AQUISIÇÃO DE PORTUGUÊS COMO LÍNGUA ADICIONAL

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    Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 46, n. 3, p. 59-70, jul./set. 2011

    LETRAS DE HOJE LETRAS DE HOJE LETRAS DE HOJE LETRAS DE HOJE LETRAS DE HOJE LETRAS DE HOJE LETRAS DE HOJE

    Aquisio de portugus como lngua adicional (PLA): o usode hedges em portugus por falantes nativos de mandarim

    Acquisition of Portuguese as an additional language (PLA): the use ofhedgesin Portuguese by native speakers of Mandarin

    Cristina Lopes PernaPUCRS Brasil

    Yuqi SunPUCRS Brasil

    Resumo: O presente artigo tem como objetivo comparar o uso de hedges entre falantes

    brasileiros de portugus a aprendizes chineses de portugus como lngua adicional (PLA). Foi

    sugerida uma denio para hedges e apresentada uma listagem das ocorrncias deste fenmenono sistema lingustico do portugus brasileiro (PB) e PLA. Aps, foi descrita a metodologiapara a compilao de dois corpora orais, atravs de um estudo longitudinal de nove meses. Aanlise dos dados foi feita com base na nova classicao de hedges, com vistas a compararas produes do PB e PLA. Os dados demonstram que no houve regularidade na aquisiodos hedges entre os falantes de PLA. Este estudo uma tentativa de anlise de hedges, com o

    aporte da lingustica de corpus, cujo objetivo mediato contribuir para uma metodologia de

    ensino e aprendizagem de PLA.

    Palavras-chave: Aquisio de hedges; Portugus como lngua adicional; Pragmtica; Lingusticade Corpus

    Abstract: The purpose of the present paper is to compare the use of hedges among Brazilian

    speakers of Portuguese and Portuguese learners, who speak Mandarin as L1. A denitionforhedges was suggested and a listing of occurrences of this phenomenon in the linguistic

    system of Brazilian Portuguese and Portuguese as Additional Language was presented. Then,

    a methodology for the compilation of the two oral corpora was presented, by means of alongitudinal study that lasted nine months. The data analysis was based on the new classicationofhedges, with the aim of comparing the productions in Brazilian Portuguese and Portuguese

    as Additional Language. This study is an attempt to analyze hedges utilizing Corpus Linguistics

    and the aim was to contribute to a methodology for the acquisition process of Portuguese as anAdditional Language.

    Keywords: Acquisition of hedges; Portuguese as an additional language; Pragmatics; Corpuslinguistics

    Introduo

    O presente trabalho apresenta uma comparaoda produo de hedges entre falantes de portugusbrasileiro e aprendizes chineses de portugus como lngua

    adicional1 (doravante PLA). Apresentamos um histrico

    1 A designao lngua adicional est sendo bastante utilizada recentementequando se trata de ensino de lngua estrangeira (LE) ou L2. SegundoStern (1983), os falantes de uma L2 so aqueles que dominam esta lnguano-nativa dentro de fronteiras territoriais onde se fala esta lngua comoL1; quanto ao termo LE, este se refere aos aprendizes dessa lngua dentroda comunidade onde essa no possui nenhum status sociopoltico.

    sobre o status recente do portugus no mundo e uma

    breve descrio sobre as investigaes na rea de PLA.Em seguida, procuramos denir o termo hedge e proporuma nova classicao para este, com vistas a analisar osdados do presente estudo. Para a coleta de dados, foram

    utilizados conceitos da lingustica de corpus, atravs da

    qual foi elaborada uma metodologia para a compilao dedois corpora orais, um de falantes brasileiros e outro de

    aprendizes chineses de PLA. Considera-se o estudo comouma tentativa de anlise de hedges em lngua portuguesa

    com o aporte da lingustica de corpus, que tem como

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    objetivo contribuir para uma metodologia de ensino e

    aprendizagem de PLA.

    O status da lngua portuguesa naatualidade

    Segundo Albuquerque e Esperana (2010, p. 4), comcerca de 205 milhes de falantes, a lngua portuguesatem uma dimenso bastante considervel no panoramalingustico mundial, em funo de ser (a) segunda lnguaromnica, (b) terceira lngua europia, (c) quarta lnguamais falada como LA, (d) quinta com maior nmerode pases de lngua ocial, espalhados pelos cincocontinentes e (e) sexta lngua mundial. Alm disso, at

    2010, o portugus foi a 5 lngua mais falada na Internetcom 82.5 milhes de usurios.2 Nas redes sociais, alngua portuguesa aparece como a 3 lngua mais usadano Twitter3 e 9, no facebook.4

    Com base em dados da UNESCO (ALBUQUERQUE& ESPERANA, 2010, p. 10), na rea de traduo, oportugus a 7 lngua de chegada e 18 lngua de partida.Segundo The International Business Edge5, entre as 15

    principais lnguas do mundo, que contribuem para 90%do PIB Mundial, o portugus consta como 9.

    De acordo com dados obtidos pelo Instituto Cames6,o ensino da lngua e cultura portuguesa distribui-se por72 pases, quer atravs da sua rede de leitorados, emcooperao com 294 instituies de ensino superior eorganizaes internacionais, quer atravs da sua rede deeducao pr-escolar e de ensinos bsico e secundrio,

    em coordenao com 14 ministrios de educaoestrangeiros e cmaras municipais, bem como com asdisporas portuguesas. A sua rede de Ensino Portugus

    no Estrangeiro (EPE) constituda por 1.691 docentes eintegra cerca de 155.000 alunos.789

    A lngua portuguesa considerada uma lngua da

    moda e do futuro. Conforme Albuquerque e Esperana

    2 Internet World Stats Acesso em 25/06/2011: http://www.internetworldstats.com/stats7.htm

    3 Semiocast (24/02/2010): http://semiocast.com/downloads/Semiocast_Half_of_messages_on_Twitter_are_not_in_English_20100224_fr.pdf

    4 Inside Facebook (28/07/2010): http://www.insidefacebook.com/2010/07/28/among-facebooks-top-languages-portuguese-arabic-and-

    spanish-lead-growth/5 The International Business Edge. Acessado em 25/06/2011. http://www.globalization-group.com/edge/2010/03/top-languages-by-gdp/#top-countries-by-gdp-chart

    6 Nmero adquirido no site de Instituto Cames. Acessado em 25/06/2011.http://www.instituto-camoes.pt/lingua-e-ensino/menu-da-rede-de-docencia/rede-de-docencia-ensino-nao-superior

    7 Observatrio da Emigrao (18/05/2010): http://www.observatorioemigracao.secomunidades.pt/np4/1755.html

    8 Notcia do Jornal da Globo (23/06/2011): http://g1.globo.com/jornal-da-globo/noticia/2011/06/alunos-de-harvard-vem-ao-brasil-para-aprender-

    portugues.html9 Notcia do Internacional Press (05/11/2007): http://www.ipcdigital.

    com/br/Noticias/Japao/Japao-apoiara-ensino-do-idioma-entre-alunos-estrangeiros

    (2010), na Europa do Leste h cerca de 3500 alunosque estudam a lngua. Em outros pases, a procura de

    portugus como LA tem aumentado nos ltimos anos, eem 2050, dever ser falada por 335 milhes de pessoasem todo o mundo.7

    Na Universidade de Harvard, o nmero de alunos

    matriculados em portugus subiu 150% em 10 anos8

    ; noJapo, o portugus a primeira LA mais falada (35%)9; naChina, o nmero de cursos de portugus nas universidadesaumentou de 3 para 13, entre 2005 e 2010 (SUN, 2011). AChina , actualmente, um dos pases com maior expansoda aprendizagem do portugus (ALBUQUERQUE &ESPERANA, 2010, p. 14).

