Aula 01 - Introdução à Teologia Do Culto Cristão

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    Introdução à teologia do culto cristão

    Aula preparada por: Vinicius Couto

    APRESENTAÇÃO

    A proposta desta aula é introduzir o estudante de teologia do culto cristão na

    compreensão dos significados básicos da disciplina, a fim de deixa-lo apto para os

    conceitos e assuntos afins que serão posteriormente abordados.

    OBJETIVOS

    Compreender o significado das terminologias culto, religião, liturgia, adoração e

    igreja em seus sentidos etimológicos e hodiernos.

    O QUE QUER DIZER CULTO CRISTÃO

    A definição de “culto cristão” não é tão simples de se fazer, segundo comenta

    James White.1 Uma das dificuldades reside no fato de ser extremamente fácil de se

    confundir tal culto com acréscimos irrelevantes das culturas hodiernas e até mesmo

    anteriores, celebradas por cristãos.

    Qual é o significado de culto? Qual a diferença do conceito dessa expressão e de

    atividades que se repetem nas comunidades cristãs? Quais são as distinções entre

    culto e educação cristã? O que torna o culto, de fato, cristão? Tais problemas

    perpassam a disciplina da teologia do culto cristão e não se limitam a esses

    questionamentos. White ainda acrescenta: “será sempre ‘cristão’ todo culto celebrado

    pela comunidade cristã?”.2 

    Para trazer as respostas certas às perguntas anteriormente levantadas, é precisorealizar uma abordagem fenomenológica do culto cristão, relatando e descrevendo o

    que os cristãos em geral fazem quando se reúnem para realizarem o culto. É

    conveniente, para elucidar as respostas, explorar algumas definições de maior

    abstração, utilizadas pelos pensadores cristãos. Finalmente, é mister examinar

    algumas palavras-chave que definem e exprimem o verdadeiro significado de culto.

    Em relação à fenomenologia do culto cristão, haverá outras aulas que trarão à

    tona assuntos mais diretos. Trata-se de estudar o que ocorreu em diferentes culturas e

    1 WHITE, James F. Introdução ao Culto Cristão. São Leopoldo: Sinodal, 1997, p. 11.2 Idem.

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    épocas históricas, avaliando as práticas e as formas estáveis e permanentes. Esse

    método será aplicado no decorrer dos próximos ensaios, visto que não é possível

    abordar em uma única aula toda a densa fenomenologia do culto cristão.

    Sobre o aspecto de definição, serão utilizados autores de diversas linhas do

    protestantismo e do evangelicalismo, bem como do catolicismo para fins de estudos

    comparativos e de estímulo à reflexão acerca das concepções amplamente adotadas.

    Perceber-se-á que existirão pensamentos convergentes e que se sobrepõe, mas, em

    outros casos serão nítidas percepções peculiares e às vezes complementares.

    Nesta primeira aula, o ensaio deter-se-á em analisar alguns dos principais termos

    ou palavras-chave utilizadas em comum dentro do vasto campo dos cristianismos. O

    foco inicial se dará em torno das expressões culto, religião e liturgia, pois se tratam de

    palavras rotineiras e que compõem basicamente a abordagem introdutória da teologia

    do culto cristão.

    O SIGNIFICADO DE CULTO

    A palavra “culto”  deriva do latim, cultu, cujo significado é adoração ou

    homenagem. Tais atos são devidos, do ponto de vista cristão, a Deus.

    Etimologicamente falando, o termo latino supracitado envolve a raiz colo  ou colere,

    que indica, além de honrar, o sentido de cultivar.

