AS FAMÍLIAS QUE CONSTRUÍRAM ROMA

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Quantas vezes um visitante de Roma depara-se com algum marco histórico e pergunta-se quem o haveria erigido? Por que o haveria feito e qual sua história? Esta fascinante publicação contém todas as respostas. Ao mesmo tempo um guia e uma obra de referência histórica, este livro divide a cidade de Roma de acordo com os distritos outrora dominados pelas famílias fabulosamente ricas dos papas: Colonna, della Rovere, Farnese, Borghese, Barberini e várias outras.

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ROMAAS FAMÍLIAS QUE CONSTRUÍRAM

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Anthony Majanlahti

ROMAAS FAMÍLIAS QUE CONSTRUÍRAM

um guia histórico e cultural

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TraduçãoDrago

Anthony Majanlahti

ROMAAS FAMÍLIAS QUE CONSTRUÍRAM

um guia histórico e cultural

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, sp, Brasil)

Majanlahti, Anthony As famílias que construíram Roma : um guia histórico e cultural / Anthony Majanlahti ; tradução Drago. -- São Paulo : Seoman, 2012.

1. Roma (Itália) - Biografia 2. Roma (Itália) - Descrição e viagens 3. Roma (Itália) - Edifí-cios, estruturas etc. 4. Roma (Itália) - História I. Título. ISBN 978-85-98903-44-6

1. Armstrong, Lance 2. Câncer - Doentes - Estados Unidos - Biografia 3. Ciclistas - EstadosUnidos - Biografia I. Jenkins, Sally. II. Título.

12-04666 CDD-914.5632

Índices para catálogo sistemático:1. Roma : Descrição e viagens 914.5632

Para Madeleine; e em memória de Nicholas Boas

Seoman é um selo editorial da Pensamento-Cultrix.

Direitos de tradução para o Brasil adquiridos com exclusividade pelaEDITORA PENSAMENTO-CULTRIX LTDA.

R. Dr. Mário Vicente, 368 – 04270-000 – São Paulo, SPFone: (11) 2066-9000 – Fax: (11) 2066-9008E-mail: [email protected]

http://www.editoraseoman.com.brque se reserva a propriedade literária desta tradução.

Foi feito o depósito legal.

Título original: Families Who Made Rome – a history and a guide

Copyright © 2005 Anthony MajanlahtiCopyright da edição brasileira © 2012 Editora Pensamento-Cultrix Ltda.

Texto de acordo com as novas regras ortográficas da língua portuguesa.

1a edição 2012.

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida ou usada de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico ou mecânico, inclusive fotocópias, gravações ou sistema de armazenamento em banco de dados, sem permissão por escrito, exceto nos casos de trechos curtos citados em resenhas críticas ou artigos de revistas.A Editora Seoman não se responsabiliza por eventuais mudanças ocorridas nos endereços convencionais ou eletrônicos citados neste livro.

Coordenação editorial: Manoel LauandCapa e projeto gráfico: Gabriela GuentherEditoração eletrônica: Estúdio Sambaqui

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SumárioLista de mapas e itinerários 7

Prefácio, por J. R. S. Boas 9

Agradecimentos 10

INTRODUÇÃO: A CIDADE ARRUINADA 13

1. OLHANDO PARA A CIDADE 21 O monte dos Cenci 25 A contrada dos Santacroce 33 A isola dos Mattei 39

2. OS COLONNA 49 Histórico familiar 49 Itinerário 65

Intermezzo: O Século XV 99

3. OS DELLA ROVERE 102 Histórico familiar 102 Itinerário 120

Intermezzo: O Princípio do Século XVI 168

4. OS FARNESE 170 Histórico familiar 170 Itinerário 184

Intermezzo: Meados e Final do Século XVI 226

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5. OS BORGHESE 231 Histórico familiar 231 Itinerário 241

Intermezzo: O Século XVII 280

6. OS BARBERINI 282 Histórico familiar 282 Itinerário 299

7. OS PAMPHILJ 359 Histórico familiar 359 Itinerário 375

8. OS CHIGI 417 Histórico familiar 417 Itinerário 433

EPÍLOGO: A ABOLIÇÃO DO NEPOTISMO 483

Cronologia 1191–1878 487

Árvores genealógicas 492

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Lista de Mapas e Itinerários

Mapa de Roma, de Giovan Battista Nolli; 1748 21

Itinerário da IntroduçãoO monte dos Cenci 25A contrada dos Santacroce 25A isola dos Mattei 25Concentrações de edifícios construídos pelas famílias, perto da Ilha Tiberiana 26

Itinerário dos ColonnaLugares relacionados aos Colonna em Santa Maria Maggiore e arredores 66O Palazzo Colonna e a Villa Colonna 77Lugares relativos aos Colonna na Piazza Santi Apostoli e arredores 87Monumentos dos Colonna no Tridente 91

