Arteônica

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Waldemar Cordeiro Arteônica

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Waldemar Cordeiro

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  • WaldemarCordeiro

    Artenica

  • 2ApoioMAC, INPE, IMPA, UFPE, IBM

    Montagem da Exposio

    Clylton Galamba Fernandes

    Edio e Diagramao do Catlogo

    Luiz Velho

    Comisso Organizadora

    Nelson MascarenhasLuiz VelhoLilia Hess

    Agradecimentos

    Analvia Cordeiro, Gabriela Suzana Wilder,Celso Luiz de Faria, Jonas de Miranda Gomes,Luiz Vasconcelos

  • 3Homenagem aWaldemarCordeiro

    Este ano a Sibgrapi faz uma homenagem aWaldemar Cordeiro, pioneiro da arte porcomputador no Brasil, que faleceu em julho de1973.

    Cordeiro foi uma presena marcante nopanorama artstico internacional, tendorepresentado o pas nas primeiras exposies dearte por computador, entre elas a famosa Cyber-netic Serendipity realizada em 1968 em Londres.

    Com este evento pretendemos estimular adiscusso sobre a visualidade na computaogrfica. Esperamos que o trabalho de WaldemarCordeiro contribua para reavivar a memria dosseus contemporneos e inspirar as novas geraes.

    A Comisso

  • 4Texto elaborado especialmente para o evento doSibgrapi em homenagem a Waldemar Cordeiropor Giorgio Moscati, um dos seu principaiscolaboradores na pesquisa de arte por computador.Agosto / 1993

    Depoimento

  • 5Waldemar Cordeiro e oUso do Computador nas

    Artes

    Sobre uma Experincia Pioneira

    1 INTRODUOEm 1968 fui apresentado ao j renomado Artista Plstico

    Waldemar Cordeiro por Mario Schenberg, conhecidoCientista, Poltico e Crtico de Arte .

    Razo da apresentao - Cordeiro desejava investigar aspossibilidades do uso do Computador nas Artes; eu tinhauma boa experincia em computao e interessesmultidisciplinares.

    Desta apresentao nasceu uma frutfera colaboraoque resultou na produo de dois trabalhos pioneiros, quetiveram ampla repercusso nacional e internacional, e sohoje considerados os primeiros trabalhos de arte porcomputador realizados no Brasil e, de uma certa forma,precursores do que hoje constitui o amplo campo daComputaco Grfica e processamento de imagens.

    O passado de Cordeiro, um dos expoentes doMovimento Concretista e uma pessoa de grande cultura eliderana, parecia ideal para inovar na explorao desta novatecnologia no campo das Artes.

    Dos nossos primeiros contactos ficou logo claro que ointeresse de Cordeiro era extremamente srio e o intuito noera iniciar imediatamente o uso da nova tcnica como ummodismo, mas sim compreende-la em profundidade eexplorar suas verdadeiras possibilidades. Esta abordagemcorrespondia bem aos meus interesses, sempre vido emaprender e em aplicar meus conhecimentos em outras reas.

    Nossa colaborao durou cerca de dois anos, sendointerrompida devido a uma viagem que realizei para fazerpesquisas em Fsica na Inglaterra, de abril de 70 a maro de

    Giorgio MoscatiInstituto de FsicaUniversidade de So Paulo

  • 671. Aps meu retorno retomamos contacto e estvamosreiniciando atividades conjuntas quando a prematura mortede Cordeiro, aos 48 anos de idade, em junho de 1973,encerrou trgicamente nossa parceria.

    Neste trabalho pretendo relatar como foi estacolaborao que do meu ponto de vista foi muito rica egratificante.

    Abordarei os antecedentes dos atores (Cordeiro, Moscati,Computador), a fase de discusso e planejamento, arealizao dos trabalhos e sua repercusso. Finalmente, luzde resultados recentes, procurarei reanalizar Derivadas deuma Imgem, sob o aspecto da percepo visual.

    2 ANTECEDENTES dos ATORES

    2.1 WALDEMAR CORDEIROQuando fomos apresentados, em meados de 1968,

    Waldemar Cordeiro trazia uma enorme bagagem no campodas artes plasticas, sendo muito conhecido no meio artstico,no Pas e no Exterior, atravs de sua extensa, inovadora econtrovertida obra, tanto nas artes plasticas propriamenteditas, como em escritos tericos, manifestos e atitudes svezes irreverentes. No me sinto competente em comentaros antecedentes de Cordeiro, que esto amplamentedescritos no ensaio de Ana Maria M. Belluzzo no livroWALDEMAR CORDEIRO uma Aventura da Razo,publicado pelo Museo de Arte Contempornea da USP(MAC/USP), por ocasio da exposio retrospectiva de suaobra, realizada em agosto de 1986, no referido Museu, emsua homenagem.

    2.2 GIORGIO MOSCATITendo me formado em Fsica e Engenharia, iniciei

    minhas atividades docentes e de pesquisa na antigaFaculdade de Filosofia Cincias e Letras (FFCL) da USP em1958. Com o objetivo de seguir carreira acadmica inicieilogo meus estudos para obter o ttulo de doutor sob aorientao de Jos Goldemberg. Meu trabalho exigiaextensos clculos, o que, por uma feliz coincidncia, foimuito facilitado pela implantao na USP de seu primeirocomputador, um IBM modelo 1620, em meados de 1962.

    Assim, fui um dos primeiros usurios desta nova tecnologia,na fase de sua de implantao na USP.

    Para os jovens de hoje, que convivem com o computadora partir do 2 grau ou dos primeiros anos de faculdade (se noantes), deve parecer estranha minha iniciao. Ao saber quea USP iria comprar um computador me apressei em procuraraprender a linguagem Fortran, o que foi conseguido emalgumas aulas tericas onde o computador s aparecia emfotografias! Como o computador no chegava, tenteidesenvolver o programa que deveria resolver meusproblemas. Quando o computador finalmente chegoudescobri que meu primeiro programa no cabia em suamemria! Aps alguns cortes resolvi a contento meusproblemas, obtive o ttulo de doutor e, em fins de 1962,viajei para o exterior para realizar um ps doutorado naUniversidade de Illinois nos EUA.

    A Universidade de Illinois era (e ) um importante centroinovador em computao. Com minha iniciao na USPconsegu rapidamente passar a utilizar as facilidadesdisponveis, que eram as mais modernas da poca, naspesquisas que realizei no campo da Fsica Experimental.

    Em 1966 voltei USP com uma boa experincia emaplicaes cientficas dos computadores.

    Pouco tempo depois de meu retorno, o Depto. de FsicaNuclear da FFCL-USP instalava um computador IBM /360para ser acoplado ao novo acelerador Pelletron. Este novocomputador, moderno para a poca, era muito mais possantedo que o 1620.

    Foi nessa poca que conheci Waldemar Cordeiro.

    2.3 O COMPUTADOR

    2.3.1 ANTECESSORESOs Computadores Eletrnicos Digitais (CED) hoje

    existentes tiveram sua concepo estabelecida e realizadaem 1940. A primeira mquina construida ficou operacionalem sua parte eletrnica em 1943 (a leitora de cartes nochegou a ser operacionalizada), por obra de John V.Atanasoff, na Universidade de Iowa. Assim estamoscomemorando os 50 anos do primeiro ComputadorEletrnico Digital que possuia os elementos essenciais de

  • 7um Computador Moderno.Anteriormente a esta iniciativa, varios instrumentos

    foram desenvolvidos para auxiliar na realizao de calculos,desde os bacos que existem a mais de 3000 anos, passandopelas maquinas de Pascal, Leibnitz e Babbage, todos comoperao digital. No campo analgico citamos a rgua declculo e varios dispositivos mecnicos, eletromecnicos eeletrnicos desenvolvidos e utilizados at o presente.

    Algumas mquinas mecnicas foram construidas parausos especiais, por ex., nos primeiros anos deste sculo foiconstrida uma mquina capaz de jogar, com sucesso, aspates finais de de uma partida de xadrez - Rei e Torre contraRei (1911 - Leonardo Torres e Quevedo).

    Anteriormente a 1945 podemos dizer que apenas asmquinas de calcular mecnicas, as rguas de clculo ealgumas mquinas para contabilidade usando cartesPerfurados (Hollerith), se tornaram operacionais e de amplouso nos clculos. Outros dispositivos analgicos de variostipos tambm foram usados para controle de mquinasnesse perodo.