    Culto também é uma derivação de religião. Cicero, filósofo do primeiro século

    antes de Cristo e que foi declarado como um pagão justo pela igreja Católica, descrevia

    “religião” como oriunda da palavra latina relegere, cujos significados eram reler, fazer

    algo a mais, observar com cuidado, processo contínuo, e finalmente, como uma

    observação diligente de todos os pertences utilizados para venerar os deuses.3 

    Na era cristã, um dos primeiros a fazer uso da expressão “religião”, foi o jurista,

    escritor e gramático latino, Aulo Gélio. Ele fazia uso do verbo relinquere, indicando que

    tudo o que é pertencente à religião deve ser colocado à parte. Gélio mostra o sentido

    de sagrado da religião, trazendo um confronto entre o profano e o santo, bem como a

    ideia de secular e o santificado.4 

    A última variação latina da palavra “religião” é encontrada nos escritos do

    conselheiro do imperador Constantino I, Lactâncio. Em sua obra Divinia Instituitiones 

    (Instituições Divinas), ele se baseou na palavra religare, que trouxe para a “religião” o

    sentido de vincular o ser humano a Deus, ou seja, uma religação.5 

    3

     CÍCERO. De Natura Deorum (Sobre a Natureza dos deuses), II, 28.4 GÉLIO. Noctes Atticae (Noites Áticas), IV, 9.5 LACTÂNCIO. Divinia Instituitiones, N, 28.

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    Neste último ponto, cabe a explicação agostiniana. Sua contribuição para o

    entendimento mais exato do sentido de religião nos primeiros séculos é bastante

    relevante. Ele usou o verbo re-eligere, com o intuito de dizer que em Cristo nós re-

    elegemos a Deus, de quem a humanidade se perdeu em virtude do pecado.6 

    O pensamento reformado complementou o significado de “religião” e trouxe o

    sentido de recta verum Deum cognoscendi et colendi ratio  (a maneira correta de

    conhecer e servir ao Deus verdadeiro). Havia uma distinção mais tênue dos

    reformadores para com a religião no sentido de trazer à tona dois outros recursos: a

    piedade e a adoração.

    Para Zwinglio, por exemplo, a piedade envolve a fé, vida, leis, ritos e

    sacramentos. Ele definia como o casamento entre a alma humana e Deus. Em Calvino

    são encontrados três conceitos-chave: a) o conhecimento de Deus e o sentido de Seus

    atributos; b) O conhecimento é quem ensina a piedade, ou a reverência somada com oamor de Deus; c) Em sentido de adoração e devoção, é oriunda da piedade.7 

    CULTO E RELIGIÃO

    As palavras “culto” e “religião” também ocorrem na Bíblia. O povo de Israel

    deveria guardar a prática cultual quando entrasse na terra prometida (Êx 12.25). A

    palavra culto neste texto é abodah e seu significado é serviço. Este serviço não dizia

    respeito exclusivamente ao serviço sagrado, mas a qualquer tipo de trabalho,conforme se pode ver em Lv 23.7,8.

    No Novo Testamento o sentido não é diferente. Paulo, por exemplo, fala aos

    Romanos sobre a relação detentora dos judeus para com o culto (Rm 9.4) e do culto

    racional (Rm 12.1). E o autor da carta aos hebreus fala de um culto divino contido na

    primeira aliança (Hb 9.1). Em todos esses casos, a palavra grega utilizada é latreia,

    cujos significados são serviço e adoração.

    Latreia deriva-se de latreuó, que tem o sentido de servir ou realizar um serviço

    ou uma tarefa técnica ou aceitável a Deus. Latreuó pode ser encontrada em passagens

    como Mt 4.10; Lc 1.74; 2.37; 4.8; At 7.7; 7.42; 24.14; Rm 1.9, 25; Fp 3.3; 2 Tm 1.3; Hb

    8.5; 9.9, 14 e Ap 7.15; 22.3.

    Já a palavra “religião” só vai aparecer traduzida, isso por ter um uso mais

    frequente próximo da era cristã, no Novo Testamento. Tal palavra vai aparecer em

    Atos 26.5 quando Paulo, em sua defesa ao rei Agripa, fala que foi um religioso fariseu

    6

     AGOSTINHO. De Civitae Dei (A Cidade de Deus), X, 4.7 BAVINCK, Herman. Reformed Dogmatics: Prolegomena, Vol I. Grand Rapids: Baker Academic, 2003, p.241.

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    altamente praticante dos princípios religiosos. A palavra usada neste texto é threskéia 

    e seu significado corresponde ao ritual de adoração, reverência e adoração aos deuses

    e adoração expressa em atos ou em serviços. A mesma palavra ocorre em Colossenses

    2.18, quando Paulo adverte acerca da falácia de adoração angelical e nas críticas de

    Tiago em 1.26,27 sobre a verdadeira religião.

