Artigo - Limites Do Planejamento Tributário 2

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  • PARAISOS FISCAIS: O LIAME ENTRE O PLANEJAMENTO FISCAL

    INTERNACIONAL E AS PRTICAS EVASIVAS DANOSAS

    Denise Lucena Cavalcante

    Rui Barros Leal Farias

    INTRODUO

    O trabalho que ora se inicia tem como objetivo

    demonstrar a possibilidade ou no do uso dos chamados parasos fiscais como

    instrumento de eliso fiscal. Da mesma forma, buscar-se- uma anlise dos pases com

    tributao favorecida (terminologia utilizada pela legislao brasileira para conceituar

    os parasos fiscais), e sua relao com atividades ilcitas, bem como a prtica de evaso

    fiscal.

    Para atingir o escopo traado ser brevemente exposto o

    atual panorama no qual os parasos fiscais se enquadram. Desta maneira, passa-se ao

    exame da concepo de paraso fiscal, internacionalmente e no direito brasileiro, tendo

    em vista a relatividade da sua caracterizao.

    Passadas as condies preliminares ao conhecimento da

    questo principal colocada, ser debatida a constitucionalidade deste instrumento de

    planejamento tributrio, assim como os aspectos negativos e positivos da prtica elisiva

    enfocada.

    PANORAMA ATUAL

    A internacionalizao dos negcios vem rapidamente

    tomando conta de todos os mercados, em todas as suas esferas. A facilidade de

    comunicao aliada rapidez na circulao de mercadorias, faz com que os agentes

    econmicos adaptem-se s caractersticas especficas dos ordenamentos jurdicos com

    os quais trabalham.

  • Neste mesmo contexto, a competitividade eleva-se a partir

    do instante em que empresas de diversas partes do globo oferecem servios e produtos

    semelhantes. Desta forma, busca-se reduzir os custos envolvidos no negcio para fins

    de se manterem aptas a disputar uma parcela do imenso mercado global.

    Com o objetivo de fornecer produtos com os menores

    custos possveis, gerando, conseqentemente, os maiores lucros, diversos meios so

    utilizados pelas empresas destacando-se, dentre estes, a reduo da carga tributria

    incidente sobre a atividade desenvolvida.

    Ocorre que, a carga tributria nos Estados modernos,

    aplicados em fornecer uma melhor qualidade de vida aos seus componentes, apresenta-

    se bastante elevada, vindo em alguns casos a comprometer o desenvolvimento de

    atividades empresariais.

    Com bases nestas premissas, ou seja, elevada carga

    tributria na grande maioria dos Estados, aliada competitividade na atividade

    econmica, figuram os parasos fiscais como meio de reduzir o impacto dos tributos nos

    negcios existentes.

    Entretanto, aliada reduzida carga tributria, os parasos

    fiscais conferem outras condies aos que aplicam recursos nestas localidades, tais

    como: sigilo bancrio e fiscal, criao de sociedades com titularidade garantida por

    meio de aes ao portador, liberdade cambial, etc. Estas numerosas vantagens, em

    conjunto com a carga tributria nula ou perto de zero, vm fazendo com que os demais

    Estados, contrrios s condutas dos parasos fiscais, criem mecanismos para evitar a

    fuga de recursos, bem como um maior controle aos que faam uso desse mecanismo de

    eliso fiscal.

    No se pode tambm, sob pena de aparentar uma certa

    ingenuidade, deixar de considerar a vinculao entre os parasos fiscais e atividades

    ilcitas. A preservao do sigilo bancrio e fiscal, aliado facilidade na transferncia de

    recursos sem necessidade de justificativa ao Estado da sua origem ou destino, criam

    condies favorecedoras do trnsito de montantes resultantes de prticas criminosas.

  • Porm, uma viso focada exclusivamente nesta infeliz realidade, deixa de lado uma

    srie de aspectos lcitos relacionados aos pases de tributao favorecida, indispensveis

    para a internacionalizao da atividade econmica.

