Artigo sobre telhados verdes

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Determinação da utilidade do uso de telhado verde no Agreste Pernambucano Sylvana Melo dos Santos (1), Suzana Maria Gico Lima Montenegro (2), Paulo Frassinete de Araújo Filho (3), Jaime Joaquim da Silva Pereira Cabral (4) e Thiago Florêncio de Araújo (5) (1) Núcleo de Tecnologia do Centro Acadêmico do Agreste, UFPE, Brasil. E-mail: [email protected] (2) Departamento de Engenharia Civil, UFPE, Brasil. E-mail: [email protected] (3) Núcleo de Tecnologia do Centro Acadêmico do Agreste, UFPE, Brasil. E-mail: [email protected] (4) Departamento de Engenharia Civil, UFPE, Brasil. E-mail: [email protected] (5) Núcleo de Tecnologia do Centro Acadêmico do Agreste, UFPE, Brasil. E-mail: [email protected] Resumo: O crescente processo de urbanização em todo mundo vem trazendo alguns impactos ambientais pela troca de áreas verdes por áreas impermeáveis. Por isso, pesquisadores do mundo inteiro estão buscando formas alternativas, naturais e sustentáveis para amenizar esses efeitos. Umas dessas formas são os “telhados verdes”, que se caracterizam pela aplicação de vegetação sobre a cobertura de edificações com impermeabilização e drenagem adequadas, agindo positivamente sobre o conforto ambiental, a qualidade do ar e a geração do escoamento superficial das águas pluviais. Este trabalho teve como objetivo a investigação sobre telhados verdes quanto a sua funcionalidade como alternativa para o manejo sustentável de águas pluviais urbanas e quanto a viabilidade de seu uso para o ganho de conforto térmico utilizando a vegetação típica do Agreste Pernambucano. Após um extenso levantamento bibliográfico sobre o tema e os casos já executados, definiu-se a vegetação a ser utilizada, foram instalados os equipamentos para monitoramento dos dados hidrológicos que visam a realização do balanço hídrico. Além disso, informações sobre variáveis climatológicas, da área de estudo foram obtidas do Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Considerando padrões internacionais de definição quanto ao conforto humano, verificou-se a necessidade de ganho de conforto ambiental para as edificações na área de estudo. Além disso, a escassez de precipitação pluviométrica na maior parte do ano é um importante sinalizador da necessidade de armazenamento da água da precipitação. Palavras-chave: Telhado verde; conforto térmico; Armazenamento de água. Abstract: The urbanization process around the world has brought several environmental impacts by exchanging original green areas by impermeable surfaces. Thus, researchers have been searching natural and sustainable alternatives to minimize the negative impacts. One of these alternatives is the green roof, characterized by the use of a vegetation layer covering the roof of a building and consisting of a number of layers that form the green roof system, including an impermeable layer and adequate drainage system, positively acting on the thermal comfort, air quality and runoff generation. This work had the objective of analysing green roof as an alternative for sustainable urban drainage practices and the feasibility of its use for gaining thermal comfort using typical vegetation from the ´Agreste´ region of Pernambuco state. The vegetation has been chosen based on an extensive literature review analyzing successful case. At the study site, equipments have been installed for hydrometeorological monitoring aiming to establish water balance estimation. Besides, information on climate variables in the study area have been obtained from CPTEC- INPE (Centre for Weather Forecast and Climate Study- National Institute for Spatial Research, Brazil). Based on international standards, it has been verified the need for improving thermal comfort for human beings in buildings in the study site. Rainfall scarcity during the majority of the months in a year is an important indicator for the need in rainwater catchment strategies. Key-words: Green Roofs;Thermal Confort; water storage. 1. INTRODUÇÃO A população da região semi-árida é estimada em 20 milhões de pessoas, correspondendo a

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Artigo sobre telhados verdes. Pesquisa realizada no Centro Acadêmico do Agreste da UFPE.

