As Tribos Urbanas Se Defienm Por Redes

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Ciências humanas e sociais | Maceió | v. 2 | n.2 | p. 165-184 | Nov 2014 | periodicos.set.edu.br CONTEXTO DAS TRIBOS URBANAS COM ENFOQUE NA FORMAÇÃO DE IDENTIDADE NA ADOLESCÊN- CIA: UMA REVISÃO INTEGRATIVA E ILUSTRATIVA DOS ANOS CINQUENTA Alessandra Souza 1 Ana Carolina Ferreira 2 Evellyn Damasceno 3 Samara Feitosa 4 Stephanie Marinho 5 Silvia Teixeira de Lima 6 Adriana Alves Marinho 7 Psicologia ciências humanas e sociais ISSN IMPRESSO 2317-1693 ISSN ELETRÔNICO 2316-672X RESUMO As tribos urbanas se definem por redes de amizades que se formam a partir de interes- ses e afinidades em comum, aos quais os membros aderem aos mesmos pensamentos, hábitos e forma de se vestir. O fenômeno aparece comum entre os adolescentes da mo- dernidade que buscam em referenciais externos formas de se estabelecer no mundo. É nesse contexto que as tribos urbanas se revelam como importantes no desenvolvimento dos jovens que se encontram em processo de construnção da identidade. Este artigo discute questões acerca das tribos urbanas junto às particularidades da adolescência. Fazendo ao final uma ilustração descritiva das principais tribos dos anos cinquenta asso- ciada à fundamentação teórica anteriomente abordada. PALAVRAS-CHAVE Tribos urbanas. identidade. adolescência.

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Artigo sobre as tribos urbanas

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    CONTEXTO DAS TRIBOS URBANAS COM ENFOQUE NA FORMAO DE IDENTIDADE NA ADOLESCN-CIA: UMA REVISO INTEGRATIVA E ILUSTRATIVA DOS ANOS CINQUENTA

    Alessandra Souza1

    Ana Carolina Ferreira2

    Evellyn Damasceno3

    Samara Feitosa4

    Stephanie Marinho5

    Silvia Teixeira de Lima6

    Adriana Alves Marinho7

    Psicologia

    cincias humanas e sociais

    ISSN IMPRESSO 2317-1693

    ISSN ELETRNICO 2316-672X

    RESUMO

    As tribos urbanas se definem por redes de amizades que se formam a partir de interes-ses e afinidades em comum, aos quais os membros aderem aos mesmos pensamentos, hbitos e forma de se vestir. O fenmeno aparece comum entre os adolescentes da mo-dernidade que buscam em referenciais externos formas de se estabelecer no mundo. nesse contexto que as tribos urbanas se revelam como importantes no desenvolvimento dos jovens que se encontram em processo de construno da identidade. Este artigo discute questes acerca das tribos urbanas junto s particularidades da adolescncia. Fazendo ao final uma ilustrao descritiva das principais tribos dos anos cinquenta asso-ciada fundamentao terica anteriomente abordada.

    PALAVRAS-CHAVE

    Tribos urbanas. identidade. adolescncia.

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    ABSTRACT

    Urban tribes are defined by networks of friendships that are formed from common in-terests and affinities, to which members adhere to the same thoughts, habits and way of dressing. The phenomenon is common among teenagers of modernity that seek external references in ways to establish in the world. In this context, urban tribes are revealed as important in the development of young people who are in the process of identity construction. This article discusses about issues of urban tribes along the pe-culiarities of adolescence. Making the end a descriptive illustration of the main tribes fifties associated with the theoretical foundation approached anteriorly.

    KEYWORDS

    Urban Tribes. Identity. Adolescence.

    1 INTRODUO

    Com certa analogia s tribos indgenas, pela ideia de sociedade organizada, que se representa por indumentrias e hbitos idnticos, as tribos urbanas se apresentam no contexto moderno habitando diferentes lugares que a cidade oferece. Formuladas a partir de um esforo de diferenciao dos jovens, cada tribo urbana evoca particu-laridades que as distinguem do resto da sociedade e que as identificam.

    As tribos urbanas participam substancialmente no processo de construo da identidade dos jovens que nelas se inserem, visto que a estruturao identitria uma das tarefas essenciais da adolescncia. Nesta fase o adolescente tem uma tendncia a se inserir em grupos, estabelecendo novos vnculos sociais alm dos familiares, a passagem dos jovens por grupos de pares quase que inevitvel, o momento mar-cado pela procura por referncias externas, parmetros que possam ajud-los a se es-tabelecer no mundo. Segundo Bock e outros autores (2008) o grupo de amigos um importante referencial para o jovem, determinando o vocabulrio, as vestimentas e outros aspectos do seu comportamento. Sua moral individual se estabelece mediante a moral do grupo.

    indispensvel ressaltar que, assim como os grupos de convvio, as tribos ur-banas representam um importante contexto socioafetivo alternativo, especialmente quando o adolescente busca maior autonomia procurando se desligar dos pais na infncia. Rangel e outros autores (2012) fazem entender que o grupo, em determi-nado perodo, ajuda o adolescente a configurar-se, a recompor-se e a constituir-se sujeito autnomo e psiquicamente independente. Para isso, os jovens encontram nas tribos a permisso para ser o que so, fazendo emergir formas de subjetividade. As particularidades surgem por meio de como ele percebe o outro e de como o outro

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    o percebe. Ele se torna nico ao mesmo tempo em que se apresenta homogneo dentro de um grupo de semelhantes.

    Tendo em vista todo o exposto fica evidente que para ter uma compreenso enriquecida sobre as tribos urbanas necessrio recorrer no s ao conceito dessas tribos e a historia de cada uma, mas entender a lgica dos indivduos que as forma-tam, a maneira como constroem seus relacionamentos, buscam prazer e satisfao, incluindo os aspectos sociopolticos do perodo de fundao de cada tribo. Para tanto, o presente estudo tem por objetivo abordar o fenmeno das tribos urbanas associado ao processo de formao de identidade dos adolescentes reportando as principais tribos dos anos cinquenta.