Itinerário dos della RovereO Quadrilátero dos della Rovere 122Os della Rovere no Vaticano 135Lugares relacionados aos della Rovere nos arredores da Piazza Navona 160Mapa de Mario Cartaro; 1576 169

Itinerário dos FarnesePalazzo Farnese e suas vizinhanças 195Caminhando com Paulo III 200

Itinerário dos BorghesePalazzo Borghese e suas vizinhanças 245Lugares relacionados aos Borghese em Trastevere 252Via San Francesco a Ripa, segundo o Mapa de Falda; 1676 252A Villa Borghese 258Lugares relacionados aos Borghese na Colina Quirinal 273

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Itinerário dos BarberiniLugares relacionados aos Barberini no Campo de’ Fiori 301Os Barberini nos limites da cidade 307Os aposentos dos nobres: um diagrama esquemático 313Palazzo Barberini: os aposentos da Princesa Anna 318Os Barberini no centro da Antiga Roma 340

Itinerário dos PamphiljOs Pamphilj na Piazza Navona e arredores 377Palazzo Doria-Pamphilj e suas vizinhanças 390A Galleria Doria-Pamphilj 394A Villa Doria-Pamphilj 401

Itinerário dos ChigiA Villa Farnesina 436Os Teatri Chigi da Piazza del Popolo, da Via del Corso e da Piazza Colonna 446A Piazza San Pietro e a Basílica 466

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Prefácio Visitei a Itália pela primeira vez em 1959, quando em férias de Cam-bridge — ocasião que marcou o início de um duradouro caso de amor com o país. Embora tenha passado rapidamente por Roma, ainda posso recordar o tremendo impacto que a cidade exerceu sobre mim, ao adentrá-la pela Pia-zza del Popolo, viajando pela tradicional rota percorrida pelos peregrinos que vêm do Norte. Depois de ter me apaixonado por Roma e começado a conhecê-la devidamente, cheguei à conclusão de que se trata — de longe — da mais bela e fascinante cidade do mundo. Merece algum crédito a noção — consensual desde o século XVIII — de que ninguém pode se considerar verdadeiramente educado enquanto não tiver estado em Roma; ao menos, em imaginação.

Ocorreu-me, há alguns anos, que, dentre os muitos livros que havia lido sobre Roma, faltava um que retratasse mais vivamente as grandes famílias — tais como os Colonna, os Barberini e Chigi, entre outras — com cujos nomes e brasões heráldicos o visitante depara-se a todo momento. Comecei a con-siderar a ideia de escrever tal livro, quando me aposentasse; mas, certa noite, enquanto jantava nas dependências da British School, em Roma, sentei-me ao lado de Anthony Majanlahti, um estudioso que pesquisava os arquivos da English College. Logo percebi que ele alimentava uma profunda paixão por Roma, e já conhecia quase tudo sobre o que eu gostaria de pesquisar. Pelos últimos dois anos, eu e minha esposa, Elisabeth, o temos auxiliado na com-posição deste livro. Desfrutamos de sua companhia em várias excursões por Roma, e passamos muitas horas a discutir sobre o que deveria ser incluído e o que, infelizmente, teria de ser deixado de fora. Espero que este venha a ser um livro essencial para todas as pessoas que se disponham a fazer uma viagem a esta antiga cidade, mental ou fisicamente.

J. R. S. BoasLondres, fevereiro de 2005

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Agradecimentos

Jamais poderia haver imaginado que uma conversa iniciada com um ca-sal inglês, durante o jantar na British School, em Roma, em uma noite do verão de 2001, resultaria em um projeto que nos consumiria três anos. Desco-brimos — Bob e Elisabeth Boas e eu — que compartilhávamos um interesse mútuo pela história das famílias romanas; e, no dia seguinte, ambos gentil-menteme ofereceram seu apoio, caso eu decidisse escrever um livro sobre este assunto.

Ao escrever este livro, meus caminhos se cruzaram com os de pessoas que me ensinaram coisas sobre as quais eu nada conhecia e me corrigiram, quan-do me equivocara — o que aconteceu muitas vezes. Dentre essas pessoas, conta-se, em primeiro lugar, a brilhante Helen Langdon, cuja amizade e pro-fundo conhecimento sobre a história da arte romana foram igualmente essen-ciais para mim. Xavier Salomon leu atentamente os vários esboços diferentes do manuscrito. O padre Mark Lewis, da Companhia de Jesus, prestou-me sua assistência quanto à história dos Jesuítas. A amistosa equipe da Biblioteca Casanatense foi de ajuda inestimável, na obtenção das ilustrações. Também fui extremamente afortunado por haver encontrado minha editora, Jenny Uglow, cujo aguçado olho clínico tornou este livro infinitamente melhor; e cuja benevolência amparou-me através de muitos períodos difíceis.