    CULTO E LITURGIA

    Outra palavra que ocorre na Bíblia e que se relaciona com todas as outras já

    abordadas é liturgia. Ela aparece em Lucas 1.23, quando Zacarias, pai de João Batista,

    estava realizando seu serviço sacerdotal. A palavra grega no texto citado é leitourgias.

    Seu significado é semelhante aos demais estudados: serviço público, pastoral, ou ritual

    levítico. Essa palavra também vai aparecer em 2 Co 9.12; Fp 2.17, 30 e Hb 8.6; 9.21,além de ocorrer em sua forma derivada leitourgos nas passagens de Rm 13.6; 15.16,

    27; Fp 2.25 e Hb 1.7; 8.2.

    Liturgia significa, de acordo com Mondoni, “ao mesmo tempo, ação do povo e

    ação em favor do povo”.8 A liturgia eclesial é o culto oficial da Igreja e a forma pela

    qual o serviço de Cristo em favor dos seres humanos é materializado. A espiritualidade

    litúrgica é “a atitude permanente ou estilo de vida cristã baseado na assimilação do

    ministério de Cristo e na identificação de vida com ele”, bem como “o substrato

    comum de qualquer espiritualidade cristã”.9 

    Costa, por sua vez, declara que,

    A liturgia é o serviço religioso de adoração ao Deus triúno. Portanto,

    não pode haver culto sem liturgia; nem liturgia sem culto, pois, culto

    é serviço religioso, e serviço religioso é liturgia. Logo, culto é liturgia!

    Deste modo, não devemos falar, como acontece com tanta

    frequência, de ‘liturgia do culto', isto é um exercício tautológico

    desnecessário e, pior, empobrecedor do significado do culto.10 

    Como se pode perceber, o culto está diretamente relacionado ao significado de

    liturgia. Apesar de, etimologicamente falando, as palavras gregas latreia, threskéia e

    leitourgia  possuírem todas o mesmo sentido (serviço), os significados modernos de

    culto, liturgia e religião passaram a ter direções diferentes. O primeiro está relacionado

    8 MONDONI, Danilo. Teologia da Espiritualidade Cristã. São Paulo: Edições Loyola, 2002, p. 139.

    9

     Ibid, p. 142.10 COSTA, Hermisten M.P. Princípios Bíblicos-Reformados da Adoração Cristã. São Paulo: Cultura Cristã,2002, p. 33.

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    ao ajuntamento de pessoas para a adoração, enquanto o segundo tem a ver com a

    denominação religiosa que determinada pessoa é filiada. A terceira diz respeito ao

    andamento do culto ou com os elementos que irão compô-lo. Em tal sentido, seria

    correto dizer que, na liturgia do culto teria oração, pregação, louvores, etc.

    O QUE É “ADORAÇÃO” 

    Adoração é uma expressão bastante extensa no contexto bíblico, porém, o

    conceito mais usual é o de serviço. Etimologicamente falando, adoração será

    encontrada sob as indicações ablôdha, no hebraico, e latreia, no grego, cujos

    significados se resumem no trabalho realizado pelos escravos ou empregados.

    A adoração está associada à reverência, admiração e respeito, cujas expressões

    originais da Bíblia são hishtaha wâ  (hb.) e  proskyneo (gr.). Tais palavras significam

    literalmente a atitude de se prostrar ou de se curvar. Em outras palavras, a adoração,

    pode ser conceituada como o serviço prestado a Deus e ao semelhante. Reverência

    não necessariamente diz respeito a silenciar-se, mas ao reconhecimento e honra dada

    a outrem.