    2 A DINMICA DAS TRIBOS URBANAS SOBRE A CONSTRUNO DE IDENTIDADE

    Tribo urbana foi um termo elaborado, em 1985, pelo socilogo francs Michel Maffesoli, para designar novas formas de organizao entre indivduos num contexto denominado ps-moderno. O socilogo estudou e teorizou as redes de amizades que se formam a partir de interesses e afinidades em comum, aos quais os membros aderem aos mesmos pensamentos, hbitos e forma de se vestir.

    Oliveira et all (2003) citam Maffesoli por sua obra O Tempo das tribos: o decl-nio do individualismo nas sociedades de massa, definindo tribos urbanas por agru-pamentos semi-estruturados, constitudos predominantemente de pessoas que se aproximam pela identificao comum a rituais e elementos da cultura que expressam valores e estilos de vida, moda, msica e lazer tpicos de um espao tempo. A mes-ma autora acrescenta que uma tribo define-se por uma sociedade frouxa, pela lgica hedonista e o no compromisso com a continuidade na linha do tempo, expressa na valorizao do aqui e agora. Ao mesmo tempo, seu carter dinmico e em constante transformao lhe confere um potencial criativo e inovador que no pode ser despre-zado (CAMILO et al., 2003).

    Pais e Blass (2004) descrevem que membros de uma mesma tribo se utilizam de linguagens, comportamentos, modos de pensar e viver, similares, manipulando coi-sas e corpos que viram signos de identidade. Os autores citam Eunice Durham (1977) na definio desse processo de organizao e reorganizao das representaes na prtica social, como dinmica cultural que constri e reconstri identidades.

    O fenmeno das tribos como forte elemento da constituio de identidade funciona, tambm, como manuteno da necessidade de afiliao do ser humano, que se observa em estudos de dinmica grupal. A verdade que o homem pos-sui necessidades sociais e que a participao no grupo tem a funo de satisfaz--las (PISANI, PEREIRA e RIZZON, 1994, p. 128). Considera-se que um nico grupo

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    no satisfaz todas as necessidades de uma pessoa, isso explica sua participao em muitos outros. A esse respeito Camilo, Oliveira e Assuno (2003) salientam que a relao do adolescente com o grupo no de fidelidade, como seria esperado em grupos contratuais. Essa livre circulao entre diferentes tendncias pode levar a migrao de uma tribo a outra.

    As expresses tribais podem transitar entre as fases do desenvolvimento hu-mano, mas no universo jovem, principalmente na adolescncia, que elas se cen-tralizam. A figurao tribal perdura no tempo em que o individuo mantiver interesse pela atividade, enquanto for membro da tribo ele se porta como personagem de um enredo imaginrio (GONALVES, 1999 apud CAMILO et al., 2003). Essa atuao per-sonificada dos tribalistas se faz anloga ao arqutipo persona proposto por Jung em psicologia analtica, se referindo face pblica ou o papel que a pessoa apresenta aos outros (SCHULTZ e SCHULTZ, 2011). Seria a impresso que o sujeito provoca nas pes-soas, aquilo que se aparenta ser. Assim, a pessoa pode trocar suas mscaras configu-rando para cada situao da vida um papel diferente e para cada papel uma persona que evoca a exposio de determinados elementos de subjetividade e a ocultao dos outros (MAFFESOLI, 2000). Jung presumiu que a persona necessria porque as pessoas so foradas a representar vrios papis na vida para se sarem bem na esco-la, trabalho e nas relaes sociais.

    Para delinear o que atrai aos jovens se envolverem em alguma tribo, Camilo, Oliveira e Assuno (2003) questionaram adolescentes sobre a significao acerca das tribos urbanas. Como fonte de suplementos alternativa de subjetividade e per-tencimento que aqueles buscam, foram identificados alguns aspectos semiticos que os abastecem. O resultado do estudo levou a proposio de trs elementos comuns s tribos urbanas: imagem esttica, prticas de lazer e estilo musical. Existe uma in-terao entre esses elementos que regulam a maneira com que os membros da tribo se situam no mundo.

    Sobre imagem esttica, nota-se como definidora da imagem do grupo. No basta para os integrantes de a tribo ter um visual semelhante entre si, necessrio se mostrar diferentes dos demais, a roupa, o cabelo, os acessrios que compem essa esttica do grupo. No compartilhar essa imagem ser normal, ou, no ser nada. Cardoza (2003, p. 2) ressalta essa valorao da esttica da imagem ao citar Feathers-tone (1997): a tica da esttica o modo contemporneo de ordenar-se no mundo, e ela prpria constitui-se num fator de favorecimento ao aparecimento das tribos. No perodo em que o culto beleza e imagem impera redefine o senso de identidade que o individuo pode cultivar de si.

    Acerca das prticas de lazer, se verificou que o compartilhamento do gosto pelas mesmas atividades sociais e esportivas uma marca importante na socialidade dos agrupamentos urbanos de adolescentes. Nos espaos da cidade as tribos criam

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    seu cenrio, assinalam neles e distinguem o territrio. Camilo e outros autores (2003) contriburam ao citar Madrid (2001), acrescentando que algumas tribos marcam sua especificidade pela ocupao e domnio de certo recorte do espao urbano praas, escadas, pistas de skate etc. no qual inscrevem sua marca pelo graffitti; pichao, presena ruidosa etc. A diferenciao espacial entre as tribos traduz que cada uma tem um estilo prprio, diferenciado, o que demarca seu territrio revelando a ideia de uma estrutura organizada, porm imaginria, j que esses se apropriam dos espaos pblicos da cidade.

    A preferncia por um mesmo estilo musical mantm estreita a interdependn-cia com a prtica de lazer, tribalistas frequentam os mesmo bares, pubs e eventos sociais para apreciar determinado estilo musical. Os diversos lugares de encontros existentes na cidade so ambientes diferentes onde grupos de pessoas renem-se para a partilha de emoes por meio da msica, criando um espao potencial de acolhimento. Em Maffesoli as emoes partilhadas e consolidadas so vividas como fatos constitudos por e para as tribos que inscreveram suas histrias neste lugar (MAIA, 2005, p.79). Nesse contexto, os adolescentes, por meio da msica, na msica e das relaes que surgem da experincia musical, passam a liberar suas emoes e desenvolver novas formas de comunicao.