Este projeto tornou-se — em grande parte — possível graças à assistên-cia da British School, em Roma, e à de seu diretor, Andrew Wallace-Hadrill. Através daquela instituição, encontrei minha colaboradora mais próxima, Cathy Hawley, autora dos mapas elegantemente desenhados que constituem uma marca distintiva deste livro. Do ponto de vista acadêmico, devo mui-to ao falecido Richard Krautheimer, por seu trabalho sobre Alexandre VII; a Carolyn Vallone, por tudo o que ela me ensinou sobre o papel das mulheres no mecenato das artes; a Eamon Duffy, por sua história dos papas; a Robert Coates-Stephens, por seus conhecimentos sobre arqueologia romana; a John Varriano, por seus livros sobre literatura romana e arquitetura barroca; a Ro-bert Brentano, por haver projetado suas luzes sobre os Colonna, durante a Idade Média; a Patricia Waddy e a J. Beldon Scott, por seu trabalho sobre os palácios romanos; e a Joseph Connors, cujo trabalho sobre o urbanismo

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romano no século XVII serviu — mais do que qualquer outra fonte — como inspiração para muito do que pode ser lido nestas páginas.

Vários dos meus amigos foram submetidos a leituras de improviso e co-optados para incursões de pesquisa ocasionais, nos últimos três anos. Agra-deço, particularmente, a Gregory Bailey, por sua compreensão e entusias-mo; e a Gail, Jennifer, Paul, Piero, Rachel, Sophie e a todos os meus “amigos virtuais”, contatados através do site worldcrossing.com. Eu nada poderia ter realizado sem Tom Desmond, que sempre foi pródigo ao me oferecer suas amorosas palavras de compreensão, nos momentos bons e ruins. Agrade-ço, ainda, aos Wallace-Hadrills — Jo, Andrew, Sophie e Michael —, que têm sido como uma segunda família para mim; aos meus pais, à minha irmã, Tina, e seu marido, Duncan; bem como aos meus amigos, Francesco e Alex, de Toronto, por me encorajarem e oferecerem seu apoio, de todas as manei-ras. Na melhor tradição do nepotismo romano, este livro é dedicado à minha sobrinha, Madeleine.

Meus mais profundos e sinceros agradecimentos são para Bob Boas. Foi dele a ideia da qual germinou este livro; e somente pude fazê-lo graças ao seu gentil encorajamento e generoso apoio financeiro — incluindo a utilização do belo apartamento de sua família, no centro de Roma — ao longo de todo o processo de composição deste livro. Meu leitor mais próximo, Bob, editou e revisou todo o texto, desde o início até o fim. Ele e sua esposa, Elisabeth, me proporcionaram não apenas uma oportunidade única em minha vida, mas também brindaram-me com sua afeição e amizade. Junto-me a eles na espe-rança de que este livro possa proporcionar, aos leitores e visitantes, um novo olhar sobre o fascinante palimpsesto que é Roma, e sobre as famílias que a construíram e reconstruíram, à sua imagem e semelhança.

Anthony MajanlahtiRoma, outubro de 2004

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Talvez seja possível afirmar que existam duas Romas históricas. Uma, é a cidade de gesso, que os estudiosos clássicos recriaram, ou criaram — es-pecialmente durante o século XIX: uma cidade de vastas colunatas, arcos e hexâmetros perfeitos, estendendo-se pelo âmago da obtusidade que ensejou as orgias, os assassinatos e a sátira. A outra, a cidade arruinada, é a fundação para as novas coisas, a serem arruinadas, por seu turno — com os amantes, em cada casa entre as ruínas, sonhando, em parte, o sonho de seus prede-cessores; todos irremediavelmente entretecidos, tal como suas casas, com os deles mesmos.

Robert Brentano, Roma antes de Avignon

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Introdução:A Cidade Arruinada

Estou sentado a uma mesinha redonda, do lado de fora de um café, na Piazza Navona. Nos primeiros dias de maio, o clima apenas começa a tornar--se mais quente. Diante de mim, tenho uma xícara de cappuccino fumegan-te, enquanto observo o que acontece ao meu redor. Tento concentrar-me no lugar, com dificuldade, olhando através da massa de transeuntes romanos, turistas e peregrinos, com suas cabeças cobertas por lenços amarelos, e os frequentadores habituais de Navona: vendedores ambulantes, mímicos e mú-sicos de rua. A latitude da praça elíptica pode ser medida de acordo com a concentração dos blocos coloridos de sua pavimentação — azuis, ocres, ama-relos e brancos. No sentido longitudinal, por trás do jorro constante da Fon-te dos Quatro Rios, com seu obelisco, ergue-se uma igreja branca, com um domo e duas torres simétricas, com sineiras. Flanqueando a igreja, à esquerda e à direita, há duas construções, de uma tonalidade azul-cinzenta semelhan-te. À esquerda está uma grande residência da nobreza; e, à direita, como se refletisse parcialmente esta, uma outra residência, menos grandiosa. Ainda que a piazza tenha sido construída sobre as fundações de um antigo estádio, no mesmo lugar onde havia um importante mercado, na Idade Média, qua-se tudo o que posso ver, agora, está, de alguma forma, ligado a uma família nobre do século XVII — uma das famílias que construíram Roma. Procuro retornar, mentalmente, à Piazza Navona da Idade Média, visualizando-a des-tituída dos emblemas da família que ordenou sua remodelação: sem palácios, sem a grande igreja, sem a fonte central; apenas com austeros edifícios mais parecidos com fortalezas, casas baixas e ruínas, lama e palha. É um quadro difícil de imaginar, e eu busco me refugiar em um gole de café.