    A investigao lingustica sobre o Ensinoe Aprendizagem de PLA no Brasil

    O ensino e aprendizagem de PLA remetem aos

    primeiros contatos inter-raciais entre jesutas e amerndiosno sculo XIII. Os jesutas se preocupavam apenas com oprocesso de alfabetizao da lngua e devido ocupaoportuguesa, a lngua do Brasil sofreu uma grande mistura

    de portugus, tupi (lngua nativa) e diversos dialetos

    trazidos pelos escravos africanos. At 1808, a mudanada Corte Portuguesa para o Rio de Janeiro fez com que ofoco de investigao de PLA ocorresse juntamente como estudo da cultura portuguesa. Segundo Corno (2001,

    p. 36), somente aps o ano 1822, devido inuncia donacionalismo provocado pela Independncia, que aliteratura brasileira passou a ter seu espao.

    Aps a Segunda Guerra Mundial, os linguistascomearam a ser autoridade principal na busca demetodologias cientcas na rea de ensino de lnguasadicionais. Nesse perodo, o ensino e aprendizagem

    de portugus sofreram bastante inuncia das teo-rias estruturalistas norte-americanas sob o mtodoaudiolingual, segundo o qual a aprendizagem de umaLA devia ser considerada uma disciplina em si o

    desenvolvimento de um conjunto de hbitos. O foco

    de aquisio e aprendizagem da LA era o domnio decomponentes isolados (gramtica e vocabulrio) e o

    desenvolvimento de habilidades distintas (ouvir, ler, falar

    e escrever).

    Embora o audiolinguismo tenha contribudo gran-demente para a investigao da aquisio de LA em vriosaspectos, as diculdades apresentadas no desempenhodos aprendizes levaram discusso da aplicabilidadedas teorias estruturalistas e behavioristas a investigaeslingusticas. No Brasil, essa observao se revela na

    publicao da obraPortugus do Brasil para Estrangeiros,que foi publicada em 1978 e considerada a pioneirana abordagem sociopragmtica, oferecendo maiores

    possibilidades de desenvolvimento da competncia

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    comunicativa dos aprendizes, graas nfase dada ao usoda lngua (CORNO, 2001, p. 43).

    A partir da dcada de 80, houve uma tendncia emaproximar a funo comunicativa da linguagem e suarelao com a histria e cultura brasileira. Outro avano

    para a rea foi o fato que os linguistas passaram a se

    preocupar com a relao entre a estratgia de aprendizageme a identidade de seus usurios. Fatores como faixa-etria,lugar de residncia (no Brasil ou no exterior) e tipo de

    lngua materna passaram a ser levados em consideraonas investigaes.

    Aps a dcada 90, o estudo pragmtico-comunicativoestabelece seu papel predominante, com o amadurecimento

    das pesquisas sistemticas nos programas de graduao eps-graduao de Letras e com as publicaes de artigosem peridicos cientcos. Os trabalhos demonstram a

    preocupao com o fato de que o ensino e aprendizagemestejam baseados no uso da lngua, dando nfase

    interao dos interlocutores, contexto de enunciado,fatores socioculturais, entre outros. No mesmo perodo,os pesquisadores comeam a se preocupar, de forma maissistemtica, com a avaliao da procincia em lngua

    portuguesa. Em 1995, o exame Celpe-Bras10 (Certicadode Procincia em Lngua Portuguesa para Estrangeiros)foi ocialmente institudo pela Portaria Ministerial,cujo objetivo avaliar a procincia comunicativa dosaprendizes, pressupondo o futuro uso da lngua.

    Nesse contexto, pretendemos, com este trabalho,

    apresentar um estudo comparativo entre falantes brasileiros

    de portugus e aprendizes chineses de PLA, atravs da

    anlise do uso de um aspecto lingustico, hedges, comvistas a demonstrar de que forma a competncia eprocincia comunicativa so adquiridas atravs dessetipo de termo.

    A competncia comunicativa e aprofcincia comunicativa

    Segundo Schlatter, Garcez e Scaramucci (2004,p. 366) a melhor maneira de avaliar se algum prociente coloc-lo em situao em que ele possa demonstrar essa

    procincia diretamente. Nesse sentido, os aprendizesdevem se preocupar com os fatores comunicativos

    e socioculturais da lngua alvo e ao se deparar com

    situaes de uso autntico da lngua. Esse conceito deprocincia diferencia-se das teorias estruturalistas

    10O Celpe-Bras o nico certicado ocial brasileiro de procincia emportugus como lngua estrangeira, sendo desenvolvido e outorgadopelo Ministrio da Educao e Cultura (MEC) do Brasi e aceitointernacionalmente em rmas e instituies de ensino como comprovaode competncia na lngua portuguesa. No Brasil, exigido por muitasuniversidades para ingresso em cursos de graduao e ps-graduao epor organizaes prossionais como o Conselho Nacional de Medicinacomo pr-requisito para a prtica da prosso no territrio brasileiro.

    norte-americanas da dcada 50, que considerava a lnguacomo uma soma dos componentes isolados (sintaxe,

    morfologia e fonologia) e das habilidades (ouvir, falar,

    ler e escrever) e acreditava que aprender uma lnguaestrangeira ou ser prociente nessa lngua pressupunhadominar seus elementos (FRIES, 1945; LADO, 1961

    apudSCHOFFEN, 2009, p. 17).A noo de competncia comunicativa, proposta porHymes em 1967 (BROWN, 2000, P. 246), salienta que osestudos sociolingusticos consideram a competncia como

    a habilidade do uso e sua inter-relao com a linguagem.Ao contrrio da teoria gerativista cuja concepo decompetncia lingustica seria o conhecimento gramatical

    de um conjunto das regras internalizadas para formar e

    entender novas sentenas (CHOMSKY, 1973, p. 32) para Hymes uma descrio que no especica os traoslingusticos em relao a uma comunicao de falantes,seus repertrios e os usos desses, possui pouca validade,

    relevncia ou interesse (1972 apud PERNA, 1992,p. 25). Essa crena fez com que os linguistas buscassemuma maneira de avaliar e analisar o desempenho dos

    apredizes de forma contextualizada.

    Cabe mencionar que os primeiros autores a sepreocuparem com o estudo de competncia, tanto lingustica

    quanto comunicativa, no se preocupavam com a aquisioe o ensino de lngua adicional. No entanto, a partir das

    abordagens dessas pesquisas, surgiu uma nova perspectivapara a anlise da procincia da lngua adicional, decunho integrativo-sociolinguista (SPOLSKY, 1975),com nfase na comunicao, autenticidade e contexto.

