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Universidade Estadual de Campinas Faculdade de Engenharia Mecnica Comisso de Ps-Graduao em Engenharia Mecnica

Plano de Carreira como instrumento de gesto: documentao e anlise de uma experincia

Autora: Crmen Lcia Rodrigues Arruda Orientador: Prof. Dr. Luiz Carlos de Freitas

Junho de 2004

Universidade Estadual de Campinas Faculdade de Engenharia Mecnica Comisso de Ps-Graduao em Engenharia Mecnica

Plano de Carreira como instrumento de gesto: documentao e anlise de uma experinciaAutor: Crmen Lcia Rodrigues Arruda Orientador: Prof. Dr. Luiz Carlos de Freitas

Curso: Engenharia Mecnica Mestrado Profissional rea de Concentrao: Gesto da Qualidade Total

Trabalho final de Mestrado Profissional apresentada Comisso de Ps-Graduao da Faculdade de Engenharia Mecnica, como requisito para a obteno do ttulo de Mestre Profissional em Engenharia Mecnica Gesto da Qualidade Total

Campinas, 2004 SP Brasil

FICHA CATALOGRFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA DA REA DE ENGENHARIA BAE UNICAMP

Ar69p

Arruda, Crmen Lcia Rodrigues Plano de carreira como instrumento de gesto: documentao e anlise de uma experincia / Crmen Lcia Rodrigues Arruda.--Campinas, SP: [s.n.], 2004. Orientador: Luiz Carlos de Freitas. Dissertao (mestrado profissional) Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Engenharia Mecnica. 1. Servio pblico. 2. Servidores pblicos. 3. Universidades e faculdades Administrao de pessoal. 4. Carreiras no servio pblico. I. Freitas, Luiz Carlos. II. Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Engenharia Mecnica. III. Ttulo.

Universidade Estadual de Campinas Faculdade de Engenharia Mecnica Comisso de Ps-Graduao em Engenharia Mecnica

DISSERTAO DE MESTRADO PROFISSIONAL

Plano de Carreira como instrumento de gesto no Servio Pblico: uma experincia

Campinas, 28 de junho de 2004

Aos meus pais, Milton e Lcia, orgulhosos servidores pblicos, aposentados aps uma vida de paixo, crena e dedicao s questes do servio pblico no Brasil

AgradecimentosDuas pessoas, em especial, tive a sorte e tambm a honra de encontrar em meu caminho nesta Universidade e que, em diferentes momentos, acreditaram em mim, abrindo-me novos horizontes. A ambos credito a existncia deste trabalho: Prof. Dr. Fernando Ferreira Costa, que me permitiu conhecer a verdadeira vida acadmica e acreditar que eu era capaz de contribuir um pouquinho com esse mundo to fascinante; Prof. Dr. Luiz Carlos de Freitas, grande mestre, que me possibilitou a participao intensa e me orientou no debate e na vivncia poltica dentro do ambiente universitrio, ensinando-me os caminhos para que eu pudesse me guiar, depois, por minhas prprias idias.

Aos meus amigos do Hemocentro da Unicamp, onde passei quatorze dos dezoito anos em que estou nesta Universidade, em especial Profa. Dra. Sara Saad responsvel pelo incio desta ps-graduao e aos meus amigos que, por no poder cit-los todos, aqui represento nas pessoas de Raquel Suzana Foglio e Marcelo Addas de Carvalho, que me acompanharam de perto desde o incio do primeiro trabalho realizado. equipe da Diretoria de Planejamento e Desenvolvimento da DGRH que, poca da implantao do plano, torceu, sofreu, vibrou, em especial minha amiga Mrcia Cristina Cndido dos Santos, que, com maestria, me guiou por muitos dos caminhos dessa nossa Unicamp. s dezenas de pessoas com quem tive o prazer de conviver durante a realizao do trabalho de implantao do plano na Unicamp, e que me fizeram acreditar que todo o esforo valeu e que ainda vale a pena, em especial ngela Maria Cavalcanti Buarque e Lus Augusto Michelin da Silva ambos membros do Grupo Tcnico da Carreira , Rosilene Sidnei Gelape, Teresa Helena Portela Freire de Carvalho e Gilmar Dias da Silva. Ao Prof. Dr. Joo Frederico da Costa Azevedo Meyer, que acompanhou e dirigiu parte do trabalho de implantao, mas que, acima de tudo, foi e um grande amigo, um torcedor de primeira e o maior ombro do mundo. Aos meus queridos amigos da Faculdade de Educao, que me receberam de braos abertos depois de toda esta maratona, e que me ajudaram a enfrentar a construo deste estudo, difcil para ns, servidores, que vivenciamos concomitantemente o cotidiano de nossas tarefas. Represento-os aqui por aqueles de convvio mais prximo, e que portanto sofreram mais de perto as conseqncias dos meus dias de cansao e mau humor: Roberta Rabelo Fiollo Pozzuto, Jrgias Alves Ferreira, Verediana Carla Miranda, Rosa Maria Marins Gobbi Sebinelli, Vera Lcia Gonalves e Sueli Aparecida Bonatto. Profa. Agueda Bernardete Bittencourt e ao Prof. Jorge Megid Neto, que me incentivaram e apoiaram a construo final desta etapa profissional. Por ltimo, mas no menos importante, ao Joo Ernesto de Carvalho, meu companheiro de todas as horas, cuja paixo pelo trabalho cientfico sempre foi o meu maior exemplo. Estou, ainda muito de longe, tentando segui-lo!

Barnab Haroldo Barbosa e Antonio Almeida (Gravada por Emilinha Borba, Carnaval de 1948) Barnab o funcionrio Quadro extra numerrio Ganha s o necessrio Pro cigarro e pro caf Quando acaba seu dinheiro Sempre apela pro bicheiro Pega o grupo do carneiro J desfaz do jacar O dinheiro adiantado Todo ms descontado Vive sempre pendurado No sai desse terere Todo mundo fala fala Do salrio do operrio Ningum lembra o solitrio Funcionrio Barnab Ai Ai Barnab Ai Ai funcionrio Ai Ai Barnab Todo mundo anda de bonde S voc anda a p ....

Maria Candelria Armando Cavalcanti e Klcius Caldas (Gravada por Blecaute, Carnaval de 1952) Maria Candelria alta funcionria Saltou de praquedas Caiu na letra O, oh, oh, oh, oh Comea ao meio-dia Coitada da Maria Trabalha, trabalha, trabalha de fazer d oh, oh, oh, oh A uma vai ao dentista As duas vai ao caf s trs vai modista s quatro assina o ponto e d no p Que grande vigarista que ela .

RESUMOARRUDA, Crmen Lcia Rodrigues. Plano de carreira como instrumento de gesto: documentao e anlise de uma experincia. Campinas, Faculdade de Engenharia Mecnica, Universidade Estadual de Campinas, 2004. 215 p. Trabalho Final de Mestrado Profissional.

O trabalho apresenta uma experincia realizada na Universidade Estadual de Campinas, no perodo de 1999 a 2002, na tentativa de modificar o cenrio de desmotivao e comodismo, to presentes atualmente nas instituies pblicas do Brasil, em decorrncia das campanhas negativas de desmonte e de difamao promovidas junto sociedade. Para promover as alteraes desejadas e tentar aproximar a instituio das formas modernas de administrao, foram estabelecidos instrumentos para a definio de uma poltica de recursos humanos, tendo como foco central o desenvolvimento de um plano de carreira para os servidores tcnicoadministrativos da Universidade. So descritos a preparao do ambiente, o desenvolvimento e a implantao do Plano de Carreira, Vencimentos e Salrios PCVS na Unicamp, bem como a sua recepo pela comunidade atravs de dados levantados, especialmente sobre a reao dos rgos de representao da categoria. Os procedimentos adotados so analisados frente s teorias de administrao e ao panorama geral do servio pblico. Ao contrrio do que se esperava a princpio, j que o plano de carreira era uma necessidade apontada pelos prprios servidores, foram encontradas resistncias para a sua implantao, primeiro devido a um imediatismo que permeia hoje as relaes sociais e tambm por fora de uma ausncia de sintonia entre as diferentes categorias que compem o ambiente da instituio universitria. Mesmo assim, a experincia trouxe ganhos, por possibilitar o debate aberto e participativo das questes de recursos humanos na busca de uma universidade pblica de excelncia. Palavras-chave: Servio pblico; servidores pblicos; universidades e faculdades administrao de pessoal; carreiras no servio pblico.

ABSTRACTARRUDA, Crmen Lcia Rodrigues. A career plan used as a management instrument: documentation and evaluation of an experience. Campinas, Faculdade de Engenharia Mecnica, Universidade Estadual de Campinas, 2004. 215 p. Trabalho Final de Mestrado Profissional.

This study presents the experience carried out at the State University of Campinas, during the period ranging from 1999 to 2002, which had the objective of changing the present scene of lack of motivation and resignation, installed at present in Brazilian public institutions, and brought on by the negative dismantling and defamation campaigns launched in order to manipulate public opinion. In order to achieve the alterations proposed and in the intent to draw the institution towards the modern forms of management, instruments were established to define a human resources policy, focusing mainly on the development of a career plan for the civil servants working at the University. The environment, development and implantation of the Career, Wages and Salary Plan (Plano de Carreira, Vencimentos e Salrios PCVS ) at Unicamp, as well as the communities reception, assessed by means of the data obtained, specially those from groups representing the working categories, are here described. The procedures that were adopted were analyzed according to the administration theories and general outlook of the civil service. Contrary to the first belief, seeing that the career plan was a necessity pointed out by the civil service employees themselves, many obstacles towards the implementation of the plan were encountered, at first due to the immediatism present today in social relations and also due to a distance between the different categories that constitute the university institution. Nevertheless, the experience was fruitful, as it encouraged an open and participative debate regarding the issues of human resources while in the pursuit of a State University of excellence. Key words: Civil (public) service; civil service employees; university management; human resources management; career plan.