    O reconhecimento pode envolver o estado de humilhação de quem pratica a

    reverência, bem como o estado de exaltação prestada a que é reverenciado. Trata-se

    de reconhecer a posição de inferior em relação a quem é adorado. O reconhecimento

    pode, ainda, envolver a gratidão pelas obras graciosas praticadas pelo serreverenciado. Neste aspecto, pode-se destacar a obra de salvação, as constantes

    capacitações, os inúmeros livramentos, bem como a transcendência e imanência

    divina.11 

    Adoração, portanto, partindo de uma cosmovisão cristã, trata-se de atitudes

    inteligíveis e não uma meditação que faz com que o "adorador" entre num transe para

    o ser "adorado". O sentido hodierno do termo "adoração" em português tomou um

    rumo assimilado pelo idioma inglês, worship, cujo significado transcende a ideia de

    serviço e catalisa mais o sentido de "atribuir mérito ou valor" a alguém.

    Ralph Martin corrobora com essa colocação quando observa que adoração é, em

    si, uma palavra nobre. Ele explica que o termo português deriva, conforme explicado

    acima, da palavra Anglo-Saxônica, weorthscipe, que por sua vez desenvolveu-se para

    worthship, até chegar, finalmente, em worship.12  As duas primeiras expressões

    possuem o prefixo worth, que dá a ideia de atribuir valor a algo ou alguém. Entretanto,

    no sentido religioso, a palavra toma uma conotação de valor supremo.

    11

     PAES, Carlito; COSTA, Sidney. Ministério de Adoração na igreja contemporânea. São Paulo: Vida, 2003,pp. 26,27.12 MARTIN, Ralph P. Adoração na Igreja Primitiva. São Paulo: Vida, 1982, p. 14.

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     Outro paradigma relacionado à expressão "adoração" diz respeito à

    musicalidade. Há uma ligação não correta de que adorar é cantar ou louvar. A

    adoração tem a ver, conforme se percebe em sua etimologia, um serviço contínuo

    para Deus. Tal serviço pode e deve ser desenvolvido dentro e fora dos templos.13 

    O QUE É “IGREJA” 

    A palavra “igreja”, tal qual é usada hoje, é amplamente identificada com o local

    em que os cristãos se reúnem para a adoração coletiva. Esse significado deriva da

    etimologia germânica, através das quais as palavras kirche, church e kerk , derivadas do

    grego tardio, kiriakón, significavam “Casa do Senhor”. No Novo Testamento, a palavra

    usada para se referir a “igreja” é ekklêsía, e seus significados usuais compõem: a) uma

    comunidade local; b) uma comunidade espiritual e c) uma assembleia litúrgica.

    14

     

    Partindo de tais pressupostos, é correto dizer que a igreja possui dupla natureza:

    uma natural e uma espiritual, uma visível e uma invisível, uma material e outra mística.

    Ela é ao mesmo tempo “universal” e “particular”, dialética esta que pertence e

    percorre sua essência. Nos parágrafos abaixo serão vistas as opiniões teológicas de

    Lutero, Zwinglio, Calvino e Wesley a respeito desse assunto.

    Lutero enxergava a Igreja como dotada de duas naturezas, uma espiritual e outra

    física. No primeiro sentido ele a via como “uma assembleia de corações em uma única

    fé”, ou seja, um corpo espiritual formado pelos salvos. No sentido físico, ele entendia

    como sendo a igreja visível e que não necessariamente incluía somente os salvos, mas

    sendo formada por joio e trigo. Além disso, ele dizia sobre seu caráter não

    institucional. Para ele, a Igreja é o povo de Deus, um corpo de cristãos, santos e

    ovelhas.15 

    A visão de Zwinglio não difere do que foi analisado anteriormente. Ele escreveu

    uma série de artigos que são considerados o primeiro tratado de confissão

    protestante, por abordar alguns princípios basilares do movimento protestante que

    teve seu start up na Alemanha com Lutero. Em seu oitavo artigo ele disse que, “todosos que permanecem no cabeça são membros e filhos de Deus, e tal é a igreja ou a

    comunhão dos santos, a noiva de Cristo, Ekklesia catholica”.16 

    Para Calvino, a igreja é a mãe de todos os cristãos, a escola de Deus, o

    reformatório divino, a coluna e baluarte da verdade. Ele enxergava grande importância

    na participação do cristão em uma comunidade visível, pois nesta vida, o local de

    13 PAES, Carlito; COSTA, Sidney. Op. Cit., pp. 27-33.

    14 HACKMANN, Geraldo Luiz Borges. A Amada Igreja de Jesus Cristo: manual de eclesiologia como

    comunhão orgânica. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2003, p. 29.15 BAYER, Oswald. A teologia de Martim Lutero. São Leopoldo: Sinodal, 2007, pp. 185-200.16 GEORGE, Timothy. Teologia dos Reformadores. São Paulo: Vida Nova, 1993, pp. 138-140.