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Determinação da utilidade do uso de telhado verde no Agreste Pernambucano

Sylvana Melo dos Santos (1), Suzana Maria Gico Lima Montenegro (2), Paulo Frassinete de Araújo Filho (3), Jaime Joaquim da Silva Pereira Cabral (4) e Thiago Florêncio de

Araújo (5)

(1) Núcleo de Tecnologia do Centro Acadêmico do Agreste, UFPE, Brasil. E-mail: [email protected] (2) Departamento de Engenharia Civil, UFPE, Brasil. E-mail: [email protected]

(3) Núcleo de Tecnologia do Centro Acadêmico do Agreste, UFPE, Brasil. E-mail: [email protected] (4) Departamento de Engenharia Civil, UFPE, Brasil. E-mail: [email protected]

(5) Núcleo de Tecnologia do Centro Acadêmico do Agreste, UFPE, Brasil. E-mail: [email protected]

Resumo: O crescente processo de urbanização em todo mundo vem trazendo alguns impactos ambientais

pela troca de áreas verdes por áreas impermeáveis. Por isso, pesquisadores do mundo inteiro estão

buscando formas alternativas, naturais e sustentáveis para amenizar esses efeitos. Umas dessas formas

são os “telhados verdes”, que se caracterizam pela aplicação de vegetação sobre a cobertura de

edificações com impermeabilização e drenagem adequadas, agindo positivamente sobre o conforto

ambiental, a qualidade do ar e a geração do escoamento superficial das águas pluviais. Este trabalho

teve como objetivo a investigação sobre telhados verdes quanto a sua funcionalidade como alternativa

para o manejo sustentável de águas pluviais urbanas e quanto a viabilidade de seu uso para o ganho de

conforto térmico utilizando a vegetação típica do Agreste Pernambucano. Após um extenso levantamento

bibliográfico sobre o tema e os casos já executados, definiu-se a vegetação a ser utilizada, foram

instalados os equipamentos para monitoramento dos dados hidrológicos que visam a realização do

balanço hídrico. Além disso, informações sobre variáveis climatológicas, da área de estudo foram

obtidas do Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos, do Instituto Nacional de Pesquisas

Espaciais. Considerando padrões internacionais de definição quanto ao conforto humano, verificou-se a

necessidade de ganho de conforto ambiental para as edificações na área de estudo. Além disso, a

escassez de precipitação pluviométrica na maior parte do ano é um importante sinalizador da

necessidade de armazenamento da água da precipitação.

Palavras-chave: Telhado verde; conforto térmico; Armazenamento de água.

Abstract: The urbanization process around the world has brought several environmental impacts by

exchanging original green areas by impermeable surfaces. Thus, researchers have been searching

natural and sustainable alternatives to minimize the negative impacts. One of these alternatives is the

green roof, characterized by the use of a vegetation layer covering the roof of a building and consisting of

a number of layers that form the green roof system, including an impermeable layer and adequate

drainage system, positively acting on the thermal comfort, air quality and runoff generation. This work

had the objective of analysing green roof as an alternative for sustainable urban drainage practices and

the feasibility of its use for gaining thermal comfort using typical vegetation from the ´Agreste´ region of

Pernambuco state. The vegetation has been chosen based on an extensive literature review analyzing

successful case. At the study site, equipments have been installed for hydrometeorological monitoring

aiming to establish water balance estimation. Besides, information on climate variables in the study area

have been obtained from CPTEC- INPE (Centre for Weather Forecast and Climate Study- National

Institute for Spatial Research, Brazil). Based on international standards, it has been verified the need for

improving thermal comfort for human beings in buildings in the study site. Rainfall scarcity during the

majority of the months in a year is an important indicator for the need in rainwater catchment strategies.

Key-words: Green Roofs;Thermal Confort; water storage.

1. INTRODUÇÃO

A população da região semi-árida é estimada em 20 milhões de pessoas, correspondendo a