    So estas as linhas mestras traadas para o exame de

    questes ainda pouco exploradas acerca da constitucionalidade do planejamento

    tributrio atravs da utilizao de parasos fiscais, bem como a conciliao das regras

    internacionais relacionadas ao intercmbio de recursos entre naes.

    PARASO FISCAL

    De pronto, faz-se necessrio expor que inexiste um

    conceito fechado para caracterizar um paraso fiscal. A doutrina sobre a matria no

    uniforme, e ainda, os critrios utilizados no so precisos, como se passar a expor.

    Muito embora tenha se generalizado na tica da maioria

    da populao um vnculo permanente entre os parasos fiscais e atividades ilcitas, como

    prostituio, trfico de drogas ou trfico de armas, deve-se esclarecer que a realidade

    expe um quadro bastante divergente deste pensamento.

    De h muitos anos os pases mais desenvolvidos, em

    especial, vm utilizando-se dos pases de tributao favorecida como meio de reduzir os

    custos fiscais, tendo em vista serem os maiores possuidores de renda, capital e

    patrimnio, realidades tomadas universalmente como hipteses de incidncia tributria.

    Ao contrrio do que se pensa, os parasos fiscais so

    largamente utilizados por empresas e pessoas fsicas, tendo em vista os seus interesses

    particulares. Inmeras sedes de bancos, seguradoras, holdings, hotis, so situadas em

    pases com tributao favorecida, sem que haja qualquer violao a regras penais, cveis

    e administrativas relacionadas aos pases com os quais operam.

    Registre-se tambm que o termo paraso fiscal no

    condiciona, em hiptese alguma, a beleza geogrfica do Estado ou dependncia

  • reduzida carga fiscal. Impossvel desassociar por completo esta percepo, justamente

    por serem as ilhas caribenhas o maior retrato destas localidades e na maioria das quais

    formaram-se complexos hoteleiros de alto luxo. O termo liga-se, essencialmente,

    reduzida ou nula carga fiscal, aliada ou no beleza do local.

    Da mesma forma, existem Estados que para algumas

    atividades especficas, so considerados parasos fiscais, embora no geral afastem-se

    desta realidade. O caso dos Estados Unidos da Amrica e do Uruguai, para as atividades

    off-shore, alm da Holanda para as holdings internacionais reflete a retromencionada

    relatividade dos caracteres dos pases com tributao favorecida.

    Feitas estas digresses relacionadas noo de paraso

    fiscal, resta imprescindvel adentrar em uma anlise mais detida para fornecer subsdios

    plena compreenso do assunto.

    INTERNACIONALMENTE

    Os ordenamentos jurdicos estrangeiros no refletem um

    critrio uniforme para identificar um paraso fiscal. A Alemanha iniciou a delimitao

    dos contornos do paraso fiscal instituindo como critrio uma taxa de tributao inferior

    a 30%. J os Estados Unidos da Amrica, em sua legislao do imposto de renda, lista

    de forma no exaustiva as localidades identificadas como parasos fiscais.

    Destes breves exemplos anteriormente destacados pode-se

    concluir que a moldura na qual se encaixa o conceito de paraso fiscal de enorme

    relatividade, tendo em vista inexistir um conceito ou caracterstica universal para

    compreender esta realidade.

    No por esta razo, ligada falta de uniformidade no

    entendimento da matria, mas em decorrncia da seriedade do trabalho desenvolvido em

    conjunto pelos pases integrantes da OCDE Organizao de Cooperao e

    Desenvolvimento Econmico, toma-se como sntese da concepo internacional de

  • paraso fiscal o resultado de estudos realizados para identificar prticas tributrias

    nocivas no mbito internacional.1

    Do estudo realizado pelo Comit de Assuntos Fiscais da

    OECD pode-se perceber os seguintes critrios que caracterizam o manejo de prticas

    nocivas, relacionadas aos parasos fiscais: inexistncia ou taxas nominais de tributos;

    falta de transparncia; falta de efetiva troca de informaes; inexistncia de atividade

    substancial.2

    Denota-se de plano que os quatro pontos levantados pelo

    estudo da OCDE retratam plenamente os contornos inerentes aos parasos fiscais.

