As Crianças Nascidas Para a Morte

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AS CRIANÇAS NASCIDAS PARA A MORTE Transcrevo abaixo uma parte do artigo "Os gêmeos e a morte: notas sobre os mitos dos Ibeji e dos abiku na cultura afro-brasileira", da autoria de Monique Augras, publicado em "As senhoras do pássaro da noite", coletânea organizada por Carlos Eugênio Marcondes de Moura. "... Entre os iorubá, quando muitas crianças de uma mesma família nascem e morrem sucessivamente, considera-se que, na realidade, trata-se da mesma criança que morre e renasce continuamente. Ela não tem a menor intenção de permanecer neste mundo, pois pertence a uma confraria de espíritos astuciosos que se divertem demais juntos e que, desde seu nascimento, anseiam por regressar para junto de seus amigos e com eles se entreterem. Quando são chamados para nascer, despedem-se, marcando um encontro para o dia de seu retorno. É por isso que são denominados Abiku, que, muito literalmente, significa "aqueles-que- nascem-para-morrer". O "filho substituto", portanto, é necessariamente um abiku, pois nasce após a morte de um irmão. É preciso multiplicar as precauções mágicas para impedir essa criança de voltar a brincar com seus companheiros. Amarram-se guizos em seus tornozelos ou então pulseiras de metal que se entrechocam. Diz-se que, assustados com esse barulho, os espíritos travessos não viriam relembrar à criança a promessa por ela feita e, talvez, ela a esqueça. Oferecem-se também sacrifícios, alimentos que agradam aos espíritos Abiku, a fim de os tornar benfazejos. Dá-se sobretudo à criança um nome cuja virtude deve permitir-lhe resistir ao apelo da morte: "A-criança-voltou" (Omotunde), "A-vida-é-suave" (Aiyédun), "Não-morra" (Maaku), "Aquele-que-vem-do-céu-voltou" (Ayorunbó), "A-morte-o-esqueceu" (Kuforijin), "Não-se-deixe-morrer" (Kojeku), para citar apenas alguns, entre tantos outros nomes levantados por R.C. Abraham e P. Verger (1968). Os membros das comunidades de origem africana conservam estas tradições no Brasil. Ao nome geralmente católico acrescenta-se discretamente um desses "nomes poderosos", como é o caso, por exemplo, de "Pedro Kiké" (indulgente), citado por Verger (1968), dado ao neto da mãe-de-santo de um terreiro do Estado de São Paulo, que reconheceu nele um abiku. Com efeito, não há necessidade de se esperar uma sucessão de lutos para identificar uma criança-nascida-para-morrer. O jogo de búzios (erin dilogun), que os fiéis do candomblé consultam em todos os momentos decisivos de suas vidas, permite prever as ameaças que pesam sobre o recém-nascido. As crianças cujo parto foi muito difícil, aquelas que, por ocasião do nascimento, perdeu-se a esperança de salvar, bem como aquelas que nascem após uma série de abortos, são igualmente incluídas entre os abiku. O diagnóstico precoce, se assim se pode dizer, da presença de uma criança- nascida-para-a-morte é extremamente importante. Agindo-se com conhecimento de causa, poder-se-á multiplicar as precauções e as oferendas, a fim de reter na vida o abiku recalcitrante.

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AS CRIANAS NASCIDAS PARA A MORTE

AS CRIANAS NASCIDAS PARA A MORTE Transcrevo abaixo uma parte do artigo "Os gmeos e a morte: notas sobre os mitos dos Ibeji e dos abiku na cultura afro-brasileira", da autoria de Monique Augras, publicado em "As senhoras do pssaro da noite", coletnea organizada por Carlos Eugnio Marcondes de Moura. "... Entre os iorub, quando muitas crianas de uma mesma famlia nascem e morrem sucessivamente, considera-se que, na realidade, trata-se da mesma criana que morre e renasce continuamente. Ela no tem a menor inteno de permanecer neste mundo, pois pertence a uma confraria de espritos astuciosos que se divertem demais juntos e que, desde seu nascimento, anseiam por regressar para junto de seus amigos e com eles se entreterem. Quando so chamados para nascer, despedem-se, marcando um encontro para o dia de seu retorno. por isso que so denominados Abiku, que, muito literalmente, significa "aqueles-que-nascem-para-morrer". O "filho substituto", portanto, necessariamente um abiku, pois nasce aps a morte de um irmo. preciso multiplicar as precaues mgicas para impedir essa criana de voltar a brincar com seus companheiros. Amarram-se guizos em seus tornozelos ou ento pulseiras de metal que se entrechocam. Diz-se que, assustados com esse barulho, os espritos travessos no viriam relembrar criana a promessa por ela feita e, talvez, ela a esquea. Oferecem-se tambm sacrifcios, alimentos que agradam aos espritos Abiku, a fim de os tornar benfazejos. D-se sobretudo criana um nome cuja virtude deve permitir-lhe resistir ao apelo da morte: "A-criana-voltou" (Omotunde), "A-vida--suave" (Aiydun), "No-morra" (Maaku), "Aquele-que-vem-do-cu-voltou" (Ayorunb), "A-morte-o-esqueceu" (Kuforijin), "No-se-deixe-morrer" (Kojeku), para citar apenas alguns, entre tantos outros nomes levantados por R.C. Abraham e P. Verger (1968).

