Aspectos históricos e políticos da expansão dos pólos ... · In this context, the State of Mato...

21
Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural 1 ASPECTOS HISTÓRICOS E POLÍTICOS DA EXPANSÃO DOS PÓLOS AGROINDUSTRIAIS DA CANA-DE-AÇÚCAR NO ESTADO DE MATO GROSSO, BRASIL [email protected] APRESENTACAO ORAL-Evolução e estrutura da agropecuária no Brasil REGINA MARIA DA COSTA; RODRIGO NEI CHRYSOSTHEMOS; FRANCISCO JOSE DA COSTA ALVES. UFSCAR, SÃO CARLOS - SP - BRASIL. Aspectos históricos e políticos da expansão dos pólos agroindustriais da cana-de-açúcar no Estado de Mato Grosso-Brasil Grupo de Pesquisa: Evolução e estrutura da agropecuária no Brasil Resumo O incremento de tecnologias tanto no setor agrícola como agroindustrial proporcionou substancial desenvolvimento da economia Brasileira, pela elevação dos índices de produtividade, participação nas exportações e na geração de empregos em regiões distantes, como o Centro-Oeste e Norte do país. Nesse contexto o Estado de Mato Grosso tem observado esse desenvolvimento, inclusive o deslocamento de pólos de produção, como os do sistema agroindustrial da atividade canavieira, em muito motivado por políticas de desenvolvimento do setor. Assim, o estudo objetivou analisar dados da expansão da atividade canavieira matogrossense, em correlação aos dados nacionais. Para isso, o estudo baseou-se numa pesquisa bibliográfica, que elenca aspectos históricos baseada em artigos e dados secundários oficiais, que possibilitaram vizualizar o desenvolvimento da atividade canavieira no Brasil e no Mato Grosso, com reflexão sobre dificuldades enfrentadas na expansão das áreas de cultivo e agroindustrialização no Estado. Palavras chave: Agroindustrialização. Cana-de-açúcar. Mato Grosso. Abstract The increase in agricultural and agro-industrial technologies has provided a significant development of the Brazilian economy, by raising the productivity indexes, participation in exports and by offering jobs in remote regions, like the Midwest and the North of this country. In this context, the State of Mato Grosso has noticed this development, even the displacement of the production centers, such as the agro-industrial system of the sugar cane production, motivated by policies of development in this sector. Thus, this study aimed to analyze data from the expansion of sugar cane production in the State of Mato Grosso, according to the national data. For this, the literature of this study lists historical aspects based on articles and official secondary data, which allowed viewing the development of sugar cane production in Brazil and Mato Grosso, reflecting about some difficulties in expanding the areas of production and agro-industrialization in the state. Keywords: Agro-industrialization. Sugar cane. State of Mato Grosso.

Transcript of Aspectos históricos e políticos da expansão dos pólos ... · In this context, the State of Mato...

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

1

ASPECTOS HISTÓRICOS E POLÍTICOS DA EXPANSÃO DOS PÓLOS AGROINDUSTRIAIS DA CANA-DE-AÇÚCAR NO ESTADO DE MATO GROSSO,

BRASIL [email protected]

APRESENTACAO ORAL-Evolução e estrutura da agropecuária no Brasil REGINA MARIA DA COSTA; RODRIGO NEI CHRYSOSTHEMOS;

FRANCISCO JOSE DA COSTA ALVES. UFSCAR, SÃO CARLOS - SP - BRASIL.

Aspectos históricos e políticos da expansão dos pólos agroindustriais da

cana-de-açúcar no Estado de Mato Grosso-Brasil

Grupo de Pesquisa: Evolução e estrutura da agropecuária no Brasil

Resumo O incremento de tecnologias tanto no setor agrícola como agroindustrial proporcionou substancial desenvolvimento da economia Brasileira, pela elevação dos índices de produtividade, participação nas exportações e na geração de empregos em regiões distantes, como o Centro-Oeste e Norte do país. Nesse contexto o Estado de Mato Grosso tem observado esse desenvolvimento, inclusive o deslocamento de pólos de produção, como os do sistema agroindustrial da atividade canavieira, em muito motivado por políticas de desenvolvimento do setor. Assim, o estudo objetivou analisar dados da expansão da atividade canavieira matogrossense, em correlação aos dados nacionais. Para isso, o estudo baseou-se numa pesquisa bibliográfica, que elenca aspectos históricos baseada em artigos e dados secundários oficiais, que possibilitaram vizualizar o desenvolvimento da atividade canavieira no Brasil e no Mato Grosso, com reflexão sobre dificuldades enfrentadas na expansão das áreas de cultivo e agroindustrialização no Estado. Palavras chave: Agroindustrialização. Cana-de-açúcar. Mato Grosso. Abstract The increase in agricultural and agro-industrial technologies has provided a significant development of the Brazilian economy, by raising the productivity indexes, participation in exports and by offering jobs in remote regions, like the Midwest and the North of this country. In this context, the State of Mato Grosso has noticed this development, even the displacement of the production centers, such as the agro-industrial system of the sugar cane production, motivated by policies of development in this sector. Thus, this study aimed to analyze data from the expansion of sugar cane production in the State of Mato Grosso, according to the national data. For this, the literature of this study lists historical aspects based on articles and official secondary data, which allowed viewing the development of sugar cane production in Brazil and Mato Grosso, reflecting about some difficulties in expanding the areas of production and agro-industrialization in the state. Keywords: Agro-industrialization. Sugar cane. State of Mato Grosso.

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

2

1. INTRODUÇÃO Traçado um breve histórico ao longo das últimas décadas da região Centro-Oeste é possível ver que a mesma sofreu uma série de transformações com impactos consideráveis na estrutura produtiva e ocupacional. Os incentivos governamentais para a ocupação da região na década de 70 refletiram em significativos fluxos migratórios e grandes empreendimentos agropecuários, levando a expansão da monocultura de alguns produtos agrícolas, como a cana-de-açúcar. Para tanto, o cultivo da cana-de-açúcar no Brasil se deu por interesses mercantilistas dos colonizadores que objetivavam atender a demanda do mercado externo, ou seja, uma produção destinada à exportação. As estruturas feudais do campo, que caracterizavam os engenhos, cederam lugar às formas capitalistas de produção a partir da Revolução Industrial, quando a agricultura alcançou um patamar técnico científico, houve a possibilidade do aumento nos índices de produtividade.

Após a 2ª Guerra Mundial a forma capitalista predominou no Brasil e com o apoio do Estado subsidiando a modernização e o avanço da produção da cana-de-açúcar, houve o deslocamento dos pólos de produção agroindustriais para o Centro-Sul do país (São Paulo, Paraná, Minas Gerais, Goiás) e, mais recentemente, para Mato Grosso do Sul e Mato Grosso.

Dessa forma, esse estudo procura verificar como se conformou o sistema agroindustrial da cana no Brasil, e por conseguinte no estado de Mato Grosso, debruçando um olhar sobre a dinâmica que se tem observado nas recentes transformações no setor canavieiro, inclusive sobre as dificuldades enfrentadas frente à adequação da mão-de-obra em condições mais humanas e de tal forma, a adequação da produção com os aspectos ambientais, fator condicionador de atendimento do mercado externo na atualidade.

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

3

2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS A metodologia utilizada foi à da pesquisa descritiva e documental, fundamentada numa pesquisa bibliográfica, através de dados secundários, e de informações obtidas em livros e artigos. Ainda utilizou-se o método histórico, descrevendo o processo de desenvolvimento do setor sucroalcooleiro, que traz em sua essência a expansão da monocultura no país.

A metodologia de análise se dá através de debate teórico a partir de autores que discutem a temática das políticas do desenvolvimento rural, em específico do setor sucroalcooleiro no Mato Grosso.

Assim, recorreu-se também à análise de dados secundários da produção de cana-de-açúcar entre as safras 2005/2006, 2006/2007 e 2007/2008, fornecidos pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), pela SEPLAN (Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenação Geral) e pela ÚNICA (União da Indústria de Cana-de-açúcar), que possibilitaram contextualizar a importância econômica do setor sucroalcooleiro.