    Mais adiante, os estudos de Canale e Swain (1980, 1983)demonstram que a competncia comunicativa pode sercategorizada em quatro componentes, a saber: competnciagramatical (lxico, morfologia, sintaxe, semntica e

    fonologia), competncia do discurso (coeso e coerncia),competncia sociolingustica (regras socioculturais da

    lngua e do discurso) e competncia estratgica (fatores

    limitados na aplicao, tais como fadiga, distrao enegligncia) (BROWN, 2000, p. 247). Tendo essesfatores em vista, ser prociente em uma lngua estrangeirasignica muito mais do que conhecer o sistema abstratoque representa apenas um aspecto da funo da linguagem.Para ser prociente em uma lngua adicional, segundoPerna (1992), no basta ter a habilidade de produzir e deentender enunciados em que a gramaticalidade menosimportante que a adequao (p. 24). A procincia deveser ento a capacidade de demonstrar coerentemente oconhecimento lingustico de uma forma adequada dentrode um dado contexto, obedecendo s regras socioculturaise os fatores interpessoais.

    No presente estudo, pretendemos analisar a habilidade

    de produzir enunciados que contenham hedges, comfalantes de mandarim que esto adquirindo PLA. Para

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    isto, tentaremos denir o termo hedge e propor uma novaclassicao para este, com vistas a analisar os dados dopresente estudo.

    Hedge

    A noo de hedge foi aprofundada por Lakoff (1973)no seu artigo Hedges: a study in meaning criteria andthe logic of fuzzy concepts. A investigao foi baseada nateoria de Fuzzy Set, que dene os morfemas, palavrasou expresses tais como -like, -ish,technically, often, sortof, loosely speaking, more or less etc. de hedges, cuja

    funo fazer com que os enunciados quem mais oumenos imprecisos (LAKOFF, 1973, p. 471). SegundoLakoff, a funo principal desse tipo de termo modicaro grau de categorizao das palavras e valor de verdadedas sentenas. Embora no se interesse pelo valorcomunicativo do uso de hedges (MARKKANEN &

    SCHRDER, 1997, p. 4), o autor salienta que os hedgespodem interagir com as condies de felicidade paraenunciados e com regras de conversao (LAKOFF,1973, p. 490). Aps Lakoff, os hedges comearam aser estudados atravs de vrias perspectivas, sendo

    principalmente na rea da pragmtica.

    Brown e Levinson discutem hedges nas estratgias de

    polidez negativa, explicando como o fenmeno lingustico

    modica a fora ilocucionria dos interlocutores eobedece as mximas de Grice. Por exemplo, no enunciado

    Acho que eles vo comparecer, o falante est tentandoproteger a mxima de qualidade, dando resposta sem se

    comprometer com o resultado nal. Para os autores, ouso de hedges um mtodo primrio e fundamental paradesarmar a ameaa interacional, sendo a ferramenta maisimediata para obter a meta comunicativa.

    Yule (1996, p.130) dene hedges como notascautelosas produzidas para mostrar de que forma umapalavra est sendo empregada. Por exemplo, o enunciado

    at onde eu sei usado quando damos algumainformao. A ideia se encontra tambm no trabalho deLoCastro (2003), que explica os termos como indicaesdas atitudes dos falantes com os nveis distintivos de

    informao, verdade, e relevncia das palavras paraminimizar ou maximizar as mximas.

    Neste artigo, adotamos a denio de Sun (2011), queanalisou hedges a partir de um ponto de vista pragmtico

    em estudo de PLA. Segundo a autora, hedges so itensfuncionais, lexicais e estruturais que especicamenteexistem em um determinado sistema lingustico,

    modicando o valor de compromisso do enunciado e afora ilocucionria do sujeito falante em considerao sestratgias comunicativas (p. 34).

    No portugus do Brasil (doravante PB), os hedges

    podem ser representados de vrias formas, que se

    encontram resumidas nos sete grupos a seguir (SUN,2011):

    N Descrio: Exemplo:

    1 Alguns morfemas Me faa um favor zinho?Obrigad o!

    2 As palavras ousintagmas

    Eu tenho orkut que quase no uso.Talvez eu esteja errada.Nastimasfrias,euquei pratica-mente em casa.Nscvamos l uns trs, quatrodias.A razo mais ou menos isso.H cerca de dois meses no ligo ateleviso.Isso signica, grosso modo, quenohmaisclassemdia.s vezes , assisto um pouco de TV

    3 Tempo verbalespecco:(pretritoimperfeito do indicativoe do subjuntivo e futuropretrito)

    Se eu fosse o professor, no dei-xaria para mostrar para os pais es-sas notas no dia da entrega dos bo-letins.A gente tenha talvez trs ou quatrojornadas. Isso podia ser um cansaopsicolgico absurdo.Voc poderia fazer uma anlisequantitativa.Poltico teria que ser trabalho vo-luntrio.

    4 Pergunta retrica. Isso no uma boa ideia ???*

    5 Pronomes.(Quandoagente utilizado pararesponder as questesde opinies pessoaisdirigidas somente parainterlocutor.)

    A: Qual o momentomais emocio-nante vivido por voc at hoje?B: Quandoeutinha15anos,ami-nha sobrinha nasceu, a a gente sesentia como mame.

    6 Frases ou inseresparentticas:

    Vou escolher barco como o meio detransporte, eu acho.Se eu no me engano, eles tm uns10, 11 anos.

    7Algumas partculasmodais(interjeies).

    A TV um produto n?Eletcerto, no ?

    * ???: marcao de pergunta retrica neste trabalho para que seja distinguvelde outros tipos de pergunta.

    Quadro 1.Hedges no sistema do PB

    Cabe mencionar que o levantamento acima ape- nas uma listagem das possibilidades de hedges no PB

    e que no vale como uma classicao para o estudosob o prisma da pragmtica, que visa analisar a fala dointerlocutor no seu contexto interacional e atravs de suas

    funes comunicativas. Vejamos o exemplo abaixo tiradodo corpus (SUN 2011):

    P: Voc poderia dizer alguma coisa a respeito dessa -gura?

    R: Essa que eu entendo, seria a minha viso que seriamduas mos, n, simbolizando o planeta Terra e issomostra a globalizao n.

    Segundo Carter e McCarthy (2006, p. 223), oshedges devem ser estudados na categoria das marcaes

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    pragmticas, mostrando que os falantes so semprecuidadosos para no parecer muito rudes e agresssivos.O exemplo acima, que contm cinco hedges (eu entendo,seria, a minha viso, seriam, n), revela uma tendncia

    de no comprometimento com a expresso de opinio.O sujeito est mitigando a fala dele para diminuir a

    potencial ameaa de face.11

    A expresso eu entendoe seria minha viso mostra a ideia de que o locutorassume a responsabilidade pelo julgamento, sem precisar

    comprometer-se com a verdade do contexto referencial;a palavra seriam indica a incerteza da fala do locutore os dois n podem ser entendidos como marcadoresdiscursivos, que embora no sejam necessariamenteproduzidos conscientemente pelo falante, demonstram a

    vontade do locutor de que sua opinio seja reconhecida.Considerando essas funes pragmticas e o contexto dafala, adotamos a classicao (SUN, 2011) abaixo para aanlise dos dados do presente trabalho.

    Quadro 2. Classifcao de hedges

    N Classifcao Exemplo

    1 Hedges comomarcadores discursivos

    Acho que os professores somuito pobres, sabe! Tu viste n?Os alunos nem te olham!

    2 Hedgespressupositivos Parece que vai chover hoje.Ele deve estar em casa agora.Se eu tivesse frias mais longas,aproveitaria s para viajar.

