AULA 1 - Direito Das Coisas 2015

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Universidade Estácio de Sá – 2015.1 Direito das Coisas: Aula 1 Fernanda Louro Atenção: este material é o nosso roteiro semanal de aula e não substitui a leitura da bibliografa indicada! Semana 1. Unidade 1. Direito das Coisas. Introdução Bibliografia indicada: TARTUCE, Flávio. Direito Civil, Vol. 4 - Direito das Coisas. Editora Gen / Método. MELO, Marco Aurélio Bezerra de. Direito das Coisas. Editora Lumen Juris (este livro está esgotado nas livrarias, mas vocês encontram nas bibliotecas). GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, vol. 5, Editora Saraiva. Conceito De acordo com Orlando Gomes: “O direito das coisas regula os poderes dos homens sobre os bens e os modos de sua utilização econômica”. Para Clóvis Beviláqua é “o complexo de normas reguladoras das relações jurídicas referentes às coisas suscetíveis de apropriação pelo homem”. Bem - para o direito das coisas - é coisa útil, suscetível de apropriação pelo homem, que tem conteúdo econômico. O nosso CC seguiu a mesma fórmula do CC/1916, atribuindo a denominação de Direito das Coisas para o Livro III. Já alguns autores, como Venosa e Nelson Rosenvald, preferem nomear esse estudo como Direitos Reais, seguindo a tradicional doutrina de Savigny, assim como a expressão das Ordenações Filipinas, para a qual Real seria todo direito que pertence ao rei, relativo à realeza. No Direito pátrio, real era todo direito designado de ônus reais (Lei 1.237, de 1864) e se caracteriza porque era ambulatório, passando a atingir o imóvel e o seu titular ou sucessor. Direito das Coisas x Direitos Reais O Direito das coisas não é sinônimo de Direitos Reais. O Direito das coisas é mais amplo. Abrange os direitos reais, o estudo da posse e os direitos de vizinhança, classificados como obrigações mistas ou propter rem. Embora exista dissídio doutrinário a respeito da natureza jurídica da posse, podemos perceber pela disposição dos Títulos do Livro III do CC/02, que este manteve a corrente articuladora do CC/16 e não inseriu a posse no rol de Direitos reais. Os Direitos Reais estão relacionados aos bens apropriáveis pelo homem que têm conteúdo econômico e possuem características especiais, que o diferem dos demais, como o absolutismo, a sequela e a taxatividade. Características Absolutismo ou oponibilidade erga omnis Os Direitos reais concedem ao seu titular verdadeira dominação sobre um objeto. E este poder de agir sobre a coisa pode ser arguido contra todos (erga omnes), pois são direitos que carregam sujeição universal ao dever de abstenção sobre a prática de qualquer ato capaz de interferir na atuação do titular sobre o objeto. Em suma, o titular do direito real pode exigir de todos “o dever geral de abstenção”. Significa o poder de agir sobre a coisa que pode ser imposto erga omnis, pois os direitos reais acarretam sujeição universal ao dever de abstenção sobre a prática de qualquer ato capaz de interferir nos direitos do titular sobre a coisa. É, inclusive, característica que difere os direitos reais dos direitos obrigacionais, que são marcados pela relatividade. Significa dizer que todos estão vinculados a não perturbar o exercício do direito real por seu titular. É totalmente o contrário do que ocorre no direito obrigacional, no qual o sujeito ativo somente pode exigir uma atuação do sujeito passivo com o qual possui vínculo jurídico, não sendo possível alcançar quem não faz parte dessa relação jurídica. Nesse ponto vale mencionar as duas teorias que tentam explicar a relação jurídica de direito real. A 1ª teoria é a teoria personalista, que parte da premissa que só existe relação jurídica entre pessoas (premissa kantiana). Logo, nos direitos reais, se estabelece uma situação em que o titular do direito real é o sujeito ativo e o sujeito passivo é a coletividade / a generalidade de pessoas que devem respeitar a sua titularidade. A 2ª teoria é a teoria realista, que compreende que o direito real é a relação jurídica entre a pessoa e a coisa. Nelson Rosenvald e Cristiano Chaves de Farias, assim como Caio Mario da Silva Pereira, adotam a teoria personalista, preferindo partir da premissa de que só existe relação jurídica entre pessoas. Logo, o sujeito ativo será o titular do direito real e o sujeito passivo será a generalidade anônima de pessoas. Os mesmo autores também destacam que a característica do absolutismo é a mesma compartilhada pelos direitos da personalidade, pois nestes o titular também tem como sujeito passivo toda a coletividade. Sequela. Significa dizer que os direitos reais aderem à coisa, sujeitando-se imediatamente ao poder de seu titular, com oponibilidade contra todos. É uma característica que decorre do absolutismo, já que a aderência faz com o que o seu titular possa perseguir a coisa em poder de terceiros, onde quer que ela se encontre. Ou seja, permite que o titular do direito real persiga a coisa onde quer que ela vá, podendo exigir de todos a abstenção ou mesmo retirando a coisa de quem violar o dever de abstenção.