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aproximadamente 11% da população brasileira e 46% dessa população (9,2 milhões) vivem em áreas rurais sob grande vulnerabilidade social e econômica. Segundo estudos da Embrapa Semi-Árido (CPATSA/Embrapa), 60 dias após o encerramento do período das chuvas, 550 mil dos 2,6 milhões de estabelecimentos rurais da região passam a viver sem qualquer tipo de água para o consumo humano ou animal, nos seus próprios agroecossistemas familiares. Se considerarmos um período de 120 dias após o término das chuvas, podemos projetar que mais de 1 milhão de estabelecimentos fiquem sem qualquer fonte de água no período de seca. Sob tais condições, a população destas localidades ainda convivem com insolação média de 2800 h/ano, e umidade relativa do ar média em torno de 50%. As temperaturas muito elevadas, em torno de 26ºC, com pequena variação interanual, inspiram uma situação de maior cuidado referente ao calor. De uma forma geral, segundo Pereira e Cunha (2006), ao longo do dia o organismo humano compreende estados de atividade, fadiga e natural recuperação, sendo que algumas vezes isso esta recuperação é dificultada por condições climáticas desfavoráveis e, em alguns casos, pela tensão psicológica imposta pela atividade de trabalho, atuando, ambas, no corpo e na mente, produzindo desconforto, perda da eficiência e, eventualmente, podendo conduzir a transtornos de saúde. O autor concluiu que as formas meteorológicas deliberantes aumentam a fadiga, isto é, a possibilidade de cansaço; a diminuição do rendimento surge mais rapidamente e com maior intensidade que com o tempo ameno. Neste contexto, os “telhados verdes”, que se caracterizam pela aplicação de vegetação sobre a cobertura de edificações com impermeabilização e drenagem adequadas, agem positivamente sobre o conforto ambiental, reduzindo a temperatura dos ambientes interiores das edificações onde são instalados.

Por outro lado, o “teto verde” ou “telhado verde” procura resgatar parcialmente as condições hidrológicas como uma forma de mitigação dos impactos acusados pela urbanização excessiva. Segundo Nascimento e Heller (2005), em áreas urbanas, um benefício marginal da captação de águas pluviais para abastecimento é a redução de escoamentos superficiais decorrentes da impermeabilização do solo. Para que o uso dos telhados verdes se caracterize como uma alternativa factível e sustentável na área de estudo, o desempenho da vegetação utilizada é fundamental. Portanto, o telhado verde contempla a preocupação com a escolha das plantas que incide sobre as espécies que demandem menor manutenção (irrigação, poda e limpeza) bem como, as mesmas devem apresentar nível de resistência capaz de suportar as condições climáticas e ambientais do local onde está instalado.

Seguindo esta configuração básica, foram construídos canteiros, na cidade de Caruaru, no Agreste Pernambucano, com vegetação, substrato, camada drenante, camada de impermeabilização e laje de concreto. Também foram determinados os parâmetros a serem monitorados para os canteiros e conseqüentemente os equipamentos e dispositivos necessários visando identificar a configuração do sistema telhado verde, inclusive vegetação, mais adequado à realidade do local.

Várias experiências exitosas podem ser encontradas na literatura específica (Köhler at al., 2001; Peck et al., 1999; Correa e González, 2002, Schmidt, 1992), com diferentes edificações, vegetações e características próprias, mas todas são unânimes em afirmar que estas estruturas agem positivamente sobre os subsistemas termodinâmico (conforto ambiental), físico-químico (qualidade do ar) e hidrometeórico (impacto pluvial). Este trabalho teve como objetivo a investigação sobre a utilidade dos telhados verdes como alternativa para o manejo sustentável de águas pluviais urbanas e sobre a viabilidade de seu uso para o ganho de conforto térmico utilizando a vegetação típica do Agreste Pernambucano, bem como descrição das etapas de instalação dos mesmos.

2. METODOLOGIA

2.1. Instalação do telhado verde

Foi implantado um módulo para estudo de telhado verde (vegetado) no município de Caruaru, onde fica o campus interiorizado da Universidade Federal de Pernambuco - UFPE, o Centro Acadêmico do Agreste. Como uma das primeiras etapas da pesquisa, foram analisadas as possibilidades das edificações existentes nas proximidades do Campus que pudessem ser utilizadas para a instalação do referido telhado verde. Nesta etapa foram considerados: variáveis do projeto arquitetônico como orientação, insolação e sombreamento, dimensões, aberturas, entre outros; variáveis do sistema construtivo como dimensões dos componentes e propriedades termofísicas dos materiais (condutividade, massa e calor específicos). Além disso, foi considerado também se a localidade permitiria a instalação de equipamentos de medição

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climatológica e que fosse assegurada a segurança dos equipamentos instalados. Assim sendo, o local escolhido está localizado nas instalações da Empresa Pernambucana de Pesquisa Agropecuária - IPA, no mesmo município, em uma edificação térrea pré-existente com três ambientes semelhantes que se mostraram muito apropriados para a instalação do telhado verde (Figura 1a). O IPA localiza-se no povoado de Malhada de Pedra, zona rural de Caruaru, em Pernambuco (Figura 1b).