Os membros das comunidades de origem africana conservam estas tradies no Brasil. Ao nome geralmente catlico acrescenta-se discretamente um desses "nomes poderosos", como o caso, por exemplo, de "Pedro Kik" (indulgente), citado por Verger (1968), dado ao neto da me-de-santo de um terreiro do Estado de So Paulo, que reconheceu nele um abiku. Com efeito, no h necessidade de se esperar uma sucesso de lutos para identificar uma criana-nascida-para-morrer. O jogo de bzios (erin dilogun), que os fiis do candombl consultam em todos os momentos decisivos de suas vidas, permite prever as ameaas que pesam sobre o recm-nascido. As crianas cujo parto foi muito difcil, aquelas que, por ocasio do nascimento, perdeu-se a esperana de salvar, bem como aquelas que nascem aps uma srie de abortos, so igualmente includas entre os abiku. O diagnstico precoce, se assim se pode dizer, da presena de uma criana-nascida-para-a-morte extremamente importante. Agindo-se com conhecimento de causa, poder-se- multiplicar as precaues e as oferendas, a fim de reter na vida o abiku recalcitrante.Se, apesar de tudo, ele morrer, considera-se que uma prova da maldade da confraria. Os autores que realizaram investigaes de campo na Nigria e no Benin (Abraham, 1962, Bascom, 1980, Verger, 1968) informam que, segundo o costume, o pequenino cadver mutilado ou mesmo queimado, para privar o abiku de qualquer vontade de recomear. Nada disto ocorre no Brasil, pelo menos no estgio atual de nossos conhecimentos. Se, ao contrrio, a criana sobreviver, tornar-se adulta e at mesmo alcanar uma idade avanada, ela, entretanto, ser tratada diferentemente das outras pessoas. Sabe-se que no candombl brasileiro os sacerdotes e sacerdotisas tm a cabea raspada por ocasio da iniciao. A cabea , com efeito, o receptculo do deus ao qual o novio consagrado e que ir manifestar-se por meio da possesso. Ao longo de toda a sua vida de iniciado, sua cabea receber um tratamento ritual que objetiva fortalec-la. Por ocasio dos aniversrios religiosos, aps um, trs, sete e vinte e um anos de iniciao, ou ento por ocasio do acesso a cargos eminentes, a cabea do sacerdote ser novamente raspada, entre outras manipulaes destinadas construo simblica do corpo do iniciado (Augras, 1986). Na linguagem dos fiis do candombl, "ser raspado" tornou-se sinnimo de iniciao, e a navalha um dos instrumentos entregues com grande pompa me-de-santo de um terreiro por ocasio de sua investidura, como emblema de suas novas funes. Ora, proibido raspar a cabea de um abiku. Se isso fosse feito, ele morreria na hora. que o rito tem por funo estabelecer, se assim se pode dizer, a permeabilidade da cabea s foras do alm. Ento nenhuma barreira deixaria de se opor aos chamamentos da confraria (dos abiku). Os ritos de iniciao incluem uma experincia de morte simblica. Aquele a quem se subtrai cotidianamente morte no deve, portanto, se expor jamais a ela. O lao que o liga vida to tnue que se deve evitar toda tentao a essa pessoa. Alm disso, a criana prometida morte, que escapou de vrias tentativas de retorno ao no nascimento, , de algum modo, mantida em constante estado de liminaridade, que se ope delimitao instituda pelos ritos de passagem. A iniciao, ao mesmo tempo que abre uma brecha entre dois nveis de existncia, logo a fecha. Ritos preliminares e ps-liminares garantem respectivamente a separao do estado anterior e a agregao do novo estado (Van Gennep, 1909). A ordem do mundo novamente afirmada. O abiku, ao contrrio, o morto-vivo, o esprito que reencarna incessantemente, o ser marginal. A presena desse esprito matreiro e teimoso cria um estado permanente de alteridade, que probe o acesso a esse outro tipo de desdobramento que a possesso ritual, pois o deus no pode manifestar-se em uma cabea que no foi preparada segundo o costume. No caso do abiku tudo parece transcorrer como se ele, encarnando seu prprio duplo, no estivesse mais disponvel para a manifestao do Outro divino. O reino da morte, Outro absoluto, ope-se ao dos deuses e, nas comunidades de candombl, o culto dos orixs totalmente separado do culto dos espritos ancestrais. A iniciao opera, de algum modo, uma domesticao da morte no plano simblico, necessria construo ritual da dualidade que, no instante culminante da possesso, se faz sntese (Augras, 1983). O abiku, ao contrrio, j dado como um ser dual. Mantido fora entre os vivos, movimenta-se em um espao no delimitado, em um presente vivido no modo do passado. O "filho substituto", na tradio iorub, no usurpador, como nas famlias descritas por B. Brusset mas, de modo semelhante, o filho do desejo de abolir a morte e, como tal, no encontra seu lugar em parte alguma. Sem espao definido e sem tempo prprio, seu ser o de um outro."

