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RESUMOTem sido observada crescente utilização dos pinos de
fibra, que se deve às propriedades favoráveis dos diferentes
sistemas de retentores fibrorresinosos, os quais reduzem a inci-
dência de fraturas radiculares e o número de sessões clínicas,
além de possibilitar melhores resultados estéticos e maior apro-
veitamento do remanescente coronário, quando comparados
aos pinos e núcleos metálicos. Aliado a esses fatores, o que
também tem impulsionado a indicação dos pinos de fibra em
situações cada vez mais desafiadoras é o desenvolvimento de
técnicas e novos designs de pinos, com o objetivo de reduzir o
volume necessário de cimento resinoso para sua fixação, em
função da dificuldade de adesão na dentina intrarradicular. Nes-
te texto, realiza-se breve discussão da utilização dos pinos de
fibra nas áreas de prótese, dentística e endodontia, e destacam-
se os riscos de desvios, perfurações radiculares e deslocamen-
tos dos pinos em dentes com remanescente coronário inferior a
2mm, bem como estratégias para reduzir tais riscos.
ABSTRACTIt has been observed a growing use of fiber posts, which
is due to the favorable properties of different fiber post systems
that reduce the incidence of root fractures and the number of
clinical sessions; they enable better cosmetic results and make
better use of remaining coronary compared to metal posts. Besi-
des these factors, it also has spurred an indication of fiber posts
in increasingly challenging situations is the development of new
techniques and designs of posts in order to reduce the requi-
red volume of cement for fixation, depending on the difficulty of
adhesion to intra-canal dentin. In this paper we provide a brief
discussion of the use of fiber posts in Prosthodontics, Dentistry
and Endodontics, highlighting the risks of deviations, root per-
forations and post dislodgment in teeth with less than 2 mm of
coronary structure, as well as strategies to reduce those risks.
Há tendência atual na odontologia de reduzir a indica-
ção do uso de retentores intrarradiculares, devido aos princí-
pios de adesão e da biomimética. Ao mesmo tempo, os pinos
de fibra vêm sendo cada vez mais aceitos e utilizados para a
restauração de dentes tratados endodonticamente amplamente
destruídos, o que se deve, dentre outros fatores, à possibilidade
de preservação da dentina. Ao contrário dos núcleos metálicos
fundidos (NMF), os retentores fibrorresinosos não necessitam,
para sua utilização, da eliminação das retenções naturais do ca-
nal radicular, bem como não exigem preparação protética para
coroa total (Fig. 1), o que permite o melhor aproveitamento do
remanescente radicular e coronário.1
PINOSDEFIBRAFiber posts
LeonardoMuniz
A Última Palavra sobre...
Figura 1: Para utilização de um NMF, faz-se necessário preparo com paredes divergentes para oclusal, nos sentidos vestibulolingual e mesiodistal. Além disso, os NMFs determinam a necessidade de utilizar coroa total e, para isso, o preparo coronário deve se apresentar convergente para oclusal também, em todos os sentidos. Esses fatores associados podem causar, em alguns dentes, destruição expressiva na região cervical da raiz e da coroa, com maior comprometimento do remanescente coronário e fragilização radicular (Imagem produzida em conjunto com o professor Márcio Giampá Ticianeli – UNIME e EBMSP).
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Além de reduzir a necessidade de desgaste, os pinos de
fibra têm melhor comportamento biomecânico e, por apresen-
tar módulo de elasticidade próximo ao da dentina, possibilitam
distribuição mais uniforme das tensões ao longo da raiz, e não
se relataram casos de fraturas radiculares, o que vem sendo
corroborado por diversos estudos clínicos.2-3
Ainda em comparação com os pinos e núcleos metáli-
cos, existe melhor desempenho estético dos pinos de fibra, que
não sofrem corrosão e apresentam coloração e translucidez
compatíveis com a estética, à exceção dos de fibra de carbono.
Além disso, os pinos de fibra dispensam a etapa laboratorial,
requerem apenas uma sessão clínica e, em casos de falhas do
pino ou do tratamento endodôntico, é possível sua remoção ou
sua recimentação.1
Com tantas propriedades positivas, por que alguns den-
tistas, especialmente os que atuam na prótese, relutam em utili-
zar os pinos de fibra? Uma justificativa plausível seria o elevado
número de pinos deslocados, quando esses materiais foram
introduzidos na odontologia, principalmente durante a remoção
de elementos provisórios, que quase sempre eram relaciona-
dos a pinos cilíndricos ou mal adaptados às paredes do canal
radicular. Na verdade, acreditava-se inicialmente que o cimento
resinoso, ao preencher os espaços determinados pela falta de
adaptação do retentor, seria suficiente para garantir retenção e
estabilização da reconstrução coronária, não importando sua
adaptação às paredes do canal radicular.