    3 Hedgesdeclarativos Falta uns dez dias para a entregado trabalho, estou quase en-louquecida!s vezes , duvido que ele seja bra-

    sileiro, pois praticamente nogosta de carnaval.

    4 Hedgessugestivos Poderia me emprestar uma ca-neta?Quem sabe voc pega um taxiparachegarlmaiscedo?Eu deveria ter feito a leitura.

    5 Hedgesposicionais Se no me engano , o Brasil pas-sou a chamar-se Repblica Fe-derativa do Brasil em 1967.A: Voc se importa de vir s 7h30da manh?B:Ah!Muitocedo! A gente noconsegue se levantar!

    6 Hedges emotivos Olguria zinha, poderia me fazerum favorzinho? No acha muitofrio aqui???

    O quadro acima mostra seis tipos de hedges clas-sicados pela funo pragmtica. A anlise delesdeve ser feita a partir do contexto da fala particular.

    Os hedges como marcadores discursivos so hedges,tais como n, sabe, digamos etc., cuja funo fazer abertura e fechamento de fala, tomar e manter o

    turno, mudar o tpico e fazer com que as opinies sejamreconhecidas e aceitas por outros participantes. Eles

    so, muitas vezes, produzidos inconscientemente com

    a frequncia de uso mais alta do que a de outros tiposde hedges.11A palavra n , em nosso estudo, sempreconsiderada como esse tipo de hedge, mas a palavra

    acho ser reconhecida nessa categoria somente quandoela tiver funo de movimento preliminar em enunciadosargumentativos e no possuir maior nfase na fala, ou

    seja, se a expresso EU acho for produzida com nfasena palavra eu ou como uma insero parenttica, elajamais ser um hedge como marcador discursivo mas

    um hedge posicional. Os hedges pressupositivos, tais

    como parece, talvez, se... fosse... etc., encontram-se principalmente nos atos de fala representativos e

    declarativos.12 O locutor prope a pressuposio de umfuturo evento ou suposio e raciocnio diante de umfato acontecido. OsHedges declarativos so palavrase expresses tais como normalmente, principal,por volta de, quase etc., que modicam o grau deverdade e o contedo semntico de um enunciado, sendo

    um tipo de amenizador das categorias de tempo, lugar,nmero entre outros, a m de protegerem a mxima dequalidade na passagem de informao. J osHedgessugestivos so produzidos, quando os falantes dosugestes, pedem favores ou descrevem suas obrigaes

    para diminuir a ameaa de face.OsHedges posicionaisso os que evidenciam a fonte da informao ou pessoaresponsvel pela opinio. Quando se fala no meu pon-to de vista, para mim e eu acho com nfase noeu do enunciado, o falante est apresentando apenas aopinio pessoal para no se comprometer com a verdadereferencial; os hedges dizem que e ouvi falar re-

    presentam a ideia de que o falante coloca-se na posiode iseno de responsabilidade; o papel de a gentequando se refere somente ao locutor, denota a tentativa dedemonstrao de pertencimento na argumentao. Porm, os hedges emotivos representam, de certa maneira,as emoes dos falantes de forma mais imprecisa. Emgeral, eles aparecem atravs do uso de palavras de grau

    aumentativo ou diminutivo, que no apenas se referemao tamanho do objeto. As frases com estrutura tpica (por

    exemplo, pergunta retrica) tambm so consideradascomo hedges emotivos.

    Na prxima seo, descreveremos os corpora aserem utilizados neste trabalho e analisaremos os dados

    com base nas teorias pragmticas. Aps uma comparaoentre as produes dos falantes brasileiros e aprendizeschineses, discutiremos de que forma os hedges podemrepresentar a procincia comunicativa dos aprendizesde LA.

    11 Face threat (ver Brown e Levinson, 1987).12 A classicao dos atos de fala v-se em Searle (1969). Em sua obra,

    os hedges so categorizados de acordo com sua funo comunicativapredominante em determinada situao, independentemente do tipo deato de fala onde o hedge for inserido.

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    O estudo

    O Corpus

    O corpus de estudo foi construdo com base nas

    transcries de entrevistas com 11 brasileiros falantesnativos de portugus do Brasil e 11 alunos chineses

    aprendizes de PLA, com faixa etria entre 20 e 30 anos,entre o terceiro e quinto ano de faculdade. Os informantesbrasileiros foram alunos regulares das Faculdades

    de Letras, Direito, Engenharia e Administrao daPUCRS13, todos nascidos no estado do Rio Grande doSul. Os informantes chineses foram alunos conveniadosda Faculdade de Comunicao Internacional em LnguaPortuguesa da CUCN14, que estudaram na PUCRS entreoutubro de 2009 e junho de 2010. Antes de ingressar nauniversidade na China, os aprendizes no haviam tidocontato com a lngua portuguesa ou com falantes dessa

    lngua. Naquela universidade, eles estudaram dois anos

    de portugus com inputde diferentes variedades, vistoque os professores eram oriundos de pases lusfonosdiferentes.

    O instrumento das entrevistas foi elaborado por Sun(2011), de acordo com a etapa individual (parte oral) domodelo do exame Celpe-Bras. Durante nove meses, osinformantes chineses participaram de dez entrevistas com

    durao de 5-10 minutos cada. Os tpicos de cada conversaforam propostos atravs de pedidos de informaes

    pessoais, de interesse geral ou da compreenso a partirde cartuns, fotos, charges e outros tipos de imagem. No

    caso dos informantes brasileiros, as entrevistas foram

    realizadas apenas uma vez com cada informante durante30-60 minutos, individualmente com a pesquisadora. Ostpicos envolvidos foram iguais aos das entrevistas com

    os chineses.

    O corpus de produo dos informantes brasileirosfoi denominado de CTOB e o de produo dos informan-tes chineses, CTOC. O quadro abaixo representa asinformaes dos dois corpora:

    Quadro 3. Informaes de nmero de palavras noCTOB e CTOC

    CTOB CTOC

    Ocorrncia (Token) de itens em corpora 39138 25871

    Formas (Type) de itens em corpora 3837 2774

    Ocorrncia de hedges 1704 759

    Formas de hedges 75 38

    Anlise

    Segundo as informaes mostradas no Quadro 3,observamos que os aprendizes no possuem vocabulriomuito limitado em comparao aos brasileiros, devido

    aos nmeros aproximados obtidos da razo forma/item.15No entanto, A frequncia de aplicao de hedges16 nasprodues dos brasileiros muito maior do que a dasprodues dos chineses. Isso demonstra que os aprendizeschineses possuem menor conscincia lingustica de uso

    de hedges em comparao aos brasileiros. Para uma

    apresentao mais concreta, vejamos os exemplos aseguir:13141516

    Quadro 4. Comparao do uso geral de hedges entreCTOB e CTOC

    CTOB CTOC

    Perguntas < Imagina se um dia, umgrupo de pessoas orien-tais quiser vir aqui viajar, oque voc sugere para elesfazerem? >

    < Se um dia, outros chine-sesvieremparacepas-sarem as frias aqui noBrasil, o que voc sugerepara eles fazerem? >

    Respostas Olha, jde-vem ter lido, mas eu acho

    que Gramado um lugarmuito bonito, praias... Aquitem umas praias bemlegais por perto, do Bra-sil n. No sei, eu achoque l pra cima no Riode Janeiro, nordeste, tempraias lindas tambm. Euno sei, eu gosto, particu-larmente, de lugares bemmovimentados assim.

