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As Três Margens do Rio Unini e o Novo Processo de Ordenamento Territorial Resumo Palavras-chave:

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As Três Margens do Rio Unini e o Novo Processo

de Ordenamento Territorial

Satya Bottin Loeb Caldenhof

Mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia,

Doutoranda pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais

Universidade Estadual de Campinas

[email protected]

Lúcia da Costa Ferreira

Professora Doutora, Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais

Universidade Estadual de Campinas

[email protected]

Resumo

Abordamos o processo de ordenamento territorial em curso no rio Unini, Barcelos/AM, em relação

à existência e implementação de três Unidades de Conservação (UCs): o Parque Nacional do Jaú

(PNJ), a Reserva de Desenvolvimento Sustentável Amanã (RDS) e a Reserva Extrativista do Rio

Unini (RESEX). O rio Unini, afluente do rio Negro pela margem direita, representa o limite entre as

três UCs, sendo habitado de sua foz até a altura de seu médio curso. Existem atualmente 10

comunidades ao longo do rio, com a presença de cerca de 660 moradores. Destas, seis

localizam-se no território do Parque, três na RESEX e uma na RDS. O objetivo desse artigo é

comparar diferentes motivações dos moradores sobre a decisão de permanecer ou se mudar de

suas comunidades, frente à ameaça ou oportunidade representada pela UC em que vive. Foram

realizadas entrevistas e aplicados questionários com moradores do Unini ao longo de cinco anos

de pesquisa na região.

Palavras-chave: unidades de conservação; ordenamento territorial; conflitos; Amazônia.

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Introdução

O presente trabalho apresenta resultados preliminares da pesquisa de doutorado em andamento

pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (NEPAM) da Universidade Estadual de

Campinas (UNICAMP), São Paulo, Brasil. A pesquisa pretende contextualizar e analisar

processos de mudança social e institucional relacionados à presença humana em áreas

protegidas na Amazônia Central brasileira. Mais especificamente, enfoca mudanças em curso em

comunidades ao longo do rio Unini, município de Barcelos, Amazonas, que faz a divisa entre três

Unidades de Conservação (UCs): o Parque Nacional do Jaú, a RESEX do Unini e a RDS Amanã

(Figura 1). O rio Unini é um dos maiores tributários da margem direita do rio Negro em seu baixo

curso, com quase 400 km de extensão, formando uma bacia hidrográfica de 2.689.644 ha, quase

totalmente inserida nestas três UCs (FVA, 2011). Sua foz localiza-se a cerca de 220 km de

Manaus em linha reta.

Figura 1: Localização dos municípios de Manaus, Novo Airão e Barcelos (AM), salientando a área da RESEX do Rio Unini, Parque Nacional do Jaú e RDS Amanã. Elaborado por Marcelo P. Moreira/Fundação Vitória Amazônica.

O foco principal deste artigo refere-se à mobilização social relativa ao novo processo de

ordenamento territorial no rio Unini a partir da criação da RESEX em 2006, analisando as

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motivações relacionadas à migração de famílias entre comunidades, entre diferentes áreas

protegidas e rural-urbana, à participação em processos de planejamento e à formação de novas

comunidades.

Objetivos

Discutir processos de mudança social em curso no rio Unini, em especial aqueles relativos a

questões relacionadas ao território, conflitos sociais e projetos de desenvolvimento

socioeconômico realizados em parceria com associações locais, organizações não-

governamentais e com o órgão gestor (ICMBio) das áreas protegidas federais.

Será feita uma análise comparativa entre três comunidades no rio Unini, uma de cada UC, quanto

à decisão de seus moradores entre ficar e partir de suas comunidades, levando em consideração

a categoria de UC (uso sustentável ou proteção integral) onde vivem. Neste sentido, o PNJ, UC

de proteção integral, representa uma ameaça às famílias residentes, dada à obrigatoriedade

prevista por lei (Brasil, 2000) de indenização e realocação de moradores, e a RESEX, de uso

sustentável, representa uma oportunidade, devido aos projetos de desenvolvimento

socioeconômico que estão sendo implementados e outros benefícios previstos por lei (por ex. o

crédito habitação, do INCRA) que ainda estão por vir, além da segurança fundiária.

Hipótese

A hipótese central que norteia esta pesquisa é que mudanças sociais entre grupos com estatuto

jurídico de populações tradicionais, residentes em áreas protegidas, são principalmente

desencadeadas pela ameaça ou oportunidade representada pelas diferentes categorias de áreas

protegidas em relação à questão fundiária e à garantia do acesso a serviços públicos básicos de

educação e saúde e a recursos naturais essenciais para o grupo familiar.