SumrioLista de Quadros ............................................................................................................................................................. i Lista de Figuras..............................................................................................................................................................ii Lista de Tabelas .............................................................................................................................................................ii Lista de Grficos ............................................................................................................................................................ii Abreviaturas..................................................................................................................................................................iii Introduo ...................................................................................................................................................................... 1 I. Formas de Administrao ........................................................................................................................................... 4 Gesto de Recursos Humanos........................................................................................................................... 30 II. O Servio Pblico no Brasil .................................................................................................................................... 36 A viso do servio pblico................................................................................................................................ 36 A universidade pblica ..................................................................................................................................... 43 A reforma administrativa no Brasil................................................................................................................... 47 A administrao na universidade pblica brasileira.......................................................................................... 50 A administrao gerencial do servio pblico e os programas de qualidade .................................................... 52 Gesto de recursos humanos e servio pblico................................................................................................. 57 As reformas necessrias .............................................................................................................................. 61 III. Procedimentos Metodolgicos ............................................................................................................................... 65 Estabelecimento do tema .................................................................................................................................. 65 Objetivos........................................................................................................................................................... 67 Fontes de dados................................................................................................................................................. 67 Listagem de documentos consultados ......................................................................................................... 68 Perspectivas de anlise...................................................................................................................................... 71 IV. A implantao de instrumentos de gesto em direo a uma poltica de recursos humanos para a Unicamp ....... 72 A Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)........................................................................................... 72 Pequena cronologia referente ao tema do trabalho...................................................................................... 72 A Unicamp em nmeros.............................................................................................................................. 74 O cenrio inicial................................................................................................................................................ 76 Carreira de Tcnico de Apoio ........................................................................................................................... 79 Plano de Carreira, Vencimentos e Salrios PCVS ......................................................................................... 82 Reviso institucional e estruturao para construo da nova carreira ....................................................... 85 O trabalho de construo da nova carreira .................................................................................................. 95 Casos especficos tratados na fase de transio ..................................................................................... 124 V. O ambiente poltico, as reaes do STU e dos representantes de servidores nos colegiados da Unicamp............ 131 VI. Discusso ............................................................................................................................................................. 171 VII. Concluses.......................................................................................................................................................... 187 Referncias bibliogrficas.......................................................................................................................................... 190 Anexos ....................................................................................................................................................................... 193

LISTA DE QUADROSQuadro 1 Quadro 2 Quadro 3 Quadro 4 Quadro 5 Quadro 6 Quadro 7 Quadro 8 Quadro 9 As seis etapas do processo de mudana de Adizes O sistema de desenvolvimento de carreiras Item 5.1. Sistema de trabalho Item 5.2. Desenvolvimento e capacitao Item 5.3. Qualidade de vida Item 7.4. Resultados relativos s pessoas Resumo dos principais pontos da carreira proposta pelo STU Comparao entre as Deliberaes CAD 142/95 e a CAD A-04/99, sobre movimentao de pessoal na Unicamp Comparao entre as comisses de acompanhamento dos processos de carreira junto s unidades e rgos (CLAs e CSARHs)

Listagem de ocupaes existentes na Unicamp em agosto de 1999, com a respectiva Quadro 10 quantidade de servidores em cada uma delas, numa primeira tentativa de classificao por tipo de atividade Quadro 11 Exemplo de composio de cargo largo Quadro 12 Exemplo de descrio sumria de cargo largo Quadro 13 Critrios de mobilidade funcional previstos no PCCS Quadro 14 Critrios para o enquadramento no PCCS Quadro 15 Quadro 16 Quadro 17 Correspondncia entre as referncias salariais da tabela salarial vigente naquele momento e da nova tabela salarial proposta Referncias iniciais atribudas a cada nvel na proposta de tabela salarial do PCVS, antes e depois da correo Levantamento realizado a partir do retorno das simulaes de enquadramento inicial com problemas apontados pelas CSARHs

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LISTA DE FIGURASFigura 1 Figura 2 Figura 3 O ciclo Shewart (adaptado de DEMING, 1990, p. 66), tambm conhecido como Ciclo PDCA O Modelo de Excelncia em Gesto Pblica do Programa em Qualidade do Servio Pblico 2003 (BRASIL, 2003) Trajetrias previstas na primeira proposta de plano de carreira, o PCCS

LISTA DE TABELASTabela 1 Evoluo do nmero de servidores do Poder Executivo Tabela 2 Catalogao das propostas, dvidas e sugestes sobre o PCCS recebidas das CSARHs Tabela 3 Optantes do PCVS em dezembro de 2001

LISTA DE GRFICOSGrfico 1 Distribuio do nmero de servidores a serem enquadrados no cargo largo de Auxiliar em Sade, de acordo com as referncias salariais Grfico 2 Distribuio do nmero de servidores a serem enquadrados no cargo largo de Tcnico em Laboratrio, de acordo com as referncias salariais Grfico 3 Distribuio do nmero de servidores a serem enquadrados no cargo largo de Superior em Exatas, de acordo com as referncias salariais

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ABREVIATURAS

AEPLAN AFPU AT ATD ATU CAD CAS CBO CCA Cipa CLA CLT Consu COP CORH CPFL CR CRH CSARH CVND DGA DGRH DIEESE DPD

Assessoria de Planejamento Econmico da Unicamp Agncia de Formao Profissional da Unicamp Assistente Tcnico Assistente Tcnico de Direo Assistente Tcnico de Unidade Cmara de Administrao Comisso de Avaliao de Servidores Cdigo Brasileiro de Ocupaes Comisso Central de Avaliao Comisso Interna de Preveno de Acidentes Comisso Local de Avaliao Consolidao das Leis do Trabalho Conselho Universitrio Comisso de Oramento e Patrimnio Conselho Orientador de Recursos Humanos Companhia Paulista de Fora e Luz Conselho de Representantes do STU Cmara de Recursos Humanos Cmara Setorial de Acompanhamento de Recursos Humanos Comisso de Vagas No Docentes Diretoria Geral de Administrao Diretoria Geral de Recursos Humanos Departamento Intersindical de Estatstica e Estudos Scio-Econmicos Diretoria de Planejamento e Desenvolvimentoiii

EFQM ESUNICAMP Fasubra FE FGV FHC FPNQ Funcamp GTC HC IA ICMS IE IEL IFCH LDB MS ORT PCCS PCVS PDCA PG PRDU PROFAE Pro-Seres PVDQ QPAP RAIS REPLAN RH STU Unesp Unicamp USP

European Fundation for Quality Management Estatuto dos Servidores da Unicamp Federao dos Sindicatos dos Trabalhadores das Universidades Brasileiras Faculdade de Educao Fundao Getlio Vargas Fernando Henrique Cardoso Fundao Prmio Nacional da Qualidade Fundao de Desenvolvimento da Unicamp Grupo Tcnico da Carreira Hospital de Clnicas Instituto de Artes Imposto sobre Circulao de Mercadorias e Servios Instituto de Economia Instituto de Estudos da Linguagem Instituto de Filosofia e Cincias Humanas Leis de Diretrizes e Bases Nvel da carreira docente (MS1, MS2, MS3, MS4, MS5, MS6) Organizao Racional do Trabalho Plano de Carreira, Cargos e Salrios Plano de Carreira, Vencimentos e Salrios Plan, Do, Check, Analise (ou Act) Procuradoria Geral Pr-Reitoria de Desenvolvimento Universitrio Projeto de Profissionalizao dos Trabalhadores da rea de Enfermagem Programa de Incentivo ao Servidor Estudante Programa de Valorizao, Desenvolvimento e Qualificao Programa da Qualidade e Participao na Administrao Pblica Relao Anual de Informaes Sociais Refinaria de Petrleo da Petrobras Paulnia Recursos Humanos Sindicato dos Trabalhadores da Unicamp Universidade Estadual Paulista Universidade Estadual de Campinas Universidade de So Paulo

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INTRODUOA viso sobre o servio pblico no Brasil foi sempre carregada de questes negativas. No passado, por conta dos apadrinhamentos (tanto na contratao de servidores como na priorizao de atendimentos), do nepotismo e tambm da m administrao dos recursos financeiros, que sempre pareceram infinitos aos olhos dos administradores pblicos mais antigos; atualmente, por causa das campanhas de difamao ocorridas a partir dos prprios governantes nacionais que, para sanar as dvidas pblicas contradas ao longo dos anos e por presso dos credores internacionais, passaram a atribuir ao aparelho do Estado, , entre outras razes mais especialmente folha de pagamento dos servidores, os motivos da ausncia de recursos financeiros. Esses fatores impulsionaram o enxugamento dos salrios, muitas vezes dos prprios quadros de pessoal com planos de demisso voluntria, atitudes que, associadas caracterstica de longa permanncia no mesmo posto de trabalho e cada vez maior ausncia de perspectivas dada pela conjuntura nacional, insuflaram um cenrio de desmotivao e conseqente acomodao dos servidores com relao s suas instituies e mesmo s suas atividades mais diretas. Aes no sentido de reverter esse quadro mostram-se cada vez mais urgentes, j que tanto por conta dos avanos tecnolgicos como da viso cultural da sociedade globalizada, as transformaes e mudanas so cada vez maiores e mais rpidas, tornando os indivduos cada vez mais exigentes com os servios que recebem e com os produtos que adquirem. Por outro lado, o investimento no homem tornou-se o centro das aes de administrao, justamente porque atravs dos processos de qualificao e de capacitao das pessoas podem-se produzir as mudanas necessrias para o acompanhamento das transformaes do mundo atual.

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Prevendo a promoo de aes em busca das mudanas necessrias para a reverso do panorama instalado no servio pblico, e refletido na universidade pblica, em julho de 1999 foi criado, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), um grupo de trabalho que tinha como misso a confeco de um novo plano de carreira para o corpo tcnico-administrativo da Universidade, uma vez que o plano em vigor estava desacreditado pelos funcionrios naquele momento e a implantao de uma nova poltica de recursos humanos (RH) havia sido fortemente reivindicada pelos servidores e sua entidade representativa na campanha eleitoral para Reitor, ocorrida em 1998. Membros do grupo de trabalho composto majoritariamente por representantes das carreiras tcnico-administrativas ento existentes na Unicamp tinham, onze anos antes, participado da implantao e do encaminhamento do plano de carreira at ento existente, o que propiciou familiaridade com o assunto. Foi tambm contratada uma consultoria externa para orientao dos trabalhos do grupo. Concomitantemente ao incio da realizao do trabalho aqui descrito, a Diretoria Geral de Recursos Humanos DGRH estava sendo totalmente reestruturada, visando criar a base necessria para se estabelecer uma nova poltica de RH. Assim, colegiados representativos e instrumentos legais para a criao e implantao de um cenrio de debate participativo foram sendo elaborados, todas essas aes culminando conjuntamente na proposta do novo plano de carreira para os servidores da Universidade. Os problemas enfrentados, as dificuldades de implantao, o tempo necessrio para cada ao em contraste com a urgncia das expectativas e com o panorama da universidade pblica e sua busca pela excelncia e qualidade especialmente no caso de uma universidade estadual paulista o que se pretende tratar neste trabalho, tentando traar uma anlise o mais imparcial possvel, porque de fora do trabalho realizado. Para isso, o texto do estudo foi desenvolvido com a seguinte estrutura: No Captulo I so mostradas, a partir de levantamentos bibliogrficos, as principais formas de administrao estabelecidas no correr dos tempos at a atualidade, enfocando ao final as prticas utilizadas na gesto de recursos humanos, permitindo assim que a anlise do instrumento de gesto proposto para a administrao de recursos humanos no servio pblico seja

