apostila potenciometria

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Resumos de potenciometria - Prof Edgard 1 POTENCIOMETRIA 1.0 - DEFINIÇÃO DA TÉCNICA A potenciometria é um método eletroanalítico de análise quantitativa que utiliza o potencial desenvolvido por celas eletroquímicas sob condição de corrente quase nula para determinar a concentração de espécies químicas em solução. Neste caso, a cela eletroquímica é denominada cela potenciométrica. A espécie química determinada pode ser um cátion ou ânion e recebe a denominação genérica de analito . A instrumentação utilizada nesta técnica consiste basicamente de um par de eletrodos, sendo um indicador e outro de referência, e um potenciômetro. O potenciômetro recebe a denominação de pHmetro quando programado para fornecer o resultado diretamente em unidades de pH. Os eletrodos utilizados em potenciometria podem ser classificados segundo dois critérios independentes entre si. Um critério está relacionado com o processo pelo qual é desenvolvido o potencial proporcional à atividade da espécie química em solução. O outro critério indica sua função na cela potenciométrica, isto é, referência ou indicador. 2.0 - CLASSIFICAÇÃO DOS ELETRODOS QUANTO AO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DE POTENCIAL EM SUA SUPERFÍCIE Observação : Neste texto, a concentração analítica (ou total) de um determinado íon, “[X]” é considerada igual à sua atividade, “a x ”. Esta aproximação é válida apenas quando a solução é diluída em relação a “X” e também diluída em relação à concentração total de todos os outros íons presentes (força iônica baixa). A atividade de um íon pode ser considerada como sendo sua “concentração ativa” na solução. Todos os eletrodos potenciométricos respondem à atividade e não à concentração analítica do íon. A atividade é definida como sendo o produto entre o coeficiente de atividade e a concentração analítica: a x = g x [X]. O coeficiente de atividade é adimensional e para soluções diluídas em relação a todos os íons presentes tem-se: g x 1 => a x [X] 2.1 - ELETRODOS METÁLICOS DE 1 a CLASSE (OU 1 o TIPO) Este tipo de eletrodo é constituído de um metal em equilíbrio com seus próprios íons presentes na solução. Exemplo 1 : prata/íon prata: - representação da meia-cela: Ag (s) | Ag + (aq) (x mol/L) || - equilíbrio de redução: Ag + (aq) + 1 e - Ag 0 (s) - potencial de meia-cela: E Ag+/Ag = E 0 Ag+/Ag - 0,0592 log 1/a Ag+

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POTENCIOMETRIA

1.0 - DEFINIÇÃO DA TÉCNICA A potenciometria é um método eletroanalítico de análise quantitativa que utiliza o potencial

desenvolvido por celas eletroquímicas sob condição de corrente quase nula para determinar a concentração de espécies químicas em solução. Neste caso, a cela eletroquímica é denominada cela potenciométrica. A espécie química determinada pode ser um cátion ou ânion e recebe a denominação genérica de analito. A instrumentação utilizada nesta técnica consiste basicamente de um par de eletrodos, sendo um indicador e outro de referência, e um potenciômetro. O potenciômetro recebe a denominação de pHmetro quando programado para fornecer o resultado diretamente em unidades de pH. Os eletrodos utilizados em potenciometria podem ser classificados segundo dois critérios independentes entre si. Um critério está relacionado com o processo pelo qual é desenvolvido o potencial proporcional à atividade da espécie química em solução. O outro critério indica sua função na cela potenciométrica, isto é, referência ou indicador.

2.0 - CLASSIFICAÇÃO DOS ELETRODOS QUANTO AO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DE POTENCIAL EM SUA SUPERFÍCIE

Observação: Neste texto, a concentração analítica (ou total) de um determinado íon, “[X]” é considerada igual à sua atividade, “ax”. Esta aproximação é válida apenas quando a solução é diluída em relação a “X” e também diluída em relação à concentração total de todos os outros íons presentes (força iônica baixa). A atividade de um íon pode ser considerada como sendo sua “concentração ativa” na solução. Todos os eletrodos potenciométricos respondem à atividade e não à concentração analítica do íon. A atividade é definida como sendo o produto entre o coeficiente de atividade e a concentração analítica: a x = gx [X]. O

coeficiente de atividade é adimensional e para soluções diluídas em relação a todos os íons presentes tem-se: gx 1 => ax [X]2.1 - ELETRODOS METÁLICOS DE 1a CLASSE (OU 1o TIPO)

Este tipo de eletrodo é constituído de um metal em equilíbrio com seus próprios íons presentes na solução.

