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    1/8SETEMBRO / 201274 REVISTA PROTEO

    SEGURANA TOXICOLGICA

    Medidas de engenharia, coletivas e individuais podem minimizar riscos

    Aprimorando a percepo

    A manipulao e o uso de agrotxicosesto entre os trabalhos rurais mais fre-quentes, no entanto, as orientaes quan-to escolha do produto e a dose a ser uti-lizada muitas vezes so obtidas de formaerrnea.

    A adoo de novas tecnologias no meiode produo rural e o aumento das mo-noculturas resultou em um elevado con-sumo de agrotxicos e tambm em um au-mento considervel do nmero de intoxi-caes de trabalhadores rurais, relaciona-do a problemas como baixa escolaridadee falta de conhecimento tcnico sobre osprodutos, resultando em no uso de Equi-pamentos de Proteo Individual. Pode-se considerar que os casos de intoxicaopor agrotxicos so um problema de or-dem socioeconmica e origem profissional.

    O Brasil ocupa um relevante papel naproduo de alimentos em nvel nacional

    Helton Csar Martins Montechesi - Engenheiro Agrnomopela UENP (Universidade Estadual do Norte do Paran)eEspecialista em Engenharia de Segurana do Trabalho pelaUTFPR (Universidade Tecnolgica Federal do Paran)[email protected]

    Edson LuisBasseto - Professor da UTFPR, Mestre emEngenharia, Engenheiro Eletricista e de Segurana [email protected]

    Helton Csar Martins Montechesi e Edson Luis Bassetto

    e internacional, o que exige uma severaadequao das normas gerais aceitas in-ternacionalmente e no emprego de tecno-logias de ponta e mo de obra qualificada.Atender legislao vigente acerca dosagrotxicos condio essencial para quea sociedade possa se beneficiar, com se-gurana toxicolgica, ambiental e agron-mica.

    LEGISLAOLEGISLAOLEGISLAOLEGISLAOLEGISLAOPor serem produtos potencialmente

    perigosos sade humana e ao ambien-te, os agrotxicos precisaram de uma le-gislao que disciplinasse sua produo,comrcio, transporte e uso.

    O Decreto n 24.114 de 12 de abril de1934 foi a primeira legislao sobre pro-dutos fitossanitrios promulgada no Bra-sil, inalterada at a dcada de 60. Somen-te em 1989, o pas comeou a cumprir efe-tivamente as exigncias internas e inter-nacionais com relao qualidade dosprodutos agrcolas com a promulgao daLei n 7.802, de 11 de julho de 1989, re-

    gulamentada pelo Decreto n 98.816, de

    11 de janeiro de 1990, e as alteraesintroduzidas pela Lei n 9.974, de 6 dejunho de 2000, regulamentada pelo De-creto n 4.074 de 4 de janeiro de 2002.

    Deve-se observar, alm das disposieslegais que regulamentam o uso de agro-txicos no pas, as Normas Regulamenta-doras, particularmente a NR 31, sobreSegurana e Sade no Trabalho na Agri-cultura, Pecuria, Silvicultura, ExploraoFlorestal e Aquicultura, e a NR 6, sobreEquipamentos de Proteo Individual;que sem dvida, so as NRs que mais im-plicam na atividade rural com aplicaode agrotxicos.

    RECEITURIORECEITURIORECEITURIORECEITURIORECEITURIOO principal objetivo do receiturio agro-

    nmico orientar o uso racional dosagrotxicos, sendo que o diagnstico pr-requisito essencial para a prescrioda receita. A recomendao para utilizaro agrotxico foi conferida pela sociedadeao engenheiro agrnomo e aos profissio-nais legalmente habilitados que por pre-

    suno legal detm os conhecimentosnecessrios para fazer a anlise e decidir

    HAMILTON

    HUMBERTOR

    AMOS

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    2/8SETEMBRO / 201276 REVISTA PROTEO

    SEGURANA TOXICOLGICA

    pela necessidade do produto.O contedo da receita agronmica est

    previsto no Decreto Federal n 4.074/2002, artigo 66. Embora possa ser consi-derado um avano por evidenciar a im-portncia da responsabilidade profissio-nal na indicao de agrotxicos, o recei-turio adquiriu um carter quase que ex-clusivamente de instrumento para vendasde agrotxicos, e no de orientao fitos-sanitria, como se pretendia quando foiinicialmente proposto. Alm disso, noprev qualquer especificao em relao

    capacitao do usurio, desconsideran-do as condies tcnicas para o uso doproduto receitado. Na forma em que se en-contra, ele permite a prescrio de qual-quer produto, inclusive os de alta periculo-sidade, para qualquer pessoa, concentran-do toda a responsabilidade no profissio-nal que emite a receita e no usurio, pelautilizao. Logicamente, h necessidadede se rediscutir a finalidade e a aplicaodesse instrumento.