    < TOCCF02 > Acho queeu vou apresentar o Rio,

    ou outro lugar, Santa Ca-tarina e outro lugar eu noconhece...

    < TOBLF05 > Eu acho queprimeiro o Rio. Acreditoque o que as pessoasconhecem mais de forasejam as imagens do Rion. Ento acho que seriamais interessante, at por-

    que o clima um poucomelhor, n?

    < TOCCM11 > Se eu for umvoluntrioparaapresentaro Brasil, eu quero... euquero lhe apresentar, porexemplo, para redeno,mesmo que redeno sejauma pequena parque, mas

    acho que um tipo desmbolo de Porto Alegre,ento eu vou apresentar.

    Notamos que quando fazem sugestes, os falantesbrasileiros usam um nmero considervel de marcadoresdiscursivos (eu acho, eu no sei, n) para fazerabertura e fechamento da fala; hedges posicionais

    (particularmente) para deixar a discusso em aberto oumargens para si prprio a m de no se comprometeremcom a sugesto feita; hedges declarativos (umas) paradar informaes no muito precisas e, ao mesmo tempo,hedges sugestivos (seria), para que a fora da ao sejaatenuada.

    13 Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul.14Communication University of China, Nanjing.15 A razo forma/item (FI) obtida dividindo-se o total de formas pelo total

    de itens. FICTOB = 3837 39138 = 9.80%; FICTOC = 2774 25871 =10.72%.

    16A frequncia de aplicao de hedges (FdH) serve para vericar apercentagem do uso dehedges em cada corpus. Divide-se o nmero totalde formas pelo nmero total de hedges no mesmo corpus: FdHCTOB =1704 39138 = 4.35%; FdHCTOC = 759 25871 = 2.93%

  • 7/30/2019 AQUISIO DE PORTUGUS COMO LNGUA ADICIONAL

    7/12

    Aquisio de portugus como lngua adicional (PLA) 65

    Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 46, n. 3, p. 59-70, jul./set. 2011

    Quanto fala dos falantes chineses, alm da poucaaplicao de hedges, os falantes utilizam verbos per-formativos (sublinhados na tabela) para explicitar a

    inteno, tornando as sugestes com ato de fala signi-cativamente mais diretas. Talvez essa forma de se ex-

    pressar, com bastante assero, denote uma caracterstica

    dos aprendizes estrangeiros, que se preocupam com osucesso da interao.Embora todos os exemplos tirados acima expressem

    claramente a inteno dos locutores, os dois grupos deinformantes utilizam estratgias comunicativas bem

    distintas. A grande frequncia do uso de hedges torna a falados informantes brasileiros mais indireta e mitigada. Com

    base nos dados desta pesquisa, parece que esse aspecto deuso e sua inter-relao na linguagem so mais difceis deserem percebidos e adquiridos pelos aprendizes de PLA.

    1 Hedges como marcadores discursivos:

    Conforme os dados de frequncia do uso de hedgesem cada categoria, deprendemos que os hedges comomarcadores discursivos apresentam sempre um nmeromaior do que os demais em textos falados. A palavra n um hedge mais marcante nos discursos dos falantes

    brasileiros, cuja frequncia chegou a 137.2 em cada 10mil palavras:

    Quadro 5. Uso de n no CTOB e CTOC

    TOB TOC

    < TOBLF07 > cada programa,cada canal tem um telespectadorespecco n? por exemplo...claro, canal aberto, Globo,SBT, Record, n? so mais praclasse mdia e classe mdiabaixa, porque os outros podemter Net, Sky, n? Essas TVs porassinatura, ento esses canaispassam mais besteira. Novela,n? Passam esses programas deauditrio, n? que mais centradopra esse pblico, n? Mas claro,eda,porexemplo,seil,essescanal de histria, de animais, n?so mais voltados pro pblicomais cultural assim, n?

    Acho que l naChina muito seguro n? No ano

    novo chins, normalmente, umtipo de frias, tipo de feira, feirade... tambm nem feira de livro,maslnaChinanosechamaisso.

    A gente j couaquibastantetempo,jcouaqui5 meses n?

    Vimos que quase todas as frases do CTOB acimaterminam com a palavra n. Entretanto, no CTOC,encontramos apenas nove casos do uso dessa palavra. Na

    aula de PLA, se o aluno pergunta sobre o que quer dizern, o professor normalmente responde que essa palavra um tipo de marcador que tem sentido igual a no ?,sendo utilizada para que o interlocutor seja envolvidona conversa e para que sua armao seja reconhecida.Porm, quando repensamos os exemplos acima,

    possvel indagarmos se o falante est realmente toansioso para que sua fala seja aceita. Essa palavra, talvez

    na maioria das vezes, seja produzida inconscientemente,

    pois aparentemente no possui sentido muito relevante.Neste sentido, como um hbito especco, ela representea lngua falada do PB.

    Outro exemplo o uso de Acho. Sendo o segundohedge mais frequentemente produzido no CTOB, a

    palavra acho (ou eu acho, acho que e achei,em alguns casos) foi entendida como sendo umaexpresso que representa a plausibilidade do enunciadoe a responsabilidade do locutor. Entretanto, no corpus,

    essa palavra em sua maioria das vezes aparece como

    abertura de fala, precedendo o argumento de um ponto

    de vista pessoal. No CTOC, a palavra acho o hedgemais produzido, sendo o nico dessa categoria que tmfrequncia maior do que o correspondente no CTOB.

    Quadro 6. Uso de acho no CTOB e CTOC

    CTOB CTOC

    < TOBDM09 > Eu acho que uma, no campo prossional,por exemplo, eu acho que svezes, rola uma espcie decompetio, por exemplo, tucompete com teu colega pra verquem faz melhor tal coisa ouquemfazmaisrpidotal coisaou quem agrada mais o chefe.Eu acho que isso, talvez, podeter uma semelhana. Acreditoque nesse ponto assim, que mevem na cabea agora.

    < TOCCM09 > Viagem, acho quepode ser ir ao Rio de janeiro, paraestudar, Rio grande go sul pode ser,So paulo acho que tambm, alitem as universidades muito bons,acho que para viajar, eles tem de irao Rio de janeiro.

    Alm de eu acho, os informantes brasileiros

    ainda produzem acredito, vejo para expressarideias de mesma natureza. Servindo como movimentospreliminares, eles tm funo apenas de iniciar umanova argumentao e manter seu turno de fala. Porm noCTOC, as formas de marcadores discursivos so muitolimitadas, restringindo-se apenas forma acho.

    Outros exemplos de hedges que so bastante pro-duzidos no CTOB e raramente encontrados no CTOC

    nessa categoria de marcadores discursivos so eu nosei (ou sei l), sabe, pois etc.

    Semanticamente, a expresso eu no sei provocariauma resposta cooperativa mas no-esperada, e sei luma resposta no-cooperativa. Em outras palavras,essas duas expresses, teoricamente, pressupem umadescontinuidade da conversa. Porm, nas interaescomunicativas, elas representam outras funespragmticas. Por exemplo, nos enunciados Ah!No sei...