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feita, primeiro, pelo conhecimento das formas de administrao que, mesmo depois de dcadas, continuam presentes nas organizaes atuais. No Captulo II apresentada uma viso geral sobre o servio pblico no Brasil, como visto atualmente pela sociedade, suas dificuldades e dilemas, passando pelos mtodos de administrao, as propostas de modernizao e os projetos de qualidade e enfocando ainda mais especificamente a questo da universidade pblica, as crises e as dificuldades enfrentadas em sua gesto na atualidade, situando o macro-ambiente do trabalho em estudo. No terceiro captulo reforado o panorama que motivou o desenvolvimento do trabalho, e por conseqncia do estudo em questo, descrevendo os mtodos e documentos utilizados para a realizao desta anlise e suas fontes. No Captulo IV descrito o cenrio da Unicamp poca da realizao da experincia e so apresentados os detalhes sobre o mtodo utilizado para a criao e implantao do Plano de Carreira, Vencimentos e Salrios para os servidores da Universidade, bem como seus primeiros resultados. No Captulo V so mostrados, atravs de anlises documentais de atas de reunies de rgos colegiados da Unicamp, onde o assunto foi foco de debate Consu, CAD e CRH , e tambm de boletins e informativos publicados na ocasio, o ambiente poltico e as reaes das representaes de servidores ao plano proposto. Finalizando, no Captulo VI os dados do trabalho so discutidos frente aos dados da literatura, fazendo uma anlise dos principais resultados encontrados, levando s concluses apresentadas no Captulo VII. Seguem-se ainda as Referncias Bibliogrficas e os Anexos, que permitem a consulta mais detalhada de documentos que foram estudados e/ou produzidos durante a experincia.

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I. FORMAS DE ADMINISTRAOA finalidade deste captulo permitir que a anlise da experincia de elaborao e implantao de um plano de carreira para os servidores da Unicamp, objeto deste estudo, receba o aporte das teorias que tratam com a gesto administrativa, especialmente no que se refere aos recursos humanos, permitindo que as prticas desenvolvidas sejam iluminadas e criticadas sob tais enfoques tericos.

Numa organizao esto presentes cinco variveis, em permanente interao: tarefas, estrutura, pessoas, ambiente e tecnologia. Esses cinco fatores e suas interrelaes formam um sistema, onde cada qual influencia e influenciado pelos outros componentes. Assim, as principais caractersticas de uma organizao so decorrentes da forma como a interrelao e a interdependncia entre essas variveis so administradas e o grande desafio da administrao moderna achar o equilbrio e a adequao entre esses fatores. As formas de administrao foram sendo construdas atravs de diferentes influncias ao longo dos sculos. Primeiro, a influncia de filsofos como Plato (429 a.C. 347 a.C.) que descreve a democracia como forma de governo e de administrao dos negcios pblicos , Aristteles (384 a.C. 322 a.C.), discpulo de Plato que trata das trs formas de organizao do Estado e da Administrao Pblica: Monarquia, Aristocracia e Democracia e Ren Descartes (1596 1650) que celebrizou-se pela descrio de seu mtodo filosfico denominado mtodo cartesiano, sendo que vrios dos princpios da Administrao como os da diviso do trabalho, da ordem e do controle, so decorrncias dos princpios cartesianos (CHIAVENATO, 2000, p. 18). Organizaes que tiveram influncia fundamental na construo das formas de administrao foram a Igreja Catlica que, com seu mtodo de hierarquia, mesmo espalhada4

pelo mundo todo dirigida por uma nica autoridade maior, o Papa, que por sua vez dotado da orientao divina superior e a Organizao Militar, tendo como ncleo central de suas organizaes o princpio da unidade de comando em que cada subordinado s pode ter um superior e o princpio de direo, que permite que cada soldado saiba o que deve fazer, de acordo com o que se espera dele. Tambm os conceitos de organizao e estratgia utilizados nas empresas so derivados das estratgias militares (CHIAVENATO, 2000). poca da Revoluo Industrial, mesmo com todas as modificaes ocorridas nos meios de produo, as formas de administrao no foram alteradas, prevalecendo ainda a hierarquia e a disciplina apreendidas da Igreja e do Exrcito. Ao final do sculo XVIII, passou o vigorar o pensamento liberal, definindo a economia como sendo desvinculada de qualquer influncia estatal, e a mo-de-obra sendo regida como qualquer outro bem, pelos donos do capital e sob as leis do mercado e da livre concorrncia. Adam Smith (1723-1790) foi o fundador da economia clssica, cuja idia central a competio, que funciona espontaneamente pela livre concorrncia, e a definio de que o papel do Estado (alm de garantir a lei e a ordem) o de intervir no cenrio econmico apenas quando no funcionem adequadamente os mecanismos de auto-regulao do mercado. Mas a forma de produo capitalista ganhou fora e espao, medida que ganhou escala, levando conseqente concentrao do capital em mos de poucos empreendedores, provocando o aparecimento de grandes monoplios e desregulando as relaes de organizao do trabalho e de concorrncia de mercado, diminuindo, com isso, a influncia do liberalismo econmico. Segundo Tragtenberg (1985), o capitalismo mudou essencialmente a forma de organizao do trabalho que passou de artesanal a especializado, sendo subdivididos os ofcios qualificados e tirando parte do valor daqueles que permaneceram. O sindicalismo, no incio do sculo XX, imps-se como forma de organizao do proletariado para contrapor-se s imposies do capitalismo, provocando, com suas batalhas, os primeiros passos para os processos de racionalizao do trabalho. Na virada do sculo XIX para o sculo XX, grandes corporaes sucumbiram pela falta de capacidade de gerenciamento, devido ao tamanho dos conglomerados. A empresa interdepartamental surgiu para organizar as grandes corporaes formadas pelas fuses de empresas, conseqncia das aquisies contnuas realizadas pelos empreendedores. Surgiu,5

assim, o cenrio propcio para a abordagem cientfica na administrao das organizaes, que pregava a nfase nas tarefas e a diviso do trabalho entre os que pensam e os que executam. Criada por Frederick Winslow Taylor (1856-1915) no incio do sculo XX, visava utilizar mtodos cientficos para aumentar a produtividade e diminuir as perdas das organizaes industriais, alm de promover a harmonia industrial em vez da discrdia entre patres e trabalhadores. A Administrao Cientfica de Taylor acreditava que empregadores e empregados tm objetivos que se completam, no antagnicos:(...) a prosperidade do empregador no pode existir, por muitos anos, se no for acompanhada da prosperidade do empregado, e vice-versa, (...) preciso dar ao trabalhador o que ele mais deseja altos salrios e ao empregador tambm o que ele realmente almeja baixo custo da produo (TAYLOR, 1985, p. 30).

Taylor cresceu no meio de austeros representantes de uma minoria religiosa descendente dos protestantes:Taylor, oriundo de uma famlia de quakers, foi educado na observao estrita do trabalho, disciplina e poupana. Educado para evitar a frivolidade mundana, converteu o trabalho numa autntica vocao (TRAGTENBERG, 1985, p. 73).

Acreditava, ainda, que o empregado trabalha no porque gosta, mas porque precisa do salrio que lhe pago para sobreviver. Assim, propunha que: a vadiagem, um dos grandes males da natureza humana segundo sua viso religiosa, inerente ao homem e precisa ser combatida. Para isso, deve haver o mximo de especializao das tarefas, para que cada empregado possa ser treinado mais e mais em uma nica atividade e controlado por um supervisor e a superviso tambm deve ser especializada para ampliar o controle; atravs da Organizao Racional do Trabalho (ORT), com a medio dos tempos e dos movimentos, o administrador deve pensar cientificamente a tarefa para que ela seja executada da maneira mais eficiente pelo operrio, que por sua vez ser selecionado levando-se em conta as aptides especficas para cada tarefa, especialmente as fsicas. A definio do tempo padro dada atravs da cronometragem dos tempos necessrios para a execuo de uma tarefa, subtraindo-se os movimentos inteis e somando-se o tempo para as necessidades pessoais dos operrios, estabelecendo finalmente o tempo mdio para a realizao de uma6

atividade. Assim tambm se define o melhor mtodo para aquele trabalho. Portanto, a administrao fica com o planejamento e a superviso, enquanto o trabalhador fica com a execuo, separando claramente as atividades de administrao das de execuo; devem ser dados incentivos salariais e prmios para aqueles que conseguirem realizar mais que os 100% previstos para a tarefa. Assim o empregado, cujo interesse apenas financeiro, estar se dedicando cada vez mais ao trabalho e aumentando a produo. Todos esses pressupostos, segundo Taylor (1985), permitiriam que houvesse maiores lucros e, conseqentemente, maiores possibilidades de ganho salarial, atendendo aos interesses e trazendo satisfao s classes tanto de empregadores como de empregados. Frank B. Gilbreth (1868-1924), um engenheiro que acompanhou Taylor em seus estudos dos tempos e dos movimentos, criou o conceito de movimentos inteis em contraposio aos movimentos elementares, definindo que todo trabalho manual pode ser reduzido a um mnimo de movimentos para sua realizao, movimentos que, individualmente, constituem a unidade fundamental do trabalho. As observaes de Gilbreth impulsionaram tambm o estudo da chamada fadiga humana, que leva baixa de produtividade, sendo um redutor da eficincia. Props alguns princpios de economia de movimentos relativos tanto ao uso do corpo humano, como arrumao do local de trabalho, das ferramentas e dos equipamentos para a realizao da tarefa. Estes estudos, segundo Tragtenberg (1985), foram realizados com os operrios em melhores condies fsicas e no com o operrio mdio. Isso foi enfatizado por Taylor (1985), ao descrever reiteradamente os critrios de seleo, relacionando-os com as aptides de tamanho e fora adequados execuo de uma tarefa. Justificava inclusive que um operrio sem a perfeio dessas qualificaes, se contratado para um trabalho que delas dependa para o timo de sua realizao, seria infeliz por no poder realiz-las na plenitude da produtividade mxima desejada. Embora o conforto do operrio e a melhoria das condies fsicas do ambiente de trabalho passassem a ser pensados, foram-no com o intuito bsico de evitar a fadiga aqui descrita e aumentar a eficincia do trabalhador. Como resultado desses estudos, investiu-se na especializao do operrio na realizao de uma nica tarefa, com movimentos contnuos e repetitivos, de acordo com os padres de desempenho e procedimentos estabelecidos. A idia bsica era que a eficincia aumenta com a7

especializao: com a repetio e a uniformidade, so diminudos os riscos de erros e de variabilidade. Assim, para se obter o mximo de especializao de um trabalhador, os engenheiros da poca reduziram ao mnimo possvel as tarefas, que assim poderiam ser melhor supervisionadas por apenas um homem, uma vez que a especializao tambm se daria ao nvel da superviso a chamada administrao funcional. Segundo Chiavenato (2000), a execuo de tarefas simples e repetitivas, com alto grau de especializao, limitam, para o indivduo que as executa, o acompanhamento das inovaes da atualidade, privando-o da satisfao no trabalho e violando a dignidade humana. Por esse motivo, os trabalhadores da poca perceberam a situao como degradante e humilhante, pois no havia qualquer exigncia de raciocnio ou significado psicolgico no trabalho. Para March e Simon (1972, p. 23) a Teoria da Administrao Cientfica apresenta:(...) proposies pressupondo que os membros da organizao, especialmente os empregados, so essencialmente instrumentos passivos, capazes de executar o trabalho e receber ordens, mas sem poder de iniciativa e sem exercerem influncia provida de qualquer significao.

