As Artimanhas Da Razão Imperialista

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    Sobre as Artimanhas da RazoImperialista*

    Pierre Bourdieu e Loc Wacquant

    O

    imperialismo cultural repousa no poder de universalizar osparticularismos associados a uma tradio histrica singu-

    lar, tornando-os irreconhecveis como tais.1Assim, do mesmomodo que, no sculo XIX, um certo nmero de questes di tas fi lo-sficas debatidas como universais, em toda a Europa e para almdela, tinham sua origem, segundo foi muito bem demonstrado porFritz Ringer, nas particularidades (e nos conflitos) histricas pr-prias do universo singular dos professores universitrios alemes(Ringer, 1969), assim tambm, hoje em dia, numerosos tpicosoriundos diretamente de confrontos intelectua is associados par-ticularidade social da sociedade e das universidades americanasimpuseram-se, sob formas aparentemente desistoricizadas, ao pla-neta inteiro. Esseslugares-comunsno sentido aristotlico de no es

    ou de te sescom as quaisse argumenta, massobre as quaisno se ar-gumenta ou, por outras palavras, esses pressupostos da discussoque permanecem indiscutidos, devem uma parte de sua fora deconvico ao fato de que, circulando de colquios universitriospara livros de sucesso, de revistas semi-eruditas para relatrios deespecialistas, de balanos de comisses para capas de magazines,esto presentes por toda parte ao mesmo tempo, de Berlim a T-quio e de Milo ao Mxico, e so sustentados e intermediados deuma forma poderosa por esses espaos pretensamente neutroscomo so os organismos internacionais (tais como a OCDE ou aComisso Europia) e os centros de estudos e assessoria para po l-

    Estudos Afro-Asiticos, Ano 24, n1, 2002, pp. 15-33

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    * Agradecemos Editora Vozes por nos ter gentilmente permitido a reproduo deste arti go,originalmente publicado em P. Bourdieu & L. Wacquant, Prefcio: Sobre as Artimanhas daRazo Imperialista, in P. Bour di eu,Escri tos de Educao, Petrpolis, Vozes, 1998. Mu danasna forma foram necessrias para a adaptao do texto s normas editoriais da revistaEstudosAfro-Asiticos.

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    ticas pblicas (tal como o Adam Smith Institute e a Fondation Sa-

    int-Simon).

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    A neutralizao do conceito histrico que resulta dacirculao internacional dos textos e do esquecimento correlatodas condies histricas de origem produz uma universalizaoaparente que vem duplicar o trabalho de teorizao . Espcie deaxiomatizao fictcia bem feita para produzir a iluso de uma g-nese pura, o jogo das definies prvias e das dedues que visamsubsti tuir a contingncia das necessidades sociolgicas negadaspela aparncia da necessidade lgica tende a ocultar as razes his t-ricas de um conjunto de questes e de noes que, segundo o cam-po de acolhimento, sero consideradas filosficas, sociolgicas,histricas ou pol ticas. Assim, planetarizados, mundializados, nosentido estritamente geogrfico, pelo desenraizamento, ao mes mo

    tempo em que desparticularizados pelo efeito de falso cor te queproduz a conceitualizao, esses lugares-comuns da grande vul ga-ta planetria transformados, aos pou cos, pela insistncia miditicaem senso comum universal chegam a fazer esquecer que tm suaorigem nas realidades complexas e controvertidas de uma so cie da-de histrica particular, consti tuda tacitamente como modelo emedida de todas as coisas.

    Eis o que se passou, por exemplo, com o debate impreciso einconsistente em torno do multiculturalismo, termo que, na Eu-ropa, foi uti lizado, sobretudo, para designar o pluralismo culturalna esfera cvi ca, en quanto, nos Estados Unidos, ele remete s se-qelas perenes da excluso dos negros e crise da mitologia na ci o-

    nal do sonho americano, correlacionada ao crescimento ge ne ra-lizado das desigualdades no decorrer das ltimas duas dcadas(M assey & Denton, 1996 [1993]; Waters, 1990; Hollinger, 1995;Hochschild, 1996).3Crise que o vocbulo multicultural en co-bre, confinando-a arti ficial e exclusivamente ao microcosmo uni-versitrio e expressando-a em um registro ostensivamente t nicoquando, afinal, ela tem como principal questo, no o re co nheci-mento das culturas marginalizadas pelos cnones acadmicos, maso acesso aos instrumentos de (re)produo das classes mdia e su-perior na primeira fila das quais figura a universidade em umcontexto de descompromisso macio e multi forme do Estado.4

    Atravs desse exemplo, v-se de passagem que, entre os pro-

    dutos culturais difundidos na escala planetria, os mais insidiososno so as teorias de aparncia sistemtica (como o fim da his t-ria ou a globalizao) e as vises do mundo fi losficas (ou quepretendem ser tais, como o ps-modernismo), no final das con-tas, fceis de serem identi ficadas; mas sobretudo determinados

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    termos isolados com aparncia tcnica, tais como a flexibilidade

    (ou sua verso britnica, a empregabilidade) que, pelo fato decondensarem ou veicularem uma verdadeira fi losofia do in divduoe da organizao social, adaptam-se perfeitamente para funcionarcomo verdadeiras palavras de ordem pol ticas (no caso concreto:menos Estado, reduo da cobertura social e aceitao da ge ne-ralizao da precariedade salarial como uma fa talidade, inclusive,um benefcio).

