As geladeiras e o buraco de ozônio

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As geladeiras e o buraco de ozônio

A necessidade de abandonarmos

o uso de CFCs fica mais e mais urgente à medida que a camada de ozônio vai

desaparecendo sobre as nossas cabeças. Mas o que irá substituí-los? Algumas

indústrias químicas - que são também responsáveis pela crise do ozônio que

todos nós enfrentamos - propuseram os HCFCs como uma "solução". No

entanto, os HCFCs também destroem a camada de ozônio e vão agravar a

crise ambiental. Outra "solução" oferecida por essas indústrias, o gás HFC,

não é melhor que a primeira. Os HFCs não prejudicariam a camada de ozônio

mas contribuiriam para o aquecimento do planeta, agravando o problema do

efeito estufa.

Nós não precisamos usar nenhum desses químicos para fazer com que nossas

geladeiras funcionem bem. Isso foi demonstrado no início de 1993, quando a

luta para salvar a camada de ozônio alcançou um momento decisivo. Os

maiores fabricantes alemães de geladeiras - que antes afirmavam jamais ser

possível uma solução desse tipo - adotaram a "geladeira verde" (que não

destrói a camada de ozônio), desenvolvida pela primeira vez com a ajuda da

Greenpeace. Vários modelos, produzidos sem os gases que danificam a

atmosfera - CFCs, HCFCs e HFCs -, já estão sendo comercializados por toda

a Europa.

Esta é uma grande conquista. No início de 1993, os grandes fabricantes de

refrigeradores da Europa lançaram uma campanha contra a Greenpeace

alegando que as geladeiras verdes consumiriam mais energia, seriam

inflamáveis e tecnicamente inviáveis. A ICI da Inglaterra, importante produtor

de CFCs, HFCs e HCFCs, enviou correspondência aos sócios da Greenpeace

perguntando: "Será que devemos todos ir para o laboratório e passar os

próximos dez anos verificando se as idéias da Greenpeace podem ser

colocadas em prática?" Foi demonstrado que eles estavam errados: na prática

foram duas semanas, não dez anos, o tempo para desenvolver uma geladeira

protótipo, na universidade inglesa de South Bank.

Ainda no início de 1993, a companhia alemã Foron anunciava seus planos de

produzir em larga escala a primeira geladeira inofensiva à camada de ozônio.

A declaração foi o tiro de largada para uma corrida de todos os outros

fabricantes em direção ao novo produto.

Destruição do ozônio - ainda um problema

O desenvolvimento da geladeira verde coincidiu com novas e alarmantes

evidências da rápida destruição da camada de ozônio sobre o hemisfério

Norte, ao mesmo tempo que continua a aumentar, ano a ano, o buraco na

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camada de ozônio sobre o hemisfério Sul. Em 1995, a camada de ozônio sobre

a Antártica bateu novo recorde de diminuição, quando um buraco de 23

milhões de quilômetros quadrados foi aberto sobre áreas habitadas.

As conseqüências destas reduções da camada de ozônio para a saúde e para o

meio ambiente são enormes. Na medida em que a camada de ozônio é

fragmentada, os níveis dos raios ultravioleta do tipo B, altamente nocivos,

aumentam sobre a superfície da Terra. Plantas, animais e ecossistemas inteiros

estão em perigo. Em algumas regiões do mundo já foram detectados níveis de

UV-B cinco vezes mais altos que os normais.

O crescimento da quantidade dessa radiação solar na superfície da Terra vem

aumentando em vários países, inclusive no Brasil, a incidência de alguns tipos

de câncer de pele. Os raios UV-B também aumentam os casos de catarata e

podem, ainda, danificar o sistema imunológico dos seres humanos.

Fazendo as escolhas certas

Algumas atitudes foram finalmente tomadas para proteger a camada de ozônio

dos CFCs, que ainda são largamente utilizados nos aparelhos de refrigeração,

na fabricação de espumas e de solventes. Na Comunidade Européia,

determinou-se a suspensão de CFCs a partir de dezembro de 1994. No

entanto, essas vitórias poderão ser desperdiçadas. Os HFCs só serão proibidos

daqui a mais de vinte anos. Esses produtos químicos, assim como os HCFCs,

são poderosos agentes do aquecimento global.