    Olha, acho que no, para sempre acho que no, de repente

    os carros; e Olha, acredito que a forma seria sempre por

    voo, todos. Sei l, o meio de transporte que voasse sobre

    gua, sobre qualquer superfcie. Entendemos que nosei nos exemplos, no quer dizer eu no consigo te dara resposta, mas sim eu no tenho certeza, porm tento

  • 7/30/2019 AQUISIO DE PORTUGUS COMO LNGUA ADICIONAL

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    66 Perna, C. L.; Sun, Y.

    Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 46, n. 3, p. 59-70, jul./set. 2011

    te responder. Igualmente, sei l no necessariamentesignica no sei e nem quero saber, mas pode ser uma

    preparao para resposta cooperativa, embora esta possaser no-esperada ou no-exata. Essas expresses, invsde impedir a continuidade da comunicao, auxiliamo sujeito a ganhar tempo para organizar a sua fala.

    A palavra sabe, seguida por ponto de interrogaoinserido no enunciado, nem sempre est testando oconhecimento contextual do interlocutor; digamos nonecessariamente implica a ideia de que o sujeito falanteseja plural e pois normalmente precede uma opiniocontrria do que foi dito pelo interlocutor.

    Podemos dizer que os hedges, como marcadoresdiscursivos, so identicados mais por sua funo

    pragmtica do que semntica e que tornam os enunciadosmais coerentes e aceitveis.

    2 Hedges pressupositivos:

    A maior diferena do uso de hedges entre falantesbrasileiros e chineses a escolha de hedges pressupositivos.

    Comparados aos brasileiros, os aprendizes chineses domais respostas armativas quando so solicitados aexplicar o entendimento de acordo com as imagens ou

    criar alguma situao hipottica.

    Quadro 7. Distino do uso de hedges pressupositivosentre CTOB e CTOC

    CTOB CTOC

    Perguntas

    Respostas < TOBAF02 > Bom, essasduas para mim, elas pa-recem so duas coisas...Essa que eu entendo,seriaa minha viso queseriam duas mos, n,simbolizando o planeta,Terra, e isso mostra aglobalizao, uma parceriaentre os mundos, n.

    < TOCCM08 > E primeirafoto sobre o, nossoglobo vai se tornar maispequeno, e, hum, e arelao dos pases ou dospessoas vai mais intenso,intenso como duas mos

    < TOCCM07 > Acho queesta figura significa...Todo mundo rene... umaetnia. assim. Segundafigura significa... achoque signica destruir oorestaetambmdestruiro mundo

    Perguntas < Vamos imaginar, se um dia, no existirem mais fron-

    teiras entre qualquer lugar, para onde voc preferia ir? >Respostas Ah! Em v-

    rios lugares, acho quetudo, que gira volta. Eugostariadeconhecerv-rios lugares. Eu acho quea sia. Eu acho que temlugares interessantes, beminteressantes, a Chinacom certeza. Europa temlugares lindos, tanto cultu-ralmente, sabe. Eu achomuitos lugares interessan-tssimos assim que euqueriaconhecer,vrios.

    < TOCCF05 > rabe. Por-que eu gostodeculturalna rabe. Porque, porqueeu gosto de pirmide. muito bom.

    < TOCCM09 > Eu gostode viajar para Italian e...ou Holanda

    Alm dessas distines, deprendemos tambmdos dois corpora que o uso de hedges pressupositivosno CTOB varia consideravelmente de acordo com

    os diferentes tpicos. Os informantes usam acho,talvez, provvel etc., palavras tpicas de hedgespressupositivos, alm de verbos modais em diferentes

    tempos verbais pode, possa, poderia, podiaetc. Alm disso, h tambm expresses com marcadores,tais como quem sabe, de repente, entre outras. NoCTOC, o uso dos hedges dessa categoria reete maiso sentido literal das palavras. No total, existem apenas

    quatro formas de hedges nessa categoria, quais sejam:talvez, acho, pode e parece. Todos so hedges

    pressupositivos bem denidos. No entanto, as palavrastais como verbos indicativos no futuro pretrito (faria) e

    modalidades epistmicas e denticas nunca apareceram.

    Quadro 8. Uso de hedges pressupositivos no CTOBe CTOC

    CTOB CTOC

    Perguntas < Depois da formatura, oque voc pretende fa-zer? >

    < O qu tu pretendes fazerquando tu voltares para aChina? >

    Respostas < TOBDM09 > Eu querofazer uma especializao.Eu no sei se, a princpio, melhor eu fazer umaespecializaooujfazero mestrado (...) Talvez,projetos... talvez...nanasno, nanas,acho que meio complicado. Masprovavelmente vai sermarketing internacional.Provavelmente vai seruma especializao emmarketing, pra depoisfazer o mestrado.

    < TOCCM09 > Eu achono futuro, talvez tem umtrabalho perto casa, se-gundo is... em China,tem pouco pessoas estu-dar portugus. No futuro,talvez tem uma trabalhoboa.

    Perguntas < Voc acha que um dia,alguns deles sero substi-tudos? >

    < O qu tu pretendes fazerquando tu voltares para aChina? >

    Respostas < TOBLF06 > Olha, acreditoque a forma seria semprepor voo,todos.Sei l, omeio de transporte quevoassesobregua,sobrequalquer superfcie. Entoisso substituiria o navio,o carro, o avio. Quemsabe at a complexidadedo transporte substituiriao foguete. Se tivesse alta

    velocidade, substituiriao trem, mas a bicicleta,eu vejo como um lazer.Ento, acho que esseseria o nico que noseria substitudo.

    < TOCCF02 > Eu queriaser um tradutor e talvez euquero ir a frica, Angola,ou talvez eu vou voltarpara o Brasil

    3 Hedges declarativos:

    Os dados do corpus representam uma tendncia de

    que os informantes chineses produzem informaes bemmais especcas em relao ao tempo, lugar e nmero.

  • 7/30/2019 AQUISIO DE PORTUGUS COMO LNGUA ADICIONAL

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    Aquisio de portugus como lngua adicional (PLA) 67

    Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 46, n. 3, p. 59-70, jul./set. 2011

    Os informantes brasileiros, por sua vez, produzem mais

    hedges declarativos, para tornar tais tipos de informaesmenos transparentes. De fato, os hedges declarativos nonecessariamente pressupem que o usurio no se lembreda informao especca, mas que os falantes no esto,talvez, se esforando na busca da informao precisa, pois

    esta no afeta as mximas de relevncia e qualidade daconversa. Por sua vez, os aprendizes, talvez devido faltade procincia, ainda prestem muita ateno a todos osdetalhes.

    Quadro 9. Distino do uso de hedges declarativosentre CTOB e CTOC

    CTOB CTOC

    Perguntas < Como foram suas ltimas frias? >

    Respostas < TOBAM01 > Eu passeiuns20diasnapraia,nalde dezembro. Uns 15 diasali, 10 dias de Janeiro na

    praia. Depois eu retorneipara Porto Alegre pracontinuar trabalho, n!E a, eu saia do trabalhopor volta da 6 horas detarde Ipara casa,fazeralguma coisa na noitenormalmente, e ia prapraiaumououtronaldesemana.

    Bom, nesseano conseguimos n,fazer uma viagem, passaruns 5 dias assim, numacasa de praia, bem praaproveitando, passandoquase todas estaes doano, numa semana s n

    < TOCCF02 > No dia 26 noite, eu fui passear umpouco, e no volto, eu fui...tem um carro, atropelou-

    me de repente.