    Poder-se-ia analisar tambm em todos os seus detalhes a no-o fortemente polissmica de mundializao que tem comoefeito, para no dizer funo, submergir no ecumenismo culturalou no fatalismo economista os efeitos do imperialismo e fazer apa-recer uma relao de fora transnacional como uma necessidade

    natural. No termo de uma reviravolta simblica baseada na na tu-ralizao dos esquemas do pensamento neoliberal, cuja domina-o de imps nos ltimos vinte anos, graas ao trabalho de sapa dosthink tanksconservadores e de seus aliados nos campos pol tico e

    jornalstico (Grmion, 1989, 1995; Smith, 1991; Dixon, 1997), aremodelagem das relaes sociais e das prticas culturais das so cie-dades avanadas em conformidade com o padro norte- ame-ricano, apoiado na pauperizao do Estado, da mercanti lizaodos bens pblicos e generalizao da insegurana social, aceitaatualmente com resignao como o desfecho obrigatrio das evo-lues nacionais quando no celebrada com um entusiasmo sub-serviente que faz lembrar estranhamente a febre pela Amrica

    que, h meio sculo, o Plano Marshall tinha suscitado em uma Eu-ropa devastada.5

    Um grande nmero de temas conexos publicados recen te-mente sobre a cena inte lectual europia e, singularmente, pari si-ense, atravessaram assim o Atlntico, seja s claras, seja por con tra-bando, favorecendo a volta da influncia de que gozam os pro du-tos da pesquisa americana, tais como o poli ticamente correto,utilizado de forma paradoxal, nos meios intelectuais franceses,como instrumento de reprovao e represso contra qualquer ve-leidade de subverso, principalmente feminista ou homossexual,ou o pnico moral em torno da guetoizao dos bairros ditosimigrantes, ou ainda o moralismo que se insinua por toda parte

    atravs de uma viso tica da pol tica, da famlia etc., conduzindo auma espcie de despoli tizao principielle dos problemas sociaise pol ticos, assim desembaraados de qualquer referncia a toda es-pcie de dominao ou, enfim, a oposio que se tornou cannica,nos setores do campo intelectual mais prximos do jornalismo cul-

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    tural, entre o modernismo e o ps-modernismo que, baseada

    em uma releitura ecltica, sincrtica e, na maioria das vezes, de sis-toricizada e bastante imprecisa de um pequeno nmero de autoresfranceses e alemes, est em vias de se impor, em sua forma ame ri-cana, aos prprios europeus.6

    Seria necessrio atribuir um lugar parte e conferir um de-senvolvimento mais importante ao debate que, atualmente, opeos liberais aos defensores da comunidade 7(outros tantos ter-mos direta mente transcritos, e no traduzidos, do ingls), ilus tra-o exemplar do efeito de falso cortee de falsa uni versali zaoqueproduz a passagem para a ordem do discurso com pretenses fi lo-sficas: definies fundadoras que marcam uma ruptura aparentecom os particula rismos histricos que permanecem no segundo

    plano do pensamento do pensador situado e datado do ponto devista histrico (por exemplo, como ser possvel no ver que, comoj foi sugerido muitas vezes, o carter dogmtico da argumentaode Rawls em favor da prioridade das liberdades de base se explicapelo fato de que ele atribui tacitamente aos parceiros na posiooriginal um ideal latente que no outro seno o seu, o de um pro-fessor universitrio americano, apegado a uma viso ideal da de-mocracia americana?) (cf. H art , 1975); pressupostos antropolgi-cos antropologicamente injusti ficveis, mas dotados de toda a au-tori da desocialda teoria econmica neomarginalista qual so to-mados de emprstimo; pretenso deduo rigorosa que permiteencadear formalmente conseqncias infalsificveis sem se expor,

    em nenhum momento, menor refutao emprica; alternativasrituais, e irrisrias, entre atomistas-individualistas e ho lis tas-co-letivistas, e to visivelmente absur das na medida em que obrigam ainventar holistas-individualistas para enquadrar Humboldt, ouatomistas-coletivistas; e tudo isso expresso em um extraordin-riojargo, em uma terr vel lngua francainternacional, que per mi-te incluir, sem lev-las em considerao de forma consciente, to dasas particularidades e os particularismos associados s tradies fi -losfi case polti casnacionais (sendo que algum pode escre ver l i -bertyentre parnteses aps a palavra liberdade, mas aceitar semproblema determinados barbarismos conceituais como a oposioentre o procedural e o substancial). Esse debate e as teorias

    que ele ope, e entre as quais seria inti l tentar introduzir uma op-o pol tica, devem, sem dvida, uma parte de seu sucesso entre osfi lsofos, principalmente conservadores (e, em especial, ca tli -cos), ao fato de que tendem a reduzir a pol tica moral: o imensodiscurso sabiamente neutralizado e poli ticamente desrealizado

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    que ele suscita veio tomar o lugar da grande tradio alem da

    Antropologia f i losfi ca,palavra nobre e falsamente profunda dede-negao (Verne i nung) que, durante muito tempo, serve de an te pa-ro e obstculo por toda parte em que a filosofia (alem) podiaafirmar sua dominao a qualquer anlise cient fica do mundosocial.8

    Em um campo mais prximo das realidades pol ticas, umdebate como o da raa e da identidade d lugar a semelhantes in-truses etnocntricas. Uma representao histrica, surgida dofato de que a tradio ame ricana calca, de maneira arbitrria, a di-cotomia entre brancos e negros em uma realidade infinitamentemais complexa, pode at mesmo se impor em pases em que osprincpios de viso e diviso, codificados ou prticos, das di fe ren-

    as tnicas so completamente diferentes e em que, como o Brasil,ainda eram considerados, recentemente, como contra-exemplosdo modelo americano.9A maior parte das pesquisas recentes so-bre a desigualdade etno-racial no Brasil, empreendidas por ameri-canos e latino-americanos formados nos Estados Unidos, es for-am-se em provar que, contrariamente imagem que os brasileirostm de suanao, o pas das trs tristes raas (indgenas, negrosdescendentes dos escravos, brancos oriundos da colonizao e dasvagas de imigrao europias) no menos racista do que os ou-tros; alm disso, sobre esse captulo, os brasileiros brancos nadatm a invejar em relao aos primos norte-americanos. Ainda pior,oracismo mascarado