Tendemos a pensar na história de Roma como uma sucessão contínua e li-near de acontecimentos, mas isto diminui a importância das alterações ocor-ridas ao longo do tempo. Jamais houve um caminho predestinado da Roma antiga até a cidade que vemos hoje em dia: a Roma atual não é mais do que a tataraneta — na melhor das hipóteses — de sua antiga predecessora. É ver-dade que cidade foi continuamente habitada; mas, após o final do período

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clássico, sua população não passava de uma fração daquela dos dias do apo-geu, e a grandeza do passado não era mais do que uma vaga lembrança para aquelas pessoas.

Por volta do ano 1300, a antiga cidade das colunatas e arcos jazia destruída e enterrada na lama trazida pelas enchentes do Tibre; e uma cidade muito diferente — quase irreconhecível, aos nossos olhos — havia lhe tomado o lugar. Na verdade, “cidade” talvez não fosse a palavra adequada para descrever o amontoado de assentamentos e construções precárias que circundava as grandes igrejas. A maioria dos romanos vivia às margens do rio, na direção do Vaticano; todos do lado de dentro das antigas muralhas, que continham me-nos residências do que terrenos desabitados, usados como pastagens ou com vinhedos cultivados. Pobre, decadente e despovoada, a cidadela medieval concentrava-se nas várzeas do Tibre, onde ao menos a água era abundante. Havia dois elementos físicos que a caracterizavam: torres e ruínas.

Nesta gravura de Etienne Dupérac, a grandiosa Torre delle Milizie (ao fundo) assoma sobre as ruínas do templo de Antoninus e Faustina, no Fórum.

Como ossos quebrados, lembranças de um mundo antigo despontavam da lama, longe de qualquer possibilidade de recuperação, como incompreen-síveis fragmentos de uma anatomia urbana perdida. Muito havia sido esque-

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cido: até mesmo o nome do Fórum romano, que passou a se chamar Campo Vaccino — o campo das vacas —, e o Capitólio, o coração dos antigos cultos do Estado, tornou-se conhecido como Monte Caprino (colina das cabras). Grandes pedaços da antiga cidade obstruíam até mesmo o centro da cidade medieval, construído em torno da grande igreja de Santa Maria Rotonda, o Panteão. As ruínas das fundações dos antigos palácios que subiam pela encos-ta da colina Palatino eram utilizadas como lugares para estocagem de gêneros ou como viveiros para criação de animais. Das fachadas de quase todos os novos edifícios — particularmente dos de alguma importância — podia-se ver emergir pedaços de antigas cornijas e entablamentos; velhas inscrições monumentais eram utilizadas como lápides, e pedaços de mármore, muito pequenos para serem utilizados em construções, serviam como pavimenta-ção ornamental das igrejas.

As torres da Roma medieval deviam causar uma impressão igualmente po-derosa. Elas eram mais robustas sobre o solo do que sugerem seus exemplares remanescentes. O poeta Joachim du Bellay, no século XVI, chamou Roma de uma cidade “couronné de tours” (coroada com torres). As que ainda restam permanecem como um eloquente testemunho da força social dominante da vida medieval: a nobreza local, os barões de Roma. Um labirinto de ruelas — algumas seguindo o mesmo curso das mais antigas — desenhava-se por entre as torres, as casas dos artesãos, os mosteiros, que mais se assemelhavam a for-talezas, e as mansões dos clérigos. Assim era o panorama de Roma, em 1300.

Quatro séculos mais tarde, a cidade já se parecia com a magnífica capital que conhecemos hoje — por obra das pessoas que a construíram, as gran-des famílias da nobreza romana. Este livro delineia suas histórias e descreve a gradual transformação da cidade, expandida e transformada tantas vezes, à medida que diferentes famílias ascendiam ao poder ou dele decaíam, gas-tando suas imensas fortunas com a construção de palácios e igrejas, ruas e piazze. Personagens extravagantes, ambições desmedidas e súbitas tragédias estão imbricadas no mapa de Roma: a qualidade dramática da história roma-na é refletida no desenho teatral da própria cidade, explicitamente remode-lada como foi, tantas e tantas vezes, para contar uma história. Os edifícios da Piazza Navona tentam nos dizer algo; mas, para que possamos compreender o que dizem, é preciso que confrontemos a história da cidade.