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Universidade Estcio de S 2015.1

Direito das Coisas: Aula 1 Fernanda LouroAteno: este material o nosso roteiro semanal de aula e no substitui a leitura da bibliografa indicada!

Semana 1. Unidade 1. Direito das Coisas. Introduo

Bibliografia indicada:TARTUCE, Flvio. Direito Civil, Vol.4 - Direito das Coisas. Editora Gen / Mtodo.

MELO, Marco Aurlio Bezerra de. Direito das Coisas. Editora Lumen Juris (este livro est esgotado nas livrarias, mas vocs encontram nas bibliotecas).

GONALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, vol. 5, Editora Saraiva.

ConceitoDe acordo com Orlando Gomes: O direito das coisas regula os poderes dos homens sobre os bens e os modos de sua utilizao econmica. Para Clvis Bevilqua o complexo de normas reguladoras das relaes jurdicas referentes s coisas suscetveis de apropriao pelo homem.Bem - para o direito das coisas - coisa til, suscetvel de apropriao pelo homem, que tem contedo econmico.O nosso CC seguiu a mesma frmula do CC/1916, atribuindo a denominao de Direito das Coisas para o Livro III. J alguns autores, como Venosa e Nelson Rosenvald, preferem nomear esse estudo como Direitos Reais, seguindo a tradicional doutrina de Savigny, assim como a expresso das Ordenaes Filipinas, para a qual Real seria todo direito que pertence ao rei, relativo realeza.No Direito ptrio, real era todo direito designado de nus reais (Lei 1.237, de 1864) e se caracteriza porque era ambulatrio, passando a atingir o imvel e o seu titular ou sucessor.

Direito das Coisas x Direitos ReaisO Direito das coisas no sinnimo de Direitos Reais. O Direito das coisas mais amplo. Abrange os direitos reais, o estudo da posse e os direitos de vizinhana, classificados como obrigaes mistas ou propter rem. Embora exista dissdio doutrinrio a respeito da natureza jurdica da posse, podemos perceber pela disposio dos Ttulos do Livro III do CC/02, que este manteve a corrente articuladora do CC/16 e no inseriu a posse no rol de Direitos reais.Os Direitos Reais esto relacionados aos bens apropriveis pelo homem que tm contedo econmico e possuem caractersticas especiais, que o diferem dos demais, como o absolutismo, a sequela e a taxatividade.

Caractersticas

Absolutismo ou oponibilidade erga omnis

Os Direitos reais concedem ao seu titular verdadeira dominao sobre um objeto. E este poder de agir sobre a coisa pode ser arguido contra todos (erga omnes), pois so direitos que carregam sujeio universal ao dever de absteno sobre a prtica de qualquer ato capaz de interferir na atuao do titular sobre o objeto.

Em suma, o titular do direito real pode exigir de todos o dever geral de absteno.

Significa o poder de agir sobre a coisa que pode ser imposto erga omnis, pois os direitos reais acarretam sujeio universal ao dever de absteno sobre a prtica de qualquer ato capaz de interferir nos direitos do titular sobre a coisa.

, inclusive, caracterstica que difere os direitos reais dos direitos obrigacionais, que so marcados pela relatividade.

Significa dizer que todos esto vinculados a no perturbar o exerccio do direito real por seu titular.

totalmente o contrrio do que ocorre no direito obrigacional, no qual o sujeito ativo somente pode exigir uma atuao do sujeito passivo com o qual possui vnculo jurdico, no sendo possvel alcanar quem no faz parte dessa relao jurdica.

Nesse ponto vale mencionar as duas teorias que tentam explicar a relao jurdica de direito real.

