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Rua das Mercês, 8 9000-420 – Funchal Telef (+351291)214970 Fax (+351291)223002 Email: [email protected] [email protected] http://www.madeira-edu.pt/ceha/ VIEIRA, Alberto(1996), A Autonomia XX aniversário. Breves Notas históricas, COMO REFERENCIAR ESTE TEXTO: VIEIRA, Alberto(1996), A Autonomia XX aniversário. Breves Notas históricas, Funchal, CEHA- Biblioteca Digital, disponível em: http://www.madeira-edu.pt/Portals/31/CEHA/bdigital/avieira/av- autonomia.pdf, data da visita: / / RECOMENDAÇÕES O utilizador pode usar os livros digitais aqui apresentados como fonte das suas próprias obras, usando a norma de referência acima apresentada, assumindo as responsabilidades inerentes ao rigoroso respeito pelas normas do Direito de Autor. O utilizador obriga-se, ainda, a cumprir escrupulosamente a legislação aplicável, nomeadamente, em matéria de criminalidade informática, de direitos de propriedade intelectual e de direitos de propriedade industrial, sendo exclusivamente responsável pela infracção aos comandos aplicáveis.

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AAutonomiaXXaniversário.BrevesNotas históricas, VIEIRA, Alberto(1996), A Autonomia XX aniversário. Breves Notas históricas, Funchal, CEHA- Biblioteca Digital, disponível em: http://www.madeira-edu.pt/Portals/31/CEHA/bdigital/avieira/av- autonomia.pdf,datadavisita:// RuadasMercês,8 9000-420–Funchal VIEIRA,Alberto(1996), Telef(+351291)214970 Fax(+351291)223002 PARAAHISTÓRIADA AUTONOMIANA MADEIRA Cronologia Acriaçãodoconceito Textos Bibliografia Introdução (ManuelPestanaReis,1922)

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A Autonomia XX aniversário. Breves Notashistóricas,

COMO REFERENCIAR ESTE TEXTO:

VIEIRA, Alberto(1996), A Autonomia XX aniversário. Breves Notas históricas, Funchal, CEHA-Biblioteca Digital, disponível em: http://www.madeira-edu.pt/Portals/31/CEHA/bdigital/avieira/av-autonomia.pdf, data da visita: / /

RECOMENDAÇÕESO utilizador pode usar os livros digitais aqui apresentados como fonte das suas próprias obras,usando a norma de referência acima apresentada, assumindo as responsabilidades inerentes ao

rigoroso respeito pelas normas do Direito de Autor. O utilizador obriga-se, ainda, a cumprirescrupulosamente a legislação aplicável, nomeadamente, em matéria de criminalidade informática,de direitos de propriedade intelectual e de direitos de propriedade industrial, sendo exclusivamente

responsável pela infracção aos comandos aplicáveis.

PARAA HISTÓRIADAAUTONOMIANA

MADEIRA

Introdução

A criação do conceito

História da autonomia

Para a História da Autonomia político-Administrativa na Madeira

Cronologia

Bibliografia

Textos

"Dar autonomia à Madeira, é construi-la em unidade política eadministrativa. (...) É reconhecer que a Madeira pela sua situaçãogeográfica, pela qualidade e número das suas relações com o mundo,pelos usos e costumes do seu povo, pelo grau de desenvolvimentomoral, intelectual, agrícola, industrial e comercial, adquiriu umafisionomia própria e especiais interesses colectivos próprios, que aindividualizam como região e como agregado social. Daqui surge anecessidade duma diferenciação nos processos políticos eadministrativos a aplicar-lhe"

(Manuel Pestana Reis, 1922)

A Autonomia é para nós uma palavra mágica. Diz tudo o que sentimos e nadado que ficou lavrado na definição dos velhos dicionários e enciclopédias.

A Autonomia é uma realidade vivencial que não se compadece com a frieza dosconceitos.

A Autonomia pertence-nos e só nós a entendemos, através da sua fruição diária.É o reconhecimento do estatuto de diferença dentro da unidade nacional. Sim,porque a autonomia hoje implica necessariamente esta relação umbilical.

A Autonomia não é geradora de consensos: amada por uns, é odiada eincompreendida por outros. Esses outros que maldizem o nosso estatuto dediferença estão do lado dos que sempre nos amordaçaram.

A Autonomia, segundo Apessoada Reis (1921), Anão é grito de revolta, massimplesmente petição de justiça". Também, não deve ser entendida como umaconquista do momento mas sim a concretização de um direito histórico. Aconjuntura realça apenas a necessidade da sua concretização como via paraultrapassar o diálogo de surdos entre o centro e a periferia, isto é a metrópole ea "colónia". Aqui, abre-se a ferida da orfandade só sarada com oreconhecimento deste estatuto de diferença. Entre a metrópole e a Acolónia@fala-se de uma forma de escravidão, cujas mordaças só serão cortadas com aautonomia. Para o homem da primeira metade do século XIX, empenhado naluta pela abolição da escravatura, tudo o que indiciasse uma relação desubordinação era condenado e anametizado com o epíteto de escravatura.

A Autonomia cresce e frutifica-se na consciencialização política e cultural dosintervenientes e projecta-se no pleno exercício dos órgãos de governo próprio.A Celebração dos vinte anos da autonomia deve ser, por isso mesmo, umaforma de apelo a essa ancestral aspiração que todos nós temos a felicidade dever concretizada.

A Autonomia mantém-se viva através da prática e do conhecimento que delatemos. Daí a necessidade de sondar o passado para compreender o presente econstruir o futuro. Divulgar a História e debater a realidade sócio-política queela encerra é também construir a autonomia.

A Autonomia, na verdade, não se esgota na dimensão política, pois precisa dahistórica e cultural que a enformam e lhe retiram a carga negativa doimediatismo.

A Autonomia, enfim, é uma conquista fruto de várias batalhas do passado epresente. Recordá-la é carregar energias para embates presentes e futuros.

A 20 de Outubro de 1922 lia-se no Diário de Notícias que "no dia em que fordecretada a completa autonomia, ter-se-á descoberto a Madeira pela segundavez". O momento era oportuno para esta associação. Comemorava-se, então, oV Centenário do descobrimento da Madeira. A isto juntava-se o fervor dosintelectuais e políticos madeirenses na defesa da autonomia. Os jornais abriram-se ao debate, marcado pela defesa de uma ampla autonomia, condiçãonecessária para a evocação do sucesso destes cinco séculos de História. Daquisurgiu a ideia dos partidos regionalista que, depois, se desfizeram com ofascínio do Estado Novo.

Num folheto evocativo do quinto centenário do descobrimento da ilha,coordenado pelo Padre Fernando Augusto de Silva, foi feito o panegírico àautonomia, pela pena de Manuel Pestana Reis. Aliás, o autor começa o seu textocom a evocação da descoberta henriquina:" há quinhentos anos as caravelas doinfante entregaram às penedias da ilha, os primeiros povoadores. (...) Emquinhentos anos a árvore genealógica dos primeiros povoadores desenvolveu-se em linha recta. Os madeirenses não podem renegar a Pátria pela razãonatural de não poderem negar a Raça". Daqui resulta que a História estabeleceesta relação umbilical mas também projecta a autonomia, a nossa carta dealforria.

Nada disto era estranho à sociedade madeirense da década de vinte, um dosmais promissores momentos de debate e reivindicação da autonomia. A criseeconómica foi a origem de tudo isto, porque era nestes momentos que mais sefazia sentir o opressivo abandono a que a ilha fora votada pela metrópole. E asituação era mais grave quando as receitas do estado arrecadadas na ilha eramconduzidas para Lisboa e usadas em empreendimentos, como o do porto deLeixões. A história da autonomia tem neste primeiro quartel do século umapágina dourada.

Lamentavelmente, este debate foi sol de pouca dura pois que se afogou naesperança adiada, que foi o Estado Novo. Este apagou a autonomia o político eprocurou trazer para o seu seio alguns dos principais arautos, como foi o casode Manuel Pestana Reis. A autonomia ficou adormecida até que nova mudançapolítica veio trazer ao de cima esta ancestral reivindicação que nos possibilitouas armas para vencer os desafios do presente e projectar os rumos do futuro.

Não sabemos se aqueles que estabeleceram o dia 1 de Julho, como o da RegiãoAutónoma e, acima de tudo, da autonomia tiveram por inspiração o texto deManuel Pestana Reis e todo o debate da década de vinte. Copiada ou original,esta decisão merece o nosso aplauso. A 1 de Julho evoca-se (ainda que paramuitos esta data da descoberta oficial ofereça dúvidas) o descobrimentoportuguês da Madeira. É o momento de encontro dos navegadoresquatrocentistas com o espesso negrume. Este singelo gesto permitiu que a Ilhase projectasse no mundo luso como a primeira jóia atlântica.

A autonomia, finalmente conseguida com a constituição de 1976, é a segundadescoberta da Madeira. Isto é, a Europa descobriu este estatuto de diferença e omadeirense revelou-se a si próprio nas suas capacidades de auto governo. Destemodo autonomia combina com descobrimento e a esta coincidência num só diade comemoração não deve ser entendida como ocasional. Abril de 1976 trouxe-nos a segunda descoberta. Agora, resta saber se o futuro nos reserva novasdescobertas para que a autonomia continue a sua marcha.

A autonomia pode ser enquadrada na tradição localista, materializada nomunicipalismo. A criação desta estrutura descentralizada de poder obedeceprecisamente a essa necessidade de aproximação dos governados aosgovernantes. Note-se que antes das transformações ocorridas no séculodezanove reconhecia-se ao município o carácter autónomo da administração,sendo o seu poder assente na jurisdição local (foral e posturas) e no exercíciodos magistrados eleitos. Por isso, recordar a autonomia será também o recordardesta multissecular instituição.

A autonomia é hoje a mais perfeita materialização da dimensão regional e amelhor via para a solução dos seus problemas. Ela fundamenta-se na História,afirma-se pela consciencialização política e cultural dos seus intervenientes eprojecta-se no pleno exercício dos órgãos de governo próprio.

Hoje podemos dizer que a autonomia política não é uma palavra vã e que nosfoi dada a possibilidade de afirmação da nossa vontade e especificidadespróprias. E, tal como referiu M. Pestana Reis em 1922, podemos repetir hojecom segurança que "a autonomia não é um grito de revolta, mas simples petiçãode justiça. Adquirimos direitos, exigimos que os reconheçam e nos garantam oseu livre gozo e exercício".

A criação do conceito e a realidade envolvente

AUTONOMIA é um conceito polifacetado com múltiplos significados, todos deacordo com a posição do seu emissor. Fala-se em autonomia política,administrativa, da junção das duas; da autonomia especial ou ordinária (casoda constituição italiana de 1948); da autonomia ao nível filosófico e psicológico.

O político, o economista, o historiador poucas vezes estão de acordo sobre isso.Cada qual vê o fenómeno pelo seu primaz, intencionalmente reducionista. Paraa historiografia o conceito adquire varias matizes conforme o momentohistórico a que se orienta a nossa análise: no antigo regime tem contornosjurídico-constitucionais distintos daqueles que terá com o advento domovimento liberal. É, aliás, em fins do século XIX que o conceito ganha anecessária consistência jurídica, sendo para ingleses e americanos o @homerule@.

A autonomia é a mais perfeita materialização dos nossos ensejos e a melhorsolução para os seus problemas. Ela fundamenta-se na História, afirma-se pelaconsciencialização política e cultural dos seus intervenientes e projecta-se nopleno exercício dos órgãos de governo próprio.

O conceito, na sua expressão actual, é uma conquista do século dezanove masnão será anacronismo o seu uso para momentos anteriores, desde que lhe sejaatribuído um significado adequado. Anacrónica é sim a projecção do seu actualsignificado às conjunturas passadas. Deste modo, a primeira preocupação dohistoriador está em questionar a documentação para extrair a definição quemais se coaduna com o ambiente da época.

A autonomia (o nomos do grego pode significar região, província, usos ecostumes), que surgiu na Grécia antiga por oposição à alteronomia e anomia, éo direito de uma região governar-se por leis próprias. Filipo foi o primeiroexemplo disso.

De acordo com S. Tomás de Aquino a sociedade assemelhava-se a umorganismo cujo bem-estar resultava do exercício autónomo das suas funções.Esta visão antropomórfica da sociedade tinha implicações na organizaçãopolítica da autonomia funcional, que quer significar "jurisdictio", isto é, poderde fazer leis e posturas, julgar e emitir ordens. É a partir daqui que se extrai aideia cooperativa de sociedade que marcou a evolução das nossas instituições.Por isso mesmo, ao longo do processo histórico variam apenas as formas da suaexpressão institucional.

O outro nível importa destacar que a autonomia não é só nossa, ela expressa-sede uma forma difusa em diversos espaços e tem um porvir semelhante emregiões insulares ou não. Deste modo a análise da "nossa" autonomia deve serenquadrada no contexto global: a nossa e a dos outros, próximos ou afastados.Este é um posicionamento que não temos visto no discurso histórico e, também,político, da autonomia. É necessária uma nova postura, aberta aos outros, e umreenquadrar do fenómeno no contexto do mundo actual e da sua emergência nodevir histórico global, com especial relevo para o espaço mediterrânico, aquiconsiderado como o berço da autonomia.