    brasileira seria, por definio, mais perver so,j que dissimulado e negado. o quepretende, em Orpheus andPower(1994),10o cientista pol tico afro-americano Michael Han-chard: ao aplicar as categorias raciais norte-americanas situaobrasileira, o autor erige a histria particular do Movimento em fa-vor dos Direitos Civis como padro universal da luta dos grupos decor oprimidos. Em vez de considerar a consti tuio da ordem et-no-racial brasileira em sua lgica prpria, essas pesquisas con ten-tam-se, na maioria das vezes, em substi tuir, na sua totalidade, omito nacional da democracia racial (tal como mencionada, porexemplo, na obra de Gilberto Freyre, 1978), pelo mito segundo oqual todas as sociedades so racistas, inclusive aquelas no seio

    das quais parece que, primeira vista, as relaes sociais so me-nos distantes e hostis. De utenslio anal tico, o conceito de ra cis-mo torna-se um simples instrumento de acusao; sob pretexto decincia, acaba por se consolidar a lgica do.processo (garantindo osucesso de livraria, na falta de um sucesso de estima).11

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    Em um artigo clssico, publicado h trinta anos, o antro p-

    logo Charles Wagley mostrava que a concepo da raa nas Am-ricas admite vrias definies, segundo o peso atribudo as cen-dncia, aparncia fsica (que no se limita cor da pele) e aostatussociocultural (profisso, montante da renda, diplomas, regio deorigem, etc.), em funo da histria das relaes e dos conflitos en-tre grupos nas diversas zonas (Wagley, 1965). Os nor te-ame-ricanos so os nicos a definir raa a partir somente da ascendn-cia e, exclusivamente, em relao aos afro-americanos: em Chi ca-go, Los Angeles ou At lanta a pessoa negra no pela cor da pele,mas pelo fato de ter um ou vrios parentes identi ficados como ne-gros, isto , no termo da regresso, como escravos. Os Estados Uni-dos consti tuem a nica sociedade moderna a aplicar a one-drop

    rulee o princpio de hipodescendncia, segundo o qual os fi lhosde uma unio mista so, automaticamente, situados no grupo in-ferior (aqui, os negros). No Brasil, a identidade racial define-sepela referncia a um conti nuumde cor, isto , pela aplicao deum princpio flexvel ou impreciso que, levando em consideraotraos fsicos como a textura dos cabelos, a forma dos lbios e donariz e a posio de classe (principalmente, a renda e a educao),engendram um grande nmero de categorias intermedirias (maisde uma centena foram repertoriadas no censo de 1980) e no im-plicam ostracizao radical nemesti g ma ti zaosem remdio. Dotestemunho dessa situao, por exemplo, os ndices de segregaoexibidos pelas cidades brasileiras, nitidamente inferiores aos das

    metrpoles norte-americanas, bem como a ausncia virtual dessasduas formas tipicamente norte-americanas de violncia racialcomo so o linchamento e a motim urbano (Telles, 1995; Reid,1992). Pelo contrrio, nos Estados Unidos no existe categoriaque, social e legalmente, seja reco nhecida como mestio (Davis,1991; Williamson, 1980). A, temos a ver com uma diviso que seassemelha mais das castas defi ni ti vamente defi nidas e delimi tadas(como prova, a taxa excepcionalmente baixa de intercasamentos:menos de 2% das afro-americanas contraem unies mistas, emcontraposio metade, aproximadamente, das mulheres de ori-gem hispanizante e asitica que o fazem) que se tenta dissimular,submergindo-a pela globalizao no universo das vises di fe ren-

    ciantes.Como explicar que sejam assim elevadas, tacitamente, po-sio de padro universal em relao ao qual deve ser analisada eavaliada toda situao de dominao tnica,12determinadas te ori-as das relaes raciais que so transfi guraes conce i tuali zadase,

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    incessantemente, renovadas pelas necessidades da atualizao, de

    esteretipos raciais de uso comum que, em si mesmos, no passamde justi ficaes primrias da dominao dos brancos sobre os ne-gros?13O fato de que, no decorrer dos ltimos anos, a sociodiciaracial (ou racista) tenha conseguido se mundializar, perden doao mesmo tempo suas caractersticas de discurso justi ficador parauso interno ou local, , sem dvida, urna das confirmaes maisexemplares do imprio e da influncia simblicos que os EstadosUnidos exercem sobre toda espcie de produo erudita e, so bre-tudo, semi-erudita, em particular, atravs do poder de con sa gra-o que esse pas detm e dos benefcios materiais e simblicos quea adeso mais ou menos assumida ou vergonhosa ao modelo nor-te-americano proporciona aos pesquisadores dos pases domina-

    dos. Com efeito, possvel dizer, com Thomas Bender, que os pro-dutos da pesquisa americana adquiriram uma estatura interna-cional e um poder de atrao comparveis aos do cinema, da m-sica popular, dos programas de informtica e do basquetebol ame-ricanos (Bender, 1997).14A violncia simblica nunca se exerce,de fato, sem uma forma de cumplicidade (extorquida) daquelesque a sofrem e a globalizao dos temas da doxa social ame rica naou de sua transcrio, mais ou menos sublimada, no discurso se-mi-erudito no seria possvel sem a colaborao, consciente ou in-consciente, direta ou indiretamente interessada, no s de todos ospassadores e importadores de produtos culturais com grife oudgri ffs(editores, diretores de insti tuies cul turais, museus, pe-

    ras, galerias de arte, revistas etc.) que, no prprio pas ou nos pa -ses-alvo, propem e propagam, mul tas vezes com toda a boa-f, osprodutos culturais americanos, mas tambm de todas as instnciasculturais americanas que, sem estarem explicitamente coordena-das, acompanham, orquestram e, at por vezes, organizam o pro-cesso de converso coletiva nova Meca simblica.15

