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AutoraFernanda Barreto MielkeEnfermeira graduada pela Universidade Federal de Pelotas. Possui mestrado e doutorado em Enfer-magem pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Servidora da Secretaria Estadual de Saúde do Estado do Rio Grande do Sul, atua como enfermeira assistencial junto ao Hospital Psiquiátrico São Pedro. Atua principalmente nos seguintes temas: saúde mental, enfermagem psiquiátrica, avaliação de serviços de saúde mental, saúde mental coletiva, saúde mental de crianças e adolescentes.

Design InstrucionalSarah Resende

RevisãoErick GuilhonFilipe Lopes Marcos Sugizaki

Projeto GráficoNT Editora

CapaNT Editora

Editoração EletrônicaBruno Carneiro

IlustraçãoThiago Ferreira

NT Editora, uma empresa do Grupo NTSCS Quadra 2 – Bl. C – 4º andar – Ed. Cedro IICEP 70.302-914 – Brasília – DFFone: (61) [email protected] e www.grupont.com.br

Enfermagem em Saúde Mental. / NT Editora.

-- Brasília: 2017. 218p. : il. ; 21,0 X 29,7 cm.

ISBN - 978-85-8416-168-3

1 Saúde mental. 2 Política nacional de assistência em saúde mental no Brasil. 3 Transtornos mentais. 4 Funções psíquicas. 5 Psicopatolo-gia. 6 Modalidades de tratamento. 7 Cuidados de enfermagem em saúde mental.

Copyright © 2017 por NT Editora.Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida por

qualquer modo ou meio, seja eletrônico, fotográfico, mecânico ou outros, sem autorização prévia e escrita da NT Editora.

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LEGENDA

ÍCONES

Prezado(a) aluno(a),Ao longo dos seus estudos, você encontrará alguns ícones na coluna lateral do materialdidático. A presença desses ícones o ajudará a compreender melhor o conteúdo abordado e a fazer os exercícios propostos. Conheça os ícones logo abaixo:

Saiba maisEsse ícone apontará para informações complementares sobre o assunto que você está estudando. Serão curiosidades, temas afins ou exemplos do cotidi-ano que o(a) ajudarão a fixar o conteúdo estudado.

ImportanteO conteúdo indicado com esse ícone tem bastante importância para seus es-tudos. Leia com atenção e, tendo dúvida, pergunte ao seu tutor.

DicasEsse ícone apresenta dicas de estudo.

Exercícios Toda vez que você vir o ícone de exercícios, responda às questões propostas.

Exercícios Ao final das lições, você deverá responder aos exercícios no seu livro.

Bons estudos!

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Sumário

1 SAÚDE MENTAL ����������������������������������������������������������������������������������������������������� 91.1 Aspectos históricos ...................................................................................................................... 91.2 Reforma psiquiátrica no mundo ............................................................................................171.3 Reforma psiquiátrica no Brasil ..............................................................................................241.4 Modelos assistenciais em saúde mental .............................................................................26

2 POLÍTICA NACIONAL DE ASSISTÊNCIA EM SAÚDE MENTAL NO BRASIL ������362.1 Legislação e diretrizes da saúde mental ............................................................................362.2 Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) ...................................................................................442.3 Estratégia Nacional de Prevenção do Suicídio .................................................................562.4 Política Nacional de Saúde Mental Infanto-Juvenil ........................................................58

3 TRANSTORNOS MENTAIS: CLASSIFICAÇÃO E ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS �������������������������������������������������������������������������643.1 Transtornos mentais ..................................................................................................................643.2 Classificação Internacional de Doenças (CID) – 10 ..........................................................703.3 Manual Diagnóstico e Estatístico de transtornos Mentais (DSM) ..............................843.4 Aspectos epidemiológicos .......................................................................................................87

4 FUNÇÕES PSÍQUICAS �����������������������������������������������������������������������������������������944.1 Consciência ....................................................................................................................................944.2 Atenção ...........................................................................................................................................964.3 Orientação .....................................................................................................................................974.4 Memória .........................................................................................................................................994.5 Sensopercepção ....................................................................................................................... 1014.6 Humor .......................................................................................................................................... 1034.7 Emoções e sentimentos ......................................................................................................... 1044.8 Pensamento ............................................................................................................................... 1064.9 Linguagem .................................................................................................................................. 1084.10 Instinto, impulso e vontade ............................................................................................... 1094.11 Psicomotricidade ................................................................................................................... 1134.12 Inteligência............................................................................................................................... 114

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5Enfermagem em Saúde Mental

5 PSICOPATOLOGIAS ������������������������������������������������������������������������������������������� 1205.1 Esquizofrenia ..............................................................................................................................1205.2 Transtornos do Humor.............................................................................................................1305.3 Transtornos de Ansiedade ......................................................................................................1405.4 Transtornos Alimentares .........................................................................................................1485.5 Transtornos Somatoformes ...................................................................................................1515.6 Transtornos Dissociativos .......................................................................................................153

6 MODALIDADES DE TRATAMENTO ������������������������������������������������������������������� 1596.1 Psicoterapia ................................................................................................................................1596.2 Psicofarmacologia .....................................................................................................................1676.3 Práticas integrativas de assistência em saúde mental .................................................1746.4 Importância da participação da família no tratamento em saúde mental ..........177

7 CUIDADOS DE ENFERMAGEM EM SAÚDE MENTAL ��������������������������������������� 1837.1 Comunicação terapêutica .....................................................................................................1837.2 Relacionamento interpessoal ...............................................................................................1897.3 Atenção à crise ...........................................................................................................................1937.4 Atenção psicossocial ................................................................................................................199

BIBLIOGRAFIA ��������������������������������������������������������������������������������������������������������������� 207

GLOSSÁRIO ���������������������������������������������������������������������������������������������������������� 214

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APRESENTAÇÃO

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Caro(a) aluno(a),

Seja bem-vindo à Enfermagem em saúde mental!

É muito importante que os técnicos de enfermagem sejam amplamente preparados para a assistência psiquiátrica, pois, com a expansão dessa área de atuação e um crescente número desses profissionais, ser formado para atuar com visão humanizada e interdisciplinar é um diferencial no currículo. Dessa forma, o entendimento do sofrimento psíquico, a partir de um olhar global do indiví-duo, possibilita uma melhor adequação das ferramentas a serem empregadas na assistência técnica em enfermagem.

Neste material, você terá a oportunidade de desenvolver suas competências para discutir os princípios gerais e biopsicossociais que fundamentam a prática na área da enfermagem em saúde mental.

Não perca tempo! Aproveite esta oportunidade para aprimorar os seus conhecimentos, visando ao aumento da qualidade do atendimento e à excelência nos resultados.

Bons estudos!

Fernanda Mielke

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Olá! Seja bem-vindo à Enfermagem em saúde mental. Está preparado para conhecer os aspectos históricos sobre saúde mental? Então, vamos iniciar o nosso estudo analisando o processo da reforma psiquiátrica no Brasil e no mundo e os principais modelos assistenciais de saúde mental. Vamos começar?

Ao finalizar esta lição, você deverá ser capaz de:

• conhecer os aspectos históricos sobre a saúde mental;

• compreender o processo da reforma psiquiátrica no mundo e no Brasil;

• analisar os dois principais modelos assistenciais em saúde mental.