A actual autonomia das regiões insulares portuguesas ficou consagrada naconstituição de 1976. Os argumentos justificativos deste processo não sãonovos, nem tão pouco se esgotam com o texto da nossa constituição. À partidaesta argumentação leva-nos a colocar algumas questões para reflexão. Serão as"históricas aspirações autonomistas das populações insulares" mera criação emistificação abrilista, como o afirma Fernando Jasmins Pereira, ou então umarealidade palpável do nosso devir histórico? Só quem desconhece o debateresultante da Revolução liberal e da Republica poderá ficcionar esta realidade.Todavia, o parágrafo da constituição não restringe o fundamento da autonomiaapenas a isso, pois fala também em especificidades de ordem económica, sociale cultural (este último acrescentado com a revisão). São estas também invençãodo legislador?

Note-se que a região não se define apenas por uma homogeneidade decondições e co-sistémicas. Ela é mais do que isso, sendo uma realidade sentida evivida pelos seus habitantes. É, no entender de André Frémont, o "espaçovivido". A isto acrescenta Juan Beneyto a dimensão histórico e cultural. Ahistória é mesmo o cimento desta solidariedade. Por isso, não são apenas ascondições de uniformidade do espaço que a definem, mas, acima de tudo, aconsciência colectiva daí resultante. A região é uma totalidade espácio-humana.

A ilha assume-se como uma região particular, tendo uma identidade própria.É, no entender de Lucien Febvre, um "pequeno quadro natural". É por si só umaunidade social, económica e política, constituindo uma forma singular de sermundo. O mar, factor de aproximação e isolamento, é o principal gerador dessaindividualização. Por tudo isto é possível falar do mundo insular, assente numasingular personalidade, numa particular cosmovisão, ou melhor ainda, numaforma de ser e estar no mundo.

Folheando os múltiplos textos que definem o processo autonómico na baciamediterrânica é evidente a valorização das dominantes geográficas e históricas.Para a constituição italiana (1948) existem dois tipos de regiões, às quais éatribuída uma autonomia diversa. A espanhola de 1982 diferencia três formasde expressão: 1. regiões definidas por "características históricas, culturais eeconómicas comuns"; 2.os territórios insulares; 3.as "províncias com identidaderegional histórica". A constituição apresenta-a, ainda, como resultado de uma"entidade regional histórica". Depois os estatutos de cada região dão a

justificação: em 1982 nas Canárias a autonomia é apresentada como a"expressão da sua identidade", enquanto nas Baleares em 1983 fala-se em"identidade histórica". Entretanto em França os estatutos da Córsega de 1982definem uma organização político-institucional específica, fundamentada nageografia e História.

A distância geográfica e a diferença territorial inviabilizam uma eficaz acçãogovernativa desde o centro (o Terreiro do Paço). Estas condições radicam odireito à diferença na orgânica governativa e são factor de promoção dodesenvolvimento. A ideia está expressa na lei fundamental, mas também foipercebida pelos defensores da autonomia em épocas anteriores: aristides daMota para os Açores (1892) e Manuel Pestana Reis na Madeira (1922).

A História da Autonomia

A aspiração da autonomia nasceu com o homem, mas foi com a civilizaçãogrega que ela mereceu a necessária teorização política e aplicação prática. Ascidades-estados, as províncias romanas, poderão ser a sua expressão. Asprimeiras têm continuidade nas cidades italianas, situação só desfeita no séculodezanove com a formação do reino de Itália (1856-70). O Senhorialismomedieval deu continuidade a esse processo. Mas tudo se esboroou com oadvento dos tempos modernos. As teses de Maquiavel e Jean Bodin foram o seusuporte. O caso da vizinha Espanha em 1492, com a conquista de Granada e atotal unificação dos reinos, é exemplo disso.

Mas o movimento continuou Europa fora. As disputas autonómicas entraramna ordem do dia da política europeia a partir do século XVII, dando-nosexemplo a Irlanda. Todavia, foi só em 1885 que se discutiu o AHome Rule@ porCharles Parnell, aprovado só em 1893 e levado à prática em 1914. Esta políticasurgira nos EUA em 1872 com John F. Dillon. Antes disso tivemos em 1755 naCórsega o movimento autonomista liderado por Pascal Paoli que conduziu aoprojecto não concretizado da independência a 8 de Maio de 1769.

A Revolução francesa não deu continuidade às teorias federalistas dos EUA,antes pelo contrário, procurou reforçar a estrutura centralista do poder. Estaonda varreu, no século seguinte, toda a Europa. A oposição a isso surgiu apenasnos alvores do século XX, contrariada, pelo comunismo e nazismo (1933-45), e aconjuntura difícil das guerras mundiais. Passada a guerra, a autonomia foi umfacto e o regionalismo passou para a ordem do dia: a Sicília tornou-se regiãoautónoma em 15 de Maio de 1946; os ideais regionalistas passaram para aordem do dia do debate político, a partir da década de setenta.

AUTONOMIA NA HISTÓRIA DE PORTUGAL

Segundo Borges de Macedo a tradição de ampla autonomia dos "poderespolíticos periféricos" é antiga e está enraizada na História Portuguesa. Mas, nãosucede apenas entre nós, também em Espanha e Itália. Aliás o nascimento dePortugal radica-se nessa opção autonomista do antigo regime.

Em Itália, tenha-se em consideração o peso das cidades-estado e o reverso damedalha com o movimento de reunificação do século XIX. Na vizinha Espanhaas Cortes de Tortosa em 1400 são os marcos emblemáticos da autonomia daCatalunha, Aragão e Valença, sendo 1492 o princípio do uniformismopeninsular, que tem em 1580 o seu ponto máximo. E o processo regressivo daautonomia continuou até ao século XX. Ela é cerceada com o avanço doprocesso histórico, demarcado, primeiro pelo despotismo iluminado e,finalmente, com o liberalismo, o momento máximo dessa tendência do processode centralização do poder. A república mais não fez que lhe dar continuidade.

A tradição localista, materializada no municipalismo, não chega, por razõesvárias, a adquirir uma dimensão regional. Tudo isto foi resultado do processode transformação do edifício institucional do Antigo Regime. Neste contexto aconjuntura política que serve de base aos descobrimentos, momento deaparecimento das ilhas, é o início do esmorecimento desta virtual autonomia, oprincípio para a afirmação da centralização expressa nos séculos XVII e XVIII. Oregimento das eleições de 1670 materializa essa opção ao definir uma maiorintervenção da coroa na estrutura institucional. Esta situação é secundada pelalei de 16 de Maio de 1832, que retira todos os poderes executivos aosmunicípios. O município subordina-se ao provedor, funcionário de nomeaçãorégia. Depois, é o aparecimento dos distritos pela lei de 25 de Abril de 1835,fundamentado pelo código administrativo de Passos Manuel (1836) que defineuma hierarquia institucional: 1. distritos, 2. Municípios, 3. Freguesia. A perdade autonomia do município acentua-se na República e prolonga-se com oEstado Novo (1936).

Mesmo assim as ilhas usufruíram, no século XV, de condições especiais que asdiferenciam das demais partes do reino. Surge, assim, o senhorio e a capitania(1433). As cartas de doação definem a precariedade desse processo e acapacidade de mandar e julgar e nunca de legislar. Neste último aspectodeveriam os capitães sujeitar-se aos forais ou regimentos gerais do reino. Estacapacidade de legislar surgiu apenas com a afirmação do município. Asposturas são a materialização desse anseio, sendo os seus capítulos umatentativa de dar voz às legítimas aspirações de uma região, no caso a área domunicípio. A criação desta estrutura descentralizada de poder obedeceprecisamente a isso. A ela se reconhece o carácter autónomo da administração,

sendo o seu poder assente na jurisdição local (foral e posturas) e no exercíciodos magistrados eleitos. Destes últimos, os juízes estavam acometidos dealguma capacidade jurisdicional.

A afirmação desta capacidade autonómica avança de acordo com o progressosócio-económico da ilha e das dificuldades de alcançar os centros de decisão.Mais uma vez a geografia é condicionante. Sucede assim na Ponta do Sol (1501),Calheta (1502), S. Vicente (1743). No caso de Santa Cruz (1515) são mais razõessócio-económicas. Em todas as cartas de criação dos três primeiros municípios éexpressamente referida a dificuldade de comunicação com a sede do município,no Funchal ou em Machico.

Os alvores do século XVI marcaram um passo atrás neste movimento. Há umanítida afirmação do poder régio: acabou o senhorio (1498), surgem nova figurasinstitucionais subordinadas à coroa (corregedor, Provedoria...). Tudo isto abriucaminho para o palco da centralização régia. A situação piora com o domíniofilipino, ao surgir uma figura - o geral - que centraliza todos os poderes na ilha,tendo continuidade até ao século XVIII. O sistema definido pelo Marquês dePombal em 1766 é a materialização disso. O primeiro golpe contra o centralismopolítico absolutista teve lugar em 1822, mas depois desfez-se no calor da lutapartidária. Depois, foi o desabrochar da consciência dos interesses locais e a lutapor uma alteração da orgânica de poder, apagados com a República e EstadoNovo

A crise económica da segunda metade do século XIX foi a ambiência geradoradeste movimento. Ora, sendo a autonomia indissociável do problema de comogovernar o arquipélago, é natural que ela surja, com maior evidência, emmomentos de crise. É precisamente que se sente a distância entre os centros dedecisão e o lugar. Todavia, a autonomia não é resultado disso, mas é a partir daíque ela emana e torna-se inteligível, por consequência, não é uma necessidadede momento, mas uma aspiração e um direito histórico. É, aliás, nestasconjunturas difíceis que o discurso autonomista se enraíza na classe política ena população, expressando-se em revoltas (do leite, da farinha...) contra aintervenção centralizadora do governo, ou nos discursos e manifestosinflamados dos políticos.

O discurso autonomista, difundido na imprensa ou nas tribunasparlamentares, é quase sempre o mesmo. A crise é resultado da situaçãoinstitucional, que não permite respostas rápidas, por isso era necessárioencontrar uma alternativa, através de um governo próximo, capaz e eficiente.Depois, este ideal reforça-se com o sentimento base de desprezo, manifesto naingratidão da pátria, na imagem de um povo sofredor e órfão, sendo aautonomia o caminho para a metrópole assumir da adequada paternidade.

A análise da maioria das intervenções evidencia a falta de originalidade naprodução ideológica. Acresce também que este movimento não adquiriu aadequada consciência política capaz de fazer singrar essa opção política em

pleno. O grande momento de debate entre nós foi o primeiro quartel do nossoséculo.

A principal diferença entre o processo autonómico nos Açores e Madeiraradica-se na fraca dimensão do movimento político-cultural que lhe serviu debase. Nos Açores a sua expressão, sobre a forma de bairrismo das ilhas oudistritos do arquipélago, favoreceu a discussão e a anterior elaboração de umaautonomia administrativa em 1895. O debate sobre a divisão administrativa doarquipélago, desde a revolução liberal, favoreceu essa discussão. Mas, tambémfoi o bairrismo o principal obstáculo à sua afirmação.

PARA A HISTÓRIA DA AUTONOMIA POLÍTICO-ADMINISTRATIVANA MADEIRA

A verdadeira consciência da autonomia, da qual somos hoje herdeiros, nasce nailha no primeiro quartel do nosso século e tem, de certeza como vaga de fundoo processo desencadeado nos Açores a partir de 1895 e a ingente criseeconómica que então se vivia.

O caso da nossa ilha é significativo. A Madeira que, desde muito cedo,adquiriu a sua consciência política viu-se, de repente com o Estado Novoenvolta numa quase secular penumbra. A crise, que se arrastava desde meadosdo século XIX, não encontrou na presente centúria qualquer resposta concretada sociedade política. A pertinácia de alguns, na luta por um projecto integradode desenvolvimento, como foi o caso do Visconde da Ribeira Brava nãoencontraram na sociedade política capacidade para carrear estes desafios.

A ilha, no limiar do primeiro quartel do século, estava a braços com umaprofunda crise: a aguardar solução para as suas tradicionais exportações (vinho,bordados e vimes) com uma agricultura moribunda a aguardar por grandesprojectos de aproveitamento hídrico e traçado viário, ficará por algum tempoentregue a si própria. Algo se avançou neste domínio mas muito mais ficou aaguardar solução.

Tardavam as soluções mas também os gritos lancinantes do ilhéu não chegamao Terreiro do Paço. Esta conjuntura de crise foi o alento gerador dos ideaisautonómicos, o cadinho onde germinou a consciência política da autonomia,brevemente abafada pelo Estado Novo. As opções estavam perfeitamentedelineadas. A concentração e distância do poder não favoreciam a prontaresposta aos problemas e geravam nos madeirenses a desconfiança aos políticoscentralistas.