A principal característica que diferenciava Roma de qualquer outra cidade era o fato de ser uma província do papa. As famílias nobres visavam tornar

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alguns de seus integrantes cardeais; membros do colégio eleitoral do papa e, eventualmente, um papa — pois as famílias de quem chegasse a exercer este ofício teriam acesso a fundos e influência praticamente ilimitados. Por quatrocentos anos, os sucessivos papas prodigalizaram riquezas e terras aos seus parentes — não raro os elevando das mais humildes origens sociais à condição de duques e príncipes, que continuavam a beneficiar-se de seu po-der mesmo muito tempo depois que o papa desaparecesse para sempre. Esses nobres expressavam seu orgulho, seus interesses, suas ambições e sua piedade através das edificações e das obras de arte cuja realização patrocinavam.

Tais patrocínios custavam enormes somas de dinheiro. Apesar de a pro-priedade de terras constituir a base da riqueza da maioria das famílias nobres e outras haverem construído suas fortunas exercendo atividades bancárias, a ocupação de posições-chave na corte papal era algo ainda mais lucrativo. Membros da corte podiam tornar-se imensamente ricos; e, uma vez que mui-tos dos personagens descritos nos capítulos seguintes detivessem cargos im-portantes na administração papal, uma contemplação dos “homens do papa” pode ser útil à nossa compreensão.

Para começar, o papa era o bispo de Roma. Cabia a ele indicar um vigário, ou substituto, para administrar sua diocese local. Como um tributo à base do poder romano, a cada um de seus cardeais era, tradicionalmente, outorgada uma igreja romana, como seu titulus ou igreja titular (refletindo uma antiga tradição de que o bispo de Roma fosse eleito por um conselho formado por párocos romanos). Essas igrejas titulares foram os focos naturais dos esfor-ços arquitetônicos desempenhados pelos vários cardeais. Até que o Concílio de Trento proibisse esta prática, no século XVI, os cardeais (e, na verdade, muitos outros prelados) costumavam manter numerosos bispados e arcebis-pados, bem como ricas abadias. Membros do cardinalato podiam agir como diplomatas e administradores; mas eram, antes de qualquer outra coisa, prín-cipes da Igreja.

A burocracia papal era constituída principalmente de clérigos, embora houvesse alguns cargos seculares, dentre os quais o mais elevado era o de Capitão-General da Igreja Romana, o líder do exército pontifício. O cargo de castelão da fortaleza pontifical, o Castel Sant’Angelo, geralmente era ocupado por um leigo, bem como as posições de uma pequena bancada legal, integra-da pelos advogados consistoriais. Todavia, as altas posições administrativas, que proporcionavam as maiores rendas e mais poder, eram reservadas aos

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clérigos. O cargo mais elevado era o de cardinal nipote (cardeal sobrinho): vir-tualmente, um secretário de Estado; e, como o próprio título indica, o ofício era reservado a algum familiar do papa. A importância deste papel variava, de acordo com cada papa; mas ela poderia ser vital, especialmente se envolvesse relações internacionais ou o governo dos Estados Papais.

Outros cargos eram quase tão importantes. O camerlengo (camareiro) con-trolava a Camera Apostolica (o Tesouro) e era encarregado da política finan-ceira e da taxação fiscal. Ele indicava quase todos os seus subordinados, exce-to o próprio tesoriere (tesoureiro), que era indicado pelo papa. A Chancelaria, onde as bulas e decretos papais eram escritos e as disputas legais eram esta-belecidas, ficava sob o controle do vice-cancelliere (vice-chanceler). Abaixo do vice-chanceler — um cargo vitalício — encontrava-se o datario (datário pa-pal), sempre um dos funcionários mais atarefados, cuja atribuição era, nomi-nalmente, colocar as datas nas bulas papais; mas, na verdade, a seu cargo fica-vam os escribas — os escritores das bulas — e os abreviadores, que resumiam o conteúdo das bulas para um registro geral; bem como o protonotario apos-tolico (chefe da burocracia legal). Existia uma justiça papal, encarregada de estabelecer julgamentos por toda a comunidade cristã. O último departamen-to era o penitenciário, chefiado pelo gran penitenziario (grão-penitenciário); responsável pela aplicação de punições eclesiásticas, tais como excomunhões e reconciliações subsequentes ao cumprimento das penalidades. Além disso, as três grandes igrejas — a de São Pedro, a de San Giovanni in Laterano (São João em Latrão) e a de Santa Maria Maggiore — contavam com archipreti (ar-ciprestes), que desempenhavam várias funções litúrgicas, frequentemente em lugar do papa. Roma, enquanto cidade, era administrada por um governador, indicado pelo papa; mas a administração municipal corriqueira ficava a cargo dos oficiais da cidade — os conservatori —, geralmente, nobres.

