Aula 19
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Economia Pública
Aula 19
V – Tributação
2 – Impostos sobre os bens e serviços;
Efeitos sobre o bem-estar;
Tributação indirecta óptima.
Bibliografia : Cullis & Jones (1998) : Cap 7 (7.1;7.2) e Cap 15 (15.1;15.2)
Pontos a abordar :
1 – Noção de carga excedentária;
2 – Identificação de carga excedentária ; medida da carga excedentária;
4 – Carga excendentária com custos marginais crescentes;
5 – Tributação óptima : princípio;
6 – Regra de Ramsey.
1 – Noção de carga excedentária;
Carga excedentária de um imposto (deadweight loss) é a quantidade que é perdida
em excesso ao que o governo colecta. Trata-se da perda de benefício que ambos os
agentes sofrem devido ao imposto.
2 – Identificação da carga excedentária
Para calcular a carga excedentária temos que utilizar a curva de procura
compensada.
Vejamos em primeiro lugar porque é necessária a curva de procura compensada.
Quando se pretende medir o valor de uma política pública utilizando a teoria da
utilidade, utiliza-se o conceito de “vontade de pagar” (willingness to pay, ou (WTP))
que o consumidor tem pela política em questão. O Conceito de willingness to pay é um
conceito da curva de procura compensada.
Prof. Carlos Barros 1
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Economia Pública
Considere-se um exemplo : Qual a vontade de pagar pela política de prevenção do
crime que a Câmara Municipal implementará através da política municipal ?
Intensidade da política WTP do Sr. J Utilidade marginal
0 polícias 0 0
1 polícia 50 euros 50
2 polícias 95 euros 45
3 polícias 135 euros 40
4 polícias 170 euros 35
5 polícias 200 euros 30
6 polícias 228 euros 28
7 polícias 254 euros 26
8 polícias 278 euros 24
9 polícias 301 euros 23
10 polícias 323 euros 22
Em termos gráficos este problema representa-se por :
Prof. Carlos Barros 2
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Economia Pública
Podemos utilizar o WTP para construir uma curva de procura compensada. A
curva a construir é compensada porque o Sr. J disse quanto é que estava disposto a
pagar (WTP) por cada polícia adicional por forma a manter-se sobre a mesma curva de
indiferença, a que corresponde a utilidade constante.
- A Curva de Procura Compensada
As curvas de procura compensadas reflectem apenas o efeito-substituição. São
curvas que dão origem à procura do bem em função dos preços (WTP, neste caso). O
rendimento é retirado ao indivíduo ou é lhe dado por forma a ele manter a utilidade que
teria se os preços não tivessem variado. Por esta razão as curvas de procura
compensadas não possuem o efeito rendimento, mas apenas efeito compensação
associado à variação do preço.
procé mado qde com
Prof. Carlos Barros
A curva deura ordináriais horizontalue a curva
procurapensada.
3
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Economia Pública
- O Excedente do Consumidor
A diferença entre o que o indivíduo quer pagar e o que o indivíduo paga é o
excedente do consumidor. Na definição de WTP vimos que o sr. J queria pagar 50
Euros por um polícia e 45 Euros por dois polícias. Se o preço de mercado for 30 Euros o
Sr. J obtém uma utilidade superior ao preço pago.
Essa utilidade mede-se por :
1 polícia : 50 - 30 = 20 Euros;
2 polícias : 45 - 30 = 15 Euros;
3 polícias : 40 - 30 = 15 Euros;
4 polícias : 35 - 30 = 5 Euros;
5 polícias : 30 - 30 = 0 Euros
∑ = 50 Euros
O excedente do consumidor é, neste exemplo, 50 Euros. Em termos gráficos o
excedente do consumidor é a área da curva da procura acima do preço de mercado.
Num contexto de um projecto concreto adicionar-se-iam as curvas de procura
individual, agregando-se os benefícios recebidos pelos indivíduos inquiridos. A
diferença entre o benefício agregado e o custo do projecto é o benefício económico do
projecto.
3 – A carga excedentária
A carga excedentária é a medida da ineficiência de um imposto. Como a vontade
de pagar por um imposto constitui um conceito da curva de procura compensada,
utilizaremos esta curva para obter a carga excedentária.
Prof. Carlos Barros 4
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Economia Pública
Considere-se um imposto sobre cigarros. O custo de produzir o cigarro é C0 e o
imposto é ‘t’, por forma que o custo mais o imposto seja C0 + t.
