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ZELMA ALZARETH ALMEIDA Revolta da vacina: Os Excluídos da “Belle Époque” no Rio de Janeiro de 1904. O presente artigo analisa a questão dos excluídos da Belle Époque que ao revoltar-se contra o governo da primeira República apresenta-se como componente Histórico determinante. A priori faz análise dos diversos fatores que levaram os participantes da Revolta da Vacina a fazer oposição ao governo republicano de forma tão violenta. A Revolta ocorrida entre 10 a 16 de novembro de 1904, com inúmeras manifestações por toda a cidade do Rio de Janeiro contra a lei da obrigatoriedade da vacina em protesto contra as medidas arbitrárias que o governo impôs a população. Esses protestos tiveram a participação de militares insatisfeitos com o comando da primeira República, Monarquistas, Intelectuais e Líderes Operários que deram total apoio a população que se rebelou contra o governo republicano e sua administração. Fazendo uma nova análise Histórica sobre as relações de poder do governo da primeira Republica em relação á população. Este artigo tem como tema central as causas que levou a população a rebelar-se contra o Governo da nova republica e sua forma de governar, assim como o descaso que tratava as camadas pobres. A maneira excludente que o governo republicano traçava seus projetos de reurbanização e saneamento na capital fez com que a população reagisse de forma violenta em busca de ter os seus direitos civis ZELMA ALZARETH ALMEIDA É GRADUADA EM HISTÓRIA .

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movimentos sociais no rio de janeiro séc.XX-XXI

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ZELMA ALZARETH ALMEIDA

Revolta da vacina: Os Excluídos da “Belle Époque” no Rio de Janeiro de 1904.

O presente artigo analisa a questão dos excluídos da Belle Époque que ao revoltar-se

contra o governo da primeira República apresenta-se como componente Histórico

determinante. A priori faz análise dos diversos fatores que levaram os participantes da

Revolta da Vacina a fazer oposição ao governo republicano de forma tão violenta. A

Revolta ocorrida entre 10 a 16 de novembro de 1904, com inúmeras manifestações por

toda a cidade do Rio de Janeiro contra a lei da obrigatoriedade da vacina em protesto

contra as medidas arbitrárias que o governo impôs a população. Esses protestos tiveram

a participação de militares insatisfeitos com o comando da primeira República,

Monarquistas, Intelectuais e Líderes Operários que deram total apoio a população que

se rebelou contra o governo republicano e sua administração. Fazendo uma nova análise

Histórica sobre as relações de poder do governo da primeira Republica em relação á

população.

Este artigo tem como tema central as causas que levou a população a rebelar-se contra

o Governo da nova republica e sua forma de governar, assim como o descaso que

tratava as camadas pobres. A maneira excludente que o governo republicano traçava

seus projetos de reurbanização e saneamento na capital fez com que a população

reagisse de forma violenta em busca de ter os seus direitos civis resguardados dando

inicio á revolta da vacina ocorrida em Novembro de 1904. Neste período, a População

do Rio de Janeiro teve um crescimento muito grande desde que veio a tornar-se capital;

havia pessoas de diferentes crenças e culturas que viviam as constantes mudanças da

cidade, estando elas insatisfeitas com o autoritarismo do governo republicano que vinha

cometendo uma série de ações abusivas com o projeto de reurbanização do Rio de

Janeiro priorizando apenas a elite, buscando afastar a camada pobre das ruas do centro

da cidade. A Capital viria a ser uma versão da “Belle Époque” européia, com toda

pompa e luxo para o deleite dos burgueses que ansiavam pelo progresso da cidade, o

afastamento da camada pobre das ruas do centro da cidade seria necessária para os

grandes negócios e o lazer sofisticado. A população assistia a tudo sem fazer nenhuma

oposição. Entretanto, a partir do momento em que tornaram obrigatória a vacinação sem

nenhuma orientação prévia de como seria a vacina, as pessoas começam a especular que

a vacina seria uma manobra do governo para o extermínio da população pobre, hipótese

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levantada pelos negros que eram excluídos da sociedade e que era a maioria pertencente

das classes pobres. Somou-se a falta de informação em relação á vacina, desrespeito

para com a tradição familiar, a arbitrariamente do governo juntamente com os excessos

para que a vacina fosse aplicada o estopim para que desencadeasse a revolta popular

contra a vacina obrigatória, formando-se grupos de opositores a Republica como

militares descontentes com o governo e alguns intelectuais, incentivando as “classes

excluídas” a revoltar-se contra o governo republicano.