O centralismo, que ficou conhecido pela designação de Terreiro do Paço, é oestigma que cavou o fosso multissecular entre nós, insulares, e a terra mãe. Estacondição foi considerada pelos liberais madeirenses como uma forma deescravidão. Em 1822, dizia o articulista do Patriota Funchalense, "A escravidãoconsiste em viver algum sujeito absolutamente à vontade de outrem; umaprovíncia, que deve sujeitar seus interesses aos da metrópole, que a seu turno anão interessa, deixa de ser província, he de facto colónia e vive escrava". E parasoltar os grilhões que mantinham esta histórica servidão, o madeirense bateu-seem diversos momentos sem o alcançar. Na Madeira a autonomia ganhou letrade forma no plano constitucional em 8 de Agosto de 1901, quando Hintze

Ribeiro assinou o primeiro decreto concedendo à Madeira o estatuto atribuídoem 1895 aos distritos de Ponta Delgada e Angra do Heroísmo.

A crise agravou-se e as soluções ficaram a vegetar nos gabinetes. Com istoadveio a desconfiança popular: a revolta da farinha (Fevereiro de 1931) e doleite (1936). E, neste intervalo de tempo, tivemos de suportar a culpa de umarevolução falhada dos deportados do regime (a 4 de Abril de 1931), onde osideais autonomistas se misturaram com a militância republicana dosdeportados. O governo da ditadura procurou desvalorizar a reivindicaçãoautonómica expressa por muitos dos madeirenses aderentes ao movimento,acusando-os de independentistas.

Estes são alguns dos espinhos que atingiram o Estado Novo e testemunham anossa luta pela liberdade e democracia. Nada disto foi esquecido pelo Dr.Oliveira Salazar que como ministro das Finanças e, depois, presidente doconselho, resolveu vingar-se da rebeldia insular com o ataque à autonomia e noabandono a que fomos votados, não obstante algumas medidas de cosméticaque não conseguiram solucionar os problemas mas apenas adiar. Mais, tentou-se apagar a forte consciência autonómica que animou a politica madeirense nosanos vinte.

A Junta Geral é a expressão desta nova realidade, adquirindo nas ilhas umaestrutura distinta na sua organização e funcionamento. Todavia esta autonomiaadministrativa não convenceu os madeirenses. À crise política junta-se aeconómica, esta última agravada com a primeira grande guerra. O isolamento aque ficou votada a ilha testemunha mais uma vez a orfandade da mãe-pátria.Deste modo em 1917 a autonomia surge como uma emanação prática. Asolução da crise passa por uma autonomia, aqui considerada como a via para asolução desses problemas. No post-guerra mantiveram-se os problemas aacalentar a opção autonómica. As comemorações do descobrimento da ilha em1922 serviram de pano de fundo para nova reivindicação da autonomia. Nofolheto evocativo da efeméride Manuel Pestana Reis lançou o mote. O debatepassou às páginas dos jornais. Foi o responsável da comissão executiva da JuntaGeral, Dr. Fernando Tolentino da Costa, quem reclamou perante o presidenteda República de passagem na ilha, a revisão do estatuto de autonomia das ilhas.

A intenção era criar um grande movimento em prol da autonomia, trazendotambém os açorianos para esta causa. Em 16 de Dezembro os madeirenses,convocados pela Junta Geral, reúnem-se em assembleia para discutir a questãoda autonomia. Das opções postas na mesa sobressaem as de Manuel PestanaReis que remetem para uma autonomia administrativa muito mais ampla. Umadas apostas era a capacidade de legislar, só conseguida em 1976. Esteentusiasmo levou mesmo à ideia de criação de partidos regionais. Todavia, aconturbada vida política nacional fez acicatar as rivalidades e intriga política,esmorecendo a autonomia. Deste modo as intenções de revisão do estatuto dasilhas ficaram adiadas até ao Governo saído do golpe de estado de 1926. Foi em1928 que as ilhas tiveram novo estatuto. Os poderes das juntas são ampliados

mas estão longe das propostas avançadas em 1922. Isto marca o início dasolução política que tomará corpo com o Estado Novo. O fervor autonomista foiabafado pela retórica do principal apaziguado do Governo da Ditadura, o Dr.Oliveira Salazar. Os autonomistas de 1922, como Manuel Pestana Reis,acomodaram-se a um estatuto de fiéis seguidores do novo regime.

A constituição de 1933 dava mostra de deliberado empenho de Estado Novo emconter o movimento autonómico ao declarar a intenção de estabelecer umestatuto especial para as ilhas, o que veio a acontecer em 1939 com o estatutodos distritos autonómicos das ilhas adjacentes, da responsabilidade do Prof.Marcelo Caetano. A isto sucederam-se revisões em 1940 e 1947.

Neste lapso de tempo esmoreceu a reclamação autonomista e só em 1969 surgecom novo fulgor através de uma exposição de um grupo de cidadãosapresentada ao governador a 22 de Abril. A questão do Planeamento Regional,estabelecido por decreto de 11 de Março é o mote para este debate que temreflexo nas páginas do jornal AO Comércio do Funchal@, e, depois, estende-seao AEco do Funchal@ e AVoz da Madeira@. Entretanto, nos Açores sucederam-se as semanas de estudo que aglutinam as forças perdidas do movimentoautonómico. A comunhão de interesses deu origem à cimeira insular noFunchal, convocada pelo nosso governador para 29 a 31 de Maio de 1970. A"primavera marcelista" foi apenas uma fugaz esperança e a consagração dafigura da região autónoma, da revisão constitucional de 1971 só abrange oUltramar. As ilhas tiveram que esperar mais cinco anos.

Em todos os momentos da nossa História recente havia consciência plena daimportância que assumia para o arquipélago a tão almejada autonomia, mas sócom o processo democrático decorrente de vinte e cinco de Abril de 1974 foipossível a sua concretização. Para trás ficaram as camufladas opções do EstadoNovo e a humilhante designação de ilhas adjacentes. A constituição de 1933previa um estatuto especial, estabelecido em 1940. Aqui ficou expressa a visãocorporativista do estado que fez passar à História algumas conquistasanteriores. Foi na chamada Primavera marcelista que se deu um passo emfrente com as chamadas estruturas de Planeamento Regional, que pretendiafazer o levantamento dos problemas e o equacionar das soluções ao nível local.

A luta contra o regime político caído em 1974 esteve muitas vezes ligada àbatalha pela autonomia. Desde a década de vinte que se haviam bloqueadotodas as saídas. Por isso a queda do regime abriu a porta para a afirmação dosimpulsos autonomistas, refreados por mais de cinquenta anos. O vinte e cincode Abril é o princípio do processo de mudança, legitimado em pleno com aConstituição da República de 1976. Pela primeira vez na História de Portugal aautonomia política não é uma palavra vã e às ilhas foi dada a possibilidade deafirmação da sua vontade e especificidades próprias. Deste modo, para nós,madeirenses, o vinte e cinco de Abril de 1974 é também sinónimo de

autonomia. Ele pode ser definido pela seguinte trilogia: liberdade, democracia eautonomia. Foi, na verdade, um virar de página e, por isso, assume particularsignificado. Para trás ficou um passado de sofrimento e de angústia, mastambém de luta permanente pelos nossos interesses e direitos políticos.

Foi o começo de uma nova era na História do nosso arquipélago. Em 1922autonomia confundia-se com descoberta, ansiando-se por uma segundadescoberta da ilha. Hoje, passados setenta e quatro anos podemos testemunharesse momento histórico, consequência do vinte e cinco de Abril. Estamosperante a segunda descoberta da Madeira. Nos princípios do século XV osportugueses revelaram ao mundo este rincão e colocaram-no na periferia dosgrandes centros económicos e políticos. Com isto agravou-se a situação dedependência e abandono. Com a autonomia, consagrada na Constituição de1976, fomos confrontados com uma nova descoberta. Isto é a Europa descobriuo estatuto de diferença e o madeirense revelou-se a si próprio nas suascapacidades de auto governo.

O império desfez-se. A metrópole deixou de deter o total controlo políticosobre a periferia. O nosso sonho tornou-se realidade. As nossas frustraçõespassaram a desafios. A autonomia, uma aspiração incessantemente adiada oucamuflada de acordo com a conjuntura e interesses políticos, foi assumida econcretizada, possibilitando-nos as armas para vencer os desafios do presente eprojectarmos os rumos do futuro.

Não mais a solução dos nossos reais problemas terá de passar pelo crivo dealguém distante. Todos eles têm ou podem ter resposta no momento certo eminstituições próprias. É esta capacidade de opção, de definir o rumo e deencontrar soluções para o dia a dia. Que nos permite aquilatar quão importanteé para nós esta data. Ela não deve ser entendida como um corte com o passado,mas sim a passagem daquilo que nos impuseram para o que queremos ser eestamos a construir.

Hoje somos uma região autónoma, com governo e assembleia legislativaprópria, e os resultados desta nova realidade política são evidentes ao nível daeconomia. As grandes vias de caminho para o futuro estão lançadas. Osproblemas que no passado deram força ao movimento autonómico, de ummodo geral, estão sanados e a sua solução é a prova mais evidente do reforço edefesa da autonomia.

CRONOLOGIA

(acontecimentos e documentos)

1892/Março/ 31 - Aristides de Mota apresenta à Câmara dos deputados oprojecto de regime autonómico para os Açores.

1895/Março/ 2 - Decreto concedendo a autonomia administrativa aos DistritosAçorianos.

1901/Maio/ 22 - Carta de lei modificando algumas das disposições do decretode 2 de Março de 1895 e autorizando o governo a torná-las extensivas àMadeira.

1901/Agosto/8 - Decreto estabelecendo a autonomia administrativa ao distritodo Funchal, de acordo com o decreto de 2 de Março de 1895, alterado pela lei de12 de Junho de 1901.

1913/Agosto/7 - Lei nº 88 em que se mantêm o decreto de 1895, de autonomiados distritos.

1928/Fevereiro/16 - Decreto nº 15:035 do governo da ditadura criando o lugarde delegado especial do governo da República nos distritos do Funchal, PontaDelgada e Angra do Heroísmo.

1928/Julho/31 - Decreto nº 15:805 do governo da ditadura que estabelece aforma de transição dos serviços dos ministérios para as Juntas Gerais.

1931/Fevereiro/4. Greve e manifestação popular no Funchal contra o decretonº.19273 de 26 de Janeiro, conhecido com o decreto da fome e do monopólio dafarinha.

1931/Abril/4 - Revolta da Madeira, iniciada pelos militares e que contou com aadesão dos populares e dos políticos republicanos. Até 2 de Maio a ilha estevesob a miragem de um governo local. A autonomia confunde-se aqui comindependência

1935/Maio/23- Carta do Dr. Oliveira Salazar ao governador do distrito doFunchal, Dr. João Abel de Freitas, apresentando soluções para a crise e a suaresposta às reclamações de autonomia.

1936/Agosto/6. Revolta do leite. A população das freguesias rurais manifesta-secontra o decreto nº.26655, sobre os lacticínios.

1938/Abril/30 - Lei nº 1967 estabelecendo as bases de administração doterritório das ilhas adjacentes.

1939/Dezembro/22. Decreto-lei nº.30214 que aprova o estatuto dos distritosautónomos das ilhas adjacentes e a lei orgânica dos serviços das respectivasjuntas gerais

1940/Dezembro/31 -Primeiro estatuto dos distritos autónomos das ilhasadjacentes.

1947/Agosto/4 - Estatuto definitivo dos distritos autónomos das ilhasadjacentes, que se manteve até 25 de Abril de 1974.

1969/Março/11- Decreto -lei nº.48905 criando a Comissão de PlaneamentoRegional

1969/Abril/22 - Exposição apresentada por um grupo de madeirenses aogovernador em que analisa a situação da região e reclama por autonomia

1970/Maio/29 - Reunião no Palácio de S. Lourenço dos governadores edeputados dos distritos insulares a fim de estudarem a revisão do estatuto dosdistritos autónomos.

1974/Maio/6. Chegada ao Funchal do Tenente Coronel Carlos Azeredo,investido nas funções de comandante militar da Madeira.

1974/Maio/9. Chegada ao Funchal do novo bispo do Funchal, D. FranciscoSantana

1974/Outubro/29. O Dr. Alberto João Jardim assume a direcção do Jornal daMadeira, dando início à Tribuna livre

1975/Janeiro/5 - O movimento de Autonomia das Ilhas Atlânticas divulga o seuprograma, em que preconiza o fim de estatuto de colónia e o estabelecimentodo regime de autonomia.

1975/Março/11- decreto-lei nº.139/75, criando a Junta de Planeamento,constituída pelo governador civil e mais quatro vogais, ficando sob a sua tutelaa Junta Geral e a Comissão Regional de Planeamento.

1975/Março/25 - Tomada de posse da Junta de Planeamento para a Madeira.

1975/Agosto/5 - A Junta de Planeamento pediu a exoneração ao governo.

1975/Dezembro/13 - Anunciada a criação da Junta Governativa e deDesenvolvimento Regional da Madeira, directamente dependente do Primeiro-

Ministro, por decreto-lei nº.101/76 de 3 de Fevereiro. A tomada de posse tevelugar a 20 de Fevereiro de 1976.