• sintetizar o conceito de saúde mental.

1.1 Aspectos históricos Você sabia que, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), não existe uma

definição oficial acerca do termo “saúde mental”?

Esse termo abrange aspectos como a qualidade de vida (emocional ou cognitiva), o bem-estar e a capacidade de se relacionar com as pessoas, como também a ausência de uma doença mental. No entanto, a dimensão da qualidade e a sensação de bem-estar variam conforme as diferenças culturais, éticas, filosóficas e religiosas.

1 SAÚDE MENTAL

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Há registros de casos de perturbações mentais por toda a história e, antes de se tornar um tema da saúde, o “louco” habitou o imaginário popular de diversas formas. Assim, passando por motivo de ironias e ridicularização até a marginalização pelo não enquadramento nos preceitos morais vigentes, a loucura é um enigma que por muito tempo ameaçou os saberes constituídos pelo homem. Todavia, para chegar à conclusão do que faz parte de ser mentalmente saudável, muita coisa aconteceu. Para compreender melhor, que tal um pouco de história?

Era Primitiva Grécia Antiga Hipócrates Galeno Idade Média Renascimento Pós-Renascimento

Possessãopor demônios

Intervençãodos deuses

Irregularidadesdos líquidos

do corpo

Relação com ás funções psíquicas

Possessãodiabólica

Alienação ouperda da

função mental

Início do entendi- mento das doenças do

psiquismo

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Os indivíduos afetados por doenças mentais na era do homem primitivo (em média 500 mil anos a.C.) eram considerados possuídos por demônios, por maus espíritos ou por poderes mágicos e sobrenaturais, e, desse modo, a cura estava relacionada a rituais de purificação e exorcismo (expulsão de espíritos), consistindo em torturas, agressões físicas brutais e até mesmo na morte de pessoas em fogueiras.

Na Grécia Antiga (período entre 1.100 a.C. e 146 a.C.), havia uma vaga concepção sobre a doença mental, de forma que acreditavam tratar-se de intervenção dos deuses sobre o pensamento e a ação do homem. Então, buscavam a cura em cerimônias de caráter religioso, ocorridas em templos.

Hipócrates (460-380 a.C.) associava a ideia de doença mental a irregularidades dos líquidos do corpo, tais como a bile e o sangue, chamando-os de “humores” e associando cada um deles a uma alteração de temperamento. Este foi o primeiro passo para tratar a doença mental através da medicina e não como algo de cunho religioso. Hipócrates classificou as doenças em: melancolia, psicose pós-parto, fobias, delirium tóxico, demência senil e histeria. A cura consistia em provocar vômitos e diarreias por meio do uso de medicações.

Com Galeno (131-301 a.C.), o psiquismo deixou de ser considerado uma questão religiosa, de alma ou espírito, seguindo a teoria de que o cérebro é a sede das funções psíquicas. Para Galeno, a “alma racional” era dividida em duas partes: a externa, que abrangia os cincos sentidos, e a interna, que consistia na imaginação, julgamento, percepção e movimento. Assim, a loucura passou a ser entendida por meio de explicações fisiológicas, anatômicas e neurológicas.

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Na Idade Média (período entre os séculos V e XV), viveu-se um período obscuro, em que a Igreja associava a loucura à possessão diabólica. Voltou, então, o predomínio da ideia do sobrenatural e dos feitiços, sendo a cura vinculada às purificações pelo fogo, por exorcismos e por banhos em ácido.

Durante o Renascimento (período entre os séculos XIV e XVII), a doença mental passou a ser considerada como parte de um processo mental traduzido em comportamentos e concebida como alienação ou perda da função mental. Nesse período, foram criadas várias instituições para doentes mentais na Europa, deixando a marca da negligência e dos maus-tratos aos seus internos. Essas instituições acabavam por abrigar, além dos doentes mentais, os demais marginalizados da sociedade como mendigos, desempregados, doentes crônicos e criminosos, que igualmente perturbavam a ordem social. A clausura coletiva dessas pessoas consideradas incômodas à sociedade tinha a intenção de esconder que o não deveria ser visto.

A partir do Renascimento, uma nova ordem social se instalava no mundo e era preciso uma nova conceituação para a loucura. A partir dessa nova concepção acerca da loucura, a clausura deixou de ser sinônimo de exclusão e assumiu um caráter terapêutico: era necessário isolar o paciente em locais adequados, afastando-o do meio que lhe gerava os distúrbios (DESVIAT, 1999).

Desse modo, no séc. XVII, teve início o movimento alienista, cuja principal forma de tratamento era o isolamento e o tratamento moral. O isolamento deveria acontecer em locais apropriados, ou seja, nos manicômios, instituições hospitalares destinadas à internação e ao tratamento de doentes mentais. Num primeiro momento, essa era uma ideia razoável, pois proporcionava a separação entre doentes e não-doentes. O isolamento passou a se tornar um problema diante do longo período de tempo que o doente passava internado, sem convívio familiar e afastado da sociedade, desencadeando o processo de exclusão e estigmatização da loucura. O tratamento moral baseava-se em terapias afetivas e psicopedagógicas, permitindo o diálogo entre o médico e o doente. Pinel, Esquirol e Ferrus são os principais representantes do movimento alienista (DESVIAT, 1999).

Negligên-cia: falta de cuidado; falta de atenção.

Clausura: local fechado. Situação de quem não pode sair do claustro; internamen-to, encerra-mento.

Movimento alienista: movimento marcado pela compaixão aos insanos, em meados do século XIX.

Manicômio: hospitais es-pecializados no tratamen-to de doen-ças mentais/transtornos mentais.

Estigmati-zação: ato de marcar, tachar, classi-ficar, criticar, condenar, censurar.

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Vamos exercitar

A respeito do conceito de Saúde Mental, assinale a alternativa correta:

a) saúde mental é o completo bem-estar emocional.

b) saúde mental é apenas a ausência de transtorno mental.

c) não existe um conceito definitivo para saúde mental.

d) a saúde mental é vista da mesma maneira em todas as culturas.

Comentário: não existe uma definição oficial para saúde mental. Esse termo inclui a qualidade de vida (emocional ou cognitiva), o bem-estar e a capacidade de se relacionar com as pessoas como também a ausência de uma doença mental. Mas a dimensão da qualidade e sensação de bem-estar varia conforme diferenças culturais, éticas, filosóficas e religiosas. Se você marcou a alternativa “c”, acertou. Parabéns!

Saiba mais

Philippe Pinel nasceu em 1745 e faleceu em 1826, na França. For-mou-se em Medicina em 1773 e em 1792 tornou-se o médi-co chefe do asilo para homens Bicetrê, em Paris, onde de-senvolveu uma nova forma de tratamento aos pacientes internados, por meio de duas ações principais: primeiro, ele separou os doentes mentais dos marginalizados, possibilitando demonstrar que existia diferenças entre os doentes e os não-doentes, o que não era possível quando todos estavam aglomerados no mesmo espaço. A segunda importante ação foi libertar os doentes men-tais das correntes às quais eram acorrentados para evitar fugas e agressões. Assim, os doentes mentais poderiam experimentar a liberdade de poder caminhar no peque-no espaço da sela. Apesar de essas formas de tratamento nos parecerem, nos dias de hoje, absurdas e violentas, para o século XVIII eram consideradas avançadas, pois buscavam uma forma de tratamento que não maltratasse os doentes mentais.

