sua efetividade, consequências

tanto para a mãe quanto para o feto, o método de administração e monitorização e os

efeitos secundários possíveis. Uma vez informadas, as mulheres devem participar na

seleção do regime de tratamento que melhor se adequa às suas preferências e

valores(21).

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Tese de Mestrado Integrado em Medicina – Junho 2013 17

CONCLUSÃO

O TEV é uma causa importante de mortalidade e morbilidade sendo o tromboembolismo

pulmonar o principal responsável pelos casos fatais. Vários fatores de risco estão

implicados na génese deste tipo de fenómenos, sendo os mais importantes a história

prévia de TEV e a presença de trombofilias. A literatura não é unanime relativamente às

trombofilias que conferem o maior risco de episódios de trombose venosa profunda na

gravidez.

Existe uma preocupação mundial em estabelecer normas de orientação clínica para

avaliação e gestão do risco, sendo as normas mais recentes propostas pela American

College of Chest Physicians e pela Royal College of Obstetricians and Gynaecologists,

que recomendam a avaliação precoce do risco para trombose venosa em todas as

mulheres grávidas. Os dois autores reconhecem que muitas das recomendações

apresentadas têm baixo nível de evidência (evidência nível C), pelo que são aceites

outras abordagens, tendo sempre em conta a decisão da mulher, sendo responsabilidade

do clínico o fornecimento de informação relativamente às opções de tratamento, suas

consequências e possíveis efeitos laterais.

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Tese de Mestrado Integrado em Medicina – Junho 2013 18

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ANEXOS

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ANEXO 1

Estratificação de risco pré-natal e orientação (deve ser feito na primeira avaliação e repetido se necessário)

Adaptado de: Royal College of Obstetricians and Gynaecologists. Reducing the Risk of Thrombosis and

embolism during Pregnancy. RCOG 2009. Green-Top Guideline No.37.

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ANEXO 2

Estratificação de risco pós-natal e orientação (deve ser feito no momento do parto)

Adaptado de: Royal College of Obstetricians and Gynaecologists. Reducing the Risk of Thrombosis and

embolism during Pregnancy. RCOG 2009. Green-Top Guideline No.37.

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