(a) Edificação selecionada para a instalação do

telhado verde.

(b) A seta indica a posição do IPA e o ponto corresponde ao

centro do município de Caruaru.

Figura 1: Local selecionado para construção do teto verde nas instalações do IPA, município de Caruaru.

A proximidade da estação climatológica do IPA, a reciprocidade de interesse científico demonstrada pela gerência local, bem como a disponibilidade de técnicos especializados, constituíram motivações adicionais para que a instalação do teto verde fosse realizada neste local. A área cedida para o desenvolvimento desta Pesquisa corresponde a dois banheiros desativados e um pequeno quarto, com aproximadamente 24m cada ambiente. Na laje de dois destes, foram implantados os telhados verdes e na laje do outro, conservou-se o telhado convencional, conforme esquema apresentado na Figura 2.

Figura 2: Esquema de disposição dos telhados verdes e convencional nas instalações do IPA em Caruaru.

O telhado verde é uma boa opção para Caruaru, podendo vir a ser projetada por arquitetos e engenheiros com o objetivo estético e de conforto térmico, e no âmbito das ações desenvolvidas nesta Pesquisa está sendo realizada a estimativa do balanço hídrico para verificação do desempenho do sistema como superfície de controle. Para adaptação do telhado original e instalação da estrutura para recebimento do telhado verde foram desenvolvidas as seguintes etapas:

• Retirada das telhas originais, construção das muretas de contenção, que servem para isolar a área de estudo quanto à entrada ou saída de escoamento em relação às áreas vizinhas, e impermeabilização da superfície superior da laje (Figura 3a) com vistas a evitar futuras infiltrações.

• Instalação do sistema de captação (calhas e tubos condutores) e colocação de tonéis (de 240 L) para armazenamento da água da chuva, Figura 3b.

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(b) Aplicação do impermeabilizante

(b) Tonéis para o armazenamento das águas da chuva captadas nos telhados

Figura 3: Fotos da etapa de construção.

• Por fim, foi realizada a implantação da cobertura verde nos dois trechos. O tipo de camada drenante aplicada pode ter aproximadamente 140 kg/m2 de carga sobre a laje, o que pode acarretar em variações significativas de custo quando da execução da mesma. Por isso, é sempre necessário que os custos sejam avaliados. A instalação do sistema de drenagem e da manta impermeabilizante foi realizada conforme apresentado na Figura 4.

Figura 4: Esquema de instalação do sistema de drenagem.

Em ambos os telhados verdes 1 e 2 (Figura 2) utilizou-se argila expandida como material drenante (Figura 5a), que constitui um agregado leve que se apresenta em forma de bolinhas de cerâmica leves e arredondadas, com uma casca rígida e resistente e uma estrutura interna formada por uma espuma cerâmica com micrósporos, que permitem a remoção dos excessos de água das superfícies e do subsolo, garantindo o perfeito escoamento da água, mantendo a umidade e criando as condições necessárias na terra para que as plantas tenham um completo desenvolvimento. A separação entre o solo e as camada drenante foi possível com o uso de Manta Bidim Drennáge (PRODUTO RT 07) (Figura 5b) que impede a passagem dos substratos para a camada de drenagem, o que prejudicaria o sistema de drenagem e a circulação do ar. A camada de substrato tem cm10 de espessura e é constituída de uma mistura que tem como base a terra vegetal (substrato propriamente dito, para fornecimento de nutrientes) e acima desta camada encontram-se as duas espécies vegetais pré-testadas em protótipos.

(a) Camada de argila expandida.

(b) Aplicação da manta Bidin.

Figura 5: Detalhe da implantação dos telhados verdes.