    A grande demanda de capacidade de clculos analticosdurante a 2a. Guerra Mundial (por ex. para a construo daBomba Atmica) criou grandes presses para odesenvolvimento de CED, entretanto no chegaram a serusados durante a referida Guerra, com exesso, talvez, doColossus, usado na Inglaterra para quebrar Criptogramas(segredos militares no permitem caracterizar com clareza oColossus). surpreendente notar que a construo damquina de Atnasoff foi interrompida pois o estudante deps graduao, Clifford Berry, participante ativo do projeto,foi chamado para servir nas foras armadas e Atanasoff noconseguiu convencer o agente recrutante que odesenvolvimento deste estranho objeto, o CED, poderia terimportantes usos militares!

    Logo aps a 2a. Guerra Mundial grandes esforos foramalocados para desenvolver os CED, inicialmente para uso nodesenvolvimento da Bomba de Hidrognio.

    Esses primeiros computadores usavam vlvulas,ocupavam enormes volumes, eram lentos, gastavam muitaenergia, ocupavam grande nmero de operadores e

    operavam apenas por algumas horas entre longos perodosde manuteno em que as vlvulas defeituosas eramsubstituidas. Inicialmente s eram usados para clculossrios (se secretos melhor ainda). Pouco depoiscomearam a ser tambm usados em clculos de caratercientfico e no secreto (as demandas cientficas foram umgrande propulsor inicial do desenvolvimento doscomputadores). Para se ter uma idia, um desses primeiroscomputadores, o MANIAC, projetado e construido a partirde 1948, no Laboratrio de Los lamos (USA), usava18000 vlvulas com um consumo de varias dezenas de kWde energia! e custou da ordem de um milho de dlares (dapoca, valendo hoje , talvez, uns 20 milhes de dlares). Noscomputadores a vlvula, uma vlvula desempenhava o papelde um transistor hoje. Mesmo assim era muito mais lento,com menos memria e menor capacidade de clculo do queuma calculadora de bolso que hoje custa poucas centenas dedlares! Hoje, um microprocessador 486 tem mais de ummilho de transistores e consome alguns watts (o crebrohumano em operao consome cerca de 20 watts).

    interessante notar que em 1956 o MANIAC foi usadopor Metropolis, Stein e Wells para jogar xadrez. Haviainteresse em investigar como um computador poderia serprogramado para tomar decises em situaes complexas.Pela reduzida memria optaram por um tabuleiro de 6X6casas, sacrificando os Bispos, o que o tornou conhecidocomo o Xadrez Anti Clerical!

    Entre 1950 e 1968, ano em que se iniciaram osacontecimentos objeto deste depoimento, os computadoresevoluiram enormemente, mas do ponto de vista do usuario, asituao de 1968 a hoje sofreu uma nova e fantsticaevoluo. Basta dizer que os micros pessoais s comearama aparecer na dcada de 80 (o microprocessador Intel 8086do primeiro PC da IBM foi lanado no mercado em junhode 1978). Em 1968 as memrias dos computadores erammuito limitada pelo custo, pois utilizavam ncleosmagnticos enrolados um a um! Os plotters eram raros e osmonitores (tipoVideo) ainda eram pouco usados (emmeados da decada de 60 era possvel conseguir nos grandescentros de computao, com uma solicitao especial, um

  • 8slide com um grfico, em preto e branco, obtidofotografando uma tela de um monitor. A entrada dos dadosera feita por meio de cartes perfurados, na base de cerca de80 bytes por carto, assim o conteudo de um comumdisquete de um Mbyte correspondia a cerca de 10.000cartes! isto , uma pilha de uns tres metros de altura! Asaida era em geral em impressora de linhas. Enfim, nossentamos muito modernos mas olhando, hoje, para trs, eratudo muito primitivo.

    Relatarei a seguir algumas caractersticas da computaona USP em 1968.

    2.3.2 A SITUAO EM 1968Em 1968 a Cadeira de Fsica Nuclear do Departamento

    de Fsica da Faculdade de Filosofia Cncias e Letras daUSP, tendo o Prof. Oscar Sala como Catedratico de FsicaNuclear, recebia um Computador IBM do tipo /360-44, paraser ligado em linha com o sistema de tomada de dados dasexperincias a serem realizadas no acelerador Pelletron, napoca ainda em construo. Esse computador, modernssimopara a poca, tinha entrada por cartes perfurados, umamemoria de 32 kbytes ( que poderia ser expandida, a um altocusto, at 256 kbytes) e tinha uma saida por impressora delinhas (imprimia mecanicamente uma linha de caracteres deuma vez). Este computador, alm de atender a demanda detomada de dados em tempo real, era usado tambm paracalculos cientficos em batch, isto , um pacote de cartescom o programa a ser executado era entregue num guichetde recepco e algumas horas, dias ou semanas depois,dependendo do tempo de execuo requerido (que podiavariar de alguns segundos a algumas dezenas de horas), serecebia os cartes de volta, junto com os resultadosimpressos (se ouvesse uma vrgula errada, era recomear oprocesso!). Por necessidade de trabalho, eu era um usuriodesse sistema.

    Nessa poca, outros departamentos da USP (Economia,Engenharia Eltrica, etc.) comeavam tambm a receberalguns computadores que complementavam o computadordo CCE-USP (Centro de Computao Eletrnica da USP).

    Fora da USP, no final da decada de 50, lembro ter

    visitado um computador recebido pelo Departamento deAguas do Estado que na poca estava sendo usado pelosaudoso Fsico Srgio Porto para fazer clculos de modelosde molculas. Em 1959 o Jockei Club de So Paulo recebiaum computador para os importantes clculos necessriospara determinar rapidamente quanto receberiam osganhadores das apostas! Quando o computador entrou emoperao, substituiu (segundo informaes recebidas napoca) o trabalho de 700 calculistas humanos que, com oauxilio de mquinas de calcular, faziam o referido servio.No Rio de Janeiro, o IBGE tambm recebeu um computadornessa poca, (incio da decada de 60 ) que, alm do uso pelainstituio, era tambm usado por pesquisadores do CBPFpara clculos cientficos.

    Em 1968 diversos computadores ja estavam implantadosno Brasil em diversas organizaes Pblicas e Privadas e oPas entrava na Era da Computao.

    No Exterior,em 1968 o computador deixava de ser deuso exclusivo para clculos de carater tcnico-cientfico eentrava para as aplicaes comerciais. Os primeiros usos docomputador nas Artes se iniciavam e algumas exposiesdesses trabalhos comearam a se realizar, comomanifestaes de vanguarda.

    Em fins de 1968 passei a ser o Diretor do Departamentode Fsica da FFCL-USP Era esta a situao quando conhecWaldemar Cordeiro e iniciamos nossa colaborao.

    3 DISCUSSES COM WALDEMAR CORDEIROAo ser apresentado a Waldemar Cordeiro, ele logo me

    colocou seu objetivo, USAR O COMPUTADOR PARAFAZER ARTE.

    Inicialmente fiquei relutante pois temia que Cordeirotivesse idias preconcebidas e quisesse apenas usar ocomputador como um novo conversor grfico que estavaentrando na moda. Rapidamente verifiquei que esta no erasua inteno. Desejava sim estudar as possibilidades destenovo instrumento em Artes e percebera que era necessrioconhec-lo em profundidade, o que s seria possvel atravsde discusses com quem tivesse familiaridade e amplosconhecimentos no campo da computao. Considerei

  • 9interessante enveredar por esse caminho.Decidimos iniciar por um perodo de mtuo

    conhecimento e troca de informaes o que foi feito a travsde contactos peridicos em que ora nos encontravamos emminha casa ora na dele (ou num restaurante!), oucombinvamos visitas a atividades artsticas, a exposicesou laboratrios. Nessas atividades participavamfreqentemente Iva, minha esposa e Helena, esposa deCordeiro. Nesse perodo trocvamos documentos, artigos elivros, para que cada um de ns, tomasse conhecimento docampo da especialidade do outro.

    Lembro-me bem das reaces de Cordeiro quando o leveipara visitar um laboratrio do Departamento de Fsica e suasurpresa ao ver como se podia manipular imagens na tela deum osciloscpio exitado por sinais eltricos harmnicos edeformando a imagem com ims que desviavam o feixe deeltrons. Introduz tambem Cordeiro a todo um mundo deimagens de origem tcnica e cientfica como capas derevistas (Science e outras), figuras de carater cientfico, egrficos de funes matemticas. Ouvimos tambmgravaes de msicas geradas por instrumentos eletrnicos(uma tcnica iniciada nos anos 30), ou compostas porcomputador. O uso do computador para gerar os sonsdiretamente estava em seus incios, a nvel de laboratrio(por ex. na Bell). interessante notar que na poca, algunsoperadores de computador haviam notado que ruidoseltricos gerados por um computador, mal blindado, emoperao, podiam ser captados por um rdio nasproximidades . Alguns operadores usavam este ruido paraacompanhar o processamento de um programa e algunschegaram mesmo a escrever programas que no calculavamnada de significativo mas ao serem captados tocavammsicas. O ritmo de uma saida de computador por mquinade escrever eltrica (uma saida usada em sistemas menores)tambm gerava efeitos sonoros com ritmos que podiam serexplorados.

