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Aristocracia, cavalaria, nobreza; alguns momentos historiográficos sobre nascimento e instalação de dominação social na Idade Média
OLGA PISNITCHENKO*
A natureza, a forma, o poder, a existência inclusive de uma nobreza, ou de alguns de
suas componentes, como, por exemplo, a cavalaria em um ou outro período da Idade Media,
constituem há muito tempo o objeto de vivas discussões. De acordo com Joseph Morsel o
fenômeno nobiliário ...se muestra em la actualidad poco inteligible e bastante desalentador
(MORSEL, 2008: 9). Neste ensaio, que faz parte de nossa investigação principal, que é
analisar surgimento da cavalaria em Castela determinando lugar que ela ocupara no quadro
social e político no século XIII principalmente no reinado de Alfonso X, pretende-se
estabelecer uma primeira aproximação entre definições e observações que alguns
medievalistas dão a este fenômeno de dominação social, privilegiando mais a Península
Ibérica. Neste aspecto a obra de Joseph Morsel oferece uma abordagem nova e interessante
deste assunto, ele analisa a amplitude de transformações aristocráticas de século V até século
XV. De una militia que incluye al rey como a los servidores de la realeza, a los clerigos y a
los laicos, a los dominantes urbanos y a los ruralesse passa a la nobleza. (MORSEL, 2008:
371) O autor não busca estabelecer representações, de nobreza, cavalaria , aristocracia mas
pretende dar conta da dinâmica das relações exógenos e endógenos de dominação, mostrando
como ao passar dos séculos os modelos de pertencer a aristocracia claramente se transformam
de nobilis no sentido romano de bem nascido e, portanto, fora do alcance até mesmo para o
imperador carolingio no século XI a nobre como membro de uma nobreza onde o nascimento
é apenas uma das maneiras entre outras de acesso ao dominio social a qual, pode ser conferida
por rei, príncipe ou mesmo pelas comunas italianas.
O século passado nos trouxe grandes obras que buscaram analisar, origens gênese e a
estrutura desta categoria social, a qual mais convém o conceito de ordo usado na época a qual
pertencem estes estudos. Nos não pretendemos fazer uma investigação sobre as teorias do
ordo na Idade Media por isso nem vamos tentar nos adequar a representação deste conceito no
famoso clássico de Georges Duby As três ordens ou o imaginário do feudalismo (DUBY,
1982), como também não vamos buscar entrar em conflitos com seus conceitos.
A contribuição de Duby para estudo de nobreza e cavalaria foi enorme, as três obras
mais dedicadas a este assunto: Guilherme Marechal – Ou o melhor cavaleiro do mundo.
(DUBY, 1994), Sociedade Cavaleiresca(DUBY, 1989) e As três ordens ou o imaginário do
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feudalismo buscam a analisar a multiplicidade de critérios , que fazem parte de fenômeno de
cavalaria. As múltiplas interações de Duby com o estudo da psicologia humana, do social, da
antropologia, da literatura e da geografia corroboraram para que ele introduzisse conceitos de
tais áreas para a História, possibilitando-o aprofundar o universo mental do período em
estudo. Georges Duby promoveu em suas obras a utilização de uma narrativa histórica
inovadora, caracterizada pelo fato de que o autor buscou muitas vezes preencher lacunas de
informação, sobre o tema estudado, tendo por base uma reflexão sobre a idéia de imaginário.
Na obra Guilherme Marechal, o personagem principal se torna o centro em torno do
qual o autor constrói sua obra. As características físicas e ações de protagonista, a importância
de primogenitura e da ordem de nascimento, os ritos de iniciação e de investidura, qual é a
utilidade de casamento e papel de mulher nesta sociedade – o mundo inteiro se cria a partir de
uma só personagem. Se quisermos encontrar uma personagem o qual poderia ser o centro em
torno do qual reconstruiríamos as relações de poder na Península Ibérica, escolheríamos El
Cid1 e sua época, que durante séculos atrai os historiadores. A esta época e a este personagem
dedicou vários estudos Ramón Menéndez Pidal2, os quais continuam sendo referencia para os
investigadores de hoje.