2.2. Definição, instalação e manutenção das espécies vegetais

Para que o uso dos telhados verdes se caracterize como uma alternativa factível e sustentável na área de estudo, o desempenho da vegetação utilizada é fundamental e, por isso, a escolha da espécie vegetal não deve ser considerada como uma etapa menos importante. De acordo com Getter e Rowe (2006), os fatores

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que devem ser considerados na definição das espécies vegetais a serem utilizadas na implantação de um telhado verde incluem aparência, condições ambientais inclusive macro e microclima, composição do substrato e profundidade, métodos de instalação, e manutenção. Os telhados verdes podem ser classificados em intensivos ou extensivos, dependendo da profundidade necessária ao plantio da vegetação e do tipo de manutenção necessária. Os tradicionais telhados verdes, que requerem uma razoável profundidade de solo devido ao grande crescimento das plantas são chamados de intensivos devido ao “intensivo” trabalho de manutenção que demandam: irrigação, fertilizantes, entre outros. Os telhados extensivos, por outro lado, têm a concepção inerente de serem quase “auto-sustentáveis”, ou seja, de necessitarem de apenas um mínimo de manutenção, como, por exemplo, irrigações esporádicas e pouco uso de fertilizantes.

Uma característica muito importante do estudo da aplicabilidade desta tecnologia em clima semi-árido é a pouca, ou nenhuma, disponibilidade de água para irrigações adicionais à cobertura vegetal. Por outro lado, por tratar-se de uma das áreas mais pobres do nordeste, buscou-se garantir a viabilidade financeira do projeto utilizando-se espécies vegetais de baixo custo. Neste contexto foram testadas algumas espécies vegetais com possibilidade de adequação ao clima e à proposta do projeto de ser o mais “auto-sustentável” possível.

Para auxiliar nesta definição, foi realizado um levantamento junto aos técnicos do IPA e com os professores envolvidos com esta Pesquisa sobre outras possibilidades de vegetação que teriam boa adequabilidade à situação climatológica da região e foram identificadas as seguintes alternativas: grama de burro (Cynodium dactylum), que tem folhas estreitas e crescimento rápido, é muito resistente; grama batatais (Paspalum notatum), bem comum e rústica, tem pouca exigência quanto à umidade e à fertilidade e resistente à pragas e doenças; grama esmeralda (Zoysia japonica), que apresenta folhas médias, grande número de estolões e boa resistência ao pisoteio; onze horas (Portulaca grandiflora), que é muito resistente à falta d’água e raios solares, não necessitando de regas abundantes.; e mal-me-quer, vedélia (Sphagneticola trilobata, Sin.: Wedelia paludosa), que é muito resistente. Em seguida foram construídos canteiros experimentais, onde foi acompanhado diariamente o desenvolvimento de algumas espécies.

Assim sendo, considerando as características locais, optou-se por utilizar em um dos telhados uma vegetação típica, o cacto popularmente conhecido como coroa-de-frade (Melocactus macrodiscus), Figura 6a, e no outro uma gramínia que pode ser facilmente encontrada na região, de nome popular grama de burro, Figura 6b. Ambas as vegetações utilizadas têm características de adaptação aceitáveis para a localidade e situação desejada.

(b) Teto verde 2: coroa de frade.

(a) Teto verde 1: grama de burro

Figura 6: Teto Verde construído em Caruaru.

2.3. Monitoramento das variáveis hidrológicas

Para verificação da redução do escoamento superficial, runoff, foram instaladas saídas em cada uma das três situações analisadas (telhado convencional, telhado verde 1 e telhado verde 2) para o escoamento de águas pluviais, tal que a água coletada em um tambor com nível d'água, reservatório, seja utilizada no estudo hidrológico. Outros dados climáticos são obtidos da própria estação climatológica do IPA de Caruaru (Figura 7), que utiliza um sistema de aquisição automática de dados com telemetria (plataforma de coleta de dados - PCD automática com transmissão via satélite). A estação envia os dados

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automaticamente para o Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos – CPTEC, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE, que disponibiliza os dados obtidos do Sistema Brasileiro de Coleta de Dados, em seu website.

(a) Vista da estação climatológica.

(b) PCD do IPA (Caruaru)

Figura 7: Estação climatológica localizada no IPA, em Caruaru.