    Estabelece-se que no cenrio moderno e globalizado que as tribos urbanas se revelam como importante contexto de desenvolvimento dos indivduos. Jovens com vontade de se diferenciar e de se identificar renem-se em grupos, partilhando das mesmas ideias e gostos, pertencer a uma tribo permite ao sujeito mostrar ao outro quem ele ao mesmo tempo em que se reconhece. Logo, diferenciao e igualdade fazem noo de identidade.

    3 PARTICULARIDADES DA ADOLESCNCIA

    Em estudos sobre a histria da adolescncia se entende que a fase uma construo da modernidade e tem a ver com as necessidades, as formas de vida impostas pela era industrial. Mais adiante, Erik Erikson (1976), envolvido com a teo-ria da identidade do ego, formalizou o conceito de adolescncia caracterizando-a como uma fase especial no processo de desenvolvimento (BOCK et al, 2008, p. 297), a fase na qual as pessoas tm que enfrentar e resolver a crise da sua identidade bsica do ego. Schultz e Schultz (2011) comentam que moldar uma identidade e aceit-la no tarefa fcil, os adolescentes fazem experincias com vrios papis e ideologias na tentativa de determinar os mais compatveis com eles, a autoimagem formada nessa fase integra as ideias a respeito do que se e o que se quer ser e o que os outros pensam a respeito. Nessa abordagem, a adolescncia denota a busca pela identidade adulta por meio do autoconhecimento e autodesenvolvimento via papis sociais. Aberastury e Knobel (2000) recortaram a transio normal na adoles-cncia no enfoque psicanaltico:

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    Busca de si mesmo e da identidade, tendncia grupal, necessidade

    de intelectualizar e fantasiar, crises religiosas, deslocalizao

    temporal, evoluo sexual manifesta, atitude social reivindicatria

    com tendncias anti ou associais, contradies sucessivas,

    separao progressiva dos pais e constantes flutuaes de humor.

    (ABERASTURY, KNOBEL apud Bock et al., 2008, p. 299).

    Embora fatores biolgicos renam foras que determinam o estgio da adoles-cncia, as condies sociais e ambientais s quais o sujeito exposto influenciam a for-ma pela qual a fase geneticamente predeterminada se realiza. Nessa natureza, o ado-lescente transcorre o estgio, contando com um conjunto de informaes biolgicas, psicolgicas, valorativas e relacionais que funcionam como uma rede de foras cons-trutivas de sua identidade pessoal. Ao passo que a fase seja favoravelmente vivida, o jo-vem se definir um adulto produtivo e maduro. Ciampa (1994) compreende a revelao identitria do sujeito como resultado de uma construo coletiva, psicossocial, num dado momento histrico. Considerando que a identidade se coloca como continua e progressiva na realizao do individuo, seu contedo no se esgota na adolescncia.

    Como a percepo de si dada pelo reconhecimento recproco dos indivduos, as tribos urbanas surgem do esforo de diferenciao dos jovens ao mesmo tempo em que buscam se igualar. Essa justificativa fundao das tribos um tanto con-traditria, entretanto, pode ser reforada pela citao Coutinho (2001, p.1) o apareci-mento das tribos no cenrio social contemporneo, reflete dois processos que, para-doxalmente, caminham juntos na complexa sociedade de consumo em que vivemos: a uniformizao e a pluralizao.

    Assim, os adolescentes que desejam suprir suas necessidades sociais por meio de amizades, socializao, aceitao em novos grupos, intimidade sexual e outros (SCHULTZ e SCHULTZ, 2011), estabelecem as tribos urbanas como resposta inquietude, ousadia, sonhos, curiosidades, conflitos, solido etc., do referencial jovem. Camilo e outros autores (2003) observaram que dinamismo da vida contempornea e a intensificao dos fluxos humanos parecem agregar maior importncia aos grupos de pares como fontes impor-tantes de identificao e referncia comportamental dos adolescentes.

    A psicloga Tessari (2005) alerta que a busca dos jovens, cada vez maior, por grupos que tenham gostos semelhantes com os seus revela a formao de uma iden-tidade que pretende ser diferenciada daquilo que foi aprendido com os pais da infn-cia. preciso cuidado e orientao dos familiares para que esses grupos no interfi-ram de forma negativa na vida do adolescente, como no caso das gangues.

    O grupo de pares constitui uma fonte de socializao menos

    repressiva que a famlia, assumindo importante papel como

    fonte de referncia social. Entre seus pares, com freqncia,

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    os adolescentes so menos exigidos a negociar perspectivas e

    encontram oportunidades de legitimar os prprios sentimentos

    e vises de mundo, norteados pela intensa identificao,

    compreenso e aceitao pelo grupo. (SILVA et al.,2012, p.135).

    Cardoza (2003) considera que conhecer algum no mais seria adentrar na sua biografia e estrutura histrica familiar, mas sim agir junto, e esta ao representaria atitude, onde se voc faz isso e eu tambm fao, ento participo de sua tribo e te-nho uma identificao com ela, ou seja, me relaciono com voc. nesse formato que as tribos representam um importante contexto socioafetivo alternativo, a famlia ps-moderna encontra-se na condio de perdedora de seus referenciais principais para uma formao de sujeito, vindo a ser substituda, pelo amparo e acolhimento da iluso a que as tribos se oferecem (CARDOZA, 2003).

    Apesar dos aspectos retratados estarem claramente associados a um enquadre da experincia adolescente normal, tambm comum ver jovens que no tenham a fase da adolescncia definida. O que se observa o abandono da escola muito cedo para trabalhar oito horas dirias antes de se completar quatorze anos de idade. Para cada uma das classes sociais a adolescncia ter uma durao peculiar. Um garoto que precise enfrentar o mundo do trabalho muito cedo e em condies bastante ad-versas ter um amadurecimento acelerado (BOCK et al., 2008, p. 302).