Metodologia e informações utilizadas

A análise que se pretende com a pesquisa de doutorado será feita a partir de três eixos principais:

ordenamento territorial, conflitos socioambientais e uso de recursos naturais. Este artigo discute

com mais atenção o eixo de ordenamento territorial e sua relação com a participação social local e

projetos de desenvolvimento socioeconômico. A metodologia baseia-se em procedimentos de

pesquisas qualitativa e quantitativa em Ciências Sociais, como surveys, análise situacional

(Gluckman, 1987 [1958]), análise institucional (Ostrom et al., 1994; Ostrom, 2005) e entrevistas

semiestruturadas, além da análise documental relativa à gestão e implementação das UCs em

foco.

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Até o momento foram realizadas dezesseis incursões a campo, incluindo seis incursões às

comunidades do rio Unini e uma àquelas no rio Jaú (PNJ), para acompanhamento de atividades

de gestão e de implementação de projetos nas três UCs (PNJ, RESEX e RDS), e nove viagens às

sedes municipais de Novo Airão e Barcelos, para participação em reuniões dos conselhos

gestores das UCs, dentre outras atividades, totalizando 165 dias em campo. Desta, uma

expedição foi organizada para aplicação de questionários e gravação de material para a produção

de um filme documentário1, e as demais foram organizadas pelo ICMBio e/ou FVA com objetivo

de implementação das áreas protegidas do rio Unini, construção de seus instrumentos de gestão,

e realização de projetos socioeconômicos locais. Foi realizado survey em três comunidades

previamente selecionadas, representantes de diferentes situações sociais em cada UC, com

aplicação de 40 questionários com todos os moradores presentes em cada comunidade no

momento da presença da equipe.

Ademais, uma das autoras (S.B.L.C.) residiu em Manaus por um ano (abril/2011 a abril/2012)

durante a pesquisa de doutorado, período no qual pôde participar de diversas reuniões

envolvendo pesquisadores, membros de ONGs, moradores e gestores das UCs, sobre questões

relativas à gestão das UCs do rio Unini e aos projetos que vem sendo realizados. Por fim, esta

pesquisa é uma continuidade de sua pesquisa de mestrado realizada na mesma região, sobre o

processo de criação da RESEX do Unini e conflitos socioambientais (Caldenhof, 2009).

Até o momento foram realizadas 45 entrevistas (17 durante o mestrado e 28 durante o doutorado)

com diversos atores relacionados a arena de gestão e implementação das UCs do rio Unini,

incluindo: moradores e ex-moradores, gestores e analistas ambientais lotados nestas unidades,

membros de ONGs locais, dentre outros. As entrevistas foram gravadas em áudio digital e tiveram

seu conteúdo transcrito para facilitar as análises realizadas, parte delas apresentada neste

trabalho.

Contextualização geopolítica local

O Parque Nacional do Jaú

O PNJ foi criado em 1980 pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF), com uma

área 2.272.000 hectares (ha), nos municípios de Barcelos e Novo Airão (AM), e era o maior

parque do Brasil no momento de sua criação (Ferreira et al., 2007). Trata-se de uma Unidade de

Conservação (UC) de proteção integral que não permite a permanência de moradores ou o uso

direto dos recursos naturais (Brasil, 2000).

1 O video documentário digital “A Terceira Margem do Rio Unini” (cor, 15min.), dirigido por Ester Fer e Satya Caldenhof, produzido por Filmes de Abril em parceria com a TV Futura, é um dos resultados obtidos. O documentário foi exibido no Programa Sala de Notícias, da TV Futura em 07/05/2012, com reprise em 13/06/2012.

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De acordo com o plano de manejo do PNJ (FVA e IBAMA, 1998), viviam mais de 3.500 pessoas

na área do parque em 1977, com poucos títulos definitivos de posse da terra ou propriedades

particulares a serem adquiridas (FVA, 1998). Esta “população invisível”, não considerada quando

o parque foi criado, diminuiu para menos um terço (1.019 pessoas) em 1992, correspondendo a

menos de 170 famílias (FVA e IBAMA, 1998:139). A instalação de uma base flutuante de controle

na foz do rio Jaú após a criação do PNJ e a posterior proibição de entrada de barcos de

comerciantes (regatões e geleiros) minaram as bases econômicas da dinâmica social local,

tornando quase inviável para os moradores continuar a viver em tal isolamento nas comunidades

(Campos 2006; Creado 2006; Ferreira et al. 2007). A maioria das famílias (cerca de 90%) que

abandonou o rio Jaú mudou para a cidade de Novo Airão (Pinheiro e Macedo, 2004), sem

qualquer compensação. Muitos anos depois, lideranças representativas se auto-organizaram em

uma associação de ex-moradores para buscar seus direitos perante a lei, o que resultou em um

processo civil que ainda está em execução contra o Estado brasileiro e Instituto Brasileiro de Meio

Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA)2. O IBAMA foi criado em 1989 pela fusão

entre o IBDF, a Secretaria Especial de Meio Ambiente (SEMA), Superintendência de

Desenvolvimento da Pesca (SUDEPE) e Superintendência da Borracha (SUDHEVEA) (Rylands e

Brandon, 2005).