A obra A sociedade cavaleiresca é uma das analises mais completas da cavalaria de
ponto de vista da história de mentalidades. Os estudos sobre ritos e relações de parentesco,
Paz de Deus, níveis culturais e mentais de feudalismo, papel de jovens , a mulher, o
matrimonio, a Igreja se reduzem a uma pequena região na norte da França. De acordo com
Duby, não de se admirar que região por ele estudada os critérios da nobreza não fossem
idênticos aos que se acreditava poder discernir nas outras regiões. Conhecem-se as
discordâncias que marcaram na França e na Germânia, a evolução das estruturas sociais
estabelecidas nos tempos carolíngios... Mas no próprio cerne destes grandes corpos
territoriais, os costumes regionais eram muito diversos e, notadamente se estabelecia por
certo toda uma gama de transições entre os tipos franceses e os tipos germânicos... (DUBY,
1 Rodrigo Díaz de Vivar, El Cid (1043-1099) foi um nobre guerreiro castelhano que viveu na época em que a Península Ibérica estava dividida entre reinos rivais de cristãos e mouros (muçulmanos). Sua vida e feitos se tornaram uma lenda, sobretudo devido a uma canção de gesta (Canción de Mio Cid), datada de 1207. 2 Ramón Menéndez Pidal (1869 -1868) foi um filólogo, historiador, folclorista e medievalista espanhol. Criador
da escola filológica espanhola. Autor de várias obras dedicados ao Cid e sai época: La España del Cid, Historia
del Cid, El Cid Campeador, Cantar del mío Cid: texto, gramática y vocabulario.
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1989) e os tipos hispânicos acrescentaremos nos. Esta obra nos mostra os caminhos para
investigação de um grupo social que através de formação progressiva de atitudes de regras
jurídicas de costumes e de uma moral acaba constituindo uma cultura comum.
Na obra As três ordens ou o imaginário do feudalismo Duby trabalha com proposta da
trifuncionalidade formulada por Georges Dumézil, quando este analisa a divisão social e
ideológica de grupos indo-europeus. A influência declarada pelo próprio Duby, que submeteu
as conclusões de livro para apreciação do Dumézil. Na obra deste filólogo a divisão da
sociedade e m três ordens explicaria um sistema de organização pragmático que teria calcado
o nascimento dos grupos indo-europeus. Entretanto Duby aproveita esta idéia não para utilizá-
la como uma explicação prática de seu tema mais sim como um elemento ideológico ,
advindo do imaginário que buscava uma ordenação representativa de sociedade feudal.
(PETERS, 2011 : 10-20)
Os sistemas ideológicas não se inventam . – Escreve Duby.- Existem difusos,
aflorando apenas a consciência dos homens. Nunca imóveis.Elaborados na memória dos
homens, intrinsecamente , através de uma de uma lenta evolução, imperceptível, mas cujos
efeitos se descobrem de longe em longe, efeitos que no conjunto se deslocam e que podemos
reconstruir(DUBY, 1982: 81) Já para Ricoeur o fenômeno ideológico ...está ligado à
necessidade, para um grupo social de conferir-se uma imagem de si mesmo, de representar-
se, no sentido teatral do termo de representar e encenar. (RICOEUR, 1983: 68)
Da formação e da gênese desta ideologia aplicada a fenômeno de Cavalaria trata Jean Flori
nas suas obras L’idéologie du glaive Préhistoire de la chevalerie (FLORI, 1983) e L’essor de
la chevalerie, naissance d’un myth. (FLORI, 1986) De acordo com autor, esta ideologia se
cria a partir de momento quando a função militar passa a se cristianizar. Para ele, cristianismo
que, acima de tudo, é uma religião pacífica, dificilmente pode se adaptar a Guerra e ao se
tornar uma religião do estado requer uma clara separação entre laicos para os quais
mandamento contra o derramamento de sangue foi modificado e o clero que permanece no
tabu de sangue absoluto. Esta modificação de mandamento contra derramamento de sangue
evolui para uma nova ética cavaleiresca. Segundo Flori é justamente a espada passa a ser o elo
da ligação entre a ideologia de defesa dos fracos e cavalaria. Através da espada miles saeculi,
um simples guerreiro se tona um defensor. Espada se torno o símbolo de poder, que igreja
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solenemente entregava aos reis durante as cerimônias como mais tarde entregara aos
cavaleiros durante a investidura, mostra autor através das várias fontes.