    Durante a pulverizao, o risco de ex-

    posio do trabalhador bastante depen-dente da tecnologia de aplicao. O idealseria atingir, com a quantidade necess-ria, apenas os organismos que se desejacontrolar, mas no h tecnologia que per-mita tal preciso. Assim, se toma como

    alvo no os organismos que trazem danos,mais as reas, plantas ou animais ondeeles se encontram. Mesmo assim a efici-ncia das aplicaes ainda muito ruim,e a maior parte do produto no atinge oalvo, perdendo-se para o ambiente queno se deseja contaminar.

    A aplicao de agrotxicos uma cin-cia multidisciplinar, que se caracteriza porum considervel desperdcio de energiae de produto qumico, constituindo-se emsrio risco de acidente para o agricultor epara o meio ambiente.

    MERCADOMERCADOMERCADOMERCADOMERCADOAtualmente existem mais de 80 fabri-

    cantes de agrotxicos no Brasil. Aproxi-madamente 673 produtos esto no mer-cado (374 genricos e 299 especialida-des); 56% so moderadamente ou poucotxicos (classe III e IV, faixa azul e verde,respectivamente).

    Em 2009, foram comercializadas 725mil toneladas de produtos formulados. Asprincipais classes so os herbicidas com

    59%, seguido por inseticidas e acaricidascom 21%, fungicidas com 12% e outrasclasses com 8%. A cultura que mais utili-za agrotxicos a soja (48%), seguidapelo milho (11%), cana (8%), algodo(7%), hortifrutiflores (4,3%), caf (4%)

    e citros (3%). O Mato Grosso o estadolder em vendas (20%), seguido por SoPaulo (15%), Paran (14%), Rio Grandedo Sul (11%), Gois (10%) e Minas Ge-rais (9%). A venda deste insumo agrcolano Brasil, em 2009, foi de R$ 12,9 bilhes.Segundo dados do Sindag, o pas apareceem 2 lugar no ranking dos 10 principaispases consumidores, que representam70% do mercado mundial de agrotxicos.

    Quanto inovao e o desenvolvimen-to cientfico-tecnolgico, para que umnovo produto seja lanado no mercado sonecessrios aproximadamente 12 anos depesquisa. A evoluo da pesquisa e da ava-liao toxicolgica dos agrotxicos temlevado produo de novas molculascom toxicidade cada vez menor e alta efi-cincia em baixas doses, o que reduz apossibilidade de intoxicaes. Comparan-do-se os defensivos atuais com os utiliza-

    dos na dcada de 60, houve uma reduode cerca de 90% na dose; 160 vezes natoxicidade aguda, alm do surgimento denovos mecanismos de ao e menor im-pacto ambiental. Para que um defensivoseja utilizado pelo agricultor necessrioque seja registrado. Trata-se de um rigo-roso processo, envolvendo avaliao dosMinistrios da Agricultura, Pecuria e A-bastecimento (MAPA), Sade (Anvisa) eMeio Ambiente (Ibama).

    CARACTERSTICASCARACTERSTICASCARACTERSTICASCARACTERSTICASCARACTERSTICASDevido grande diversidade de produ-tos importante conhecer a classificaodos agrotxicos quanto sua ao e aogrupo qumico a que pertencem, sendotil tal conhecimento para o diagnstico

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    3/8SETEMBRO / 201278 REVISTA PROTEO

    SEGURANA TOXICOLGICA

    das intoxicaes e a instituio de trata-mento especfico. Os agrotxicos mais co-muns so divididos em inseticidas, fungi-cidas e herbicidas. So classificados tam-

    bm pelo seu poder txico, expresso emtermos do valor da Dose Letal (DL50) por

    via oral, representada por miligramas doproduto txico por quilo de peso vivo, ne-cessrios para matar 50% de animais-tes-tes. Por determinao legal todos os pro-dutos devem apresentar nos rtulos umafaixa colorida indicativa de sua classetoxicolgica. Observe as cores e doses le-tais em cada classe na Tabela 1, Classifi-cao toxicolgica e cor dos rtulos.