A FVA

A FVA é uma organização não-governamental ambientalista fundada em Manaus em 1990. Em

1993, a FVA e o IBAMA assinaram um termo de cogestão para o Parque Nacional do Jaú, por

meio do Programa Nacional do Meio Ambiente (PNMA), apoiado pelo Banco Mundial com a

participação do Banco de Desenvolvimento Alemão (KfW) (FVA, 1998; Creado, 2006). À luz deste

termo, a FVA desenvolveu ações técnicas e administrativas em parceria com o IBAMA para a

implementação do PNJ. Estas ações incluíram a definição de rotinas e procedimentos de

fiscalização, coleta de dados básicos, e um levantamento sobre a posse da terra no parque,

resultando na elaboração do Plano de Manejo com a participação de múltiplos atores, incluindo os

habitantes. Neste interim, a FVA assumiu o papel de mediar a relação vertical entre o IBAMA e os

moradores locais (FVA, 1998) e iniciou um processo de capacitação que acabou tornando-os

atores em sua própria história (Caldenhof, 2009).

O processo de criação da RESEX do Unini

O histórico da criação da RESEX do Unini possui estreita relação com a existência do PNJ, que

abrange parcialmente a margem direita do rio Unini, até o rio Paunini, afluente deste, incluindo

também o leito do rio Unini neste trecho, em sobreposição ao território da RESEX (Caldenhof et 2  Entre os moradores que saíram do rio Jaú após a criação do parque, cerca de 65 famílias que agora vivem em Novo Airão formaram uma comissão para buscar seus direitos perante a lei, o que culminou com uma Ação Civil Pública pelo Ministério Público Federal (MPF) contra a União e o IBAMA em 2003. A Justiça deu ganho de causa aos ex-moradores em primeira instância (2008), mas o Estado recorreu dessa decisão e o processo ainda está em andamento.  

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al., 2011). Em 2002, lideranças de comunidades do rio Unini que participaram do processo de

capacitação desenvolvido em parceria com a FVA fundaram a Associação dos Moradores do Rio

Unini (AMORU), com objetivo de criar uma reserva extrativista no rio Unini com o intuito de

garantir a segurança sobre o uso do território e dos recursos naturais, em função da ameaça de

uma possível indenização fundiária e realocação compulsória dos moradores residentes no

território do Parque por parte do governo federal (Caldenhof, 2009).

Após quatro anos desde a criação da AMORU, a RESEX do Unini foi criada pelo Decreto

Presidencial s/n°, de 21 de junho de 2006, ocupando uma área de 833.352 ha, integralmente

inserida no município de Barcelos/AM (Caldenhof, 2009; Caldenhof et al., 2011). Trata-se de uma

unidade de conservação de uso sustentável, que abrange a bacia do rio Unini em sua margem

esquerda, incluindo seu leito, e incluiu em seu território duas comunidades ali já existentes, bem

como uma terceira comunidade na margem direita do rio Negro (Caldenhof, 2009). Tanto o PNJ

quanto a RESEX do Unini são atualmente geridos pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da

Biodiversidade (ICMBio), criado em 2007 com a divisão do IBAMA (Caldenhof et al., 2011).

Completando o mosaico de unidades de conservação da bacia do rio Unini, existe a Reserva de

Desenvolvimento Sustentável (RDS) Amanã, criada por decreto estadual N. 19.021, de 04 de

agosto de 1998 (ver Figura 1). A RDS Amanã ocupa uma área de 2.313.000 ha, conectando o

PNJ a RDS Mamirauá, entre as bacias do rio Negro e do baixo rio Japurá (AMAZONAS, 1998). A

RDS Amanã e a RDS Mamirauá são duas UCs de uso sustentável estaduais geridas pelo Centro

Estadual de Unidades de Conservação (CEUC), vinculado à Secretaria de Estado de Meio

Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SDS), em parceria com o Instituto de Desenvolvimento

Sustentável Mamirauá (IDSM) (Caldenhof et al., 2011). Somadas, as três UCs da bacia do rio

Unini ocupam mais de 5,4 milhões de hectares, no coração da Amazônia, em uma região

relativamente livre dos grandes conflitos amazônicos relacionados ao desmatamento, à

exploração mineral e à produção de commodities (soja, gado, arroz) para o mercado externo, bem

como em uma região acessível apenas por via fluvial, pelo rio Negro, livre das pressões trazidas

com as estradas para a Amazônia (Nepstad et al., 2002).

O PNJ e a RESEX do Unini, por sua vez, integram o Mosaico do Baixo Rio Negro, reconhecido

pela portaria do Ministério do Meio Ambiente (MMA) N. 483, de 14 de dezembro de 2010, que

abrange 11 UCs nas esferas federal, estadual e municipal (REDE..., 2011, Caldenhof et al., 2011).