Ainda sobre essa forma de administrao proposta por Taylor, encontramos em Tragntenberg (1985, p.194):A industrializao extensiva inerente ao esquema de Taylor implica a proliferao do trabalho desqualificado que coexiste com a estrutura administrativa monocrtica, alienante, onde a principal virtude a obedincia a ordens.

Somando-se Administrao Cientfica iniciada por Taylor, surgiu a Teoria Clssica da Administrao, que foi desenvolvida por Henry Fayol (1841-1925), aplicando importante nfase estrutura das organizaes e no mais s tarefas, como Taylor. Para Fayol (1976), toda organizao apresenta seis funes: tcnicas produo de bens ou de servios; comerciais compra, venda e permuta; financeiras procura e gerncia de capitais; de segurana proteo e preservao do patrimnio e das pessoas; contbeis inventrios, registros, balanos, custos, estatsticas; e administrativas que integram, na cpula, as outras cinco funes, coordenando-as e sincronizando-as, pairando sempre acima delas, de

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onde se depreende que as funes do administrador so prever, organizar, comandar, coordenar e controlar. As funes administrativas esto presentes em todos os nveis da organizao, embora a proporcionalidade entre estas e as funes operacionais seja dada pelo nvel hierrquico: quanto mais alto o nvel, maior a sua proporo. Para Fayol, a organizao tem um estrutura monocrtica, determinada de cima para baixo como as organizaes eclesisticas e militares , centralizando as decises e criando as unidades de comando. A escala hierrquica rgida e cada subordinado responde a um s superior (CHIAVENATO, 2000; TRAGTENBERG, 1985). A especializao do trabalho dividida pelas reas/setores da organizao e pode dar-se tanto no sentido vertical autoridade e responsabilidade como no horizontal nas diferentes atividades da organizao. O autor acreditava que quanto mais departamentalizada, mais eficiente seria uma organizao. Fayol criou tambm os conceitos de coordenao o coordenador responsvel pela indicao de que h um nico alvo ou objetivo a ser atingido e pela organizao do grupo para esse fim; de rgos de linha que so os estabelecidos de acordo com o princpio escalar; e de rgos de staff que no esto em linha e funcionam como assessores, consultores em sua rea de especializao, quando solicitados pelos rgos de linha, no possuindo autoridade de comando. Assim, a Teoria Clssica pensou a organizao como imvel, rgida e lgica, com princpios preestabelecidos que devem ser obedecidos por todos. Apesar de primordialmente emprica, embora pregasse a anlise cientfica, pela primeira vez foi pensada a organizao como um todo, tentando visualizar sua estrutura. Segundo Chiavenato (2000), as maiores crticas Teoria Clssica referem-se ao estabelecimento de princpios, com a nfase de dogmas. chamada tambm de Teoria da Mquina, devido sua correlao determinista: a determinadas aes sero obtidos efeitos e conseqncias previsveis. Sua abordagem simplificada e incompleta, uma vez que no considera o elemento humano na organizao.

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Como movimento de reao Abordagem Clssica da Administrao, a Teoria das Relaes Humanas foi iniciada por volta de 1930, a partir de experimentos de Elton Mayo (18801949) e colaboradores. O fator psicolgico foi observado em experimentos realizados em uma fbrica da Western Electric Company, no bairro de Hawthorne, em Chicago, nos Estados Unidos da Amrica, inicialmente previstos para observar outros elementos como perodos de descanso, lanches, reduo de jornada, etc. Foram observadas alteraes importantes quando se diminuam as presses de superviso e permitiam-se conversas entre os trabalhadores, criando, portanto, um ambiente amistoso. Conseqentemente, o grupo estabelecia objetivos comuns de equipe, como o de aumentar a produo, o que no era objeto de estudo do trabalho. O grupo de pesquisadores centrou, ento, o foco da observao, nas relaes humanas no trabalho. A partir dessas observaes realizadas durante o experimento de Hawthorne, foram definidas algumas premissas (CHIAVENATO, 2000): a especializao das tarefas cria trabalhos montonos e repetitivos, desmotivando o trabalhador e afetando sua eficincia; o empregado pode ter todas as condies fsicas para a realizao do trabalho, mas se no estiver integrado, no conseguir bons nveis de produo: os empregados existem em grupos e os grupos criam regras de convivncia que so respeitadas por todos: nos grupos sociais, cada qual com sua personalidade influencia as atitudes dos demais e procura ajustar-se s condies do grupo a que pertence; os grupos informais podem se contrapor aos interesses formais da organizao, quebrando os sistemas criados pelas estruturas e os padres estabelecidos: o indivduo prefere produzir menos e ganhar menos para continuar sendo aceito em seu grupo, contrapondo o homem descrito por Taylor; os aspectos emocionais no previsveis interferem diretamente na Teoria das Relaes Humanas. Mayo via a sociedade industrial destruindo as relaes bsicas de convivncia, como a famlia, e tornando a empresa o novo locus do convvio social, onde o ser humano ir buscar10

satisfazer suas necessidades de motivao. A incompatibilidade entre os objetivos da empresa e os objetivos do trabalhador ir provocar srios conflitos sociais, sendo as relaes humanas e a cooperao as chaves para se evitar o conflito social na sociedade industrial. Para o criador da Teoria das Relaes Humanas, os conflitos devem ser combatidos por serem nocivos sociedade, no vendo possibilidades de utilizao construtiva de conflito social, que aparece para ele como a destruio da prpria sociedade (TRAGTENBERG, 1985, p. 81). Para Mayo, os nveis de motivao do homem eram hierarquizados na seguinte seqncia: necessidades fisiolgicas, como alimentao, sono, atividade fsica, satisfao sexual, abrigo e proteo, e segurana fsica contra os perigos; necessidades psicolgicas, como segurana ntima, autoconfiana, afeio e necessidades de auto-realizao, decorrentes da educao e da cultura. Segundo esta Teoria, toda necessidade humana pode ser satisfeita, frustrada ou compensada e o atendimento, ou no, das necessidades determina o moral do indivduo e conseqentemente o moral do grupo. Este ltimo, por sua vez, determina o clima organizacional. A conduo de um grupo social dada pela liderana, que pode ser autocrtica, democrtica ou liberal. A comunicao tambm fator importante na Teoria das Relaes Humanas: atravs dela que o gerente faz saber aos subordinados como e porque ser desenvolvida uma tarefa e, na outra via, recebe as informaes sobre como esto sendo realizadas as aes. A partir das idias de Mayo, passou-se a observar a organizao informal que ocorre naturalmente independente da organizao formal e agrupa pessoas por similitude de pensamentos ou atividades, da mesma forma que as distancia por antipatias ou diferena de status. A incompreenso da organizao no formal pode levar administrao e/ou manipulao erradas da situao, provocando a oposio da organizao no formal organizao formal, em desarmonia com os objetivos da empresa. Chiavenato (2000) afirma que, embora apresente pontos importantes no evidenciados na Administrao Cientfica, a Teoria das Relaes Humanas tambm faz uma anlise unilateral da administrao: coloca o administrador como apaziguador de conflitos humanos, sem pensar a organizao onde as pessoas atuam. A utilizao desta teoria na administrao passou a ser vista como uma forma de manipular os trabalhadores, visando o aumento da produo, atravs do atendimento s suas necessidades psicolgicas, tornando-os satisfeitos e conseqentemente alienados.11

A partir de 1940 desenvolveu-se a Administrao Burocrtica, em virtude da traduo para o ingls das obras do alemo Max Weber (1864-1920), para atender s lacunas das teorias anteriores (Administrao Cientfica pelo seu mecanicismo e das Relaes Humanas pelo seu romantismo ingnuo) e tambm porque estas mostravam-se insuficientes para atender s necessidades das organizaes, cada vez maiores e mais complexas. Possui enfoques intra e inter-organizacional: envolve a prpria organizao e tambm suas relaes com outras organizaes dentro de uma sociedade maior. Portanto apresenta, pela primeira vez, um modelo integrado de organizao, voltando-se para a descrio e a explicao dos fatos, permitindo ao administrador escolher a melhor forma de lidar com a organizao, sem no entanto estabelecer princpios, normas e prescries prontas. Se comparada a Administrao Burocrtica com as teorias de Taylor que preocupou-se em desenvolver mtodos cientficos e precisos para as rotinas da organizao, contribuindo com a gerncia; e de Fayol que preocupou-se com as funes diretivas , ser possvel visualizar que Weber pensou a organizao como um todo, inserida na sociedade, embora ainda sem prever as mudanas de ambiente, tratando-o como se fosse algo absolutamente esttico e previsvel (CHIAVENATO, 2000). A burocracia tem razes na Antigidade histrica, e foi aperfeioada no decorrer da Revoluo Industrial com a finalidade de administrar as atividades de uma empresa baseando-se na adequao dos meios aos fins pretendidos, visando adquirir o mximo de eficincia na consecuo dos objetivos. Os estudos de Weber pressupem que o moderno sistema de produo baseia-se no que ele denomina de tica protestante, que significa considerar o trabalho como ddiva divina e o excesso de ganhos como algo que no pode ser ostentado e que deve ser, portanto, poupado. De acordo com a Teoria Burocrtica, autoridade significa poder (o inverso no necessariamente verdadeiro) e depende da legitimidade. O poder conduz dominao de uns por outro(s) e esta, para ser exercida, precisa de um aparato administrativo. Chiavenato (2000) apresenta trs tipos de autoridade definidas pela burocracia, vistas a seguir. A Autoridade Tradicional, tpica da sociedade patriarcal, pode ser exercida na forma patrimonial, que quando os empregados so servidores pessoais do senhor e dependem12