    A atividade de aplicao de agrotxicos

    no ambiente agrcola peculiar: diferen-temente de uma unidade de produo fa-bril, em que o ambiente de trabalho podeser influenciado por tcnicas de controlede ventilao, temperatura, umidade, ilu-minao, adequao arquitetnica, con-

    dies ergonmicas dos postos de traba-lho e outras medidas, no ambiente de pro-duo rural, geralmente as atividades detrabalho se do a cu aberto, o que no

    permite o controle total das interfernci-as climticas no ambiente de trabalho, li-mitando e dificultando a proposio demedidas de engenharia para o controle di-reto sobre o ambiente de trabalho.

    Alm disso, a aplicao de agrotxicosapresenta uma particularidade muito im-portante: provavelmente a nica ativi-dade produtiva em que a contaminaodo ambiente de trabalho intencional e,mais do que isso, o propsito da ativi-dade. Normalmente, as contaminaes de

    ambientes de trabalho so indesejveis edevem ser evitadas e controladas. Mascomo proceder quando a contaminao a finalidade da atividade? esta contra-dio que faz da utilizao dos agrotxicosuma atividade de alto risco e de difcil tra-

    tamento tcnico no que se refere aos as-pectos de segurana.

    Sob estas condies, as medidas indivi-duais de proteo, como as prticas detrabalho e o uso de EPIs, ganham parti-cular importncia, mesmo sendo de dif-cil aplicao e controle devido s carac-tersticas sociais, culturais e de relaese organizao do trabalho. Justamente pe-la dificuldade na aplicao dessas medidasindividuais, as medidas coletivas de con-trole no podem ser colocadas em segun-do plano ou ser desconsideradas, como

    vem ocorrendo na atividade agrcola.

    EXPOSIOEXPOSIOEXPOSIOEXPOSIOEXPOSIOPor meio da distribuio percentual dos

    agrotxicos registrados no Brasil, em fun-o da DL50 da formulao nas classestoxicolgicas, possvel observar que ogrupo que apresenta maior risco so os

    inseticidas, com maior percentagem nasclasses I e II. De um modo geral, quase ametade dos produtos esto inseridos naclasse III (47,3%). Estima-se que sejam15 milhes de pessoas expostas a agrot-xicos e que ocorram de 150 a 200 mil in-toxicaes agudas por ano.

    A exposio pode ser definida como osimples contato do produto com qualquerparte do organismo humano, sendo as viasde exposio mais comuns: ocular, respi-ratria, drmica e oral. A exposio dire-

    ta ocorre quando o produto entra em con-tato direto com a pele, olhos, boca ou na-riz dos trabalhadores. J a exposio in-direta ocorre quando as pessoas que noesto aplicando ou manuseando os agro-txicos entram em contato com plantas,

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    4/8SETEMBRO / 201280 REVISTA PROTEO

    SEGURANA TOXICOLGICAalimentos, roupas ou qualquer outro obje-to contaminado.

    De acordo com a NR 31, o empregadorrural ou equiparado deve proporcionarcapacitao sobre preveno de aciden-tes com produtos fitossanitrios a todosos trabalhadores expostos diretamente. Oprograma deve ter carga horria mnimade vinte horas, distribudas em no mxi-mo oito horas dirias, durante o expedien-te de trabalho, com contedo program-tico definido.

    EFEITOSEFEITOSEFEITOSEFEITOSEFEITOSA intoxicao por agrotxicos perce-

    bida por meio das circunstncias profis-sionais, do suicdio e das circunstnciasacidentais, respectivamente. O Ministrioda Sade calcula que, para cada notifica-o de intoxicao por agrotxico, h cer-ca de 50 casos no notificados. De acor-

    do com a OMS (Organizao Mundial deSade), somente um em cada seis aciden-tes so oficialmente registrados e 70% dasintoxicaes ocorrem em pases subde-senvolvidos, sendo que 70% das intoxi-caes agudas so causadas pelos inseti-cidas organofosforados.

    De todas as doenas profissionais noti-ficadas, o envenenamento por produtosqumicos, principalmente chumbo e pesti-cidas, representam 15% de acordo compesquisa realizada pela OPAS (Organiza-

    o Pan-Americana de Sade) em 12 pa-ses da Amrica Latina e Caribe. Os agro-txicos geralmente tm ao deletria so-bre a sade humana, provocando diver-sos agravos. As manifestaes podem nosurgir de imediato, apresentando geral-mente sintomas no especficos presen-tes em diversas patologias.