1976/Abril/2 - Aprovação pela Assembleia Constituinte da constituição daRepública Portuguesa, que no parágrafo segundo do artigo 61 define osarquipélagos dos Açores e Madeira, como@ regiões autónomas dotadas deestatutos político-administrativos próprios

1976/Abril/29 - Aprovação pelo conselho de ministros do Estatuto provisórioda Madeira, publicado no dia 30 no Diário da Republica, alterado em 1 deJunho.

1976/Junho/27 - 10s eleições para a Assembleia Regional.

1976/Julho/19 - Aprovação da constituição da República

- Inauguração da Assembleia Regional

1976/Setembro/6. Lino Miguel, o primeiro-ministro da República para aMadeira

1976/Setembro/16 - Anúncio do 11 Governo Regional, chefiado pelo Eng.Ornelas Camacho

1976/Outubro/1 - Acto de posse do II Governo Regional da Madeira.

1977/Janeiro/18 - Aprovado o decreto regional que cria o Instituto do Bordado,Tapeçarias e Artes da Madeira.

1977/Março/8 - Aprovado o decreto que cria o Jornal Oficial da Região.

1977/Março/15 - Início da discussão do projecto de estatuto definitivo daregião.

1978/Março/3 - Remodelação no Governo Regional. O Dr. Alberto João Jardimassume a presidência.

1978/Março/7 - Assembleia aprovou o projecto de decreto regional dasinsígnias da região, publicado no Diário da República a 11 de Agosto.

1978/Novembro/1. A bandeira da região é içada pela primeira vez no edifíciodo Governo Regional à Avenida Zarco

1980/Fevereiro/27 - A Assembleia Regional aprovou o projecto de Estatutopolítico-administrativo da região.

1980/Julho/15 - Aprovação do hino da região.

1982/Abril/29 - O plenário do Governo Regional aprovou o projecto derecuperação do edifício de Alfândega da ilha para instalações da AssembleiaRegional.

1983/Julho/1 - Primeira comemoração do dia da Região Autónoma.

1986/Julho/1 . Lançamento da primeira pedra do monumento à autonomiapolítica da Madeira em Santa Cruz.

1987/Julho/1 - Inauguração do Monumento à Autonomia em Santa Cruz.

1987/Dezembro/17 - O plenário da Assembleia Regional estabeleceu o dia 4 deDezembro como "Dia da Assembleia Regional".

1989/Julho/7 - Promulgação do decreto da Assembleia Regional que aprova a20 revisão Constitucional.

1990/Fevereiro/22 - Aprovação da proposta de estatuto político-administrativoda RAM, a submeter à Assembleia da República.

BIBLIOGRAFIA

Os estudos sobre a autonomia na Madeira são ainda esparsos, sendo necessáriauma maior aposta na investigação desta temática. A publicação, a exemplo doque sucedeu nos Açores com J. Reis Leite, das principais peças que dão corpoao nosso processo autonómico pode ser um bom princípio para essa necessáriavalorização do tema.

Eis alguns dos textos publicados que merecem o nosso interesse.

CALISTO, Luís, Achas na Autonomia, Funchal, 1995.

CAMACHO, Augusto da Silva Branco, Em defesa da autonomiaadministrativa das ilhas adjacentes, Ponta Delgada, 1962

- Estatuto dos distritos autónomos das ilhas adjacentes, PontaDelgada, 1972

CARREIRO, José Bruno, A autonomia administrativa dos Açores, PontaDelgada, 1994

FERREIRA, Fernando Amâncio, As Regiões Autónomas na ConstituiçãoPortuguesa, Coimbra, 1980

FREITAS, João Abel de, Madeira, Construir o Futuro, Lisboa, 1984.

JANES, Emanuel, "A implantação da República na Madeira" in Atlântico, n118, 1989.

JARDIM, Alberto João Jardim, Tribuna Livre. 1974-78, 3 vols., Ponta Delgada,1995.

JOÃO, Maria Isabel, Os Açores no século XIX - Economia, sociedade emovimento autonomista, Lisboa, 1991.

JORDÃO, Carlos A. R. Carvalho, Tutela administrativa dos GovernosRegionais sobre as Regiões Autónomas, Braga, 1980

- Administração regional autónoma um percurso ao redor da própriadinâmica evolutiva da autonomia, Funchal, 1983

LEITE, José Guilherme Reis, "A Autonomia das Ilhas Atlânticas, os Açores e aMadeira. A experiência açoriana no século XIX" in Actas do I ColóquioInternacional de História da Madeira, Vol. I, 1989.

- Sobre a autonomia dos Açores, Ponta Delgada, 1990

-"O segundo movimento autonomista açoriano e a importância da Madeira noseu desenvolvimento" in Actas do II Colóquio Internacional de História daMadeira, Funchal, 1990.

-A Autonomia dos Açores na legislação portuguesa 1892-1947, Horta, 1987.

-Política e administração nos Açores de 1890 a 1910. O 11 movimentoautonomista, Ponta Delgada, 1995.

MONJARDINO, Álvaro, As autonomias regionais em 10 anos dejurisprudência. 1976-1986, 2 tomos, Horta, 1987

-"Raízes da autonomia constitucional", in Actas do II ColóquioInternacional de História da Madeira, Funchal, 1990.

MOTTA, Aristides da, Autonomia administrativa dos Açores, Ponta Delgada,1994

PEREIRA, Fernando Jasmins, O destino das ilhas , Lisboa, 1979

ROSA, Eduardo F.(introdução), Açorianidade e autonomia. Páginasescolhidas, Ponta Delgada, 1989

VERÍSSIMO, Nelson, "Em 1917 a Madeira reclama autonomia" Atlântico, nº 3,1985.

- "O alargamento da autonomia dos distritos insulares. O debate na Madeira(1922-1923) in Actas do II Colóquio Internacional de História da Madeira,Funchal, 1990.

-"A nossa autonomia", in Atlântico nº 19, Funchal, 1990.

-"Autonomia Insular - as ideias de Quirino de Jesus" in Islenha, nº 7, 1990.

-"Autonomia Insular - o debate na primavera marcelista" in Islenha, nº 9, 1991.

Anexo: textos e documentos

REGIONALISMO.

AUTONOMIA DA MADEIRA

Há quinhentos anos as caravelas do Infante entregaram às penedias da Ilha, osprimeiros povoadores. Gente portuguesa, o seu sangue e o seu géniotransmitiram-se de geração em geração sem mistura sensível. Os actuaeshabitantes da Madeira são portugueses, portuguesa é a sua língua, portuguesessão os seus costumes. Por cá passaram hespanhoes e inglezes em continuascaravanas de nómadas do cosmopolitismo, e a larga porta da emigraçãoespalhou pelo mundo colónias de naturaes cujo número d'almas deve ascenderpresentemente a bem um milhão. Todavia, a natureza Étnica deste povopermanece inalterável. A fixidez dos caracteres específicos antropológicos epsicológicos resistiu a todos os contactos, a todas as misturas, a todas asinfiltrações. Em quinhentos anos a árvore genealógica dos primeirospovoadores desenvolveu-se em linha recta. Os madeirenses não podem renegara Pátria pela razão natural de não poderem negar a raça.

Madeirenses e ingleses, madeirenses e americanos, são elementos que serepelem. Não é só o facto do sangue que impede essa união fantasiada, essaosmose repugnante de raças diferentes, mas uma civilização secular com raízesprofundas na vida e na história.

Nestas circunstâncias, é tão impossível o separatismo ou independência comouma substituição ou troca de bandeira nacional.

Autonomia quer dizer descentralização, ou melhor, desconcentração política eadministrativa, apenas. Isto significa que a sombra da bandeira de todos osportugueses se levantará a bandeira regional, particular dos madeirenses, comseu escudo e brasão d'armas.

Não é um grito de revolta, mas simples petição de justiça. Adquirimos direitos,exigimos que os reconheçam e nos garantam o seu livre gozo e exercício.

Esses direitos. E aqui está porque a nossa voz soa a quebrado, colidem, de certomodo com os princípios da democracia pura. E digo de certo modo, porque osistema político, dito democrático, que nos rege, é manifestamente híbrido. Emboa democracia a centralização é a regra. Todas as funções se concentram nasmãos do Estado. A Nação resume-se numa abstracta consciência colectiva quese define pela lei do número que por sua vez, se concretiza nos podereslegislativo e executivo. Uma republica individualista e egualitaria, como parece

ser a nossa, só aberrativamente comporta uma, administração diferenciada efraccionada por autonomias locaes. O Estado dividiu o Paiz em províncias,distritos, concelhos e freguezias. Administrativamente a província nadasignifica, é uma designação que ficou dos velhos tempos que se conserva ematenção à história. As restantes divisões são arbitrárias. Criou-as o Estado paraescalonar e facilitar a sua administração. A sua base J o cadastro populacional.O Estado define-as e limita-as pelo número de habitantes, de contribuintes edeleitares. Por cada uma distribua um número certo de funcionários que orepresentam e executam serviços em seu nome. Tudo isto J uniforme epuramente mechanico.

As câmaras municipaes gozam hoje duma ténue autonomia que se traduz naconsignação dum mínimo e dum máximo de faculdades que se exercem notodo ou em parte conforme as necessidades locaes, critério e vontade dosvereadores. Mas o seu estatuto J o mesmo para todas. O mesmo acontece com asJuntas Geraes, <excecção das Ilhas a que foram dadas atribuições especiais. Emtudo isto não se verifica a livre iniciativa ou a auto-determinação político-administrativa, condicionadas, que, a meu ver, deve ser a essencialcaracterística definidora da autonomia.

O hibridismo do regímen reside na incompleta equação entre os princípios e apratica. A uma república individualista e egualitaria deveria repugnar aexcepção e a diferenciação. Todavia, inúmeros exemplos podem apontar-se docontrario, a começar no sufrágio que é restrito, o mais restrito possível, apenasextensivo aos dez ou quinze por cento da população masculina tida por saberler e escrever, e a acabar nos novos cavaleiros da Ordem de Cristo.

Nem é preciso recordar a situação criada à Igreja Católica, e, muito menos, a,Fénix dos tribunaes especiais. Sob o ponto de vista administrativo, olhe-se paraas Colónias. Quão longe estamos d'aquela voz de puritano que num dosúltimos parlamentos da monarquia bradava:--percam-se as colónias, massalvem-se os princípios!...

Não vem a preposito discutir se a republica neste andar de mala-posta aossolavancos para a esquerda e para a direita, corre bom caminho. O que importa,e constatar que este regímen político em que se vive, deante do factoconsumado ou inevitável, parte de parte os princípios para atender B realidade.Esta nossa democracia, mau grado as aparências, é um regime de bem fácilacomodação as necessidades e ideias novas dos novos tempos. O regimen, àmedida que se afasta do 5 d'outubro, reprodução serôdia de 89., mais seaproxima do século xx. E ainda bem. Posto isto, podemos esperar que sejamsatisfeitas as nossas reivindicações sem duras resistências por parte do Governoe do Congresso da Republica. Basta que todos os madeirenses queiram!

E todos os madeirenses hão-de querer quando tiverem uma consciênciaesclarecida e forte dos seus direitos.

Mas não se pode querer, sem crer. A fé transporta montanhas! I preciso, pois,que este sentimento tenha a violência da vara de Moysés batendo na rocha. Omilagre virá depois. Quais são, porem, os nossos direitos?

Tem-se dito: são os da maioridade. São, portanto, aqueles direitos definidos ecompreendidos na capacidade de regermos a nossa pessoa e bens, ou seja aauto-administração da nossa pessoa e bens. Mas porque se trata duma pessoacolectiva, duma pessoa moral chamada de direito publico, esses direitos sãodeterminados e limitados pela sua natureza e fins.

Dar autonomia à Madeira, J constitui-la em unidade política e administrativa. Eoutorgar-lhe a carta constitucional dos seus direitos políticos e públicos,compatíveis com os direitos de soberania nacional e em bases conformes com ascondições d'existencia do agregado regional. I reconhecer que a Madeira pelasua situação geográfica, pela qualidade e numero das suas relações com omundo, pelos usos e costumes do seu povo, pelo grau do seu desenvolvimentomoral, intelectual, agrícola, industrial e comercial, adquiriu uma fisionomiaprópria e especiais interesses colectivos próprios, que a individualizam comoRegião e como agregado social. Daqui surge a necessidade duma diferenciaçãonos processos políticos e administrativos a aplicar-lhe.

Para que a autonomia que se pretende dar a Madeira corresponda a umaverdadeira carta d'alforria, tem de assentar nestas ou semelhantes bases:

1. Função representativa: desempenhada por um governador civil que não sejaexclusivamente um alter-ego do Ministro do Interior, mas apenas umrepresentante do Estado.