Em termos gráficos ter-se-ia :
A área ABC mede a carga excedentária resultante do lançamento do imposto
sobre os cigarros. O triângulo ABC é conhecido por triângulo de Harberger. Por que
razão o triângulo de Harberger constitui uma medida de ineficiência ? Porque o imposto
obtido é a área 00 )( BACtC + mas a diminuição do produto devido ao imposto é ))( 10 BCqtC +
e, portanto, o triângulo é um puro desperdício de recursos que o imposto induz.
Carga excedentária
Se a curva da procura for linear, a área do triangulo ABC é dada por:
(basexaltura/2). Quando a curva não é linear a area é calculada como um integral. O
valor do integral é dado por:
A medida do triângulo ABC é dada por : Legenda :
ed = elasticidade da procura; t= imposto; P= preço sem imposto; Q= quantidade sem imposto. QPtde
PQPtde
PtCE
..2.21
......2
1
=
=
Prof. Carlos Barros 5
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Economia Pública
Carga excedentária e variação equivalente
O conceito de variação equivalente foi uma medida proposta por Hicks para
contornar a dificuldade de calcular o excedente do consumidor. Esta dificuldade decorre
do facto de ser impossível calcular o integral do excedente do consumidor no caso geral,
quando os preços variam, já que o integral depende da ordem de integração.
A variação equivalente é um conceito associado à medida de willingness to pay,
assim como a variação compensadora está ligada à willingness to accept.
Definição de variação equivalente – variação equivalente é o rendimento mínimo
que o consumidor está disposto a pagar de forma a manter-se no mesmo nível de
utilidade face a uma variação nos preços de P0 para P1. A variação equivalente mede-se
pelo willingness to pay. Se se quiser manter o consumidor no mesmo nível de utilidade
ter-se-á de retirar rendimento, para compensar da subida do preço. Este valor, na
ausência de imposto, deixa a utilidade individual exactamente no ponto em que estaria
se o imposto fosse lançado. A variação equivalente servirá para medir a variação na
utilidade devido a um imposto. Comparando a variação na utilidade com o imposto
identifica-se a carga excedentária.
Vejamos graficamente a questão:
Prof. Carlos Barros 6
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Economia Pública
Considere-se uma situação inicial dada por 12. dada a variação nos preços de P0
para P(1+t) a restrição orçamental desloca-se para 14. Como queremos calcular a
variação equivalente, vamos traçar uma restrição orçamental paralela à inicial 67.
Traçar esta restrição orçamental significa anular a variação nos preços relativos
A variação equivalente obtém-se deslocando a restrição orçamental para ela ser
paralela à restrição orçamental inicial e tangente à nova curva de indiferença ( recta
67 ). A diferença 16 é o rendimento que se retira ao indivíduo devido à variação (isto é,
devido ao imposto), para o deixar com o bem-estar inicial que teria sem o imposto. Isto
é, 16 é a perda de utilidade do indivíduo associada ao imposto.
Conclusão : O lançamento do imposto faz a quantidade passar de 4 para 11
unidades de X. A quantidade 11 ( quantidade apôs o lançamento do imposto) custaria
antes do imposto 13−1 unidades de Y e após o imposto, apenas 121− . Se tivéssemos
retirado 16 de quantidade Y ao indivíduo, o que é igual a 9.10 , ele manteria a utilidade
equivalente já que apôs o imposto continuamos a consumir X e Y nas proporções
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Economia Pública
iniciais. O imposto retirado é 5.10 . Conclui-se que o imposto retirado 5.10 é inferior à
perda de utilidade 9.10 . A diferença 9.5 é a carga excedentária.
A carga excedentária mede-se no gráfico abaixo e corresponde ao triângulo 123 .
A medida do triângulo 123 é :
CE = ½.t.P.(ed.t.P.Q)/P
= ½ ed.t2.P.Q
No equilíbrio inicial sem imposto temos a restrição orçamental 12 e a curva de
indiferença I3. No ponto de tangência 30 o indivíduo iguala a inclinação da curva de
indiferença ( isto é, a TMS ∂UX/∂UY) à inclinação da restrição orçamental ( -PX/PY).