    Na intoxicao aguda, os sinais e sinto-mas so ntidos e objetivos, aparecendo

    algumas horas aps a exposio excessi-va, por curto perodo, a produtos extrema-mente ou altamente txicos, podendoocorrer de forma leve, moderada ou gra-

    ve, dependendo da quantidade absorvida.J a intoxicao crnica ocorre por expo-sio pequena ou moderada a produtostxicos ou a mltiplos produtos, em queo surgimento dos sinais e sintomas sotardios, aps meses ou anos, acarretandodanos irreversveis. Veja a Tabela 2, Prin-cipais sinais e sintomas agudos e crni-

    cos.

    FFFFFAAAAATORESTORESTORESTORESTORESA segurana no trabalho com agrot-

    xicos avaliada por meio da estimativado risco de intoxicao. Alguns fatoresque influenciam so: durao da exposi-o, intensidade do vento, atitude do tra-balhador, frequncia das exposies, me-

    didas de segurana de proteo e de higi-ene adotadas, alm da toxidade do agrot-xico. O risco definido principalmente emfuno de dois fatores: toxicidade e graude exposio ocupacional. O grau de ex-posio se d em funo de duas outras

    variveis quantitativas: a concentrao doagrotxico e o tempo de exposio. Sa-bendo-se que no possvel ao usurioalterar a toxicidade do produto, a nicamaneira concreta de reduzir o risco adiminuio da exposio. O controle de

    riscos no emprego de substncias qumi-cas procura trabalhar sobre esses doisfatores. Diminuindo a toxicidade ou a ex-posio, pode-se diminuir o risco. Elimi-nando um desses fatores, pode-se alcan-ar o seu controle total.

    H fatores presentes no ambiente detrabalho ou inerentes ao prprio indiv-duo exposto que podem influenciar na to-xicidade de um produto qumico. Entre

    os fatores biolgicos relacionados ao pr-prio indivduo podemos citar a idade, osexo, o peso, as caractersticas genticas,o estado de sade, de nutrio e as condi-es metablicas (esforo fsico). As defi-cincias nutricionais como as proticas,por exemplo, potencializam os efeitos t-xicos de vrios agrotxicos e a desidrata-o pode aumentar a susceptibilidade intoxicao por inibidores de colineste-rases.

    A formulao, concentrao, equipa-mentos de aplicao, mtodos de traba-lho, medidas de segurana, proteo ehigiene adotadas, condies ambientais ecomportamento da substncia no ambi-ente so alguns dos diversos fatores queinterferem na exposio potencial. H,portanto, condies que interferem naexposio que extrapolam a ao diretae, s vezes, fogem vontade e ao contro-

    le do aplicador (vento, tipo de terreno,dinmica do trabalho, etc.).

    Deve-se considerar ainda que a eficin-cia das aplicaes muito ruim e a maiorparte do produto no atinge o alvo, sen-do perdida para o ambiente. Raramente aeficincia de coleta do agrotxico ultra-passa 50%, ou seja, pelo menos metadedo agrotxico aplicado estar contami-nando o ambiente em que se encontra oaplicador no momento da aplicao, pro-piciando grande potencial de exposio.

    Assim, h fatores determinantes da ex-posio que nem sempre podem ser to-talmente controlados. Portanto, o con-trole da exposio deve ser prioritaria-mente exercido no ambiente em que o-corre o trabalho e no sobre o indivduoexposto.

    CONTROLECONTROLECONTROLECONTROLECONTROLENa aplicao das medidas de controle,

    trs nveis de interveno so propostospara minimizar as exposies: na fonte deemisso do contaminante (age diretamen-te no processo de produo e nas fontesde risco existentes no ambiente de traba-lho); na trajetria do agente entre a fontee o trabalhador (limitada pela natureza dotrabalho com agrotxicos, consiste no usode barreiras para eliminar o contato en-tre o agente e o indivduo); e no indivduosujeito ao risco (agem sobre o trabalha-dor exposto a um risco no totalmentecontrolado pelos outros dois nveis). Con-fira a Tabela 3, Mtodos de controle. Le-

    vando-se em considerao a priorizao

    das medidas coletivas sobre as indivi-

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    5/8SETEMBRO / 201282 REVISTA PROTEO

    SEGURANA TOXICOLGICA

    duais, as aes sobre esses trs nveis de

    interveno sugeridos devem dar-se, prin-cipalmente, sobre a fonte e a trajetriado contaminante. As medidas de contro-le individual devem ser consideradas,sempre na perspectiva de complementar,e no de substituir, as medidas coleti-

    vas.Diferentes sistemas de aplicao deter-

    minam diferentes condies de exposio. necessrio adotar medidas de engenha-ria cabveis ao ambiente de trabalho ru-ral, para tornar os sistemas de aplicao

    mais seguros. Equipamentos mais efici-entes esto sendo desenvolvidos por meiode pesquisas. Porm, por motivos de or-dem tcnica e econmica, so poucas asinovaes tecnolgicas que de fato soutilizadas pelos agricultores. Em razo da

    versatilidade e do baixo custo relativo, ospulverizadores costais manuais so osequipamentos mais utilizados pelos pe-quenos agricultores. Os pulverizadores debarras tratorizados tambm so muitoutilizados por pequenos e mdios agricul-tores.