    Alm dos adolescentes trabalhadores e os excludos da escola, jovens que foram ar-rebatados pelas prticas infracionais, portadores de doenas crnicas, deficientes fsicos, sensoriais e mentais, esto associados a diferentes condies de insero/excluso social que vo determinar certas especificidades da adolescncia como estudo (CAMILO et al., 2003). importante discutir que adolescentes que se desenvolvem nessas condies po-dem sofrer interferncia na socializao com grupos de pares que contribuem e poten-cializam a autonomia individual mediante a consolidao da identidade pessoal e social.

    Como aqui visto, as diferentes variaes da vida do sujeito contribuem para constituio da sua identidade. Sobre o aspecto social que o foco desta pesquisa, faz-se acordo com Guareschi (apud SALVARO, 2008) quando afirma que o sujeito na verdade, algo como uma soma total das relaes que estabelece em sua vida. O indivduo se forma a partir das relaes e por isso possui uma multiplicidade de va-lores em consequncia dos diversos grupos que participa. Os grupos de amizade se revelam como uma segunda famlia na vida dos jovens que encontram neles apoio, liberdade de expresso e aceitao das suas caractersticas pessoais.

    4 METODOLOGIA

    A pesquisa deste estudo foi realizada por meio de reviso bibliogrfica onde foram pesquisados artigos cientficos e peridicos nas bases de dados do SCIELO e

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    GOOGLE ACADMICO por meio dos seguintes descritores: tribo(s) urbana(s), identi-dade e adolescncia. Literaturas de sociologia e psicologia foram tomadas por base para o trabalho. Para ilustrar as tribos urbanas que configuram a dcada de 1950 e verificar o contexto sociopoltico do perodo foram realizadas prticas investigativas em blogs e comunidades virtuais, fundados por membros e pessoas interessadas no tema, tendo por base as principais tribos: Greasers, Teddy Boys, Bodgies e Widgies, Beatniks, Rockers e Surfistas.

    5 RETRATOS DOS ANOS DOURADOS

    A dcada de 1950, conhecida como o perodo dos anos dourados, se marcou pelos grandes avanos cientficos, tecnolgicos e mudanas culturais e comporta-mentais. Nesta dcada foi dado inicio s transmisses televisivas, provocando uma grande mudana nos meios de comunicao. No campo da poltica internacional, estava acontecendo a Guerra Fria terreno preparado pelo fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945, que alterou significativamente o alinhamento poltico e a estrutura social do mundo.

    Foi pouco antes dos anos 1950 que surgiram as primeiras tribos urbanas, com mais consistncia nos estados americanos, na tentativa dos jovens de se desvincular da rigidez de dcadas anteriores, por meio da construo de novas ideologias. Essa ideologia pode ser entendida como as representaes que as classes sociais constro-em a partir das suas condies materiais de existncia (FOCHI, 2006).

    Ao mesmo tempo em que se formavam as tribos uma gama de variedades sur-gia no mercado consumidor derivado do sistema capitalista dos Estados Unidos. E apesar de na poca as informaes no se propagarem na velocidade no sculo XXI, os meios de comunicao, principalmente a televiso, influenciaram nos estilos dos jovens pelo mundo. As tribos passaram a ser reflexa do moderno, do arrojado e do imediato, essa ideia refletiu no s no mercado de consumo, mas transformou o jo-vem e sua ideia acerca da autoimagem.

    Coutinho (2001) entende que a transitoriedade e o imediatismo se congregam numa certa apologia do presente vivida na tribo, no havendo projetos futuros ou preocupaes com o destino da tribo; o prprio movimento do consumo que de-termina o futuro destas tribos. Essas constituies dos estilos impuseram limites que fecham o cerco em torno da tribo dando margem ao surgimento de outras novas redes; em exemplo disso aparecem os skatistas que emergiram do surf e passaram a se caracterizar num formato diferente do inicial para difundir seu estilo prprio e mais demandas para o consumo.

    Na musicalidade da poca surgiu o Rock'nRoll pelo mundo em um estilo dan-ante com Elvis Presley em 1956, seu estilo, penteado, seu famoso rebolado, os seus

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    gestos provocantes e o seu ar de rebeldia foram imediatamente incorporados pelos jovens da classe mdia urbana, Elvis significava uma maneira de romper com o es-tablishment, destacar-se como indivduo e romper com os valores tradicionais da sociedade. Mais ao final da dcada formou-se a banda de rock britnica The Beatles.

    Na moda dos anos 1950, com o fim dos anos de guerra e do racionamento de tecidos e produtos de beleza, a mulher se tornou mais feminina e glamurosa. O clima era de sofisticao e era tempo de cuidar da aparncia. A maquiagem estava na moda e valorizava o olhar, o que levou a uma infinidade de lanamentos de produtos para os olhos: sombras, rmel, lpis para os olhos e sobrancelhas, alm do indispensvel delineador. Para os cabelos, o auge eram as tintas, cremes, gel, cera capilar e as loes alisadoras e fixadoras. O clssico topete embalou os anos 1950, suportado por simples pente e gel de cabelo, mulheres, tambm, destacavam a parte frontal do cabelo pen-teada pra trs. O topete simboliza o rock na fase inicial, este e demais elementos es-tticos (jeans, couro, jaquetas, coletes, culos escuros, botas etc.) que compreendiam as tribos da dcada, ainda comportam um estilo moderno nos atuais.

    6 DESCRIO DAS TRIBOS

    6.1 GREASERS

    Enquanto o rocknroll americano se espalhava pelo pas, adolescentes americanos predominantemente tnicos adotavam penteados com cabelos puxados para trs, for-mando longos e espessos topetes, cheio de creme, cera capilar, gel de cabelo, tnicos ou pomadas. Essa tendncia tornara-se um meio de comunicao e identificao dos jovens tribalistas, visto que, na sociedade contempornea as identidades so demarcadas pelos hbitos de consumo (FOCHI, 2006). Foi pelo visual greased-back (engraxado para trs) que o ttulo da tribo tomou forma nas gangues de rua do sul e nordeste dos Estados Unidos. O estilo greaser e a subcultura se tornaram popular pelo aspecto de rebelio aos modos e aos costumes expressados pelos jovens, que na sua maioria eram brancos e da classe trabalha-dora. Ressalva-se que os I se utilizavam da rebeldia simplesmente para se divertir.