Exemplo 1: prata/íon prata:- representação da meia-cela: Ag(s)| Ag+

(aq) (x mol/L) ||

- equilíbrio de redução: Ag+(aq) + 1 e- Ag0

(s)

- potencial de meia-cela: EAg+/Ag = E0Ag+/Ag - 0,0592 log 1/aAg+

ou EAg+/Ag = E0Ag+/Ag - 0,0592 pAg

Exemplo 2: mercúrio/íon mercuroso- representação da meia-cela: Hg(l)| Hg2

2+ (aq)

(x mol/L) ||

- equilíbrio de redução: Hg22+

(aq) + 2 e- 2 Hg0(l)

Quando existe a condição de reversibilidade da reação, o eletrodo metálico é sensível à concentração de seus próprios íons em solução. Contudo, estes sistemas possuem pouca aplicação prática, devido a vários fatores, tais como:- Metais duros como Fe, Cr, Co e Ni não produzem potenciais reprodutíveis- Metais situados abaixo do hidrogênio na tabela de potenciais padrão de redução geralmente reagem em meios ácidos. Ex: Zn, Cd- Alguns metais de fácil oxidação só podem ser utilizados em soluções desaeradas para evitar formação de camada superficial de óxido. Ex: Pb, Cu, Bi, Tl- A presença de metais com maiores potenciais de redução na solução produzem resposta não seletiva. Ex: determinação de Cu2+ com eletrodo de Cu(s) na presença de íon Ag+ ocorre redução do Ag+ sobre o eletrodo: 2 Agaq

+ + Cu(s) 2 Ag(s) + Cuaq2+

2.2 - ELETRODOS METÁLICOS DE 2a CLASSE (OU 2o TIPO)

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Este tipo de eletrodo consiste de um metal em equilíbrio com solução saturada com um de seus sais pouco solúvel. Ao invés do sal pouco solúvel, pode-se ter também solução contendo um complexo estável deste metal. Este eletrodo possui sensibilidade para o ânion do sal pouco solúvel ou do complexo estável, respectivamente.Exemplo para: “ metal solução saturada de sal pouco solúvel ”Eletrodo de prata/cloreto de prata

- representação da meia-cela: Ag(s)|AgCl(sat.), Cl- (x mol/L) ||

- equilíbrio de redução: AgCl(s) + 1 e- Ag(s) + Cl-(aq)

- potencial de meia-cela: EAgCl/Ag0+Cl = E0AgCl/Ag0+Cl - 0,0592 log aCl-

ou EAgCl/Ag0+Cl = E0AgCl/Ag0+Cl + 0,0592 pCl

Demonstração do equilíbrio de redução do AgCl partir dos seguintes equilíbrios:

(1) equilíbrio de redução: Ag+aq + 1 e- Ag0

(s)

(2) equilíbrio de solubilidade: AgCl(s) Ag+aq + Cl-aq

Para (1) tem-se: EAg+/Ag0 = E0 Ag+/Ag0 - 0,0592 log (1/[Ag+])

Para (2) tem-se: Kps = [Ag+] . [Cl-] => [Ag+] = Kps / [Cl-] Substituindo-se (2) em (1) tem-se: EAg+/Ag0 = E0

Ag+/Ag0 - 0,0592 log ([Cl-] / Kps)=> EAg+/Ag0 = E0

Ag+/Ag0 - 0,0592 ( log [Cl-] - log Kps )=> EAg+/Ag0 = “E0

Ag+/Ag0 + 0,0592 log Kps” - 0,0592 log [Cl-] A expressão entre aspas é uma constante e equivale ao potencial padrão de redução da reação:

AgCl(s) + 1 e- Ag(s) + Cl-(aq) ........... E0

AgCl/Ag0+Cl = 0,222 V

=> EAgCl/Ag0+Cl = E0AgCl/Ag0+Cl + 0,0592 pCl

Para garantir que a solução adjacente à prata metálica fique sempre saturada em AgCl, costuma-se revestir o fio de prata com uma camada de AgCl sólido conforme figura 1.

AgCl(aq)(saturado)

Cl-(aq)

Ag sólido

AgCl sólido

Figura 1. Eletrodo de prata-cloreto de prata

Exemplo para: “ metal solução com complexo estável ”Eletrodo de mercúrio/complexo Hg-EDTA

2.3 - ELETRODOS METÁLICOS INERTESConstituído de metais nobres como Pt, Au, ou Pd em contato com par redox reversível em

solução. Metais como: W, Ta e aço inox não são inertes o suficiente para esta finalidade, pois formam película de óxido isolante.Exemplo: fio de Pt e par redox Ce(IV)/Ce(III)- representação da meia-cela: Pt(s)|Ce4+

(aq) (x mol/L), Ce3+(aq) (y mol/L) ||

- reação de redução: Ce4+(aq) + 1 e- Ce3+

(aq)

- potencial de meia-cela: ECe4+/Ce3+ = E0 Ce4+/ Ce3+

- 0,0592 log aCe3+ /aCe4+

Neste caso, o material do eletrodo funciona como transportador inerte de elétrons não participando diretamente da reação redox. Outros pares redox reversíveis:

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Fe3+ + 1 e- Fe2+

I3- + 2 e- 3 I-

Alguns sistemas redox não se comportam de maneira reversível na superfície do eletrodo, e desta forma, não produzem potenciais reprodutíveis. Isto acontece porque a transferência de elétrons é lenta nestas reações. Exemplos de pares redox irreversíveis:

S4O62- + 2 e- 2 S2O3

2-

Cr2O72- + 14 H+ + 6 e- 2 Cr3+ + 7 H2O

MnO4- + 8 H+ + 5 e- Mn2+ + 4 H2O

2.4 - ELETRODOS DE MEMBRANATambém conhecidos como eletrodos íon seletivos (EIS) são muito utilizados em potenciometria,

sendo o eletrodo de membrana de vidro sensível ao íon H+ o mais popular desta classe. Estes eletrodos serão estudados em capítulo posterior.