    Adicionar itens de segurana aos equi-pamentos agrcolas acarreta em custosextras ao agricultor. Entretanto, o custoindividual e social dos acidentes no podeser menosprezado na tomada de decisosobre a obrigatoriedade de fabricao deequipamentos cada vez mais seguros.Gasta-se muito no desenvolvimento denovas molculas e na regulamentao eavaliao dos riscos toxicolgicos, masno se observa o mesmo interesse, empe-nho e rigor com relao s mquinas que

    iro aplic-las, que certamente tambm

    tm grande responsabilidade pelos pro-

    blemas de contaminao ambiental e deexposio de trabalhadores.

    PERCEPOPERCEPOPERCEPOPERCEPOPERCEPOO reconhecimento dos riscos potenci-

    ais sade por parte de quem manipulaagrotxico o ponto inicial que motiva aatitude de controle individual. A percep-o de risco no depende exclusivamentedo indivduo, ela faz parte do desenvolvi-mento social; o que limita o controle dosriscos em nvel individual. Importantes fa-

    tores de ordem cultural, social, econmi-ca e psicolgica influenciam a percepodos indivduos aos riscos a que esto sub-metidos em suas rotinas de trabalho.

    O senso de imunidade subjetiva, ou aminimizao da probabilidade de que algonegativo (o acidente) possa ocorrer noambiente de trabalho, seria uma das es-tratgias que os trabalhadores desenvol-

    vem a fim de fazer frente ao problema domedo no trabalho sob condies de riscoe com alta incerteza. Outros mecanismospoderiam ser identificados configurandouma espcie de ideologia ocupacionaldefensiva, a qual buscaria na negao doperigo, embora conhecido, a possibilida-de de continuar realizando o trabalho, semdesencadear uma ruptura das defesas ps-quicas construdas socialmente para su-perar este medo.

    H tambm o caso em que, impossibili-tado de alterar a situao de convvio comos agrotxicos, o trabalhador desenvolveum sistema de negao ou desprezo so-bre a existncia do risco, inclusive agra-

    vando sua exposio, como forma indire-

    ta de demonstrar certo domnio sobre asituao. Em uma viso parcial e simplista, comum responsabilizar o indivduo fren-te ao controle dos riscos, especialmentetendo como causa dos problemas, a faltade informao por parte do usurio. Talentendimento, no raro, leva proposi-o de medidas de interveno que se re-sumem capacitao individual e ao trei-namento para as tarefas, sem questionaro contedo do trabalho e as condies desegurana oferecidas nos ambientes. As-sim, a anlise da percepo de risco dostrabalhadores constitui ferramenta fun-damental para os que pretendem cons-truir uma atividade educativa realmentetransformadora junto a esse pblico.

    EPIsEPIsEPIsEPIsEPIsO trabalhador estar exposto a uma

    grande diversidade de substncias ao lon-

    go de toda a sua vida laborativa relaciona-da ao uso de agrotxicos. Como conside-rar o dimensionamento do grau de prote-o necessrio a ser oferecido pelos EPIs?Estes devem defender o trabalhador daexposio aos produtos, servindo paraproteger as principais rotas de entradadessas substncias no organismo, evitan-do a contaminao e as consequentes in-toxicaes.

    Sem dvida, o uso de materiais imper-meveis, como borrachas naturais ou sin-

    tticas e polmeros diversos, tem aumen-tado o grau de proteo para trabalhado-res expostos a substncias qumicas peri-gosas.

    Nas atividades de trabalho com agrot-xicos, a indicao das indumentrias deveser feita de acordo com cada ambiente esituao de trabalho, representando umfator complementar em um plano de aopreventivo de acidentes e doenas rela-cionados exposio aos agrotxicos den-tro de um programa de SST. Confira naTabela 4, Relao entre operao, EPI eexposio. A recomendao genrica deEPIs sem informao quanto determi-nao da necessidade, ocasio e formacorreta de emprego, pode resultar em no-

    vos riscos, desconforto e falsa sensaode segurana, provocando o descrditoquanto real necessidade desses equipa-mentos e gerando ainda maiores dificul-dades para atividades de orientao.