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Início das instituições hospitalares no Brasil

A loucura no Brasil só começou a ser objeto de intervenção do Estado a partir da chegada da família real portuguesa, em 1808. Diante da necessidade de controle efetivo sobre o crescimento da sociedade, importantes mudanças ocorreram nesse período.

Importante

Os termos “hospital psiquiátrico”, “hospício” e “manicômio” que encontraremos no decorrer de nossa lição, apresentam o mesmo conceito: instituição hospitalar destinada ao tratamento de doentes mentais.

Desta forma, a medicina, enquanto mecanismo reordenador da estrutura social, passou a organizar o projeto do qual emerge a psiquiatria brasileira (AMARANTE, 1994).

O tratamento oferecido aos loucos até esse período era de péssima qualidade. Os doentes mentais ficavam sob a responsabilidade das santas casas de misericórdia, sendo abrigados em porões. O atendimento oferecido não incluía cuidados médicos, visto que a principal finalidade era fornecer abrigo, alimento e cuidados religiosos a esses doentes.

Em 1830, a Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro realizou um diagnóstico da situação dos loucos na cidade. Assim, os loucos passaram a ser reconhecidos como doentes mentais e, como tais, passaram a merecer um espaço próprio para tratamento e recuperação. Dessa forma, a medicina reivindicava os espaços para tratar a doença mental e solicitava a abertura de instituições específicas para essa clientela, com o lema: “Aos loucos o hospício!”. Isso ocorreu na intenção de que os loucos, de fato, tivessem o direito ao tratamento médico e aos cuidados de saúde (AMARANTE, 1994).

Na intenção de expor uma posição crítica da classe médica e entendendo a clausura como forma de tratamento, foi iniciada a luta pela abertura dos hospitais psiquiátricos. O isolamento proposto por Pinel ainda era considerado como efetivo, sendo compreendido como uma boa e adequada forma terapêutica.

Este movimento pela criação de instituições específicas para doentes mentais resultou na instalação do primeiro hospital psiquiátrico brasileiro e da América Latina, que foi inaugurado em 1852, durante o Segundo Reinado. Era o denominado Hospício de Alienados Pedro II, no Rio de Janeiro (foto a seguir). Posteriormente, por seu grande porte e pelas decorações de luxo que possuía, ficou conhecido como “palácio dos loucos”. No período de 1852 a 1886, muitas instituições psiquiátricas foram criadas em todo território nacional, devido à necessidade de atender à demanda (BRASIL, 2005; ODA; DALGALARRONDO, 2005).

Hospício: sinônimo de manicômio.

Demanda: manifestação de um de-sejo, pedido ou exigência; solicitação.

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Os hospitais psiquiátricos

Os hospitais psiquiátricos geralmente eram instituições de grande porte. Eles atendiam a homens e mulheres com transtornos mentais, em alas/ unidades separadas. O número de leitos variava, numa média de 500 ou 1.000 a 3.000 ou 3.500, podendo ultrapassar esses valores. Atualmente, o número de leitos varia entre 250 ou 300 a 550 ou 600, em conformidade com a política nacional de redução de leitos em hospitais psiquiátricos.

Tabela 1 – Número de leitos em dois hospitais psiquiátricos

Ano Número de leitos

Hospital Psiquiátrico São Pedro (RS)

1960 5.000

2007 470

Hospital Psiquiátrico Juqueri (SP)

1981 4.200

1998 1.411

2005 654

O período de permanência na instituição hospitalar também era variável, indo desde dias até meses e anos, dependendo da sorte ou do azar do paciente. O dia da alta era indefinido, impossibilitando a elaboração de um projeto de vida. A noção de tempo dentro da instituição era perdida, reconhecendo-se apenas os rígidos horários da higiene, da alimentação, do repouso e da medicação (GUIMARÃES; SAEKI, 2007). Sabe-se das transformações das condições do hospital psiquiátrico, mas ainda é possível identificar ali algumas situações precárias.

A assistência era baseada principalmente na terapia medicamentosa abusiva, que apontava dois aspectos distintos, mas interligados. Um dos aspectos era a questão da lucratividade com o uso de medicação, o que demandava que o paciente permanecesse mais tempo internado. O segundo ponto era a sedação do paciente, que o impossibilitava de realizar atividades, reforçando o seu afastamento da sociedade.

Terapia medicamen-tosa: consiste no uso de medica-mentos que auxiliam no tratamento.

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Antigamente, não era oferecida nenhuma atividade ao doente e este passava os dias caminhando, divagando, conversando, alucinando, delirando. Hoje, em alguns hospitais psiquiátricos, há oficinas de trabalhos manuais, música, atividades físicas, entre outras.

O contato com os profissionais de saúde era restrito às consultas, basicamente médicas, e à administração de medicamentos. Nos dias de hoje, já se tem experiências com grupos (geralmente separados por transtornos mentais) e com atendimentos individuais realizados por enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais, dentre outros.

A família, na ótica hospitalar, era, muitas vezes, encarada como a culpada pelo transtorno ou doença. Isso fazia com que

os profissionais de saúde não considerassem a família no tratamento, impondo-lhes o papel de simples informantes (MELMAN, 2001). Hoje, já há um consenso de que as famílias atuam de maneira fundamental na evolução do seu familiar

durante o tratamento, na medida em que deem o apoio e o suporte adequados. O investimento na participação da família durante a internação está ocorrendo de forma

que haja uma resposta efetiva, refletida na recuperação do doente.

As visitas ao hospital psiquiátrico ocorriam, em geral, somente após o 15º dia de internação, ainda com a ideia de que o meio familiar, especialmente, e o meio social eram os desencadeadores da doença. O visitante não possuía livre acesso à instituição, sendo definidos dias e horários de visitas. Muitas vezes, eram horários difíceis para as pessoas que trabalhavam, por exemplo, às 15 horas.

A pessoa que visitava permanecia em um espaço restrito, não podendo circular nas dependências do hospital (GUIMARÃES; SAEKI, 2007). Em alguns hospitais psiquiátricos, nos dias de hoje, é possível que o paciente tenha direito ao passeio: passa alguns dias (geralmente 3 dias) com a família e retorna à instituição, com a ideia de preparar o paciente, a família e a comunidade para alta hospitalar daquele.

A “coisificação” do paciente internado era uma marca bastante forte no hospital psiquiátrico (DESVIAT, 1999). Coisificação no sentido de que o paciente perdia sua identidade: não era reconhecido como um ser humano, um cidadão, mas sim como um diagnóstico, um código (CID), porque lá dentro todos eram iguais, ou seja, apenas doentes mentais.

O hospital psiquiátrico era uma instituição total, ou seja, a pessoa desenvolvia todos os tipos de atividades no mesmo espaço físico, estando em situação semelhante aos demais, separada da sociedade mais ampla por um período considerável de tempo, levando uma vida fechada e formalmente administrada (GOFFMAN, 2003).