Vivem atualmente no rio Unini cerca de 660 moradores em dez comunidades, segundo dados do

levantamento socioeconômico realizado em fev./mar./2009 pelo ICMBio (não publicado),

atualizado por uma das autoras (S.B.L.C.) em duas viagens a campo realizadas em maio de 2011

e janeiro de 2012 (Tabela 1). Destas comunidades, três localizam-se na área da RESEX do Unini,

seis no PNJ e a mais distante na RDS Amanã (ver Figura 2).

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Tabela 1: Dados populacionais do Rio Unini (janeiro de 2012). Elaborado e atualizado por Satya B. L. Caldenhof a partir de tabela elaborada por Ana Flávia C. Z. Tinto, analista ambiental do ICMBio.

Figura 2: Comunidades do Rio Unini. Elaborado por Ignacio Oliete Josa/Fundação Vitória Amazônica.

A criação da comunidade Patauá

Um dos primeiros projetos de implementação da RESEX do Unini, após a criação de seus

instrumentos de gestão (Conselho Deliberativo, Plano de Uso e Plano de Manejo Participativo) foi

o planejamento e estabelecimento de uma nova comunidade em seu território. A partir de uma

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parceria entre a AMORU, a FVA e o ICMBio, a FVA aprovou um projeto junto ao Fundo Nacional

de Biodiversidade (FUNBIO), em 2008, com recursos do programa de Áreas Protegidas da

Amazônia (ARPA) do MMA. O objetivo era promover a conservação do PNJ através da

conscientização dos moradores do entorno e do uso sustentável dos recursos naturais, por meio

do manejo e agregação de valor (Caldenhof et al., 2011). Um dos objetivos específicos foi

viabilizar o beneficiamento de castanha na RESEX do Unini. Para tanto, o projeto previu a

construção de galpões para estoque e beneficiamento de castanha, aquisição de equipamentos, e

capacitações para moradores locais em manejo de castanha, e em manipulação e beneficiamento

de alimentos (Caldenhof et al., 2011).

Levando em consideração a ameaça representada pelo PNJ à permanência dos moradores e o

antigo anseio de algumas lideranças de formar uma nova comunidade em uma localidade

conhecida como Patauá, no território da RESEX, também foi incluído nos objetivos específicos

subsidiar o ordenamento territorial de duas novas comunidades na RESEX do Unini, planejadas

para receber moradores do PNJ que pretendiam migrar de suas comunidades para o território da

RESEX (Caldenhof et al., 2011). Apesar do planejamento participativo ter sido realizado também

para a área da localidade conhecida como Acufaris (ver Figura 2), a comunidade não chegou a

ser implementada, dada à resistência dos moradores da comunidade Tapiíra, no PNJ, que

solicitaram os estudos, em migrar para o local antes de serem indenizados pelo governo federal

por ter que deixar o território do parque (Caldenhof et al., 2011).

Dois galpões foram construídos no território da RESEX: um para armazenamento da produção, na

comunidade Lago das Pedras, e um para beneficiamento da castanha, adjacente à área planejada

para a construção da comunidade Patauá (Caldenhof et al., 2011), que passou a se chamar

Central Agroextrativista da União dos Moradores do Rio Unini. O projeto teve início com o

reconhecimento e inspeção da área pretendida para construção da nova comunidade em

setembro de 2008, com a participação de moradores, técnicos da FVA e dois arquitetos

contratados pelo projeto para descrição geomorfológica do terreno com equipamento de GPS.

(Caldenhof et al., 2011). Famílias de comunidades do PNJ começaram a se mudar para os lotes

demarcados no Patauá em março de 2009. Moradores locais foram capacitados e contratados

para trabalhar na construção do galpão entre 2010 e 2011 (Caldenhof et al., 2011), sendo

posteriormente capacitados por técnicos da FVA em manejo de castanha e operação do

maquinário da Central Agroextrativista. Segundo dados do levantamento socioeconômico

realizado pelo ICMBio com as famílias residentes (não publicados) em fev./mar./2009, atualizados

em jan./2012, existem 59 moradores na nova comunidade, distribuídos em dez casas (treze

famílias), além de quatro casas em construção (Caldenhof et al., 2011).

A partir deste contexto, com a criação de uma nova comunidade na RESEX por ex-moradores do

PNJ que decidiram por abrir mão de seus direitos à indenização, a resistência dos moradores de

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Tapiíra em mudar para a área que havia sido planejada na RESEX, somado ao abandono da

comunidade Democracia pelas famílias residentes, que migraram para as cidades de Barcelos e

Novo Airão a partir de 2008, após a RESEX ter sido criada, surgem as perguntas que orientam

esta pesquisa e este artigo:

1. Por que grupos humanos sujeitos aos mesmos arranjos institucionais apresentam

diferentes padrões de comportamento frente às mesmas políticas ambientais?

2. Quais condições e variáveis explicam diferentes processos de tomadas de decisão por

grupos humanos sujeitos aos mesmos arranjos institucionais?