    Ocorre que, inobstante a tentativa de esgotar o conceito em questo, permanecem os

    questionamentos relacionados relatividade de cada um dos elementos de identificao.

    Mesmo com o questionamento da relatividade das

    caractersticas, deve-se louvar o esforo da OCDE em reduzir as prticas de guerra

    fiscal internacional, num sentido amplo, j obtendo a adeso e cooperao de inmeros

    Estados e dependncias.

    NO DIREITO BRASILEIRO

    No ordenamento jurdico nacional, o primeiro diploma

    legal que veio a tratar da matria foi a Lei Federal n 9.430 de 27 de dezembro de 1.996.

    A norma em questo trouxe regras at ento inexistentes, normatizando as noes

    preos de transferncia, pessoa vinculada, alm da previso dos caracteres dos pases

    com tributao favorecida, denominao legal dos parasos fiscais.

    1 Harmfull tax competition Estudo elaborado pelo Comit de Assuntos Fiscais da OECD em 1.998.2 The OECDs project on harmfull tax practices: The 2001 progress report - Relatrio do ano de 2001 sobre o progresso do projeto ligado prtica tributrias nocivas.

  • O caput do art. 24 3 da Lei mencionada anteriormente

    elege como critrio apto a verificar a existncia de um paraso fiscal, o seguinte dado

    objetivo: tributao da renda inexistente ou em alquota mxima igual ou inferior a vinte

    por cento. O pargrafo terceiro deste mesmo artigo, introduzido pela Lei Federal n

    10.451/2002, alude tambm necessidade de considerar separadamente para fins de

    atendimento a regra do caput, a tributao sobre capital e trabalho, assim como, as

    dependncias do pas de domiclio ou residncia.

    Ressalte-se tambm, que o art. 4 da Lei Federal n

    10.451/2002, conferiu o mesmo tratamento dado aos preos de transferncia, para as

    operaes realizadas com pases ou dependncias cuja legislao interna garanta sigilo

    composio societria de pessoas jurdicas. Esta alterao legal vem no mesmo sentido

    das atuais discusses travadas internacionalmente acerca dos parasos fiscais,

    combatendo-os no apenas pelo reduzido nvel de tributao.

    Encontra-se em vigor, no presente momento, a Instruo

    Normativa n 188/20024, onde o rol dos pases com tributao favorecida para o Estado

    brasileiro so listados tendo em vista os critrios da baixa tributao e sigilo societrio.

    3 Art. 24. As disposies relativas a preos, custos e taxas de juros, constantes dos arts. 18 a 22, aplicam-se, tambm, s operaes efetuadas por pessoa fsica ou jurdica residente ou domiciliada no Brasil, com qualquer pessoa fsica ou jurdica, ainda que no vinculada, residente ou domiciliada em pas que no tribute a renda ou que a tribute a alquota mxima inferior a vinte por cento. 1 Para efeito do disposto na parte final deste artigo, ser considerada a legislao tributria do referido pas, aplicvel s pessoas fsicas ou s pessoas jurdicas, conforme a natureza do ente com o qual houver sido praticada a operao. (...) 3 Para os fins do disposto neste artigo, considerar-se- separadamente a tributao do trabalho e do capital, bem como as dependncias do pas de residncia ou domiclio. (Includo pela Lei n 10.451, de 2002)