    Mas todos esses mecanismos que tm como efeito favoreceruma verdadeira globalizao das problemticas americanas,dando, assim, razo, em um aspecto, crena americanocntricana globali zao entendida, simplesmente, comoamericani zaodo mundo ocidental e, aos poucos, de todo o universo, no so su-ficientes para explicar a tendncia do ponto de vista americano,

    erudito ou semi-erudi to, sobre o mundo, para se impor como pon-to de vista universal, sobretudo quando se trata de questes taiscomo a da raa em que a particularidade da situao americana particularmente flagrante e est particularmente longe de serexemplar. Poder-se-ia ainda invocar, evidentemente, o papel mo-

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    tor que desempenham as grandes fundaes americanas de fi lan-

    tropia e pesquisa na di fuso da doxa racial norte-americana no seiodo campo universitrio brasileiro, tanto no plano das re presenta-es, quanto das prticas. Assim, a Fundao Rockefeller financiaum programa sobre Raa e Etnicidade na Universidade Federaldo Rio de Janeiro, bem como o Centro de Estudos Afro-Asiticos(e sua revis ta Estudos Afro-Asiticos) daUniversidade CandidoMendes, de maneira a favorecer o intercmbio de pesquisadores eestudantes. Para a obteno de seu patrocnio, a Fundao impecomo condio que as equipes de pesquisa obedeam aos cri triosdeaffirmati ve ac ti on maneira americana, o que levanta pro ble-mas espinhosos j que, como se viu, a dicotomia branco/negro deaplicao, no mnimo, arriscada na sociedade brasileira.

    Alm do papel das fundaes filantrpicas, deve-se, enfim,colocar entre os fatores que contribuem para a difuso do pen sa-mento US nas cincias sociais a internacionalizao da atividadeeditorial universitria. A integrao crescente da edio dos livrosacadmicos em lngua inglesa (doravante vendidos, fre qen te-mente, pelas mesmas editoras nos Estados Unidos, nos diferentespases da antiga Commonwealth britnica, bem como nos pe que-nos pases poliglotas da Unio Europia, tais como a Sucia e a Ho-landa, e nas sociedades submetidas mais diretamente dominaocultural americana) e o desaparecimento da fronteira entre ativi-dade editorial universitria e editoras comerciais contriburampara encorajar a circulao de termos, temas e tropos com forte di-

    vulgao prevista ou constatada que, por r icochete, devem seu po-der de atrao ao simples fato de sua ampla difuso. Por exemplo, agrande editora semicomercial, semi-universitria (designada pe losanglo-saxes como crossover press),Basil Blackwell, no hesita emimpor a seus autores determinados ttulos em consonncia comesse novo senso comum planetrio para a instalao do qual elatem dado sua contribuio sob pretexto de repercuti-lo. Assim, coletnea de textos sobre as novas formas de pobreza urbana, naEuropa e na Amrica, reunidos em 1996 pelo socilogo italianoEnzo Mingione, foi dado o t tu lo Urban Poverty and the Under-class, contra o parecer de seu responsvel e dos di ferentes co la bo ra-dores, uma vez que toda a obra tende a demonstrar a vacu idade da

    noo deunderclass(Backwell chegou mesmo a se recusar a co locaro termo entre aspas).16Em caso de reticncia demasiado grandepor parte dos autores, Basil Blackwell est em condies de pre ten-der que um ttulo atraente o nico meio de evitar um preo devenda elevado que, de qualquer modo, liquidaria o livro em ques-

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    to. assim que certas decises de pura comercializao editorial

    orientam a pesquisa e o ensino universitrios no sentido da ho mo-geneizao e da submisso s modas oriundas da Amrica, quandono acabam por criar, claramente, determinadas disciplinas, taiscomo os cultural stu di es, campo hbrido, nascido nos anos 70 naInglaterra que deve sua difuso internacional a uma pol ti ca depropaganda editorial bem-sucedida. Deste modo, o fato de queessa disciplina esteja ausente dos campos universitrio e in te lec-tual franceses no impediu Routledge de publicar um compen di-um inti tu ladoFrench Cul tural Stu di es, segundo o modelo dosBri-ti sh Cultural Studies(existe tambm um tomo deGermanCulturalStudies).E pode-se predizer que, em virtude do princpio de par te-nognese tnico-editorial em voga atualmente, ver-se- em breve

    aparecer uma manual deFrenchArab Cultural Stu diesque venha aconsti tuir o par simtrico de seu primo do alm-Mancha, BlackBriti sh Cultural Stu di es, publicado em 1997.

    Mas todos esses fatores reunidos no podem justi ficar com-pletamente a hegemonia que a produo exerce sobre o mercadomundial. a razo pela qual necessrio levar em considerao opapel de alguns dos responsveis pelas estratgias de import-exportconceitual misti ficadores misti ficados que podem veicular, semseu conhecimento, a parte oculta e, muitas vezes, maldita dos produtos culturais que fazem circular. Com efeito, o que pen-sar desses pesquisadores americanos que vo ao Brasil encorajar oslideres do

    Movimento Ne groa adotar as tticas do movimento

    afro-americano de defesa dos di reitos civis e denunciar a categoriapardo (termo intermedirio entre branco e preto que designa aspessoas de aparncia f sica mista) a fim de mobilizar todos os bra si-leiros de ascendncia africana a partir de uma oposio di cotmicaentre afro-brasileiros e brancos no preciso momento em que,nos Estados Unidos, os indivduos de origem mista se mobilizam afim de que o Estado americano (a comear pelos Institutos de Re-censeamento) reconhea, oficialmente, os americanos mestios,deixando de os classificar fora sob a etiqueta exclusiva de ne-gro? (Spencer, 1997; DaCosta, 1998). Semelhantes constataesnos autorizam a pensar que a descoberta to recente quanto re pen-

    tina da globalizao da raa (Winant, 1994 e 1995) resulta, node uma brusca convergncia dos modos de dominao etno-racialnos diferentes pases, mas antes da quase universali zao do follkconceptnorte-americano de raa sob o efeito da exportao mun-dial das categorias eruditas americanas.