Assim Flori analisa a evolução que acontece dos primeiros séculos de cristianismo
quando a negação de carreira militar, como, por exemplo, servir no exercito romano, levava a
martírio – como no caso de São Maximiliano de Tebessa, para época de guerra justa , guerra
santa, quando a morte no campo de batalha passa a ser um martírio.
No caso da outra grande obra dedicada a cavalaria a de Dominique Barthelemy
(BARTHÉLEMY, 2010) nos podemos ver este fenômeno analisado sob um ângulo
completamente diferente, a dos estudo antropológicos. O trabalho do autor permite identificar
nos registros da violência medieval os instrumentos que atuam em seu controle e mecanismos
de recomposição. E raízes destes mecanismos Barthelemy encontra nas tradições sociais
francas bárbaras.
Os povos germânicos pertenciam a uma sociedade bárbara, onde com em outras
sociedades com domínio de aristocracia guerreira é possível identificar semelhança com
cavalaria que já sentia superior a um simples camponês e por outro lado sabia fazer os reis
respeitar a sua independência. Nesta cultura já está presente ideal heróico e ao mesmo tempo
nos conflitos se prefere a tática quando no caso de vingança ou de guerra não se chegue ao
final mortal.
O cristianismo não fez povos bárbaros desistir da cultura germânica. A cultura de
honra e vingança acaba se conservando no âmbito da monarquia franca. Quando na época de
Carlos Magno cria-se aquilo que Jean Flori chamou de ideologia de espada, como nos já
vimos, e os fieis de rei passam a dividir co ele as obrigações de defender viúvas, órfãos,
mulheres, de certo modo, assumindo a tarefa de realização de vingança germânica. De acordo
com autor , neste caso a ideologia cristã mais justificava e desculpava os cavaleiros que
melhorava as maneiras destes – pois apresentavam a violência simbólica, que assinalava
fraqueza como característica daqueles a quem eles protegiam.
Para Barthelemy não há uma mutação feudal do ano mil, uma ruptura social coma
época carolíngia, uma chamada por ele mutação cavaleiresca entre a segunda metade do
século XI e a primeira do século XII. Mas esta mutação deve ser atribuída não ao surgimento
de classe cavaleiresca que como autor prova durante todo seu livro evolui desde os povos
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germânicos, mas às ameaças que pesavam sobre essa classe ...as concorrências que sofria, e
ver aí eventualmente alguma coisa como uma aposta na demonstração de força e no esforço
dessa classe se justificar. (BARTHÉLEMY, 2010: 18)
Franco Cardini em busca das raízes de cavalaria vai ainda mais longe que Dominique
Barthelemy, abrangendo uma dimensão geográfica e cronológica muito maior. No seu estudo
Alle radici della cavalleria medievale (CARDINI, 1979) Cardini afirma que os povos
germânicos adotaram a cavalaria sob a influencia dos povos nômades, principalmente os
godos, que foram empurrados para ocidente pela pressão dos hunos.A importância do cavalo
na vida dos povos nômades levou Cardini a destacar o valor sagrado do cavaloe buscar as
origens de arquétipo de superioridade de combatente montado.
Com este objetivo ele analisa mitologia de oriente artigo, grega, romana, oferece uma
interpretação interessante dos cultos xamânicos de vários povos. Mas o seu interesse
particular é o mundo mágico-religioso dos povos germânicos, que ele tenta reconstruir com
base nos contos épicos, obras históricas de alta idade media, e fontes jurídicas da época. De
acordo co autor o culto do cavalo foi assimilado pelos povos germânicos e não se perdeu com
avanço de cristianismo.