    4 Art. 1 Para todos os efeitos previstos nos dispositivos legais discriminados acima, consideram-se pases ou dependncias que no tributam a renda ou que a tributam alquota inferior a 20% ou, ainda, cuja legislao interna oponha sigilo relativo composio societria de pessoas jurdicas ou sua titularidade as seguintes jurisdies: I - Andorra; II - Anguilla; III - Antgua e Barbuda; IV - Antilhas Holandesas; V - Aruba; VI - Comunidade das Bahamas; VII - Bahrein; VIII - Barbados; IX - Belize; X - Ilhas Bermudas; XI -Campione DItalia; XII - Ilhas do Canal (Alderney, Guernsey, Jersey e Sark); XIII - Ilhas Cayman; XIV - Chipre; XV - Cingapura; XVI - Ilhas Cook; XVII - Repblica da Costa Rica; XVIII - Djibouti; XIX - Dominica; XX - Emirados rabes Unidos; XXI Gibraltar; XXII - Granada; XXIII - Hong Kong; XXIV - Lebuan; XXV - Lbano; XXVI - Libria; XXVII - Liechtenstein; XXVIII - Luxemburgo (no que respeita s sociedades holding regidas, na legislao luxemburguesa, pela Lei de 31 de julho de 1929) ; XXIX - Macau; XXX - Ilha da Madeira; XXXI - Maldivas; XXXII - Malta; XXXIII - Ilha de Man; XXXIV - Ilhas Marshall; XXXV - Ilhas Maurcio; XXXVI - Mnaco; XXXVII - Ilhas Montserrat; XXXVIII - Nauru; XXXIX - Ilha Niue; XL - Sultanato de Om; XLI - Panam; XLII - Federao de So Cristvo e Nevis; XLIII - Samoa Americana; XLIV - Samoa Ocidental; XLV - San Marino; XLVI - So Vicente e Granadinas; XLVII - Santa Lcia; XLVIII - Seychelles; XLIX - Tonga; L - Ilhas Turks e Caicos; LI - Vanuatu; LII - Ilhas Virgens Americanas; LIII - Ilhas Virgens Britnicas.

  • POSSIBILIDADE DE UTILIZAO DOS PARASOS FISCAIS COMO MEIO

    LCITO DE ELISO FISCAL

    A concepo que se tem de paraso fiscal e de

    planejamento tributrio parte, naturalmente, aos olhos de um desconhecedor da

    operacionalizao do fenmeno da incidncia tributria, de uma idia preconceituosa

    tendente a considerar estes termos estreitamente vinculados a condutas ilcitas.

    Inmeros so os exemplos, na seara do direito criminal,

    da utilizao de parasos fiscais para sonegao fiscal, lavagem de dinheiro e ocultao

    de valores oriundos de desvios na aplicao de recursos pblicos. Da mesma forma, se

    conhecem de prticas supostamente derivadas de planejamento tributrio, contudo, que

    se constituem em ilcitos duramente punidos pelas normas jurdicas.

    Fundamental, destacar a realidade dos conceitos

    envolvidos em um raciocnio para posteriormente emitir um juzo de valor. Viu-se no

    tpico precedente que as vantagens oferecidas pelos parasos fiscais, legalmente

    denominados pases com tributao favorecida, no so de uso proibido pela legislao

    brasileira. A lei traa os contornos para a sua caracterizao, estabelece instrumentos

    para a tributao na fonte de valores creditados a estabelecimentos situados em parasos

    fiscais, sem vedar, em nenhum instante, a sua utilizao.

    O mesmo ocorre com o planejamento tributrio. No

    ordenamento jurdico brasileiro no existem obstculos busca pela via legal de

    economia de tributos. O contribuinte no pode ser obrigado a seguir pela alternativa de

    tributao mais onerosa, cabendo uma avaliao da legalidade da opo menos custosa,

    antes da ocorrncia do fato gerador do tributo. Precisamente dentro desta realidade

    situa-se a noo de eliso fiscal, delimitada por Jos Eduardo Soares de Melo, nos

    seguintes termos: Neste ponto que transparece a noo de eliso, significando

    procedimento legtimo e objetivando subtrao incidncia tributria.5

    5 ANAN JUNIOR, Pedro (coord.). Planejamento fiscal aspectos tericos e prticos. So Paulo: Quartier Latin, 2.005, p. 181.

  • O fenmeno da incidncia tributria exige para sua

    realizao, a observncia de inmeras normas destacando-se, dentre estas, o princpio da

    legalidade mais especificamente no que tange tipicidade. O nus da tributao parte

    sempre da previso normativa, atravs de instrumento prprio, qual seja, a lei no sentido

    material e formal. Consoante a ordem constitucional brasileira, a obrigao tributria

    deve guardar total respeito aos termos estabelecidos em lei.