Foram eleitas quatro comunidades no rio Unini para a realização de uma análise comparativa

quanto a decisão de seus moradores entre ficar e partir. Os diferentes tipos de comportamento

relativos à permanência ou não de seus moradores após a criação da RESEX, e suas respectivas

comunidades, foram: 1. A mudança de famílias de comunidades do PNJ para a RESEX

(comunidade Patauá); 2. A resistência de famílias de comunidades do PNJ em mudar para a

RESEX (comunidade Tapiíra); 3. O abandono de sua comunidade na área do PNJ para viver nas

sedes municipais após a criação da RESEX (Democracia); e 4. As famílias não sofrem a ameaça

de ter que sair de suas casas (PNJ), ou o oportunidade de ter os benefícios (por ex. crédito

moradia do INCRA) para aquelas que vivem em uma RESEX (comunidade Vila Nunes). Foram

aplicados quarenta questionários com chefes de família (todos aqueles presentes na comunidade

no momento da pesquisa) em três comunidades, segundo a seguinte distribuição: vinte na

comunidade Tapiíra (55,6% das famílias), doze na comunidade Patauá (92,3% das famílias) e oito

na comunidade Vila Nunes (100% das famílias). Ainda devem ser aplicados questionários com os

ex-moradores de Democracia3 que migraram para as sedes municipais próximas e não foram

localizados.

Resultados preliminares

Do total dos moradores entrevistados, quase a metade (49%) nasceu em localidades ou

comunidades no próprio rio Unini, rio Jaú ou afluente, enquanto 48% nasceram nas cidades

próximas (Manaus, Novo Airão, Iranduba, Manacapuru e Barcelos). A metade dos moradores de

Tapiíra/PNJ reside na comunidade há mais de 10 anos e apenas 20% há menos de cinco anos,

enquanto 100% dos moradores de Vila Nunes vivem na comunidade há mais de 15 anos e 100%

dos moradores de Patauá há menos de 5 anos (Tabela 2), tendo em vista que os primeiros

moradores da nova comunidade mudaram em março de 2009 .

3 Vale notar que estivemos na comunidade Democracia em janeiro de 2012 e havia quatro casas habitadas por moradores que migraram de outras comunidades (total de 23 moradores e seis famílias) após o abandono da mesma por seus moradores em meados de 2008/2009.

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Tabela 2: Tempo que a família vive na atual comunidade (em números absolutos). Elaborado por Fabiano Lopez da Silva a partir de dados coletados por Satya B. L. Caldenhof em jan./2012.

Entre os principais motivos apontados pelos moradores para sua mudança para a comunidade

onde vive atualmente, a presença de parentes e amigos foi o principal fator para Vila Nunes/RDS

Amanã (67%) e Tapiíra/PNJ (38%), seguido por escola (29%) e trabalho (19%) para Tapiíra, e

trabalho (11%) e área para plantar, caçar pescar (11%) para Vila Nunes. Já os principais motivos

para a mudança dos moradores para o Patauá foram a distância mais próxima à foz do rio Unini

(30%), e por conseguinte às sedes municipais, e a segurança de ter a casa na RESEX (25%),

seguidos por trabalho e escola (empatados com 15% cada) (Tabelas 3 e 4). A comunidade,

entretanto, não tinha uma escola construída até janeiro de 2012, havendo apenas um professor

dando aula multi-seriada de 1o ao 5o ano em uma construção improvisada de pau roliço coberta

de palha, no estilo das construções tradicionais do interior da Amazônia (palafita), como acontece

na maioria das demais comunidades do Unini.

Tabela 3: Motivação principal para a vinda da família para a comunidade atual. Elaborado por Fabiano Lopez da Silva a partir de dados coletados por Satya B. L. Caldenhof em jan./2012.

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Tabela 4: Motivação principal para a vinda da família para a comunidade atual (por comunidade). Elaborado

por Fabiano Lopez da Silva a partir de dados coletados por Satya B. L. Caldenhof em jan./2012.

Neste sentido, a comunidade Patauá apresenta um perfil de formação bastante diferenciado das

demais no rio Unini, que tiveram sua origem a partir do crescimento de um ou mais núcleos

familiares, baseada em relações de parentesco e compadrio, onde famílias com muitos filhos se

agruparam para solicitar apoio da prefeitura para enviar um professor para prover o ensino na

comunidade (Chaves et al., 2004).