A Sublevação iniciada por alguns líderes operários existentes naquela época, fez com

que o povo fosse às ruas a queimar bondinhos, quebrar lojas, destruindo o patrimônio

público dando inicio a uma verdadeira guerra civil. A Polícia, Marinha, e Exército foi às

ruas para conter os manifestantes, tendo como saldo muitos mortos e centenas de

feridos, os que foram presos eram muitas das vezes deportados para o Acre, onde mais

tarde viriam a morrer de varíola pelas condições subumanas em que viviam. Depois de

uma semana decretado estado de sítio na cidade a polícia conseguiu conter os

manifestantes com as prisões e mortes dos principais agitadores. Em 16 de novembro a

lei da obrigatoriedade da vacina foi revogada, decretado o estado de sitio na cidade a

polícia aproveitou a oportunidade para limpar toda a cidade prendendo as pessoas

indiscriminadamente pelas ruas, bastava estar malvestido, não ter trabalho, ou

residência fixa para ser presos e deportados. Em dois de setembro de 1905, foram

anistiados todos os participantes da revolta, os cadetes retornaram as fileiras militares, já

os deportados para o acre esses cumpriram a missão de desaparecerem como desejava a

elite Republicana.

Aos poucos o cotidiano do Rio de Janeiro foi retomando sem a imposição do governo

com a obrigatoriedade da vacinação, a vida recomeçava aos poucos, com todo o centro

da cidade remodelado para a camada rica da cidade, e os populares se refugiando em

habitações improvisadas nos morros do centro da cidade e no subúrbio carioca, a tão

conhecida exclusão social havia mais uma vez saído vitoriosa como nos é pertinente até

os dias atuais.

– Os autores trabalhados neste artigo são: Nicolau Sevcenko, José Murilo de Carvalho,

e Sidney Chalhoub. Nicolau Sevcenko aborda de uma maneira singular a questão

política da exclusão da camada popular das reformas feitas na cidade, e de como o

governo da primeira República desejava manter a parcela pobre da cidade afastada do

grande centro, que ele iria transformar na Belle Epoque Carioca, aos moldes europeus,

com seus cafés elegantes, seus prédios suntuosos e os lindos jardins, remodelando a

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paisagem do centro da cidade para o lazer da burguesia, onde nada disso combinaria

com a população pobre que vivia nos cortiços e ganhavam seu sustento pelas ruas da

cidade. Em seu livro Sevcenko relata como os populares assistiam atônitos aos mandos

e desmandos do governo da primeira república, em um dos capítulos de seu livro que

relata sobre a Revolta da Vacina Sevcenko faz seguinte análise:

A ação do governo não se fez somente contra seus alojamentos, suas roupas, seus pertences, sua família suas relações vicinais, seu cotidiano, seus hábitos, seus animais, suas formas de subsistência e de sobrevivência sua cultura. Tudo, enfim, é atingido pela nova disciplina espacial, física, social, ética e cultural imposta pelo governo reformador. Gesto oficial, autoritário, que se fazia, ao abrigo das leis, de edição que bloqueava qualquer direito ou garantia das pessoas atingidas. Gesto brutal, disciplinador, e discriminador, que separava claramente o espaço do privilégio e as fronteiras da exclusão e da opressão.1

O Autor faz uma abordagem marxista dando ênfase á reação popular contra as abusivas

formas de impor o poder do governo republicano. A Revolta da vacina se constituiu em

uma das principais demonstrações de resistência dos grupos populares do país contra a

opressão, discriminação e o tratamento excludente a que eram submetidos pela

administração pública nessa fase da história.

O Segundo autor que faço referência é José Murilo de Carvalho nos remete a questão

dos problemas políticos econômicos e sociais, que ocorreram na transição do império

para a primeira república. O autor da ênfase a intenção dos participantes da revolta em

que ela começou em nome da defesa dos direitos civis, e despertou o interesse geral,

obtendo o apoio de militares insatisfeitos que buscavam derrubar o governo,

empregados de emprego público acertando contas com as companhias, os produtores

mal pagos também fizeram o mesmo com as fábricas e todos os cidadãos acertaram suas

contas com o governo. Eram os mais diversificados grupos que agiam em oposição ao

governo Republicano com as suas insatisfações variadas, para José Murilo de Carvalho

foi “’á revolta fragmentada de uma sociedade fragmentada”, procurando explicar os

motivos que teriam levado aos protestos Carvalho faz a seguinte análise em seu livro:

Havia setores sociais interesses e insatisfações variadas que teriam se articulado de forma complexa e contraditória nos eventos que conduziam à revolta, a divisão social tinha resultado na alienação quase que completa da população em relação ao sistema político que não lhe abria espaços; mas havia certo tipo de pacto informal de que a população assistiria a tudo sem se manifestar desde que o estado não interferisse na vida do cotidiano dessas pessoas. Quando a população se vê invadida dentro desses limites ela reage

1 SEVCENKO, Nicolau. Revolta da Vacina: Mentes Insanas em Corpos Rebeldes. S.P: Cosac Naif, 2010(pág.82).

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de forma violenta, por conta própria. Foi à única revolta que teve êxito baseado nos direitos dos cidadãos de não serem tratados arbitrariamente pelo governo.2