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    Pode-se-ia fazer a mesma demons trao a propsito da di fu-

    so internacional do verdadeiro-falso conceito de underclassque,por um efeito de allodoxia transcontinental, foi importado pelossocilogos do velho continente desejosos de conseguirem uma se-gunda juventude intelectual surfando na onda da popularidadedos conce i tosmade in USA.17Para avanar rpido, os pes qui sado-res europeus ouvem falar de classe e acreditam fazer referncia auma nova posio na estrutura do espao social urbano quandoseus colegas americanos ouvem falar de under pensam em umacambada de pobres perigosos e imorais, tudo isso sob uma pticadeliberadamente vitoriana e racistide. No entanto, Paul Pe ter-son, professor de cincia pol tica em H arvard e diretor do Comitde pesquisas so breunderclassurbana do Social Science Research

    Council (tambm financiado pelas Fundaes Rockefeller eFord), no deixa subsisti r qualquer equvoco quando, com o seuaval, resume os ensinamentos extrados de um grande colquio so-bre a underclassrealizado, em 1990, em Chicago, nestes termosque no tem necessidade de qualquer comentrio: O sufixo class o componente menos interessante da palavra. Embora impliqueuma relao entre dois grupos sociais, os termos dessas relao per-manecem indeterminados enquanto no for acrescentada a pa la-vra mais familiar under. Esta sugere algo de baixo, vil, passivo, re-signado e, ao mesmo tempo, algo de vergonhoso, perigoso, dis rup-tivo, sombrio, malfico, inclusive, demonaco. E, alm desses tri-butos pessoais, ela implica a idia de submisso, subordinao e

    misria (Jenks e Peterson, 1991:3).Em cada campo intelectu al racional, existem passadores(por vezes, um s; outras vezes, vrios) que retomam esse mito eru-dito e reformulam nesses termos alienados a questo das relaesentre pobreza, imigrao e segregao em seus pases. Assim, j no possvel contar o nmero de artigos e obras que tm como ob je ti-vo provar ou negar, o que acaba sendo a mesma coisa comuma bela aplicao po sitivista, a existncia desse grupo em talsociedade, cidade ou bairro, a parti r de indicadores empricos namaioria das vezes mal construdos e mal correlacionados entre si(cf., entre muitos, Rodant, 1992; Dangschat, 1994; Whelm,1996). Ora, colocar a questo de saber se existe uma underclass

    (termo que alguns socilogos franceses no hesitaram em traduzirpor subclasse, na expectativa, sem dvida, de introduzir o concei-to de sub-homens) em Londres, Lyon, Leiden ou Lisboa pres su-por, no mnimo, por um lado, que o termo dotado de uma certaconsistncia anal tica e, por outro, que tal grupo existe real men-

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    te nos Estados Unidos.18Ora a noo semijornalstica e se mi erudi-

    ta de un der class desprovida no s de coerncia semntica, mastambm de existncia social. As populaes heterclitas que ospesquisadores americanos colocam, habitualmente, sob esse ter-mo beneficirios da assistncia social, desempregados crnicos,mes solteiras, famlias monoparentais, rejeitados do sistema es co-lar, criminosos e membros de gangues, drogados e sem teto, quan-do no so todos os habitantes do gueto sem distino devem suaincluso nessa categoria fourre-tout ao fato de que so per ce bi dascomo outros tantos desmentidos vivos do sonho americano desucesso individual. O conceito aparentado de excluso co-mumente empregado, na Frana e em certo nmero de outros pa -ses europeus (principalmente, sob a influncia da Comisso Eu ro-

    pia), na fronteira dos campos pol tico, jornalstico e cient fico,com funes similares de desistoricizao e despoli tizao. Isso duma idia da inanidade da operao que consiste em retradu-zir uma noo inexistente por uma outra mais do que incerta (Her-pin, 1993).

    Com efeito, aunderclassno passa de um grupo fictcio, pro-duzido no papel pelas prticas de classificao dos eruditos, jor na-listas e outros especialistas em gesto dos pobres (negros urbanos)que comungam da crena em sua existncia porque tal grupo consti tudo para voltar a dar a algumas pessoas uma legitimidadecient fica e, a outras, um tema poli ticamente compensador (Wac-quant, 1996b). Inapto e inepto no caso americano, o conceito de

    importao no traz nada ao conhecimento das soci edades eu ro-pias. Com efeito, os instrumentos e as modalidades do governoda misria esto longe de ser idnticos, dos dois lados do Atln ti co,sem falar das divises tnicas e de seu estatuto pol tico.19Segue-seque, nos Estados Unidos, a definio e o tratamento reservados spopulaes com problemas diferem dos que so adotados pelosdiversos pases do Velho Mundo. E, sem dvida, o mais extraordi-nrio que, segundo um paradoxo j encontrado a propsito deoutros falsos conceitos da vulgata mundializada, essa noo deun-derclassque nos chega na Amrica surgiu na Europa, bem como ade gueto que ela tem por funo ocultar em razo da severa cen su rapol tica que, nos Estado Unidos, pesa sobre a pesquisa a respeito

    da desigualdade urbana e racial. Com efeito, tal noo tinha sidoforjada, nos anos 60, a partir da palavra sue caonderklass, pelo eco-nomista Gunnar Myrdal. M as sua inteno era, nesse caso, des cre-ver o processo de marginalizao dos segmentos inferiores da clas-se operria dos pases ricos para criticar a ideologia do aburgue sa-

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    mento generalizado das sociedades capitalistas (Myrdal, 1963).