Dessa forma, o artigo está estruturado em três sessões: uma sessão com abordagem macro do desenvolvimento agroindustrial sucroalcooleiro no Brasil; uma sessão sobre o desenvolvimento agroindustrial sucroalcooleiro no Estado do Mato Grosso, e, por fim, uma sessão com as Considerações Finais do estudo.

3. O DESENVOLVIMENTO AGROINDUSTRIAL SUCROALCOOLEIRO

3.1 O sistema agroindustrial sucroalcooleiro e as políticas de incentivo ao setor

FURTADO (2007) ao descrever o processo histórico de crescimento do cultivo da cana-de-açúcar no Brasil na metade do século XVI, relata que o cultivo da planta existe desde a chegada dos portugueses, que tinham como objetivo o povoamento do território afastando possíveis invasores de sua nova colônia. A estratégia era demarcar as áreas através do plantio da cana-de-açúcar. Como a região do Nordeste apresentava na época solo propício ao cultivo da cana e o seu principal produto, o açúcar, teve grande aceitação na Europa, o Império Português aproveitou-se da mão-de-obra escrava, e intensificou o cultivo da cana-de-açúcar em grande escala naquela região. Assim, na fase Brasil Colônia, a base da economia brasileira restringia-se aos engenhos de açúcar, cultivada em grandes fazendas, com a produção de açúcar voltada para o comércio externo. No que tange aos incentivos à modernização da agricultura da cana, em específico a indústria do açúcar, foi subsidiada pela política da garantia de juros, nos empréstimos públicos e na isenção de tarifas na importação de equipamentos. O objetivo dessa política era aumentar a escala produtiva, reduzindo os custos de produção (FURTADO, 2007). Para que isso acontecesse, era preciso que os engenhos centrais não dependessem apenas da matéria-prima própria, mas também da cana cultivada por terceiros (SZMRECSÁNYI, 1979). Assim, a política de modernização da indústria do açúcar incitou a criação de uma nova classe de agentes que é a de fornecedores de cana-de-açúcar. De início essa classe abasteceu os engenhos e posteriormente às usinas de açúcar e álcool.

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

4

De acordo com Baccarin (2005) o que marca a fase dos engenhos centrais é a determinação entre a fase agrícola e a fase industrial, pois os empresários do setor eram obrigados a ser tornar proprietários de engenhos centrais, caso contrário permaneceriam na fase agrícola de produção, sendo apenas fornecedores de cana ou saiam da atividade. Muitos não tinham condições de obterem esses engenhos por questões culturais tradicional do poder fundiário e também pela insuficiência de recursos, permanecendo na fase agrícola. Cabe lembrar ainda que a diferenciação de atividade agrícola e industrial trouxe inúmeros conflitos entre os fornecedores de cana e industriais, por envolver valores a serem pagos pela cana, volume de produção e a garantia de compra da cana. Atualmente essas divergências ainda permanecem, principalmente se o fornecedor de cana for um pequeno produtor rural. Com isso, o poder político exercido pelos antigos senhores de engenho passa a ser exercido pelos novos fornecedores de cana. Mesmo não tendo o poder econômico, com a criação dos engenhos centrais, os fornecedores de cana-de-açúcar tinham grande influência no plano político. Em 1933 surgiu no país o Instituto do açúcar e do álcool (IAA), com poderes para regular a agroindústria, controlando também as oferta de açúcar através das cotas de produção. O artigo 8º do IAA proibia instalações de usinas sem prévia consulta ao Instituto. Porém, em 1941 houve o advento do Estatuto da Lavoura Canavieira (ELC), as funções do IAA, foram ampliadas, controlando também transações entre usinas e fornecedores de cana. Porém, em 1990 o IAA foi extinto devido seu poder não conseguir incidir sobre o uso da terra para cultivo da cana, não conseguir aplicar também controles rígidos que evitasse a expansão extensiva da produção agrícola (SZMRECSÁNYI, 1979). A intervenção pública não teve poder suficiente para impedir que houvesse o deslocamento da produção setorial do Norte-Nordeste para o Centro-Sul (em específico para São Paulo), não conseguiu também evitar a centralização produtiva, pois a cada novo ciclo produtivo o complexo se organizava cada vez mais em unidades menores e eficientes por grandes agroindústrias que com o avanço tecnológico, aumentavam a racionalidade das tarefas e a produtividade setorial. Completando o cenário do expansionismo o governo lança em 1975 o Programa Nacional de incentivo a produção do álcool (Pró-álcool), trazendo a aceleração do desenvolvimento das agroindústrias sucroalcooleiras, e é nessa fase que a lavoura canavieira expandiu no Brasil. Baccarin (2005) destaca que o desenvolvimento do Proálcool esteve sujeito ao planejamento e execução do Conselho Nacional do Álcool (CNAI) e da Comissão Executiva Nacional do Álcool (CENAL). Num primeiro momento, tentando encontrar alternativa para a crise no mercado do açúcar em 1974 e buscando um substituto à gasolina, (combustível importado e encarecido, após primeiro choque do petróleo em 1973), o Governo concede créditos públicos abundantes e baratos direcionados aos investimentos: agroindustrial e rural e ao custeio agrícola. Ao mesmo tempo adotou políticas de favorecimento à produção de automóveis movidos a álcool. Com isso, houve o estímulo a entrada de novos empresários e a expansão da lavoura canavieira para regiões sem ou com pequena tradição com a cultura, como o oeste paulista, o norte paranaense, o Triângulo Mineiro e áreas do Centro-Oeste. Em 1980, ao contrário do que houve em 1974, o preço do petróleo apresenta queda e ao mesmo tempo a dependência brasileira de importação desse produto também diminui,

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

5

fazendo com que a Petrobrás apresentasse grande resistência ao aumento da produção do álcool. Nesse mesmo período, agravou-se a situação fiscal e financeira do Governo, acarretando na diminuição dos investimentos públicos e da concessão de subsídios. Em 1986, os créditos públicos de investimento do Proálcool forma zerados e o preço do álcool passou a ser fixado abaixo do custo de produção médio das usinas e destilarias, fazendo com que a produção sucroalcooleira ficasse estagnada entre 1986 a 1990, conhecida como a crise de abastecimento de álcool, diminuindo a venda de carros a álcool (SZMRECSÁNYI, 1979). Baccarin (2005) relata que, com a manutenção do preço do petróleo em nível baixo e do aumento da sua produção em nível nacional, surgiram novas condições no mercado de automóveis desfavorecendo a continuidade do Proálcool. Nesse momento, a melhor opção era por carros populares sem que houvesse a diferenciação tributária entre as versões a gasolina e a álcool. Com o mercado de automóveis a álcool estagnado, a política econômica faz adoção de medidas de caráter neoliberal de menor intervenção do Governo na economia com a desregulamentação dos mercados. Com isso, houve resistência de empresários das regiões menos competitivas e dos proprietários de destilarias autônomas. Porém, a maior tensão de conflito entre o público e o privado ocorreu em torno das cobranças de impostos e da negociação do endividamento das empresas sucroalcooleiras. No entanto, sabe-se que o mercado internacional de açúcar apresentou mais vezes, condições favoráveis durante o período de desregulamentação, pois os preços desse produto apresentaram elevação acima dos custos setoriais, como conseqüência a produção do açúcar cresceu mais que do álcool e com o volume exportado o Brasil se transformou no principal exportador mundial. Com isso os empresários do Centro-Sul, aproveitaram as oportunidades de negócios pelo fato da exportação do açúcar deixar de ser monopólio público, diversificando as nações de negociações do produto brasileiro, o que possibilitou a superação do protecionismo praticado pelos países europeus e EUA. No cenário de expansão do setor sucroalcooleiro, a pior fase vivida pelo complexo sucroalcooleiro foi na década de 1990, quando ocorreu a liberação dos preços que coincidiu com a queda do preço internacional do açúcar. Nesse momento houve a mobilização por parte dos empresários e representantes políticos em favor de novas medidas públicas para a sustentação do setor. A partir de então, a intervenção pública torna-se necessária, devido os mercados apresentarem características muito desfavoráveis. Desse período em diante, a intervenção pública passa a ser vista como uma possível solução para as crises periódicas no mercado de açúcar e álcool. No entanto, como vivemos num ambiente democrático, espera-se que as políticas sejam de importância econômica e social, evitando privilegiar alguns grupos econômicos, mas que promova a sustentabilidade da atividade dando maior segurança à sociedade. Além da legislação específica e favorecida de apoio, o complexo agroindustrial, conta na estrutura administrativa federal, com o Conselho Interministerial do Açúcar e do Álcool (CIMA), cujos objetivos são o de estudar e propor políticas e coordenar as ações dos diversos órgãos envolvidos com o setor. Para a execução das ações, dispõe do Departamento de Açúcar e do Álcool, vinculado à Secretaria de Produção e Comercialização do Ministério da Agricultura, Pecuária e do Abastecimento (MAPA). 3.2 Ambiente institucional do setor sucroalcooleiro