A 1 teoria a teoria personalista, que parte da premissa que s existe relao jurdica entre pessoas (premissa kantiana). Logo, nos direitos reais, se estabelece uma situao em que o titular do direito real o sujeito ativo e o sujeito passivo a coletividade / a generalidade de pessoas que devem respeitar a sua titularidade.A 2 teoria a teoria realista, que compreende que o direito real a relao jurdica entre a pessoa e a coisa. Nelson Rosenvald e Cristiano Chaves de Farias, assim como Caio Mario da Silva Pereira, adotam a teoria personalista, preferindo partir da premissa de que s existe relao jurdica entre pessoas. Logo, o sujeito ativo ser o titular do direito real e o sujeito passivo ser a generalidade annima de pessoas.

Os mesmo autores tambm destacam que a caracterstica do absolutismo a mesma compartilhada pelos direitos da personalidade, pois nestes o titular tambm tem como sujeito passivo toda a coletividade.

Sequela.

Significa dizer que os direitos reais aderem coisa, sujeitando-se imediatamente ao poder de seu titular, com oponibilidade contra todos. uma caracterstica que decorre do absolutismo, j que a aderncia faz com o que o seu titular possa perseguir a coisa em poder de terceiros, onde quer que ela se encontre.

Ou seja, permite que o titular do direito real persiga a coisa onde quer que ela v, podendo exigir de todos a absteno ou mesmo retirando a coisa de quem violar o dever de absteno.

Exemplo: imvel gravado com hipoteca

Difere do direito obrigacional, em que no h o atributo da sequela, j que a prestao s se dirige ao seu titular e a mais ningum.

Preferncia

Est relacionada aos direitos reis de garantia. Confere um privilgio ao seu titular, em obter o pagamento de um dbito com o valor do bem aplicado exclusivamente a sua satisfao.

Se houver diversos credores concorrendo para o recebimento do crdito sobre este bem, a coisa dada em garantia subtrada da execuo coletiva, pois o titular do direito real de garantia tem preferncia em relao aos demais credores.

consequncia da sequela.

No caso de vrias hipotecas sobre o mesmo imvel (art. 1.476, CC) aplica-se o princpio prior tempore potior jure (primeiro no tempo, melhor no direito), prevalecendo o crdito para aquele que registrou o direito real com antecedncia, na ordem crescente de preferncias.

Exclusividade

No pode haver direito real de igual contedo sobre o mesmo bem. No possvel instalar um mesmo direito real onde outro j existe.

Obs: 1 - essa caracterstica no afeta o condomnio (onde cada um proprietrio de sua proporo ideal, distinta e exclusiva).

2 tambm no afeta o usufruto, no qual o usufruturio tem direito aos frutos e o nu-proprietrio conserva o direito substncia da coisa.

Taxatividade

Os direitos reais so numerus clausus, isto , de enumerao taxativa.

A autonomia privada, por si, no pode conceber direitos reais, pois estes apenas existiro, se houver previso legal, ou seja, se houver norma disciplinando, dependendo-se de atuao legislativa.

Por exemplo, o art. 1225 e leis especiais (como a Lei 9.514/97 alienao fiduciria de bem imvel).

- a taxatividade tem a ver com a segurana jurdica, de manter intocado o poder sobre a coisa, podendo sofrer apenas as restries previstas na lei.

- CC/02: inovou no rol de direitos reais, mas no criou novos direitos reais, pois j eram previstos em leis especiais, p. ex. D. de superfcie: Lei 10.257/2001; promessa de compra e venda (art. 1.361) e propriedade fiduciria (art. 1.417): DL 58/37, Lei 6.766/79 e DL 911/69; concesso especial para fins de moradia (Lei 11.481/2007): CRFB, art. 183, 1; MP 2220/2001, art. 56 do Est. Cidade; art. 167 Lei 6.015/73; e concesso de direito real de uso: DL 271/67.

- comparao com direitos obrigacionais: numerus apertus

Os Direitos reais e os Direitos obrigacionaisOs Direitos Reais tambm no se confundem com os direitos obrigacionais. O estudo comporta distines e tambm semelhanas, a seguir listadas.