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As pessoas se deitavam e se levantavam no mesmo horário, comiam a mesma comida, usavam a mesma vestimenta (uniforme), realizavam as mesmas atividades de lazer, cumpriam rígidos horários e normas, eram tratadas da mesma forma e tomavam a medicação no mesmo horário. Essas atitudes de uniformização geravam a perda da individualidade, acompanhada pelo processo de coisificação, supracitada.

O individual não era observado, somente o coletivo, pois a ideia era de que todos estavam na instituição pela mesma condição: eram loucos, doentes mentais, então deveriam receber o mesmo tratamento, sendo que o que de fato importava era a patologia e seu conjunto de sintomas.

A agressividade social gerada pela institucionalização e por longos períodos no hospital psiquiátrico fez com que muitas pessoas morressem socialmente, ainda que estando biologicamente vivas. Esse foi o principal aspecto que motivou a crítica ao modelo hospitalar, centrado no hospital psiquiátrico.

Vamos exercitar

Sobre o hospital psiquiátrico, é correto afirmar que:

a) o período de permanência era estipulado em meses.

b) era uma instituição total onde a pessoa desenvolvia todos os tipos de atividade no mesmo espaço físico.

c) compreendia a importância da participação da família no tratamento.

d) possibilitava o retorno breve da pessoa internada ao convívio social e familiar.

Comentário: era uma instituição total, porque as pessoas desenvolviam todos os tipos de atividade no mesmo espaço físico, estando separada do convívio social e levando uma vida fechada e formalmente administrada. Caso tenha marcado a alternativa “b”, você acertou. Parabéns!

Institucio-nalização: ato ou efeito de institucio-nalizar(-se), tornar-se parte da instituição.

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1.2 Reforma psiquiátrica no mundoDiante da ineficiência do modelo de assistência psiquiátrica que existia até a Segunda Guerra

Mundial, prioritariamente centralizado no tratamento em hospitais psiquiátricos, que acabavam por excluir o doente mental da sua família e a sociedade, exigia-se uma transformação na área da psiquiatria.

O movimento da reforma psiquiátrica surgiu depois da Segunda Guerra, inicialmente na Europa, na intenção de transformar ou até mesmo extinguir os hospícios, manicômios e hospitais psiquiátricos existentes.

A guerra acabou por adoecer muitos soldados, afetando também sua saúde mental. Isto contribuiu para que, no período pós-guerra, fosse pensada uma nova maneira de tratamento na área da saúde psiquiátrica que não levasse tanto tempo quanto uma internação e que causasse menos danos à pessoa.

O desejo coletivo de construir uma sociedade mais livre e igualitária associado à descoberta dos psicofármacos (denominação dada aos medicamentos psiquiátricos), a utilização da psicanálise e da saúde pública no cuidado em saúde mental serviram como propulsores dos diferentes movimentos de reforma da psiquiatria (DESVIAT, 1999).

Os idealizadores da reforma psiquiátrica tinham muitos motivos concretos e consistentes para suas críticas ao modelo hospitalocêntrico de atenção, centralizado no cuidado em hospitais psiquiátricos. Dentre eles, podemos citar o afastamento do doente mental por longo período de tempo da família e da sociedade, dificultando o seu retorno a esses espaços, e a concentração do tratamento na parte medicamentosa, desconsiderando a parte subjetiva do adoecimento, ou seja, as emoções, os sentimentos e suas mais variadas formas de manifestação (COSTA-ROSA, 2000).

Psicofárma-cos: nome dado aos fármacos utilizados em psiquiatria. Agentes químicos que atuam sobre o sistema nervoso cen-tral (SNC).

Psicanálise: método terapêutico criado por S. Freud.

Hospitalo-cêntrico: modelo asilar, baluarte do isolamento do louco.

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Tendo em vista essas questões e o período histórico sendo vivenciado, ou seja, um momento de crescimento econômico e de reconstituição social no período do pós-guerra, era necessário lançar um novo olhar à loucura e à doença mental.

Assim se iniciam os movimentos de reforma psiquiátrica em todo o mundo. Estes movimentos resultaram em dois rumos principais para colocados o manicômio. No primeiro, realizaram-se ações reformistas no interior de hospitais psiquiátricos. Isso ocorreu na psicoterapia institucional e na comunidade terapêutica em geral. Já o segundo caminho consistiu no fechamento dos hospitais. Isso ocorreu com áreas como a psiquiatria de setor, a psiquiatria comunitária (desinstitucionalização) e psiquiatria democrática (DESVIAT, 1999).

Psicoterapia institucional

A psicoterapia institucional foi desenvolvida na França, sendo influenciada pela psicanálise, e se constituiu em uma tentativa de salvar o manicômio.

A psicoterapia institucional entendia que o manicômio era construído pelas pessoas que faziam parte dele, tanto os profissionais quanto os doentes mentais e, desse modo, era imprescindível que a terapia envolvesse todas essas pessoas, compreendendo que a instituição em sua totalidade era o alvo do tratamento.

Assim, a psicoterapia institucional é definida como um conjunto de ações, desenvolvidas no interior do hospital psiquiátrico, que permitem a criação de instrumentos (atividades de modo geral) que possibilitem a abertura de espaços de troca e experiências.

As formas terapêuticas de institucionalização eram baseadas na reinvenção, na revolução permanente do hospital psiquiátrico e na criação de instituições alternativas.

A psicoterapia institucional foi a base para a setorização da psiquiatria, realizada em um segundo momento, também na França.

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Comunidade terapêuticaA comunidade terapêutica, iniciada na Inglaterra, consistia em grupos de discussões nos quais

o doente mental participava como responsável por seu tratamento juntamente com o médico, ainda no interior do hospital psiquiátrico.

Importante

Antigamente, a responsabilidade do tratamento era dividida entre o médico e os demais mem-bros da comunidade, ou seja, os doentes mentais.

A comunidade terapêutica, em seu íntimo, mantinha princípios como democratização de opiniões, tolerância, comunicação, liberdade de expressão, confronto com a realidade, atividades coletivas, participação do coletivo nas decisões.

A crítica aos modelos reformistas da psicoterapia institucional e da comunidade terapêutica é a de que o doente mental não retornava à sociedade, mas criava-se uma micro-sociedade no interior dos hospícios, mantendo a separação entre doente e não doente mental. Não havia uma interlocução com o mundo social externa aos muros hospitalares.

Vamos exercitar

A respeito da psicoterapia institucional, assinale a alternativa correta:

a) a psicoterapia institucional era realizada apenas em instituições privadas.

b) a psicoterapia institucional entendia que o manicômio era construído pelas pessoas que faziam parte dele, tanto os profissionais quanto os doentes mentais.

c) a psicoterapia institucional abrange todas as instituições que declaram apoio aos funcionários com transtornos leves e moderados.

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d) a psicoterapia institucional buscava a estruturação de um serviço público de qualidade para o tratamento da população com problemas mentais.

Comentário

A alternativa correta do nosso exercício é a letra “b”. A psicoterapia institucional foi desenvolvida na França, sendo influenciada pela psicanálise, e se constituiu em uma tentativa de salvar o manicômio.

A psicoterapia institucional entendia que o manicômio era construído pelas pessoas que faziam parte dele, tanto os profissionais quanto os doentes mentais, envolvendo todos no tratamento.