A maior parte da indústria de refrigeração está sob pressão da indústria

química para que adotem suas opções favoritas: HCFCs e HFCs. A indústria

química tem investido bilhões nesses produtos. Para essas empresas, soluções

concretas e baratas como a geladeira verde são verdadeiras ameaças para seus

novos e lucrativos mercados, criados pela restrição ao uso dos CFCs. No

entanto, substituir CFCs por HCFCs e HFCs é como "pular da panela para o

fogo", segundo o Dr. Joe Farman, cientista britânico que descobriu o buraco

de ozônio sobre a Antártida. Existem soluções melhores para todos os usos

atuais dos CFCs.

A amônia, por exemplo, pode ser usada para refrigeração em larga escala, em

supermercados ou no processamento de alimentos. Refrigeradores domésticos

como a Geladeira verde podem usar hidrocarbonetos - como os gases propano,

butano e isobutano. Esses gases simples são excelentes fluidos refrigerantes.

A tecnologia já é bastante experimentada e os gases são completamente

inofensivos à camada de ozônio, além de muito mais baratos que os HCFCs e

HFCs.

Hidrocarbonetos: a alternativa mais segura.

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Hidrocarbonetos já foram fluidos refrigerantes bastante conhecidos e

largamente utilizados em transporte, pequenas unidades comerciais e

refrigeradores domésticos antes dos CFCs serem inventados, na década de 30.

Além de baratos, esses produtos químicos não são tóxicos. Têm baixíssimo

impacto no aquecimento global e nenhum impacto sobre a camada de ozônio.

Eles são uma solução ideal para países em desenvolvimento como o Brasil.

A própria indústria de refrigeração já reconheceu o potencial dos

hidrocarbonetos. O Instituto de Refrigeração do Reino Unido diz que seria

"sensivelmente melhor" usar hidrocarbonetos como fluido de refrigeração em

geladeiras domésticas. O Dr. Forbes, chefe do comitê técnico do Instituto, diz:

"O hidrocarboneto é a opção óbvia para as geladeiras domésticas e é mais

barato". Apesar de os hidrocarbonetos serem inflamáveis, o risco de incêndio

é mínimo, dadas as pequenas quantidades usadas em refrigeradores

domésticos.

A Geladeira verde de 150 litros da Foron contém em torno de 20 gramas de

propano e butano, enquanto o modelo KDR 3700 de 364 litros da Bosch-

Siemens usa 44g de isobutano. Estas quantidades são similares àquelas

contidas, respectivamente, em três e seis isqueiros. As autoridades alemãs

deram aprovação oficial aos diferentes modelos da Geladeira verde depois de

extensivos testes de segurança e performance.

Espumas isolantes: uma revolução técnica

Até pouco tempo atrás, os HCFCs - agressores da camada de ozônio - eram

vistos como os principais substitutos dos CFCs para a fabricação das espumas

de isolamento térmico das geladeiras. Depois de sucessivas campanhas da

Greenpeace, várias indústrias de espumas passaram a usar o ciclopentano,

inofensivo à camada de ozônio, no lugar nos CFCs e HCFCs. Representantes

das empresas envolvidas na produção de espumas de isolamento térmico com

ciclopentano já afirmaram que se trata da "maior e mais rápida mudança

tecnológica nos últimos 25 anos" na indústria do poliuretano.

A Liebherr, fabricante alemã de geladeiras, está entre as primeiras empresas

que adotaram o ciclopentano na fabricação de espumas. Essa empresa levou

apenas um fim de semana para converter todas as suas fábricas da Alemanha e

da Áustria. Todos os outros fabricantes da Europa estão fazendo o mesmo. O

interesse por essa tecnologia na Itália, Espanha, Dinamarca e na parte oriental

da Europa é bastante grande. Em todo o mundo, as indústrias dependem, em

maior ou menor grau, de suas exportações para o mercado europeu,

fortemente influenciado pelas preocupações ambientais.