Até 1870, o papa também governava os Estados Papais, que se estendiam diagonalmente através da Itália central. A governança do papa poderia ser exercida de duas maneiras: diretamente, através de governadores ou legatá-rios; ou por meio de nobres intermediários, que governavam sobre territórios como signori (senhores) hereditários, representantes do papa. Ocasionalmen-te, o papa podia destituir uma família de sua senhoria hereditária e impor um novo governador. Em outras ocasiões, ele poderia impor sua própria família como governadora de um território. Estas experiências obtiveram níveis desi-guais de sucesso, como veremos a seguir.

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A riqueza gerada por essas posições é difícil de ser quantificada em valores modernos; tanto mais por causa das várias mudanças monetárias — quanto à forma e ao valor do dinheiro — ocorridas ao longo dos séculos. Do final do século XV até 1530, a principal cunhagem papal foi o ducado — o “ducado de ouro da Câmara”, de valor equivalente ao de seu predecessor, o florim de ouro. Em 1530, Clemente VII de’ Medici introduziu uma nova moeda, o escudo de ouro. O ducado, o florim e o escudo eram aproximadamente equivalentes, em termos de valor. Mas o que isto significava? Uma receita anual típica pode nos proporcionar uma contextualização: um mestre-escola ou um clérigo poderia ganhar cerca de 25 ducados ao ano, no início do século XVI; em contraste com este fato, Don Camillo Pamphilj, na década de 1650, doou 60.000 es-cudos para a construção de Sant’Andrea al Quirinale — soma equivalente a dois anos de arrecadação de tributos de toda uma cidade dos Estados Papais.

Século após século, as famílias romanas mudaram o mapa urbano. Os ba-rões do século XIV precisavam de suas torres e fortalezas para se manterem em segurança, especialmente quando o papado mudou seu trono para Avig-non, em 1309, e não retornou a Roma antes de 1378, depois que um papa rival instaurou sua corte em Avignon, provocando o Grande Cisma. O período subsequente a estes fatos foi o mais difícil, desde a queda do antigo império: a economia, frágil e dependente do papa, ruiu em sua ausência, enquanto guer-ras devastaram os campos romanos e até mesmo a própria cidade. O supri-mento de alimentos era escasso e a ordem pública não passava de um sonho inatingível.

Barões medievais, como os Cenci, os Santacroce, os Orsini e os Colonna, abriram seus caminhos sem oposição na ausência do papa. Como escreveu um cronista do século XIV:

“Por todos os lados, a devassidão. Por todos os lados, o mal. Não há justiça; não há lei. Não há mais nenhuma escapatória: o homem mais forte e mais hábil no manejo da espada é que tem mais razão e direitos. A única maneira de uma pessoa defender-se a si mesma é através da ajuda de seus parentes e amigos. Todos os dias formam-se grupos de homens armados.”

A cristandade católica apenas foi se reunir em 1417, sob a égide de um nobre romano, Martin V Colonna, como papa. A restauração do papado no século XV feriu mortalmente a estruturação do poder dos antigos barões. Os dois papas

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da família della Rovere combateram implacavelmente a desordem implícita no baronato. Eles proporcionaram um modelo para as futuras famílias papais, ten-do sido os primeiros a implantarem o domínio hereditário deles mesmos sobre os Estados Papais, contra o panorama das Guerras Italianas (1494–1559). Os Farnese, no século XVI, foram a próxima família a seguir seu exemplo.

As grandes famílias do século XVII — os Borghese, os Barberini, os Pamphilj e os Chigi — devotaram suas atenções para o esplendor, em vez da soberania: em vez de conquistar e governar seus próprios territórios, suas ambições concentraram-se apenas sobre Roma e sua campagna circundante. (Devido ao fato de a história ser tão complexa e a sucessão dos papas ser verti-ginosa, este livro inclui uma breve cronologia, para proporcionar um contex-to.) Ao longo de todo este tempo, as famílias modificaram constantemente a face da cidade, patrocinando arquitetos e artistas, adotando novos estilos — do renascentista ao barroco; do rococó ao neoclássico — e encomendando trabalhos aos maiores artistas: Michelangelo, Rafael, Bernini. Embora pudes-sem ser rudes e venais, os nobres romanos também se mostravam capazes de atos de fé sincera; e desprezar ou ignorar isto é perder boa parte da perspec-tiva do quadro geral.

O capítulo de abertura descreve três itinerários baseados nas famílias, em uma mesma área da cidade, que traz à luz certos aspectos da paisagem urbana e apresenta o mundo social da aristocracia romana no século XIV. As famílias Cenci, Santacroce e Mattei expressaram, em menor escala, as mesmas ambi-ções e desejos que motivaram suas grandes sucessoras.