Psiquiatria de setor

A psiquiatria de setor (ou setorização) também foi desenvolvida na França, como consequência da psiquiatria institucional. Esta buscava a estruturação de um serviço público de qualidade para o tratamento da população com problemas mentais, para que esta tivesse acesso universal à saúde e ao tratamento da doença mental.

Na psiquiatria de setor, o cenário de tratamento não era mais o hospital psiquiátrico. As cidades eram divididas em setores dentro dos quais eram criados locais de atendimento extra-hospitalares, na perspectiva de descentralizar o atendimento, fortalecendo a construção da assistência na comunidade.

A lógica era manter o doente mental o mais próximo possível de sua família e comunidade, promovendo-lhe autonomia, a partir de um atendimento mais humanizado, prestado por uma mesma equipe de saúde.

Ainda que a ideia principal fosse descentralizar o atendimento ao doente mental, construindo-o na comunidade, muitos hospitais psiquiátricos eram reconhecidos como centros de referência em psiquiatria, o que acabava por dificultar a afirmação desses espaços comunitários como espaços efetivos de tratamento em saúde mental.

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Psiquiatria comunitária (desinstitucionalização)

A psiquiatria comunitária consistiu em um processo de reformulação da assistência, desenvolvida nos Estados Unidos. É o início da ideia de desinstitucionalização.

Além de sair do interior do hospital psiquiátrico, também era preciso valorizar a pessoa que estava sofrendo e não somente sua doença, diferenciando-a da loucura. Era primordial oferecer o apoio e o suporte necessários às famílias destes doentes para que as relações de poder dentro da própria família fossem modificadas, promovendo um novo lugar social ao doente mental.

O paciente estava dentro de sua comunidade, onde era conhecido por ela e também a conhecia, o que poderia ser considerado um fator positivo para que ele fosse auxiliado pela comunidade.

O processo de desinstitucionalização não significa apenas “retirar” o doente mental de dentro do hospital psiquiátrico, mas sim de construir condições para que ele seja assistido em suas necessidades, com qualidade e sempre que for preciso, dentro de seu espaço social, de sua comunidade.

Saiba mais

A partir dos movimentos de reforma psiquiátrica, o foco da atenção em saúde mental deixa de ser a doença mental e passa a ser a produção da saúde mental.

A intenção é reconstruir com o doente mental a sua vida, suas relações e suas atividades, considerando-o como membro da sociedade, que tem sua contribuição no coletivo e que possui capacidades e habilidades, ou seja, reconhecê-lo como cidadão.

Psiquiatria democrática

A psiquiatria democrática, experiência italiana, era baseada no fechamento dos hospitais psiquiátricos, sendo este devidamente assegurado pela legislação, conforme veremos a seguir e, também, na construção de centros de saúde mental nos bairros para que os pacientes fossem atendidos em sua comunidade, em serviços com portas abertas, destacando a liberdade como forma de tratamento.

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Importante

A ideia principal deste modelo de reforma era fazer com que o paciente retornasse à sociedade e, na medida do possível, retomasse suas atividades, sua vida

Franco Basaglia foi o principal ator da reforma psiquiátrica italiana. Ele nasceu em Veneza, Itália, em 1924, falecendo em 1980. Era médico e, ao ingressar no Hospital Psiquiátrico de Gorizia na condição de diretor, em 1961, iniciou ações no intuito de transformá-lo em uma comunidade terapêutica.

Porém, com o passar do tempo, percebeu que somente a humanização da assistência não seria suficiente para superar a miséria, por exemplo, dos internos. Então, iniciou o movimento de transformação radical, no sentido de extinguir o hospital psiquiátrico.

Em 1971, Basaglia foi nomeado o diretor do Hospital Psiquiátrico Regional de Trieste, na Itália, onde iniciou o processo de fechamento daquele hospital psiquiátrico e promoveu a substituição do tratamento hospitalar por uma rede territorial de atendimento, da qual faziam parte serviços de atenção comunitários, emergências psiquiátricas em hospital geral, cooperativas de trabalho protegido, centros de convivência e moradias assistidas para loucos.

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No ano de 1973, a Organização Mundial da Saúde (OMS) credenciou o serviço psiquiátrico de Trieste como principal referência mundial para a reformulação da assistência em saúde mental. Então, a partir de 1976, o Hospital Psiquiátrico de Trieste foi fechado oficialmente e a assistência em saúde mental passou a ser exercida em sua totalidade na rede territorial montada por Basaglia.

Como consequência das ações e dos debates iniciados por ele, no ano de 1978, foi aprovada a lei italiana nº 180, que assegurava o fechamento dos hospitais psiquiátricos e a criação de serviços alternativos na comunidade. Conhecida como lei da reforma psiquiátrica Italiana ou mesmo lei Basaglia, estabelecia, dentre outras diretrizes, que:

a) eram proibidas novas internações a partir da promulgação da lei, bem como a construção de novos hospitais psiquiátricos;

b) os serviços psiquiátricos na comunidade, no território, deveriam garantir atendimento contínuo. Poderiam dispor de leitos (não mais do que quinze leitos) em hospitais gerais;

c) poderia haver intervenção jurídica em casos de internação contra a vontade do paciente.

Franco Basaglia esteve algumas vezes realizando conferências no Brasil e suas ideias se constituíram nas principais influências para o movimento pela reforma psiquiátrica brasileira. Assim, o ideal de uma reforma psiquiátrica após Basaglia seria uma sociedade sem manicômios, isto é, uma sociedade capaz de abrigar os loucos, os portadores de sofrimento mental, os divergentes e os diferentes, baseada na inclusão e na solidariedade.

Vamos exercitar

Qual é o principal objetivo da reforma psiquiátrica?

a) Reeducação dos doentes mentais.

b) Punição por condutas não aceitáveis.

c) Exclusão e internação dos doentes mentais.

d) Transformar e humanizar a assistência psiquiátrica.

Comentário: o objetivo principal dessa transformação é reinserir o doente mental no âmbito social, de forma a modificar a relação da sociedade com os doentes mentais, reconhecidos como cidadãos, que merecem respeito e tratamento dignos. Se você marcou a alternativa “d”, você acertou. Parabéns!

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1.3 Reforma psiquiátrica no Brasil O movimento da reforma psiquiátrica no Brasil teve início no final dos anos de 1970, ocorrendo

paralelamente ao movimento de reforma sanitária. A reforma psiquiátrica brasileira foi influenciada pelo movimento reformista italiano, idealizado por Franco Basaglia (AMARANTE, 1995).

Iniciou-se a partir da crise da Divisão Nacional de Saúde Mental, que era o órgão do Ministério da Saúde responsável pela formulação das políticas de saúde mental. A crise ocorreu devido às precárias condições de trabalho, à inadequação do quadro de recursos humanos, às queixas salariais e ao modelo médico assistencial predominante. Ela acabou por deflagrar a greve dos trabalhadores em 1978, quando se iniciou a organização do Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental – MTSM, no Rio de Janeiro. Esse movimento, inicialmente, organizou um quadro de críticas ao modelo clássico e dominante de tratamento: o médico-terapêutico (AMARANTE, 1995).