Hoje, a partir da divulgação dos casos de deslocamen-
tos dos pinos, se reconhecem a dificuldade de adesão intrar-
radicular pelas condições desse substrato, dificuldade de vi-
sualização, sensibilidade da técnica adesiva, baixa resistência
coesiva e alta contração de polimerização dos cimentos resino-
sos. Tais dificuldades são potencializadas pelo elevado fator de
configuração cavitária do canal radicular e pela impossibilidade
de inserção incremental do cimento resinoso.1,4-6
Considerando-se essas dificuldades, a adaptação do
pino deve ser um dos objetivos iniciais a ser alcançados, para
melhorar sua retenção, o que é possível a partir da seleção de
retentores com formatos e diâmetros compatíveis com os ca-
nais radiculares, de forma a aumentar sua retenção friccional,7
como ocorre nos NMFs. Hoje se reconhece a importância dos
sistemas adesivos e cimentos resinosos na fixação dos pinos de
fibra, entretanto, os resultados não devem ser relacionados ape-
nas à qualidade dos diferentes sistemas adesivos e cimentos
resinosos disponíveis, pois a quantidade necessária de cimento
tem papel decisivo no sucesso da retenção.1, 7-8
Na perspectiva de se reduzir o volume necessário de
cimento resinoso, foram desenvolvidos diversos pinos com de-
senhos cônicos, destacando-se o formato cônico paralelo (FRC
Postec, Ivoclar Vivadent, Liechtenstein) e o com dupla conicida-
de (DT Light Post, Bisco e White Post DC, FGM, Brasil), como
opção para os pinos cilíndricos, o que melhorou seu potencial
de ajuste aos canais radiculares e favoreceu a retenção. Con-
tudo, em algumas situações clínicas, os canais radiculares são
bastante amplos na região cervical, e até mesmo o pino com
dupla conicidade não consegue bom preenchimento.
Considerando-se essa dificuldade, foram desenvolvidos
pinos com dupla conicidade reforçados (White Post DCE, FGM),
que apresentam maior grau de conicidade e permitem melhor
preenchimento cervical, a partir da utilização de retentor com
ponta mais delgada. Esse novo design de pino não substitui
os demais pinos cônicos, na verdade, ele aumenta as proba-
bilidades de ser selecionados pinos mais compatíveis com os
diferentes diâmetros e formatos dos canais radiculares (Fig. 2).
Os pinos com dupla conicidade reforçados são bastante indica-
dos para dentes ântero-superiores, pois melhoram o prognós-
tico protético para coroas unitárias, até mesmo em dentes com
pouco ou nenhum remanescente coronário.1
Figura 2: Esquema ilustrando a utilização de pinos cilíndricos (A e B), com dupla conicidade (C) e com dupla conicidade reforçados (D), em dente incisivo central. É possível observar a impossibilidade de o pino cilíndrico preencher de forma adequada o canal radicular (A). A tentativa de utilizar um pino cilíndrico mais cali-broso aumenta o risco de haver desvios e perfurações e, ainda assim, não se ob-tém bom preenchimento cervical (B). Nota-se que o pino com dupla conicidade melhora o aspecto biológico, pois requer menor desgaste apical para melhorar o preenchimento cervical (C). Contudo, para esse caso, a melhor adaptação cervi-cal foi obtida utilizando-se o pino com dupla conicidade reforçado (D). O maior grau de conicidade desse design de pino possibilitou excelente preenchimento cervical, a partir de desgaste apical extremamente conservador.
Além das dificuldades já discutidas em relação à adesão
intrarradicular, um dado da literatura é muito relevante: os ca-
sos de deslocamentos divulgados ocorrem quase sempre em
dentes com remanescente coronário inferior a 2mm, condição
bastante frequente em reabilitações protéticas.1, 9
A manutenção do remanescente de dentina radicular e
coronária possibilita resistência e estabilidade para o conjunto
restaurado. Numa preparação para coroa total, por exemplo, a
presença de bom remanescente coronário aumenta a área de
adesão disponível e favorece que a prótese o abrace (efeito
férula), o que reduz sobremaneira o risco de haver fraturas den-
tais e deslocamentos dos pinos (Fig. 3).10- 11
PINOSDEFIBRA
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Ao contrário de o que ocorre na prótese, na dentística, o
uso dos pinos de fibra, quando associado às restaurações dire-
tas, não oferece risco de haver fraturas ou deslocamentos, uma
vez que a quantidade de remanescente coronário favorece ex-
celente adesão e estabilização.12 Uma ressalva importante para
dentes com grande quantidade de remanescente coronário é a
possibilidade de o remanescente direcionar a broca para uma
das paredes, o que aumenta o risco de ocorrer desvios e per-
furações radiculares, especialmente nos dentes anteriores, em
que o acesso endodôntico é realizado pela face palatina (Fig.