economicamente dele, ou na forma feudal, que ocorre quando os empregados vassalos e suseranos so aliados e fiis ao senhor e ganham dele seus prprios domnios para administrar. A Autoridade Carismtica, que possui um lder, com o talento do domnio sobre os demais e que escolhe seu pessoal segundo a confiana que deposita na devoo deles, no dependendo da qualificao e do conhecimento. Finalmente a Autoridade Legal, Racional ou Burocrtica, em que existem regras impessoais e escritas que regem as relaes entre os empregados, seus colegas e seus superiores e onde os meios de administrao so concentrados no topo da hierarquia. Para Max Weber (1979), a burocracia produz o mximo da eficincia e tem como principais caractersticas: Leis, normas e regulamentos: constituio, estatutos cobrem todas as reas da organizao, definindo inclusive as relaes hierrquicas de poder. Comunicaes formais: sempre por escrito. Racionalidade e diviso do trabalho: coerente com os objetivos, toda a estrutura tem sua descrio sobre as atribuies de cada participante e os limites de suas atividades. Portanto, h uma diviso sistemtica do trabalho, visando a maior eficincia da estrutura para o alcance dos objetivos. Impessoalidade nas relaes: as pessoas so consideradas como ocupantes de cargos e de funes, e assim tratam e so tratadas por seu superior. Hierarquia da autoridade: os cargos esto dispostos em uma estrutura hierrquica de poder, com descrio e regras estabelecidas. Assim, o funcionrio est livre das arbitrariedades do poder. Rotinas e procedimentos padronizados: conjunto de regras e normas que ajustam o funcionrio s exigncias do cargo e s exigncias da organizao a mxima produtividade. Os padres facilitam a avaliao do desempenho de cada participante. Competncia tcnica e meritocracia: os mesmos critrios so utilizados em toda a organizao para admisso, transferncia e promoo dos funcionrios, critrios estes baseados em mrito, capacidade e competncia do funcionrio no desempenho das tarefas de seu cargo ou funo.

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Administrao por especialista: o administrador da organizao deve ser um profissional que se especializa na gesto, separando claramente os seus bens dos bens que administra. Profissionalizao dos participantes: especialista, assalariado, ocupante de cargo, nomeado pelo superior hierrquico, com mandato determinado por um estatuto; segue carreira dentro da organizao ( um profissional que faz do trabalho a sua carreira, ao longo de sua vida), no possui a propriedade dos meios de produo que administra; fiel ao cargo e identifica-se com os objetivos da empresa; um administrador profissional e tende a controlar cada vez mais as burocracias (pode ter mais poder sobre a organizao que um grande acionista). Completa previsibilidade do funcionamento: possvel prever antecipadamente e rotinizar todas as ocorrncias. Assenta-se numa viso padronizada do comportamento humano. A racionalidade burocrtica prev que os objetivos gerais da organizao sero buscados por todos os seus integrantes, cada qual representando seu papel, sendo consideradas sempre as metas coletivas e no as individuais. Segundo Chiavenato (2000), na burocracia h tambm os cargos ocupados por chefes no burocrticos, que so responsveis pela ligao dos burocratas com a racionalidade, influindo psicologicamente e reforando o compromisso com as regras da organizao. Este nico indivduo, perante o qual as emoes e sentimentos dos burocratas se associam, quando se ausenta provoca o que Weber chama de crise da sucesso, que acompanhada por um perodo de instabilidade. O autor descreve ainda as anomalias de funcionamento do sistema burocrtico as disfunes da burocracia , no previstas pelo modelo weberiano, e que so conhecidas como a prpria burocracia pela maioria dos leigos: Internalizao das regras e apego aos regulamentos: a transformao das normas e regulamentos em objetivos.(...) o funcionrio adquire viseiras e esquece que a flexibilidade uma das principais caractersticas de qualquer atividade racional. (...) o funcionrio burocrata torna-se um especialista, no por possuir conhecimento de suas tarefas, mas por conhecer perfeitamente as normas e os regulamentos que dizem respeito ao seu cargo ou funo (CHIAVENATO, 2000, p.209).14

Excesso de formalismo e de papelrio: a ausncia de uma anlise do que precisa ser registrado de fato e o no funcionamento da estrutura do sistema da forma prevista provocam a desconfiana e levam aos excessos de registro. Resistncia a mudanas: a repetio e a previsibilidade da burocracia proporcionam segurana a quem as executa. Qualquer tentativa de mudana provoca o medo, a insegurana e portanto a resistncia, que pode ser passiva ou agressiva. Despersonalizao do relacionamento: as pessoas so conhecidas pelos ttulos dos cargos que ocupam ou at mesmo por um nmero de registro. Categorizao como base do processo decisrio: quem decide sempre aquele que ocupa o cargo hierrquico mais alto, mesmo que nada conhea sobre o assunto. Superconformidade a rotinas e procedimentos: as regras e rotinas passam a ser absolutas e sagradas para o funcionrio, que se torna incapaz de compreender o significado de suas tarefas para a organizao como um todo e que passa a trabalhar em funo das rotinas e procedimentos e no dos objetivos da empresa, atendendo estritamente ao descrito na norma e restringindo-se ao desempenho mnimo. Perdem-se as possibilidades de iniciativa, criatividade e inovao. Exibio de sinais de autoridade: utilizao ostensiva de smbolos de status para demonstrar, aos olhos de todos, aqueles que detm o poder (estacionamento e restaurante prprios dos diretores, uso de smbolos no uniforme como no exrcito, etc.). Dificuldade no atendimento a clientes e conflito com o pblico: pela burocracia, todos os clientes devem ser atendidos de forma padronizada, o que gera a espera, a irritao e as conseqentes crticas e reclamaes. O funcionrio passa a perceber essas presses como ameaa sua prpria segurana e se defende por trs do corporativismo. Esta disfuno provoca o fechamento ao cliente.

Todas as formas de administrao anteriormente descritas tm em comum o fato de pensarem o todo como algo que pode ser decomposto para que possa ser melhor analisado, colocando cada elemento visto sob seu prprio ngulo, sem as interferncias de outras partes; ou

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ainda de no preverem as influncias do ambiente externo, das organizaes informais e de outros fatores nem sempre possveis de serem prognosticados. Justamente a percepo de que a totalidade obtida da interligao dos elementos, analisando as influncias que uns exercem sobre os outros, a base da Teoria de Sistemas, para a qual a soma das partes apresenta caractersticas prprias que no so encontradas em nenhum dos elementos isoladamente: a esta capacidade denomina-se sinergia. Esta teoria prev que todo sistema possui um propsito ou um objetivo a ser alcanado pelo conjunto, o que significa que a alterao em uma de suas partes provoca mudanas em todas as demais. Prev tambm que um sistema existe em um meio e por ele condicionado, sendo dois os requisitos para que se mantenha firme e equilibrado: homeostasia (garante a rotina do sistema) e adaptabilidade (leva ruptura, mudana, inovao). Katz e Kahn (apud CHIAVENATO, 2000, p. 364) desenvolveram um modelo aplicando a Teoria dos Sistemas teoria administrativa:(...) cada organizao cria sua prpria cultura com seus prprios tabus, costumes e usos. A cultura do sistema reflete as normas e valores do sistema formal e sua reinterpretao pelo sistema informal, bem como reflete as disputas internas e externas das pessoas que a organizao atrai, seus processos de trabalho e distribuio fsica, as modalidades de comunicao e o exerccio da autoridade dentro do sistema. Assim como a sociedade tem uma herana cultural, as organizaes sociais possuem padres distintivos de sentimentos e crenas coletivos, que so transmitidos aos novos membros.

A Teoria da Contingncia leva em conta todas as teorias administrativas anteriores dentro do prisma da Teoria de Sistemas. Os antigos conceitos so redimensionados, atualizados e integrados dentro da abordagem sistmica para permitir uma viso conjunta e abrangente, levando concluso de que no h um nico mtodo ou tcnica vlido para qualquer tipo de situao, mas sim uma variedade deles, proporcionada pelas diversas teorias administrativas, e que so apropriados para determinadas situaes. A partir da Teoria da Contingncia passou-se a aceitar o homem complexo sujeito ativo e no objeto da ao, aceitando a enorme variabilidade humana dentro das organizaes: em vez de selecionar as pessoas e padronizar o comportamento humano, preferiu-se realar as diferenas

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individuais e respeitar a personalidade das pessoas, aproveitando e canalizando as suas diferentes habilidades e capacidades (CHIAVENATO, 2000). Surgiu assim o conceito de clima organizacional para explicar a qualidade ou propriedade do ambiente organizacional que percebida ou experimentada pelos participantes da organizao e que influencia o seu comportamento. O clima organizacional tem uma influncia poderosa na motivao das pessoas e sobre o desempenho e satisfao no trabalho. As melhores empresas para se trabalhar cuidam exaustivamente da melhoria do clima organizacional.

A Era da Informao surgiu com o avano do desenvolvimento tecnolgico e da tecnologia da informao. O capital financeiro cedeu lugar para o capital intelectual e a nova riqueza passou a ser o conhecimento, necessrio para mover o aparato tecnolgico cada vez mais complexo. A tecnologia da informao passou a provocar transformaes em ciclos cada vez mais curtos: embora deva-se conhecer as aes do passado, no se pode repeti-las. O futuro deve sempre trazer o novo, gerando enormes incertezas. As principais transformaes provocadas pela tecnologia da informao foram a compresso do espao, a compresso do tempo e a conectividade, aproximando os diferentes lugares do mundo de forma cada vez mais rpida. A tecnologia da informao passou a ser o principal instrumento a servio do homem, desvalorizando a funo do intermedirio e fazendo com que a globalizao da informao propiciasse, cada vez mais, a globalizao da economia.A chegada da era da informao trouxe um novo contexto e uma avalanche de problemas para as organizaes. A velocidade e a intensidade das mudanas foi muito alm do que se esperava. O diferencial entre o que as organizaes esto fazendo e o que deveriam fazer tornou-se enorme e inultrapassvel. A soluo? Recorrer a medidas extremas e rpidas para a busca da sobrevivncia. E da excelncia. Assim, comearam a surgir modismos na Administrao (CHIAVENATO, 2000, p. 432).