    CAPCAPCAPCAPCAPACITACITACITACITACITAOAOAOAOAOA preparao de aplicadores habilitados

    para a utilizao de agrotxicos indepen-

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    6/8REVISTA PROTEO 83SETEMBRO / 2012

    de da sua vinculao aplicao de pro-dutos mais perigosos ou de uso restrito.Mas, neste caso, esses profissionais noteriam atribuio especfica e suas respon-sabilidades seriam exatamente as mesmasque as de qualquer outro usurio de agro-txicos, apesar de estarem mais capaci-tados. Assim, nem se criaria uma reservade mercado para estimular a formaodesse profissional. Nem o intuito de con-trolar a ampla disseminao e o uso indis-criminado dos produtos mais txicos se-ria atingido.

    A existncia de aplicadores capacitadospara o trabalho com agrotxicos muitoimportante. Afinal, contar com pessoaspreparadas para lidar com esses produ-tos fundamental e o treinamento de apli-cadores essencial. No entanto, a habilita-o vai alm da capacitao, porque im-plica profissionalizao, com a respectiva

    necessidade de investimentos na organi-zao de programas de formao, habilita-o, reciclagem, fiscalizao e controleprofissional e de toda uma estrutura paraesse fim. Por isso, a vinculao com a res-trio de uso dos agrotxicos de maiorrisco o que melhor justifica a necessi-dade de um aplicador certificado como oprofissional habilitado.

    O caso de Palmital/SPEstudo revela falhas que comprometem sade dos trabalhadores

    Com sua economia agrcola baseada naproduo mecanizada de gros e no setorsucroalcooleiro, Palmital/SP tem como pe-culiaridade a concentrao de pequenosprodutores que ocupam rea de 49,9 dos54,9 mil hectares do municpio. Neste es-tudo de caso foi aplicada aleatoriamenteentrevista direcionada a 30 agricultoresdo municpio e scios da Coopermota (Co-operativa dos Cafeicultores da Mdia So-rocabana de Cndido Mota), que possuicerca de 1.800 cooperados, sendo 70%pequenos produtores e 30% mdios egrandes produtores rurais.

    Os dados foram obtidos por meio dequestionrio com 40 perguntas simples e

    objetivas, com respostas diretas e de f-cil entendimento. Foram analisados as-pectos como: escolaridade, faixa etria,tempo de profisso e principalmente as-pectos relacionados ao comportamentodo trabalho com agrotxicos. A pesquisade campo foi realizada no perodo de 28de agosto a 10 de outubro de 2011.

    Todos os entrevistados so do sexo

    masculino, sendo que nove agricultorestm mais de 60 anos de idade. De acordocom o item 31.8.3 da NR 31, vedada amanipulao de quaisquer agrotxicos,adjuvantes e produtos afins por menoresde 18 anos, maiores de 60 anos e por ges-tantes. A maioria dos entrevistados pos-sui ensino fundamental completo e ape-nas trs possuem ensino superior. Dezpossuem propriedades com tamanho en-tre 10 e 30 hectares, confirmando a pre-dominncia de pequenos produtores ru-rais no municpio. Apenas quatro agricul-tores praticam a monocultura da cana-de-acar, sendo que os demais cultivamduas ou mais lavouras. Milho o produto

    mais cultivado. Todos os entrevistadospraticam a agricultura h pelo menos umadcada, sendo que 19 entrevistados inici-aram a prtica antes de completar 18 anosde idade, e alguns nasceram e viveram nomeio agrcola.

    DADOSDADOSDADOSDADOSDADOSDos 30 entrevistados, 11 possuem mais

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    7/8SETEMBRO / 201284 REVISTA PROTEO

    SEGURANA TOXICOLGICA

    de um equipamento de pulverizao. Ape-nas um possui somente o pulverizadorcostal e outro no possui sequer um pul-

    verizador prprio. Quanto realizao de

    manuteno peridica nos equipamentosde pulverizao, 24 (40%) realizam, en-quanto seis (20%) no realizam.

    Quanto orientao para realizar a apli-cao dos agrotxicos, 22 agricultoresseguem as orientaes de um profissio-nal habilitado e oito no seguem nenhu-ma orientao. Entre os entrevistados, 23pessoas (76,76%) realizam planejamen-to antes de iniciarem as atividades de apli-cao de agrotxicos, enquanto que setepessoas (23,33%) no realizam nenhum

    planejamento. Referente participaoem algum curso ou treinamento sobre usocorreto de EPI, 21 j participaram en-quanto nove nunca participaram. No casode curso ou treinamento para operao emanuteno de pulverizadores, 18 dizem

    j terem participado, enquanto 12 nuncaparticiparam.