    No figurino da tribo, normalmente incluam-se camisetas brancas ou pretas com as mangas arregaadas, camisas brancas com casacos, t-shirts, camisas de ma-lha italianas, camisas ao estilo daddy-o-style, jaquetas pretas, azul ou caqui, casaco preto ou marrom, jaquetas jeans da Levis, jaquetas de couro, calas Levis, calas de algodo largas. Os calados incluam botas estilo motociclista, militar, de engenheiro e de vaqueiro e tnis All-stars. Os acessrios comuns eram creepers, bandanas, cha-pus de aba curta, boinas, coppola, e carteira de correntes. O penteado podia variar, mas sempre feitos com pomadas e gel. A maneira que os jovens das tribos se vestiam revestia-se de significado simblico, sendo transpassada: nas roupas, maquiagens, penteados etc., uma forma de resistncia s culturas dominantes (PAIS, 2008).

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    Ao contrrio dos rockers britnicos que foram exclusivamente motociclistas, os greasers americanos ficaram conhecidos mais por seu amor aos carros Hot Rods (carros antigos modificados), contudo ambas subculturas tinham em comum o estilo musical rock'n'roll e rockabilly bastante tocados na poca.

    O tempo dos greasers foi muito significativo para a histria americana. Alm de ter feito uma marca no mercado da moda, foi o tempo de rompimentos iniciados pelos grupos para pensar e favorecer a individualidade.

    6.2 TEDDY BOYS

    Formada em Londres e espalhada por todo o reino Unido, o teddy boys foi uma subcultura tipificada por jovens rapazes que usavam penteados pomposos com roupas inspiradas nas indumentrias masculinas da era eduardiana mas atriburam componentes mais agressivos ao seu estilo. Esses neo-eduardianos eram bad-boys rebeldes e elegantes que rejeitavam as tradies impostas na poca. O toque mas-culino nas vestimentas no consolidou um empecilho para que garotas da poca, tambm, pudessem se tomar gancho nesse embalo, essa apropriao feminina de vesturios com corte masculino pode simbolizar um desejo de emancipao das mu-lheres (PAIS, 2008).

    Vestiam casacos longos de golas, coletes brocados, peas com detalhes em ce-tim ou veludo, casacos de l com vrios bolsos, camisas brancas de gola alta, lenos, chapu coco, creepers, gravatas finas, calas muito justa geralmente preta e sapatos camurados e/ou bicudos. Interessante que esses malvados se preocupavam que suas roupas deveriam ser feitas sob medidas em alfaiates, elegncia era primordial. Os cabelos eram penteados com brilhantina ao estilo quiff (topete) com costeletas e du-cktail (rabo de pato). Todo figurino seguia o padro de consumo da poca, mas sem deixar de ter o toque esttico da tribo, deveriam ser reconhecidos logo quando vistos.

    Em Fochi (2006), a primeira distino que se pode fazer entre um grupo de pessoas e outro, pela imagem, pela forma como as pessoas se apresentam, enfim, pela esttica, muito mais que qualquer outro aspecto. Entre os gneros existia uma diferena mnima nas vestimentas, as garotas tinham um estilo andrgino corriam riscos em usar roupas masculinas, poderiam ser presas, agredidas ou sofrer perverso por supostamente serem homossexuais os cabelos eram curtos, usavam maquia-gem, blusas pretas, camisas brancas, saias na panturrilha, calas justas e alguns aces-srios e peas masculinas.

    Conhecidos pelas brigas costumeiras com os mods subcultura que embora tenha origem ao final da dcada de cinquenta nos anos sessenta que ganha des-taque os teddy boys usavam da fora para se firmarem e impor respeito quando preciso. Essa intolerncia pode assumir a forma de violncia real, que se explicita na

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    hostilidade e rivalizao, geradoras de conflitos entre grupos (CAMILO et al., 2003). Assim, foram considerados rebeldes sem causa, orgulhosos, a ovelha negra da so-ciedade britnica.

    Essa subcultura britnica associou-se ao rockn'roll e ao rockabilly no estilo mu-sical, a msica era seu nico veculo de comunicao com o mundo exterior. Quando os teddy boys e as teddy girls se encontravam inventavam novos passos de dana, novas grias, discutiam msicas, aumentando a distncia entre eles e a gerao de seus pais que tentavam repreend-los. Esses pais muitas vezes eram intolerantes com som dos toca-discos s alturas e sempre as mesmas msicas, esse padro se repete entre as famlias de hoje em dia.

    O compartilhamento de cdigos (grias, jarges, msica,

    pautas comportamentais), de elementos estticos (estilos de

    vestir, adornar e expressar-se por meio do corpo) e de prticas

    sociais (relativas ao comportamento poltico e s formas de

    lazer, de circulao e apropriao do espao urbano e da

    cultura) contribui para definir a imagem social de cada tribo.

    (CAMILO et al., 2003, p. 64)

    6.3 BODGIES E WIDGIES

    Equivalentes aos teddy boys ou aos greasers, a tribo urbana Bodgies e Widgies oriunda da Austrlia e da Nova Zelndia. O termo bodgie expressa algo (ou ocasio-nalmente algum) falso, e nessa ideia foi aplicado aos jovens rapazes australianos, especialmente da dcada de cinquenta, que mostravam conformidade com certas modas e comportamentos grosseiros anlogos aos britnicos teddy boys. Widgie era a sua contraparte feminina. Por serem os primeiros adolescentes rebeldes na Austrlia e talvez por sua falta de originalidade no estilo, a tribo urbana foi conceituada origi-nalmente por fake, false, inferior, worthless (falso, falso, inferior, sem valor), dando o significado a algo falso, pouco confivel e malfeito.