    Tendo em vista as consideraes pretritas, a inocorrncia

    de qualquer das hipteses estabelecidas em lei, e no proibidas tambm por tal regra,

    podem ser praticadas. O limite da legalidade oferece oportunidades para a opo entre

    as alternativas situadas dentro ou fora do campo de incidncia normativo.

    As idias de eliso e evaso fiscal expressam a distino

    entre as condutas lcitas e ilcitas, respectivamente, praticadas no escopo de reduzir ou

    evitar a incidncia de norma tributria.6 A distino entre estas figuras reside

    precisamente na observncia ou no do texto legal para evitar ou postergar o pagamento

    de tributo. No caso da evaso fiscal, o contribuinte no respeita as determinaes legais

    e viola o texto normativo, o que no se d nos casos de eliso.

    A anlise do planejamento tributrio promove tambm

    uma diversidade de discusses quanto sua legitimidade. Questiona-se por exemplo, a

    violao ao princpio da capacidade contributiva, ao princpio da solidariedade, e ao

    princpio da isonomia para criticar o planejamento tributrio.

    No se pode olvidar da importncia dos princpios

    constitucionais acima descritos. Entretanto, nenhum deles tem o condo de

    impossibilitar a eliso fiscal. O contribuinte que pauta a sua conduta no campo da

    6 Registre-se que apesar da maioria de a doutrina entender evaso como conduta ilcita e eliso como conduta lcita, existem opinies abalizadas que criticam a terminologia adotada, como se verifica em extrato da obra de Hugo de Brito Machado, ora transcrita: Embora no exista uniformidade na doutrina,alguns preferem a palavra evaso para designar a forma ilcita de fugir ao tributo, e a palavra eliso para designar a fuga lcita de praticar essa mesma fuga. Na verdade, porm, tanto a palavra evaso como a palavra eliso, podem ser utilizadas em sentido amplo, como em sentido restrito. Em sentido amplo significam qualquer forma de fuga ao tributo, lcita ou ilcita, e em sentido restrito, significam a fuga ai dever jurdico de pagar o tributo e constituem, pois, comportamento ilcito. (MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributrio. So Paulo: Malheiros, 26 ed., 2.005. p. 143)

  • legalidade para reduzir o nus fiscal no pode ser obrigado, por qualquer interpretao

    que extrapole o seu limite, a imputar o pagamento de tributos.

    A administrao pblica buscou recentemente com a

    edio da Lei Complementar n 104/2001, introduzir uma norma geral anti-eliso,

    modificando a redao do artigo 116 do Cdigo Tributrio Nacional. Permaneceu em

    discusso a possibilidade do fisco utilizar a interpretao econmica no direito

    tributrio, prtica veementemente rechaada pelos estudiosos da matria7.

    Com base nas consideraes realizadas, passa-se a

    verificar que os parasos fiscais podem vir a ser utilizados legitimamente pelos

    contribuintes. Inmeras pessoas fsicas e jurdicas sediadas em territrio nacional fazem

    uso deste mecanismo de planejamento tributrio sem sofrer de autuaes do fisco, em

    face da sua legalidade.

    No ordenamento jurdico ptrio o legislador no

    estabelece vedaes ao uso dos pases com tributao favorecida para reduzir o

    pagamento de tributos. Indiretamente existem alguns obstculos para a remessa de

    capitais ao exterior, como a tributao na fonte destes, aliados burocracia para o envio

    dos valores atravs do Banco Central do Brasil. Reitere-se, porm, que a liberdade

    concedida pelo legislador subsiste pelo seu silncio na restrio desta forma de

    planejamento tributrio.