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

6

De acordo North1 (1973) apud Fava (2008) no artigo “ambiente institucional para a formação do arranjo produtivo local do álcool de Piracicaba”, a definição resumida sobre o ambiente institucional, aponta que o mesmo tem relação direta com o desenvolvimento econômico. Já a análise institucional contemporânea é um campo de estudo em grande desenvolvimento nas várias áreas das ciências, como: economia, sociologia e ciência política. Esse conjunto de estudos institucionais levou a origem do “Novo Institucionalismo”. Essa nova abordagem é composta por três diferentes perspectivas analíticas: institucionalismo histórico, institucionalismo da escolha racional e institucionalismo sociológico (HALL e TAYLOR, 1996 apud FAVA, 2008). Nessas três perspectivas, há o interesse em explorar o conjunto de relações que existe entre as instituições e seu comportamento, buscando uma explicação dos processos pelos quais as organizações se originam e se modificam. Portanto, com as mudanças institucionais (desregulamentação do setor sucroalcooleiro) muitas das funções exercidas pelo governo passaram a ser de responsabilidade dos diversos envolvidos nas cadeias produtivas, evidenciando as mudanças enfrentadas e a necessidade de reorganização dos sistemas como um todo. A alteração do ambiente institucional vivenciada pelo setor sucroalcooleiro, além de alterar os papéis dos atores tradicionais e as arenas decisórias (maneira pela qual o processo decisório é estruturado e condicionado pelo seu próprio objeto), fez com que os atores secundários assumissem posição de destaque no processo de escolha das políticas inerentes ao setor (caso dos pequenos produtores de cana e dos trabalhadores). Porém, Helfand (1994) apud Barros e Moraes, (2002), a interação de quatro fatores são relevantes ao analisar as escolhas de políticas governamentais: o Estado, os grupos de interesse (no caso do setor sucroalcooleiro, citamos as duas grandes regiões produtoras: Norte/Nordeste e Centro-Sul), a economia e o regime político. A desregulamentação do mercado e as incertezas dos subsídios públicos de sustentação encontraram resistência do Norte e Nordeste que apresentavam desvantagem competitiva em relação ao Centro-Sul, mas também por parte dos fornecedores de cana-de-açúcar que reivindicavam prorrogação do tabelamento dos preços deste produto, pela manutenção dos subsídios agrícolas e pela regulamentação do governo quanto à sua comercialização. Ademais, a região Norte/Nordeste tinha interesse em manter a intervenção como forma de controlar a expansão da produção na região Centro-Sul. Baccarin (2005) mostra que também na região Centro-Sul, foram identificados vários grupos de interesse que não concordavam com a desregulamentação (grupos de produtores, técnicos do setor e algumas lideranças), pois muitos objetivavam expandir a produção (mantendo o interesse na regulamentação e o sistema de cota por produção) impedindo que os estados mais competitivos atrapalhassem seu crescimento. Além do mais, os diferentes estados competiam de forma diferenciada em relação ao custo do transporte do álcool combustível e assim, os produtores dos estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e do oeste de São Paulo, mais distantes do centro de consumo, teriam

1 Ambiente Institucional foi o tema da tese de Prêmio Nobel de Economia de Douglas North, premiado em 1993. Para esse autor, as instituições foram fundamentais para o desenvolvimento da Europa e Estados Unidos e são indispensáveis para o crescimento das economias emergentes.

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

7

dificuldades em competir com os outros produtores de São Paulo num ambiente de livre mercado, se a transição ocorresse sem uma fase de transição, com regras estabelecidas. Por esse motivo, pressionavam que a liberação ocorresse em outros moldes, contribuindo para o atraso da mesma. Um grupo que almejava a desregulamentação por se sentir prejudicado com as distorções no sistema de cotas era a Cooperativa dos Produtores de Açúcar e Álcool de São Paulo (COPERSUCAR). Esse grupo acreditava que os mais competitivos estariam aptos a operar no regime liberado. Em meio tantas discordâncias, foi criada uma nova associação de produtores de São Paulo, a União da Agroindústria Canavieira de São Paulo (ÚNICA), substituindo a tradicional entidade representativa dos industriais que era a Associação das Indústrias de Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo (AIAA). Porém, dentro da ÚNICA também não havia um consenso sobre a desregulamentação e assim diversas unidades de São Paulo se afastaram da ÚNICA juntando-se a outros produtores de outros estados associados à Sociedade dos Produtores de Açúcar e Álcool de São Paulo (SOPRAL) que era a entidade representativa das unidades produtoras da geração Proálcool (que contava com produtores de SP, PR, MT, MS, GO e ES). Estes por sua vez criaram a Coligação das Entidades Produtoras de Açúcar e Álcool (CEPAAL), tendo como objetivo consolidar os interesses dos diversos estados produtores, conciliando as opiniões para lidar com o novo ambiente institucional2 (Barros e Moraes, 2002). Diante desse cenário, o ambiente institucional estava marcado pelos atores principais que pressionavam e mobilizavam seus recursos para que seus objetivos fossem alcançados: as duas entidades do Centro-Sul, as produtoras do Norte-Nordeste, as entidades dos fornecedores de cana-de-açúcar que incluíam os da região Norte-Nordeste (através de um apelo social, tendo em vista ao grande número de pequenos fornecedores existentes que se opunham a liberação do preço da cana-de-açúcar). Portanto, em 1997 houve a necessidade da criação de uma estrutura decisória que é o Conselho Interministerial do Açúcar e do Álcool (CIMA3), visando alterar o sistema descentralizado de tomadas de decisão. Na época exigiu a coordenação dos diversos órgãos do governo adeptos ao produto, pois com as multidisciplinares do álcool requereu que os vários ministérios (Ministério da Agricultura, Fazenda, Minas e Energia, Ciência e Tecnologia, Orçamento, Transportes, Desenvolvimento, Meio-Ambiente e Relações Exteriores) se envolvessem nas decisões sobre o setor (Moraes, 1999 apud Barros e Moraes, 2002).

2 Esse novo ambiente institucional ou Nova Economia Institucional (NEI) apresentava duas entidades com visões diferentes: A ÚNICA estava a favor da desregulamentação, enquanto a CEPAAL acreditava que a liberação deveria ser postergada (devido o alto estoque na safra 1998/99 e a falta de regras claras de transição). Além disso, a CEPAAL via a necessidade de uma regulamentação que formalizasse a comercialização do álcool para as distribuidoras de combustíveis, impondo a contratação formal de certa quantidade de álcool demandada pelo mercado. 3 O CIMA era composto por dez ministros e pelos seus respectivos secretários executivos, sendo que os últimos com um representante da Casa Civil da Presidência da República, compunham o Comitê Executivo do CIMA (formado por seis representantes dos produtores de açúcar e álcool das duas regiões produtoras (de diferentes estados); quatro representantes dos fornecedores de cana; quatro parlamentares da Câmara dos Deputados de diversos partidos e regiões; e dois senadores da República (do Rio Grande do Norte e do Mato Grosso)