Geladeiras e consumo de energia

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A geladeira é um dos maiores consumidores de energia em uma residência.

Embora não represente a principal carga elétrica instalada, é um equipamento

que consome energia elétrica de forma intermitente 24 horas por dia. As

geladeiras verdes têm grande eficiência energética, podendo inclusive reduzir

o consumo de energia. Os custos de operação das geladeiras à base de

hidrocarbonetos são muito mais baixos do que o das geladeiras que destroem a

camada de ozônio. O modelo KDR 3700 de 364 litros da Bosch-Siemens, de

uma única temperatura, por exemplo, consome 0,35 kWh/24h - índice muito

inferior ao dos modelos equivalentes disponíveis no nosso mercado.

Os hidrocarbonetos são fluidos de refrigeração intrinsecamente mais eficientes

que os HFCs. Isto significa que, com melhorias tecnológicas, as possibilidades

de futuras reduções no consumo de energia das geladeiras é muito maior com

o uso dos hidrocarbonetos do que com o uso dos HFCs. Para um país como o

Brasil, em que o número de equipamentos domésticos por habitante ainda é

muito pequeno, a escolha de linhas tecnológicas mais econômicas no consumo

de energia, com preservação do meio ambiente global é, sem dúvida, a

escolha certa.

Além de ser mais barata na operação, a geladeira verde também será mais

barata no momento da compra. Recente levantamento feito pela Greenpeace

nas grandes lojas de revenda da Europa mostrou que as geladeiras verdes são

hoje, em média, de 2% a 5% mais caras que as geladeiras equivalentes à base

de HFCs. Esta situação fatalmente será revertida com o crescimento que as

geladeiras verdes vêm apresentando no mercado europeu, onde já representam

um quinto do total das geladeiras produzidas.

A história da geladeira verde

A primeira geladeira verde foi produzida no início de 1992 pela DKK

Scharfenstein, indústria da antiga Alemanha Oriental conhecida pela marca

Foron. Com a ajuda da Greenpeace, esta indústria uniu-se aos cientistas do

Instituto de Higiene de Dortmund para desenvolver a nova geladeira. Houve

intensa oposição da indústria química e de outros fabricantes de geladeiras.

Dr. Rosin, do Instituto Dortmund, lembra-se: "De repente nós percebemos que

havíamos contrariado um gigantesco lobby industrial, que já havia decidido

que os HFCs seriam os novos fluidos no mundo da refrigeração e que estavam

pretendendo fazer muito dinheiro com isso".

Em julho de 1992, a DKK Scharfenstein decidiu lançar um modelo comercial.

A Greenpeace ajudou a garantir os pedidos de consumidores e varejistas

preocupados com o meio ambiente. Os pedidos de dezenas de milhares de

pessoas em apenas algumas semanas salvaram a empresa, que estava

ameaçada de falência, e garantiu os empregos de seus funcionários.

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A geladeira verde da Foron rapidamente ganhou prestígio junto aos ministros

ambientalistas e recebeu o prêmio Blue Angel. Pela primeira vez uma

geladeira ganhou esse selo de aprovação ambiental. A produção em larga

escala começou em março de 1993. A empresa produziu 160.000 unidades

naquele ano e pretendia produzir 300.000 unidades no ano de 1994. A Foron

projetou receitas para 1994 de 250 milhões de marcos alemães, contra uma

receita de 100 milhões de marcos alemães em 1993. O sucesso da Foron fez

com que seus concorrentes mudassem radicalmente suas estratégias. Em

fevereiro de 1993, a Bosch-Siemens e a Liebherr anunciaram seus planos de

produzir geladeiras à base de hidrocarbonetos.

A nova tecnologia - que marginaliza os HCFCs e HFCs - foi uma mudança

revolucionária para a indústria de refrigeração. A Bosch revela: "Agora

conseguimos, em definitivo, um aparelho completamente isento de CFCs e

HCFCs". A Siemens refere-se aos hidrocarbonetos como o "achado do

século", acrescentando: "Usaremos essa tecnologia pioneira em todos os

modelos possíveis".

