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CIÊNCIA EM TELA - Volume 1, Número 1 - 2008
Resumo
Um consenso entre os docentes do Ensino Fundamental é que a
introdução a alguns conteúdos de Ciências constitui um grande desafio,
pois são temas geradores de muitas dúvidas, que podem persistir, caso
esses fundamentos não sejam bem fixados. Para tornar esse processo
mais efetivo e dinâmico, o docente pode utilizar ferramentas que
facilitem o aprendizado, utilizando recursos que fixem conhecimentos
por meio de uma atividade em que o aluno sinta prazer em realizá-la.
Atualmente, esse tipo de estratégia, utilizando recursos da Informática,
tem sido crescentemente proposta no ensino de algumas ciências no
Brasil, pois atende a esses propósitos de forma diferenciada do contexto
tradicional.
O propósito deste relato é descrever como o uso da Informática, em
especial da Internet, pode facilitar o trabalho docente, disponibilizando
soluções para problemas pontuais na aprendizagem de temáticas
complexas, auxiliando na discussão e na construção de conceitos pelo
alunado de Ciências do Ensino Fundamental.
Palavras-Chave: Informática na Educação; Educação em Ciências;
Ensino Fundamental.
1. Introdução
Neste relato descrevo minha experiência docente vivenciada no
contexto da disciplina de Ciências no Ensino Fundamental, onde os
conteúdos abordados são consolidados a partir da utilização de
recursos da informática, já rotineiramente usados pelos alunos fora da
sala de aula.
Iniciei a utilização da Internet no contexto escolar, criando inicialmente
um site como uma ferramenta de apoio didático exclusiva para meus
alunos do Ensino Fundamental, Ensino Médio e Pré-vestibular com o
endereço eletrônico: (ver figura 1).
Com o desenvolvimento desse processo, percebi que para compartilhar
informações que os educandos julgassem interessantes, era necessário
inserir uma abordagem adequada ao ambiente virtual que já fazia parte
do dia a dia desse alunado, ou seja, trabalhar preferencialmente com
pesquisas on line, desafios lúdicos e uma interface de comunicação
simples e eficiente.
http://www.flaviocbarreto.bio.br
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A internet como atividade integrantede uma prática docente
Instituto Educacional Vivenciando RJ
Flávio Chame Barreto
Figura 1 - Site de apoio didático – Página inicial
relato
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Essa inserção, rapidamente favoreceu uma melhoria nas relações entre
os conteúdos e os educandos, resultando em um diferencial bastante
interessante e enriquecedor no processo de ensino e aprendizagem.
Além disso, essa opção de utilizar os recursos de informática e da
Internet demonstrou que podemos possibilitar ao aluno trabalhar o seu
processo de aprendizagem de uma forma ativa, transferindo o enfoque
educacional do processo de ensino para o processo de aprendizagem
(VALENTE; FREIRE, 2001). Neste aspecto, porém ressalvo, percebi que
um conteúdo proposto poderia ser considerado apropriado ou não,
significativo ou não pelo aluno. Considerando isso, o docente deve dar
uma atenção especial e proporcionar momentos de debate em sala de
aula para facilitar as conclusões dos alunos, assim como avaliar, sempre
que possível, o histórico das navegações realizadas e a consistência das
informações obtidas.
Como as concepções que o aluno tende a conservar melhor são aquelas
em que ele participa (POZO, 1998) e a utilização da Internet é uma
prática crescente nas novas gerações, o processo de navegação nos
conteúdos, pelo aluno por essas vias, implica em novos desafios para o
docente, pois ao contrário dos materiais educativos em formatos
tradicionais, a relação com a informação é mais abstrata, em
seqüências nem sempre lineares, produzidas por diferentes fontes, que
no caso da Internet, podem ser fidedignas ou não.
2. Descrevendo uma atividade didática
Dentre as inúmeras atividades que desenvolvi, utilizando a Internet
durante o ano letivo no ensino fundamental, escolhi para descrever
neste relato, a que foi realizada pela 5ª série do Instituto Educacional
Vivenciando, na cidade do Rio de Janeiro, durante os meses de
setembro e outubro de 2007, com o tema “reciclar, reaproveitar e
reutilizar” (ver figura 2).
Figura 2 – Pesquisa proposta com o temados “3 R – Reciclar, Reaproveitar, Reutilizar”
Consciente de que apenas o uso do computador não seria capaz de
trazer uma contribuição importante, caso não houvesse um processo de
participação, desafios e reflexão sobre o conteúdo, planejei uma
atividade que valorizasse o processo de investigação e pesquisa. A
proposta inicial era que os alunos acessassem uma página específica do
meu site, onde eu havia colocado um desafio.
A tarefa consistia em que cada aluno simulasse ser um repórter de um jornal
fictício on line, com a incumbência de produzir um texto sobre o lixo gerado
por um determinado produto, incorporando nele suas críticas e sugestões.
As opções de lixo eram inúmeras e variavam desde papéis, papelão e copos
descartáveis até garrafas pet e pneus usados (ver figura 3).
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Nesta página eu disponibilizei alguns links e orientações para as
primeiras buscas, uma caixa de texto onde cada um digitaria seus
textos e um botão que ao ser clicado, enviaria seu conteúdo para o
email do editor chefe, ou seja, para mim (ver figura 4).