Condição de equilíbrio em “3” Y
X
Y
X
PP
UU
−=∂∂
−
Lançando o imposto sobre o bem X, à taxa t, o preço relativo de X cresce e a
restrição orçamental altera a sua inclinação para 14 . No novo ponto de tangência 5
verifica-se a tangência entre a nova restrição orçamental e a curva de indiferença I1.
Condição de equilíbrio em “5” Y
X
Y
X
PtP
UU )1( +
−=∂∂
−
Variação equivalente e variação compensadora
O conceito de variação compensadora foi apresentado por Hicks simultaneamente
ao de variação equivalente. A variação compensadora está ligada ao willingness to
accept. A variação compensadora define-se como o valor que tem de vir de fora do
sistema para compensar o indivíduo da distorção nos preços induzida pelo imposto,
utilizando o rendimento real após o lançamento do imposto. Em termos gráficos ter-se-
ia :
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Economia Pública
Variação compensadora = PtP 34)1( + ;
Variação equivalente = PtP 12)1( +
Verifica-se que a variação compensadora para uma descida nos preços é a
variação equivalente de um aumento nos preços. A variação equivalente de uma descida
de preços é a variação compensadora de um aumento dos preços.
Conclusão : Pode-se utilizar quer a variação compensadora quer a variação
equivalente na estimação da variação do bem-estar do lançamento do imposto.
Até este momento admitimos que a curva de oferta era horizontal e correspondia a
custos marginais constantes, consideremos agora a situação com custos marginais
crescentes.
4 – Carga excedentária com custos marginais crescentes
Considere-se a situação de custos marginais crescentes, situação em que a curva
da oferta terá inclinação crescente.
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Economia Pública
Considere-se um imposto sobre o bem X. Antes do imposto o preço é P0 e com o
imposto a curva da oferta desloca-se para ST. O produtor tem de aumentar o preço por
forma a pagar o imposto. O preço a que o consumidor procura a quantidade fornecida
após o lançamento do imposto é Pd e o preço a que o produtor oferece é PS. A diferença
vem : T = Pd – PS.
Como o preço pago pelo comprador varia dPd e o preço recebido pelo produtor
varia dPS, o imposto é suportado pelos consumidores e pelos produtores em função das
respectivas elasticidades procura/preço e oferta/preço.
As elasticidades da procura e da oferta vêm :
)0//()0/( pdPqqde ∂∂∂∂=
)0//()0/( psPqqse ∂∂∂∂=
Estas elasticidades podem ser reescritas da seguinte forma :
−∂∂=
0
0.0/PdP
Pqqde
−∂∂=
0
0.0/PSP
Pqqse
O preço do consumidor e do produtor pode assim ser definido por :
)0(00.pdeq
pqdP
+∂
=
)0(00.pseq
pqsP
+∂
=
Como se tem:
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Economia Pública
−∂=
−=
desedese
qpq
sPdPT
.00.0
Reescrevendo, temos :
desedese
Pq
Tq .).00(
−=∂
O custo do bem-estar do imposto unitário é :
−=
desedese
Pq
TW .).00(2
21
O custo do bem-estar do imposto ad valorem, com T=t.p vem:
−=dese
deepqTW s.).0.0(2
21
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Economia Pública
5 – Tributação óptima com lazer tributável e imposto sobre bens
Continuaremos a analisar a carga excedentária, desta vez recorrendo à tributação
óptima.
A tributação óptima é um corpo normativo da tributação que se preocupa com os
impostos que minimizem a perda de eficiência. Considere-se que o governo pretende
aumentar o seu rendimento através de um imposto sobre bens. Como se pode fixar um
imposto sem carga excedentária ? Existem 3 maneiras de fixar um imposto sem carga
excedentária: (i) lançar um imposto lump-sum; (ii) lançar um imposto sobre o lazer; (iii)
aplicar a regra de Ramsey.
Em princípio um imposto lump sum não possui carga excedentária. Acontece que
o lump sum é um conceito teórico quase nunca utilizado por ser altamente regressivo.
Temos assim que obter um imposto óptimo.
Considere-se a escolha entre lazer (L) e unidades do bem X.
O lançamento de um imposto neste contexto faz aumentar os preços dos bens (P1 e
PX devem estar situados acima dos respectivos custos marginais iniciais, cmg1 e cmgX).
A restrição orçamental vem : I = cmg1.L + CmgX.X, com I= rendimento total.
O imposto é lançado de forma a que os rácios de preços se mantenham constantes.