    Os pases com tributao favorecida figuram na

    atualidade como instrumento de fundamental importncia para as sociedades atuantes

    no mercado internacional, facilitando os seus investimentos e controlando a carga

    tributria incidente sobre o seu patrimnio, renda e servios.

    7 Veja a posio de inmeros juristas em: ROCHA, Valdir de Oliveira (coord.). O planejamento tributrio e a lei complementar 104. So Paulo: Dialtica, 2003.

  • ASPECTOS NEGATIVOS DOS PARASOS FISCAIS

    Identificada a viabilidade da utilizao dos pases com

    tributao favorecida como instrumento de planejamento tributrio faz-se mister

    explicitar aspectos positivos e negativos do seu manejo.

    Os aspectos negativos so apreciados primeiramente no

    escopo de tornar evidente a realidade exaltada pelas caractersticas dos parasos fiscais.

    Mesmo sendo instrumento lcito de eliso fiscal, algumas de suas facetas so de certa

    forma, prejudiciais realidade econmica e jurdica internacional.

    Como bem se sabe, uma das maiores razes parla

    utilizao dos parasos fiscais reside na obteno de completo sigilo bancrio e fiscal.

    Os ordenamentos jurdicos dos pases ou dependncias considerados de tributao

    favorecida, na sua grande maioria estabelecem vedaes troca de informaes relativa

    movimentao de recursos nos seus territrios.

    A garantia de segredo da pessoa do depositante em

    instituies financeiras, bem como a possibilidade de criao de empresas emissoras de

    ttulos ao portador, serve como meio de encobrir patrimnio ou movimentaes

    financeiras. Seja qual for a finalidade do sigilo, a sua garantia absoluta pode gerar

    inmeras dificuldades ao rastreamento de recursos oriundos de fontes ilcitas.

    Uma das bandeiras defendidas pela OCDE nos seus

    ltimos relatrios refere-se justamente cooperao dos parasos fiscais no que tange

    relativizao dos sigilos bancrios e fiscais. Os resultados vm se apresentando

    favorveis nos ltimos anos, sendo identificados como no cooperativos s resolues

    da OCDE apenas as seguintes jurisdies: Andorra, Libria, Principado de

    Liechtenstein, Repblica das Ilhas Marshall e o Principado de Mnaco.

    Tais constataes bem externam, que com o passar dos

    anos, a conscincia dos governos administradores das jurisdies com tributao

    reduzida esto tendentes a conciliar a concesso de reduzido nus fiscal com o papel

    ativo na coibio de condutas ilcitas.

  • Outro aspecto essencial para diagnosticar negativamente

    os parasos fiscais refere-se estreita relao destes com as prticas de evaso fiscal.

    Mesmo que o utente deste instrumento de planejamento tributrio no esteja cometendo

    uma ao criminosa, viola o ordenamento jurdico da jurisdio qual se vincula, pelo

    desrespeito regras previstas para regular a incidncia tributria.

    O planejamento tributrio, ou seja, a eliso fiscal, deixa

    de existir no momento em que o contribuinte, direta ou indiretamente, desrespeita os

    comandos normativos balizadores das regras tributrias. Os parasos fiscais so

    excelentes veculos para os contribuintes com este objetivo em mente, haja vista a

    garantia de sigilo fiscal e bancrio aliado a inmeros outros fatores como a vasta rede

    bancria, facilidade na criao de empresas (off shelf) e desburocratizao da

    administrao tributria.

    Todavia, no se pode se questionar a legitimidade do uso

    de parasos fiscais com base neste nico aspecto. Independentemente de existirem ou

    no estas jurisdies, os contribuintes, em certa escala, continuaro a desrespeitar as

    normas tributrias internamente. O interesse de reduzir o nus fiscal no deixa, nem

    deixaria de existir, se no houvesse os parasos fiscais, sendo este argumento

    isoladamente incapaz de refutar o seu manejo.