Este livro pode servir para guiá-lo em uma visita à cidade; mas ele também foi escrito para o leitor que gosta de viajar em imaginação, confortavelmente sentado em uma poltrona. Cada capítulo contém duas seções: a primeira con-ta a história de uma família, com seus personagens mais notáveis descritos detalhadamente. A segunda, constitui um itinerário dos lugares relacionados a cada família. Em geral os itinerários não oferecem uma rota particular en-tre os monumentos, preferindo focalizar os lugares que guardem uma relação com a família em questão, em vez de sugerir um passeio turístico por uma vi-zinhança — ainda que, às vezes, dentro de um itinerário, um passeio turístico possa ser sugerido. Às vezes, visitaremos bastante os mesmos lugares, quando estes voltem a adquirir importância nas histórias das sucessivas famílias. Há muitas surpresas reservadas. Alguns dos maiores centros de poder, como a Piazza San Pietro, são óbvios; mas poucas pessoas poderiam esperar encon-

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trar, na semioculta Piazza Santi Apostoli, por exemplo, o lugar que abrigou tantos homens poderosos.

Olhar para o mapa de Roma desta maneira nos revela uma história alter-nativa: a história da aristocracia urbana, do patriciado e de seus efeitos sobre a cidade por ele governada. O aparentemente confuso mapa viário de Roma torna-se, repentinamente, racional e compreensível: se pudermos compreen-der sua linguagem, passaremos a lê-lo não como um mero mapa de ruas, mas, também, de ambições e sonhos, de invejas e ódios, de orgulho e de amor. To-das essas emoções tomam forma nas ruas e construções da cidade, elaborada na história das famílias que construíram Roma.

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1. Olhando para a cidade

O mapa de Giovan Battista Nolli, de 1748, mostra o emaranhado de estradas e alamedas no centro de Roma. A rua cujo traçado é destacado por uma linha negra é a Via Papalis — rota principal das procissões papais entre os dois polos representados pelas igrejas de San Pietro e San Giovanni in Laterano. Foco principal de intensas remodelações urbanísticas, a partir do início do período moderno, atualmente seu trecho principal (que passa sob a Piazza Navo-na) é o que foi substituído pelo Corso Vittorio Emanuele II, desde o século XIX.

Roma, a Rainha das Cidades, vangloria-se de duas miríades de habitantes; agora que o Estado Todo-Poderoso é dominado por mesquinhos Príncipes, Roma apequena-se.

Robert Burton, A Anatomia da Melancolia, 1621

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Quando olhamos para a Roma de hoje, precisamos ter em mente que ela é muito diferente da Roma do século XVII — e ainda mais, da do século XIV. É preciso treinarmos nosso olhar e filtrarmos os altos edifícios dos períodos mais recentes para que possamos ter uma sensação da aparência da cidade no passado. E não apenas isto: também devemos imaginar uma cidade com ape-nas algumas de suas ruas pavimentadas, com pedras ou mesmo com madeira. É preciso que nos esqueçamos dos encanamentos que levam água potável às casas e que nos lembremos de que as fontes, em Roma, sempre tiveram uma finalidade muito mais importante do que a meramente decorativa: o abaste-cimento de água ao povo. E é necessário pôr de lado noções de coisas como automóveis, iluminação pública e uma rede de saneamento básico.

Também devemos ignorar um dos traços mais característicos de Roma, o palazzo d’affitto — o edifício de apartamentos —, tipo de construção que surgiria apenas no final do século XVII e início do século XVIII, quando a po-pulação começou a crescer. Antes disso, os palácios dos nobres e os sobrados de dois pavimentos dos trabalhadores — geralmente, uma combinação de residência e oficina — compunham o panorama urbano da Roma dos sécu-los XV e XVI. Os novos edifícios de apartamentos elevaram o perfil das ruas da cidade: pela primeira vez, artesãos e mercadores podiam habitar edifícios residenciais tão altos quanto aqueles dos ricos. O que vemos, hoje em dia, é uma paisagem urbana muito mais alta e uniforme.

Outro aspecto distintivo dos quarteirões urbanos de Roma é a frequência com que eles expressam as ambições de seus vários proprietários. Era comum que um proprietário construísse apenas parcialmente um grande edifício e fosse gradualmente expandindo seus domínios, adquirindo os lotes adjacen-tes, demolindo as construções que neles existissem, para, afinal, ampliar a sua construção original. Este processo costumava ser interrompido por falta de fundos, pela intransigência de um vizinho, ou mesmo pela morte do proprie-tário ambicioso — resultando no fato de Roma se tornar uma cidade de casas parcialmente construídas. A característica mais identificadora destas é a bor-da serrilhada de uma das laterais da fachada de uma construção. Um exemplo é o Palazzo Mattei di Paganica, na Piazza dell’Enciclopedia Italiana. O palace-te assoma sobre uma casa vizinha, do século XV. Suas divisões internas foram deixadas inacabadas, para que a construção de uma nova parte pudesse ser continuada, emendando-se à parte antiga da fachada — que se assemelha a um conjunto de dentes, pronto para devorar a construção vizinha. O historia-

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dor de arte Joseph Connors, contemplando este aspecto particular das ruas de Roma, refere-se a uma sensação “fundamental de péssima convivência en-tre vizinhos”, transmitida pelas edificações da cidade. Essas fachadas ganan-ciosas e expansionistas, com suas bordas endentadas, também contribuem para dar a Roma sua aparência de uma cidade em ruínas.