Analisando influencia da mitologia germânica Cardini explora surgimento de uma
cultura de honra e de direito de uso das armas próprios aos povos germânicos, do ponto de
vista dele, sendo que justamente nestas tradições germânicas busca também as origens de
cavalaria Dominique Barthelemy. Contudo Cardini analisa a organização social e militar dos
povos germânicos em particular uma instituição como comitatus e seu equipamento militar,
buscando nela raízes de cavalaria.
Ao tratar de cristianismo dos povos germânicos autor enfatiza os momentos e tenta
provar que estes povos aceitaram a nova religião através de uma combinação peculiar de
imagens de seus deuses com imagem de Cristo, os conceitos pagãos com um conjunto de
conceitos e sentimentos inerentes à religião cristã. Para ele foi justamente a Igreja, cuja
concepção de Guerra e de guerreiros foi bastante ambivalente teve que buscar compromissos
num mundo imerso na guerra continua. Desenvolvimento de sua posição própria
teologicamente fundamentada sobre esta questão era uma necessidade ditada pelas condições
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sociais tanto de auto-afirmarão política tanto doutrinal da Igreja. A Espada e Cruz deviam se
unir numa única doutrina.
Caballería (KEEN, 2008) de Maurice Keen não está se aprofundando em busca de
raízes, utilizando como fontes as novelas corteses daquela época, documentos eclesiásticos ou
obras didáticas em língua vulgar, como, por exemplo os tratados de cavalaria, o autor tenta
buscar um modelo válido para interpretar o que é a cavalaria respondendo já no primeiro
capitulo que vê cavalaria como um ethos. Se nos basamos en los tratados que hemos
examinados la caballería podía ser definida como un ethos en el que elementos guerreros,
aristocráticos y cristianos están fundidos. (KEEN, 2008: 32) E nenhum destes elementos
para autor é simples em sua estrutura. O aspecto militar da cavalaria está em especial
associado a habilidade de equitação a destreza na qual podia ser difícil de adquirir para quem
não tivesse condições financeiras para isso. O aspecto aristocrático, não é só questão de
nascimento, mas está ligado com as idéias de função de cavalaria com uma escala de virtudes
que implicam que aristocracia é tanto uma questão de valor como de linhagem. O aspecto
cristão de acordo com autor, surpreendentemente representado livre de prejuízos e de
prioridades eclesiásticas. Assim Cavalaria como Keen a vê através dos tratados é um modo de
vida e em este modo de vida aparecem três grupos de elementos comuns e imutáveis: o
elemento militar, o elemento social, e o elemento literário, os quais autor estuda através dos
capítulos do seu livro.
War in the Middle Ages (CONTAMINE, 1984) de Philippe Contamine é mais uma
obra que enfoca cavalaria como uma das forças principais que não só atua no campo de
batalha, mas também no campo de política que é responsável pelo começo e fim de guerras.
No seu trabalho Contamine tenta dar uma análise detalhada do fenômeno da guerra como uma
vida social, política e espiritual e religiosa da Europa da Idade Media. Ao falar do mundo
ibérico ele cita o famoso artigo de Elena Lourie publicado em 1966 A society organized for
war : Medieval Spain (LOURIE, 1966: 54-76), um artigo que influenciou fortemente os
estudos posteriores da Reconquista medieval espanhola e até mesmo o título de um livro de
James Powers (POWERS, 1988). O artigo analisa os quadros jurídicos, militares, sociais e
infra-estruturas de uma sociedade que estava organizada e vivia em função da guerra entre os
cristãos e muçulmanos, assim nos podemos ver que aristocracia guerreira espanhola
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encontrou a sua justificação de ser mais que em qualquer parte de Europa não só vivendo em
guerra permanente, mas também se ocupando de repovoação de terras conquistadas
defendendo as fronteiras dos novos territórios.