Os textos acompanhados pelas respectivas referências, começaram
imediatamente a chegar em minha caixa de Email. Após imprimi-los, e
durante duas aula seguidas, todos os alunos tinham acesso ao conteúdo
de todos os textos.
Em grupos, eles debatiam as soluções propostas, inseriam novos
comentários, criticavam quando a informação era pobre ou
inconsistente, e nesses casos, decidiam fazer novas pesquisas na
Internet, redistribuindo entre eles as novas funções e prazos. Ao final de
15 dias, recebi um texto final, enviado através do meu site, com as
respectivas referências, links e fotos.
3. Desdobramento da atividade inicial
Na aula imediatamente posterior, durante a conclusão dos debates, os
alunos me perguntaram se podiam criar um jornal on line “de verdade”
utilizando em sua primeira edição, o material desenvolvido pela turma.
Falei que era uma ótima idéia, principalmente porque o mundo inteiro
teria a chance de ter acesso ao material produzido por eles. A simples
menção que o mundo inteiro teria acesso ao texto gerou novos debates
que culminaram com novas atividades que incluíram várias consultas
aos professores de português, artes e informática, além é claro, deste
professor de ciências. Duas semanas depois um site completamente
produzido por eles e denominado “Jornal Internacional de Ciências” foi
disponibilizado na Internet, hospedado no servidor gratuito
“Yahoo/Geocities” (Ver figura 5). Nessa segunda fase, o meu papel
continuou sendo de orientador, pois novas pesquisas foram realizadas,
alguns textos ampliados e novas imagens foram incorporados ao texto
original.
Figura 3: Opções sugeridas para
as pesquisas
Figura 4: A caixa detexto para o envio dos
textos e links paraas primeiras buscas.
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4. Avaliação
Durante essa atividade ratifiquei que um dos objetivos na educação não
deve ser o quanto de um conteúdo será absorvido, mas principalmente,
como isso ocorrerá. Logo, um ensino que favoreça atingir esses
objetivos, por meio de atividades que podem ser desenvolvidas pelo
aluno de forma prazerosa, onde ele constrói conceitos que considere
inteligíveis, plausíveis e proveitosos no seu cotidiano, devem ser
realizadas pelo docente (PHILLIPS, 1997).
O tema da pesquisa, na forma que foi proposto, permitiu uma profunda
reflexão dos alunos sobre o desenvolvimento tecnológico acelerado e a
sua conseqüente produção de lixo, propiciando um olhar crítico sobre o
problema. Servindo para comprovar que para se poder tomar uma
posição crítica e de valor e não só de consumo indiscriminado deve-se
ter a capacidade de saber aprender, critério para selecionar e situar a
informação e um mínimo de conhecimento básico para dar-lhe sentido e
convertê-la em conhecimento pessoal, social e profissional (SANCHO,
1988).
Apesar de não ter sido explicitado na tarefa proposta, as discussões
convergiram para a busca de soluções coerentes com a redução do
consumo, fato este, resultante das diferentes pesquisas e dos próprios
debates que sempre sinalizavam para este ponto em comum. Este
consenso foi destacado por diversas vezes nos textos produzidos, e
inclusive finalizou a versão final como uma sugestão a ser seguida por
todos nós.
Este relato demonstra que o processo de descoberta, do significado de
conceitos básicos, pelo aluno, pode ser realizado de forma bem simples
através do uso da Informática como mediadora no processo de
aprendizagem. Atualmente, as ferramentas disponíveis nos programas
de uso cotidiano permitem que qualquer docente que tenha domínio
básico de informática possa construir rapidamente diferentes
aplicativos que atendam as suas necessidades pontuais. O simples
processo de navegação pelos inúmeros sites que oferecem serviços
gratuitos, como por exemplo o que foi escolhido pelos alunos para
hospedar o material produzido, disponibilizam tutoriais que orientam
passo a passo como criar e publicar páginas e hospedar diferentes
conteúdos gratuitamente na Internet.
É importante ressaltar que o aspecto motivacional das diferentes atividades
desenvolvidas, possibilitou uma compreensão mais ampla do tema pelos
alunos, onde a participação deles foi de tal forma enriquecedora, que posso
considerar tais atividades como boas opções para que sua prática seja
utilizada de forma mais generalizada por outros docentes.
Figura 5: Jornal on line criado por iniciativados alunos aproveitando o material da pesquisa
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5. Referências Bibliográficas
POZO, J. I. Teorias cognitivas da aprendizagem. 3 ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.
PHILLIPS, R. JENKINS, N. Interactive multimedia development: The developer's handbook to interactive multimedia – A pratical guide for educational applications. London: Kogan Page, 1997.
SANCHO, J. M. (Org). Para Uma Tecnologia Educacional. São Paulo: Editora Artmed. 1988.
VALENTE J. A.; FREIRE, F. M. P. (Org), Aprendendo para a vida: Os computadores na sala de aula. 1ª Ed, São Paulo: Editora Cortez, 2001.
Sobre o autor
Flávio Chame Barreto é bacharel em Biologia na especialidade Genética e licenciado em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, atua como professor do ensino básico e superior e como consultor no desenvolvimento de softwares. Atualmente, está concluindo uma especialização no ensino de Ciências e Biologia no Instituto de Bioquímica Médica da UFRJ.
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