4). Dessa forma, desgaste compensatório na face palatina da
região incisal pode ser necessário para melhor direcionamento
da broca (Fig. 4).1
1. . .
2. . .
3.
Ao discutir os riscos de ocorrer desvios e perfurações
radiculares, vale ressaltar que, até há pouco tempo, os pinos
apresentavam pontas extremamente calibrosas, ofereciam pe-
rigo para dentes com raízes delgadas e achatadas no sentido
mesiodistal. Essas situações eram bastante freqüentes em den-
tes posteriores, ântero-inferiores e incisivos laterais superiores,
ou seja, na maioria dos dentes.1
Figura 3: Esquema ilustrando a área de ferulização, que consiste na área da den-tina abraçada pela coroa protética. Quanto maior for o remanescente coronário, maior será a área de ferulização e de adesão e menor a ação de alavanca que a restauração exerce sobre a estrutura dental, quando os dentes são submetidos a esforços oblíquos.
Figura 4: Em dentes anteriores, o remanescente incisal direciona os alargadores dos pinos para a face vestibular, e pode determinar desvio seguido de perfuração (A). Para evitar esse problema, pode-se realizar desgaste palatoincisal com pontas diamantadas ou brocas (B), a fim de reduzir o risco de haver perfurações vestibulares e favorecer a centralização do pino (C e D).
Com a recente introdução de pinos com pontas mais del-
gadas – White Post DC 0,5 (FGM), White Post DCE 0,5 (FGM),
DT Light Post 0,5 (Bisco) e FRC Postec 0 (Ivoclar Vivadent) – e o
desenvolvimento de estratégias individualizadas para trabalhar
cada dente de acordo com sua anatomia e solicitação mecâ-
nica, os riscos de haver desvios e perfurações laterais foram
minimizados. Em análise final, parece que até nisso a nature-
za conspira a favor da odontologia, pois os dentes posteriores
que apresentam raízes mais delgadas não necessitam de pinos
calibrosos ou longos, uma vez que, na região posterior, predo-
mina um vetor de força axial, e o núcleo de preenchimento em
resina composta ajuda na distribuição das tensões para o rema-
nescente e na estabilização da prótese. A análise dos dentes
ântero-superiores mostra que deles se exige mais mecanica-
mente, por estarem mais expostos a esforços oblíquos. Assim,
necessita-se de pinos mais longos e calibrosos, especialmente
na região cervical. Novamente, a natureza é benevolente, pois
esses dentes apresentam canais mais amplos e facilidade de
acesso.
Com o conhecimento dos riscos relacionados ao uso
dos pinos de fibra, o aprimoramento das técnicas e o desen-
volvimento dos materiais, especialmente os novos designs de
pinos e a redução do diâmetro de suas pontas, abre-se nova
perspectiva na indicação dos pinos de fibra para restauração
de dentes tratados endodonticamente, em condições cada vez
mais desafiadoras.
AGRADECIMENTOSAgradeço de forma especial aos colaboradores de
nosso livro Reabilitação estética em dentes tratados endodon-
ticamente. Pinos de fibra e possibilidades clínicas conservado-
ras: Adriano Sapata, Alexandre Moreira, Ceres Fontes, Carlos
Francci, Denise Cerqueira, Edméa Lodovici, Flávio Takamatsu,
Leonardo Costa, Marcelo Luchesi Teixeira, Marcelo Witzel, Már-
cio Giampá Ticianeli, Marcos Kirihata, Marta Muhana, Maurício
Lago, Paula Mathias, Paulo Rocha, Rosa Amoedo, Sílvio Alber-
garia e Soraia Souza.
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Leonardo MunizMestreemClínicaOdontológicapelaFO-UFBA,
ProfessordeClínicaIntegradadaEscolaBahianadeMedicinaeSaúdePública,EspecialistaemEndodontiapelaFO-UFBA,AutordoLivroReabilitação Estética em Dentes Tratados
Endodonticamente. Pinos de Fibra e Possibilidades Clínicas Conservadoras
RuadasAlfazemas,761,sala806,41380-710,Iguatemi,Salvador,BA,[email protected]
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