Esta era uma das razões de rei ser a autoridade indiscutível na sociedade castelhana e
numa medida muito ampla os bens e a posição de um nobre dependiam do favor real. De
acordo com Marie Claude Gerbet o rei asturo-leones era todopoderoso, ungido, herdero de
los reyes visigodos, se debia a la protección de la Iglesia, la dirección de la guerra contra los
infieles, la defensa y el poblamento. (GERBET, 1997: 24) E se a guerra proporcionou à
nobreza a justificação desta posição superior, a sua fonte de enriquecimento foi sem duvida o
rei que autorizava as “presuras”, outorgava as recompensas tanto em dinheiro como acima de
tudo em “prestimonios” passavam a fazer parte de patrimônio de um aristocrata.
Existem várias controversas a respeito das origens da aristocracia3 medieval de Leão e
Castela, nos não podemos comparar a gênese da nobreza ibérica com franco-germânica pelo
fato que a rápida conquista da maior parte da Península Ibérica pelo exercito muçulmano
entre anos 711 e 720 destruiu não somente o poder da monarquia Visigótica, mas também, em
larga escala, a classe dominante que a apoiava. Marie-Claude Gerbet(GERBET, 1997)
menciona a crônica de Alfonso III que alude a Pelayo, primeiro rei asturo-leones elegido por
nobreza local asturiana e visigodos refugiados. Não vamos entrar em discussão sobre a
origem étnica do Pelayo, para nos é importante que a crônica escrita no inicio de século X
claramente indica origem étnica daqueles que se reuniram para eleger o primeiro rei, de
acordo com a tradição visigoda. Los visigodos refugiados eran sin duda poco numerosos, lo
que favoreció su establecimento. Los más poderosos tuvieron que fusionarse en seguida con
la vieja aristocracia tribal local y los fideles del rey, que probablementeteníanun doble
origen(GERBET, 1997: 21). Mas a nossa visão desta aristocracia através das crônicas do
período fica embaraçada, e somente a partir de século X temos materiais suficientes para que
3 Joseph Morsel faz questão que fazer clara separação de termos aristocracia e nobreza, para este autor com qual
não podemos não concordar nobreza constitui uma forma estereotipada de aristocracia quando existe transmissão de maneira preferencial pelo sangue de um status jurídico que confirma e materializa superioridade que se pretende. Uma classe dominante que pode ser definida deste jeito começa surgir na Península Ibérica somente no século XII. Já termo aristocracia etimologicamente implica em noção dos homens governados por uma minoria considerada (por ela mesmo ou por outros) como “melhores”. São as definições que adotamos durante o nosso trabalho. MORSEL, J.La aristocracia medieval. El dominio social em Occidente (siglos V-XV). Universitat de València, 2008
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os historiadores possam juntar detalhes de laços familiares e domínios territoriais de algumas
famílias aristocráticas mais influentes da região. Este quadro emerge de um grupo
relativamente pequeno de famílias interligadas, cuja influencia política e econômica abrange
grandes áreas de reino.
Se Marie Claude Gerbet insiste que aristocracia de reino Asturo-leones teve uma
origem dupla hispanogoda e local sin que sea possible discernir la parte que corresponde a
cada uno.(GERBET, 1997: 28) Simon Barton baseando-se em trabalhos de Salvador de Moxó
afirma o papel dominante de aristocracia visigoda, que mesmo misturada com nobreza
asturiana local a superava no sentido ideológico, assumindo herança visigoda para o reino
Asturo-leones. Although the eighth century may have witnessed the emergence of e new
distinct’ nobility in the nascent kingdom of the Asturias, there is broad agreement that there
was a certain continuity across the threshold of the Muslim conquest and that many of the
nobles of the Asturian-Leonese realm in the ninth and tenth centuries were themselves direct
descendants of the Visigothic ruling class (BARTON, 1997: 29).