    No se pode deixar de atentar para uma realidade

    indiscutvel. Os parasos fiscais tendem a funcionar como um osis para negcios

    ilcitos. As garantias das jurisdies favorecem a lavagem de dinheiro derivado das

    formas mais escusas, como prostituio, trfico de drogas e trfico de armas, dentre

    outras.

    A maior parte dos parasos fiscais, em algum momento,

    teve em seu territrio a passagem de numerrio derivado de atividades criminosas. O

    principal aspecto que leva busca destas localidades se deve ao fato de haver uma

    maior garantia ao sigilo da origem e destino dos montantes envolvidos em transaes. A

    reduzida carga fiscal tem o seu valor, porm situa-se em um plano secundrio,

    agregando-se ao principal benefcio gerado aos criminosos.

  • Como se disse anteriormente, a garantia aos sigilos

    bancrio e fiscal vem sendo combatida. Como resultado disto, as jurisdies no

    cooperativas passaram a fornecer dados, antes absolutamente sigilosos, mediante a

    requisio oficial de autoridades judicirias, desde que comprovada a ilicitude da

    conduta investigada.

    Jurisdies como a Sua, conhecida pela rigidez no sigilo

    de informaes, vm contribuindo para investigaes em diversos pases, no caso de

    pedidos motivadamente fulcrados em investigao de atividades criminosas.

    Autoridades brasileiras, por exemplo, obtiveram dados de parasos fiscais em inmeras

    oportunidades, nos ltimos anos, o que expe o interesse em valorizar a transparncia

    nos negcios internacionais.

    Por fim, tratando dos aspetos negativos atinentes aos

    parasos fiscais resta lanar consideraes quanto guerra fiscal internacional

    ocasionada entre jurisdies.

    No constante af de fornecer condies mais favorveis

    para o aporte de capitais, benefcios fiscais so concedidos indistintamente, gerando

    uma disputa para incentivar os investidores utilizao de um ou outro paraso fiscal.

    Sem dvida que a concorrncia, mesmo que seja no

    mbito das condies de tributao, favorece ao destinatrio final da relao jurdica.

    Porm, uma disputa em propores extremas torna-se prejudicial no mbito global, na

    medida em que as naes mais desenvolvidas, ou mais demandantes de recursos

    pblicos, perdem condies de atender s suas funes.

    A fuga dos recursos para parasos fiscais, em elevado

    volume, funcionaria como um bice para o financiamento dos Estados dependentes de

    recursos derivados da tributao. A concorrncia deve existir, contudo, dentro de

    balizas aceitveis, para que no seja transfigurada em uma guerra fiscal internacional.

  • As consideraes realizadas neste tpico servem para

    demonstrar, num plano geral, que os parasos fiscais possuem uma certa dose de

    nocividade. Caractersticas prprias deste instrumento de eliso fiscal devem ser

    detidamente observadas para evitar leses aos pases que exercem o seu poder de

    tributar dentro do que se considera justo, adequado.

    ASPECTOS POSITIVOS DOS PARASOS FISCAIS

    Conhecidas as feies negativas dos parasos fiscais, uma

    exposio dos seus pontos positivos revela-se essencial para que possam ser conhecidas

    integralmente as suas utilidades.

    Inquestionvel a facilitao das transaes internacionais

    atravs dos parasos fiscais. A enormidade de instituies bancrias, aliada reduo na

    burocracia para a concluso de negcios internacionais, tornam estas jurisdies deveras

    interessantes.

    Tomando o Brasil como parmetro para a aferio do grau

    de burocracia na conduo de negcios entre naes, claramente se verifica a vantagem

    angariada pela intermediao em pases com tributao favorecida. No Brasil os

    mecanismos cambiais previstos em leis e em atos infralegais dificultam as

    transferncias de recursos internacionalmente.

    A burocracia na administrao pblica brasileira, por

    demais conhecida de todos, causa uma srie de transtornos ao investidor estrangeiro,

    que nem consegue compreender integralmente a sua razo de ser. Os entraves, a demora

    e os custos ocasionados pela burocracia tornam a realizao de negcios por meio de

    parasos fiscais, com regras mais cleres e menos burocrticas, mais interessante e

    prtica ao investidor.