    Passamos a discutir as possibilidades. DiscutimosTeleviso e as possibilidades de manipulao e gerao deimagens; msica, nos aspectos de composio, anlise,gerao de sons, sua modificao, filtragem e

    transformaes e o processo de audio; imagens, suagerao, transformaes, efeito das cores, teoria das cores,processo de viso etc; pensamos em textos e o uso docomputador para analisar textos, compor poesias a partir deregras e a possibilidade de associar os aspectos plsticos esonoros das palavras; objetos tridimensionais e suarepresentaco bidimensional e estrereoscpica; asassociaces de varias tcnicas para gerar ambientes queexitariam vrios de nossos sentidos e capacidades depercepo.

    A abordagem girava sempre no sentido de perceber aspossibilidades de cada tcnica para gerar novas formas deexpresso artstica, fugindo sempre do simples uso de umanova tcnica para substituir uma tcnica antiga sem renovara mensagem.

    Entre sonhos de coisas infactveis para a poca (masmuitas das quais so hoje corriqueiras), e outras, menosambiciosas, mas factveis, preparamos uma longo programapara explorar o que poderia ser realizado com os recursostcnicos disponveis.

    Nos fixamos inicialmente em dois projetros, um geradorde palavras ao acaso, com sonoridade da lngua portuguesa euma imagem a ser trabalhada e impressa em uma LinePrinter.

    O gerador de palavras foi realizado e chamado deBEAB.

    Quanto imagem pensamos em partir de uma imagemde carter figurativo e operar alguma transformao para serimpressa. Cordeiro insistiu muito em usar uma imagem comforte conteudo humano e emotivo para ser transformada poruma maquina fria e calculista. Quanto s transformaes,discutimos um sem nmero delas. Transformaesgeomtricas, simetrias, inverses, mudanas em contraste,em granularidade, deformaes (como imagens em espelhoscurvos), introduo de ruido aleatrio, perda de informao,mistura de imagens, sucesso de imagens etc. Nesta alturaeu me perguntei, do ponto de vista cientfico, qual atransformao mais usada. A resposta imediata foi aoperao de derivao. Em Fsica e Matemtica a derivadade uma funo uma nova funo com muita informao

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    sobre as propriedades da funo original. No processamentode sinais muito comum gerar um sinal que a derivada deoutro sinal. Pareceu logo uma boa idia e passamos realizao desse segundo trabalho. Cordeiro se incumbiu deescolher e digitalizar uma imagem, eu me incumb depreparar e rodar os programas. Aps alguns ajustes entramoscom a imagem original digitalizada, um poster promocionaldo Dia dos Namorados e o computador nos forneceu aimagem derivada. Decidimos reinjetar essa imagem nocomputador e deriva-la novamente obtendo a segundaderivada e repetimos mais uma vez o processo obtendo aderivada terceira.

    Como era de se esperar, o conteudo de informao daimagem derivada era semelhante ao da original, haviamosapenas transformado uma imagem com varios graus declaro/escuro em uma imagem de contornos. As derivadasseguintes, aos poucos perdiam a informao. Decidimos queo trabalho seria formado por quatro imagens, a originaldigitalizada e as tres derivadas. Denominamos este trabalhoDERIVADAS DE UMA IMAGEM. As quatro imagenseram -grau zero - o original; grau um - primeira derivada;grau dois - segunda derivada e grau tres - terceira derivada.

    Consideramos o resultado muito satisfatrio como umaprimeira experincia. No s a imagem era interessante,como envolvia um procedimento que poderia ser utilizadopara qualquer outra imagem do mesmo tipo. Entendemosque um aspecto importante do trabalho era o procedimento,e mais ainda, abria o caminho para outras transformaesmatemticas a serem identificadas.

    Apesar da possibilidade de reutilizar o programa paraoutras imagens, isto no ocorreu.

    Algum tempo depois, decidimos fazer um certo nmerode copias em Silk Screen das Derivadas (apenasoriginal digitalizado e primeira derivada).

    Abaixo descrevo com algum detalhe aspectos tcnicosdo BEAB e DERIVADAS.

    4 OS TRABALHOS

    4.1 BEABEste programa foi concebido como um primeiro passo

    para gerar palavras ao acaso. A forma mais simples degerar palavras ao acaso, seria sortear conjuntos de letrasde vrios comprimentos (por ex., conjuntos de cinco letras).Os conjuntos gerados teriam pouca semelhana compalavras de uma lngua, se bem que, por acaso algumas daspalavras geradas poderiam existir. Para gerar palavrascom sonoridade semelhante de uma determinada lngua,devemos descobrir algumas de suas regras caractersticas .No caso do portugus, definimos as seguintes regras paranossas primeiras tentativas:a) As palavras teriam seis (6) letras .b) As palavras alternariam vogais (v) e consoantes (c).c) As probabilidades da escolha dos conjuntos vc e cv

    deveriam refletir as probabilidades com que estesconjuntos aparecem na lngua portuguesa.Assim as palavras seriam do tipo cvcvcv ou vcvcvc.Para atribuir as probabilidades, deveriamos fazer um

    estudo detalhado das probabilidades com que, por ex., osvrios pares cv e vc (ou trades cvc e vcv) aparecem nalngua purtuguesa, particularmente nas palavras com seisletras. Por simplicidade, verificamos num dicionrioquantas linhas eram usadas para palavras que se iniciavamcom os pares ab, ac, ad ....az,....eb,ec,.....ub,uc,.....uz,ba,be,.....zu.

    De posse dessas probabilidades, sorteamos, usando umarotina de nmeros ao pseudo-acaso, sries de nmeros queforam usados para escolher trades de pares cv e vc.

    Os conjuntos mais comuns na lngua portuguesa, comoCA, BO, AL, ES etc., apareciam mais freqentemente doque os conjuntos raros como ZU, UX etc.

    Assim, algumas possveis palavras seriam por ex.CACETE, BOLADA, ACABAC etc. (no havia censurapara possveis palavres!).

    As palavras geradas tinham uma sonoridade claramentesemelhante sonoridade das palavras realmente existentesna lngua portuguesa. Uma frao das palavras geradasexistia realmente.

    Posterirmente foi atribuido um nmero que indicava se apalavra era formada por conjuntos de alta ou baixaprobabilidade de existir na lngua portuguesa. Se verificou

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    que se o nmero era grande (alta probabilidade), era de fatomais provvel que a palavra realmente existia.

    Foram realizadas algumas listagens de palavras e, porocasio da Exposio de 1986 no MAC/USP, foiprogramado um micocomputador para reproduzir oBEAB e os visitantes podiam levar uma folha pessoal,com palavras geradas pelo micro, que era diferente dequalquer outra.

    4.2 DERIVADAS DE UMA IMAGEMDepois de concebida a idia de trabalhar com a derivada

    de imagens, passamos sua realizao.Os vrios passos seriam: escolher uma imagem;

    digitaliza-la; preparar os cartes com os dados da imagemdigitalizada; escrever um programa para efetuar a operaoderivar; preparar os cartes com o programa; alimentar ocomputador com os cates de dados da imagemdigitalizada; alimentar o computador com os cartes doprograma; rodar o programa.

    Antes de iniciar a seqncia acima foram feitasexperincias para verificar qual seria o nmero convenientede pontos (linhas e colunas) em que seria dividida a imageme o numero de nveis de claro/escuro a ser utilizado. Foramimpressas vrias combinaes de caracteres e superposiode caracteres para se ter uma idia das possibilidades. Parater pontos bem escuros utilizamos um recurso disponvel desuperpor linhas, isto , instruir a impressora a imprimir duaslinhas sucessivas sem avanar o papel (como s vezesacontece quando tiramos um extrato no banco e o avano dopapel emperra!).

    Fixamos o nmero de pontos da imagem em 98 X 112(10.976 pontos) e o nmero de nveis em sete.

    Cordeiro escolheu a imagem, um poster promocionalpara o dia dos namorados e, com os dados acima passou aatribuir um nmero de zero a seis a cada um dos 10.976pontos da imagem, conforme o nvel de preto no ponto.