Com a intenção de desenvolver uma ação no campo social da psiquiatria, o MTSM elaborou um pensamento crítico com relação às questões da saúde mental no país, permitindo visualizar a inversão desse modelo através da desinstitucionalização. Com isso, foram abertas as portas para a reforma psiquiátrica, pois uma parte da classe dos trabalhadores resolveu que queria mudar. Obviamente, tiveram o apoio dos pacientes, dos seus familiares e de uma considerável parte da sociedade.

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Em 1987, ocorreram fatos importantes para que a reforma psiquiátrica desse mais um passo à frente. Em julho daquele ano ocorreu a I Conferência Nacional de Saúde Mental, no Rio de Janeiro. Essa conferência tinha como propostas gerais a ampliação do conceito de saúde, a participação popular na saúde mental e a sugestão para que os trabalhadores da área de saúde mental revisassem o seu papel diante do novo modelo de atenção em saúde mental, construído a partir da reforma psiquiátrica, denominado modo psicossocial. Ela foi importante para que se pensasse em saúde não somente como ausência de doenças, mas como uma condição relacionada à vida social, cultural, econômica e política das pessoas (AMARANTE, 1996).

Em dezembro de 1987, ocorreu o II Congresso Nacional do Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental, cujo lema era “Por uma sociedade sem manicômios”. Foram apresentados três eixos básicos: a ampliação da discussão da loucura nas práticas assistenciais, a organização dos profissionais de saúde mental com o Estado para que eles fossem reconhecidos como trabalhadores da saúde pública e, por fim, a reflexão sobre a prática profissional concreta, no cotidiano, para que houvesse efetivamente a ruptura com o isolamento social. O congresso chamou a atenção, também, para a necessidade de participação da sociedade nas discussões relacionadas à assistência em saúde mental, visto que ela também tem sua parcela de responsabilidade nesta questão (AMARANTE, 1996).

Inspirado na lei Basaglia (Lei nº 180/1978) o então deputado Paulo Delgado (PT-MG) apresentou um projeto de lei ao Congresso Nacional, no ano de 1987, que propunha uma mudança radical no que se referia à assistência em saúde mental. No projeto de lei constava que seriam proibidas novas internações em hospitais psiquiátricos e que a rede hospitalar psiquiátrica seria extinta em até cinco anos. Propunha também tratamentos alternativos e a interferência da autoridade judiciária que julgaria a necessidade de internação, quando isso fosse solicitado pelo paciente. Esse projeto de lei tramitou por 12 anos no Senado, sofrendo várias modificações.

Saiba mais

Somente no dia 06 de abril de 2001 é que foi sancionada a lei nº10.216 (também chamada Lei Paulo Delgado), que dispõe sobre a Reforma Psiquiátrica no Brasil.

Psicossocial: que envolve conjun-tamente aspectos psicológicos e sociais.

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A partir daquele momento, algumas mudanças básicas começaram a acontecer. Uma delas foi a nomenclatura dada ao doente mental: não se usa mais paciente, mas usuário, no sentido de que a pessoa é usuário de um serviço de saúde, o serviço de saúde mental especificamente. A mudança de modelo assistencial em saúde mental foi outro aspecto a ser destacado, como veremos no próximo tópico desta lição. A participação e a inclusão da família no tratamento dos usuários da saúde mental foi outra mudança importante.

A reforma psiquiátrica não deve ser entendida apenas como a mudança do modelo de atenção e a substituição dos manicômios por serviços comunitários. Ela é um movimento social de inclusão, de reintegração social e de reconstrução, na busca – cotidiana e permanente – do novo lugar do doente mental na sociedade.

Dessa forma, configurou-se uma nova política, a política de saúde mental, constituída para atender a todas essas mudanças que o movimento de reforma psiquiátrica propôs para a área da psiquiatria.

Importante

A principal função da reforma psiquiátrica era construir um novo estatuto social para a pessoa com transtorno mental e promover a transformação do modelo assistencial em saúde men-tal, eliminando não o tratamento clínico, mas extinguindo a internação de longa permanência como forma de exclusão social, que é entendida como uma das formas possíveis de tratamento.

1.4 Modelos assistenciais em saúde mentalPrimeiramente, é importante conceituarmos o termo modelo assistencial: refere-se ao modo

como são organizadas as ações de atenção à saúde, envolvendo aspectos assistenciais e tecnológicos. É a forma de organização e articulação entre os recursos físicos, humanos, materiais e tecnológicos disponíveis, que serão utilizados no enfrentamento das dificuldades relacionadas à saúde da população (SILVA JÚNIOR; ALVES, 2007).

Usuário: denomina-ção dada às pessoas com transtornos mentais que utilizam os serviços de saúde mental de base co-munitária.

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Em saúde mental, nos deparamos com dois modelos assistenciais principais e, consequentemente, opostos: o modelo hospitalocêntrico e o modelo psicossocial. Para facilitar a compreensão, vamos estudá-los separadamente a partir de quatro parâmetros principais: a) concepção de objeto e meios de trabalho, b) formas de organização institucional, c) formas de relacionamento com os indivíduos com transtorno psíquico e d) concepção dos efeitos em termos terapêuticos (COSTA-ROSA, 2000).

Modelo hospitalocêntrico

a) Concepção do objeto e dos meios de trabalho

A concepção de objeto refere-se ao modo como o indivíduo com transtorno psíquico é compreendido e os meios de trabalho estão relacionados às ferramentas utilizadas na prestação da assistência e cuidado.

No modelo hospitalocêntrico, o indivíduo é visto unicamente como doente que necessita de tratamento. Há pouca ou nenhuma consideração sobre a existência do sujeito, os seus desejos, os seus sentimentos e a sua experiência de vida. Nesse sentido, o indivíduo não participa ativamente de seu tratamento, pois não se acredita na importância dessa participação.

Saiba mais

A medicação é o foco do tratamento e é nela que se colocam as maiores expectativas com rela-ção à melhora do quadro do paciente.

A aproximação da família, quando ocorre, se dá no sentido pedagógico e assistencial, mas não na intenção de fazê-la participar de forma ativa na construção do cuidado com seu familiar adoecido mentalmente.

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Apesar de haver uma equipe multiprofissional envolvida na assistência à pessoa doente, os profissionais pouco conversam entre si para discutir o caso do paciente e pensar, em conjunto, a melhor medida terapêutica. Cada profissional dedica-se exclusivamente à sua área de atuação e o prontuário é considerado o elo de conexão entre a equipe.

A instituição de referência para o atendimento dos indivíduos com transtornos psíquicos é o hospital psiquiátrico, com sua estrutura fechada, que pouco permite a troca com o âmbito familiar e social.

Vamos exercitar

Complete os espaços vazios utilizando os termos indicados no banco de palavras a seguir:

manicômios

reconstrução

movimento social

reforma psiquiátrica

doente mental

serviços comunitários

A ___________________ não deve ser entendida apenas como a mudança do modelo de atenção e a substituição dos ___________________ por ___________________. Ela é um ___________________ de inclusão, de reintegração social e de ___________________, na busca – cotidiana e permanente – do novo lugar do ___________________ na sociedade.

Comentário: a sequência correta do nosso exercício é: reforma psiquiátrica, manicômios, serviços comunitários, movimento social, reconstrução e doente mental. A reforma psiquiátrica não deve ser entendida apenas como a mudança do modelo de atenção e a substituição dos manicômios por serviços comunitários. Ela é um movimento social de inclusão, de reintegração social e de reconstrução, na busca – cotidiana e permanente – do novo lugar do doente mental na sociedade.

b) Formas de organização institucional

As formas de organização institucional dizem respeito ao modo como a instituição estrutura sua organização interna e as relações entre os trabalhadores.