No entanto, o poder delegado por rei ou usurpado por força, assim como a riqueza, apesar de
desempenhar um papel considerável para surgimento dos traços individuais da aristocracia
castelhano-leonesa, não foram suficientes para nascimento de nobreza como tal. De acordo
tanto com Marie Claude Gerbet quanto com Simon Barton, para que aristocracia haveria se
tornado uma nobreza era necessário que apareça dentro dela a consciência de linhagem.
Famílias aristocráticas estavam ligados pelo parentesco horizontal de consangüíneos, tanto
por lado paterno, como por lado materno, e eram capazes de transmitir status social,
liberdade, bens e direitos pela herança. De acordo com Pallarés e Portela (PALLARÉS,
MÉNDEZ y PORTELA SILVA, 1993: 823–840.), que estudaram aristocracia galega no
séculos VIII- XI relação vertical de parentesco se reduzia a relação pais-filhos e a memória
familiar não ia mais além dos avos. No entanto já no século XI nobilitas era considerado
como conjunto de qualidades morais, e estas qualidades não eram consideradas hereditárias
para aristocracia castelhano-leonesa até o século XII. Alem disso, ...Ser aristócrata era una
condición social que aún no había dado nacimiento a un estatuto jurídico transmisible a los
descendientes. (GERBET, 1997: 31)
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Simon Barton analisa a causa principal de consciência de linhagem surgir na Península
Ibérica bem mais tarde que nas terras franco-germânicas estudadas, por exemplo, por Duby, e
mostra várias razões e diferenças sociais que retardaram este processo. Como nos já havíamos
dito a aristocracia ibérica nasce e se forma e função da reconquista que avança pela península
até segunda metade de século XIII acrescentando as novas terras aos reinos cristãos que
necessitavam de ser repovoadas e protegidas, enquanto em outras partes da Europa o
problema de fragmentação e diminuição de patrimônios aristocráticos surge ainda no século
X. Vemos então - escreve Duby – as famílias de nobreza iam se enfraquecendo aos poucos
pelo fracionamento das heranças... pela diminuição das rendas senhoriais. (DUBY, 1989: 5)
Ao mesmo tempo acontece a passagem de um sistema parentesco para outro. A família onde
todos os filhos tinham mesmo direito de herança, e onde parentesco da mulher ou da mãe
desempenhava um papel igual ao da ascendência paterna na vida e na consciência da família
passa para um sistema patrilinear, onde o filho primogênito passa a ser o maior beneficiado
por herança. Como os reinos cristãos da Península Ibérica estavam em expansão permanente,
o patrimônio da aristocracia ainda não estava delimitando possibilidade de beneficiar todos os
filhos tanto com terras da família como com recém conquistadas. Los repartos sucesorios
igualitáriosresultaban catastróficos para el patrimônio desde el punto de vista del linaje.
(GERBET, 1997: 71) Na verdade, pelo contrário, da necessidade de defender e povoar as
terras conquistadas emergia a necessidade de mais aristocracia para representar o rei nas
novas terras.
Segundo Barton, que baseia a sua afirmação em estudos de G Duby, é justamente a
necessidade de privilegiar o primogênito, que não havia na Península Ibérica, estimula o
surgimento de consciência de linhagem. Outro aspecto importante, que não podemos
esquecer, é desde surgimento de reino Asturo-Leones, a principal justificativa de condição de
aristocrata é a função administrativa que este exerce como representante do rei, assim todos os
grandes aristocratas faziam parte da corte real4 onde passavam muito tempo o que de acordo
4 Na obra Sociedade cavalheiresca Georges Duby discutindo sobre nascimento da nobreza analisando documentos históricos pertencentes a Norte de França dos séculos IX-XIII também coloca a corte do rei como um dos aspectos sociais que impede afirmação de linhagem. Na época franca, existia ainda assim uma casa, a
do rei, e é de notar que a família real tenha sido a primeira a se manifestar como uma “raça”, limitando ao
“agnatio” os nomes dos filhos, confinando numa situação subalterna as alianças através das mulheres. Ora, só
agregando-se a casa do rei, podia um nobre fazer então sua fortuna,ali vivendo em sua adolescência entre os
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com autor significa ...that the formation of noble lineages arounda fixed houshold remained
unlikely.(BARTON, 1997: 44)
Os primeiros sinais de noção “embrionica” de linhagem, Barton atribui ao inicio
século XII, quando grandes famílias aristocráticas começam experimentar com sobrenome
para se identificar e destacar, adotando nomes de seus domínios principais ou de ancestrais
distintos. Assim conde Pedro Gonzáles freqüentemente aparece nos documentos adicionando
“de Lara5” ao seu nome, Ponces de Leon levam sua descendência do Ponce Vélaz6, Osorios
de Rodrigo Osório7. Somente as linhagens condais adotaram sobrenome que menciona os
seus domínios (senhorios) o resto manteve nome de família formado a partir do nome do pai
que paulatinamente se substitui por nome de algum grande personagem da linhagem.