Promovendo a tecnologia em todo mundo.

A Greenpeace está agora divulgando a tecnologia de refrigeração à base de

hidrocarbonetos pelo mundo todo, da América Latina à China, para aumentar

seu rápido sucesso. A Greenpeace está trabalhando para mudar as orientações

atuais das empresas, dos governos e das instituições internacionais como o

Banco Mundial e os programas da Organização das Nações Unidas.

Este esforço internacional começa a ter sucesso. Após demonstrações da

Greenpeace em Copenhague e Amsterdam, as geladeiras à base de

hidrocarbonetos tiveram sua vendagem consolidada no mercado europeu. A

Bosch-Siemens anunciou no início de fevereiro de 1994 que até o final

daquele ano 85% das geladeiras por ela produzidas seriam da família de

geladeiras verdes. Essa declaração da Bosch-Siemens foi seguida por outras

de mesmo teor da AEG e da Electrolux.

Os ministros do Meio Ambiente da Inglaterra, da Dinamarca e da Holanda

deram seu apoio à geladeira verde e, atualmente, todos têm seu próprio

refrigerador à base de hidrocarboneto. Os países asiáticos também estão

interessados. Uma apresentação da Greenpeace em Tóquio, em abril de 1993,

atraiu mais de 600 representantes das indústrias japonesa e coreana. Em abril

de 1993, a Greenpeace fez também a primeira apresentação da geladeira verde

na China, reunindo-se com representantes do governo e da indústria que

controlam o mercado chinês. A Greenpeace voltou à China em novembro e a

colaboração continuou, com vistas à implantação de uma primeira fábrica

desses refrigeradores naquele imenso país. O melhor desta tecnologia é que os

gases usados não podem ser patenteados. Eles são baratos e qualquer país, rico

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ou pobre, pode usá-los sem precisar pagar licença ou royalties. Apesar de

todos esses avanços, interesses escusos ainda estão promovendo o uso dos

HFCs e HCFCs na refrigeração doméstica. Por seu lado, a Greenpeace

continua lutando por uma mudança rápida e real.

Alguns produtores europeus de geladeiras, no entanto, continuam ignorando

os avanços tecnológicos. É o caso das empresas inglesas Hotpoint e Lec, que

vendem geladeiras à base de HFCs e HCFCs. Essas empresas têm ignorado

inclusive os avisos do governo do Reino Unido. Em maio de 1993, o

Ministério do Meio Ambiente lançou um desafio no Parlamento, conclamando

as indústrias inglesas a "reconhecer a ameaça" tecnológica que vinha da

Alemanha e a "derrubar nossos competidores" adotando a geladeira a

hidrocarbonetos. Em vão. O governo inglês não pôde contar com seu próprio

mercado quando decidiu fazer algumas compras de produtos ambientalmente

adequados. As autoridades inglesas foram então obrigadas a comprar 20

geladeiras verdes da companhia alemã Liebherr. O então ministro inglês do

Meio Ambiente, Tim Yeo, chamou a imprensa para divulgar o seu desagrado

pelo fato de as empresas inglesas não serem capazes de fornecer uma

geladeira inofensiva ao ozônio para seu próprio gabinete. "É essencial que os

usuários de CFCs e HCFCs apressem-se em encontrar substitutos, se não

quiserem ficar para trás de seus concorrentes", disse o ministro.

Ao mesmo tempo, um abaixo-assinado promovido pela Greenpeace na

Inglaterra, que contou com mais de 180.000 assinaturas, pedia às lojas que

fizessem estoques de geladeiras verdes alemãs. O mesmo abaixo-assinado

pedia aos fabricantes ingleses que iniciassem a produção das geladeiras

verdes. Hoje, estas geladeiras já estão à venda no mercado inglês, porém não

são de fabricação inglesa. Os fabricantes alemães, Bosch-Siemens e Liebherr,

estão divulgando amplamente seus produtos, que não agridem o meio

ambiente, e ganhando novos mercados por todo o Reino Unido.

Protegendo a camada de ozônio com a geladeira verde. Rio de Janeiro, Greenpeace,

s.d.