No modelo hospitalocêntrico, esta organização se dá de forma verticalizada, ou seja, o fluxo do poder institucional segue um sentido único: do topo para a base, “de cima para baixo”, aceitando que poucos determinam e muitos obedecem, evidenciando hierarquia, subordinação, exclusão e divisão do trabalho e saberes em especialidades.

Com isso, há uma importante estratificação do poder e do saber, que se expressa tanto nas relações institucionais quanto entre os trabalhadores.

Transtornos psíquicos: transtornos mentais.

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c) Formas de relacionamento com os indivíduos com transtorno psíquico

De maneira simplificada, pode-se dizer que a relação estabelecida com os indivíduos com transtorno psíquico trata-se de uma divisão entre loucos e sãos, ou, simplesmente, entre doentes e sadios.

Os indivíduos doentes não são considerados como capazes de protagonizar ações diante de sua vida e, por isso, não são chamados a fazer parte do planejamento de seu tratamento, entendendo que com nada irão poder contribuir nesse sentido.

Como já foi visto anteriormente, a principal forma de tratamento no modelo hospitalocêntrico é a medicamentosa. Ela não oferece oportunidades ao indivíduo de retomar sua vida e suas atividades e retornar ao seu espaço de convivência. O doente é, efetivamente, paciente: aquele que aguarda passivamente por tratamento, cuidado e atenção.

d) Concepção dos efeitos em termos terapêuticos

A concepção dos efeitos em termos terapêuticos diz respeito às ideias de tratamento e cura e, no modo hospitalocêntrico, se concretizam pela cronificação dos pacientes internados por longos períodos nos hospitais psiquiátricos e pelo uso maciço de medicamentos.

Modelo psicossocial

a) Concepção de objeto e meios de trabalho

No que se refere à concepção de objeto e meios de trabalho, a atenção psicossocial considera os fatores políticos, biológicos, psicológicos, sociais e culturais como determinantes, ou seja, o indivíduo com transtorno psíquico faz parte de um contexto familiar, reside em determinado local que caracteriza o seu território de vida e onde mantém suas relações sociais.

Os meios de tratamento utilizados são a psicoterapia, a socioterapia, a laborterapia e um

Sãos: sau-dáveis; com saúde; sadios.

Medica-mentosa: influência recíproca de um medica-mento.

Cronifica-ção: processo relacionado a doenças que se alongam por muito tempo.

Maciço: em grande quan-tidade.

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conjunto de dispositivos de reintegração sociocultural, além da medicação. O indivíduo com transtorno psíquico assume a condição de participante principal do tratamento, e é atribuída a ele importância incontestável enquanto sujeito, ou seja, uma pessoa com experiência própria e história de vida.

Considera-se, de maneira enfática, a permanência do indivíduo com seu grupo familiar e social, os quais também estão incluídos na proposta de tratamento, de diferentes formas. A família, que antes era cconsiderada, muitas vezes, culpada e um fator “que atrapalha”, se torna aliada e parceira no tratamento do seu familiar com transtorno psíquico.

Busca-se o reposicionamento do indivíduo frente à sua condição, ou seja, se, por um lado, ele sofre os efeitos do seu transtorno psíquico, por outro, ele é um potencial agente de mudanças, deixando de ser somente aquele que sofre. A reinserção social é uma prática bastante trabalhada nos serviços que constituem o modelo psicossocial, não deixando de atentar para a problemática que retirou o sujeito da circulação sociocultural. O objeto de trabalho no modelo psicossocial é a existência-sofrimento do indivíduo, considerando que o transtorno psíquico é parte de sua vida, e não a sua essência.

No modelo psicossocial, o trabalho se dá a partir de equipe interprofissional, incluindo áreas para além das conhecidas no campo da saúde, superando o modelo de estratificação do saber e especialidades, mas sem desvalorizar a importância específica de cada área.

Importante

O tratamento também está para além do uso de medicamentos, propondo um modelo de in-tervenção que produza saúde, cuidado e cidadania. Nesse sentido, novos dispositivos institu-cionais se fazem necessários para implantar esse novo processo de trabalho. Nascem, assim, os centros de atenção psicossocial, os ambulatórios de saúde mental, as equipes multiprofis-sionais inseridas na atenção básica, os leitos em hospitais gerais, os centros de convivência, as oficinas de geração de renda e trabalho, entre outros, que atualmente compõem a Rede de Atenção Psicossocial.

Sociotera-pia: atividade terapêutica cujo objetivo e oferecer ao indiví-duo uma melhoria de condições de vida através de técnicas de investi-gação para determinar qual o me-lhor procedi-mento a ser indicado em seu caso.

Laboterapia: tratamento de doenças psicoemocio-nais através do trabalho, terapia ocu-pacional.

Enfática: que deu serieda-de, ênfase, importância a algo.

Reinserção: ação de inse-rir novamen-te, colocar novamente.

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b) Formas de organização institucional

No modelo psicossocial, o organograma está organizado de modo horizontal, não mais seguindo o fluxo do ápice para a base. As relações de poder estabelecidas na instituição devem ser horizontais, tanto entre os trabalhadores quanto entre estes e os usuários.

E0874B

CONDIÇÕES SOCIOECONÔMICAS, CULTURAIS E AMBIENTAIS GERAIS

ESTILO DE VIDADOS INDIVÍDUOS

REDES SOCIAIS E COMUNITÁRIAS

CONDIÇÕES DE VIDAE DE TRABALHO

DESEMPREGO

ÁGUA E ESGOTO

HABITAÇÃO

AMBIENTE DETRABALHO

EDUCAÇÃO

PRODUÇÃOAGRÍCOLA E DE

ALIMENTOS

A horizontalização institucional exige a diferenciação entre poder decisório e poder de coordenação. O poder decisório é dado pela reunião geral da instituição, enquanto o poder de coordenação é de representação e deve coordenar as ações conjuntas e executar as decisões tomadas pelo coletivo. Com isso, conclui-se que apenas o poder de coordenação é marcado pela esfera do saber técnico (saber-fazer), trazendo a diferenciação entre saber e poder. O poder decisório é marcado pela participação popular, que é algo bastante presente e necessário no modelo psicossocial.

c) Formas de relacionamento com os indivíduos com transtorno psíquico

As instituições, no modelo psicossocial, devem se constituir como espaços de interlocução, promovendo o protagonismo dos indivíduos com transtorno psíquico, ou seja, eles são os atores principais neste cenário de cuidado e atenção. Além disso, a instituição deve ser um ponto de fala e de escuta da população, acolhendo as demandas sociais e referindo-as, quando for o caso, às outras instâncias sociais, de saúde ou não.

d) Concepção dos efeitos em termos terapêuticos

No modelo psicossocial, o principal objetivo do tratamento oferecido é o reposicionamento subjetivo, isto é, proporcionar ao indivíduo com transtorno psíquico a possibilidade de reinventar as suas próprias vidas e existências a partir da convivência com seu transtorno psíquico, sem necessitar de abrir mão da vida familiar e social.