    V-se como o desvio pela Amrica pode trans formar uma idia: deum conceito estrutural que visava colocar em questo a re presenta-o dominante surgiu uma categoria behaviorista recortada sobmedida para refor-la, imputando aos comportamentos an-ti-socais dos mais desmunidos a responsabilidade por sua des pos-sesso.

    Esses mal-entendidos devem-se, em parte, ao fato de que ospassadores transatlnticos dos diversos campos intelectuais im-portadores, que produzem, reproduzem e fazem circular todos es-ses (falsos) problemas, reti rando de passagem sua pequena parte debenefcio material ou simblico, esto expostos, pelo fato de suaposio e de seus habitus eruditos e pol ticos, a uma dupla hetero-

    nomia. Por um lado, olham em direo da Amrica, suposto n-cleo da (ps)modernidade social e cient fica, mas eles prpriosso dependentes dos pesquisadores americanos que exportam parao exterior determinados produtos intelectuais (muitas vezes, nemto frescos) j que, em geral, no tm conhecimento direto e es pe-cfico das insti tuies e da cultura americanas. Por outro lado, in-clinam-se para o jornalismo, para as sedues que ele prope e ossucessos imediatos que proporciona, e, ao mesmo tempo, para ostemas que afloram na interseo dos campos miditico e pol tico,portanto, no ponto de rendimento mximo sobre o mercado ex te-rior (como seria mostrado por um recenseamento das resenhascomplacentes que seus trabalhos recebem nas revistas em voga).

    Da, sua predileo por proble mticassoft, nem verdadeiramentejornalsticas (esto guarnecidas com conceitos), nem comple ta-mente eruditas (orgulham-se por estarem em simbiose com oponto de vista dos atores) que no passam da retraduo se-mi-erudi ta dos problemas sociais do momento em um idioma im-portado dos Estados Unidos (etnicidade, identidade, minorias,comunidade, fragmentao, etc.) e que se sucedem segundo umaordem e ri tmo ditados pela mdia: juventude dos subrbios, xe no-fobia da classe operria em declnio, desajustamento dos es tudan-tes secundaristas e universitrios, violncias urbanas, etc. Esses so-cilogos-jornalistas, sempre prontos a comentar os fatos de socie-dade, em uma linguagem, ao mesmo tempo, acessvel e mo der-

    nista, portanto, muitas vezes, percebida como vagamente pro-gressista em refe rncia aos arcasmos do velho pensamento eu ro-peu), contribuem, de maneira particularmente paradoxal, para aimposio de uma viso do mundo que est longe de ser in compa-tvel, apesar das aparncias, com as que produzem e veiculam os

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    gran des think tanksi nternacionais, mais ou menos diretamente

    plugados s esferas do poder econmico e pol tico.Quanto aos que, nos Estados Unidos, esto comprometidos,muitas vezes sem seu conhecimento, nessa imensa operao in ter-nacional de import-exportcultural, eles ocupam, em sua maioria,uma posio dominada no campo do poder americano, e at mes-mo, muitas vezes, no campo intelectual. Do mesmo modo que osprodutores da grande indstria cultural americana como o jazz ou orap, ou as modas de vesturio e alimentares mais comuns, como ojeans, devem uma parte da seduo quase universal que exercem so-bre a juventude ao fato de que so produzidas e utilizadas por mi no-rias dominadas (Fantasia, 1994), assim tambm os tpicos da novavulgata mundial tiram, sem dvida, uma boa parte de sua eficcia

    simblica do fato de que, ut ilizados por especialistas de disciplinaspercebidas como marginais e subversivas, tais como os cultural stu-dies, osminori ty studies, osgay studiesou oswomen studies, eles assu-mem, por exemplo, aos olhos dos escritores das antigas colnias eu-ropias, a aparncia de mensagens de libertao. Com efeito, o im-perialismo cultural (americano ou outro) h de se impor sempremelhor quando servido por intelectuais progressistas (ou de cor ,no caso da desigualdade racial), pouco suspeitos, aparentemente, depromover os interesses hegemnicos de um pas contra o qual es gri-mem com a arma da crtica social. Assim, os diversos artigos quecompem o nmero de vero de 1996 da re vis taDissent, rgo davelha esquerda democrtica de Nova York, consagrado s Mi no-rias em luta no planeta: direitos, esperanas, ameaas, projetam so-bre a humanidade inteira, com a boa conscincia humanista carac-terstica de certa esquerda acadmica, no s o senso comum liberalnorte-americano, mas a noo deminority(seria necessrio con ser-var sempre a palavra inglesa para lembrar que se trata de um conce i-to nativo importado na teoria e ainda a, originrio da Europa)que pressupe aquilo mesmo cuja existncia real ou poss vel deveriaser demonstrada,20a saber: categorias recortadas no seio de deter mi-nado Estado-nao a partir de traos culturais ou tnicos tm,enquanto tais, o desejo e o direito de exigir um reconhecimento c vi-co e poltico. Ora, as formas sob as quais os indivduos procuram fa-

    zer reconhecer sua existncia e seu pertencimento pelo Estado va ri -am segundo os lugares e os momentos em funo das tradies his-tricas e constituem sempre um motivo de lutas na histria. assimque uma anlise comparativa aparentemente rigorosa e generosapode contribuir, sem que seus autores tenham conscincia disso,