2. -Função governativa: compreendendo um Conselho Legislativo e umConselho Executivo. As atribuições do Conselho Legislativo são especiais,restritas aos interesses puramente regionaes, quer públicos, quer privados. São-lhe interditas as questões de Soberania (formas de governo, exercito e relaçõesexteriores, a função judicial, a instrução secundaria e superior. Eleição indirecta.O Conselho Executivo, saído do Conselho Legislativo por eleição, recolhe eadministra as receitas, orçamenta e fiscaliza as despesas. Sob a sua direcção,estão todas as obras de fomento e instituições de assistência distritaes (JuntaGeral, Obras Publicas, Juntas autónomas, Região Agrícola, serviços de saúde easilos)

3. Função administrativa: Câmaras Municipaes.

4. Função educativa: Liberdade d'ensino. Instrução primaria a cargo dosmunicípios. Protecção às escolas livres sob forma de prémios às que melhoresprovas darem no seu ensino. Escolas industriaes e profissionaes. Museusregionaes d'arte e historia natural.

5. Função judicial: alteração no numero de comarcas e da sua jurisdiçãoterritorial de modo a evitar-se a ausência de magistrados de carreira e afacilitar-lhes o acesso dos povos das varias freguesias da ilha. Uma possívelcriação dum tribunal de 20 instancia no Funchal. Um juiz de paz em cadaconcelho que desempenhe a mais as funções dos atuaes administradores.

6. Função d'Ordem Publica: Guarda Fiscal e Guarda Civil, compreendendo estauma Policia d'investigação Criminal, uma Policia de Segurança Publica. UmaPolicia rural e uma Policia Florestal.

7. Sobre o produto bruto das receitas criadas e arrecadadas no arquipélago,será deduzida uma percentagem fixa para o Estado.

8.A organização administrativa e social fundar-se-ha na família (restrição dodivorcio e creação do homestead), parochia e municipio + associações de classe.

9. Religião: a católica reconhecida e protegida como sendo a tradicional e aúnica capaz de produzir a unidade moral do agregado regional. Liberdade deculto, d'ensino religioso e assistência religiosa.

Estas bases são lançadas sem preocupações scientificas, apenas na intenção defocar pontos de vista que me parecem fundamentaes quando se trata deelaborar o estatuto autonômico da Madeira Outros aspectos ha a atender e osque ahi ficam demandam um estudo mais detido e uma explanação maisdetalhada. Isso porem, não cabe nos limites deste artigo destinado a suscitarideas e a interpretar sentimentos que andam na consciência pública ainda emestado incoerente.

Na base não falo num corpo legislativo, Esta função é importante e essencial.Basta atender-se ao que se está passando com as questões que mais interessam anossa vida económica. E já vasta a legislação especial aplicada unicamente <Madeira. O regime sacarino, o regime dos trigos e farinhas, o regime vinícola,etc. Mas ha ainda o regime dos bordados, das manteigas, do turismo, das obrase exploração do porto, afora as questões d'aguas, de colonia, de baldios, deflorestas e outras sobre que nos temos de pronunciar criando formulas jurídicasque satisfaçam as suas especiais condições e os seus fins. E não nos digam quetudo isso nos pôde vir por meio dum parlamento nacional! A mecânica ecomposição do Congresso da Republica obstam a que taes assuntos sejamresolvidos a nosso contento. O sistema parlamentar, entregue a partilhaspartidárias, pouco mais produz do que intriga política. Os nossos interesses, asnossas necessidades não são atendidas, porque se não cura do seu estudo eporque os senhores deputados nos ignoram completamente, quando nos nãodesprezam. Ora nós, se queremos viver e progredir, temos de fugir à intrigapolítica e acomodar-nos dentro de fórmulas políticas e administrativas que nospermitam regular as questões regionaes por nós mesmos, livres da acção imoralde agenciadores de votos.

A base 70 consigna uma percentagem fixa das nossas receitas para o Estado. I ainversa do que se dá presentemente. Mas assim J que deve ser. O produto donosso trabalho, das nossas riquezas, deve ser aplicado em nosso proveito. O quenão faz sentido é que se esteja a contribuir para as obras do Porto de Leixões,para o sorvedouros dos bairros sociaes e de todas as revoluções que a irrequietagente da Capital queira fazer e alimentar.

(Manuel Pestana Reis, "Regionalismo. A autonomia da Madeira", in QuintoCentenário do Descobrimento da Madeira, Publicação comemorativa,Funchal, Dezembro 1922)

Hei por bem decretar, para valer como lei, o seguinte:

Artigo 1.° Os serviços dependentes dos Ministérios do Comércio eComunicações, da Agricultura e da Instrução e bem assim os dos governoscivis, polícia cívica, saúde pública, assistência e previdência dependentes dosMinistérios do Interior e das Finanças, nos distritos do Funchal, Ponta Delgadae Angra do Heroísmo, transitarão, a partir de 1 de Julho de 1928, com todas assuas despesas e com todas as suas receitas privativas, para as juntas gerais dosmesmos distritos, nos termos deste decreto com força de lei.

Artigo 13.° As juntas gerais dos distritos autónomos serão constituídas porquinze membros, dos quais nove electivos, sendo seis eleitos pela maioria e trêspela minoria, e os restantes seis vogais natos, que serão os seguintes: osecretário-geral do governo civil ou o funcionário que o substituir, quandoaquele exerça funções de governador civil; o reitor do liceu, o inspector desanidade marítima, o inspector de sanidade terrestre, o engenheiro director dosserviços de obras públicas e o engenheiro agrónomo chefe dos serviçosrespectivos ou o intendente de pecuária do distrito, pertencendo a efectividadeao mais velho dos dois.

(Decreto do governo da ditadura, nº. 15805 de 31 de Julho de 1928)

INDEPENDÊNCIA?

O governo da Ditadura nem sequer procura defender-se com nobreza,com elevação de processos, perante a opinião estrangeira. Deturpa, falseia e nãohesita em lançar o label de traidor sobre o povo da Madeira, sobre esteamargurado povo, sofredor e valente, tão arreigadamente português e tãoafervoradamente dedicado à sua Pátria. E que fez, pois, a Ditadura? Atravésdos seus arautos, cúmplices do mesmo crime, atirou para além-fronteiras anotícia infame é que o Movimento de 4 de Abril tinha propósitos separatistas,que pretendíamos proclamar a independência da ilha!

Não, Srs. da Ditadura! Não se atira assim, com tanta leveza de ânimo Corque não dizê-lo? Com tanta insensatez, o brio, o orgulho, os claros sentimentospatrióticos dos madeirenses, para a crítica severa do estrangeiro, que, de boa fé,aceitará a informação, supondo-a correspondendo a uma verdade. Não, oh Srs.da Ditadura! Através das nossas paixões, das nossas relações políticas, umacoisa deve haver a pairar mais alto: a unidade da nossa dedicação à Pátria, odesejo ardente de todos os portuguesesseja qual for o torrão que pisem debem servir a Pátria, de engrandecer e dignificar Portugal. Para os estrangeiros,para a opinião estrangeira, deve-se sempre acentuar, firmemente, esta verdade:nas nossas lutas, mesmo no seu entrechoque mais vivo ou mais sangrento,nunca esquecemos o nosso orgulho de sermos portugueses, portugueses acimade tudo! Por febril patriotismo, que é bem do nosso feitio e timbre de Raça, eatépor elegância moral.

O que disse o Governo da Ditadura para o estrangeiro foi uma calúnia. Umacalúnia grave, ignominiosa, que repetimos!

É certo que a Madeira tem ainda o seu problema local por resolver; é certo que aMadeira pugna, e tem pugnado, sem desfalecimentos, para que os PoderesPúblicos lhe dêem aquela necessária autonomia administrativa que permitadesenvolver as suas estupendas fontes de riqueza, as suas extraordináriaspossibilidades económicas; é certo também que o povo madeirense possue umvibrante sentimento regionalista, um grande amor por este sagrado torrão, queé uma maravilha bem-dita da Natureza. É absolutamente verdade! Mas,autonomia política, mas independência política, não a desejamos, não aqueremos. Orgulhamo-nos tanto de ser portugueses, que só uma História nosserve, a de Portugal!

(Notícias da Madeira, 17 de Abril de 1931)

2. Parece desnecessário insistir na conveniência de um regime administrativoinsular diverso do adoptado para o continente: estão os dois arquipélagos dosAçores e da Madeira separados de Portugal continental pelo Oceano, longeportanto das vistas directas dos governantes e ligados a Lisboa porcomunicações marítimas muito espaçadas (sobretudo com os Açores);constituem-nos um grande número de pequenas ilhas que não mantêm entre silaços de tam estreita cooperação como por vezes se pensa, mas que sãosolidárias pela posição geográfica, pelo estado social e pelas necessidades dosseus habitantes, cuja índole e modo de viver diferem bastante dos do maiornúmero das populações continentais; por isso, a descentralização se impõe e adesconcentração também uma e outra em benefício dos povos e com vantagempara a boa administração. (...)

6. Queixam-se os distritos insulares de que o regime de 1928 lhes éincomportável, porque as receitas não chegam para cobrir as despesas, e háquem, perdendo de vista o equilíbrio que tem de haver entre a riqueza existentee a satisfação das necessidades públicas, sustente que se deve progredir aindana autonomia, negando-se ao Estado o direito de ir buscar um ceitil que seja àeconomia das ilhas. E este modo de ver filho de um vicioso particularismoregional, que esquece a solidariedade que liga as diversas partes da Nação e aexistência de órgãos políticos e administrativos de interesse geral, para cujamanutenção todos os cidadãos têm o dever de contribuir. A administração dascircunscrições está longe de ser um circuito fechado entre as suas receitaspróprias e as próprias despesas: o Estado unitário compreende eindissoluvelmente liga as comunidades locais, acorrendo com os recursos daFazenda Pública onde for mais conveniente e útil para o interesse nacional.Formam as ilhas adjacentes um todo com o continente, é o mesmo o seu sistemade administração e governo, como o mesmo é o grau de civilização doshabitantes e de progresso social: seria, pois, contrário ao bem comum consagraruma forma egoísta de plena autonomia financeira que parecesse realizar adesintegração do Estado de - uma parte do seu território metropolitano.

(Lei nº. 1967 de 30 de Abril de 1938. bases da administração do território dasilhas adjacentes)

A Madeira e os Açores, situados em pleno Atlântico, a alguns dias de viagem deLisboa, estão fora do contacto, da influência directa do Governo; as suaseconomias têm caracteres próprios, que as diferenciam das províncias docontinente: o espírito das suas populações, pela natureza insular do território,pelo clima, pelo intercâmbio com o estrangeiro, pela sua vida económica esocial, oferece, em certos aspectos, uma feição típica.

Para governar e administrar as nossas ilhas adjacentes é indispensável conhecê-las na intimidade, ter não só a inteligência dos seus problemas, mas também osentido da sua sensibilidade.

As dificuldades que destas circunstancias resultam para a administraçãocentral, na apreciação e resolução dos assuntos insulares, na adaptação dosserviços às necessidades locais, na adopção de medidas urgentes ou peculiares,impõem evidentemente um sistema que torne, principalmente, dependente deórgãos locais a direcção dos negócios administrativos das ilhas.

Só assim se podem evitar em grande parte os inconvenientes que a 263morosidade burocrática, que a falta de conhecimento directo dos assuntos, adivergência de informações, a luta de influências determinam, em regra,quando as questões insulares se subordinam inteiramente à mecânica dasrepartições ou serviços centrais.

Ninguém ignora, de resto, as relações que existem entre a vida económica epolítica de determinada região e a sua orgânica administrativa: inter-influenciam-se continuamente e os defeitos do meio podem, muitas vezes, I seratenuados ou corrigidos pela virtude do sistema.

(discussão na Assembleia Nacional da proposta de lei do regimeadministrativo das ilhas adjacentes. ordem do dia 3 de Março de 1938.Intervenção Favila Vieira)

A autonomia administrativa vem de mais longe. Nasce com o própriopovoamento das ilhas adjacentes e processa-se desde então. O Infante D.Henrique, sempre com larga visão de homem genial, depressa se convenceu deque não poderia de tão longe governar as ilhas descobertas ou encontradas.Razões imperativas da geografia assim o recomendavam. (...)

As cartas de doação a que o ilustre autor se refere são, quanto a nós, osprimeiros instrumentos públicos definidores de uma amplíssima autonomia,então, plenamente aceitável. Ao seu conteúdo faremos a seguir uma brevereferência, bem justificável para o ponto de vista em que nos colocamos. (...)

Repetimos a conclusão a que, então, chegámos: na relativa autonomia de quegozam actualmente os distritos das ilhas adjacentes, tem uma tradição tãolongínqua que vai encontrar as suas mais profundas raízes no período dasdescobertas e se prolonga até ao regime liberal que, com a introdução do tipouniforme de administração, cerceou aquelas liberdades de acção dos governoslocais que não eram concessões de favor ou privilégios, mas antes resultavamde uma experiência feita de longos anos, onde o bom senso e o tino de bemservir os povos sempre estiveram presentes

(Augusto Branco Camacho, Em defesa da autonomia administrativa das ilhasadjacentes, Ponta Delgada, 1962, pp. 20-23)

1947-Estatuto dos distritos autónomos

TITULO I Da divisão do território

art. 1.° O território das ilhas adjacentes divide-se, para efeitosadministrativos, em concelhos, que se subdividem em freguesias e se agrupamem distritos autónomos.

Art. 2.° Os distritos autónomos do Funchal e de Ponta Delgada são de 1.aordem; os restantes distritos autónomos são de 2.a ordem.