    Para a realizao do programa contei com a colaboraode um estudante de nome Wisnick e passamos a concebe-lo.Para realizar uma derivada numericamente, fizemos asdiferenas entre os nmeros que caracterizam pontos

    sucessivos (tomado sempre como positivo para nossoobjetivo). Assim, por ex., se numa linha temos a seguintesucesso de pontos, a linha derivada tem a estruturaindicada na segunda linha:

    original 000000666665553211111000000derivada 000000600001002110000100000.

    Se usarmos apenas este processo, uma quebra deintensidade ao longo de uma coluna aparecer distorcida.Foram tomadas providncias para que o programaidentificasse corretamente quebras de intensidade,independentemente da direo em que ocorriam.

    Aps perfurados os cartes, inclusive com os dados daimagem, o programa foi rodado gerando a imagem original esua imagem derivada. O resultado nos agradou e nos ocorreuque poderamos usar o mesmo programa para fazerderivadas sucessivas automaticamente. Realizamos at aterceira derivada e verificamos que quanto mais alto o nvelde derivao, mais irreconhecvel ficava a imagem, comoseria de se esperar. Por outro lado achamos que a perda dede definio era, em si, um resultado interessante.

    Decidimos assim que o trabalho seria constituido peloconjunto de quatro imagens: original (transcrio do poster)e as tres derivadas sucessivas.

    A imagem est um pouco distorcida, tendo sua alturaexagerada em relao largura mas decidimos mante-la semalteraes.

    Apesar de termos considerado a possibilidade de efetuara derivada de outras imagens e de aperfeioar osprocedimentos, Derivadas de uma imagem foi o nicotrabalho que realizamos com o programa.

    5 A DIVULGAO E REPERCUSSESPouco depois de termos terminado as Derivadas

    Cordeiro teve conhecimento de que o Servio deDivulgao e Relaes Culturais dos EUA estavaorganizando na Minigaleria da biblioteca do USIS, emSo Paulo, uma exposio chamada Computer Plotter Art(primeira mostra na America Latina) que reuniria 12trabalhos feitos com computador nos EUA, usando plotterCalComp (California Computer Inc.). No conheo os

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    detalhes dos contactos de Cordeiro com os organizadores daexposio, mas, finalmente, Derivadas foram expostas naMinigaleria (de 13 a 17 de maro de 1970) e a imprensa deuampla divulgao do fato, realando que artistas brasileirosestavam expondo junto com trabalhos feitos com a maisalta tecnologia.

    As discusses que ocorreram durante a exposio ealgumas divulgadas pela imprensa com relao questo seArte por Computador pode ser considerada realmenteArte foram muito interessantes. s vezes parecia que aspessoas esqueciam que instrumentos musicais clssicos,pinturas, pinceis telas etc. envolviam uma boa dose detecnologia, desenvolvidas durante sculos, sem falar naFotografia, no Cinema na Televiso e nos famosos e aindano reproduzidos Stradivarius.

    Parece que toda vez que uma nova tecnologia passa a serusada em arte, a primeira reao negar sua validade.Depois, aos poucos, vai se tornando tradicional e aceita!

    Ao discutir com Cordeiro o significado dessas reaesfiquei muito surpreso com relao aos processos da Crticade Arte. Para Cordeiro, mais escolado nesse campo, a reaono era inensperada.

    Nossos trabalhos foram exibidos em varias ExposiesInternacionais e receberam, em geral, crtica favorvel.

    Desejo citar tres referncias que indicam o quantoDerivadas atingiu os especialistas em Arte porComputador.

    A primeira se refere ao artigo Technology and art 15:Computer graphics at Brunel publicado na conceituadarevista STUDIO INTERNATIONAL - JOURNAL OFMODERN ART - Print Supplement june 1970 - Londonpelo respeitado crtico Jonathan Benthall. Neste artigo, aofazer a crtica da exibio montada pela Computer ArtSociety, para acompanhar o Computer GraphicsSymposium na Universidade Brunel, perto de Londres, emabril de 1970, Benthall, aps relembrar o potencial evidentena exposio Cybernetic Serendipity no Institute ofContemporary Arts (ICA) em Londres em 1968, se reveladesapontado com os trabalhos expostos e declara que, parailustrar o referido artigo, escolheu os quatro grficos de

    Derivadas, apesar de no terem sido expostas! (chegaramatrasadas). Adiante, aps descrever o trabalho, declara:

    ....O que me faz pensar que isto arte e no umartifcio (contrivance), a escolha evocativa da imagem.Quando vi pela primeira vez esta srie, por um momento,no detectei que a imagem esquerda mostra uma cabeamasculina e uma feminina e, ainda mais ambiguas, as duasfiguras de p direita. Cordeiro e Moscati ...... pareceminteressados na fronteira entre legibilidade eilegibilidade......A sequncia de Cordeiro e Moscati lembraimagens estticas de uma seqencia de um filmeexplorando, talvez, uma elusiva relao humana, sem anecessidade de atores..

    Dois anos depois (1972), no seu livro Science andTechnology in Art Today, Benthall volta a comentarDerivadas com destaque. Ao compara-las com trabalhosque usaram tecnologias muito mais sofisticadas, queconsiderou pura demonstrao de tcnica, declara:

    ....O trabalho de Cordeiro um comeo na direo detrazer de volta as emoes humanas ao mundo frio ecerebral do computador.

    Se voc comear olhando a imagem 4, sem ter visto asimagens de 1 a 3, ela quase ilegivel. Mesmo a imagem 1 obscura: as cabeas masculina e feminina, em primeiroplano esquerda, so facilmente lidas, mas h duas figurasem p direita que so vagas. H uma obvia ligao com aspinturas Whitley Bay de Richard Hamilton e com Blow-upde Antonioni, aos quais j me refer no captulo sobrefotografia. Seria absurdo considerar Derivadas de umaimagem como um profundo trabalho de arte; o que nele de extremo interesse a possibilidade que sugere de efetuarmodulaes semelhante em filmes..

    A segunda se refere ao livro Art et Ordinaterur(Casterman, Paris, 1971) do Prof. Abraham Moles, Diretordo Instituto de Psicologia Social da Universidade deStrsbourg, Frana. Este livro, escrito em linguagemacadmica, explora as relaes entre Arte, Tecnologia,Psicologia, Percepo e Informao. As imagens deDerivadas ilustram a abertura do captulo IV - Potica,Literatura e Informao.

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    A terceira se refere ao livro Computer Graphics -Computer Art traduco de Computergraphik-Computerkunst de Herbert W. Franke (Verlag, Munich1971). Neste livro feita uma descrio geral do estado daArte por Computador e da Computao Grfica da poca. feito um apanhado geral das vrias tcnicas usadas e soreproduzidos 100 trabalhos feitos com as mais variadastcnicas que caracterizam o Estado da Arte. Derivadasest entre os reproduzidos, como sendo um trabalho originale significativo e os autores esto citados entre os trintagrupos internacionais ativos no campo. O livro teve umasegunda edio em 1985 e, apesar de incluir novos trabalhosque evidenciam a trementa evoluo da tcnica, volta areproduzir nosso trabalho.

    Desde ento estes trabalhos foram exibidos em diversasExposies e Homenagens a Waldemar Cordeiro.

    Para a exposico em 1986 no MAC/USP, emHomenagem a Cordeiro, preparei uma verso para PC(microcomputador pessoal) do programa BEAB querodava continuamente, ligado a uma impressora, e permitiaaos visitantes receber uma listagem de palavras ao acasoque era sua, pessoal, pois cada um recebia uma versodiferente. Penso que esta oportunidade de visitar umaexposio de Arte e sair com um Original Pessoal de umaObra de Arte, diferente de qualquer outro existente,estava em sintonia com o estilo prprio de Cordeiro e de suamaneira de ver a Arte e que, se estivesse vivo, teriaaprovado com entusismo.

    6 REVISITANDO DERIVADASO sucesso de Derivadas, na poca, nos intrigou muito

    e nos perguntvamos se no haveria uma razo maisprofunda que pudesse justificar este sucesso.

    Em 1986, durante os preparativos da exposio noMAC/USP, fui convidado para um depoimento por AracyA. Amaral, Prof. Adjunto da FAU-USP e ento Diretora doMAC e por Ana Maria Belluzzo, tambm professora daFAU e Curadora da referida exposio. O objetivo eraesclarecer aspectos da relao Arte-Computador e de minhacolaborao com Cordeiro. Neste depoimento, na forma de

    entrevista, em que participaram Amaral, Belluzzo e RejaneL. Cintro (Div. Difuso Cultural, MAC/USP) e que foipublicado (Arte e Computao-cadernos MAC-2 - SoPaulo, julho de 1986), abordei a referida questo.Transcrevo abaixo (livremente), alguns trechos pertinentesda entrevista.