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

8

O que se observa a partir de então, que as células do movimento democrático são as cidades (onde que se vive se planta cana, se produz, se geram os empregos e se recolhem os impostos). Logo, se a produção da atividade canavieira gera benefícios, aumenta o interesse da população, dos trabalhadores que acabam incitando os prefeitos a estimular sua produção. Sendo assim, os municípios são importantes agentes de pressão sobre o governador, junto com aqueles que representam o povo e suas Câmaras Legislativas. Conseqüentemente, os governos dos estados cuja atividade canavieira tiver relevância econômica terão poder de pressionar o Governo Federal para criar estímulos ao setor. Cabe lembrar ainda que o Governo Federal que teve principal papel na elaboração e implantação do Proálcool, no novo ambiente institucional o seu poder fica reduzido, cabendo apenas definir em conjunto com o setor privado ações com objetivos estabelecidos. Incumbe também ao mesmo, desenvolver novos mercados para os produtos da cadeia produtiva da cana-de-açúcar, reduzindo as barreiras e tarifas, como forma de incentivo ao produto num ambiente democrático. Baccarin (2005) assinala a importância crescente de outro ator público em ambiente de livre mercado no setor sucroalcooleiro que é a Agência Nacional de Petróleo (ANP), pois na medida em que o agente executor das políticas públicas referentes ao setor, (determinadas pelo CIMA ou pelo Conselho Nacional de Política Energética) a mesma é responsável pela manutenção dos estoques estratégicos do governo e pela fiscalização do setor de combustíveis. As montadoras de veículos apresentam certa relevância no sentido de abastecimento do mercado de carros a álcool para que as políticas adotadas sejam efetivadas. Já os consumidores não têm atuação direta na determinação das políticas, mas influenciam as tomadas de decisão no que se refere aos preços dos combustíveis. Sabe-se então que com a desregulamentação, houve a identificação das arenas decisórias, dos agentes e seus recursos de poder que compõem os processos decisórios. Pois inserido num ambiente institucional amplo com regime político democrático, o poder de intervenção do Governo diminuiu. E com a economia do país inserida num contexto globalizado, com disposições liberais, o Estado não disponibiliza de recursos para implementação de políticas públicas, transferindo as decisões para os seguintes atores: os parlamentares do Congresso Nacional, os Sindicatos dos Trabalhadores, os Governos Estaduais e os prefeitos dos municípios canavieiros. Diante disso cabe apenas ressaltar que o poder que o Governo Federal tinha na fase da elaboração do Proálcool, o mesmo fica reduzido, tendo suas ações transferidas através do CIMA e da ANP. Portanto, a necessidade de conhecer o novo ambiente institucional competitivo e globalizado, auxilia nas tomadas de decisão para o desenvolvimento do setor sucroalcooleiro. Acredita-se ainda que através do estudo desse novo ambiente, proporcionará o entendimento da lógica organizacional das cadeias produtivas agrícolas, auxiliando nas criações de políticas governamentais que visem restringir ou criar barreiras protecionistas no comércio interno ou externo. Pois a forma que ocorrerão as relações dessas cadeias com o ambiente institucional, ambiente tecnológico, organizações e indivíduos, definirão as estratégias que influenciarão no sucesso ou fracasso dessa atividade. 3.2.1 - O papel do Ministério da Agricultura e a interferência política diante da expansão do cultivo da cana no Brasil

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

9

O Ministério da Agricultura possui como missão: Promover o Desenvolvimento Sustentável e a Competitividade do Agronegócio em Benefício da Sociedade Brasileira, estimulando o aumento da produção agropecuária e o desenvolvimento do agronegócio, com o objetivo de atender o consumo interno e formar excedentes para exportação. Essa é a missão institucional do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), que tem como conseqüência a geração de emprego e renda, a promoção da segurança alimentar, a inclusão social e a redução das desigualdades sociais. Em busca de realizar o planejado, o MAPA formula e executa políticas para o desenvolvimento do agronegócio, integrando aspectos mercadológicos, tecnológicos, científicos, organizacionais e ambientais, para atendimento dos consumidores brasileiros e do mercado internacional. A atuação do ministério baseia-se na busca de sanidade animal e vegetal, da organização da cadeia produtiva do agronegócio, da modernização da política agrícola, do incentivo às exportações, do uso sustentável dos recursos naturais e do bem-estar social. A infra-estrutura básica do MAPA é formada pelas áreas de política agrícola (produção, comercialização, abastecimento, armazenagem e indicadores de preços mínimos), produção e fomento agropecuário; mercado, comercialização e abastecimento agropecuário; informação agrícola, defesa sanitária (animal e vegetal); fiscalização dos insumos agropecuários; classificação e inspeção de produtos de origem animal e vegetal; pesquisa tecnológica, agrometeorologia, cooperativismo e associativismo rural; eletrificação rural; assistência técnica e extensão rural. As Delegacias Federais de Agricultura e as empresas vinculadas ao ministério – Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA). O Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), a Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (CEPLAC). A Companhia de Entrepostos e Armazéns de São Paulo (CEAGESP), a Companhia de Armazéns e Silos do Estado de Minas Gerais (CASEMG) e as Centrais de Abastecimento de Minas Gerais (CEASA/MG) – também executam as políticas públicas voltados ao agronegócio. Uma das inovações da atual gestão do MAPA foi à criação de câmaras setoriais das diversas cadeias produtivas do agronegócio (carne, leite, avicultura, açúcar e álcool, fruticultura, entre outras). Elas reúnem representantes do governo e do setor privado para debater e propor políticas públicas para o agronegócio brasileiro. SZMRECSÁNYI (1979) evidencia a importância econômica da cana-de-açúcar, pois a cultura possui grande utilidade. É caracterizada como planta industrial e possui valor de mercado sendo que seu cultivo representa potencial fonte de renda e de emprego para ponderáveis parcelas da população rural e para as usinas de açúcar e álcool, resultante do amplo consumo tanto dentro como fora do país. Para atender a demanda pelos produtos e subprodutos da cana-de-açúcar, o sistema agroindustrial organizou a cadeia produtiva sucroalcooleira, conforme fluxograma a seguir (Figura 1):

Figura 01: Sistema Agroindustrial Sucroalcooleiro

DISTRIBUIDOR VAREJISTA (Postos de Combustíveis)

DISTRIBUIDOR ATACADISTA (Distribuidoras Autorizadas pela ANP, ANEL, MAPA)

CONSUMIDOR FINAL

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

10

Fonte: Adaptado de Zilbersztajn (2000)

As mudanças no ambiente institucional sob influencia da ordem político-econômica neoliberal requereu que o complexo agroindustrial se reorganizasse de maneira que houvesse a difusão de inovações tecnológicas e organizações integradas em cadeias produtivas para que fossem capazes de competir num mercado integrado. Dentre as inúmeras mudanças, a organização do trabalho tem influenciado um conjunto amplo de trabalhadores que tem sofrido com experimentação da mudança de ordem tecnológica quanto nas relações sócio-culturais do trabalho (GRAZIANO, 1998 apud PREVITALLI et. al, 2008). A inconsistência entre a existência da política pública e sua aplicabilidade, não ocorre apenas nas questões relacionadas à dinâmica organizacional do trabalho. Batalha (2007) apresenta uma breve reflexão sobre a incompatibilidade das políticas, citando como exemplo o papel das políticas agrícolas e ambientais, reforçando que existe uma definição comum de que internacionalmente, muitas políticas agrícolas são conflitantes com as metas ambientais. A maioria dos programas de apoio as commodities, incitam produtores a usarem excessivas quantidades de insumos externos para aumentar os rendimentos e maximizar ganhos com os subsídios governamentais. Temos como exemplo, a cultura do milho nos EUA onde à mesma teve grande apoio, o que ocasionou o esquecimento das demais culturas, e no Brasil, a soja e a cana-de-açúcar caminham para o mesmo processo. Essa prática leva a monocultura de alguns produtos, garantindo vantagem econômica, no entanto, causa o chamado stress ambiental (uso do solo por longo período por uma única cultura). O que se observa é a inquietação mundial, tanto que houveram reformulações na Política Agrícola Comum (PAC) da União Européia, exigindo métodos compatíveis com a proteção ambiental, reduzindo o uso de fertilizantes/defensivos, forçando à adoção de uma agricultura orgânica, com terras em períodos de descanso. No Brasil muitos produtores optaram por métodos sustentáveis, mas isso não ocorre de forma consciente, e sim por exigência de países industrializados da Europa, EUA e Japão que se interessa por produtos brasileiros, e os mesmos não querem um produto que propicie impactos sociais e ambientais. O que muitos crêem, é que haja contratos que incluam questões sociais e ambientais, tentando assim aliviar os impactos da monocultura, porque esse modo de produção reflete diretamente na condição do trabalho e na segurança alimentar.