Do total de moradores do Patauá (treze famílias), a maioria (nove famílias) migrou de

comunidades localizadas à montante do rio, no território do PNJ (Floresta, Lago das Pombas,

Manapana e Vista Alegre), uma família mudou-se de um antigo sítio nas proximidades da área e

duas famílias são ex-moradores do rio Unini que residiam em Manaus e em Barcelos e retornaram

a viver no rio quando a comunidade começou a ser constituída. Há ainda dois comerciantes

regatões que não possuem casa na comunidade mas são considerados moradores pelos demais

(Caldenhof et al., 2011). Além da segurança sobre o território e a menor distância relativa à foz do

rio Unini, a construção do galpão de beneficiamento de castanha na comunidade Patauá entre

2010 e 2011, empregando mão-de-obra local temporariamente, pode ser considerada forte

atrativo para promover a mudança dos moradores de outras comunidades, ainda que não tenha

sido apontada como tal durante a aplicação do questionário. Outros fatores, como o acesso a

novas áreas de mata primária para o estabelecimento de roças próximas a sede habitacional,

ausência dos velhos conflitos sociais nas comunidades de origem e novas regras de convivência,

podem ter influenciado na decisão (Caldenhof et al., 2011).

Em relação à escolaridade, Patauá e Vila Nunes apresentam um gráfico similar, com 42% e 43%

respectivamente, de chefes de família sem estudos, 27 e 29% com ensino fundamental I

incompleto, 17% e 14% com fundamental I completo (5o ano). Dentre as famílias com ensino

fundamental I incompleto, todos os chefes de família em Vila Nunes completaram o 3o ano,

enquanto no Patauá 8% completaram o 2o ano, 8% o 3o ano, e 8% o 4o ano. Em Vila Nunes, onde

o ensino vai apenas até o 5o ano do ensino fundamental, nenhum chefe de família completou o

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ensino fundamental II ou médio, tendo os 14% restantes estudado até o 6o ano (provavelmente

antes de migrarem pra comunidade, já que quase todos os chefes de família viveram um período

em Manaus). No Patauá, dos 16% restantes, metade terminou o 8o ano e metade chegou ao

ensino médio, seja em suas comunidades de origem (Vista Alegre e Lago das Pombas) ou nas

sedes municipais, dado que a comunidade recém-fundada também oferece estudo apenas até o

5o ano do ensino fundamental (assim como as demais, com exceção de Tapiíra, Vista Alegre e

Terra Nova, que oferecem ensino fundamental completo) (Tabela 5).

Tabela 5: Níveis de escolaridade dos chefes de família nas comunidades Tapiíra, Patauá e Vila Nunes, rio Unini, Barcelos/AM. Elaborado por Fabiano Lopez da Silva a partir de dados coletados por Satya B. L. Caldenhof em jan./2012.

Já na comunidade Tapiíra, apenas 15% dos chefes de família não tiveram estudo. Quinze por

cento completou o ensino fundamental I (5o ano), 35% tem ensino fundamental II incompleto, 10%

completou o ensino fundamental II (9o ano) e 15% atingiu o ensino médio (Tabela 5). A maior

escolaridade relativa e disponibilidade do ensino fundamental completo podem ser considerados

fatores importantes na decisão das famílias em permanecer em sua comunidade e não migrar

para comunidades na RESEX ou para as sedes municipais, além do índice de escolaridade mais

alto contribuir para a organização social da comunidade.

A união dos moradores, notável pela existência da Associação dos Moradores de Tapiíra

(AMOTAPI), única associação representativa de uma comunidade dentre as dez no rio Unini, e

pela organização da comunidade para conseguir apoio da prefeitura para melhorias e ampliação

da escola, instalação de telefone público, dentre outros, também é um fator a ser considerado. A

escola da comunidade Tapiíra é a maior do rio Unini, construída com tábuas de madeira e coberta

com telhas. Além do ensino fundamental completo, oferece Educação para Jovens e Adultos

(EJA) no período noturno.

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Diferentemente das famílias que migraram de outras comunidades do PNJ para o Patauá/RESEX,

lideranças de Tapiíra afirmam que só aceitarão mudar de sua comunidade se forem todos juntos

para um mesmo local, de forma a manter a estrutura comunitária. A falta de disponibilidade de

áreas de terra firme às margens do rio Unini, na RESEX, para estruturar uma nova comunidade

em terreno com condições similares e área disponível para moradia e cultivo de todas as famílias

também influencia a decisão destas lideranças de ficar e lutar por sua permanência. Moradores de

Tapiíra participam de um Grupo de Trabalho de Consolidação Territorial formado no âmbito do

Conselho Deliberativo da RESEX e defendem a redelimitação do parque e da RESEX, com a

exclusão da área das comunidades do PNJ no rio Unini do limite do parque e sua inclusão no

território da RESEX, como uma solução alternativa à regularização fundiária e realocação das

famílias do parque.