    ... Existe um problema que discutimos na poca e queainda no resolvi,...., a questo a seguinte: tanto a imagemem claro/escuro como a imagem por contornos so usadascomo forma de linguagem......se compararmos uma imagem,por ex. um rosto, representado por seu contorno com aimagem em claro/escuro do mesmo rosto, elas tm formasmuito diferentes. Ento, o que existe em nossa vista e nonosso crebro que faz com que se possa reconhecer umapessoa tanto na realidade e numa imagem tipo fotogrfica,em claro/escuro como numa linguagem em que s aparecemumas poucas linhas de contornos?......Do ponto de vistaevolutivo, as vantagens para a sobrevivncia provocaram odesenvolvimento da capacidade de reconhecer uma pessoacomo um parente, um amigo, um filho ou um inimigo, umapessoa que pode fazer bem ou mal, para decidir se deve seaproximar ou fugir.............reconhecer imagens da naturezatem um papel na alimentao, defesa ereproduo.............no sei quando, no processo evolutivo, sedesenvolveu a capacidade do crebro de atribuir significadoa essas imagens de contornos que so muito diferentes dasimagens que se encontram na natureza. Mas elas tmcertamente significado. Derivadas de uma Imagem umatransformao entre claro/escuro e contorno e, por algumarazo que eu no entendo, o contorno traz uma mensagemque tem uma relao muito grande com a mensagem doclaro/escuro. Penso, assim, que o fato desses dois tipos deimagem estarem relacionados pela operao de derivarconstitue um problema aberto cuja compreenso envolveestudos de evoluo biolgica, antropologia e percepo.

    Voltando ao problema biolgico-evolutivo da percepo,nota-se que a deteco do movimento muito importantepara a sobrevivncia. O que o movimento de uma figuraem relao ao fundo? Se uma figura est parada em relaoao fundo, no se sabe bem qual a separao entre as duas.

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    a nossa cabea que, pelo significado, separa uma da outra.Isto , o que a figura e o que o fundo, depende doobservador. Se eu estou olhando para voc, e considerar omovimento deste copo, voc o fundo para o movimento docopo, mas, se eu pensar no seu movimento, o sof l atrs, o fundo para para o seu movimento. Na naturezaobservamos que lagartixas e passarinhos tm movimentosbruscos, como mecanismo de defesa. Um movimento maislento e contnuo mais facilmentre perceptvel. Nomovimento brusco, se no est sendo sendo focalizado nomomento em que ocorre, no percebido. A nova imagemligeiramente modificada no revela o movimento pois jesquecemos os detalhes da anterior..........para efeito decamuflagem, tanques, navios e avies no so apenaspintados com as cores do fundo, mas procura-se simularuma textura semelhante textura do fundo......o movimentoda silhueta facilmente perceptvel.

    Recentemente, um artigo publicado na conhecida revistaScientific American (maio 1991, pg. 40), de autoria de M.A. Mahowald e C. Mead, me fez reanalizar Derivadas luz do progresso nos conhecimentos sobre os mecanismosda viso, e compreender melhor o seu significado,esclarecendo o problema acima citado.

    O artigo se intitula The Silicon Retina e descreve umchip (circuito integrado complexo montado em ummonocristal de silicio). Este chip est baseado na arquiteturaneuronal do olho e visa simular o funcionamento da retinareal. Esta retina artificial gera sinais que mimetizam ossinais gerados pela retina real.

    Segundo os autores, uma das caractersticas dos sinaisgerados por esta retina artificial consiste em que:

    .... Grandes areas uniformes (da imagem observada)produzem sinais visuais fracos pois os sinais de cadafotoreceptor so cancelados pelo sinal mdio espacial darede de celulas horizontais. Em compensao, bordasproduzem sinais intensos pois receptores dos dois lados daborda tm intensidades de luz que so significativamentediferentes do valor mdio local. .....

    .... Fotoreceptores geram sinais (provenientes) de umobjeto em movimento enquanto os sinais gerados pelas

    celulas horizontais, com os quais so comparados, estoainda emitindo os nveis anteriores de intensidade.Diferentemente de uma cmara (fotogrfica), que produzuma simples imagem instantnea de um objeto, a retina seconcentra em informar mudanas.

    Em outras palavras, as informaes importantes que aretina envia ao crebro se referem a mudanas espaciais outemporais no nivel de iluminao (ou cor) da imagem, o quecorrespode a uma derivada espacial (d/dx) ou temporal (d/dt) da intensidade da imagem. Zonas da imagem cujaintensidade no varia no espao ou no tempo no tm grandeinteresse e no enviam sinais para o crebro.

    O estudo da retina artificial no s traz perspectivas paraa construo de Robs com capacidade de viso, mastambm permite entender melhor o funcionamento doprocesso da viso natural.

    A relao entre a tranformao de derivao daimagem que realizada em Derivadas (que detecta asbordas da imagem) e o funcionamento da retina natural soevidentes.

    Assim, de acordo com o exposto, a transformao deuma imagem em claro/escuro numa imagem formada porcontornos, como feito em Derivadas, nada mais do queo processo que nossa retina executa naturalmente numaimagem, antes de envia-la ao crebro. Se a imagem j emcontornos, o crebro estar recebendo a segunda derivada daimagem, que ainda inteligvel (como se pode notar emDerivadas).

    Tendo em vista estes desenvolvimentos recentes nacompreenso dos processos da viso, se pode perceber oquanto Derivadas est relacionado com os mecanismosmais fundamentais deste processo.Penso que esta anliseajuda a explicar porque Derivadas, talvez penetrandodiretamente no inconciente do observador, tenha atraidotanta ateno.

    7 CONCLUSOEste trabalho precursor, realizado a cerca de 25 anos, em

    condies bastante primitivas, foi motivo de grandesatisfao para mim e, acredito, tambm para Cordeiro. A

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    oportunidade de ter conhecido, trabalhado e aprendido comCordeiro constituiram para mim uma experincia marcantee inesquecvel.

    Olhando retrospectivamente parece surpreendente queeste primeiro trabalho, que tinha inicialmente apenasobjetivos exploratrios, tendo em vista, posteriormente,desenvolver um programa mais extenso de Arte comComputador, tivesse tanto sucesso.

    Na poca, o computador era visto apenas como umproduto da tecnologia que tinha seus usurios restritos aomeio tecnolgico. Este trabalho, ligando humanismo comtecnologia nos pareceu uma contribuio para ajudar a criarum dilogo entre estas duas culturas distintas que secomunicam com tanta dificuldade e desconfiana mtua.

    Observando o grande progresso que a ComputaoGrfica teve nestes vinte e cinco anos, s posso lamentar amorte to prematura de Cordeiro. A cada inovao queaparece no mercado, imagino o quanto Cordeiro se deleitariaem utiliza-la.

    Espero com este depoimento ter contribuido para tornarmais conhecido para as novas geraes alguns aspectos dosprimrdios da computao grfica no Brasil. Apesar dasdificuldades da poca e das limitaes que devem parecerridculas comparadas com as facilidades de hoje, possogarantir que foi muito gratificante.

    8 BIBLIOGRAFIAInformaes relacionadas com este trabalho podem ser

    encontradas nas seguintes publicaes, que por sua vez,cotm ampla bibliografia.

    1 - Ana Maria Belluzzo, Aracy A. Amaral, PierrreRestagny e Decio Pignatari -WALDEMAR CORDEIROuma aventura da razo - MAC - Museu de ArteContempornea da Universidade de So Paulo - So Paulo,1986

    2 - Waldemar Cordeiro - ARTENICA - (reune dadosreferente Exposio Internacional Artenica realizada emmaro de 1971 na Fundao Armando Alvares Penteado eas teses recebidas para um simpsio que no se realizou) -Editora das Americas - Editora da Universidade de So

    Paulo - So Paulo 1972.3 - Herbert W. Frank - Computer Graphics - Computer

    Art - Phaidon Publishers - New York - 1971. - Tambm -Computergraphiik - Computerkunst 2nd Ed.- Springer -Verlag - Berlin, Heidelberg, New York, Tokio 1985 .

    4 - Abrham Moles - Art et Ordinateur - Casterman -Paris - 1971.

    5 - Jonathan Benthall - Technology and art 15: Computergraphics at Brunel - Studio International - Journal of ModernArt - Spring Supplement - june 1970 - London.