AGROINDÚSTRIA (Usinas Cadastradas no MAPA e ANP)

PRODUÇÃO

(Matéria-Prima: Cana-de-açúcar)

FORNECEDORES (Insumo, máquinas, fertilizantes, peças, agroquímicos)

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

11

3.2.2 A relevância da cana-de-açúcar, a expansão e alguns impactos

A cana-de-açúcar tem grande relevância econômica e inúmeras são as vantagens na sua produção, como por exemplo, a redução de CO2, fator este fomentado pelas políticas públicas na contenção das mudanças climáticas. Outro fator é ser vista pelos empresários do agronegócio como uma grande chance de crescimento econômico. Observa-se no mapa a seguir (Figura 2) as áreas de plantações de cana-de-açúcar.

Figura 2: Mapa da produção do Setor Sucroenergético Fonte: Adaptado da UNICA, 2009

De acordo com Dados oficiais do IBGE, UNICAMP (Universidade Estadual de

Campinas – SP) e do CTC (Centro de Tecnologia Canavieira), a produção de cana-de-açúcar se concentra nas regiões Centro-Sul e Nordeste do Brasil. O mapa acima mostra em vermelho as áreas onde se concentram as plantações e usinas produtoras de açúcar, etanol e bioeletricidade. A cana ocupa destaque na produção agrícola do Brasil, com a sexta posição no ranking nacional, e com avanço gradativo ano a ano. Essa informação pode ser conferida no quadro a seguir, que demonstra a produção de cana-de-açúcar em toneladas processadas pelas usinas nas últimas quatro safras (Quadro 1).

Quadro 1: Cana-de-açúcar em toneladas processada pelas usinas brasileiras, safras: 2005/2006, 2006/2007, 2007/2008, 2008/2009

ESTADOS 05/06 06/07 07/08 08/09 ACRE - - - -

RONDONIA - - - 106.292 AMAZONAS 252.672 224.700 318.141 303.350

PARÁ 510.086 697.400 575.525 626.865 TOCANTINS 95.314 179.300 - 55.456 MARANHÃO 1.797.490 1.660.300 2.134.604 2.280.160

PIAUÍ 492.369 706.000 689.130 900.181

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

12

CEARÁ 40.709 27.400 8.250 122.355 R. G. NORTE 2.356.268 2.397.400 2.047.750 3.186.768

PARAIBA 4.291.473 5.107.700 5.653.047 5.885.978 PERNAMBUCO 13.858.319 15.293.700 19.844.415 18.949.518

ALAGOAS 22.532.291 23.635.100 29.444.208 27.309.285 SERGIPE 1.109.052 1.136.100 1.371.683 1.831.714 BAHIA 2.391.415 2.185.600 2.522.923 2.541.816

MINAS GERAIS 24.543.456 29.034.195 35.723.246 42.480.968 ESPIRITO SANTO 3.804.231 2.894.421 3.938.757 4.373.248 RIO DE JANEIRO 4.799.351 3.445.154 3.831.652 4.018.840

SÃO PAULO 243.767.347 263.870.142 296.242.813 346.292.969 PARANÁ 24.808.908 31.994.581 40.369.063 44.829.652

SANTA CATARINA - - - - R. G. SUL 57.976 91.919 128.980 107.184

MATO GROSSO 12.335.471 13.179.510 14.928.015 15.283.134 MATO GROSSO DO SUL 9.037.918 11.635.096 14.869.066 18.090.388

GOIÁS 14.559.760 16.140.043 21.082.011 29.486.508 REGIÃO CENTRO-SUL 337.714.418 372.285.061 431.113.603 504.962.891

REGIÃO NORTE-NORDESTE 49.727.458 53.250.700 64.609.676 64.099.738 BRASIL 387.441.876 425.535.761 495.723.279 569.062.629

Fonte: Adaptado de ÚNICA/MAPA (2010)

Apesar dos diversos anúncios incitando a substituição do consumo de combustíveis fósseis por bicombustíveis, com intuito de cumprir metas na redução de gases de efeito estufa, a monocultura da cana-de-açúcar traz alguns transtornos para o país. O crescimento da cana-de-açúcar tem provocado a diminuição do plantio de alguns produtos associados às pequenas propriedades e à agricultura familiar. De acordo com dados do Instituto de Economia Agrícola (IEA), entre 2005 e 2006, no Estado de São Paulo, houve a retração em diversas plantações, conforme mostra o Quadro 2:

Quadro 2: Principais produtos que retraíram a produção devido à monocultura da cana-de-açúcar no Estado de São Paulo em 2005/2006

Produtos Retração em (%) Arroz 10 % Milho 11% Feijão 13% Batata 14%

Algodão 40% Fonte: IEA, 2007.

De acordo com Slack (2007), ao criar um plano, cada parte da operação precisa ser monitorada para assegurar que as atividades planejadas estão de fato ocorrendo. Porém torna-se perceptível que não existe tal plano, não há um estudo que determina que culturas sejam relevantes nas diversas regiões do país, garantindo retorno econômico e equilíbrio da demanda. Um dos fatores para a ascensão do setor sucroalcooleiro é a valorização do preço do álcool no mercado internacional, isso porque o etanol está tornando-se um combustível de consumo mundial. E por ser menos poluente que a gasolina, o álcool se tornou uma

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

13

alternativa aos combustíveis fósseis como o petróleo, que tem registrado elevação de preço e diminuição dos estoques. Com a implantação de novas usinas de álcool que estão programadas, a demanda pelos produtos da cana deverá aumentar. Para tanto, é presumível que a cultura remunere mais por hectare do que qualquer outra, ante os riscos, que são poucos, pois todo o processo de manejo é feito pelas usinas. Para enfrentar a expansão da cana e outras monoculturas, os municípios deveriam programar planos rurais e urbanos, como já prevê uma determinação do Ministério das Cidades. Apesar dos impasses e descumprimento das leis, o país busca o desenvolvimento. De acordo com a União dos produtores de Bioenergia (UDOP), a indústria automobilística projeta uma frota de 15 milhões de veículos flex fuel em 2013, além disso, o interesse pelo etanol brasileiro é grande, comprovado com a visita do presidente norte-americano ao Brasil em março de 2007. Tudo isso faz com que as usinas trabalhem com um sistema de planejamento e controle puxado (que consiste em produzir de acordo com a demanda). Ocorre o aumento do interesse pelo produto brasileiro, o que alavanca a atividade agroindustrial e conseqüentemente a necessidade de matéria prima e o incremento de áreas destinadas ao plantio de cana. Ocorre assim a necessidade de programas que minimizem esses impactos, ou de programas de acompanhamento dos impactos desse crescimento. Para tanto, o país não possui claramente o diagnóstico de cada área, lembrando que há diferentes problemas para cada área de produção. Tal diagnóstico deveria apontar as principais dificuldades na estrutura fundiária, apontando áreas que permitam o cultivo de cana, sem que haja prejuízo no abastecimento interno de alimentos, ou ainda, que se perca a cultura, a experiência entre os produtores rurais, das técnicas e saberes relacionados à produção de alimentos. Isso leva-nos a crer que precisamos com urgência de um estudo abrangente que possibilite avaliar com maior segurança quais serão os limites naturais da monocultura da cana, e que ações governamentais controlem e dirijam a produção, garantindo patamares estratégicos de produção objetivando segurança alimentar à população. 3.3.3 O Zoneamento Agroecológico da cana-de-açúcar De acordo com dados da ONG Repórter Brasil (2009), o Zoneamento Agroecológico (ZAE) é visto pelos produtores de cana-de-açúcar e governo, como estratégias de sustentabilidade ambiental que proporcionará ao setor sucroalcooleiro a ampliação da produção do etanol em conformidade com a aceitação do mercado internacional. Porém, há um ano a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Agroenergia trabalhava nessa questão. E nesse meio tempo os setores ambientalistas pressionavam contra a expansão desse produto frente aos interesses do setor ruralista. O zoneamento foi oficializado por meio da publicação do Decreto Presidencial 6.961/2009 que será utilizado como base para o Conselho Monetário Nacional (CMN), definir regras de financiamento para o setor sucroalcooleiro. De início o decreto proíbe o plantio da cana-de-açúcar na Amazônia, na Bacia do Alto Paraguai, no Pantanal e áreas indígenas. Estabelece também, que áreas de vegetação primária não podem ser desmatadas para o cultivo de cana e a mesma não pode expandir em terrenos com declividade igual ou superior a 12%, locais estes que tornariam a mecanização inviável. Sendo assim, caso haja