TÍTULO II Dos distritos autónomos

CAPÍTULO I Dos Órgãos da administração distrital

Art. 3.° Cada distrito das ilhas adjacentes constitui uma pessoa moral dedireito público, dotada de autonomia administrativa e financeira.

Art. 4- O órgão da administração distrital autónoma é a junta geral, que exerceas suas atribuições e competência directamente ou por intermédio de umacomissão executiva.

Art. 5 ° O Governo da República é representado em cada distrito por umgovernador civil, a cujo cargo está a gestão dos interesses políticos eadministrativos do Estado, a superintendência na polícia geral e a inspecção efiscalização tutelar da administração distrital autónoma.

Art. 6.° As juntas gerais poderão deliberar a criação de quaisquer órgãosprivativos de consulta, de carácter permanente ou transitório, com acomposição que determinarem e para fins relativos ao exercício das suasatribuições e competência.

Único·É obrigatório para os funcionários do Estado que desempenhemfunções no distrito autónomo a aceitação das funções dos órgãos consultivosdistritais para que sejam designados pela junta geral

Art. 7.° As juntas gerais poderão sempre solicitar o parecer dos órgãosconsultivos da administração central do Estado acerca de negócios dos serviçospúblicos que lhes estejam confiados e sobre que tenham de deliberar.

CAPITULO II Da Junta Geral

SECÇÃ0 I Composição, Constituição, Sessões e Reuniões

Art. 8.° A junta geral do distrito é composta por sete procuradores, dos quaistrês natos e quatro eleitos quadrienalmente.

1.° A junta geral tem presidente, nomeado por quatro anos, pelo governadordo distrito, de entre os procuradores eleitos, podendo excepcionalmente recair anomeação em pessoa estranha ao corpo administrativo desde que tenharevelado méritos extraordinários em serviços prestados ao Estado

2.° Nos casos em que o governador do distrito use a faculdade conferida naparte final do parágrafo anterior, o presidente acresce ao número dosprocuradores e tem os mesmos direitos e deveres.

3.° -- O presidente da junta geral pode ser reconduzido e a todo o tempoexonerado ou demitido pelo governador do distrito

4.° Nas suas faltas e impedimentos o presidente da junta geral serásubstituído por um presidente substituto, nomeado nos mesmos termos pelogovernador do distrito, e na falta de um e outro exercerá as funções oprocurador mais velho.

5.° As funções de presidente da junta geral são remuneradas conforme atabela anexa a este Estatuto.

6.° Os funcionários do Estado ou os funcionários administrativos que sejamnomeados presidentes das juntas gerais serão considerados em comissãoextraordinária de serviço e com direito a optar pelo seu ordenado ou pelo depresidente da junta geral, competindo a esta em qualquer caso o respectivopagamento.

7.° Aos funcionários na situação a que se refere o parágrafo anterior serácontado o tempo de serviço que prestarem na presidência das juntas gerais,para todos os efeitos legais, como se fosse prestado nos quadros permanentes aque pertencem.

Art. 9 ° São procuradores natos à junta geral:

a) o reitor do liceu da sede do distrito;

b) o delegado distrital do Instituto Nacional do Trabalho e previdência;

c) o engenheiro director técnico da Junta Autónoma dos Portos nos distritos dePonta Delgada, Angra do Heroísmo e do Funchal e o engenheiro director dasobras públicas no distrito da Horta.

1.° Os procuradores natos são substituídos, nas faltas e impedimentos legais,por quem suas vezes fizer nos lugares públicos que desempenham.

2.° Quando o Ministro das Obras Públicas considere inconveniente aparticipação dos engenheiros a que se refere a alínea c) nas juntas gerais, serãosubstituídos por procuradores de nomeação do mesmo Ministério, escolhidosde preferência de entre indivíduos diplomados com curso superior deengenharia.

Art 10.° Os restantes procuradores serão eleitos, em lista completa e porescrutínio secreto, pelas câmaras municipais e organismos corporativos morais,culturais e económicos do distrito

1.° Cada lista conterá quatro nomes para procuradores efectivos equatro para procuradores substitutos.

2.° Enquanto não estiver completa a organização corporativa, a relaçãodos organismos com direito de sufrágio será elaborada pelo governador dodistrito, ouvido a delegação do 1. N. T. P. e por modo a dar representação, tantoquanto possível, às diversas actividades sociais do distrito.

3 ° Elaborada a relação dos organismos, será publicada nos jornaislocais e afixada nos paços do concelho da sede do distrito durante quinze dias,pelo menos, podendo os interessados reclamar contra ela para o governador dodistrito, que decidirá definitivamente.

4.0--As câmaras municipais e os organismos corporativos serãorepresentados no acto de eleição pelos seus presidentes, juízes ou provedores.Quando, porém, tenham sede fora da ilha onde estiver a sede do distrito,poderão votar por correspondência.

5.° Todas as listas serão encerradas num sobrescrito branco, fechado,sem quaisquer dizeres e com as dimensões que forem fixadas. Quando o votoseja por correspondência, será esse sobrescrito metido noutro, também fechado,lacrado e endereçado, como correspondência postal registada, ao governadordo distrito, com a menção de só dever ser aberto no acto eleitoral. Neste caso, éao governador que compete abrir o sobrescrito exterior quando chamado oeleitor que o remeteu e depor na urna o sobrescrito nele contido.

6 ° O acto eleitoral efectuar-se-á em dia designado pelo governador dodistrito, entre 15 de Novembro e 5 de Dezembro, consoante as conveniênciasresultantes das comunicações marítimas

(Estatuto dos Distritos Autónomos das ilhas Adjacentes, aprovado pelodecreto-lei nº.36453 de 4 Agosto de 1947)

Textos do Dr. A. J. JARDIM alusivos à autonomia

Há equívocos que convém desfazer até para evitar interpretações descabidas.Mas certamente involuntárias.

Correm para aí boatos sobre "independência" da Madeira, e até se esgrime como nome de pessoas, ligando-as a pretensos movimentos cuja existênciadesconhecem. (...)

Tentar separar a Madeira do todo nacional, para além de ridículo constitui umamachadada grave na consciência do País. E significa abandonar esta minúsculaporção de terra a ambições vorazes e estranhas, das quais não nos saberíamos,nem nos poderíamos defender.

Também é de recusar uma autonomia que se destine a evitar a aplicação localduma legislação de forte pendor social. O problema sócio-económico daMadeira é grave, mas não se resolve nem pelo protelamento de situaçõesinjustas, nem através de imprudências de espectacular alcance feérico que, naprática, virão traduzir-se em descalabros. E o descalabro gera bancarrota,desemprego, fome.

Porém, outra coisa é encarar a autonomia, já não com um sentido de defesapolítica da parte de quaisquer grupos particulares, mas num sentido de soluçãotécnico-económico. Solução que nada tem que ver com a forma de regimepolítico que o Povo elegerá. Mas que se destina a procurar encontrar a melhorfórmula de estruturar as ligações administrativas do Arquipélago com oContinente e de encontrar as instituições locais mais apropriadas. Apropriadasa quê? A justamente fazer também aplicar com eficiência à Madeira as leisvigentes em todo o espaço português. Leis que esperamos virem a ser justasporque de particular incidência na resolução dos problemas das classes maisdesfavorecidas.

Repare-se, portanto, que a palavra autonomia, neste sentido, já não se revestedum manto separatista, quiçás adverso a uma correcta política social. Antes,autonomia aqui é solução de mero alcance técnico. Que só um incrívelfenómeno de loucura colectiva poderia desprezar, face à evidentedescontinuidade geográfica entre os territórios em consideração. Mas atecnicidade é um meio para o objectivo comumdesenvolvimento nacional.

A melhoria das condições de vida da população não pode ficar dependente depreconceitos de natureza partidária. O que se procura ao falar de autonomia emrelação à Madeira é a solução estrutural que sirva a causa comum do progresso.Este não pode ser sustido por estratégicas de ocasião.

30-10-1974

(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, p.12-13)

Num correcto esquema de autonomia o Arquipélago terá necessariamente quedispor de um poder executivo e de um poder fiscalizador que controle eobrigue os órgãos executivos a uma acção no âmbito demarcado pelos reaisinteresses da população. Serão imprescindíveis dois órgãos: o Governador,poder executivo. e uma Assembleia Regional, poder fiscalizador. Quaisquerdeles com representatividade de base.

O Governador numa região autónoma deve ser eleito por sufrágio directo euniversal, e por maioria absoluta. Um período de quatro anos pode considerar-se razoável. Mas o princípio da não reeleição é útil porque não faz a governaçãocair numa rotina perniciosa, nem faz cultivar o gosto ou o vício pelo poder. NaMadeira, pois uma vez vigente uma lei orgânica a subordinar este território auma estrutura efectivamente autónoma, seria num Governador assim eleito quese centralizariam os Serviços Distritais. Ele responderia politicamente perante oeleitorado, e legalmente perante os Tribunais. (...)

Por outro lado, o Governador, como efectivo detentor do poderexecutivo regional. Tem que ser o principal mandatário do Governo Central naexecução das deliberações cuja competência esteja centralizada em Lisboa. Oque obriga por outro lado a aceitar um eficaz sistema de controlo pelo GovernoCentral. normal dado o direito de soberania. Visto que a Madeira como regiãoautónoma elegeria o Governador, dentro do esquema proposto. O que leva oGoverno Central a ter como mandatário uma personagem não designada porEle, mas da base, pela população.

29-12-74

(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, pp.88-89)

Os princípios da democratização e descentralização regional. Se efectivados naplenitude do seu significado, permitem às populações serem realmente astitulares dos seus destinos.

Ora. Para que uma região autónoma possa conscientemente planear o seufuturo e repartir as receitas disponíveis pelas prioridades julgadas maisconvenientes. Não ficando assim à mercê de contingências estranhas. Há umsector onde a autogerência deve indiscutivelmente manifestar-se. O campofinanceiro.

Se dispusermos da faculdade legal de elaborarmos um Orçamento Regional aoqual esteja adstrita a quase totalidade das receitas fiscais aqui cobradas issosignifica que serão os Órgãos mandatários da população local. Porque por ela

eleitos, quem definirão os investimentos públicos prioritárias. De acordo com avontade popular.

31.12.74

(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, p.90-91)

A especificidade da autonomia que o caso concreto da Madeira exige, não sereduz a um mero esquema de descentralização igual ao de Vila Real ou deSilves. Efectivamente não estão em causa os laços com a Pátria comum. Mascomo Já foi afirmado: "A Madeira é com efeito, em certos aspectos, um pequenopais sob o ponto de vista económico, cercado pelo mar, exportando eimportando em parte directamente do estrangeiro, com uma fronteiraalfandegária estanque. Condicionam sobretudo a sua economia einterdependência dos sectores económicos locais, a mútua repercussão de suasactividades a variável extensão do terreno por onde se expande cada produtoagrícola segundo a sua fortuita valorização os volumes de produção, consumo,rarefacção ou pletora do seu bem delimitado mercado interno e a possibilidadede absorção por parte dos mercados externos seus clientes

11.02.75

(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, p.150-151)

Finalmente, o sistema de autonomia realiza um processo evolutivo devalorização com o fito de dirigir o território geograficamente descontínuo paraque este assuma a defesa dos seus interesses próprios e diferenciados dorestante espaço nacional em que se institucionalizou, através de um auto-governo nesses sectores.

No aspecto administrativo, o sistema de sujeição identifica-se com acentralização, pois esta permite a subordinação permanente e total dosinteresses específicos do território descontínuo à metrópole, o mesmo sedizendo no aspecto económico. Só no aspecto financeiro é que não é deestranhar o aparecimento às vezes de dois orçamentos diferentes, forma porexemplo de o território descontínuo não onerar demasiado a Metrópole.

O sistema de integração traduz-se também numa forte centralizaçãoadministrativa e numa ausência de especialidade legislativa. O que não querdizer que não possa existir descentralização, se for esse o esquemametropolitano, mas agora só e exclusivamente numa óptica executiva. Políticaeconómica sem distinção, união aduaneira, ausência de orçamento regional,etc., são outras marcas de um sistema integrativo.

O sistema de autonomia pressupõe poderes legislativos, que não meramenteexecutivos, em matéria de aspectos especificamente regionais, distintos do todonacional. Pressupõe uma política económica com o realismo de considerar duasregiões de conjunturação diferente. Pressupõe uma política económica com orealismo de considerar duas regiões · conjunturação diferentes. Pressupõeseparação orçamental, embora haja participação do território descontínuo nasdespesas comuns do Estado que também aproveitam esse mesmo território.

Estamos, portanto, perante três sistemas diferentes, dos quais a autonomia, emfunção do interesse nacional e da realidade local, é indubitavelmente o quedeve ser prosseguido no Arquipélago da Madeira.