Outro autor que busquei referências sobre a revolta foi Sidney Chalhoub ele apresenta

um debate sobre o que ele denomina “Ideologia da Higiene”, abordando o mundo pouco

conhecido dos cortiços e dos populares. Segundo Chalhoub, os governantes da capital

desejavam por um fim nessas habitações que se concentravam no centro da cidade, e

que esses moradores eram vistos pela sociedade fluminense como malfeitores,

carregadores de vícios e perigosos para a sociedade, motivo pelo qual deviam manter-se

afastados das ruas do centro da capital do Rio de Janeiro local onde a burguesia iria

desfrutar de ares europeus desejados pela elite carioca, com a realização do projeto de

reurbanização da cidade. Chalhoub retrata diversificadas questões da época fala sobre a

febre amarela, a vacina antivariólica, sobre a cultura africana no Brasil e suas mais

variadas resistências á escravidão relacionando cada um desses tópicos com a exclusão

social na cidade do Rio de Janeiro que nos é pertinente até hoje.

Em sua obra Chalhoub toma como ponto de partida a cidade do Rio de Janeiro

relatando à resistência da população negra em solidificar a cultura africana no Brasil, e

das suas formas de resistência a escravidão e lutas contra a exclusão social vivida depois

de 1888 quando ocorreu à abolição da escravatura.

Sidney Chalhoub relata que a falta de confiança nos médicos e o apego á religião

africana também foram fatores preponderantes para a resistência a vacina. O autor faz

um apanhado de fatores em que viviam os participantes da revolta em seu contexto

político e social.

as causas que levaram a camada excluída da população a se revoltar-se com as políticas

da nova República, mostrando o quanto a revolta da vacina foi um dos episódios mais

significativos do contexto da época, onde vários grupos da sociedade estavam em total

discordância com este governo e estando dispostos a não mais aceitar o autoritarismo

dessa elite republicana, traçando um comparativo ao momento atual onde também

existem vários grupos que estão em total desacordo com o governo do estado do Rio de

Janeiro do séc.XXI, em uma sociedade que também passa por profundas mudanças. As

manifestações populares que tem atualmente ganhado destaque nas capas de jornais e

revistas e páginas de redes sociais, relativo ás recentes manifestações acontecidas no

2 CARVALHO, José Murilo de. Os Bestializados: O Rio de Janeiro e a República que não Foi. São Paulo: Companhia das Letras,1987.

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Rio de Janeiro contra o governo de Sérgio Cabral nos faz analisar sobre a exclusão

social e o que se tem feito de novo para que possamos incluir cada vez mais a população

pobre, e fazer questionamentos sobre o que podemos realizar para que os programas

sociais do governo que mais excluem do que incluem possam fazer realmente algum

resultado a médio e longo prazo para que toda a população sinta-se incluída e

participante das melhorias de um Rio de Janeiro cada vez melhor. Como o presente

artigo mostra as revoltas populares não é algo recente na história do Rio de Janeiro, e é

recorrente a busca do entendimento do bloco que dividem as várias classes sociais da

nossa cidade maravilhosa.

Em um ambiente de inúmeros conflitos e valores desrespeitados, a adoção da vacina

obrigatória contra a varíola foi o estopim para desencadear a Revolta Urbana em que o

Rio de Janeiro foi cenário, algo que acontece novamente com as inúmeras obras

inacabadas na cidade, arbitrariedades cometidas pela policia pacificadora, escândalos de

desvios de dinheiro público entre outros revoltam cada dia mais a população.

Atualmente o projeto do Porto Maravilha, implantação das UPPS, dentre outros;

buscam a ordem pública e a reorganização do espaço urbano no Rio de Janeiro e

também é alvo de muitas críticas, onde inúmeros projetos e licitações destas obras são

considerados também arbitrários e superfaturados desencadeando a revolta de grande

parte da população. Assim como na primeira república os pobres, negros e os

”favelados3” fazem parte da população excluída da cidade alvo de constantes programas

sociais desenvolvidos pelos representantes do governo da cidade, onde nada de concreto

e efetivo é feito por esta população marginalizada, discriminada que vive sempre na

busca por melhor organização do bloco social que divide as camadas da sociedade.

Como nos é recorrente a então exclusão social é vista até os dias atuais, onde poucos

possuem muito e a grande maioria da população permanece pobre, excluída e escondida

em suas moradias precárias nas comunidades da cidade ou da Baixada Fluminense.

BIBLIOGRAFIA:

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IN: O Brasil Republicano: O tempo do Liberalismo Excludente, da Proclamação da

3 Favelados: rotulação denominada para as pessoas que vivem nas comunidades no entorno da cidade do Rio de Janeiro.

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