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

14

a necessidade de novos empreendimentos do setor, os mesmos deverão obter uma certidão do MAPA de que o cultivo não haverá riscos à segurança alimentar do país (Açúcar ético, 2010). É relevante salientar ainda que enquanto o projeto de lei (PL) 6.077/2009 não for votado na Câmara dos Deputados e no Senado, as medidas do decreto funcionam apenas como diretrizes para a concessão de crédito rural e agroindustrial. Por isso o risco de retrocesso é real, tendo em vista as pressões da bancada ruralista que tem buscado mudanças no texto do projeto. Outro aspecto considerado pelo ZAE é a expansão da atividade sucroalcooleira sobre áreas já ocupadas por outra atividade agropecuária. Para que a substituição de culturas não se transforme uma potencial ameaça a segurança alimentar do país, o governo previu algumas medidas de controle a serem administradas pelo MAPA. De acordo com o MAPA, através do ZAE o Brasil possui 64,7 milhões de hectares aptos ao cultivo ou a expansão sob usos agrícolas diversos (podendo diversificar entre agricultura e pecuária). Esse órgão considera ainda que dos 64,7 milhões de hectares onde a cultura poderia se expandir, 19,2 milhões foram considerados de alta aptidão; 41,2 milhões de hectares têm média aptidão; e 4,2 milhões de hectares têm baixa aptidão. Em relação às áreas de culturas alimentares, uma comparação entre os mapas do ZAE a dos dados do IBGE para a produção agrícola, mostra que onde constam áreas de pastagem elevadas, os mesmos municípios também produzem elevadas culturas alimentares (entre mil e 50 mil hectares). Segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), o plantio de cana-de-açúcar está relacionado à presença de usinas. E indiferente a cultura cultivada anteriormente, após as instalações industriais da mesma, as atividades cultivadas tende a ser convertida em canaviais. E como a produção de grãos nas últimas safras manteve um ritmo ascendente, como a de cana, os deslocamentos das grandes culturas é um fenômeno que já acontece, ocupando naturalmente áreas da agricultura familiar e gerando impactos em biomas mais sensíveis. Portanto, de acordo com a Conab, não adianta zonear apenas as áreas para o plantio da cana, mas para as demais culturas também como o caso da soja, pois tal medida poderia apenas estar transferindo os impactos ambientais e a segurança alimentar. O projeto é uma resposta a críticas feitas por ambientalistas de que o aumento da produção do etanol no país estaria ameaçando o ambiente e a floresta amazônica. O decreto possui 30 páginas e pode-se acessar no seguinte endereço: http://www.in.gov.br, no qual consta o seguinte resumo: Pontos positivos: a) Exclusão de Amazônia, Pantanal e Alto Paraguai da área apta à expansão; b) Proibição de novos desmatamentos para plantio da cana; c) Construção de mecanismos de proteção à segurança alimentar; d) Criação de condicionantes agroecológicas para o financiamento do setor; e) Restrição a cultivos em áreas de grande declividade. Pontos negativos: a) Cerrado permanece como espaço prioritário de expansão da cultura; b) Mapeamento de áreas prioritárias à biodiversidade foi desconsiderado; c) Zoneamento desvinculado da realidade das demais atividades agropecuárias;

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

15

d) Riscos de impactos indiretos subavaliados; e) Permissão a empreendimentos em atividade ou já licenciados em áreas não-aptas.

Diante do exposto sobre o ZAE, urge a necessidade do acompanhamento da

tramitação do projeto de lei no Congresso Nacional e da sua posterior implementação pelos órgãos do Executivo, de maneira a evitar regressões e garantir as melhorias necessárias no setor sucroalcooleiro em conformidade com o meio ambiente e a segurança alimentar. 4 O SETOR SUCROALCOOLEIRO NO MATO GROSSO 4.1 A expansão do setor sucroalcooleiro no Mato Grosso

Inserido no cenário da expansão da cana-de-açúcar no país, o estado do Mato Grosso também fez a adoção pela atividade canavieira, onde muitos dos incentivos de colonização do Estado acabaram beneficiando, principalmente, os grandes projetos agropecuários e madeireiros na região, bem como a fundação de várias cidades ancoradas nesse processo de colonização, como: Tangará da Serra, Nova Olímpia, Barra do Bugres, Sinop, Campo Novo do Parecis, Juína, e outros. Algumas dessas cidades, por estarem integradas à política brasileira de colonização apoiaram a instalação de usinas de açúcar e álcool no Estado. Costa (1995) relata que a história da atividade canavieira no estado do Mato Grosso recebeu forte incentivo do Pró-álcool, o que proporcionou o cultivo em larga escala da cana no Estado, apresentado crescimento e conquistando o mercado internacional através da Bacia do Paraguai/ Prata. Contribuindo, Aleixo (1987) aponta que desde 1751 já havia registros da atividade no Estado. A produção açucareira iniciou a partir do momento em que as minas de ouro começaram a se esgotar e os comerciantes que acumularam excedentes com o ouro passaram a investir na compra e exploração de terras cultiváveis. Nesse mesmo período foi registrado que a capitania possuía quatro engenhos de aguardente e vinte e dois de açúcar e rapadura (exemplo de um dos modelos desses engenhos encontra-se na fazenda Jacobina, na região de Cáceres, município de Mato Grosso). Assim, Aleixo (1987, p.46), aponta os principais fatores para o desenvolvimento da cana-de-açúcar em Mato Grosso: a) Disponibilidade de terras; b) Existência de mão-de-obra adequada à atividade (escrava); c) Existência de um mercado consumidor; d) Presença de vias de comunicação capazes de escoar a produção (abertura da navegação pelo Rio Paraguai). Aleixo e Castro (1987) afirmam que foi através da navegação pelo Rio Paraguai e do Rio Prata, que houve a possibilidade da substituição dos engenhos rudimentares por equipamentos modernos e industrializados e assim, registram em 1856 o momento em que as primeiras usinas se instalaram a margem do Rio Cuiabá. Essas mesmas autoras subsidiaram em informações fornecidas pelo historiador Rubens de Mendonça que aponta a Usina da Conceição (em 1893) como a primeira usina a

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

16

se instalar no Estado. Em 1896 construíram a Itaicí4, considerada o melhor estabelecimento açucareiro de Mato Grosso. Em seqüência, usinas como: Maravilha, Flexas, Aricá, São Miguel, São Sebastião, Tamandaré e a Ressaca (essa última localizada no vale do Rio Paraguai, na região de Cáceres), passaram a fazer parte desse cenário. Narram ainda que a produção açucareira em Mato Grosso prosseguiu até as primeiras décadas do período republicano. Povoas apud Aleixo (1995), indica que em 1923 Itaicy produzia 225 toneladas de açúcar e 5000 carradas5 de aguardente, mais adiante assinala que a usina Maravilha produzia 1600 litros de álcool por dia e atingia mais de 200 litros de aguardente. Com essa produção, essas usinas abasteciam o mercado local e as áreas de regiões fronteiriças como Paraguai e Bolívia fazendo com que a atividade mercantil fosse o impulsionador à ampliação e modernização desses estabelecimentos. Porém, por não produzir em grande escala, as usinas matogrossense não conseguiam concorrer com as usinas de São Paulo e do Nordeste. A modernização das usinas em Mato Grosso coincidiu com o processo de transformação que as áreas tradicionais e produtoras de açúcar no Brasil estavam passando. O Nordeste, os Estados de São Paulo e Rio de Janeiro disputavam os mercados internacionais, buscando maior produtividade e com isso necessitavam expandir os canaviais. Sendo assim, a usina matogrossense teve relevância apenas no sentido da conquista do mercado interno e de fronteira. Aleixo (1987, p. 168) afirma que... “além de conseguir serem fonte geradora de excedente, as usinas do Mato Grosso, viabilizou o projeto de construção de uma elite regional que, política e economicamente, dominou o Estado durante as três primeiras décadas deste século”. (Com a instalação das usinas, esse período da historia do Mato Grosso é marcado por uma nova ordem econômica que buscava transformações econômicas e tecnológicas para solidificar a indústria açucareira sobre as demais atividades econômicas). No decorrer da história econômica da atividade canavieira no Estado do Mato Grosso, ela é transferida das várzeas dos rios pantaneiros para as extensas áreas nas chapadas, planaltos e planícies da Bacia do rio do Alto Paraguai (BAP), através da tecnologia agrícola moderna, como mecanização e correção química dos solos. A produção de cana de açúcar na BAP se encontram nos municípios de Jaciara (que envolve também os municípios de Juscimeira, Dom Aquino, São Pedro da Cipa), Poconé, Barra do Bugres, Nova Olímpia (que envolve os municípios de Denise, Arenápolis e Tangará da Serra) e Lambari D’Oeste (Rio Branco, Mirassol D’Oeste,