    Os Equipamentos de Proteo Indivi-dual so utilizados por 18 pessoas e noso utilizados por 12 pessoas. Para 26pessoas (87%) o uso desconfortvel,sendo que apenas quatro pessoas (13%)acham o seu uso confortvel. Nos questio-nrios, 23 (77%) dizem saber utilizar osEPIs e 7 (23%) afirmam que no sabemutiliz-los. Sendo que 27 indivduos (90%)consideram o uso realmente necessrio esua aquisio relativamente fcil, sendoseu custo-benefcio bom. Contudo, trsindivduos (10%) consideram o uso desne-cessrio e a aquisio no muito fcil (peladificuldade de encontrar tamanhos maio-res). Na entrevista, 18 trabalhadores(60%) usam sempre o mesmo EPI para

    todas as atividades com o uso de agrotxi-

    cos, enquanto 12 (40%) utilizam o EPI deacordo com a atividade especfica de apli-cao.

    A limpeza e a descontaminao do EPIso realizadas por 19 indivduos (63%) eno realizadas por 11 (37%). Vrios agri-cultores alegaram no usar o EPI por tra-balharem em tratores equipados com cabi-nes e sistema de ar condicionado, ou empulverizadores automotrizes dotados des-se sistema. No entanto, deve-se observarque a qualquer momento que este trabalha-dor tenha que sair da cabine ir deparar-secom o ambiente contaminado. Portanto,seria conveniente estar usando o EPI.

    Dez trabalhadores admitiram j ter so-frido algum acidente de trabalho comagrotxicos, seja com o produto qumicopropriamente dito ou com os equipamen-tos utilizados na aplicao. Cinco (16,67%)afirmaram que no se sentem preparados

    e seguros para realizar a atividade de apli-cao de agrotxicos.

    EXPOSTOSEXPOSTOSEXPOSTOSEXPOSTOSEXPOSTOSTodos os entrevistados dizem estar ci-

    entes sobre os riscos causados sade eao meio ambiente que os agrotxicos po-dem proporcionar. Pelo menos 19 pesso-as (63%) dizem tomar banho, trocar deroupa e providenciar a lavagem da vesti-menta contaminada logo aps a operaoe 11 pessoas (37%) afirmam que no fa-

    zem este procedimento de imediato (ape-nas no final do dia de trabalho).Observou-se que 26 entrevistados (87%)

    usam somente a dose do produto reco-mendada e quatro (13%) no seguem asrecomendaes descritas. Alm disso, 24agricultores (80%) seguem as orientaesde profissional habilitado para realizar amistura dos produtos e respeitam o pra-zo de reentrada na rea tratada e o pero-do de carncia, enquanto que seis pesso-as (20%) realizam a mistura de produtospor conta prpria e no respeitam o pra-

    zo de reentrada bem como o perodo decarncia. Quanto ao odor dos produtos,24 (80%) consideram muito incmodo,enquanto seis (20%) dizem no sentir in-cmodo. Dez pessoas (33%) relataramque sentem ou j sentiram algum tipo demal-estar durante ou aps as aplicaese 20 pessoas (67%) afirmaram nunca tersentido nada; sendo que somente trsagricultores (10%) admitiram ter se in-toxicado pelo menos uma vez. Apenas umagricultor procurou assistncia mdica.

    Mais da metade dos agricultores (16)relatam reaplicar as sobras dos produtosgeralmente nas bordaduras das reas queesto sendo tratadas e uma parcela de 12agricultores afirma que no h sobras,sendo que a quantidade preparada sem-pre exata. Contudo dois agricultores, demaneira errada, deixam a calda que so-bra no pulverizador para aproveit-la na

    prxima aplicao. Trs agricultores (10%)no fazem a leitura do receiturio agro-nmico, da bula e do rtulo da embalagemdo agrotxico antes de iniciar a aplicao,sendo que 27 agricultores (90%) realizam.Eles afirmam, de modo geral, que o moti-

    vo da leitura para maior conhecimentoe orientao a respeito do produto, da do-se, das recomendaes do fabricante e douso correto. Esta mesma porcentagem deentrevistados diz saber o significado dascores das embalagens (faixas) e dos picto-

    gramas nelas existentes.Verificou-se que 28 agricultores (93%)fazem uso somente de produtos registra-dos no Ministrio da Agricultura, Pecu-ria e Abastecimento e de uso permitidono Estado; comercializado por empresasidneas, com emisso de nota fiscal e re-ceiturio agronmico. Porm, 11 agricul-tores (37%) afirmam j ter feito uso deprodutos de procedncia desconhecida ouduvidosa, sem a emisso de nota fiscal edo receiturio agronmico.