    6 - Jonathan Benthall - Science and Technology in ArtToday - Thames and Hudson London - 1972.

    7 - Misha A. Mahowald and Carver Mead - The SiliconRetina - Scientific American - May 1991 - pg. 40.

    8 -Allan R. Mackintosh - The first Electronic Computer -Physics Today - March 1987 - pg. 25.

    9 - Allan R. Mackintosh - Dr. Atanasoffs Computer -Scientific American - August 1988 - pg. 72.

    10 - Francis H. Harlow and N. Metropolis - Computing& Computers - Weapons Simulation Leads to the ComputerEra - Los Alamos Science - Winter/Spring 1983.

    11 - Herbert L. Anderson - Metropolis, Monte Carlo andthe MANIAC - Los Alamos Science - Fall 1986.

    12 - Brian Randell (ed.) - The Origins of DigitalElectronic Computers Selected Papers - Springer-Verlag -Berlin, Heidelberg, New York - 1973.

    13 - Aracy A. Amaral, Ana Maria Belluzzo, RejaneL.Cintro e Giorgio Moscati - Arte e Computao - umdepoimento de Giorgio Moscati - Cadernos MAC - 2 -Museu de Arte Contempornea da USP - julho 1986 - SoPaulo.

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    Crtica

    Textos de LArte et lordinateur, Casterman,1971 e da conferncia proferida na Universidadede Montreal, Canad, por Abraham Moles selecionados pelo autor numa homenagem pessoal obra de Waldemar Cordeiro.Setembro / 1973.

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    Abraham A. MolesCrtico e Ensaista

    Problemtica da arte porcomputador

    A Arte , antes de tudo, artifcio. o computador,ferramenta do artifcio, a chave da nica arte autntica:aquela que se emancipa do calor humano? As imagensapresentadas nesta sala fazem-nos pensar assim.

    Seria o artista esboo imperfeito de uma mquina decriar qual recorremos falta de melhor? E que papelrepresentar ele num Universo do artifcio total?

    Por que este frenesi humanista que deseja assimilar ohomem quilo que ele tem de mais animal em si, o calor docorao? Se podemos recriar a aparncia do mundo pelopoder da mente e do computador por que nos limitarmoss vagabundagens do instinto?

    A arte por computador resultado dos tempos: por queuma tica repressiva da arte limitando-a somente s mos doartista?

    E se a arte por computador, por ser nova, presta-se aotrfego e alienao, como diz Frieder Nake, isso no seno acidente de percurso, canal obrigatrio de uma dadasociedade. A serigrafia a primeira etapa do mltiplo, omltiplo a primeira etapa da dissoluo da obra naconscincia cultural, que por sua vez a primeira etapa deuma nova criao.

    A arte no uma cousa como a Vnus de Milo ou oEmpire State Building; uma relao que o homem mantmcom as cousas: relao ativa para o criador que as altera e asorganiza sua vontade, relao passiva do consumidor

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    fruidor de formas e de arranjos. Enriquecimento de vida,programao da sensualidade ou experincia desensualizao das formas, sempre o jogo de dominar seuambiente ou ser dominado por ele.

    E que brilhantes excitaes da vivacidade de nossossentidos nos propem os fsforos coloridos da tela luminosa,nova superfcie a ser pendurada, animada deste conjuntode manchas de cores segundo uma certa ordem de quefalava Maurice Denis, jogos e caleidoscpios da artepermutacional como primeiras etapas de uma construo deartifcios pela memorizao ilimitada.

    Sabemos que doravante a mquina suscetvel deabsorver, sem perdas, a totalidade dos estmulos estticos, demo-los em gros codificados de sensorialidade, e dedistribuirlos sem migalhas nos compartimentos de suamemria. Eis-nos em confronto com a verdadeira questo:pode-se destes fazer surgir uma nova obra?

    A arte uma sensualizao programada do ambiente:ambiente prximo, imediato e quase passivo do campovisual explorado pelo olho no movimento que custa topouco a ponto de poder ser prodigalizado. Ambiente dodesenvolvimento sonoro ou teatral, ambiente espacial que ohomem explora ou descobre em sua totalidade. Artes paraver, ouvir ou praticar, o artista o seu programador: eleque semi-determina micromovimentos dos olhos ou trajetospara perambulao urbana, jogos dos labirintos e dosjardins; ele os condiciona, fixando para si prprio comoregra do jogo a aquisio de prazer por parte daqueles que opraticam. O computador, com suas memrias, suas sub-rotinas e seus algoritmos, oferece ao artista o meio paraelaborar esta programao do jogo sensorial em uma escalaque os artistas do passado no poderiam jamais ter suposto exceo talvez dos maneiristas cujo rigor obstinado captoua vertigem do infinito do campo das permutaes.

    A arte da sociedade dos Sistemas repousar sobre as

    mquinas de complexidade a ser manipulada. Vemos criar-se um Neomaneirismo da Mquina, isto , um estilooperatrio no qual a maneira mais importante que a forma,pois uma forma no seno uma soluo dentre umgrande nmero de outras possveis da mesma maneira, decerto modo uma demonstrao de existncia. A maneira darealizao a verdadeira fonte de riqueza, de inveno e defora.

    Outrora programador intuitivo, daqui pr frente sadoes qualits das escolas de programao, substituindo umaintuio vaga e segura pela insero de uma taxa de aleatriomensurado e previamente experimentado, o artista ou aqueleque toma seu lugar, o criador de formas novas, podeprender-se a seu prprio jogo, encontrando em sua atividadeuma razo de ser suficiente para no preocupar-se com opblico. O produto do computador resolve este jogodialtico que se estabelece entre o artista como criador puroe o artista como fornecedor de patterns consumidossensualmente por um espectador externo ao de inovao.Como se inserir este jogo dialtico em uma sociedadebem programada? Esta a questo.

    A fascinao esta qualidade do relacionamento entre oser a forma que impe de modo duradouro essa mesmaforma ao trajeto do olhar. Inmeros so seus recursos: asimples fora da forma no seno um dentre eles, oemaranhamento, o duplo sentido, a simetria, a vertigempersptica, a integrao perceptiva, o choque da cor, a finuraimposta pelo detalhe, o domnio da complexidade estoentre os utenslios da fascinao, aqueles que o artistaexplora sua vontade e dos quais os inovadores da arteptica fizeram uma explorao sistemtica. A arte porcomputador dispe de novos recursos de fascinao: aperseguio de um longo desgnio resultante de variaesprecisas e inumerveis que o olhar integrar de um s golpe,encontrando a tendncia por sob o desvio, a regra sob aexceo, a ordem distante sob a desordem prxima; ela uma destas novas possibilidades que resultam diretamenteda preciso do detalhe dentro do gigantismo do propsito,

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    levadas pela mquina a inventariar os algoritmos oriundosdeste novo possvel, e a calcular as foras de fascinao queesses algoritmos dela extraem.

    A obra de Waldemar Cordeiro prefigura a evoluo dasimagens artificiais ou naturais, criando todas as etapasintermedirias, esquemas fabricados automaticamente combase numa fotografia ou reciprocamente. assim que porum processo de manipulao dos pontos de uma imagem,Cordeiro os quantifica por meias-tintas, depois os submete derivao de sua granulao em funo de sua posio quefaz emergir os seus contornos, e ainda duas outrasderivaes. A imagem torna-se ento apta a todas asmanipulaes permitidas pelo sinal eletrnico. Ele situa-sedestarte no campo dos possveis, mostrando que se pode irlonge na arte de fascinar. Pois se tais imagens me seduzem,sei que, por trs de cada uma delas, existem variaes quebasta pesquisar.

    As imagens aqui expostas no so fechadas em simesmas; elas exemplificam uma arte toda de artifcio quesegue rumos bem diferentes do imaginrio artsticotradicional. O caminho do arbitrrio nela passa atravs daordem e no h ponto, mancha, cor, que no tenha sidolevado em conta, conscientizado pelo ordenador das formas:no mais o resultado de uma continuidade espontnea domovimento de sua mo, porm de uma vontade de forma;faz-se necessria uma aptido de ir alm. O artista deve iralm e definir sua atividade pela idia do exemplo antes quepela da obra.

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    Manifesto

    Textos do artista apresentando as basesconceituais de seu trabalho de arte porcomputador, discutindo a sua execuo e situandoo contexto histrico em que este se insere.

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    Artenica

    As variveis da crise da arte contempornea, no ainadequao dos meios de comunicao, enquantotransporte de informaes, e a ineficcia da informaoenquanto linguagem, pensamento e ao.