A Plataforma de Coleta de Dados – PCD, do IPA, é composta de vários sensores, entre eles: sensor ultra-sônico de vento, sensores de temperatura e umidade relativa do ar, sensores de radiação solar global e de radiação fotossintética ativa, sensor de precipitação ou pluviômetro, sensor de pressão atmosférica ou barômetro, sensor de radiação total líquida ou saldo radiômetro, sensor de temperatura do solo e sensor de fluxo de calor no solo (INPE, 2008). Desses parâmetros, estão sendo observados e analisados continuamente: temperatura do ar, temperatura máxima do ar, temperatura mínima do ar, umidade relativa do ar e precipitação (Tabela 1).

Tabela 1 – Características dos parâmetros obtidos da PCD localizada em Caruaru. Fonte: INPE (2008).

Parâmetro Unidade Descrição Temperatura do Ar °C Valor instantâneo a cada 3 h Temperatura Máx. do Ar últ. 24 h °C Valor a cada 3 h com a Máx. das últ. 24 h, amostragem a cada 1 minuto Temperatura Mín. do Ar últ. 24 h °C Valor a cada 3 h com a Mín. das últ. 24 h, amostragem a cada 1 minuto Umidade Relativa do Ar % Valor instantâneo a cada 3 h Precipitação Acumulada mm Valor acumulado mensal cada 3 h (zera o acum. automat. dia 01 cada mês)

3. RESULTADOS

Com os dados coletados da estação climatológica do IPA foi desenvolvido um banco de dados com informações diárias de 3 anos hidrológicos (período contínuo de doze meses durante o qual ocorre um ciclo anual climático completo), compreendendo o período de junho de 2005 a maio de 2008 e foram realizadas algumas análises, conforme apresentado a seguir.

A temperatura média mensal do ar considerando os três anos hidrológicos apresentou uma amplitude da ordem de 4ºC, tendo apresentado comportamento semelhante a cada mesmo período dos diferentes anos (Figura 8).

Figura 8: Temperatura média mensal do ar de junho de 2005 a maio de 2008.

O período em que se verificaram os maiores valores médios mensais de temperatura do ar, em torno de 24ºC, foi de novembro a fevereiro, nos três anos. A análise mais detalhada com relação ao comportamento mensal indica que valores maiores podem ser esperados na maior parte dos dias.

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Selecionando-se, para análise, o mês que apresentou maior média mensal, fevereiro de 2006, pode-se verificar que os máximos valores diários apresentados chegam a superar a média mensal em até 38%, e o menor valor máximo observado no período, que é 30ºC, também é superior à média mensal (Figura 9).

Figura 9: Variação da temperatura máxima diária do ar no mês de fevereiro de 2005.

A umidade relativa é o índice mais conhecido para descrever o conteúdo de vapor d’água na atmosfera. Por definição, umidade relativa é a razão entre a razão de mistura real e a razão de mistura de saturação, e variações da umidade relativa causadas por variações da temperatura ocorrem na natureza tipicamente por: variação diurna da temperatura, movimento horizontal de massa de ar e movimento vertical de ar. Um fator muito importante no comportamento da umidade é a temperatura, pois a temperatura define a pressão de saturação de vapor de água. Uma pequena mudança no valor de temperatura, principalmente em altas umidades, tem um efeito significativo na umidade relativa, já que a pressão de saturação de vapor de água muda também. Considerando-se um dos dias analisados que apresentou maior temperatura diária, dia 7 de fevereiro de 2006, verificou-se o comportamento dos valores medidos de temperatura ao longo do dia e também para a umidade relativa, e o efeito do ciclo diurno da temperatura, para os dados coletados neste dia, é visível na Figura 10.

Figura 10: Variação da temperatura do ar e da umidade relativa para o dia 07/02/2006.

De fato, o ar contém uma certa quantidade de vapor de água que depende da sua temperatura: quanto mais quente o ar, mais vapor de água ele retém. Uma baixa umidade relativa significa que o ar é mais seco e poderia reter muito mais água naquela temperatura. A umidade relativa tem papel importantíssimo na sensação de conforto. Se a umidade relativa for de 100%, significa que a água não vai evaporar, pois o ar já está saturado (máxima quantidade de vapor d'água possível). Quanto mais baixa a umidade relativa, mais fácil para a água evaporar. Analisando-se a distribuição temporal da umidade relativa média mensal para todo o período investigado, observa-se que os valores variaram entre 70 e 90% conforme a época do ano (Figura 11).

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Figura 11: Umidade relativa média mensal de junho de 2005 a maio de 2008.