Quanto à composição da renda das famílias entrevistadas, apenas uma moradora idosa de uma

comunidade alegou não praticar mais a agricultura, sendo ajudada pelos filhos. Consideradas as

famílias das três comunidades, 52,5% recebem recursos do Programa Bolsa Família, do Governo

Federal; 45% praticam o extrativismo vegetal; 17,5% recebem salário do município de Barcelos

(professor ou agente de saúde); 17,5% recebem ocasionalmente recursos por serviços

temporários; 15% das famílias recebem aposentadoria; e 10% recebem seguro defeso

(pescadores profissionais). O porcentual de famílias que trabalha com serviços temporários é

mais significativo na comunidade Vila Nunes, onde parte dos moradores já trabalhou prestando

serviços para empresas de pesca esportiva e atualmente presta serviços para pesquisas

científicas que vem sendo realizadas para os estudos de viabilidade da atividade por solicitação

da Justiça. Em relação às demais, as famílias em Tapiíra praticam proporcionalmente menos

extrativismo vegetal, uma porcentagem maior recebe salários (dada a presença de cinco

professores, uma agente de saúde e uma microscopista), e há um maior número de pescadores

profissionais que recebem seguro defeso (Tabela 6).

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Tabela 6: Composição da renda nas comunidades Tapiíra, Patauá e Vila Nunes, Rio Unini, Barcelos/AM (múltipla escolha, em números absolutos). Elaborado por Fabiano Lopez da Silva a partir de dados coletados por Satya B. L. Caldenhof em jan./2012.

A produção agrícola constitui a renda principal em todas as comunidades, e uma porcentagem

relativamente alta das famílias da comunidade Tapiíra indicou outras fontes de renda como

principal (Tabela 7).

Tabela 7: Renda principal das famílias nas comunidades Tapiíra, Patauá e Vila Nunes, Rio Unini, Barcelos/AM (em números absolutos). Elaborado por Fabiano Lopez da Silva a partir de dados coletados por Satya B. L. Caldenhof em jan./2012.

Praticamente 100% das famílias no rio Unini produzem farinha de mandioca para consumo e para

venda. Dentre os principais produtos que compõem a produção agroextrativista das famílias

entrevistadas, destaca-se a farinha de mandioca e a banana em todas as comunidades, seguida

por castanha, cipó e cará. Com menor importância temos melancia, macaxeira, derivados da

farinha de mandioca (arubé, tucupi, biju), abacaxi e abóbora, dentre outros (Tabela 8). Como se

ver a partir da Tabela 8, a produção para o consumo é muito mais diversificada do que para a

venda em todas as comunidades pesquisadas. Um dado relevante que deve ser considerado é

que uma média de 80% das famílias alegou que pesca pirarucu para consumo e uma média de

90% consome bichos-de-casco e ovos de quelônios (tartaruga, tracajá, jaboti, etc.), enquanto

nenhuma família disse fazer o mesmo para a venda. Tendo em vista que o comércio destes

animais é proibido por lei, e que é sabido por parte do governo que este comércio ilegal existe

proveniente do rio Unini para a cidade de Novo Airão principalmente, observa-se que os chefes de

família podem ter omitido a informação ao responder o questionário.

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Tabela 8: Comparação entre a produção agroextrativista para consumo e venda nas comunidades Tapiíra, Patauá e Vila Nunes. Elaborado por Fabiano Lopez da Silva a partir de dados coletados por Satya B. L. Caldenhof em jan./2012.

Quanto ao estilo de liderança, todos os moradores de Tapiíra consideraram o presidente da

comunidade, que é o mesmo da Associação comunitária, do tipo democrático. Os presidentes das

comunidades Patauá e Vila Nunes foram considerados majoritariamente como do tipo liberal

(“onde todos participam, mas não faz nada”), com uma pequena parte dos chefes de família de

Vila Nunes classificando-o como do tipo situacional (“que muda conforme a situação”). Houve

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maior divergência de opiniões na nova comunidade Patauá, onde cerca de 60% classificaram

como liberal, cerca de 30% como democrático e cerca de 10% como autoritário.

Tabela 9: Estilo de liderança nas comunidades Tapiíra, Patauá e Vila Nunes, Rio Unini, Barcelos/AM. Elaborado por Fabiano Lopez da Silva a partir de dados coletados por Satya B. L. Caldenhof em jan./2012.

Quando questionados sobre a intenção de mudar da comunidade atual, a maioria dos chefes de

família de todas as comunidades informaram que não pretendem se mudar, tendo um porcentual

maior das famílias de Vila Nunes afirmado que sim (Tabela 10).

Tabela 10: Intenção dos moradores de Tapiíra, Patauá e Vila Nunes de mudar de suas atuais comunidades no Rio Unini, Barcelos/AM. Elaborado por Fabiano Lopez da Silva a partir de dados coletados por Satya B. L. Caldenhof em jan./2012.

Ainda que a maior parte das famílias afirma que não pretende se mudar, quando questionados

para onde iriam sobre a hipótese de se mudarem, a grande maioria afirma que mudaria para a

cidade de Novo Airão. Quase 20% dos moradores de Tapiíra afirmaram que prefeririam continuar

no rio Unini e mudar para a nova comunidade Patauá. No caso de Vila Nunes, cerca de 30%

mudaria para Novo Airão, cerca de 30% para Barcelos e cerca de 20% para Manaus (Tabela 11).