Uma forma de pensar sobre Roma é em termos de suas diferen-tes subdivisões. Na Idade Média, Roma foi dividida em várias regiões administrativas — chamadas rioni —, sucessoras das regiões da cidade estabelecidas por decreto de Au-gustus, no século I a.C. O primeiro rione foi chamado Monti (colinas) e abrangia todos os terrenos mais elevados dentro dos limites das muralhas — aproximadamente um terço da extensão total do territó-rio da cidade. Uma vez que era a própria população quem definia os limites dos rioni, podemos consta-tar, novamente, que os habitantes medievais abandonaram a área do centro antigo e concentraram-se na curva do Tibre. Havia treze rio-ni; mas a população aglomerava-se nos rioni de Ponte, Parione, Rego-

la, Sant’Angelo (onde ficava o gueto judeu), San Eustachio, Pigna e Cam-pitelli — todos contidos na curva do Tibre e próximos das margens do rio. Menos populosos eram os rioni de Colonna, Campo Marzio e Trevi, que se enfileiravam ao longo da margem leste; enquanto Ripa, na extremidade sul, e Trastevere, na margem oposta do rio, eram movimentados distritos mercantis. Borgo, diante da igreja de San Pietro, foi adicionado como o 14.º rione em um período posterior da história de Roma; mas, durante a maior parte do período em questão, ele era considerado separadamente, como um assentamento papal.

A borda endentada do Palazzo Mattei di Paganica. Por trás do letreiro da Enciclopedia Italiana, a fachada avança com seus dentes ameaçadores, fechando-se sobre a construção menor.

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Dentro dessas subdivisões, todavia, ocultavam-se outras, ainda menores; mas com designações mais significativas de vários lugares. Notavelmente — e de modo distinto do que acontecia em outras cidades medievais —, as divi-sões paroquiais eram relativamente insignificantes; pois, na verdade, o tama-nho e a importância de cada paróquia podiam aumentar ou diminuir, de acor-do com o aumento ou o declínio no número de paroquianos. Os romanos da Idade Média e de períodos posteriores tendiam a ver sua cidade menos em termos de paróquias e de rioni do que em termos de vizinhanças — domi-nadas por nobres locais que, frequentemente, davam seus próprios nomes à área, registrando-os inclusive em documentos legais.

A autoridade local, representada pelas famílias nobres, era comumente ex-pressa em termos físicos, tais como uma ilha (isola), uma extensão de terras (contrada) ou uma colina (monte). Três breves excursões a pé — dentro dos limites dos rioni de Sant’Angelo e Regola — nos revelam de que maneira es-sas áreas podiam aglutinar-se e funcionar conjuntamente, evidenciando uma quantidade de características comuns.

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ITINERÁRIO

1. O monte dos CenciPartindo da Piazza Cenci, seguindo pela Via Arenula

Nesta e nas próximas duas excursões, estaremos procurando principal-mente pelos vestígios dos nobres medievais e pelas maneiras através das quais as famílias nobres mantiveram suas tradicionais propriedades centrais, até mui-to tempo depois de a Idade Média tornar-se apenas uma lembrança distante.

Um horripilante poema popular, recitado no dialeto local, evoca o tipo de emoção que os barões medievais despertavam no povo romano.

Chave:1. O monte dos Cenci2. A contrada dos Santacroce3. A isola dos Mattei

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Orsin, Colonna, Cenci e FrangipaniRiscuoton oggi e pagano domani.Più assai che peste, papa, ed Imperiali,Più a Roma sono assai crudeli e fatali,Più assai che fame, Galli, e Aragonesi,Savelli, Orsini, Cenci, e Colonnesi.

(Orsini, Colonna, Cenci e Frangipani,Cobram hoje, mas pagam amanhã.Muito mais do que a peste, o papa e os imperialistas,Para Roma eles são mais cruéis e mortíferos,Muito mais [muito piores] do que a fome, os franceses e os aragoneses,São os Savelli, os Orisini, os Cenci e os Colonna.)

Concentrações de edifícios construídos pelas famílias, perto da Ilha Tiberiana, no mapa de Nolli, de 1748.

Chave:1. O monte dos CenciI. Palazzetto CenciII. Palazzo Cenci-BolognettiIII. San Tommaso ai Cenci

2. A contrada dos SantacroceI. Palazzo SantacroceII. Santa Mari in PublicolisIII. Palazzo Santacroce PasoliniIV. Palazzo del Monte di Pietà (antigo Palazzo Santacroce)

3. A isola dos MatteiI. Piazza Mattei e a Fontana delle TartarugheII. Palazzo di Giacomo MatteiIII. Palazzo Mattei di GioveIV. Palazzo Mattei CaetaniV. Palazzo Mattei Paganica