A umidade relativa ameniza a variação da temperatura, com bloqueio da radiação e diminuição do calor radiante emitido da Terra para a atmosfera. Os meses mais úmidos, ou seja, de maior umidade relativa média, foram de março a agosto (acima de 85%), sendo que este comportamento não foi observado para o período de junho a agosto de 2005. Analisando-se simultaneamente os gráficos apresentados na Figura 10 e Figura 13, pode-se observar que os meses de junho, julho e agosto apresentaram as menores variações na temperatura média mensal. Nestes casos as amplitudes de temperatura foram de 0,8ºC, 0,7ºC e 0,9ºC para os anos de 2005, 2006 e 2007 respectivamente. A temperatura e insolação elevadas são aspectos importantes que identificam a necessidade de desenvolvimento de alternativas para controle térmico dos interiores das edificações. Com relação aos dados pluviométricos, pode-se observar pelo gráfico apresentado na Figura 12, que o período de chuva na região é normalmente de fevereiro a junho, sendo o mês de junho o que concentra maior volume precipitado.

Figura 12: Precipitação média mensal de junho de 2005 a maio de 2008.

Conforme os dados apresentados, verifica-se que em junho de 2005 o valor médio mensal precipitado (129,4 mm) foi bastante superior aos dois anos seguintes, que foram da ordem de 60mm. No que se refere à distribuição da precipitação média mensal, verifica-se que na maior parte dos meses, a precipitação atinge valores máximos de 20mm e a existência de dias sem chuva pioram a situação de escassez hídrica na região.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com base nos estudos e análises realizados neste trabalho, pode-se concluir que:

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• com relação ao comportamento da temperatura média mensal do ar na localidade estudada, verifica-se que os meses de novembro a fevereiro são os mais quentes do ano, e para o qual, a partir das experiências verificadas na literatura, deve-se esperar um ganho de conforto térmico para a estrutura instalada;

• considerando padrões internacionais de definição quanto ao conforto humano (WMO, 1987), os dados de temperatura e umidade relativa verificados para a região indicam a necessidade de desenvolvimento de tecnologia economicamente viável e tecnicamente específica para ganho de conforto ambiental das edificações, como o telhado verde, voltada à realidade local;

• a escassez de precipitação na maior parte do ano é um importante sinalizador da necessidade de armazenamento da água que precipita ao longo dos meses chuvosos, ratificando assim a necessidade de instalação de sistema de captação e armazenamento da água associado ao telhado verde;

• todo o volume armazenado poderá ser utilizado para a própria manutenção hídrica do sistema, bem como em outros usos que se mostrarem necessários. A viabilidade do uso do volume de água coletado pelo telhado só pode ser definida, entretanto, após a análise físico-química-microbiológica da água coletada.

5. SEGUIMENTO DOS TRABALHOS

Com vistas a dar continuidade ao desenvolvimento desta Pesquisa será investigado: • o desempenho do telhado verde com relação ao ganho de conforto térmico por meio da

realização do monitoramento das temperaturas interna e externa dos ambientes sob o telhado verde, inclusive nos três meses mais quentes do ano na região;

• o funcionamento do sistema como superfície de controle através da realização do balanço hídrico do sistema;

• a auto-sustentabilidade hídrica do sistema, bem como outras possibilidades de uso identificadas após a análise da qualidade da água que escoa do telhado verde.

Espera-se que todo o volume armazenado seja utilizado para a própria manutenção hídrica do sistema, bem como em outros usos que se mostrarem necessários, e que o telhado verde construído em Caruaru possa agir positivamente sobre o conforto ambiental, a qualidade do ar e a geração do escoamento superficial das águas pluviais.

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Page 10: Artigo sobre telhados verdes

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W.M.O. - World Climate Programme Applications (1987) Climate and Human Health. World Meteorological Organization.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à Financiadora de Estudos e Projetos – FINEP, no âmbito do Programa PROSAB, à Pró-Reitoria de Pesquisa da UFPE – PROPESQ, no âmbito do edital Enxoval, pelo apoio financeiro, ao convênio PIBIC/UFPE/CNPq pela bolsa de iniciação científica, e à Empresa Pernambucana de Pesquisa Agropecuária – IPA por permitir a realização desta pesquisa em suas instalações.