Considere-se que o governo aumenta os preços acima do custo marginal na taxa equi-
proporcional : P/cmg = I/(I-R). Nesta situação não existe carga excedentária porque não
se alteram as condições marginais, independentemente do sítio onde a curva de
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Economia Pública
indiferença for tangente à restrição orçamental. Se o lazer fosse tributável era possível
fixar impostos óptimos para a economia. O problema é que o lazer não é tributável.
6 – Tributação óptima com lazer não tributável : Preços de Ramsey
Quando o lazer não é tributável aplica-se a regra de Ramsey para obter impostos
óptimos.
Regra de Ramsey : Um aumento em todos os impostos na mesma proporção
induzirá uma diminuição proporcional na procura de todos os bens, desde que o
consumidor seja compensado de modo a que se mantenha na mesma curva de
indiferença.
Este resutado pode ser obtido quando as taxas de imposto são fixadas de forma
proporcionalmente inversa à elasticidade-preço da procura.
Considerem-se dois bens, X e Y. Para determinar estas taxas óptimas elas devem
ser fixadas de forma inversamente proporcional à elasticidade do preço. Considere-se
igualmente a carga excedentária de um imposto específico no bem X :
EBX = ½ .eX.PX.X.T2X
A carga excedentária do impos
EBY = ½ .eY.PY.Y.T2Y
Considerando que o Estado pr
é igual ao imposto lançado sobre o
bem Y : PY.Y.TY. Desta forma ob
imposto que se venha a obter pre
.eY.PY.Y.T2Y.
Legenda :
eX = elasticidade preço da procura compensada do bem X; PX = preço do bem X; X = quantidade consumida do bemX; TX = taxa de imposto do bem X.
to no bem Y é :
etende arrecadar o rendimento R que, por definição,
bem X : PX.X.TX ; mais o imposto lançado sobre o
tém-se : R = PX.X.TX - PY.Y.TY. Para qualquer
tende-se minimizar a soma ½ .eX.PX.X.T2X + ½
Prof. Carlos Barros 13
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Economia Pública
O problema vem:
Min (½ .eX.PX.X.T2X + ½ .eY.PY.Y.T2
Y);
sa : R = PX.X.TX - PY.Y.TY
Construindo a Lagrangeana temos :
L = ½ .eX.PX.X.T2X + ½ .eY.PY.Y.T2
Y + λ ( R = PX.X.TX - PY.Y.TY)
Calculando as condições de primeira ordem temos :
∂L/∂TX = eX.PX.X.TX - λ PX.X = 0;
∂L/∂TY = eY.PY.Y.TY - λ .PY.Y = 0;
Resolvendo o sistema obtém-se :
TX/TY = eY/eX
Esta expressão é designada regra da elasticidade inversa ou regra de Ramsey.
Esta regra diz que para minimizar a carga excedentária as taxa de imposto devem
ser fixadas de forma inversamente proporcional às elasticidades-preço dos bens. Nestas
condições a regra satisfaz a Regra de Ramsey.
Para minimizar a carga excedentária é preciso ter presente que esta é consequência
de distorções nas quantidades. Portanto, a redução proporcional de X deve ser igual à
redução proporcional de Y.
TX.eX = TY.eY
TX.[(∂q/qX)/TX] = TY.[(∂qY/qY)/TY]
Por isso é necessário que ∂qX/qX = ∂qY/qY
Vejamos uma situação em que se fixa o mesmo imposto para bens com diferentes
elasticidades.
Prof. Carlos Barros 14
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Economia Pública
Prof. Carlos Barros 15
Em termos gráficos tem-se para duas procuras compensadas de X e Y o mesmo
imposto, o que é um erro.
Verifica-se que os impostos sobre os bens aumentam com o aumento das elasticidades-
preço da procura. Assim, um impacto sobre X é óptimo se assegurar uma redução
proporcional da procura de X igual à redução proporcional da procura de Y.
Assim, no gráfico acima como as elasticidades são distintas e o imposto é o
mesmo, conclui-se que o rendimento podia ser obtido lançando um imposto sobre X
inferior, com vantagens em termos de carga excedentária. Como X tem menor
elasticidade deveria pagar um imposto superior ao Y com maior elasticidade.
Conclusão: è um erro lançar o mesmo imposto quando as elasticidades são distintas. A
taxa de imposto que minimiza a carga excedentária é fixada de forma inversamente
proporcional à elasticidade-preço.