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    membro do corpo de Cristo não precisava se importar com obras. Sua crítica apontava

    para uma fé auto enganadora e superficial. Tal fé, na teologia Tiaguina, não passa de

    algo sem vida e incapaz de glorificar a Deus (Tg 2.14-19).

    O mesmo assunto percorre a teologia paulina, bem como os ensinos Jesuíticos.

    Paulo argui que as obras devem ser feitas com amor e que de nada adianta fazer o

    bem com fingimento ou por interesses (Rm 12.9; 1 Co 13. 1-3; 2 Co 6.6). Ele próprio

    assevera a salvação mediante a graça, mas ao mesmo tempo revela a necessidade de

    haver boas obras (Gl 2.8-10). Não obstante, o pensamento petrino também não fica de

    fora desse contexto. Ele exorta seus leitores a praticarem a fraternidade com um

    coração puro e sem fingimento ou hipocrisia (1 Pe 1.22).

    Os pensamentos apostólicos até aqui expostos são intensamente validados pelos

    ensinos de Jesus, que era completamente contra a ideia de se auto promover quando

    se ajudava alguém. De acordo Cristo, o que a mão direita faz, a esquerda não precisasaber e vice-versa. Para Ele, todas as 613 leis no Antigo Testamento, 20  podiam ser

    sintetizadas em apenas outros dois: amar a Deus de toda força, alma e entendimento e

    amar ao próximo como alguém ama a si mesmo.

    A ADORAÇÃO E A COLETA

    A adoração possui, inequivocamente, seu lado transcendental e místico. Não há

    como desassociar tal ideia do culto cristão, afinal, “Deus [é] Espírito, e importa que osque o adoram *o+ adorem em espírito e em verdade” (Jo 4. 24).  Apesar disso, a Igreja

    também possui uma realidade material e física.

    Por mais que sejam enfatizadas a espiritualidade e transcendência do

    relacionamento Deus-homem e homem-Deus, há uma natureza indissociável do

    mundo presente, que não pode arrematar a Igreja para uma Shangri-la espiritual ou

    para um universo de beatitude, comodidade e prazer imaculado.

    Conforme a exposição do presente ensaio pode-se concluir que, a adoração

    envolve um lado espiritual, devido a Deus, mas também envolve uma faceta natural

    que se ajusta às necessidades humanas coletivas e individuais, através das quais é

    gerada uma responsabilidade social de adoração.

    Ainda na dicotomia da adoração, outra área que figura a ação adoradora

    encontra-se nas contribuições financeiras. Num primeiro instante, ela aborda o

    reconhecimento e ação de graças ao Deus que tem sustentado a agido

    20

     A tradição judaica chama os 613 mandamentos da Torá, isto é, dos livros da Lei (os primeiros cincolivros da Bíblia Cristã  –  Gênesis, Êxodo, Levítico e Deuteronômio), de Taryag mitzvot  sendo queTaRYaG,é um acrônimo do valor numérico "613.

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    provisionalmente em cada detalhe da vida humana. Numa segunda abordagem, ela

    atua na mordomia cristã em favor dos necessitados.