Já para que nos possamos falar de nobreza de direito precisamos que esta nobreza
possua um estatuto jurídico apropriado. Surgimento deste estatuto jurídico, Carlos Estepa
Díez (ESTEPA DIÉZ,1977) atribui em primeiro lugar aos privilégios de isenção fiscal e às
imunidades que os reis passaram conceder não só a igreja mas as pessoas. No principio a
transmissão de bens de origem real assim como isenções precisavam de confirmação do
soberano, o qual geralmente os concedia. Mas a nobreza de fato se consolidou ainda antes,
através do poder econômico conferido pelas propriedades da terra, o qual foi aumentado pelas
isenções fiscais. De hecho, aunque la ariscoracia se consolidó gracias a las exenciones
otorgadas a sus propriedades territoriales, muchos prorpietarios de tierras que no habíam
obtenido ninguna exencion quedaron al margen de la nobreza. (GERBET, 1997: 70) Somente
no século XIII Alfonso X nas Siete Partidas vai fixar a definição jurídica de nobreza em
várias leis que serão destinados a ela.
outros “manteúdos”, obtendo em seguida benefícios e honradas do chefe. Logo, nobreza completamente
domestica, e que por isso não podia organizar-se em “casa” particular. (DUBY, 1989: 9) 5 Lara situada a 45 quilômetros de Burgos era sede da família de Lara tomada durante a reconquista por tropas comandados por conde Gonzalo Fernández, que em cima de cerra conhecida como “el Molar” construiu um castelo no ano de 902. 6 Ponce Veláz de Cabreira (1160-1202)Foi senhor em povoação de Asturias, Mansilla e outros lugares em Galicia e reino de Leão que foram lhe concedidos por serviços a coroa. Em 1886 ocupou o posto de Alferes maior na corte de D. Fernando II de Leão 7 Rodrigo Osorio (morreu em torno de 1261), foi um nobre leones, filho de Osorio González. A sua vida é pouco conhecida por históriadores sendo o fato mais importante que ele foi o pai de Rodrigo Rodríguez Osorio quem participou da conquista de Sevilla recebendo terras em troca de seu serviço em 1253. Em 1273 era merino mayor da terra de León assim como tenete das torres de Sevilla. SALAZAR Y ACHA, J. Los Osorio, un linaje
de más de mil años al servicio de la corona». Anales de la Real Academia Matritense de Heráldica y
Genealogía IV: pp. 143-182.