4 A Usina de Itaici localiza-se no município de de Santo Antônio do Leverger, e tinha por modo de produção a industrialização da cana-de-açúcar, não se caracterizou por um único e belo prédio, mas, principalmente, por ser o embrião de um processo de industrialização e de um modo de produção característico e novo para Mato Grosso. Sua construção data de 1896, em estilo eclético; atualmente encontra-se desativada e com Tombamento Histórico pela Portaria nº 55/84, D.O. 08/01/1985; a situação atual está em processo de recuperação. 5 Carrada: Objetos que um carro transporta de uma vez. Quantidade que pode carregar um carro. Grande porção de qualquer coisa.

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

17

Cáceres) localizadas em áreas aplainadas ou levemente onduladas da depressão do Rio Paraguai e do Planalto do Guimarães. Possui ainda outras quatro usinas em nível estadual, localizadas nos municípios de São José do Rio Claro, Campo Novo dos Parecis, Comodoro e Confresa, na bacia Amazônica. Nos municípios descritos acima estão instaladas algumas destilarias. De acordo com informações do Sindicato das Indústrias Sucroalcooleiras do Estado de Mato Grosso (Sindálcool/MT), atualmente há onze usinas filiadas, sendo que, cinco delas produzem açúcar e álcool e seis produzem apenas o álcool, como se apresenta no quadro a seguir:

Quadro 4: Destilarias de álcool e açúcar em Mato Grosso DESTILARIAS PRODUTORAS DE

AÇÚCAR E ÁLCOOL DESTILARIAS QUE PRODUZEM APENAS O

ÁLCOOL Usina Barralcool s.a. Alcopan - Álcool Pantanal Ltda. Coprodia Zihuatanejo do BrasilAaçúcar e Álcool s.a. Usinas Itamarati s.a. Destilaria de Álcool libra Ltda. Usina Jaciara s/a Agropecuária Novo Milênio Ltda. Lambari d' Oeste e

Mirassol d' Oeste Usina Pantanal de Álcool e Açúcar Ltda. Usimat destilaria de álcool ltda.

Dentre as onze usinas acima elencada, de acordo com a Gazeta Mercantil (1994), as usinas Barrálcool (localizada em Barra dos Bugres) e Itamarati (de Nova Olímpia), receberam destaque por estarem entre as 100 melhores empresas do Centro Oeste brasileiro, tendo como principal motivo a produção da cana-de-açúcar. A cada ano a paisagem dos canaviais no Mato Grosso vem se alterando gradativamente. É comum observar a cada nova safra, lavouras de grãos e as áreas de pastagens do interior do norte matogrossense ser substituídas pelas plantações de cana-de-açúcar, a mudança é visível. Há cinco anos, a pecuária era predominante, hoje o que se vê quando se passa por essas regiões são terras do município se transformando em extensos canaviais. Atualmente, o Estado ainda possui uma pequena área plantada, em comparação ao Estado de São Paulo. Mas tem apresentado índices de expansão. Para demonstrar o processo de expansão, observe o Quadro 1 a seguir, que demonstra a área plantada da cana de açúcar por Estado. Em destaque estão Mato Grosso e São Paulo para mostrar que mesmo de forma tímida a expansão no Mato Grosso continua. Os dados desse quadro são utilizados pela CONAB para avaliar a safra agrícola da cana-de-açúcar.

Quadro 4: Área plantada de cana-de-açúcar – Safras: 2006 a 2008

ESTADOS Área Total Cana (em 1.000ha)

Safra 05/06 Safra 06/07 Safra 07/08 Goiás 215,9 250,6 401.8

Minas Gerais 297,4 368,4 600.7 Mato Grosso 204,4 214,3 223.2

Mato Grosso do Sul 159,7 182,0 275.8 Paraná 378,5 438,8 509.3

São Paulo 3.364,6 3.661,14 3.824,2 Fonte: Adaptado do 3º Levantamento de Safra Agrícola: Dezembro de 2008 (CONAB, 2009)

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

18

De acordo com essa mesma fonte, em 2008 o Estado de MT, apresentou um considerável índice de produção em relação às safras passadas. A produção foi de 16.109,9 mil toneladas de cana, enquanto São Paulo 340.510,4 toneladas. Segundo o IBAMA (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis), qualquer monocultura traz perda da biodiversidade, extingue as riquezas dos recursos naturais, deixando uma fotografia negativa para a posteridade. No entanto, em termos quantitativos faz com que o produto ganhe êxito no campo econômico, fazendo com que os governantes façam vistas aos impactos causados pela monocultura e expansão da cana. 4.1.3 O Zoneamento Agro-Ecológico (ZAE) da cana-de-açúcar no Mato Grosso De acordo com a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Mato Grosso (FAMATO), o ZAE irá impedir que o Estado do Mato Grosso duplique a produção do etanol. Os impactos avaliados pelo zoneamento também incluíram os problemas sociais e trabalhistas que marcaram o setor sucroalcooleiro, que ainda hoje coloca em risco a sustentabilidade da atividade canavieira. Sustentabilidade não se resume a aspectos econômicos e ambientais. Na questão dos direitos trabalhistas, como exemplo, o setor sucroalcooleiro ocupou nos últimos anos o primeiro lugar em número de trabalhadores escravizados. No ano de 2008, 2.253 pessoas foram libertadas nos canaviais, que representa (49% do total). Em julho de 2009 o Grupo Móvel de Fiscalização coordenado pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) encontrou mais 951 trabalhadores em condições degradantes nas lavouras de cana-de-açúcar, o que representa 47% dos trabalhadores escravizados libertados no período. Porém, como o gado bovino continua recordista em número de fazendas flagradas com trabalho escravo, a diferença se deve ao fato da cana-de-açúcar usar mão-de-obra intensiva enquanto, na pecuária, a quantidade de trabalhadores por fazenda ser menor. Apesar do lançamento em junho de 2009, do Compromisso Nacional para Aperfeiçoar as Condições de Trabalho na Cana-de-açúcar (Acordo de adesão voluntária, não vinculante, assinado pelo governo e pelos setores: empresarial e sindical), o país ainda carece de medidas punitivas no descumprimento da legislação trabalhista. Contudo, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 438/2001 que prevê a expropriação das terras onde ocorreu o crime de trabalho escravo, continua paralisada no Congresso e mesmo as usinas signatárias desse Compromisso ainda continuam praticando irregularidades (Gomes et. al, 2009). De acordo com o Centro de Monitoramento de Combustíveis (CMA) apud Gomes et. al (2009), o ZAE no Centro-Oeste vetou a instalação de novas usinas de açúcar e álcool no Pantanal e na Bacia do Alto Paraguai, seguindo uma resolução do Conama de 1985. Porém, diversas usinas já haviam se instalado na região, quase as margens do influente Rio Paraguai, o principal rio do Pantanal, o que representa ameaça para o bioma. No Mato Grosso, estão diversos cursos d’água que formam o Pantanal, no entanto há seis usinas instaladas na Bacia do Alto do rio Paraguai. Como exemplo, é o caso da usina Alcopan, localizada na principal porta do Pantanal no MT, em Poconé, que foi flagrada com 318 trabalhadores em situação análoga à escravidão em 2005. Diante das irregularidades encontradas no Estado do MT, a Famato se pronunciou contra o ZAE devido, dos 141 municípios existentes, 115 estão afetados pelo zoneamento e