t gravida. A, a criana recebe todos os fundamentos que a me receber....

Formas de Abik 1- Abik In ou Iz - Abik do Fogo - que come a cabea da me (mata-a) no nascimento, ou do pai posteriormente pr acidente......

2 - Abik Om ou Azin - Abik da gua: este o tipo de abik que nasceu de 6, 7 ou 8 meses. Geralmente explode a bolsad'gua da me nesse perodo vai para a incubadora. Morre precocemente ou cresce e sai desse perodo critico

3- Abik Al - Abik da terra: este o tipo de abik, que esto mais intimamente ligados aos seus companheiros da floresta que com freqncia o chamam de volta. Muitas vezes nascem pr cesariana ou de parto normal sanguinolento....

4 - Abik Fefe - Abik do Vento: este tipo difere um pouco dos demais pr ser de especial origem no meio do convvio das pessoas. Ele destaca-se em todo ambiente desde seu nascimento que, em geral, foi inesperado ou no planejado. So emocionalmente instveis.... Texto de Eduardo Fonseca Junior - Professor de Teologia e Cultura Afro-Negra

costume na cultura Gge-Yoruba dar nomes especiais a certas crianas chamadas abik, cuja traduo "nascido para morrer". elas so consideradas pela ancestral cultura africana como pertencentes a uma legio de espirtos que moram nas florestas ou em torno das rvores de Iroko. sabido que cada m desses abiks quando necem j trazem consigo o dia e a hora em que vo retornar para o "outro lado da vida", para a companhia dos seus companheiros das florestas de Iroko. geralmente este tempo determinado entre o nascimento e os sete anos de vida. Providncias so tomadas para que essas crianas permaneam no mundo dos vivos, fazendo-as esquecer as datas e, consequentemente, seus companheiros do outro lado. alm dos amuletos e magias feitos nessas crianas, os quais vo desde simbolos, brves e patus que so postos em suas pernas, braos e pulsos, pinturas destonantes so feitas em seus corpos de forma que transmitam sentimentos repulsivos para que assim seus companheiros do outro lado recusem uma nova ligao. Certos nomes significativos so dados a essas crianas abiks, para deixar claro que seus objetivos foram descobertos e antecipados. Por ex.: MALMO - No v embora novamente, BANJOK - Sente-se ou fique comigo, APAR - Aquele que vai e vem, etc.... Festas so feitas para esse tipo de crianas, nas quais feijo fradinho e azeite-de-dend so fartamente distribuidos, como prato principal. Os Abiks tem sido confundidos no Brasil com abiaxs, que so as crianas nascidas "feitas de bero" e com misso espiritual.... ABIAX

1a. HIPOTESE - O abiax oriundo de uma trasmigrao espiritual (morre em lugar, pas, etc e nasce na mesma hora ou horas depois em outro lugar e outro corpo), carecendo apenas de um ritual de confirmao ou coroaao do Ib Or(trs adoxos e tudo mais), conforme o cargo espiritual designado por If...... 2a. HIPOTESE - O abiax feito (raspado) na barriga da me, quando est recolhida para a "feitura e est grvida.