Autonomia que não é o mesmo do que descentralização. Esta é uma praxis queé possível até desenvolver em sistemas de integração. Bastando para tal umaespecial distribuição de tarefas ao nível dos vários postos da hierarquiaadministrativa. Autonomia não significa uma mera execução maisresponsabilizada. Vai mais longe. Robustece os laços entre as parcelas do todonacional, através de um funcional Esquema de articulação em que os problemasespecíficos de cada território são legislados localmente com realismo,permitindo aos órgãos da cúpula nacional uma actuação mais preocupada comos problemas da comunidade no seu global, na potencial certeza que, por suavez, constitui até um importante factor para uma actuação mais eficiente, mais àvontade, do poder central.

Esta autonomia para as ilhas Adjacentes deve estar subordinada ao princípioda solidariedade, ao principio da especialidade de legislação, ao princípio dadescentralização administrativa, ao principio da autonomia financeira, aoprincipio da especialidade da organização político-administrativa e ao princípioda unidade política.

O principio da solidariedade, entendido como subjacente à autonomia para asilhas Adjacentes, resulta da participação destas na República Portuguesa esignifica contribuição destas no assegurar da integridade e defesa da Repúblicae na realização dos fins comuns ao Povo português, da forma que fordemocraticamente definida.

O princípio da especialidade de legislação, para justamente permitir aexistência de normas adequadas à específica conjuntura do territóriodescontinuo.

O princípio da descentralização administrativa, através de uma repartição depoderes às várias escalas hierárquicas da administração, consoante o esquemamais adequado à situação da região em causa.

O princípio da autonomia financeira traduzido na existência de um orçamentoregional, privativo para o território descontinuo, diferente do Orçamento Geraldo Estado, onde no entanto se compreende também a participação desse

território no encarar-se as despesas e receitas que estejam adstritas aos finsessencialmente nacionais.

O princípio da especialidade da organização político-administrativa, no fundoquererá dizer que não será exactamente o mesmo o estatuto a aplicar em cadaDistrito das ilhas Adjacentes, mas estabelecido consoante as característicaspróprias de cada um.

18.12.75

(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, p.538-539)

É indubitável que um sentimento de sã autonomia é perfilhado pelos Povos dosdois Arquipélagos atlânticos. A liberdade representa isto mesmo os gruposhumanos resolverem os problemas que lhes são intrínsecos e administrarem osbens que lhes pertencem. A não ser assim, a democracia considera-se viciada ànascença.

E a política no seu sentido verdadeiro, naquela única concepção que suscita aadesão das populações e a confiança indispensável à construção estável de umfuturo justo e próspero, exige que os problemas não sejam iludidos. Exige queeles sejam encarados corajosamente nas suas reais dimensões e consequências,tendo em vista as necessidades de quem depende das respectivas soluções. Aproblemática das ilhas só pode ser devidamente solucionada, se foremadoptadas as novas estruturas que são indispensáveis para que haja nestasregiões um desenvolvimento integral desenvolvimento simultaneamenteeconómico, social, cultural e moral que a todos e cada um beneficie, mas queessencialmente seja alavanca da promoção, no progresso, da igualdade declasses.

A História mais que comprovou que enquanto a Madeira não for governada doFunchal e definirem os Madeirenses as estruturas tidas por mais convenientes,as coisas correrão sempre mal no nosso Arquipélago, as necessidades popularesnão estão célere e correctamente atendidas. Mais. O descontentamento assimpermanentemente gerado será sempre factor desagregador da sociedadeportuguesa, em vez de obter-se a meta almejada do robustecimento daRepública, da Democracia e da Justiça Social.

Também a História tem provado que nós, Madeirenses, capazes de fazer tantacoisa gigante em todo o canto do mundo como temos sabido executar, cá,dentro de casa, somos ilhas na Ilha. Ora, ou acabamos com o individualismoegoísta, com os interesses de clãs, com os espíritos de classe, ou então nuncaseremos capazes de realizar cá dentro, a epopeia que diariamente erguemos emcada esquina do mundo. E a hora em que presentemente vivemos é de desafio.Ou arrancamos agora, mesmo no meio de uma crise ameaçadora, ou teremos de

esperar muito tempo. Muito tempo mesmo. Que os egoístas, os clãs, as falsaselites ao menos deixem os outros trabalhar...

Há um grande problema que para já se põe. O Governo surge a tratar aMadeira e os Açores como apenas duas províncias, entre as sete que cria naregionalização administrativa do País. E está errado. A Madeira e os Açores nãosão apenas mais duas províncias. São regiões distintas integradas na RepúblicaPortuguesa. As províncias do Continente, por serem contíguas, pelasactividades que entre si e permanentemente integram, formam um todoharmónico e com tão íntimas interdependências que só para efeitos de gestãoadministrativa se compreende a partilha de um todo que é um só.

Mas essa íntima interdependência, a ponto de formar um todo só, não pode serconcebida em relação a áreas descontíguas, que formam uma individualidadegeográfica, um espaço próprio distinto do continental. As fronteiras do nossoArquipélago são tão radicalmente definidas, que o isolam como zonaindividualizadíssima. Insusceptível do mero tratamento de província emparidade por exemplo com o Algarve em relação ao Continente, por exemplo.

Nós somos um inconfundível e diferente espaço atlântico que incontestáveislaços colocam no mesmo projecto nacional a República Portuguesa.

O Povo deste espaço ambiciona pela autonomia verdadeira, integrado noespaço português, e acabará por tê-la. A não ser que Lisboa tenha mesmoendoidecido e seja incapaz de alcançar as repercussões terríveis que terá na vidanacional um conflito aberto entre o Povo das Ilhas e o Governo Central.

15.01.76 (Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, vol. II, p.29-30)

Vamos pensar a sério em nós, Povo Madeirense. Mas com o espírito aberto àautenticidade e não ao sectarismo nem ao pacto com a mediocridade. AMadeira será aquilo que os Madeirenses quiserem e fizerem. Por muito quecuste ou por muito que demore. Mas é preciso acima de tudo saber querer e,principalmente saber fazer.

29-01-76

(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, vol. II, 1995, p.53)

Princípios a que tem de obedecer a governação local. Primeiro, em função daactual situação do País e da vontade já expressa da população ao da autonomia.

Forma esta até (a única possível) de reforçar os laços da unidade dentro daRepública Portuguesa.

Autonomia é uma solução política, feita através de opções, e só então depoismaterializada tecnicamente. A Junta é um órgão de governo. Governar não éuma mera questão. É optar. E optar é fazer política. (...)

Foi para reivindicar a autonomia da Madeira e pela implantação a nível degoverno local de uma representatividade democrática que se lutou pelo derrubeda defunta Junta de Planeamento. Se lutou para que fossem os princípios depolítica nacional mais escolhidos pela população Madeirense, a nortearem osseus destinos. Daí que a única solução honrosa e COERENTE possível, fosse ade estar em oposição a partir do momento em que houvesse quem entendesseque o conjunto da nova Junta não oferecia garantias de reivindicar essaautonomia e a partir do momento em que ela não era representativa. E entãomais, a partir da ocasião em que um partido minoritário cá da Madeira, fazendogala da sua supremacia no Continente, recusou um possível acordo que faria járeunir aquele mínimo de condições que abriria uma possibilidade de se avançarno campo autonomista, e impôs a "sua" Junta a uma terra que lhe não reconhecerepresentatividade para tal. (...)

As Finanças são decisivas para a vitória da batalha da autonomia. Não possoadmitir que diante das câmaras de televisão o Governador diga que não sabe oque estava por detrás do interesse pelo pelouro das Finanças. Até pode seracintoso. Para além da contradição, outra em que caiu, dizendo primeiro quenão havia números definidos quanto ao movimento de dinheiros do Funchalpara Lisboa e vice-versa, e daí a bocado apresentar um quadro ondefinanceiramente a Madeira estaria esmoler do Continente. Então, há ou não hánúmeros?

30.02.76

(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, vol.II, p.87-89)

Mas é preciso também entender-se que a Autonomia é um meio necessário paraa construção de uma sociedade nova, mais justa, destruindo na Madeira certosaspectos obscurantistas de hierarquismo social e de profundas e imoraisdiferenças de nível de vida. A Autonomia não é uma opção conservadora. Éuma opção progressista, no autêntico sentido da palavra, destinada quer aevitar a marxização da Madeira, quer a continuidade de estruturas sócio-económicas carcomidas pelo pó dos tempos.

16-05-7

(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, vol.II, p.230-231)

Sou dos que venho criticando aqueles que tomam posições radicais nas relaçõesContinente-llhas.

Não embarco na história da "independência" porque nunca ninguém medemonstrou ser esse o destino que tornaria mais felizes as classes maisdesfavorecidas do Povo Madeirense.

Creio mesmo que não existe o que se poderá chamar uma "consciêncianacional" com a generalização que ela por definição impõe. O que noto é que háum sentimento fortemente regionalista a correr sérios riscos de se transformarem "separatismo" na grande maioria da população, se o Governo Centralcontinuar a fazer as asneiras que faz, continuar a praticar interpretações legaisprepotentes - como a dos casos em que os Governos Regionais têm que serouvidos se os problemas da Madeira andarem por mãos de políticos ouautoridades que não sabem distinguir "regionalismo" de "separatismo"; que nãocompreendem, por dentro, a consciência regionalista e autonómica do Povolocal.(...)

O "separatismo" não se combate com represálias, nem com perseguições. Isso écriar "mártires", criar "heróis", engrandecer uma ideia, alimentando-a. O"separatismo" não se combate com a política do governo socialista em relação àsilhas, esta a meu ver, hoje, o principal agente do separatismo. Não se combatecom as vergonhosas e escandalosas deturpações que a imprensa estatizada eoutra, tecem à volta da realidade Insular. (...)

Se na verdade as ilhas beneficiam da existência da ameaça 'separatista", se osGovernos Regionais podem na verdade beneficiar dessa força de pressão, lá issoestou convencido que até se traduz num politicamente inteligente proveito decircunstâncias.

1.02.77

(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, vol. III p.55-57)

1977. Regime Politico Administrativo da Madeira e Açores

TÍTULO VII

Regiões autónomas

ARTIGO 227.° (Regime político-administrativo dos Açores e da Madeira)

1. O regime político-administrativo próprio dos arquipélagos dos Açorese da Madeira fundamenta-se nas suas características geográficas, económicas,sociais e culturais e nas históricas aspirações autonomistas das populaçõesinsulares.

2. A autonomia das regiões visa a participação democrática dos cidadãos,o desenvolvimento económico-social e a promoção e defesa dos interessesregionais, bem como o reforço da unidade nacional e dos laços de solidariedadeentre todos os portugueses.

3. A autonomia político-administrativa regional não afecta a integridadeda soberania do Estado e exerce-se no quadro da Constituição.

ARTIGO 228.° (Estatutos)

1. Os projectos de estatuto político-administrativos das regiõesautónomas serão elaborados pelas assembleias legislativas regionais e enviadospara discussão e aprovação à Assembleia da República.

2. Se a Assembleia da República rejeitar o projecto ou lhe introduziralterações, remetê-lo-á à respectiva assembleia legislativa regional paraapreciação e emissão de parecer.

3. Elaborado o parecer, a Assembleia da República procede à discussão edeliberação final.

4. O regime previsto nos números anteriores é aplicável às alterações dosestatutos.

ARTIGO 229.(Poderes das regiões autónomas)

1. As regiões autónomas são pessoas colectivas de direito público e têmos seguintes poderes, a definir nos respectivos estatutos:

a) Legislar, com respeito da Constituição e das leis gerais da República, emmatérias de interesse específico para as regiões que não estejam reservadas àcompetência própria dos órgãos de soberania;

b) Legislar, sob autorização da Assembleia da República e com respeito daConstituição, em matérias de interesse específico para as regiões que nãoestejam reservadas à competência própria dos órgãos de soberania;

c) Desenvolver, em função do interesse específico das regiões, as leis de basesem matérias não reservadas à competência da Assembleia da República, bemcomo as previstas nas alíneas N.S. n), v) e x) do n.° I do artigo 168.° ;

d) Regulamentar a legislação regional e as leis gerais emanadas dos órgãos desoberania que não reservem para estes o respectivo poder regulamentar;

e) Exercer a iniciativa estatutária, nos termos do artigo 228.° ;

f) Exercer a iniciativa legislativa, nos termos do n.° I do artigo 170.° , mediante aapresentação à Assembleia da República de propostas de lei e respectivaspropostas de alteração;

g) Exercer poder executivo próprio;

h) Administrar e dispor do seu património e celebrar os actos e contratos emque tenham interesse;

i) Exercer poder tributário próprio, nos termos da lei, e dispor de receitas fiscaisnelas cobradas e de outras que lhe sejam atribuídas e afectá-las às suasdespesas, bem como adaptar o sistema fiscal nacional às especificidadesregionais, nos termos de lei-quadro da Assembleia da República;

J) Criar e extinguir autarquias locais, bem como modificar a respectiva área, nostermos da lei;

l) Exercer poder de tutela sobre as autarquias locais;

m) Elevar povoações à categoria de vilas ou cidades;

n) Superintender nos serviços, institutos públicos e empresas públicas enacionalizadas que exerçam a sua actividade exclusiva ou predominantementena região, e noutros casos em que o interesse regional o justifique;

o) Aprovar o plano económico regional, o orçamento regional e as contas daregião e participar na elaboração dos planos nacionais;

p) Definir actos ilícitos de mera ordenação social e respectivas sanções, semprejuízo do disposto na alínea d) do artigo 1 68 .o;

q) Participar na definição e execução das políticas fiscal, monetária, financeira ecambial, de modo a assegurar o controlo regional dos meios de pagamento emcirculação e o financiamento dos investimentos necessários ao seudesenvolvimento económico-social;

r) Participar na definição das políticas respeitantes às águas territoriais, à zonaeconómica exclusiva e aos fundos marinhos contíguos;

s) Participar nas negociações de tratados e acordos internacionais quedirectamente lhes digam respeito, bem como os benefícios deles decorrentes;

t) Estabelecer cooperação com outras entidades regionais estrangeiras eparticipar em organizações que tenham por objecto fomentar o diálogo e acooperação inter-regional, de acordo com as orientações definidas pelos órgãosde soberania com competência em matéria de política externa;

u) Pronunciar-se por sua iniciativa, ou sob consulta dos órgãos de soberania,sobre as questões da competência destes que lhes digam respeito.