    < TOCCF03 > Eu fui aArgentina com os meuscolegase caval por 4dias, uma cidade.

    < TOCCM11 > Os brasi-leiros s tm quatro coisaspara fazer, tipo futebol,churrasco, praia e festa,s isso.

    As formas mais encontradas de hedges pres-supositivos no CTOB so palavras ou sintagmasadverbiais e preposicionais, tais como normalmente,principalmente, geralmente, basicamente,praticamente, politicamente etc. e de certa forma,de certa maneira, de certo modo, de modo geral,em torno de, por volta de, entre outros. Entende-seque essas formas sejam difceis de serem adquiridas pelosaprendizes chineses, pois existe pouca produo dessetipo de hedges no CTOC. Alm disso, muitos deles soimpossveis de serem traduzidos e explicados de forma

    literal em lngua chinesa.

    Outra observao baseada nas amostras do CTOB que o objetivo da produo dos hedges declarativos ,

    principalmente, limitar o mbito de nmero ou de tempoa m de proteger as mximas de modo e de qualidadeda fala, mas no descrever o sentimento ou opinies

    pessoais na argumentao. Por isso, esses hedges somais encontrados quando so utilizados para responder asinformaes pessoais. Diferentemente do uso de hedges

    declarativos no CTOB, os falantes chineses usam muito

    menos esse tipo de hedge nas respostas de questes quese relacionam vida privada em relao aos brasileiros,mas bastante mais em outros tpicos quando expressamas opinies pessoais e argumentativas.

    Quadro 10. uso de hedges declarativos no CTOB eCTOC

    CTOB CTOC

    Perguntas < Voc concorda com estafrase ? >

    < Tu achas que na China,as mulheres so bemvalorizadas quando tra-balham? >

    Respostas < TOBAM03 > Ah, eu nosei, assim o importante competir, essa frasemuito... muito politica-mente correta.

    Acho quemais ou menos. E nor-malmente, homens emulheres tm trabalhosdiferentes.

    Perguntas < Depois da formatura, oque voc pretende fa-zer?>

    Respostas < TOBAM01 > Eu querofazer uma especializao.Eu no sei se, a princpio, melhor eu fazer umaespecializaooujfazero mestrado

    Depende,acho que eu vou... sim. Nosei por que geralmente asmulheres tm que arrumara casa.

    Perguntas < Voc vai ao cinema so-zinho ou com namora-da? >

    < A qual sentimentohumano se refere estacharge? > < Voc no gosta deassistir TV? > < O que voc e seusamigos fazem no seu tem-po livre? >

    Respostas < TOBLM08 > Geralmen-te eu vou com minhanamorada, a pessoa que

    eu mais vou com ela,mas s vezes, com algunsamigos tambm, masmais com ela e de vez emquando, eu vou sozinhotambm.

    < TOCCM08 > Achoque o foto queria, a fotodiz algumas vezes que

    ganhar o primeiro lugar uma sorte. < TOCCM09 > no...tudo... algumas vezes, euno tenho muito tempo. < TOCCF03 > Ns jo-gamos computadores, ealgum... algumas vezesjogar cartos.. cartas, efazer... fazemos compras.

    Percebemos ainda que os chineses produzem muitomais normalmente, s vezes e mais ou menos.Isso deve ter sido inuenciado pelo seu prprio sistemalingustico. No entanto, embora haja um nmero muitomenor desse tipo de hedge no CTOC, a frequncia totalde sua produo no ca muito inferior no CTOB. Almdisso, os aprendizes chineses generalizam, nem sempre

    com sucesso, os signicados das palavras e expresses,usando-as com diferentes sentidos. Corforme o quadro 9apresentado acima, no exemplo , algumasvezes pode ser interpretado como de certa maneira;no , a mesma expresso tem sentido denormalmente, ou muitas vezes; j no ,ela pode ser entendida como s vezes. Nenhuma das trs

  • 7/30/2019 AQUISIO DE PORTUGUS COMO LNGUA ADICIONAL

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    68 Perna, C. L.; Sun, Y.

    Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 46, n. 3, p. 59-70, jul./set. 2011

    interpretaes muito utilizada por falantes brasileiros.Por isso, quando analisamos a fala dos aprendizes,

    precisamos usar de um maior rigor para identicar ocontexto de fala, a m de melhor entender a inteno dofalante e orientar adequadamente o ensino de LA.

    4 Hedges sugestivos:Quase todos os hedges sugestivos selecionados

    no CTOB podem ser considerados como mitigadores,

    cujas formas principais so verbos indicativos no futuropretrito. Tal tempo verbal normalmente visto como

    um verbo condicional, sendo ensinado para os alunos

    como forma de se expressar, de forma mais polida, o

    pedido; ou nas frases que contm verbos de subjuntivono passado. Porm, no CTOC, observamos que alm dosverbos modais, esse tipo de palavra muito difcil de ser

    encontrada na produo dos alunos chineses.

    Quadro 11. Uso de hedges sugestivos no CTOB e

    CTOC

    CTOB CTOC

    Perguntas < Se a vida fosse umaviagem, qual transportevoc gostaria de utili-zar? >

    < Fale sobre o seu en-tendimento sobre estaimagem. >

    Respostas < TOBDM09 > Acho quecarro. Tu aproveita mais,ou tu pode ver cadaparte, cada caminho datua viagem... Acho queo carro seria uma boaopo.

    < TOCCF03 > Esta ima-gem queria expressaruma ideia que os povos domundo queria ser unidos.

    No CTOC, no houve ocorrncia de hedge que sejaverbo, alm do uso como auxiliar do tempo verbal do

    futuro pretrito. Por isso, os chineses produzem bastante

    queria fazer em vez de faria. A explicao poderiaser que, por um lado, eles tinham pouco inputdo indicativono futuro pretrito; e por outro lado, o uso de verbo auxiliar

    pode diminuir o risco do erro na conjugao, sendo umaforma de simplicar o uso do tempo verbal. Com basenos dados apresentados, os nicos dois hedges sugestivos

    produzidos por informantes chineses, que apresentam umafrequncia mais alta do que as produes dos brasileirosso queria e pode, sendo ambos verbos auxiliares.

    5 Hedges posicionais:

    Hedges posicionais so os hedges que apresentammaior similaridade de uso nos dois corpora em termos

    de frequncia. Quanto s suas formas, o CTOC representanove formas, entre as quais, oito so realizadas na primeira

    pessoa do singular, tais como para mim, na minhaopinio etc, enquanto o CTOB representa 19 formas,com 17 responsveis pela primeira pessoa do singular.

    Quadro 12. Uso de hedges posicionais no CTOB eCTOC

    CTOB CTOC

    Perguntas < Tu tens algum momentovivido at hoje que tuachas muito emocionantepara ti? >

    < Como foi a viagem daChina para o Brasil? >

    Respostas < TOBLF04 > Ah, lgicoquando minha sobrinhanasceun(...)eucomeceia cuidar dela, comecei aser... Da agora a gentesente meio como me n,responsvel, e tem quecuidar, tem que... A genteestsempreemcima,simsabendo como ela t, oque ela quer...

    < TOCCM06 > Humm...acho que o estncia doavio to longe paramim.

    < TOCCF03 > Para mim,a viagem foi muito inte-ressantes.

