Arte&Ilusão
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7/27/2019 Arte&Iluso
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Ernest Gombrich (1986) Arte e Iluso. Um Estudo da Psicologia da Representao
Pictrica, So Paulo: Martins Fontes, (1 edio original: 1959), 383 p.
A obra magistral de Ernest Gombrich Arte e Ilusoparte do fascnio confessadodo autor pelas misteriosas maneiras pelas quais formas e smbolos podem ser usados
para significar outras coisas alm deles mesmos para testar a hiptese de que nenhum
artista capaz de pintar o que v e pr de lado as convenes que conhece. No
obstante ter sido escrita h meio sculo e contar com inmeras edies publicadas, esta
obra permanece central para o estudo da psicologia da percepo, da semitica e da
semitica social da arte, pela profundidade com que aborda os mecanismos de
reproduo e mudana subjacentes a todo o estilo, escola ou tendncia.O enigmtico conceito de estilo introduzido pelo autor para lanar os alicerces
da psicologia da viso que desenvolver ao longo das quase quatrocentas pginas do
livro. Stilus era o instrumento de escrever dos romanos. Na sua origem fala-se de um
estilo apurado e de uma pena fluente. O conceito problematiza-se ao constituir-se
como categoria de expresso e passar a ser associado discusso sobre os nveis de
habilidade (leia-se grau de semelhana). Muitas vezes, aquilo que parece um progresso
do ponto de vista do domnio de um meio de expresso pode tambm ser visto como umdeclnio para a virtuosidade vazia (p. 8). Por outro lado, o que tambm est em causa
na avaliao que se faz de um estilo, desde as escolas de retrica at dissoluo dos
gneros artsticos - herdeiros da complexa problemtica do estilo - a sua suposta
varivel conscincia moral (Argan & Fagiolo, 1994: 111).
Os estudos sistemticos dos efeitos de representao mimtica aquilo a que
hoje chamamos de psicologia da percepo comearam por ser um problema prtico
no ensino da arte do sculo XVIII procurava-se a relao entre o problema da
inabilidade em copiar a natureza e a incapacidade de a ver. A questo que se desenhava
era se pintores tm sucesso na imitao da realidade por verem mais ou vm mais por
terem adquirido a habilidade da imitao? As duas posies parecem justificadas pela
experincia e os artistas sabem que tanto aprendem pela observao atenta da natureza
como pela reproduo das obras do passado. Observar, apenas, jamais lhes ensinou o
seu ofcio.
Com a emergncia da Arte Moderna e a ruptura do pacto mimtico, a esttica e a
crtica de arte comearam a abandonar o problema da representao convincente e o
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preconceito de que a excelncia artstica se identificaria com a exactido fotogrfica.
Nesse processo, comeou-se a associar irrelevncia artstica com simplicidade
psicolgica. Apesar da psicologia ter demonstrado a imensa complexidade dos
processos de percepo na iluso visual, muitos defenderam, e defendem ainda, que
essas questes triviais, inclusivamente, nunca tiveram nada a ver com a arte.
No obstante a reduo da arte a semitica, projectada pelas pesquisas mais
analticas da Arte Moderna, a arte no pode renunciar exigncia da nomeao - essa
a sua condio de linguagem. A partir da Arte Conceptual, em que a arte se posiciona
como meta-linguagem, a obra coloca-se no encontro entre um momento semitico, que
d o quadro exacto da situao do cdigo no acto em que a obra realizada, e um
momento hermenutico, de descoberta de novos mbitos da realidade. Esse o abismo
desse encontro a denominao potica e a denominao comunicativa (Menna, 1999:
99).