    CONSIDERAESCONSIDERAESCONSIDERAESCONSIDERAESCONSIDERAESO simples fornecimento dos EPIs no

    garante a proteo da sade do trabalha-dor e nem evita as contaminaes. Incor-retamente utilizados, os EPIs podem com-prometer ainda mais a Segurana do Tra-balhador. O desenvolvimento da percep-o do risco aliado a um conjunto de in-formaes e regras bsicas de seguranaso as ferramentas mais importantes paraevitar a exposio e assegurar o sucessodas medidas individuais de proteo

    sade do trabalhador.

  • 7/29/2019 Artigo Aprimorando a percepo.pdf

    8/8REVISTA PROTEO 85

    O uso correto dos EPIs um tema queexige constante atualizao dos profissi-onais que atuam na rea de cincias agr-rias atravs de treinamentos e do acessoa informaes atualizadas, proporcionan-do a adoo de medidas cada vez mais e-conmicas e eficazes para proteger a sa-de dos trabalhadores, alm de evitar pro-

    blemas trabalhistas. O profissional de SSTtem papel fundamental nestas aes. De-

    ve desenvolver, elaborar e executar pro-jetos e programas que visem a reduo,eliminao ou controle dos agentes qumi-cos presentes no meio ambiente e nos lo-cais de trabalho, prevenindo os acidentes. de fundamental importncia que o en-genheiro de Segurana do Trabalho e oengenheiro agrnomo atuem conjunta-mente para a elaborao de planos deao eficazes a fim de evitar os problemas

    com os agrotxicos.O receiturio agronmico deveria serreconsiderado, deixando de ser apenasum instrumento de comercializao deprodutos agrotxicos. A emisso dessedocumento deveria ser feita apenas a tra-balhadores rurais capacitados a realizaras aplicaes, e as vendas de balco po-deriam ser banidas. Conforme estabeleceo cdigo de tica profissional, o agrnomoao receitar o agrotxico deveria analisaro local de aplicao e as condies do e-quipamento e, principalmente, ter certe-za acerca da capacitao do trabalhadorrural para o desenvolvimento da ativida-de. No entanto, percebe-se que infeliz-mente muitas empresas privadas ofere-cem assistncia tcnica com carter maiscomercial do que educativo. Deste modo,os profissionais abrem mo da tica emtroca da estabilidade de emprego.

    APONTAPONTAPONTAPONTAPONTAMENTOSAMENTOSAMENTOSAMENTOSAMENTOSSo necessrias aes governamentais

    e das entidades de classe dos profissio-

    nais para reverter esta situao. Atenden-

    do de forma criteriosa legislao vigen-te acerca dos agrotxicos para que real-mente todos possam se beneficiar, comsegurana toxicolgica e ambiental.

    De acordo com as informaes cedidaspela Coopermota, os agricultores maisantigos apresentam relutncia ao uso denovas tecnologias, porm o departamen-to tcnico desempenha um importante

    papel na sua orientao. Em Palmital, ha peculiaridade de a maioria dos trabalha-dores rurais serem pequenos ou mdiosagricultores, trabalhando geralmente so-zinhos ou em famlia. Por isso necess-ria uma ao de conscientizao para a-tender a NR 31 para sua prpria seguran-a e sade.

    Por fim, sugere-se trs pontos conve-nientes e estratgicos na tentativa de seconseguir melhores resultados na recep-o dos agricultores ao entendimento do

    tema. O primeiro consiste na mobilizaodo Sindicado Patronal Rural, Sindicatodos Trabalhadores Rurais, Secretaria deDefesa Agropecuria do municpio, esco-la de cursos tcnicos (Etec Professor M-rio Antnio Verza curso de Agroneg-cios), Coopermota e demais empresas dosetor agrcola para desenvolvimento deum estudo mais aprofundado do tema, eem seguida criar uma estratgia de divul-gao, conscientizao e orientao na co-munidade rural. O segundo ponto pro-mover um extensionismo rural, divulgan-do conceitos de preveno de acidentese controle de riscos no trabalho com agro-txicos, abordando questes de seguran-a do trabalho rural. E, finalmente, o ter-ceiro aprimorar os cursos e treinamen-tos, para que no enfoquem apenas o usocorreto e seguro dos EPIs e dos agrotxi-cos, mas que desenvolvam a percepode risco dos agricultores.