    Embora o uso das palavras comunicao e informao naliteratura cientfica no assuma significado unvoco,entendemos por comunicao o transporte, processamento emecanismo tcnico utilizados para a transmisso dainformao. Destarte, tanto o objeto artesanal, o quadro,como a mquina que reproduz ou complementa algumasfunes do sistema nervoso, do crebro ou docomportamento humano na atividade artstica,reproduzindo-as mediante um rgo artificial, integramsistemas de comunicao.

    A obsolescncia do sistema de comunicao da artetradicional reside na limitao de consumo implcita nanatureza do meio de transmisso. O nmero limitado defruidores possveis, os custos elevados, a rea deatendimento e as dificuldades tcnicas do sistema decomunicao da arte tradicional esto aqum da demandacultural quantitativa e qualitativa da sociedade moderna.

    As obras tradicionais so objetos fsicos a seremapresentados em locais fisicamente determinados,pressupondo o deslocamento fsico dos fruidores. Numacidade como So Paulo, de oito milhes de indivduos, cujasprojees populacionais para 1990 prevem uma cifra demais de dezoito milhes de habitantes, essa forma decomunicao no vivel. E ainda menos o ser para umacultura a nveis nacional e internacional, bsicos para odesenvolvimento harmnico da humanidade.

    Essas evidncias simples no parecem ter sidosuficientemente compreendidos. Artistas de formaobasicamente tradicional pensam em resolver a crisecomunicativa saindo das galerias e indo para a micro-paisagem urbana ou para o micro-paisagem regional,embrulhando montanhas por exemplo. Parecem no ter

    Waldemar CordeiroArtenica.So Paulo.Editora Universidade de S. Paulo,1971.

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    percebido que o obsoleto est na natureza da coisa e no nasua escala.

    De fato, a arte tradicional mais conhecida mediante areproduo dos meios mecnicos e eletrnicos decomunicao do que atravs do consumo direto. Essatraduo ou comutao comunicativa implica, porm, emperda de informao do ponto de vista de mensagempretendida na origem. A recproca verdadeira: a traduopara a tela de mensagens da comunicao de massa (Pop)no escapa do mesmo destino de degradao do nvelinformativo. A converso digital da imagem analgicamediante a retcula ou o RCT da TV pode alterarsubstancialmente a estrutura guestaltiana da mensagem.Conclumos ento que a mudana de comunicao tambm mudana de informao.

    A obra que implicitamente define o espao fsico do seuprprio consumo, setoriza o ambiente, pressupondo umazona especfica para a fruio artstica.

    Por outro lado, a crise de informao da artecontempornea deriva de uma problemtica artstica queparte de outras problemticas artsticas. Da resulta que aoriginalidade constitui, em ltima anlise, o melhor dos elospara a continuao da tradio, perpetuando a alienao dodesenvolvimento linear do processo artstico. Essa tambmuma setorizao, agora no apenas fsica mas tambmsemntica, na medida em que o consumo da obra de arterequer um conhecimento especfico prvio de repertriosexclusivos. A setorizao comunicativa e informativaconflita com o carter interdisciplinar e integrado da culturaplanetria.

    A utilizao de meios eletrnicos pode proporcionar umasoluo para os problemas comunicativos da arte mediante autilizao das telecomunicaes e dos recursos eletrnicos,que requerem, para a otimizao informativa, determinadosprocessamentos da imagem. No caso da artenica otransporte no implicaria transformao. A utilizao dosnovos meios comunicativos pouco significaria, no entanto,se no levasse em conta as mais diversas variveis dacultura. Aumentando o nmero de fruidores, a situao dacultura se torna mais diversificada e o feed-back mais

    complexo. Na medida em que a compreenso das condiesgerais esteja base de todo esforo criativo, o ato de criarvem exigir mtodos mais complexos e meios mais rpidosdo que aqueles at agora utilizados. Nesse rumo que a artepoder reencontrar as condies para o desempenho da suafuno criativa.

    Sabe-se que a mera utilizao do computador nosignifica por si s a soluo de todos os problemas. Nota-se,por exemplo, uma tendncia para o virtuosismo tcnico,quase um neoformalismo visando a uma demonstraohedonstica sofisticada. Essa tendncia, embora no formuleproblemas novos no campo da arte, em virtude dosprocessos automticos empregados, possui o grande mritode desmitificar a arte tradicional e contribuir para a anlisede processos da mente na atividade artstica. Se osproblemas artsticos puderem ser tratados por mquinas, oupor equipes que incluam o partner computador,poderemos saber mais a respeito de como o homem trata osproblemas artsticos. A simulao reproduz com eficazrapidez a produo artstica tradicional, exaurindo-a,esvaziando-a, fornecendo a radiografia e os eltrons do seucadver, o que vale por uma certido de bito domisonesmo. Essa tendncia, embora lance mo de recursosvastos, se autolimita setorizao j por ns apontada arespeito do diagnstico das possibilidades comunicativas daarte tradicional, embora nessa condio setorial promovainegavelmente uma operao iconoclasta altamentehiginica. O problema mais urgente no , contudo, o derivalizar com a arte tradicional, porquanto isso equivaleria aaceitar um campo de atuao j condenado absolescnciadefinitiva.

    Uma segunda tendncia da arte eletrnica visa a realizarobras interdisciplinares aproveitando pesquisas edescobertas no campo da Neurologia e da Psicologia(Gestalt), processando nesse sentido imagens com a ajuda docomputador. Tipicamente sinttica, essa tendncia seinscreve na faixa da arte concreta desenvolvida nascondies histricas da primria revoluo industrial(suprematismo, neoplasticismo, construtivismo, etc., at aarte concreta), que criou uma linguagem de mquina para a

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    comunicao da sociedade urbana e industrial. A esserespeito podemos destacar as semelhanas evidentes entre aarte concreta e a computer art.

    O fato de que as tendncias sintticas (a arte concreta, acintica e a programada) tenham sofrido no decorrer dadcada 60/70 uma profunda crise, deu-se em virtudeprincipalmente do aparecimento de uma nova culturapopular de massa, possibilitada pelos meios eletrnicos decomunicao (que se refletiu de diferentes maneiras nocampo da arte, particularmente atravs de endereosconservadores como o Pop, o novo-realismo e a nova-figurao), tornando-se responsvel pela introduo noproblema arte de novas variveis, que transcendem asimpostaes meramente sintticas. Deve-se salientar,contudo, a importncia, no domnio da conscientizao dasatividades humanas, do desenvolvimento da pesquisasinttica, elevada dos meios mecnicos para os eletrnicos.

    Por fim, extraordinria significao assume para acultura a utilizao do computador do domnio da imagemcom finalidades exclusivamente tcnicas e cientficas,notadamente no campo da leitura, reconhecimento einterpretao automticas de patterns, proporcionandorecursos imensos no apenas para a programao criativacomo para a programao de estudos crticos das mensagensartsticas.

    No Brasil a Computer Art encontra antecedentesmetodolgicos da Arte Concreta, que apareceu no fim dadcada de 40 e teve seu maior desenvolvimento, atingindo oapogeu, na dcada 50/60. A arte concreta foi no Brasil anica que utilizou mtodos digitais para a criao.Coincidindo com o perodo que apresentou o maior ndicede industrializao, a arte concreta no Brasil, principalmentenas reas urbanas, forneceu algoritmos largamente utilizadospara comunicao atravs de meios industriais de produo.A arte concreta visual influi decisivamente sobre avanguarda na poesia, na msica e na programao visual.

    Na viso prospectiva da importncia dos meioseletrnicos para a cultura nacional, deve ser salientada avarivel da extenso territorial. Para os demais campos daatividade social, o sistema de telecomunicao, atualmente

    em processo de expanso, constitui um fator derelacionamento, aproximao e integrao. Essa mesmamacro-infraestrutura da comunicao poderia oferecer osmeios para o desenvolvimento de uma cultura artstica dembitos nacional e internacional. A cultura enfrentou nopassado dificuldades fsicas provenientes de uma ocupaodo territrio nacional por ncleos de diferentes dimenses,separados por distncias de milhares de quilmetros, reasessas com densidades populacionais baixssimas, s vezespraticamente vazias. Por outro lado, no interior dessesncleos, a proximidade excessiva chega a degradar ascondies de vida, comprometendo as possibilidadescomunicativas. Os recursos eletrnicos de comunicaopoderiam corrigir essas duas anomalias, permitindo ummelhor equilbrio ecolgico entre o fator fsico e ocomunicativo.