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    para fazer aparecer como universal uma problemtica feita por e

    para americanos.Chega-se, assim, a um duplo paradoxo. Na luta pelo mo no-plio da produo da viso do mundo social universalmente re co-nhecida como universal, na qual os Estados Unidos ocupam atu al-mente uma posio eminente, inclusive dominante, esse pas re-almente excepcional, mas seu excepcionalismo no se situa exa ta-mente onde a sociologia e a cincia social nacionais esto de acor-do em situ-lo, isto , na fluidez de uma ordem social que ofereceoportunidades extraordinrias (principalmente, em comparaocom as estruturas sociais rgidas do velho continente) mobi lida-de: os estudos comparativos mais rigorosos esto de acordo emconcluir que, neste aspecto, os Estados Unidos no diferem fun da-

    mentalmente das outras naes industrializadas quando, afinal, oleque das desigualdades a ni tidamente mais aberto.21Se os Esta-dos Unidos so realmente excepcionais, segundo a velha temticatocquevilliana, incansavelmente retomada e periodicamente re a-tualizada, antes de tudo pelo dualismo rgido das divises da or-dem social. ainda mais por sua capacidade para impor como uni-versal o que tm de mais particular, ao mesmo tempo em que fa-zem passar por excepcional o que tm de mais comum.

    Se verdade que a desistoricizao que resulta quase inevita-velmente da migrao das idias atravs das fronteiras nacionais um dos fatores de desrealizao e de falsa universalizao (porexemplo, com os falsos amigos tericos), ento somente uma

    verdadeira histria da gnese das idias sobre o mundo social, as so-ciada a uma anlise dos mecanismos sociais da circulao in terna-cional dessas idias, poderia conduzir os eruditos, tanto nessecampo quanto alhures, a um controle mais aperfeioado dos ins-trumentos com os quais argumentam sem ficarem inquietos, deantemo, em argumentar a propsito dos mesmos.22

    NOTAS

    1. Para evitar qualquer mal-entendido e afastar a acusao de antiamericanismo prefervel afirmar, de sada, que nada mais universal do que a pretenso ao universalou, mais precisamente, universalizao de uma viso parti cular do mundo; alm

    disso, a demonstrao esboada aqui ser vli da,mutati s mutandis, para outros cam-pos e pases (pri ncipalmente, a Frana: cf. Bourdieu, 1992).

    2. Entre os livros que do testemunho dessa macdonaldizao rampante do pen sa men-to, pode-se citar a jeremiada elitista de A. Bloom (1987), traduzida imediatamentepara o francs, pela editora Julliard, com o t tulo Lme Dsarme(1987) e o panfleto

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    enraivecido do imigrante indiano neoconservador (e bigrafo de Reagan), membrodo Manhattan Insti tute, D. D iSouza (1991), traduzido para o francs com o ttuloLducati on contr e les Li berts(1993). Um dos melhores indcios para identi ficar asobras que participam desta nova doxa intelectual com pretenso planetria ace leri -dade, absolutamente inabitual, com a qual so traduzidas e publicadas no exterior(sobretudo, em comparao com as obras cient ficas). Para uma viso nativa de con-junto dos sucessos e fracassos dos professores universitrios americanos, atualmente,ver o recente nmero de Daedalusconsagrado a The American Academic Pro-fession (1997), principalmente B. Clark, Small Worlds, Different Worlds: TheUniqueness and Troubles of American Academic Professions (pp. 21-42), e P.Altbach, An International Academic Crisis?The American Professoriate in Com-parative Perpspecti ve (pp. 315-338).

    3. Para uma anlise de conjunto dessas questes que, com justeza, coloca em evidnciasua ancoragem e recorrncias histricas, ver Lacorne (1997).

    4. Sobre o imperativo de reconhecimento cultural, ver Taylor (1994) e os textos coleta-dos e apresentados por T. Goldberg (1994); sobre os entraves s estratgias de per pe-tuao da classe mdia nos Estados Unidos, cf. Wacquant (1996a); o profundomal-estar da classe mdia americana bem descrito em Newman (1993).

    5. Sobre a mundializao como projeto americano, cf. Fligstein (1997); sobre o fas-cnio ambivalente pela Amrica no perodo aps a guerra, ver Bol tanski (1981) e Ku-isel (1993).

    6. No se trata do nico caso em que, por um paradoxo que manifesta um dos efeitosmais tpicos da dominao simblica, um certo nmero de tpicos que os EstadosUnidos exportam e impem em todo o universo, a comear pela Europa, foram to-mados de emprstimo a esses mesmos que os recebem como as formas mais avan a-das da teoria.

    7. Para uma bibliografia do imenso debate, verPhilosophy & Social Cri ti cism, vol. 14, n

    3-4, 1988, nmero especial Universali sm vs. Communitarianism: ContemporaryDebates in Ethics.

    8. Desse ponto de vista, avil tadamenle sociolgico, o dilogo entre Rawls e Habermas a respeito dos quais no exagerado afi rmar que, em relao tradio fi losfica,so bastante equivalentes altamente significati vo (cf., por exemplo, Ha ber-mas,1995).

    9. Segundo o estudo clssico de Carl De gler, Nei ther BlackNor White(1995), publi ca-do pela primeira vez em 1974.

    10. Um poderoso antdoto ao veneno etnocntrico sobre esse tema encontra-se na obrade Anthony Marx (1998), que demonstra que as divises raciais so estreitamentetributrias da histria pol ti ca e ideolgica do pas considerado, sendo que cada Esta-do fabrica, de alguma forma, a concepo de raa que lhe convm.

    11. Quando ser publicado um livro inti tulado O Brasil Racista segundo o modelo da

    obra com o t tulo cienti ficamente inquali ficvel, La France Raciste, de um soci lo-go francs mais atento s expectati vas do campo jornalsti co do que s com ple xi da-des da realidade?

    12. Esse estatuto de padro universal, de meridiano de Greenwich em relao ao qualso avaliados os avanos e os atrasos, os arcasmos e os modernismos (a van guar-

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    da), uma das Propriedades Universais daqueles que dominam simbolicamente umuniverso (cf. Casanova, 1997).