    Nos primeiros séculos da era cristã, houve uma sincera preocupação com a área

    social da igreja. As viúvas e órfãos não podiam ser esquecidos. Mas o agir social não se

    limitava a essas áreas. As coletas deveriam demonstrar a solicitude cristã para os que

    estavam passando alguma necessidade. Sobre isso, Martin comenta:

    O objeto da contribuição da igreja de Corinto foi aliviar os “santos”

    (i.é, cristãos judaicos) pobres em Jerusalém, conforme omanos 15:26

    os descreve. Alguns anos antes de escrever 1 Coríntios, Paulo

    aceitara certa medida de responsabilidade pela igreja em Jerusalém,

    assolada pela pobreza (Atos 11:27-30); e, depois disto concordara em

    “lembrar-se“ destes irmãos crentes necessitados, e levar a sua

    contínua petição por ajuda diante das igrejas gentias que

    estabelecera sob a orientação de Deus (Gálatas 2:10).21 

    Na parábola do bom samaritano, apesar de não haver uma instrução para a

    coleta de contribuições, a ilustração maestral sobre a ajuda ao próximo é feita como

    uma resposta para o questionamento de um líder religioso da época. A ideia de tal

    proponente do farisaísmo era colocar Jesus a uma exposição vexatória, com o intuito

    de colocar o Cristo como alguém inferior no sentido epistemológico da Lei levítica. O

    representante religioso mostrou, para sua própria ignomínia, que deve-se ajudar o

    próximo. Ao ouvir tais palavras, Jesus o desafiou: “faça isso” (cf Lc 10.27), como que

    dizendo que havia um contraste entre sua epistemologia e práxis.22 

    CONSIDERAÇÕES FINAIS

    Através dessas primeiras definições, o estudante da teologia do culto cristão

    poderá estar munido do conhecimento básico e necessário para seguir com os dados

    posteriores. A compreensão do significado etimológico de culto, religião e liturgia

    demarca o ponto de partida.

    As próximas aulas se darão em torno dos aspectos litúrgicos na histroriografia

    eclesiástica, passando pelo primitivismo, escolasticismo, protestantismo,

    wesleyanismo, pentecostalismo, neopentecostalismo e novos movimentos inseridos

    no cristianismo.

    21

     KAY, J. Alan. Op. Cit., p. 91, 92.22  HENDRIKSEN, Willian. Comentário do Novo Testamento: Lucas, volume 2. São Paulo: Cultura Cristã,2003, pp. 88-96.

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    Haverá, ainda, abordagens relacionadas às fundamentações sistemáticas e

    práticas do culto cristão com um foco mais direto na reforma protestante e no

    metodismo primitivo. Para o desfecho dessa disciplina serão abordados os principais

    desafios contemporâneos que a pregação expositiva, a musicalidade cristã, bem como

    a missiologia enfrentam no contexto da pós-modernidade.

    BIBLIOGRAFIA

    AGOSTINHO. De Civitae Dei .

    BAVINCK, Herman. Reformed Dogmatics: Prolegomena, Vol I. Grand Rapids: BakerAcademic, 2003.

    BAYER, Oswald. A teologia de Martim Lutero. São Leopoldo: Sinodal, 2007.

    BURTNER, Robert W.; CHILES, Robert. E. (org.). Coletânea da Teologia de João Wesley .Rio de Janeiro: Colégio Episcopal, 1995.

    CALVINO, João. Institutas.

    CÍCERO. De Natura Deorum.

    COSTA, Hermisten M.P. Princípios Bíblicos-Reformados da Adoração Cristã. São Paulo:Cultura Cristã, 2002.

    GÉLIO. Noctes Atticae.

    GEORGE, Timothy. Teologia dos Reformadores. São Paulo: Vida Nova, 1993.

    HACKMANN, Geraldo Luiz Borges. A Amada Igreja de Jesus Cristo: manual deeclesiologia como comunhão orgânica. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2003.

    HENDRIKSEN, Willian. Comentário do Novo Testamento: Lucas, volume 2. São Paulo:Cultura Cristã, 2003.

    KAY, J. Alan. The Nature of Christian Worship. Londres: Epworth Press, 1953.

    LACTÂNCIO. Divinia Instituitiones.

    MARTIN, Ralph P. Adoração na Igreja Primitiva. São Paulo: Vida, 1982, p. 14.

    MONDONI, Danilo. Teologia da Espiritualidade Cristã. São Paulo: Edições Loyola, 2002.

    PAES, Carlito; COSTA, Sidney. Ministério de Adoração na igreja contemporânea. SãoPaulo: Vida, 2003.

    WHITE, James F. Introdução ao Culto Cristão. São Leopoldo: Sinodal, 1997.