Na Antiguidade, porm, a conquista da iluso pela arte era uma proeza to
recente que toda a discusso sobre pintura e escultura girava em torno da imitao ou
mimesis. Maravilhar-se era o primeiro passo no caminho da sabedoria. Esses fantasmas
da realidade visual a que chamamos pinturas, eram autnticas maravilhas! Vasari via a
inveno dos meios de representao como uma grande empresa colectiva de tal
dificuldade, que era inevitvel uma certa diviso de trabalho. A histria da arte
interpretada, na tradio que vai de Plnio e Vasari at Constable e Turner, como uma
progresso em direco verdade visual. Pode-se dizer que o progresso da arte nessa
direco era, para o mundo antigo, o que hoje, para o moderno, o progresso da tcnica:
o prprio modelo do progresso como tal (p. 9, 12).
Por volta do final do sculo XIX, Fiedler, Hildebrand e Riegl, os trs fundadores
da escola estilstica, contribuem para a desintegrao da concepo da arte como
imitao da natureza opondo-se aos argumentos usados pelos impressionistas paradefender a ideia que os seus quadros, sendo o fruto de puras sensaes pticas,
mostravam o mundo como realmente o viam. A distino entre o que realmente vemos
e o que inferimos atravs do intelecto to velha quanto o pensamento humano sobre a
percepo (p. 12). No entanto, os impressionistas apelavam para a cincia para
defender, nos seus quadros, o olhar inocente (expresso divulgada por Ruskin) e
garantir, assim, um lugar de progresso na histria da verdade visual. Fiedler explica
como mesmo a mais simples impresso dos sentidos j um facto mental e aquilo a quechamamos mundo exterior no passa, na realidade, do resultado de um complexo
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possvel em situaes nas quais a nossa experincia se encontre ajustada e os nossos
olhos afinados a uma determinada paleta e pincelada. A importncia que as relaes
estabelecem na arte, no s entre os elementos de um determinado quadro mas tambm
em diferentes quadros da histria, envolve o papel das nossas expectativas na decifrao
dos cdigos. A tais expectativas a psicologia denominou contextos mentais. Toda a
comunicao depende de uma interaco deste tipo, entre expectativa e observao,
conjecturas acertadas e jogadas em falso. A projeco que lanada para interpretar
uma imagem uma hiptese, entre outras descartadas, para lhe dar sentido. O sucesso
dessa empresa depende, em ltima instncia, da identificao do observador com o
cdigo utilizado pelo artista.
Um estilo, tal como um clima de opinio, cria um horizonte de expectativas. Ao
anotar relaes, a mente regista tendncias e desvios a essas tendncias. O que os
artistas inovadores fazem expandir os limites de uma escala, ensinando-nos uma nova
percepo (Parte IV). Porm, para chegar nova posio, o inventor tem de reagrupar
os seus componentes atravs de um discernimento intuitivo que transcende (mas inclui)
as posies precedentes (Kubler, 1998: 93). A tenacidade das convenes e o papel dos
tipos e esteretipos na arte impulsionam o homem a repetir o que aprendeu. o poder
que dita o querer. A inveno tem duas fases distintas: a descoberta de novas posies,
seguida da sua fuso com o corpo de conhecimento existente (Ibidem, 94). Sem a
conscincia da enorme presso que move o homem para a repetio, no seramos
capazes de admirar aqueles seres excepcionais que conseguiram quebrar o encanto e
realizar um significativo avano em cima do qual outros pudessem construir (p. 20).
Nunca houve uma poca como a nossa em que a imagem visual fosse to
acessvel e to presente na nossa vida quotidiana. Dos selos postais aos cartazes eflyers,
da banda desenhada animao online, dos media s embalagens domsticas por todo
o lado estamos cercados de representaes da realidade. A pintura ensinada na escolae praticada como passatempo e terapia. Qualquer amador domina hoje truques que
pareceriam inimaginveis a Giotto e o colorido berrante das nossas embalagens
provavelmente o chocaria. Porm, se aceitarmos a doutrina de que a iluso visual nunca
teve nada a ver com a arte, no s a perda do contacto com os grandes mestres
inevitvel, como dificilmente continuaremos a maravilhar-nos. Para alm disso, os
motivos pelos quais a representao da natureza se tornou banal devem ser, para o
historiador, do maior interesse (p. 7).Slvia Pinto, Novembro de 2009
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