Continuando a pensar a tecnologia da informao, tambm Tom Peters (2001) acredita que as duas foras que esto mudando o mundo so a tecnologia e a globalizao. Os avanos so to rpidos que os riscos de fracasso so cada vez maiores. Citado por Peters (2001, p. 21) Gary Hamel, em artigo na Harvard Business Review, diz que em nenhuma outra poca o mundo

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tratou os revolucionrios de forma to amistosa e o establishment de forma to hostil, reforando que essa mxima vale tanto para indivduos quanto para empresas. Como j visto, o montante de informaes disseminadas infinitamente maior a cada dia e a busca dessas informaes possibilitada pela tecnologia. No entanto, informao no gera conhecimento se o indivduo no estiver preparado para receb-la. A palavra aprendizado, no uso contemporneo, perdeu seu significado central: tornou-se sinnimo de internalizao de informaes, que tem pouca relao com o verdadeiro aprendizado, aquele que recria, tornando-nos capazes de fazer algo completamente novo, mudando nossa viso a respeito das coisas, tornando-nos parte do processo gerativo da vida (SENGE, 2003, p. 47). Uma pessoa pode at receber mais informaes graas tecnologia, mas somente conseguir transform-las em conhecimento se possuir as capacidades necessrias para aproveitlas. A pessoa somente consegue de fato aprender algo mais ao receber uma informao nova, se j souber muito a respeito do assunto (SENGE, 2001). Ainda segundo o autor, aprender, em chins, significa estudar e praticar constantemente. Portanto, ser uma organizao que aprende no pode ser um objetivo a ser alcanado, pois isso significaria o fim do processo de busca. Organizaes que aprendem, na proposta de Senge (2003, p. 37) so:organizaes nas quais as pessoas expandem continuamente sua capacidade de criar os resultados que realmente desejam, onde se estimulam padres de pensamento novos e abrangentes, a aspirao coletiva ganha liberdade e onde as pessoas aprendem continuamente a aprender juntas.

Tambm o lugar onde, ao conhecer melhor sua realidade, as pessoas descobrem como fazer para mud-la, melhor-la, porque a verdadeira aprendizagem permite, ao ser humano, fazer coisas novas, que antes no se sentia capaz de realizar. Senge (2003) estabelece dois conceitos sobre a aprendizagem: adaptativa, necessria para a sobrevivncia, mas que no pode estar dissociada da segunda, a aprendizagem generativa, esta sim responsvel pela criao de novas possibilidades com relao ao futuro. Penrose (1959) descreve duas formas de aquisio do conhecimento: atravs do aprendizado formal, por meio de professores ou pela leitura, podendo ser expressado e transmitido a outros; e como resultado do aprendizado adquirido pela experincia pessoal. Penrose (1959) explica que, com o passar do tempo, a experincia pode ser transformada em18

aes objetivas, estas sim podendo ser repassadas. Mas a experincia, em si, jamais poder ser transmitida. Produzir uma mudana freqentemente sutil nos indivduos, no podendo ser separada deles. Senge (2003) aponta algumas das deficincias de aprendizagem existentes na maioria das empresas e que descreve sob a forma de pensamentos comuns a elas: Eu sou o meu cargo. Confundimos nosso cargo com a nossa prpria identidade, medida que fomos treinados a vida toda para sermos leais a ele. Quando algum responde o que faz para viver, geralmente descreve as tarefas que executa, dificilmente responde sobre o propsito maior da empresa na qual atua. Assim, as pessoas se vem dentro de um sistema onde tm pouca ou nenhuma influncia, nada podendo realizar para as suas mudanas, vendo-se dentro dos limites do prprio cargo. O inimigo est l fora. A culpa sempre de algum ou de um agente externo. Tambm, como a deficincia anterior, uma decorrncia da viso no sistmica do mundo. A iluso de assumir o controle. O modismo da atitude proativa ser considerada como antdoto reatividade nem sempre real. Pode-se ser proativo sendo reativo ao mesmo tempo, se esta atitude representar simplesmente uma ao enrgica contra o inimigo, fazendo parecer que se tem o controle da situao; mas sem considerar todas as variveis envolvidas, atacando apenas um determinado ponto do sistema. A fixao em eventos. A preocupao com eventos de curto prazo como responsveis pelas aes da organizao. A parbola do sapo escaldado. O mecanismo interno dos sapos, responsvel pela deteco das ameaas sua sobrevivncia, regulado para identificar mudanas sbitas no meio ambiente, mas no as lentas e graduais. Assim, se o sapo colocado em uma panela de gua fria, e a temperatura da gua for subindo aos poucos, quando ele se d conta de que a gua est muito quente, pode ser tarde demais para reagir e pular fora da panela. Se no prestar ateno aos eventos sutis, a empresa poder tornar-se um sapo escaldado. A iluso de aprender com a experincia. O aprendizado advindo da experincia adquirida no mtodo de tentativa e erro , sem dvida, muito importante: tomamos uma atitude,19

observamos as conseqncias e ento assumimos ou no outra diferente (SENGE, 2003, p. 56-57). Mas quando as conseqncias somente so sentidas a longo prazo, ou em local distante ao da ao, como avaliar a eficcia dessa atitude?A est o dilema essencial da aprendizagem que as organizaes tm de enfrentar: aprendemos melhor com a experincia, todavia nunca experimentamos diretamente as conseqncias de nossas decises mais importantes (SENGE, 2001, p. 57).

O mito da equipe gerencial. No se pode garantir que um grupo de gerentes de vrias reas de conhecimento, colocados juntos para a soluo de um determinado problema, reproduza de fato uma atuao em equipe. Senge (2003) prope, para soluo das deficincias, uma administrao baseada no domnio de cinco disciplinas bsicas, definindo-as como um corpo de teoria e tcnica, as quais devem ser estudadas e dominadas para serem colocadas em prtica (SENGE, 2003, p. 44). O uso das disciplinas poderia transformar as organizaes controladoras e autoritrias em organizaes que aprendem, passando por ondas de experimentao e de progresso. As cinco disciplinas: 1. Domnio pessoal: aprender a expandir as capacidades pessoais para obter os resultados desejados e criar um ambiente organizacional que estimule todos os participantes a alcanar as metas escolhidas. Concentrar esforos no que deve ser realmente realizado dentro do foco especfico, aplicando as energias no alcance das mais altas aspiraes, no dispendendo recursos de forma desnecessria. 2. Modelos mentais: refletir, esclarecer continuamente e melhorar a imagem que cada um tem do mundo, a fim de verificar como moldar atos e decises. Todo ser humano possui pressupostos arraigados que precisa trazer superfcie para que se possa analis-los, e permitir que recebam novas influncias. 3. Viso compartilhada: estimular o engajamento do grupo em relao ao futuro que se procura criar e elaborar os princpios e as diretrizes que permitiro que esse futuro seja alcanado. As imagens de futuro compartilhadas so depositrias de compromisso e envolvimento em sua construo.

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4. Aprendizagem em equipe: trabalhar, no conjunto, as aptides individuais, de maneira que grupos de pessoas possam desenvolver inteligncia e capacidades maiores que a soma dos talentos de cada um. 5. Pensamento sistmico: criar uma forma de analisar e uma linguagem para descrever e compreender as foras e inter-relaes que modelam o comportamento dos sistemas. essa quinta disciplina que permite congregar todas as demais em um corpo coerente de teoria e prtica, pois todas precisam ser trabalhadas em conjunto para permitir a mudana dos sistemas com maior eficcia, para que possam agir mais de acordo com os processos do mundo natural e econmico. Uma empresa tradicional pode se transformar numa organizao que aprende, comeando pelo engajamento: deve-se criar um ambiente em que as pessoas efetivamente possam se engajar no que fazem e em que o crescimento pessoal e o da organizao estejam interligados. Essa a primeira condio (SENGE, 2001). Os seres humanos aprendem realmente quando h mudanas fundamentais em sua maneira de ver o mundo e alteraes significativas de suas capacidades.(...) todo aprendizado est diretamente relacionado com um processo de tomada de deciso, ou ento no tem sentido. Quando voc aprende uma coisa, aprende a fazer algo diferente; est tomando a deciso de fazer algo diferente. As mudanas mais significativas no processo de tomada de deciso no esto nas decises em si, mas na conscientizao (SENGE, 2001, p. 81).

Segundo Senge (2003, p. 38), as empresas de sucesso sero as que descobrirem como cultivar nas pessoas o comprometimento e a capacidade de aprender em todos os nveis da organizao. E para isso preciso investir nas pessoas e na manuteno de seu compromisso, porque o entusiasmo por curtos perodos pode ser fcil; j o comprometimento algo muito difcil de sustentar (SENGE, 2001, p. 80). As mudanas significativas envolvem processos de tomada de deciso: h a deciso de mudar. Portanto, dependem de atos conscientes sem conscientizao no h mudana. Portanto, para que as organizaes possam crescer e se adaptar a novas realidades de maneira criativa e inovadora preciso que o mximo de pessoas da organizao esteja envolvido e comprometido com o processo. E para isso, elas tambm precisam estar conscientes de que a

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mudana ser boa, no apenas para a empresa, mas tambm para os indivduos que compem o seu universo.(...) a maior parte dos insucessos na tentativa de mudar ocorre porque h um nmero muito pequeno de pessoas profundamente comprometidas com essas mudanas e essas pessoas simplesmente no tm poder para criar mudanas profundas nem capacidade de sustentar processos de aprendizado necessrios para mudanas de longo prazo (SENGE, 2001, p. 8).

As pessoas precisam acreditar para mudar, tambm porque toda mudana gera conflitos por afetar interesses especficos. Para que o conflito seja construtivo, fundamental que haja uma cultura de confiana e de respeito mtuo dentro da empresa (ADIZES, 2001, p. 34). Para o autor, o conflito, a diversidade no aumentam o risco de desintegrao, se houver um foco que funcione como elemento de coeso. A diversidade no solapa a unidade e tambm a unidade no deve ser usada para destruir a diversidade. fundamental que tanto a estrutura quanto o processo de tomada de deciso sejam organizados para criar um novo ambiente de confiana e respeito mtuo (ADIZES, 2001, p. 35). Depende da estrutura da organizao a distribuio de autoridade, responsabilidade e recompensas, que por sua vez determinam as diferentes tarefas das pessoas. Se essa estrutura for direcionada no sentido de que as pessoas possam dar o melhor de si naquilo que mais lhes agrada fazer, ou que sintam-se capazes e satisfeitas em realizar, ser possvel obter o seu engajamento. Para que se criem as chamadas organizaes que aprendem, Hamel e Prahalad (1995) afirmam que to importante quanto aprender tambm saber desaprender. Isto no significa abandonar o passado, mas pensar seletivamente sobre ele.O que impede as empresas de criar o futuro uma base instalada de idias as convenes inquestionadas, a viso mope das oportunidades e ameaas e os precedentes no desafiados que constituem a estrutura gerencial existente (HAMEL; PRAHALAD, 1995, p. 71). Quando a velocidade de evoluo gentica menor do que a velocidade de mudana ambiental, uma espcie, como os dinossauros, pode ser extinta. O equivalente nas corporaes so as demisses e a reestruturao em massa. S atravs do desaprendizado antecipado se pode esperar uma revoluo sem derramamento de sangue (HAMEL; PRAHALAD, 1995, p. 78).