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Tabela 11: Intenção de local de mudança na hipótese de decidirem se mudar de suas atuais comunidades no Rio Unini, Barcelos/AM. Elaborado por Fabiano Lopez da Silva a partir de dados coletados por Satya B. L. Caldenhof em jan./2012.

Cem por cento das famílias afirmou ter parentes residindo nas cidades, conforme a distribuição

apresentada na Tabela 12.

Tabela 12: Cidades em que os moradores das comunidades Tapiíra, Patauá e Vila Nunes, no Rio Unini, Barcelos/AM, possuem parentes. Elaborado por Fabiano Lopez da Silva a partir de dados coletados por Satya B. L. Caldenhof em jan./2012.

Conclusões

De modo geral, podemos afirmar que nenhuma variável isolada é suficiente para determinar a

decisão das famílias em migrar ou permanecer em suas atuais comunidades. Não houve

diferença significativa quanto a composição da renda das famílias nas três comunidades.

Fatores que parecem mais determinantes em influenciar a decisão de ficar (representada pelos

moradores da comunidade Tapiíra/PNJ) são a organização social, estilo de liderança do tipo

democrático, nível de escolaridade e oferta de ensino. Em relação ao nível de escolaridade,

acreditamos que a maior escolaridade influencie a própria compreensão dos direitos em relação à

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legislação ambiental e tomada de iniciativa no processo de negociação para a sua permanência,

com a participação no Grupo de Trabalho de Consolidação Territorial e proposta de redelimitação

do PNJ e liderança da comunidade Tapiíra nas discussões sobre a redelimitação ou

recategorização da UC.

Entre os motivos que influenciam a decisão de mudar (representada pela comunidade

Patauá/RESEX), a distância da foz do rio e segurança fundiária foram os principais fatores

apontados pelas famílias, mas acreditamos que a construção do galpão da Central

Agroextrativista empregando a mão-de-obra local na época de fundação da comunidade também

é um fator importante. Seria relevante aplicar o questionário com os moradores das demais

comunidades do PNJ em que parte dos moradores migrou para a nova comunidade Patauá para

buscar compreender os fatores que influenciaram a decisão de ficar, enquanto outros decidiram

partir. Sabe-se, por exemplo, que a maioria dos moradores da comunidade Floresta migrou para o

Patauá, mas não todos. Com isso, a comunidade perdeu a agente de saúde, que foi uma das

moradoras que migrou, e também a disponibilidade de um professor da sede municipal, uma vez

que é exigido um número mínimo dez alunos por comunidade para que a prefeitura envie um

professor. O que leva os demais moradores a decidir ficar, mesmo sem atendimento de saúde ou

oferta de ensino, é uma das questões a ser feita.

A comunidade Vila Nunes apresenta um perfil diferenciado por ser constituída por descendentes

diretos de apenas uma família, cuja matriarca é o fator unificador na comunidade. Não existe uma

ameaça de uma possível realocação das famílias, como no caso do PNJ, mas a comunidade vem

sendo incluída em todos os processos de gestão e projetos de desenvolvimento local, possuindo

moradores como conselheiros tanto no Conselho Consultivo do PNJ como no Conselho

Deliberativo da RESEX. O atual presidente da comunidade é o presidente da AMORU, e no seu

mandato a associação aprovou projeto para aquisição dos equipamentos de beneficiamento de

castanha da Central Agroextrativista. Uma liderança desta comunidade participou de capacitações

sobre turismo de base comunitária e intercâmbios promovidos pela equipe da RESEX,

beneficiando-se, portanto, das oportunidades que a UC representa. Mais de 30% das famílias

desta comunidade disse que tem a intenção de se mudar, especialmente pela falta de oferta do

ensino fundamental II e ensino médio para os filhos em idade escolar. A comunidade entretanto

foi a que historicamente mais se beneficiou da disponibilidade de serviços temporários pelas

empresas de pesca esportiva, dada a maior proximidade relativa aos locais onde a atividade era

realizada. Acreditamos que a retomada da atividade, prevista com a liberação da Justiça, seja um

importante fator de fixação das famílias localmente, devido a oferta de empregos.

Dentre os próximos passos da pesquisa, pretende-se aplicar os questionário com os ex-

moradores da comunidade Democracia que migraram para as sedes municipais para analisar

quais fatores influenciaram a decisão de saírem do rio Unini, e refletir sobre os dados e análises

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preliminares para complementar as informações em entrevistas semi-estruturadas a serem

realizadas em uma última incursão a campo.

Agradecimentos

Esta pesquisa é beneficiada por bolsa FAPESP (processo N. 2009/15687-6). As autoras

agradecem a Marcelo P. Moreira e Ignacio Oliete Josa, da Fundação Vitória Amazônica, pela

elaboração dos mapas, e a Fabiano Lopez da Silva pela elaboração das tabelas e comentários

sobre o texto.

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