    O processo cultural pelas telecomunicaes estocorrendo e irreversvel sob a orientao de tcnicos,que nem sempre possuem uma viso profunda, global ehumanstica dos problemas. Note-se, porm que quando nosreferimos a uma viso profunda, global e humansticapretendemos desligar essa imagem da chamada culturasuperior acadmica, que mais enfadonha, medocre einexpressiva do que o kitsch da comunicao de massa. Osmeios eletrnicos no Brasil facilitam e aceleram aantecipao da cultura sobre a realidade scio-econmica.Atravs do espao continental do pas, a informao artsticapoderia atingir os lugarejos mais remotos e isolados doterritrio muito antes do que os equipamentos materiais dacivilizao. A esse respeito altamente provvel que asinformaes do rdio e da TV cheguem aos ncleoshabitados da Amaznia antes do asfalto da Transamaznica.

    A cultura criativa brasileira, contudo, lamentavelmente,ainda no descobriu a potencialidade da Artenica.

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    Waldemar CordeiroComputer plotter-art.Catlogo da I Mostra na Amrica Latina deComputer Plotter Art.So Paulo, Mini Galeria do USIS.Maro /1969.

    Computer Plotter Art

    1 1 0 0 0 11 0 1 0 0 1 (significa arte, em linguagem binria)1 0 0 1 1 01 1 0 1 0 1

    Os trabalhos expostos integram a primeira exposiointernacional de arte processada pelo computador equipadocom plotter, promovida pela California Computer. Figura namostra um trabalho nosso, em equipe com o prof. JorgeMoscati Derivados de uma imagem realizado em1969 no computador digital IBM 360/44 (no dotado deplotter) da USP.

    Num breve histrico, provavelmente incompleto, a partirdo Simposium sobre Arte e Computadores, realizado noTama Fine Arts College, Tquio 1967, a manifestaopioneira Cybernetic Serendipity organizada por JasiaReichardt em 1968 no IAC de Londres e seguida pelamostra Mind-Extenders apresentada no fim do mesmo ano,pelo Museum of Contemporary Crafts, em Nova York. Noano seguinte, o Museu de Brooklyn, em colaborao com ogrupo E.A.T., organizou a mostra Some More Beginnings.Novas Tendncias 4, sob a direo de Bozo Bek, realizouem maio do ano passado, em Zagreb, uma exposio e umimportante seminrio subordinados ao tema Computadorese Pesquisas Visuais. Para este ano, esto programadasvrias exposies, entre elas: Computer Graphic 70 naBrunel University de Londres, promovida pela ComputerArts Society. As primeiras experincias de artistasargentinos sero apresentadas pelo Centro de Arte yComunicacin dirigido por Jorge Glusberg. Por ocasio daFall Joint Computer Conference, a ser realizada em LasVegas, haver uma mostra de msica, arte visual e teatro emcomputadores.

    Aqui no Brasil, embora o primeiro trabalho comcomputador de nossa autoria, em colaborao com o prof.Moscati, tenha sido realizado em 1968, esta a primeira

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    mostra de arte com computador. , tambm, a primeirada Amrica Latina. A arte computadorizada, enquantometodologia, se identifica, em ltima anlise, com astendncias da arte contempornea chamadas, genericamenteconstrutivas e que visam quantificao e digitalizaodos elementos da obra de arte.

    Na arte digital (dgito = nmero) a mensagem processada numericamente, alcanando um grau superior depreciso. Exemplos histricos de arte digital so Seurat, ocubismo analtico, o suprematismo, o neo-plasticismo, todoo construtivismo e a arte concreta. Na arte digital a grandezafsica representada por um nmero, em termos estatsticosprobabilsticos que no excluem o recurso acaso.

    O desenvolvimento da arte digital tem relao direta coma industrializao, com a criao da linguagem de mquina ea linguagem artificial, to freqente na semiologia grfica. Aesse propsito, conviria investigar em que medida acomplexidade do fenmeno perceptivo inerente mensagemartstica no responsvel por elementos ambgoscaractersticos da linguagem natural, que minam ahomogeneidade e a regulamentao minuciosa daterminologia da linguagem artificial. De contradies dessegnero deriva, provavelmente, a necessidade da atividadeartstica, no substituvel pelas solues apenas tcnicas daengenharia da comunicao.

    Neste breve, brevssimo texto podemos afirmar, talvezdogmaticamente, que a arte digital corresponde maissatisfatoriamente aos problemas tcnicos da demandaoriunda da evoluo tecnolgica e da situao culturalproduzida pelo crescimento demogrfico e pelo fenmenodos grandes aglomerados urbanos (metrpoles emegalpoles), da diminuio das distncias fsicas e dodesenvolvimento das telecomunicaes.

    A utilizao do computador, portanto, pode serconsiderada no mbito da arte digital, iniciada no Brasil pelaarte visual concreta, no fim da dcada de quarenta, e queapresenta na dcada de cinqenta e sessenta, o seu maiordesenvolvimento e apogeu, influenciando outras artes,notadamente a poesia, e coincidindo com o maior ndice deindustrializao do pas.

    Atualmente, nas condies gerais da segunda revoluoindustrial, os processos de programao e digitalizao sobem mais sofisticados e pressupem a utilizao deinstrumentos mais eficazes, como o computador. Esse nopassa de um instrumento que pode realizar qualquer desenhoem menor tempo e maior preciso. Por isso mesmo, essepoderoso instrumento pode servir, tambm, maismisoneista das atitudes culturais. O seu uso em tradues deformas tradicionais pode ser discutvel. como usar todosos recursos da eletrnica moderna para executar umacanzonetta napolitana, que ser sempre melhor se tocadacom os dedos no violo. O uso do computador adquireparticular importncia para as tendncias que pesquisam naarte mtodos heursticos. Nesses casos a rapidez de clculo edas decises de lgica podem fazer economizar uma vida.Com efeito, s vezes o estudo das variveis de uma idia(estrutura ou meta-estrutura da mensagem artstica) podelevar anos de trabalho rduo, quando bastaria umaprogramao inteligente para resolver esse problema empoucas horas, com o auxlio do computador. O uso docomputador na arte, e na crtica de arte tambm, abreperspectivas imensas suscetveis de atender a alguns dosanseios mais profundos da humanidade, proporcionando aalmejada arte auto-consciente (C. Alexander),interdisciplinar e operativa.

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    Obras

    Seleo de obras de arte por computador.1969 a 1973

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    Derivadas de uma imagem.1969,transformao em grau zeropress output, 47 x 34,5 cm

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    Derivadas de uma imagem.1969,transformao em grau umpress output, 47 x 34,5 cm

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    Derivadas de uma imagem.1969,transformao em grau doispress output, 47 x 34,5 cm

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    Retrato de Fabiana.1969,!/4 output list47 x 34,5 cm

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    Retrato de Fabiana.1969,2/4 output list47 x 34,5 cm

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    Retrato de Fabiana.1969,3/4 output list47 x 34,5 cm

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    A mulher que no B.B.1971,computer graphic30,5 x 45,5 cm

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    Gente,1972/1973transformao em grau umcomputer output,63,50 x 30,5 cm

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  • Waldemar Cordeiro / Raul Fernando Dada / J. SoaresSobrinho,Centro de Computao do Instituto de Arte da UnicampGente, 1972/1973computer out put, 67 x 30 cmdigitalizaoGente Grau 1, computer out put, 63,5 x 30,5 cmGente Grau 2, computer out put, 63,5 x 30,5 cmGente Grau 4, computer out put, 63,5 x 30,5 cmGente Grau 6, computer out put, 63,5 x 30,5 cmDigitalizao de Gente 1/2, 77 x 42 cmGente 1/2, computer out put, 77 x 42 cm

    Waldemar Cordeiro / J.L. Silveira / Carlos A.T. Pulino,UnicampGente 25% grau zerocomputer out put, 64 x 31 cmGente derivada Bcomputer out put, 126 x 60,5 cmGente grau zerocomputer out put, 126 x 60,5 cmGente derivada Acomputer out put, 127 x 60,5 cmGente derivadacomputer out put, 126 x 60,5 cmPeople derivativeplotter out put, 101 x 62,5 cmPeople 1/2plotter out put, quatro cores, 40,5 x 25 cmPeople 1/2plotter out put, 70 x 73 cmPeople derivativecomputer out put plotter, 80,5 x 49,5 cmColeo Famlia Cordeiro

    Waldemar Cordeiro / N. Machado / R. Dada, UnicampPirambu, 1973plotter out put, dgito de 6 linhas, 25,5 x 37 cmColeo Famlia Cordeiro