2. As propostas de lei de autorização devem ser acompanhadas do anteprojectodo decreto legislativo regional a autorizar, aplicando-se às correspondentes leisde autorização o disposto nos n.° s 2 e 3 do artigo 168.° .

3. As autorizações referidas no número anterior caducam com o termo dalegislatura ou a dissolução, quer da Assembleia da República, quer daassembleia legislativa regional a que tiverem sido concedidas.

4. Os decretos legislativos regionais previstos nas alíneas b) e c) do n.° I deveminvocar expressamente as respectivas leis de autorização ou leis de bases, sendoaplicável aos primeiros o disposto no artigo 172.o, com as necessáriasadaptações.

ARTIGO 230.(Limites dos poderes)

É vedado às regiões autónomas:

a) Restringir os direitos legalmente reconhecidos aos trabalhadores;

b) Estabelecer restrições ao trânsito de pessoas e bens entre elas e o restanteterritório nacional, salvo, quanto aos bens, as ditadas por exigências sanitárias;

c) Reservar o exercício de qualquer profissão ou acesso a qualquer cargopúblico aos naturais ou residentes na região.

ARTIGO 231.° (Cooperação dos órgãos de soberania e dos órgãos regionais)

1. Os órgãos de soberania asseguram, em cooperação com órgãos degoverno regional, o desenvolvimento económico e social das regiõesautónomas, visando, em especial, a correcção das desigualdades derivadas dainsularidade.

2. Os órgãos de soberania ouvirão sempre, relativamente às questões dasua competência respeitantes às regiões autónomas, os órgãos de governoregional.

ARTIGO 232._ (Representação da soberania da República)

1. A soberania da República é especialmente representada, emcada uma das regiões autónomas, por um Ministro da República, nomeado eexonerado pelo Presidente da República, sob proposta do Governo, ouvido oConselho de Estado.

2. Compete ao Ministro da República a coordenação da actividade dosserviços centrais do Estado no tocante aos interesses da região, dispondo paraisso da competência ministerial e tendo assento em Conselho de Ministros nasreuniões que tratem de assuntos de interesse para a respectiva região.

3. O Ministro da República superintende nas funções administrativasexercidas pelo Estado na região e coordena-as com as exercidas pela própriaregião.

4. Nas suas ausências e impedimentos, o Ministro da República ésubstituído na região pelo presidente da assembleia legislativa regional.

ARTIGO 233.'(Órgãos de governo próprio das regiões)

1. São órgãos de governo próprio de cada região a assembleia legislativaregional e o governo regional.

2. A assembleia legislativa regional é eleita por sufrágio universal,directo e secreto, de harmonia com o princípio da representação proporcional.

3. O governo regional é politicamente responsável perante a assembleialegislativa regional, e o seu presidente é nomeado pelo Ministro da República,tendo em conta os resultados eleitorais.

4. O Ministro da República nomeia e exonera os restantes membros dogoverno regional, sob proposta do respectivo presidente.

5. O estatuto dos titulares dos órgãos de governo próprio das regiõesautónomas é definido nos respectivos estatutos político-administrativos .

ARTIGO 234.° (Competência da assembleia legislativa regional)

1. É da exclusiva competência da assembleia legislativa regional oexercício das atribuições referidas nas alíneas a), b) e c), na segunda parte daalínea d), na alínea), na primeira parte da alínea i) e nas alíneas j), m) e p) do n.°I do artigo 229.° , bem como a aprovação do orçamento regional, do planoeconómico e das contas da região e ainda a adaptação do sistema fiscal nacionalàs especificidades da região.

2. Compete à assembleia legislativa regional elaborar e aprovar o seuregimento, nos termos da Constituição e do estatuto político-administrativo darespectiva região.

3. Aplica-se à assembleia legislativa regional e respectivos gruposparlamentares, com as necessárias adaptações, o disposto na alínea c) do artigo178.° , nos n.° S 1, 2 e 3 do artigo 181.° e do artigo 182.° , com excepção dodisposto nas alíneas e) e J) do n.° 3 e no n.° 4, bem como no artigo 183.° , comexcepção do disposto na alínea b) do n.° 2.

ARTIGO 235. (Assinatura e veto do Ministro da República)

1. Compete ao Ministro da República assinar e mandar publicar osdecretos legislativos regionais e os decretos regulamentares regionais.

2. No prazo de quinze dias, contados da recepção de qualquer decreto daassembleia legislativa regional que lhe haja sido enviado para assinatura, ou dapublicação da decisão do Tribunal Constitucional que não se pronuncie pelainconstitucionalidade de norma dele constante, deve o Ministro da Repúblicaassiná-lo ou exercer o direito de veto, solicitando nova apreciação do diplomaem mensagem fundamentada.

3. Se a assembleia legislativa regional confirmar o voto por maioriaabsoluta dos seus membros em efectividade de funções, o Ministro da

República deverá assinar o diploma no prazo de oito dias a contar da suarecepção.

4. No prazo de vinte dias, contados da recepção de qualquer decreto dogoverno regional que lhe tenha sido enviado para assinatura, deve o Ministroda República assiná-lo ou recusar a assinatura, comunicando por escrito osentido dessa recusa ao governo regional, o qual poderá converter o decreto emproposta a apresentar à assembleia legislativa regional.

5. 0 Ministro da República exerce ainda o direito de veto, nos termos dosartigos 278.° e 279.° .

ARTIGO 236.° (Dissolução dos órgãos regionais)

1. Os órgãos de governo próprio das regiões autónomas podem serdissolvidos pelo Presidente da República, por prática de actos contrários àConstituição, ouvidos a Assembleia da República e o Conselho de Estado.

2. Em caso de dissolução dos órgãos regionais, o governo da região éassegurado pelo Ministro da República.

(Lei Constitucional Nº.1/92 de 25 de Novembro. 3revisão da Constituição daRepública)

A Constituição portuguesa declarou o direito à autonomia dos arquipélagosdos Açores e da Madeira, uma vez que reconheceu a existência de interessesparticulares das comunidades territoriais que neles habitam, assegurando-lhesmeios para a tornarem efectiva.

Como notas distintivas dessa autonomia relevam as seguintes:

a) Competência para legislar em matérias de interesse específico para asregiões, com respeito da Constituição e das leis gerais da República;

b) Competência para regulamentar a legislação regional e as leis geraisemanadas dos órgãos de soberania que não reservem para estes o respectivopoder regulamentar:

c) Exercício de poder executivo próprio;

d) Superintendência nos serviços, institutos públicos e empresasnacionalizadas que exerçam a sua actividade exclusivamente na região enoutros casos em que o interesse regional o justifique;

e) Assunção de atribuições estaduais com a correspondente transferência deserviços periféricos dos órgãos de soberania;

f) Eleição das assembleias regionais por sufrágio universal, directo e secreto, deharmonia com o princípio da representação proporcional, abrangendo o colégioeleitoral apenas círculos eleitorais das respectivas regiões.

(Fernando Amâncio Ferreira, As Regiões Autónomas na constituiçãoPortuguesa, Coimbra, 1980, pp.59-60)

Desde a extrema-direita à esquerda, se ainda há disso na política daí, desde osbons conservadores aos revolucionários ou conspiradores de profissão, desdeos católicos aos indiferentes e aos ateus todos em comovedora unanimidadeassentaram ou estão assentando em que a Madeira é uma "filha enjeitada". Enão tenho visto que ninguém com os factos, só com os factos, tenha contrariadoa campanha [...]

E porque compreendo esse fenómeno, é que a Madeira continua sendo tratadacomo terra civilizada e com paciência, ao menos enquanto se não desmandaremdemais. Porque, se o fizerem, é conveniente não esperar a doçura da repressãousada da outra vez. E podem continuar dizendo à vontade que os abandonam[...].

Todos os partidários da autonomia supuseram que esta consistia simplesmentena liberdade de gastar, dando o Poder Central quanto fosse necessário para isso[...].

A autonomia não é a autonomia de gastar, mas a de administrar umpatrimónio ou uma receita, tirando de um ou de outra o maior rendimento. Dofacto de a receita não chegar para tudo o que apetece ou há mesmo necessidadede fazer, não se segue que é ao Governo que incumbe cobrir as diferenças.

Perdoe-me V. Ex.a a extensão desta carta. Ela lhe provará [...] o cuidado que memerece essa Madeira encantada e infinitamente ingrata. Em toda a parte hágente que não sabe agradecer, mas uma terra inteira, cheia de benefícios edesconhecedora deles, só a Madeira. E porquê? Porque no fundo deseja o quenão pode ter, quer o que não é capaz de realizar e faz ideia que é ao Governoque cabe a responsabilidade dos erros e dos crimes praticados pelos seusnaturais.

(Carta do Dr. Oliveira Salazar, de 23 de Maio de 1935, ao Presidente da JuntaGeral do distrito, Dr. João Abel de Freitas)

PREÂMBULO: ESTATUTO POLÍTICO-ADMINISTRATIVO DA REGIÃOAUTÓNOMA DA MADEIRA

A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea b) do artigo 164.° , don.° 3 do artigo 169.° e do artigo 228.° da Constituição, precedendo proposta daAssembleia Regional da Madeira, nos termos do n.° I do artigo 228.° e da alíneae) do n.° 1 do artigo 2'29.° da Constituição. o seguinte:

TITULO I

Artigo 1.° O arquipélago da Madeira, composto pelas ilhas da Madeira, doPorto Santo, Desertas, Selvagens e seus ilhéus, constitui uma região autónomada Republica Portuguesa, dotada de personalidade jurídica de direito publico.

2A Região Autónoma da Madeira abrange ainda o mar circundante e seusfundos, definidos como águas territoriais e zona económica exclusiva, nostermos da lei.

Art. 2.° I A autonomia política, administrativa e financeira da RegiãoAutónoma da Madeira não afecta a integridade da soberania do Estado eexerce-se no quadro da Constituição e do seu Estatuto.

2A autonomia da Região Autónoma da Madeira visa a participaçãodemocrática dos cidadãos, o desenvolvimento económico e social integrado doarquipélago e a promoção e defesa dos valores e interesses do seu povo, bemcomo o reforço da unidade nacional e dos laços de solidariedade entre todos osportugueses.

Art. 3.° São órgãos de governo próprio da Região a AssembleiaLegislativa Regional e o Governo Regional.

2As instituições autonómicas regionais assentam na vontade doscidadãos, democraticamente expressa, e participam no exercício do poderpolítico nacional.

Art. 4.- representação da Região cabe aos respectivos órgãos de governopróprio.

2No âmbito das competências dos órgãos regionais, a execução dosactos legislativos no território da Região é assegurada pelo Governo Regional.

Art. 5IA Região tem bandeira. brasão de armas, selo e hino próprios,aprovados pela Assembleia Legislativa Regional.

2Os símbolos regionais são utilizados nas instalações e actividadesdependentes dos órgãos de governo próprio da Região ou por estes tutelados.

3Os símbolos regionais são utilizados conjuntamente com oscorrespondentes símbolos nacionais e com salvaguarda da precedência e dodestaque que a estes são devidos, nos termos da lei.

Art. 6.° A soberania da República Portuguêsa é especialmenterepresentada na Região por um Ministro da Republica, nos termos definidos naConstituição.

Art. 7.° A organização judiciária nacional tomará em conta asnecessidades próprias da Região.

Art. 8.° IA Região exerce poder tributário próprio nos termos da lei edispõe das receitas fiscais nela cobradas, bem como de outras que lhe sejam,atribuídas, nomeadamente as geradas no seu espaço territorial.

2º Nos termos da Constituição, a Região tem o sistema fiscal próprioresultante da adaptação do sistema fiscal nacional às especificidades regionais.

3º Nos termos da Constituição, o sistema fiscal regional será estruturadopor forma a assegurar a correcção das desigualdades derivadas da insularidade,a justa repartição da riqueza e dos rendimentos e a concretização de umapolítica de desenvolvimento económico e de justiça social.

(Lei nº.13/91 de 5 de Junho, Diário da República, nº.128, série I A de 5 deJunho de 1991)