Distines:Direitos reaisDireitos obrigacionais

Objeto a coisa (o bem sob o qual o sujeito exerce sua ingerncia econmica)Objeto a prestao

Absoluto (erga omnes)Relativo

Vincula o titular coisaVincula credor e devedor

S. P. universal / indeterminadoS.P. determinado

Coisa o objeto imediatoA coisa o objeto mediato

Relao perptuaRelao transitria

Direito de sequelaA nica garantia o patrimnio do devedor

Numerus claususNumerus apertus

Semelhanas:Direitos reais podem nascer de negcios jurdicosAlguns direitos reais so criados para aumentar a eficcia dos direitos obrigacionaisTambm nas relaes de direitos reais existem obrigaes para as partes (ex: usufruturio dever de conservar a coisa)Alguns direitos obrigacionais possuem eficcia real (ex. contrato de locao averbado no R.I. art. 8, Lei 8.245/91)

Classificao

D. reais sobre coisa prpria: em geral, pleno e ilimitado. Ex: propriedade.

D. reais sobre coisa alheia: limitados e submetidos aos princpio da elasticidade (transitrios).

Desdobram-se da matriz, que a propriedade, permitindo que uma outra pessoa titularize direito real sobre a coisa.

Quando se extingue, o poder retorna para as mos do titular do direito de propriedade em virtude do princpio da consolidao.

De gozo ou fruio: servido, usufruto, concesso especial;De garantia: penhor, hipoteca, alienao fiduciria;De aquisio: promessa de compra e venda irretratvel

Figuras hbridas:

Obrigao proporter rem (ob rem / mista / ambulatria)

uma obrigao imposta em relao a uma certa coisa que recai necessariamente sobre quem tem a sua titularidade.A mera titularidade de um direito real importar a assuno de obrigaes desvinculadas de qualquer manifestao de vontade do sujeito.Significa que se voc titular, voc devedor. Dizem das obrigaes propter rem que o titular s fica vinculado s obrigaes constitudas na vigncia de seu direito. Essa caracterstica, no entanto, sofre restries da prpria lei, como por exemplo no que diz respeito ao adquirente de unidade autnoma de condomnio, que se responsabiliza por todo o dbito das cotas condominiais do seu antecessor (art. 4, Lei 4.591/64).Ele afetado ao tempo em que a obrigao se constituiu. O devedor responde com todo o seu patrimnio.Ex: obrigao do condmino de contribuir para a conservao da coisa comum; de pagar os impostos alusivos propriedade; os direitos de vizinhana; obrigao de respeitar a conveno do condomnio.nus reais: So obrigaes que limitam a fruio e a disposio de um direito real.Constitui gravame ou direito oponvel erga omnes, como na renda constituda sobre imvel. Acompanha a coisa, so ambulatrias. Por isso se diz que o encargo da coisa e no do seu titular. Por isso, s atingido no limite do valor do bem, pois a garantia real implica a sua responsabilidade por uma dvida da prpria coisa. O titular da coisa fica obrigado mesmo se no foi quem imps o nus real, p. exemplo, a servido, a hipoteca, o penhor. Ver art. 1.345.A distino entre nus real e obrigao propter rem controvertida, podendo ser apontadas as seguintes distines (Carlos R. Gonalves):- a responsabilidade pelo nus real limitada ao bem onerado, no respondendo o proprietrio alm dos limites do respectivo valor, pois a coisa que se encontra gravada; Na obrigao propter rem o devedor responde com todos os seus bens ilimitadamente, pois ele quem est vinculado;- o nus real desaparece, perecendo o objeto. J os efeitos da obrigao propter rem podem permanecer;- no nus real a ao cabvel tem natureza real (in rem scriptae), nas obrigaes propter rem, a ao pessoal.

Obrigao com eficcia realNem todos os ttulos levados a registro geram direitos reais. Existem direitos obrigacionais que quando levados ao registro, adquirem eficcia real, mas no se converte em direito real propriamente, justamente porque os direitos reais se submetem ao princpio da taxatividade.Apesar disso, pode-se dizer que certas obrigaes, decorrentes de uma relao contratual, existe a possibilidade de se alcanar uma eficcia real, uma dimenso real por fora de lei. Isso ocorre quando se confere publicidade a essa obrigao, como, por exemplo na relao locatcia, nos arts. 8 e 33 da Lei 8.245/91.Outras hipteses em que o registro confere eficcia real a um direito obrigacional, sem criar direito real:- clausulas de inalienabilidade; impenhorabilidade e incomunicabilidade;- o registro da penhora no processo civil de execuo;