    Ao que parece, os teddy boys comparecem como a tribo original e os bodgies sua reproduo, contudo, associando essa questo formao da identidade, no s nas diferenas que os adolescentes se definem, se observar a dinmica interna das tribos so entre os semelhantes que os jovens costumam se encontrar. Ento esse ser falso estigmatizado pela sociedade ter sim grandes benefcios pela formao da tribo, o que constri a identidade do sujeito a atividade que ele executa (BOCK et al., 2008), o que no inclui, necessariamente, serem inditas.

    Frequentemente retratados nos meios de comunicao como desordeiros, os membros de ambos os gneros construram uma subcultura em torno de motos, rocknroll e Elvis Presley que chocavam os pais. Como toda tribo, esses jovens bus-

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    cavam a identidade grupal em marcadores imaginrios: a roupa, o cabelo e os aces-srios que compunham a esttica do grupo (CASTRO, 1998 apud SANTOS, 2013). Os rapazes e moas tinham o cabelo alisado e seu o uniforme era cala jeans apertada e jaquetas de couro. Atualmente, os membros dessa tribo seriam considerados no muito rebeldes e ningum tomaria qualquer aviso deles, mas nos anos cinquenta o seus comportametos chocavam pela ruptura dos padres do poca.

    6.4 ROCKERS (MOTO CLUBES)

    O ttulo rockers denomina uma subcultura juvenil amante das motocicletas, mais especificamente as da categoria caf racer. Oriunda do Reino Unido, a tribo reunia jovens da classe operria que aparecia pelos bares, clubes, rodovias e eventos relacionados. Os rockers tambm eram conhecidos pela sua rivalidade com os mods, que os referia como greasers ou graxa como insulto, por esse motivo o uso dos ter-mos greasers e rockers bastante intercambivel no Reino Unido.

    Os rockers compravam motocicletas de fbrica padronizadas, faziam ajustes e modificaes para aparecerem como motos de corrida ao seu estilo. A sustentao destas identificaes se refere posse ou no de determinados objetos que se arti-culam na composio da imagem da tribo. A imagem de si cultivada e cultuada tal como os artistas criam um objeto de arte, para uma apreciao esttica (COUTINHO, 2001). Ento, mais que diverso ou transporte, as motocicletas conferiam-lhes um efeito que intimidava os demais.

    O visual de motociclista rocker foi influenciado pelos padres dos ex-militares e pilotos estadunidenses que no ps-guerra teriam feito da moto o veculo para a busca de adrenalina, partindo disso adequaram ao seu estilo a praticidade que necessitavam nos trajes. As vestes se traduziam em jaquetas de couro muitas vezes adornadas com taxas de metal, remendos, emblemas e pinos, luvas, capacete, culos de aviador, calas de couro ou jeans, camisetas, bons de couro, botas de cano alto. Para as mulheres se incluam saias gods, saias franzidas, plissadas ou pregueadas, cardigans, luvas brancas, lenos no pescoo, sapatilhas, botinhas, tnis baixo, camisetas e regatas. Influenciados pelos dolos do rock mantinham seu penteado no lugar com creme num simples ou exagerado topete. A forma como os rockers apresentavam nas roupas, acessrios e no corpo comunicavam para a sociedade sua identidade e a pertena tribo.

    Originalmente, os rockers se mostravam contra o uso de drogas, para eles, to-das as drogas eram algo para ser desprezado. Sua antipatia por qualquer pessoa co-nectada com as drogas era intensa, principalmente quando se referia aos mods que aceitavam o uso de anfetaminas e os provocavam nas brigas por cham-los de ma-ricas. Essa narrativa transparece a ideia de conservao da unidade interna do grupo, necessria proteo de sua estrutura, depende do ataque ao outro, todo aquele que representado como sendo de fora (CAMILO, et al., 2003).

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    No contexto geral dos estilos moto clubes, existiram grupos com tendncias de-sagradveis e muitos acontecimentos vieram a denegrir a imagem dos motociclistas, principalmente pela imprensa sensacionalista da poca que acusava os motociclistas de arruaceiros e desordeiros.

    Adicionando que algumas produes de Hollywood incentivavam verdadeiros predadores a criarem Moto Clubes e constituir gangues, o que fez da dcada de cin-quenta uma pgina negra na histria do motociclismo em alguns pases. Para esse contexto, Fochi (2006) pertinente ao dizer que quando a mdia utiliza o termo tribo em uma notcia negativa, referindo-se a uma determinada tribo que cometeu algu-ma infrao ou ato de vandalismo, as pessoas prendem-se ao termo tribo e denota que toda ela age da mesma maneira, fazendo prtica de atos condenveis, ao invs de conotar que as atitudes podem ser especficas de indivduos entre aquela tribo. Felizmente, mais tarde as motocicletas voltaram a ser tema de Hollywood com Elvis Presley iniciando a mudana da imagem do motociclista com o incio da fase romn-tica do motociclismo, que seguiu at o final da dcada de 1970.

    .

    6.5 BEATNIKS

    Na mesma dcada dos greasers, tambm nos Estados Unidos, surgiu outra subcultura com outros estilos e formato. Ao passo do romantismo os beatniks fo-ram uma das primeiras culturas jovens a mostrar no seu vesturio o luto por um estado de guerra em que no viam sentido e do qual no queriam participar. Os beatniks hoje so vistos somente sob a esttica de boemia intelectual, mas sua for-mao se deve a iniciativa de protestar o estilo de vida materialista em sequncia Segunda Guerra Mundial.

    Como um movimento de contracultura, as principais caractersticas desse subgrupo era a valorizao da natureza, luta pela paz, respeito a minorias raciais e culturais, liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos, o conceito p na estrada, fazer sua prpria revoluo cultural por meio da literatura. Viajavam sem destino e com suas poesias, musicas, mudaram a vida de milhares de pessoas, fa-zendo com que eles vissem o mundo de outra maneira. A gerao que surgia nesse meio entrava num movimento de busca por um estilo de vida que fugisse do padro escola e famlia. Magnani (1992) refora esse sentido da tribo designando que existe uma tendncia oposta ao gigantismo das instituies e do Estado nas sociedades modernas, a tribo permitiria agrupar os iguais, possibilitando-lhes intensas vivn-cias comuns, o estabelecimento de laos pessoais, a criao de cdigos de comu-nicao e comportamento particulares. A tribo agrega algo pessoal, que conforta os cidados isolados na grande metrpole.