    13. James McKee demonstra, a uma s vez, em sua obra-mestra (1993), por um lado, queessas teorias com pretenses cient ficas retomam a esteretipo da inferi oridade cul-tural dos negros e, por outro, que elas se revelaram singularmente inaptas para pre di-zer e depois explicar a mobilizao negra do aps-guerra e os moti ns raciais dos anos60.

    14. Sobre a importao da temtica do gueto no recente debate em torno da cidade e deseus males, Wacquant (1992).

    15. Uma descrio exemplar do processo de transferncia do poder de consagrao deParis para Nova York, em matria de arte de vanguarda, encontra-se no li vro clssicode Serge Guilbaut (1983).

    16. No se trata de um incidente isolado: no momento em que este artigo vai para o pre-lo, a mesma editora empreendeu um combate furioso comos urbanlogos Ronald

    van Kempen e Peter Marcuse, a fim de que estes modifiquem o ttulo de sua obra co-leti va, The Parti ti oned Ci ty, paraGlobali zing Ci ti es.

    17. Como tinha sido observado, h alguns anos, por John Wastergaard em sua alocuodiante da British Sociological Association (Wastergaard, 1992).

    18. Tendo sentido muita dificuldade para argir uma evidncia, ou seja, o fato de que oconceito de underclassno se aplica s cidades francesas, Cyprien Avend aceita e re-fora a idia preconcebida segundo a qual ele seria operatrio nos Estados Unidos(cf. Avend, 1997).

    19. Essas diferenas esto enraizadas em profundos pedestais histricos, como in dica aleitura comparada dos trabalhos de Giovanna Procacci (1993) e Michael Katz(1997).

    20. O problema da l ngua, evocado de passagem, um dos mais espinhosos. Tendo co-nhecimento das precaues tomadas pelos etnlogos na introduo de palavras na ti-

    vas, e embora tambm sejam conhecidos todos os benefcios simblicos fornecidospor esse verniz demodernity, podemos nos surpreender que determinados profissi o-nais das cincias sociais povoem sua linguagem cient fica com tantos falsos amigostericos baseados no simples decalque lexicolgico (minority, mi nori dade; pro-fession, profisso liberal, etc.) sem observar que essas palavras morfologicamente g-meas esto separadas por toda a diferena existente entre a sistema social no qual fo-ram produzidas e o novo sistema no qual esto sendo introduzidas. Os mais expostosfallacydo falso amigo so, evidentemente, os ingleses porque, aparentemente, fa-lam a mesma lngua, mas tambm porque, na maioria das vezes, tendo aprendido asociologia em manua is, readerse li vros americanos, no tm grande coisa a opor, sal-vo uma extrema vigilncia epistemolgico-politica, invaso conceitual. ( claro,existem plos de resistncia declarada hegemonia americana, como, por exemplo,no caso dos estudos tnicos, em torno da re vistaEthni c and Racial Studies, dirigida

    por Martin Bulmer, e do grupo de estudos do racismo e das migraes de RobertMiles na Universidade de Glasgow; no entanto, esses paradigmas alternativos, pre o-cupados em levar plenamente em considerao as especificidades da ordem brit ni-ca, no se definem menos por oposio s concepes americanas e seus derivadosbritnicos.) Segue-se que a Inglaterra est estruturalmente predisposta a servir de ca-

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    valo de Tria pelo qual as noes do senso comum erudito americano penetram nocampo intelectual europeu (isto vlido tanto em matria intelectual, quanto em po-l tica econmica e social). na Inglaterra que a ao das fundaes conservadoras edos intelectuais-mercenrios est estabelecida h mais tempo e a mais apoiada ecompensadora. D o testemunho dessa situao a difuso do mito erudito daun der-classna seqncia de intervenes ultramidiati zadas de Charles Murray, especialistado Manhattan Insti tute e guru intelectual da direita libertria dos Estados unidos, ede seu par simtrico, ou seja, o tema da dependncia dos desfavorecidos em re la os ajudas sociais que, segundo proposta de Tony Blair, devem ser reduzidas drasti ca-mente a fim de libertar os pobres da sujeio da assistncia, como foi feito porClinton em relao aos primos da Amrica no vero de 1996.

    21. Cf. em parti cular Erickson & Goldthorpe (1992); Erik Olin Wright (1997) chega aomesmo resultado com uma metodologia sensivelmente diferente; sobre os determi-nantes pol ticos da escala das desigualdades nos Estados Unidos e de seu crescimento

    durante as ltimas duas dcadas, Fischer et ali i(1996).22. Em uma obra essencial para avaliar plenamente no s a partede inconsciente his t-rico que, sob uma forma mais ou menos ir reconhecvel e reprimida, sobrevive nasproblemti cas eruditas de um pas, mastambm o peso hi strico que d ao impe ri a-lismo acadmico americano uma parte de sua extraordinria forade imposio, D o-rothy Ross revela como as cincias sociais americanas (economia, sociologia, cinciapol ti ca e psicologia) seconstruram, de sada, apartir de dois dogmas comple men ta-res consti tuti vos da doxa nacional, asaber: o individualismo metafsico e aidia deuma oposio diametralentre o dinamismo e aflexibilidade da nova ordem socialamericana, porum lado, e,por outro, aestagnao e arigidez das velhasformaessociais europias (Ross, 1991). Dois dogmas fundadores cujas retradues diretas seencontram, em relao ao primeiro, na linguagem ostensivelmente depurada da te o-ria sociolgica com atentativa cannica de Talcott Parsons de elaborar uma teoria

    voluntarista da ao e, mais recentemente, na ressurgncia da teoria dita da escolharacional; e, em relao aosegundo, na teoria da modernizao que reinou sem par-ti lhas sobre o estudo da mudana societal nas trs dcadas aps a Segunda GuerraMundial e que, atualmente, faz um retorno inesperado nos estudos ps-soviticos.

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