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Núcleo Básico – Módulo 08 AS COMPETÊNCIAS COMO REFERÊNCIA DO CURRÍCULO
AS COMPETÊNCIAS COMO REFERÊNCIA DO CURRÍCULO1
Guiomar Namo de Mello
O currículo por competências constitui hoje um paradigma dominante na
educação escolar no Brasil e em quase todos os demais países da América, da
Europa e até em alguns países asiáticos. Na África também vem sendo adotado
como organizador de várias propostas de reforma educacional e curricular. Nestes
referenciais as competências são entendidas como organizadores dos conteúdos
curriculares a ser trabalhados nas escolas públicas estaduais. Essa onipresença das
competências no discurso e nas propostas educacionais nem sempre se faz
acompanhar de explicações para tornar o conceito mais claro nas escolas, o que
motiva os presentes referenciais a estenderem-se no exame da questão.
O conceito de competência. Como a maior parte dos conceitos usados em
pedagogia, o de competências responde a uma necessidade e uma característica de
nossos tempos. Na verdade surge como resposta à crise da escola na segunda
metade do século XX provocada, entre outros fenômenos, pela então incipiente
revolução tecnológica e pela crescente heterogeneidade das clientelas escolares.
Essa crise levou a uma forte crítica dos currículos voltados para objetivos
operacionalizados e observáveis, que fragmentava o processo pedagógico.
As competências são introduzidas como um conjunto de operações mentais
que são resultados a ser alcançados nos aspectos mais gerais do desenvolvimento
do aluno. Em outras palavras, caracterizaram-se, no início, pela sua generalidade e
transversalidade, não relacionadas com nenhum conteúdo curricular específico, mas
entendidas como indispensáveis à aquisição de qualquer conhecimento.
O exame das muitas definições de competência permite destacar o que está
presente em todas elas. A competência, nas várias definições, se refere a:
um conjunto de elementos...
que o sujeito pode mobilizar...
para resolver uma situação...
com êxito.
Existem diferenças não substantivas quanto ao que se entende por cada
uma dessas palavras, o que não é incomum quando se trata de descrever aspectos
psicológicos cognitivos ou emotivos. Em uma definição os elementos são designados
como recursos, em outras, como conhecimentos em outras como saber. Mobilizar
para uns significa colocar em ação, para outros colocar esquemas em operação e
1 Extraído do texto Referenciais Curriculares para a Educação Básica do Século 21,
preparado para a Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul, disponível em:
http://www.seduc.rs.gov.br/pse/html/refer_curric.jsp?ACAO=acao1
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ainda selecionar e coordenar. Situação é caracterizada como uma atividade
complexa, como um problema e sua solução, como uma representação da situação
pelo sujeito. O êxito é entendido como exercício conveniente de um papel, função ou
atividade, ou como realizar uma ação eficaz, ou responder de modo pertinente às
demandas da situação ou ainda como ação responsável, realizada com
conhecimento de causa.
Analisando o conteúdo dos diversos termos utilizados para caracterizar o
conceito de competência, pode-se afirmar que não há polissemia, isto é, diferentes
significados de competência, e apesar das diferenças terminológicas todos têm em
comum uma abordagem que entende a competência como algo que acontece,
existe e é acionado desde processos internos ao sujeito. Este aspecto essencial, ou
seja, de que a competência não está na situação, nem em conhecimentos ou
saberes do currículo, e sim naquilo que a Situação de Aprendizagem e esses
saberes constituíram no aluno, é o que importa para fins pedagógicos, por duas
razões.
A primeira é a de que esses processos internos do aluno são constituídos, ou
seja, podem e devem ser aprendidos. A segunda é a de que um currículo por
competências se expressa, manifesta e valida pelas aprendizagens que propiciou no
aluno e que este coloca em ação de determinada maneira em determinada situação.
Objetivos de ensino podem ser expressos naquilo que o professor faz, nos materiais
que manipula, nos conteúdos que seleciona e nas operações que realiza para
explicar. Mas o que valida o currículo não são os objetivos de ensino e sim os
processos que se constituíram no aluno e se expressam pela competência de saber,
de saber fazer e de saber porque sabe.
Para coerência pedagógica do currículo é preciso que a referência a
competências como finalidade, fundamente-se numa concepção de aprendizagem
por competências. Esta última, por sua vez, implica numa didática situacional, porque
as competências são aprendidas em situação e em situação devem ser avaliadas.
Um currículo com referência nas competências implica também na
existência de operadores curriculares transversais, que se referem às competências
gerais que devem ser perseguidas em todas as áreas ou disciplinas, porque são
competências indispensáveis para aprender qualquer conteúdo curricular. Estes
Referenciais adotam como competências para aprender as cinco grandes
competências do ENEM, que podem ser consideradas seus operadores transversais:
Dominar a norma culta e fazer uso das linguagens matemática, artística e
científica;
Construir e aplicar conceitos das várias áreas do conhecimento para a
compreensão de fenômenos naturais, de processos histórico-geográficos, da
produção tecnológica e das manifestações artísticas;
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Selecionar, organizar, relacionar, interpretar dados e informações representadas
em diferentes formas, para tomar decisões e enfrentar situações-problema;
Relacionar informações, representadas de diferentes formas, e conhecimentos
disponíveis em situações concretas, para construir argumentação consistente;
Recorrer aos conhecimentos desenvolvidos na escola para elaborar propostas de
intervenção solidária na realidade, respeitando os valores humanos e
considerando a diversidade sociocultural.
Competências transversais para aprender, como as do ENEM, precisam ser
articuladas com as competências a serem constituídas em cada uma das áreas ou
disciplinas, que se expressam em expectativas de aprendizagem. Na ausência dessa
articulação instaura-se uma aparente ruptura entre competências e conteúdos
curriculares, que leva ao entendimento equivocado de que a abordagem por
competências não valoriza os conteúdos curriculares, quando na verdade eles são
nucleares e imprescindíveis para a constituição de competências.