Acompanhar as mudanas aprender novas estratgias e avanar com elas. Mas a necessidade de mudana precisa ser sentida por todos na organizao e preferencialmente antes da crise. Motivar o sentido de urgncia com relao mudana um grande desafio. E para isso 22

preciso prever as ameaas que podem afetar a organizao, para evit-las e para criar novas oportunidades com relao ao futuro.

Quadro 1. As seis etapas do processo de mudana de Adizes1. Fazer o diagnstico Reconhecer que a companhia tem um problema e no pode continuar como est. 2. Construir o empowerment Selecionar falhas pequenas para soluo rpida, aumentando a confiana dos funcionrios para poder lhes delegar poder e responsabilidade. 3. Estudar a misso e os valores Estudar a misso da companhia, para esclarecer o que deve fazer e que valores deve ter. 5. 4. Realinhar a estrutura com a estratgia Analisar a estrutura da organizao, levando em conta que ela talvez deva ser modificada para poder cumprir a misso e criar os valores desejados. Reorganizar os sistemas de informao Examinar os sistemas de informao com o objetivo de assegurar que a estrutura funcione corretamente. 6. Reorganizar os sistemas de recompensa Atualizar o sistema de remunerao para que as pessoas sintam que foram recompensadas por sua contribuio para a mudana.

Fonte: Adizes, 2001, p. 36.

Num ambiente de confiana, as pessoas mantm seu compromisso a longo prazo com a organizao, pois sentem que a empresa tambm tem um compromisso a longo prazo com elas. Um indivduo pode aceitar que os seus interesses sejam temporariamente postos de lado, se vislumbrar no futuro um horizonte em que todos ganham: a empresa e os seus empregados.Um horizonte a longo prazo no abrange apenas os prognsticos do que acontecer a longo prazo; significa uma meta em comum a longo prazo, alm de interesses comuns a longo prazo compartilhados por meio de uma viso comum. E aqui surge a pergunta: como essa viso a longo prazo e esses interesses comuns podem ser traduzidos para o curto prazo de modo a tornar os interesses comuns aplicveis no presente, que quando eles so necessrios? O agente de transformao chama-se confiana mtua, que surge quando temos confiana que algum, cujos interesses diferem dos nossos a curto prazo, ir nos retribuir a longo prazo (ADIZES, 1996, p. 178).

Esse tipo de ambiente possvel desde que as pessoas possam realizar-se frente ao trabalho, aproveitando ao mximo suas potencialidades e percebendo que os resultados produzidos criam melhorias para a instituio, tendo como conseqncia o retorno para elas e para a sociedade, funcionando como engrenagens de um sistema. Deming (1990), discutindo os problemas da indstria norte-americana frente aos avanos da indstria japonesa, aponta que os custos, a concorrncia, o ambiente externo so sempre23

prioritarimente lembrados como as principais causas do mau desempenho de uma organizao, quando a causa real a administrao inadequada. Com isso, cortam-se despesas, enxugam-se quadros, no atacando as razes dos problemas. O autor chama a ateno para a importncia de se conhecer e perceber um sistema atravs do que denomina de Saber Profundo o conhecimento de quatro teorias bsicas que se inter-relacionam: a. uma viso geral do que um Sistema e suas conseqncias possveis, lembrando que a performance de cada elemento do sistema deve ser vista e avaliada sempre em relao ao sistema como um todo. Pode, inclusive, ser necessria a perda em alguma das partes para que se obtenha a otimizao do todo. Sem uma administrao do sistema como um todo, iro ocorrer subotimizaes, que geram perdas. b. elementos de Teoria da Variabilidade, atravs da qual podem-se conhecer minimamente os conceitos de estabilidade e de variabilidade, sabendo distinguir causas comuns de causas especiais de variao. c. Teoria do Conhecimento, pela qual se percebe que a experincia de administrar e o conhecimento de um exemplo no servem para melhorar o gerenciamento, a menos que estudados com o apoio de uma teoria, e que copiar um exemplo de sucesso sem essa noo pode levar a desastre.(...) No existe essa coisa chamada um fato em relao a uma observao do mundo ao redor; quaisquer duas pessoas tero idias diferentes a respeito do que conta e do que no conta em relao a qualquer evento (e portanto do que relatar e do que no relatar) (DEMING, 1990, p. XXII)

d. elementos de Psicologia, que ajudam na compreenso a respeito das pessoas, suas diferenas, suas necessidades.

Deming (1990) prope o desenvolvimento de 14 princpios como elementos da transformao que deve ser promovida nas organizaes. So eles: 1. Estabelea constncia de propsitos para a melhora do produto e do servio, objetivando tornar-se competitivo e manter-se em atividade, bem como criar emprego.

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2. Adote a nova filosofia. Estamos numa nova era econmica. A administrao ocidental deve acordar para o desafio, conscientizar-se de suas responsabilidades e assumir a liderana no processo de transformao. 3. Deixe de depender da inspeo para atingir a qualidade.A qualidade no deriva da inspeo, e sim da melhora do processo produtivo (DEMING, 1990, p. 22)

4. Acabe com a prtica de aprovar oramentos apenas com base no preo. Ao invs disto, minimize o custo total. Desenvolva um nico fornecedor para cada item, num relacionamento de longo prazo fundamentado na lealdade e na confiana. 5. Melhore constantemente o sistema de produo e de prestao de servios, de modo a melhorar a qualidade e a produtividade e, conseqentemente, reduzir de forma sistemtica os custos. Isto inclui tambm uma melhor alocao do esforo humano, sua forma de seleo, adequao e treinamento, buscando a melhoria contnua do conhecimento e da aplicao das habilidades. 6. Institua treinamento no local de trabalho. 7. Adote e institua liderana. O objetivo da chefia deve ser o de ajudar as pessoas e as mquinas e dispositivos a executarem um trabalho melhor. 8. Afaste o medo. As pessoas precisam sentir-se seguras e despreocupadas para poderem dar o melhor de si sem temer as conseqncias de propor e de adotar o novo. A utilizao de um novo conhecimento pode revelar fraquezas antes desconhecidas.Algumas pessoas talvez se perguntem se, na idade em que esto, so capazes de aprender algo de novo. Se houver mudanas, onde que eu fico? (DEMING, 1990, p. 45).

9. Elimine as barreiras entre os departamentos. O trabalho em equipe necessrio, porm arriscado para as pessoas se elas forem cobradas pelo seu desempenho individual. 10. Elimine slogans, exortaes e metas para a mo-de-obra 11. a) Suprima as quotas numricas para a mo-de-obra b) Elimine objetivos numricos para o pessoal de administrao25

Sempre que existirem quotas numricas e um sistema estvel, haver os trabalhadores abaixo e tambm acima da mdia, com as conseqncias possveis para qualquer um dos lados. Aqueles que estiverem abaixo, vo sentir-se rejeitados, desanimados. Os acima da mdia sero pressionados para trabalhar no nvel do coeficiente, e no mais. importante substituir as quotas numricas por liderana e boa administrao. 12. Remova as barreiras que privam as pessoas do justo orgulho pelo trabalho bem executado. Quando algum tem que trabalhar apagando incndios, corrigindo deficincias de um sistema mal administrado, obviamente no ir satisfazer-se com seu trabalho. Em compensao, o trabalhador que se sente valorizado, ir querer estar presente todos os dias, participando da construo dos objetivos da empresa. Se h barreiras realizao profissional, elas devem ser trabalhadas pela chefia, visando a sua remoo.A possibilidade de realizao profissional algo mais significativo para o operrio do que a existncia de quadras de esportes e reas de lazer. Proporcione mo-de-obra a oportunidade de trabalhar com satisfao, e os 3% de indiferentes desaparecero por presso de seus colegas (DEMING, 1990, p. 64).

13. Estimule a formao e o auto-aprimoramento de todos, num movimento contnuo e crescente. 14. Tome a iniciativa e engaje todos da empresa no processo de realizar a transformao. A transformao da competncia de todo mundo.

Deming (1990) ainda alerta sobre as doenas e os obstculos que podem levar morte de uma empresa. Para a cura dessas doenas da administrao ocidental h que se promover uma completa reconstruo de suas formas. As doenas, mortais segundo o autor, so em grande parte conseqncia da no aplicao dos 14 princpios. So elas: a falta de constncia de propsito, no permitindo a melhoria contnua dos processos; a nfase nos lucros a curto prazo, doena que incapacita, pois promove o raciocnio de curto prazo, anulando a constncia de propsito e o crescimento a longo prazo; o uso da avaliao de desempenho, classificao por mrito ou reviso anual, gerando a26

Administrao pelo Medo, j que para Deming (1990) um sistema de avaliao de desempenho promove o levantamento de problemas, transformando o administrador em administrador de defeitos e a classificao por mrito, que a princpio parece ser a forma mais justa de dar o que se merece pessoa certa, pode criar o efeito oposto pois, pela competitividade que inspira, promove a busca do querer fazer o melhor para si mesmo, para conseguir a melhor pontuao. Quanto doena da avaliao de desempenho, o autor refora que s pessoas que so medidas por contagem negado o orgulho pelo trabalho realizado. Deming (1990, p. 79), afirma que a classificao por mrito decorrente dessa forma de avaliao inibe a inovao, a criatividade, pois quilo que ainda no conhecido no se conhecem tambm os resultados, podendo levar ao cometimento de erros. Ento, criar, inovar pode ser um risco que deve ser evitado e uma pessoa empreendedora e competitiva que no consegue bons resultados em uma avaliao de desempenho vai sentir-se desmotivada e vai procurar outras frentes de trabalho. Deming (1990) explica que um bom sistema de liderana leva eliminao da necessidade da avaliao de desempenho, porque o gerente que lidera enfrenta os problemas, obtendo o melhor das (e para as) pessoas, obtendo assim a melhoria contnua da equipe e dos processos e, conseqentemente, diminuindo as diferenas entre os desempenhos individuais. Continuando as doenas mortais das organizaes, seguem-se a mobilidade da administrao e as mudanas de emprego, lembrando que no sistema pblico fato comum a mudana das direes, fazendo com que a maioria das aes seja definida pelo processo poltico e no administrativo o que, segundo Deming (1990, p. 89) estimula as performances de curto prazo. No minuto em que o poltico eleito, j comea a fazer sua campanha para a prxima eleio. Donde se pode concluir que, se no o fizer, certamente perder para o adversrio. E na oposio, estar tratando de desqualificar ao mximo a administrao do vencedor, para que possa vencer na prxima tentativa. Tambm as mudanas de direo nas organizaes pblicas tornam quase impossvel a constncia de propsito, transformando a busca da melhoria contnua numa causa perdida. Cada vez que se tenta melhorar o sistema, depende-se da aprovao de um colegiado, cuja composio tambm estabelecida por critrios polticos, por serem formados, em sua maioria, por representantes eleitos por alguma via. Para Deming (1990), a afirmativa que todas as decises de ordem administrativa precisam passar pelos rgos colegiados para tornar-se oficiais descabida.27