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

19

não podem ter usinas de cana. Como conseqüência, projetos de instalação de novas usinas que estavam em andamento não serão aprovados (como exemplo a usina da Cia Terra planejadas que viria para a cidade de Tangará da Serra e outra da CEVN que se instalaria em Denise). 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Os impactos da globalização, cada vez mais exigirão do gerente de produção decisões que vislumbrem visão do negócio internacional, responsabilidades ambientais, adequação de inovações tecnológicas entre outros. Para falar de planejamento e controle da produção nesse vasto “mar de cana”, precisaríamos entender que planejar requer consideração conjunta da situação presente e da visão de futuro de quem determina o gerenciamento de produção agrícola, porque planejar é projetar o futuro diferentemente do passado, por causas sob nosso controle. Nesse contexto, fica evidente nas análises desse estudo é que os sistemas adotados pelo MAPA e MDA são discrepantes, existe uma lacuna institucional entre esses órgãos que poderiam melhorar a eficiência dos projetos desenvolvidos por ambos, caso houvesse uma integração. Considerando o ambiente atual de acirrada competição, existem inúmeras formas de boas práticas de produção adequadas às exigências do consumidor e em especial os países europeus e EUA. Porém, a prioridade sobre a expansão da monocultura canavieira tem sido o retorno do negócio, que tem se apresentado com resultados muito mais satisfatórios no presente que desvantagens. Diante disso, até que ponto é relevante sintonizar o sistema de produção canavieiro com o ambiente externo e que aspectos (expansão, monocultura, impactos, planejamento, estratégias) realmente interferirão na sustentabilidade da atividade? Dizem que o Brasil vive hoje um cenário econômico favorável, afinal o vento da economia sopra a favor. Sabe-se que a monocultura possui caráter bastante lucrativo pela sua extensão produtiva, porém, as políticas explícitas são suficientes a ponto de que quando esse vento virar seja possível que o país continue em berço esplendido? Que planejamento e controle político de produção garantirão que a cana seja sustentável? É sabido do decreto que atualmente ainda é apenas uma diretriz que determina quais culturas, onde, e em que extensão plantar, considerando-se aqui um zoneamento agroalimentar e sócioeconômico. Porém, a pressão da bancada ruralista contra o decreto é muito forte, que tentará reverter à situação. Assim, é necessário refletir sobre a interferência da política na monocultura canavieira correlacionando ao planejamento e controle da produção, pois essa questão é instigante por ser um tema amplo, exigindo cautela e intensa pesquisa. Por isso, esse estudo instiga a reflexão do ambiente institucional do setor sucroalcooleiro e a interferência da política no planejamento da produção. Destaca-se ainda a maneira utilizada para contextualizar o Planejamento e controle da produção (PCP) haja vista que tal análise surge de uma realidade bem mais complexa que o monitoramento e controle de um processo dentro de uma organização, pois não se atentou a um recorte específico de usina, mas correlacionamos à intervenção política influenciando na realidade matogrossense.

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

20

6 REFERÊNCIAS ALEIXO, Lucia Helena Gaeta e CASTRO, Inês. Memória histórica da indústria de Mato Grosso. Cuiabá: UFMT, 1987. ALEIXO, Lucia Helena Gaeta. Vozes no silêncio: Subordinação, resistência e trabalho em Mato Grosso (1888-1930). Cuiabá: UFMT, 1995. ALVES, Francisco José da Costa. et al (orgs). In Certificação Socioambiental para a Agricultura : Desafios para o Setor Sucroalcooleiro. São Paulo: Imaflora; São Carlos: EdUFSCar, 2008. 300 p. AZEVEDO, Hamilton Jorge de. Uma análise da cadeia produtiva de cana-de-açúcar na Região norte Fluminense. Boletim Técnico n. 6. Disponível em: <http://web0.cefetcampos.br/portal/epex/dppg/nucleos-pesquisa/need/projetos/osrnf/nossas-publicacoes/Boletim6.pdf/view?searchterm=boletim%20tecnico>. Acesso em: 15 mar. 2010. BACCARIN, José Giacomo. A constituição da Nova Regulamentação Sucroalcooleira. São Paulo: Editora UNESP. 2005. 237 p. BARROS, Geraldo Santana de Camargo.; MORAES, Márcia Azanha Ferraz Dias de. A desregulamentação do Setor Sucroalcooleiro. Revista de Economia Política, v. 22, n. 2 (86), abril-junho/2002. Disponível em: <http://www.rep.org.br/pdf/86-9.pdf >. Acesso em: 20 fev. 2010. BATALHA, Mário Otávio (Org.). Gestão Agroindustrial. São Paulo: Atlas, 2007. FIGUEIREDO, Candido de. Novo dicionário da Língua Portuguesa Candido de Figueiredo – 1913. Disponível em: <http://pt.wikisource.org/wiki/Candido_de_Figueiredo_1913/Carrada>. Acesso em: 23 mar. 2010. CONAB. Acompanhamento da Safra Brasileira Cana-de-açúcar, safra 2008./ terceiro levantamento dezembro/ 2008. Brasília: Conab, 2008 COSTA, C. Introdução à Ciência da Sociedade. 2. ed. São Paulo: Moderna. 1995 FAMATO. Federação da Agricultura do Estado do Mato Grosso. Zoneamento da cana-de-açúcar impede que Mato Grosso duplique produção de etanol. Disponível em: <http://www.clicrbs.com.br/canalrural/jsp/default.jsp?uf=1&local=1&action=noticias&id=2660404&section=noticias>. Acesso em: 15 mar. 2010 FAVA, Flávio Eduardo. Ambiente Institucional para a formação do arranjo produtivo local do álcool de Piracicaba. 6. Amostra acadêmica UNIMEP (2008). Disponível em: <http://www.unimep.br/phpg/mostraacademica/anais/6mostra/1/140.pdf >. Acesso em: 10 mar. 2010 FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. Rio de Janeiro: Cia das Letras.2007

Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

21

GRAZIANO da Silva, José. A questão Agrária no Final do Século XXI. Apresentado na Mesa Redonda “Diversas Formas de Acesso a Terra” realizada no INCRA. Brasília: 1995 GOMES, Marcel. et. al. O Brasil dos agrocombustíveis, cana 2009: Impactos das lavouras sobre a terra, o meio e a sociedade. Relatório sobre o setor sucroalcooleiro. Disponível em: <http://www.reporterbrasil.org.br/agrocombustiveis/exibe.php?id=116>. Acesso em: 10 mar. 2010 HALL, P. A.; TAYLOR, R.C. Political science and the three new institutionalism. Oxford: Blackwell Publishers. Political Studies, n. XLIV, p.936-957, 1996 IBGE. Levantamento Sistemático da Produção Agrícola. Rio de Janeiro. v.17 n.3 p.1-74 Março de 2005. PREVITALLI, Fabiane Santana. A expansão da Agroindústria Sucroalcooleira na Região do Triângulo Mineiro/Brasil e implicações sobre o trabalho. Disponível em:<http://www.ifch.unicamp.br/cemarx/coloquio/Docs/gt9/Mesa2/a-expansao-da-agroindustria-.pdf >. Acesso em: 22 fev. 2010. SZMRECÁNYI, Tamás. O planejamento da agroindústria canavieira do Brasil (1930-1975). São Paulo: HUCITEC, 1979. SEPLAN (Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenação Geral). Anuário Estatístico de Mato Grosso - 2002. Cuiabá: Central de Texto, 2002. SLACK, Nigel.; CHAMBERS, Stuart.; JOHNSTON, Robert. Administração da Produção. São Paulo: Atlas, 2007. UNICA (União da Agroindústria Canavieira de São Paulo). Cana-de-açúcar: Produtos. 2003. Disponível em: <http://www.unica.com.br/content/show.asp?cntCode={D6C39D36-69BA-458D-A95C-815C87E4404D}>. Acesso em: 8 nov. 2009.