    Cultos, os beatniks circulavam pelos cafs e pores onde escutavam jazz e ou-tros ritmos considerados cult. O estilo adotado por eles poderia ser analisado por

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    rituais de resistncia, violaes simblicas ordem social dominante (PAIS, 2008). Os protestos traduziram na esttica a marcao do luto pela sociedade e as guerras. Os beatniks (gastos, corrodos) adotaram em seu uniforme, peas com ar de despoja-mento, cala Levis, camisetas, blusas de gola rol ou largas, camisas para fora da cal-a, boinas, cabelos bagunados, barba e bigode, sandlias e uma bolsa para carregar os livros dos jovens intelectuais.

    6.6 SURFISTAS

    De inicio, o surf se fundiu numa prtica religiosa que servia para distino so-cial no Hava e na Polinsia. No perodo ps-guerra o surf popularizando-se na costa oeste dos Estados Unidos virando uma moda entre os jovens, principalmente na Ca-lifrnia onde fizeram das praias seu lugar. Para Pitta (2005) a lgica dos jovens para organizarem seu espao cotidiano puramente afetiva, os grupos e tribos investem nos lugares da cidade e fica l por causa de alguma razo emocional, um sentimento que no tem nenhuma explicao racional.

    O Surf em si como um esporte restrito, no impediu aos jovens que cur-tiam deslizar sobre as ondas propor uma subcultura particular e um lifestyle (estilo de vida) para os praticantes. Loiros (pela parafina e pelo sol) e bronzeados o ano inteiro, os surfistas eram reconhecidos por jovens com gosto pela natureza e pela vida saudvel. O esteretipo do surfista geralmente se associava a algum bonito que no possua outras preocupaes mais alm das ondas e se relacionar com os pares e garotas ao som do surf music, ou seja, estar no mundo para compartilhar sentimentos, emoes e prazeres. Era comum que alguns jovens no praticantes de surf, partilhassem do esprito da tribo e a elas pertencerem o que conta o fato de estar junto que promove o sentir junto, cujo prottipo a vibrao de uma torcida pelo seu time (COUTINHO, 2001).

    As roupas dos surfistas eram praianas em todo lugar que fossem para acentuar bem o seu estilo esportivo e despojado. Vestiam calas ou cales largos, t-shirts com padro havaiano, culos de sol e as roupas emborrachadas para o surf. Duran-te o vero utilizavam chinelos que eram substitudos por calados desportivos no inverno. As garotas que se identificavam ao estilo, tambm, se apresentavam loiras e bronzeadas. Entre as mulheres no era comum a prtica do surf, mas por terem namorado surfista as fez dominar toda a linguagem e cdigo da tribo. Em seu ves-turio incluam saias curtas, cales ou calas com padro havaiano, tops ou cami-ses justos e sandlias nos ps.

    Em tempos de mar baixa para o surf, os jovens californianos passaram a im-provisar tbuas sobre rodas para surfar no asfalto, isso pode apontar que a tribo dos skatistas de anos mais tarde teve sua fundao ligada aos surfistas.

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    7 CONSIDERAES FINAIS

    Por meio dos estudos com referenciais tericos sobre as tribos urbanas inseridas na formao da identidade dos jovens do perodo moderno, juntamen-te com a anlise realizada sobre as tribos urbanas dos anos cinquenta, faz-se concluso que a participao em alguma tribo urbana promove benefcios aos jovens que buscam referenciais durante sua formao pessoal. O pertencimento s tribos aparece positivamente quando refora nos adolescentes sentimentos de pertena, proteo, de partilha e de convvio. Mas infelizmente algumas tribos se conduzem em comportamentos drogativos e violentos associados aos ado-lescentes de baixa tolerncia.

    Apesar dos comportamentos de risco associados a algumas tribos a inser-o do jovem numa dessas redes no precisa acarretar alarmismo. A demons-trao de interesse em dilogos por parte dos pais com o adolescente permite conhecer as prticas do seu grupo permitindo avaliar a periculosidade dos com-portamentos. importante se atentar ao fato de que os jovens se apropriam da imagem esttica, formas de lazer e do estilo musical das tribos como forma de se identificar no mundo e de se comunicar com ele. A tendncia e estilo das primeiras tribos urbanas ainda influenciam nos padres comportamentais dos jovens de hoje em dia, estes fazem atualizaes ou sugerem novas modalidades, contudo, os aspectos bsicos da adolescncia se mostram os mesmos, indepen-dentemente do perodo.

    A exposio dos padres das tribos urbanas da dcada de 1950 propor-cionou ao trabalho a efetivao do exposto terico. Em anlise aos materiais sobre tribos urbanas e incluindo as de perodos especficos percebeu-se que so poucos os estudos publicados acerca desse assunto, principalmente na rea da psicologia que aborda as tribos como reflexas do processo de formao identi-tria dos indivduos jovens. Ficou perceptvel que a sociologia a rea que mais publica sobre a temtica.

    Cabe ento psicologia desmistificar, estudar e desenvolver mais pesqui-sas de campo sobre o fenmeno das tribos urbanas, que pode ser uma porta de entrada para o sucesso nos campos de atuao com adolescentes; uma boa comunicao e a no estigmatizao do jovem concede a chave para uma rela-o profissional-adolescente otimizada. Sugerem-se, ainda, estudos associados expanso da tecnologia que leva a criao de novas comunidades e muitas vezes terminam por substituir as tribos presenciais.

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    REFERNCIAS

    BOCK, Ana; FURTADO, Odair; TEIXEIRA, Maria. Psicologias: uma introduo ao estu-do de psicologia. 14.ed. So Paulo: Saraiva, 2008.