    Ressalte-se tambm a reduo dos custos derivados da

    burocracia, no enfrentada nos pases com tributao favorecida, como, taxas,

    despachantes, estrutura de pessoal treinado para conhecer todas as regras concernentes

  • atividade, e potencialidade de punies por desrespeito s regras que conduzem a

    atividade da administrao pblica. Estas so algumas das principais decorrncias para a

    busca de locais onde a atividade econmica seja facilitada.

    No que os pases com tributao favorecida sejam

    completamente liberais no trato da administrao pblica.Entretanto, o custo e o tempo

    envolvido se reduzem significativamente na medida em que o tributo e sua cobrana

    deixam de ter o valor que possuem em jurisdies que tributam em montantes

    considerados normais.

    A busca do empresrio pela via menos onerosa inerente

    prpria essncia do negcio. Menor custo fator determinante para a obteno de

    maior lucro, o que figura constantemente na mente de quem exerce atividade

    econmica. A obteno desta meta por intermdio dos parasos fiscais inegvel, razo

    pela qual a sua importncia cresce a passos largos.

    Acrescentando argumentos para demonstrar o papel

    relevante dos parasos fiscais, deve-se tratar da provocao que a tributao baixa ou

    inexistente promove sobre os modelos econmicos pautados em elevada carga

    tributria.

    Os parasos fiscais foram uma re-anlise do atual modelo

    fiscal que beira o confisco. Estas jurisdies, mesmo com reduzida arrecadao,

    conseguem auferir recursos atravs das condies atrativas fornecidas aos investidores

    internacionais.

    O foco da arrecadao deixa de ser o patrimnio ou renda

    do contribuinte, voltando o Estado atrao de investimentos que, por via de

    conseqncia, geram crescimento econmico e melhores condies de vida aos

    habitantes de localidades subdesenvolvidas.

    As ilhas caribenhas so um exemplo concreto dessa

    realidade, havendo recebido vultosos investimentos em hotelaria, turismo e nas

  • atividades financeiras fomentando o natural crescimento econmico muitas vezes

    impossibilitado em outras localidades pelo elevado nus tributrio.

    Os pontos brevemente delineados so apenas alguns dos

    aspectos positivos dos parasos fiscais, que com a evoluo da tecnologia, globalizao

    no mercado econmico e dos negcios via Internet elevam a sua importncia estando

    distncia de um simples comando no computador.

    CONCLUSES

    Com base nas consideraes formuladas restou possvel

    visualizar a concepo nacional e global de pases com tributao favorecida. Da

    mesma forma, as suas feies positivas e negativas foram destacadas para identificar os

    principais argumentos pr e contra estes instrumentos de eliso fiscal.

    Mister salientar o ponto fulcral do trabalho desenvolvido,

    qual seja, a legitimidade de utilizao dos parasos fiscais para reduzir a carga tributria.

    A ordem jurdica brasileira vedaria negcios realizados com empresas sediadas em

    pases com tributao favorecida?

    Como visto, no existem proibies no ordenamento

    jurdico brasileiro ao planejamento tributrio utilizando-se de parasos fiscais. Sabe-se,

    contudo, que a partir da ltima dcada a administrao tributria aperfeioou-se

    corretamente para combater o uso abusivo ou ilcito destas localidades. Mas o combate

    para preservar a arrecadao no vai de encontro com o uso de pases com tributao

    favorecida para operaes lcitas e do conhecimento do fisco.

    A autonomia da vontade, como garantia da ordem

    jurdica, abre margem para a busca da via menos tributada, sendo esta escolha

    plenamente lcita e legtima por parte do contribuinte.

  • certo que se defende a desmistificao dos parasos

    fiscais como osis de prticas ilcitas, desde que tais condutas continuem a ser

    combatidas com veemncia, no escopo de garantir uma maior transparncia e

    credibilidade aos negcios realizados por este meio.

    BIBLIOGRAFIA

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