Os rgos colegiados devem, sim, definir as polticas sob as quais devem ser construdos os processos administrativos e fiscalizar para que sejam cumpridas, mas no discutir todas as aes para oficializ-las. As mudanas de direo e de rumos portanto, a ausncia da constncia de propsito e do planejamento de mdio e longo prazos levam tambm o trabalhador a uma situao de insatisfao com o trabalho e incapacidade de sentir orgulho por suas aes. Sua reao pode ser a busca de outro local para trabalhar ou o absentesmo e a pouca vontade na realizao de suas tarefas. Outra doena organizacional apontada por Deming (1990) a administrao somente pelo uso de nmeros visveis, com pouca ou nenhuma considerao aos nmeros desconhecidos ou impossveis de conhecer. Nem todos os problemas ou melhoras so possveis de se medir e nem por isso so menos importantes para a administrao de uma empresa. As perdas causadas, por exemplo, pela ausncia de orgulho a respeito do trabalho ou os ganhos obtidos com a melhora do trabalho em equipe, por exemplo, dificilmente podem ser mensurados objetivamente. Outro problema importante que pode ser criado pelos nmeros, sem que haja o conhecimento do sistema como um todo, o corte nos investimentos provocado pela anlise simplista de relatrios financeiros desanimadores. Assim, as causas de problemas ou de melhorias podem simplesmente ser descartadas, sem que a elas seja atribuda a devida importncia. Alm das doenas, Deming (1990) tambm aponta obstculos, que no so to mortais quanto as doenas, podendo at ser ultrapassados, mas que atrapalham sensivelmente a melhoria da qualidade e da produtividade. O primeiro deles definido pelo autor como a esperana do pudim instantneo, e define-se pelas solues mgicas obtidas atravs dos modismos que se instalam na administrao contempornea e que merecem toda a desconfiana, pois nada em administrao simples, rpido, sem esforo e sem passar pelo aprendizado necessrio. Complementando o obstculo descrito anteriormente, a premissa de que a resoluo dos problemas, a automatizao, os dispositivos prticos e o novo maquinrio transformaro a empresa refora a crena em solues mgicas.

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As organizaes tambm criam seus prprios obstculos, quando saem procura de exemplos que possam ser copiados. Mas no h uma nica receita a ser seguida igualmente por todos e perigoso simplesmente copiar, sem compreender a teoria do que se deseja fazer. O fato que os japoneses primeiro aprendem a teoria do que desejam fazer, depois fazem a melhor (DEMING, 1990, p. 96). Mas tambm causa de obstculo acreditar que nossos problemas so diferentes. Certamente so, mas isso no impede que princpios universais sejam utilizados para a sua soluo. Completando a lista dos obstculos de Deming (1990) esto: o obsoletismo nas escolas, que se voltam cada vez mais para o atendimento das necessidades de mercado, defasando o conhecimento e a formao integral das pessoas; o ensino deficiente dos mtodos estatsticos na indstria; o uso de padres e tabelas para aceitao; a crena de que nosso departamento de controle de qualidade cuida de todos os nossos problemas de qualidade e que nossos problemas devem-se exclusivamente aos operrios. Quanto a este ltimo apontamento, acrescenta-se uma fala do autor, que diz:A premissa que prevalece no mundo inteiro a de que no haveria problemas na produo ou no servio se o pessoal da produo simplesmente executasse suas tarefas exatamente como lhes foi ensinado. Sonhos bons!... Os operrios so prejudicados pelo sistema, e o sistema pertence administrao! Foi o Dr. Joseph M. Juran quem ressaltou, h muito tempo, que a maior parte das possibilidades de melhora depende de aes sobre o sistema e que as contribuies do operariado so severamente limitadas (DEMING, 1990, p. 100). Portanto, no suficiente melhorar os processos. Deve haver tambm um constante aperfeioamento do projeto, do produto e do servio, juntamente com a introduo de novos produtos, servios e novas tecnologias. E tudo isso de responsabilidade da administrao (DEMING, 1990, p. 101).

Deming (1990) alonga ainda mais a sua lista de obstculos, com os seguintes: partidas falsas; instalamos o controle de qualidade; o computador sem controle; a premissa de que a nica necessidade atender s especificaes; a falcia do zero-defeito; teste inadequado de prottipos; e quem quer que venha tentar nos ajudar precisa saber tudo sobre o nosso negcio, donde se pode perceber que tratam-se de crenas geradas pelos modismos e pela busca fcil e rpida de respostas aos problemas, sem o devido cuidado para a percepo e a tentativa de saneamento das causas.

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As proposies de Deming permitem pensar que o dia-a-dia das organizaes atuais reflete um acmulo de modelos construdos ao longo do tempo, que precisam ser pensados luz das teorias administrativas, para que possam de fato ser trabalhados e modificados na busca de melhorias. Sendo o objeto principal deste trabalho a implantao de um plano de carreira para os recursos humanos, rever a evoluo das formas de administrao atravs dos tempos ajuda a compor um panorama geral do ambiente de gesto nas empresas que, mesmo atualmente, apresenta resqucios de cada um dos modelos citados. E possibilita perceber como, nesse ambiente, as pessoas foram e continuam sendo consideradas nas organizaes: como recursos a serem utilizados da melhor forma possvel para a obteno dos melhores resultados.

Gesto de Recursos Humanos Os conceitos sobre o trabalho e suas relaes, na forma como os conhecemos atualmente, surgiram a partir da Revoluo Industrial, no sculo XX, embora o homem tenha sempre desempenhado tarefas subordinado a outros homens. At a dcada de 1950, o mundo passava por transformaes lentas, previsveis e esse era o esprito que norteava as relaes de trabalho: burocrticas, padronizadas, com tarefas especializadas. Nesse contexto as pessoas eram consideradas recursos de produo, assim como os equipamentos e o capital, devendo ter seu comportamento tambm padronizado, como as mquinas. Para tratar da administrao dessas pessoas, existiam os Departamentos de Relaes Industriais, que atuavam intermediando as relaes entre o capital e o trabalho (CHIAVENATO, 1999). No perodo compreendido entre 1950 e 1990 que o mundo comeou a ganhar velocidade em suas transformaes. O mercado de competio entre as empresas comeou a se expandir, passando do local ao regional, e ao internacional. As estruturas estticas e conservadoras, hierarquizadas e burocrticas, passaram a ser empecilho para as transformaes necessrias. A viso sistmica comeou a tomar corpo, transformando as estruturas rgidas dos Departamentos de Relaes Industriais em Departamentos de Recursos Humanos, avanando no sentido de entender as pessoas como seres vivos e inteligentes, importantes na determinao do sucesso empresarial. Esses departamentos, nesse formato, responsabilizam-se pela prestao de servios especializados como recrutamento, seleo, remunerao, relaes trabalhistas e sindicais.30

Mas a verdadeira transformao dos recursos humanos em capital intelectual, ativo mais importante da organizao, somente aconteceu a partir de 1990, na Era da Informao, perodo em que as transformaes tecnolgicas so to rpidas e imprevisveis, que a vantagem estratgica deixa de estar nos equipamentos e no capital acumulado e torna-se presente no conhecimento sobre como tirar o melhor proveito desses recursos. O conhecimento torna-se bsico e o desafio maior passa a ser a produtividade do conhecimento. Tornar o conhecimento til e produtivo tornou-se a maior responsabilidade gerencial (CHIAVENATO, 1999, p. 30). A antiga Administrao de Recursos Humanos cede lugar Gesto de Pessoas. A capacitao e a qualificao profissional, possibilitando ao homem extrair das mquinas e equipamentos os melhores resultados, assumem lugares importantes nessa nova viso. Assim, a rea de Recursos Humanos, tenha ela qualquer denominao nessa nova era, tambm precisa adaptar-se rapidamente a essas mudanas. J em 1959, Penrose, estudando a teoria do crescimento das empresas, afirmava a importncia estratgica dos recursos humanos numa organizao, pela possibilidade da obteno seja pela criao intelectual, seja pela atividade produtiva de diferentes resultados de um mesmo recurso material, com caractersticas de operao que dependem dos conhecimentos do indivduo. Garcia (2000), a respeito do pensamento de Penrose, explica:A criao de um recurso produtivo na empresa requer alguns passos bsicos, iniciando-se com a compra de recursos fsicos no mercado visando obter deles servios. Dentro da empresa, modificam-se os servios que aquele recurso pode render, a partir da capacidade das pessoas que o utilizam e do processo de aprendizagem que se desenvolve pela experincia de se trabalhar com esse recurso. A aprendizagem vem do processo interativo em um grupo de trabalho, a partir de uma linguagem comum existente no grupo. A capacidade das pessoas est relacionada, tambm, com os recursos com os quais trabalham. Da unio: experincia, aprendizagem e recursos fsicos que surgem os novos servios produtivos.

A aquisio de conhecimento um processo dinmico, portanto, com o tempo os resultados obtidos pelo homem tambm tendem a se modificar, gerando a aquisio de aprendizagens diferentes entre as organizaes e possibilitando, a algumas, o desenvolvimento de caractersticas nicas. Garcia (2000) complementa, afirmando que essa diferenciao decorrncia de conhecimentos e de formas especficas de atuao, difceis de serem imitados e transferidos a outras organizaes, gerando assim as vantagens competitivas.

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Tambm as empresas precisam estar atentas liderana, j que a rota para a qualidade no pode ser simplesmente adquirida, como se adquirem os equipamentos ou softwares: No h nada que substitua o trabalho em equipe e bons lderes de equipe para atingir uma consistncia nos esforos, juntamente com conhecimento (DEMING, 1990, p. 15). Penrose (1959) lembra que dos gerentes e administradores vo depender, ainda, os recursos que sero colocados disposio dos seres humanos para que eles desenvolvam suas atividades, e o resultado das atividades vai depender dos recursos e das condies de trabalho disponveis. Assim, as potencialidades completas para o crescimento de uma empresa so resultado dessa troca recproca, permitindo ou no a sua expanso, independentemente das mudanas externas organizao. Pela percepo desses fatores, a administrao de Recursos Humanos (RH) ganha importncia em seu papel nas o