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No século XIII na Península Ibérica os conflitos com os muçulmanos tenderam a
escassear, e para aristocracia tornava-se cada vez mais difícil manter o mesmo tipo de vida,
pois esta se tornava cada vez mais cara. Sendo assim, muitos membros desse grupo social não
possuíam mais nada, além das suas terras. De acordo com Ayala Martinez, o fim da
Reconquista afetou a justificação de "status" privilegiado da nobreza, assim como ...su
fundametacion socio-economica se veria debilitada por la aparicion de unos tempranos
sintomas de rececion a la que una estructura de jerarquia vasallatica y de contenido feudal
en pleno processo de descomosicion apenas si podia hacer frente. Solo el asalto frontal al
poder politico y la senorilizacion plena de la sociedad se presentaban como unicas vias
alternativa spara la debilitada pero insustituible nobleza. (AYALA MARTÍNEZ, 1986: 92)
Desse modo, de acordo com autor, a guerra permanente entre coroa e nobreza é um
dos aspectos mais destacados de reinado de Afonso X. Os três episódios fundamentais que
marcam o confronto entre poder real e nobreza aconteceram em 1254-55. O primeiro, quando
Afonso X pela primeira vez mediu as suas forças com as da nobreza, a qual, por sua vez,
recorreu a coalizão navarro-aragonesa antiafonsina. O segundo episódio teve lugar entre 1269
e 1272. O último ocorreu entre 1282 e 1284, tendo evoluído para uma verdadeira guerra civil,
envolvendo praticamente todo o reino. Chefiado pela alta nobreza contra o rei legítimo, esse
último conflito contou, sem dúvida, com maiores e mais claras implicações ideológicas.
(AYALA MARTÍNEZ, 1986: 92) O objetivo a ser atingido era:
La fundamentacion del predominio nobiliario en el incremento de seguros e casi siempre rentables derechos juridicionales, lo cual no significaba otra cosa que un claro desafio al poder real, tanto mas peligroso cuanto que en este momento la Corona se esforzaba en la cimentacion de um regimen monarquico de signo centralista y aspiraciones claramente autoritarias. Al margen, pues, de los intereses economicos de cada uno de los sectores en lucha, Corona y nobleza, y de sus objetivos estrictamente pragmaticos cara al mantenimiento o consecucion del poder, existe en la base del enfrentamiento una distinta consecusion ideologica-politica; frente a una vision unitaria del poder, de signo romanista y reforzadora de la autoridad monarquica, los nobles defenden un programa de raiz germanista, propgnador de un poder compartido en el seno de un regimen monarquico-pactual. (AYALA MARTÍNEZ, 1986: 93)
No entanto, as reformas administrativas, durante o reinado de Afonso X, beneficiaram,
em primeiro lugar, os próprios nobres, muitos dos quais foram contratados como vassalos do
rei, recebendo remuneração regular. Los vassalos del rey pertencian por lo general a la alta e
media nobreza (ricos hombres, infanciones o hidalgos y caballeros) y formabam parte del
exercito permanente del rey, aunque solo prestabam un servicio esporadico, ya fuese en
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persona o a la cabeza de sus hombres(Gerbet, 1997 :121) Recebiam um salário anual, além
de cobrar uma indenização por cada dia de serviço efetivo. A antiga Cúria ordinária passou a
ser nomeada de Corte ou de Casa Real. Os cinco cargos principais desta passaram a ser
ocupados por grandes nobres. De acordo com M.C. Gerbet, o cargo de majordomo maior era
o mais importante, além de estar muito bem remunerado, era outorgado a um parente próximo
ou a um favorito do rei; o alferes maior chefiava o exército durante a ausência do rei, seguiam
a esses o camareiro maior, o juiz maior e o chanceler maior, que sempre era um eclesiástico
de alta hierarquia. Também surgiu em torno de Afonso X uma grande quantidade de técnicos
especializados em direito, que desenvolviam várias atividades nas causas atribuídas à justiça
real. Estes predecessores de letrados eram homens competentes que, na sua maioria,
pertenciam à nobreza inferior e que, em função de razões políticas, não compartilhavam o
mesmo ponto de vista dos ricos homens. Enfim, podemos afirmar que, quando a nobreza se
revoltou contra Afonso X em 1272, estava muito longe de ser excluído do poder, ao contrário,
o fortalecimento das instituições em benefício do poder real, não a prejudicou
economicamente, o que não pode ser dito a respeito de poder político, sendo que a mesma que
estava reivindicando por ele se adaptou muito bem ao seu novo papel.
Bibliografia
AYALA MARTÍNEZ, C. Directrices fundamentales de la política pensinsular de Alfonso X.
Madrid: Universidad Autónoma de Madrid, 1986
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