    CAMILO, Adriana. A.; OLIVEIRA, Maria C.; ASSUNO, Cristina. Tribos urbanas como contexto de desenvolvimento de adolescentes: relao com pares e negociao de diferenas - Temas em Psicologia da SBP, v.11, n.1, p.61-75, 2003. Disponvel em: . Acesso em: 4 nov. 2013.

    CARDOZA, Isabela F. A sociedade ps-moderna e o fenmeno das tribos urbanas - Lato & Sensu, Belm, v.4, n.1, 2003. Disponvel em: . Acesso em: 4 nov. 2013.

    CIAMPA, Antonio C; LANE, Slvia T. M., CODO, Wanderley. Psicologia Social: o ho-mem em movimento. 13. ed. So Paulo: Brasiliense, 2004.

    COUTINHO, Luciana G. Da metfora paterna metonmia das tribos: um estudo psi-canaltico sobre as tribos urbanas e as novas configuraes do individualismo - 2001. Disponvel em: . Acesso em: 4 nov. 2013.

    FOCHI, Marcos A. Cultura Hip Hop e marcas alternativas: a presena da ideologia e das estratgias mercadolgicas - Programa de Ps-Graduao em Comunicao Social, Fa-culdade Csper Lbero, So Paulo, 2006. Disponvel em: . Acesso em: 8 nov. 2013.

    MAGNANI, Jos G. Tribos Urbanas: Metfora ou Categoria? Revista dos alunos de ps--graduao em Antropologia. Departamento de Antropologia, FFLCH/USP, So Paulo, n.2, 1992. Disponvel em . Acesso em: 11 nov. 2013. MAIA, Joo. Michel Maffesoli e a cidade partilhada. Revista FAMECOS: mdia, cultura e tecnologia, v.1, n.26, 2005. Disponvel em: . Acesso em: 4 nov. 2013.

    OLIVEIRA, Maria C. S. L; CAMILO, Adriana A.; ASSUNCAO, Cristina V. Tribos urbanas como contexto de desenvolvimento de adolescentes: relao com pares e negocia-o de diferenas. Temas psicol., Ribeiro Preto , v. 11, n. 1, jun. 2003 . Disponvel em . Acesso em: 09 nov. 2013.

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    PAIS, Jos M.; BLASS, Leila M. Tribos urbanas: produo artstica e identidades. Revis-ta Brasileira de Cincias Sociais, v.21, n.60, So Paulo, 2004. Disponvel em: . Acesso em: 4 nov. 2013.

    PAIS, Jos M. Mscaras, jovens e escolas do diabo. Revista Brasileira de Educao, v.13, n.37, 2008. Disponvel em: . Acesso em: 11 nov. 2013.

    PISANI, Elaine; PEREIRA, Silo; RIZZON, Luiz. Temas de psicologia social. Petrpolis, RJ: Vozes, 1994.

    PITTA, Tnia. Territrios, arqutipos e tribos. Revista FAMECOS, Porto Alegre, n.26, abril 2005. Disponvel em: . Acesso em: 11 nov. 2013.

    RANGEL, Ana Paula; TORMAN, Ronalisa; FOCESI, Luciane. Adolescncia: Construin-do uma identidade. Revista Conhecimento Online, ano 4, v.1, 2012. Disponvel em: . Acesso em: 4 nov. 2013.

    SALVARO, Janine. Tribo: qual a sua? A ps-modernidade como palco para a formao de tribos. Revista Cientifica Plural, Unisul, 2008. Disponvel em: . Acesso em: 4 nov. 2011.

    SANTOS, Maria Stella. Pinta natalense: identidade, conexes tribais e cultura do consumo Intercom: Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comuni-cao, Rio Grande do Norte, 2013. Disponvel em: . Acesso em: 11 Novembro 2013.

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    SCHULTZ, Duane; SHULTZ, Sydney. Teorias da personalidade. So Paulo: Cengage Learning, 2011.

    TESSARI, Olga. Jovens que buscam identidade. Disponvel em: . Acesso em: 8 nov. 2013.

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    REFERNCIAS (NO-CIENTFICAS)

    A dcada de 1950: cultura, arte, msica, cinema, poltica, guerras, cincias, tecnolo-gia, histria. Disponvel em: . Acesso em: 10 nov. 2013.

    As tribos da dcada de cinquenta. Disponvel em: . Acesso em: 10 nov. 2013.

    Beatniks. Disponvel em: . Acesso em: 10 nov. 2013.

    Bodgies. Disponvel em: . Acesso em: 10 nov. 2013.

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    Greasers. Disponvel em: . Acesso em: 10 nov. 2013.

    Motoclubes. Disponvem em: . Acesso em: 10 nov. 2013.

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    Surfistas. Disponvel em: . Acesso em: 10 nov. 2013.

    Surfistas. Disponvel em: . Acesso em: 10 nov. 2013.

    Teddy Boys. Disponvel em: . Acesso em: 10 nov. 2013.

    Tribos Urbanas Americanas: Beatniks. Disponvel em: . Acesso em: 10 nov. 2013.

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    1 Acadmica do curso de Psicologia da Centro Universitrio Tiradentes Unit.

    E-mail: [email protected]

    2 Acadmica do curso de Psicologia da Centro Universitrio Tiradentes Unit.

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    3 Acadmica do curso de Psicologia da Centro Universitrio Tiradentes Unit.

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    4 Acadmica do curso de Psicologia da Centro Universitrio Tiradentes Unit.

    E-mail: [email protected]

    5 Acadmica do curso de Psicologia da Centro Universitrio Tiradentes Unit.

    E-mail: [email protected]

    6 Docente do curso de Psicologia da Centro Universitrio Tiradentes Unit.

    E-mail: [email protected]

    7 Docente do curso de Psicologia da Centro Universitrio Tiradentes Unit.

    E-mail: [email protected]

    Data do recebimento: 10 de Maro de 2014Data da avaliao: 11 de Maro de 2014Data de aceite: 31 de Julho de 2014