    Perguntas < A qual sentimento se re-fere esta charge? >

    Respostas < TOBLF05 > a gente sem-pre tenta ser o melhorn, esse a gente sempretenta fazer o melhor. Agente d o mximo prafazer o melhor, e no... Euacho que a gentenuncatsatisfeito. que a gentesempre quer melhorar ecrescer...

    < TOCCF01 > Para mim,os brasileiros so muitosimptico, as meninasso muito bonitas e osbrasileiros me ajudammuito.

    < TOCCF02 > Na minhaviso sobre o Brasil, achoque muito bonito, todosos lugares tm muitorvores e ores, para oporto alegre, uma cidadearborizada.

    < Ento voc se achauma pessoa satisfeita? >

    Eu me acho muito, muitosatisfeita. Muito!

    No CTOC, a palavra mais frequente nessa categoria para mim, sendo um hedge mais fcil de ser entendidoliteralmente pelos falantes chineses. A expresso a

    gente somente ocorreu uma vez como hedge posicional,enquanto no CTOB, o hedge posicional com maiorfrequncia justamente a palavra a gente. Encontramosmuitos exemplos desse fenmeno, quando a palavra nonecessariamente tem sentido de ns. Alguns delesquerem dizer eu, em outras situaes, ela pode serinterpretada como as pessoas.

    No exemplo , a expresso a gente mais possvel de ser interpretada como eu pelocontexto. No exemplo , se no houvesse asegunda pergunta, os a gente no enunciado no seriamconsiderados como hedges e deveriam ser interpretados

    como ns. No entanto, depois de toda explicao quea gente nunca se sente satisfeita, o informante logoarma que se acha muito, muito satisfeito. Portanto,consideramos aqui, que o pronome a gente tem sentidode as pessoas.

    De fato, nesse exemplo, o que ainda pode ser discutido a palavra satisfeito. O informante disse que a gentenunca t satisfeita e eu me acho muito satisfeita,nos quais a palavra satisfeita possui conotaesdiferentes. No primeiro caso, nunca estar satisfeitoquer dizer nunca querer parar de melhorar, evoluir.

  • 7/30/2019 AQUISIO DE PORTUGUS COMO LNGUA ADICIONAL

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    Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 46, n. 3, p. 59-70, jul./set. 2011

    No segundo caso, eu me acho satisfeita quer dizereuestou gostando da minha vida, pois no h nadapara reclamar; estou satisfeita com o que tenho. Noentanto, essas possveis anlises foram feitas com base

    na estranheza que a expresso a gente concedeu aodiscurso. Ela torna o enunciado mais vago e a palavra

    satisfeita demonstra ambiguidade.

    6 Hedges emotivos:

    Este tipo de hedge no foi muito encontrado em nossocorpus, talvez devido limitao dos tpicos escolhidosnas entrevistas, que alm das questes pessoais, apresentoua maioria das perguntas de natureza argumentativa. No

    CTOB, apenas duas formas foram consideradas como esse

    tipo de hedge. So elas: morfema de diminutivo de nomes(-inho/inha) e pergunta retrica (???). H duas formas,tambm, no CTOC, que foram consideradas como hedgeemotivos. Esses so muito muito e -inho/inha.

    Quadro 13. Uso de hedges emotivos no CTOB eCTOC

    CTOB CTOC

    Perguntas < O que voc entendesobre a questo da desi-gualdade socioecon-mica? >

    Respostas (...) O quet acontecendo??? agente paga tanto imposto,a gente passa quatromeses do ano no Brasil,pagando imposto, e paraonde vai esse dinheiro???A gente no tem maisescola descente, a genteno tem um hospital dequalidade, a gente no temsegurana para andar narua, estranho assim. Praonde vai tudo isso???

    < TOCCF01 > Eu achoque eles so muito muitosimpticos,eoBrasil,eugosto muito do futebol doBrasil.EuachoqueKak muito muito bonito.

    < TOCCM09 > Antes eucheguei ao Brasil, eu achoque todos os brasileirosjogammuitobom.Quandoeu joguei com eles, no muito muito bom.

    Perguntas < A qual sentimento hu-mano se refere estacharge? >

    < O que aconteceu quandotu viajaste no avio? >

    Respostas (...) Esseaqui no conseguiu nadae caria feli z s como pouquinho do queeles tem, pouquinho decada um n. Triste n,coitadinho daquele ali.

    Puxa vida!

    < TOCCF06 > ltima vez,a gente foi para Argentina.Eu vi o luz noite. Muitomuito muito bonito.

    < Muito bonito n? >

    < TOCF06 > Muito muito

    muito bonito. E antes dechegar no Buenos Airestambm muito legal.

    Os hedges emotivos esclarecem-nos a concepode que os hedges nem sempre so considerados comodesintensicadores. O exemplo de acimarepresenta bem essa ideia. Em geral, a maioria das

    perguntas retricas possui a funo de intensicadoras eno de atenuadoras da fora ilocucionria. Entretanto, oaparecimento deles sempre faz com que o enunciado que

    mais vago do que apenas um indicativo de armao. Nooutro exemplo , o falante utiliza trs -inhocom nfase na prosdia de fala, para demonstrar que oguri realmente coitadinho. Nesse caso, a palavrapouquinho, embora represente seu sentido literalde muito pouco, pertence categoria de hedge por

    aumentar o sentimento do enunciado.Quanto ao uso de hedges emotivos no CTOC, no foiencontrado nenhum hedge com apresentao de estruturatpica. Ou seja, no h hedge de pergunta retrica noCTOC como hedge emotivo. Entretanto, percebemos um

    tipo de expresso bastante marcante na fala dos sujeitoschineses, a expresso muito muito, que talvez possa serconsiderada como hedge. A expresso ocorre apenas umavez no CTOB, que foi considerada como sendo somenteuma nfase na descrio. No entanto, no CTOC, elaapareceu 18 vezes, tornando-se uma expresso especcana fala dos informantes chineses. Nos enunciados, tais

    como em , armando que algo que muitobom, mas no muito muito bom, o enunciado torna-sevago aps a adio da expresso muito muito.

    Concluso

    Este artigo objetivou analisar a produo oral dosfalantes brasileiros de portugus e aprendizes de PLA,

    vericando a funo comunicativa da linguagem atravsdo uso de hedges. Os resultados sugerem que os aprendizeschineses conseguem expressar claramente sua posiopessoal, porm possuem fala muito mais direta, com

    informaes mais precisas do que a fala dos informantesbrasileiros. Entendemos que os hedges podem, de certamaneira, representar a procincia comunicativa dosfalantes, o que signica muito mais do que conhecer osistema abstrato de uma lngua, segundo Perna (1992).

    Reconhecemos que os resultados deste estudo tmlimitaes, entre elas o de ter sido conduzido atravs deentrevistas formais que no provocam produes totalmentenaturais, alm do fato de no possuirmos uma amostramuito grande com tpicos de entrevistas restringidos. Por

    outro lado, apesar de no serem muito extensos, os corporaanalisados neste trabalho tm seu signicado considervel

    para o estudo de aquisio de hedges na rea de PLA. Osresultados poderiam ser considerados para o planejamento

    do ensino e aprendizagem do PLA e para futura pesquisasobre aquisio de aspectos pragmticos em PLA.

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    Recebido: 11/05/11Aprovado: 21/05/11

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