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O modelo psicossocial busca um olhar abrangente sobre o ser humano que sofre com um transtorno psíquico, compreendendo que esse indivíduo tem uma história de vida, de relações familiares e sociais e é portador de um transtorno psíquico que repercute de diversas formas em sua vida. Isso nos remete ao conceito de saúde mental, que estudamos no início de nossa lição, o qual abrange a qualidade de vida emocional e cognitiva, o bem-estar e a capacidade de se relacionar com as pessoas, como também a ausência de uma doença mental.

Vamos exercitar

Assinale a alternativa que não representa um fator que difere nos dois modelos assistenciais em saúde mental.

a) O local de tratamento do indivíduo com transtorno psíquico.

b) A forma como a família é compreendida durante o tratamento.

c) A maneira como o indivíduo com transtorno psíquico é visto.

d) A aplicabilidade do modelo assistencial.

Comentário: como nós estudamos, a aplicabilidade do modelo assistencial esteve presente nos diferentes contextos, por isso, a alternativa incorreta é a letra “d”.

Resumindo Nesta lição, estudamos as diferentes maneiras como a saúde mental era entendida ao longo

da história, indo desde a possessão por demônios até a criação de instituições especializadas no tratamento da doença mental.

Estudamos, também, como essas instituições foram se constituindo nos grandes hospitais psiquiátricos, que, por sua forma de organização e funcionamento, acabaram por promover a separação, por longos anos, do individuo com transtorno psíquico da sociedade, causando um dano social e emocional quase irreparável a essas pessoas.

Veja se você se sente apto a:

• identificar os aspectos históricos da saúde mental;

• discutir o processo da reforma psiquiátrica no mundo e no Brasil;

• classificar os dois principais modelos assistenciais em saúde mental;

• relatar o conceito de saúde mental.

Você finalizou a primeira lição do nosso material. Esperamos que você tenha gostado de conhecer a respeito dos aspectos históricos da saúde mental. Vamos nos encontrar na próxima lição. Até mais!

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Exercícios

Questão 1 - Sobre o conceito de saúde mental, marque a alternativa correta.

a) Saúde mental compreende o cuidado e a assistência médica e de enfermagem.

b) Saúde mental é sinônimo de ausência de doenças mentais.

c) Saúde mental compreende a qualidade de vida, o bem-estar e a capacidade de se relacionar com as pessoas.

d) Saúde mental consiste no processo saúde-doença do campo da psiquiatria.

Questão 2 - A respeito do cuidado com os doentes mentais, marque a alternativa falsa.

a) Na era do homem primitivo, os doentes mentais eram vistos como possuídos por demônios, maus espíritos ou poderes sobrenaturais.

b) Na Grécia Antiga, havia uma vaga concepção sobre a doença mental. Acreditava-se que ela era intervenção dos deuses sobre o pensamento e a ação do homem.

c) Hipócrates associava a doença mental às irregularidades dos líquidos corporais, como bile e sangue.

d) Galeno considerava que o psiquismo estava diretamente relacionado aos aspectos religiosos e, por isso, acreditava na cura das doenças mentais pelo exorcismo.

Questão 3 - Sobre o movimento alienista, assinale a alternativa incorreta.

a) O movimento alienista era baseado no isolamento e no tratamento moral.

b) O isolamento consistia em isolar o doente mental em locais apropriados como os manicômios.

c) O isolamento proporcionava a separação entre doentes mentais e não doentes.

d) Nos dias atuais, o isolamento se configura como importante estratégia no tratamento psiquiátrico.

Questão 4 - A respeito do manejo com os doentes mentais, assinale a alternativa incorreta.

a) No Brasil, em 1808, iniciou-se a intervenção sobre a loucura, diante da necessidade de controle sobre o crescimento da população.

b) Em 1852, foi inaugurado o primeiro hospital psiquiátrico no Brasil, chamado Hospício Martinho Lutero, também conhecido como paraíso dos loucos, por seu grande porte e decorações de luxo. Nos hospitais psiquiátricos, a principal forma de tratamento era o isolamento proposto por Pinel.

c) No início da intervenção sobre a loucura, os doentes mentais eram abrigados nos porões das santas casas de misericórdia.

d) A medicina passou a reivindicar espaços adequados ao tratamento dos doentes mentais com o lema “aos loucos o hospício”.

Parabéns, você fina-lizou esta lição!

Agora responda às questões ao lado.

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Questão 5 - Sobre os hospitais psiquiátricos, assinale a alternativa correta.

a) A internação tinha caráter breve e o doente mental ficava internado em média por 30 dias.

b) O foco do tratamento no hospital psiquiátrico era a terapia medicamentosa abusiva.

c) Nos hospitais psiquiátricos eram oferecidas diversas atividades aos seus internos, como trabalhos manuais, música, atividade física, entre outros.

d) A relação entre profissional de saúde e doente mental era horizontal, tendo o doente mental acesso irrestrito à equipe, com diálogo aberto, atendimentos grupais e individuais.

Questão 6 - Sobre a reforma psiquiátrica, podemos afirmar que:

a) trata-se do processo de transformação da psiquiatria diante da ineficiência do modelo de assistência psiquiátrica existente.

b) trata-se de uma transformação no tratamento baseado nos psicofármacos.

c) trata-se do processo de ampliação do uso de psicofármacos no âmbito do Sistema Único de Saúde.

d) trata-se da criação de um complexo hospitalar para o atendimento dos casos psiquiátricos.

Questão 7 - Sobre as críticas ao modelo hospitalocêntrico, assinale a alternativa incorreta.

a) O modelo hospitalocêntrico se baseava no cuidado com o território.

b) O modelo hospitalocêntrico trazia o afastamento do doente mental por longo tempo.

c) O modelo hospitalocêntrico desconsiderava a parte subjetiva do tratamento.

d) O modelo hospitalocêntrico favorecia a exclusão social dos doentes mentais.

Questão 8 - O movimento de reforma iniciado na França sob a influência da psicanálise, cujo alvo do tratamento era a instituição em sua totalidade e cujas práticas eram desenvolvidas no interior do hospital psiquiátrico, é denominado:

a) psicoterapia institucional.

b) comunidade terapêutica.

c) psiquiatria de setor.

d) psiquiatria comunitária.

Questão 9 - Entre as afirmativas abaixo, assinale a alternativa correta.

a) Na lógica da comunidade terapêutica, o doente mental não participava de seu tratamento.

b) A psiquiatria de setor teve seu início na França, sendo influenciada pela psicoterapia institucional.

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c) A psiquiatria de setor ainda mantinha o hospital psiquiátrico como cenário de tratamento.

d) O processo de desinstitucionalizar significa somente retirar o doente mental de dentro do hospital psiquiátrico.

Questão 10 - A respeito da psiquiatria democrática, podemos dizer que:

a) a ideia principal da psiquiatria democrática era fazer com que o paciente retornasse ao hospital psiquiátrico e, na medida do possível, abandonasse suas atividades e sua vida.

b) a psiquiatria democrática era baseada na abertura dos hospitais psiquiátricos.

c) a psiquiatria democrática é a principal influência para a reforma psiquiátrica brasileira.

d) a psiquiatria democrática era baseada no ampliamento dos hospitais psiquiátricos em cada bairro.