3.0 - CELAS POTENCIOMÉTRICAS3.1 - CONFIGURAÇÃO BÁSICA

No caso da potenciometria direta, o potencial desenvolvido pela cela deve possuir correlação linear com o logaritmo da concentração da espécie de interesse (analito). A Figura 2 apresenta o esquema básico do tipo mais simples deste tipo de cela, onde a solução de referência atua também como ponte salina. Desta forma, existe apenas uma junção líquido-líquido onde o potencial de junção (E J) é desenvolvido. Isto difere um pouco das celas voltaicas vistas anteriormente, onde a ponte salina apresentava duas junções líquido-líquido, cada uma situada em uma meia-cela (Figura 3).

Figura 2: Esquema de cela potenciométrica típica

Figura 3: Esquema de cela eletroquímica com ponte salina convencional

Nesta cela temos o desenvolvimento dos seguintes potenciais:Eref = potencial desenvolvido pelo eletrodo de referênciaEJ = potencial desenvolvido na junção líquido-líquidoEind = potencial desenvolvido pelo eletrodo indicador na presença do analito

3.2 - POTENCIAL DE JUNÇÃO LÍQUIDO-LÍQUIDOO potencial de junção líquido-líquido é produzido quando duas soluções contendo concentrações

diferentes do mesmo eletrólito e/ou eletrólitos diferentes, são postas em contato através de uma barreira que minimize a difusão entre estas soluções. Esta barreira pode ser feita com vidro sinterizado, asbesto (amianto), gel de ágar-ágar saturado com eletrólito, etc. A Figura 4 (A, B e C) apresenta 3 casos típicos de formação de potencial de junção líquida.

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Figura 4. Processo de formação do potencial de junção líquida Ej

Caso(A): Neste caso tem-se o mesmo soluto iônico (HCl) com concentrações diferentes. As mobilidades iônicas dos íons são as mesmas em ambos os lados da junção, contudo a difusão é maior no sentido da solução mais concentrada para a mais diluída. Como a mobilidade iônica do H+ é maior que a mobilidade iônica do Cl- tem-se como resultante um potencial positivo no lado da solução mais diluída.Caso(B): Neste caso as concentrações dos solutos são as mesmas em ambos os lados da junção. O íon comum aos dois eletrólitos (Cl-) sofre difusão com a mesma intensidade para ambos os lados da junção, anulando portanto qualquer resultante de carga. O íon K+ possui a mesma concentração que o H+, contudo a mobilidade iônica do H+ é superior à do K+ fazendo com que o lado contendo o KCl fique com potencial positivo.Caso(C): Este é o caso mais complexo, onde os solutos e as concentrações são diferentes em ambos os lados da junção. A previsão do sinal do potencial fica difícil, principalmente quando existem vários solutos envolvidos, como geralmente acontece na prática.Na prática costuma-se utilizar pontes salinas contendo solução de KCl saturada. Isto é feito porque as mobilidades iônicas do K+ e do Cl- são muito próximas e desta forma o potencial de junção é minimizado.

O eletrodo de referência, por convenção, representa o anodo da cela e, conforme será visto posteriormente, o Eind pode ainda possuir mais de um componente dependendo do tipo de indicador. O potencial global da cela é dado por: Ecela = Eind – Eref + Ej

Os valores de Eref e Ej devem permanecer constantes durante a utilização desta cela, ou seja, apenas o E ind

deve variar com a variação da concentração do analito.

4.0 - CLASSIFICAÇÃO DOS ELETRODOS QUANTO À SUA FUNÇÃO NA CELA POTENCIOMÉTRICA

O segundo critério de classificação é baseado no papel desempenhado pelo eletrodo na cela potenciométrica, sendo que neste caso, tem-se dois tipos de eletrodos: eletrodo de referência e eletrodo indicador. O eletrodo de referência deve manter um potencial fixo durante as medidas. Quando a cela potenciométrica é usada como detector de pontos de inflexão em titulações potenciométricas, não é necessário o conhecimento do valor do potencial de referência, bastando que este permaneça inalterado durante a titulação. Já o eletrodo indicador, deve responder à concentração do analito para o qual é sensível. No caso de potenciometria direta, é de suma importância uma resposta linear deste eletrodo em função do logaritmo da concentração do analito. Antes do estudo destes eletrodos será visto o modo básico de funcionamento de uma cela potenciométrica.

4.1 - ELETRODOS DE REFERÊNCIAO eletrodo padrão de hidrogênio (EPH), que é o eletrodo de referência universal, raramente é

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utilizado em potenciometria. Isto acontece porque sua operação é relativamente problemática quando comparada com outros eletrodos de referência que serão apresentados a seguir. Entre seus problemas, pode-se citar: risco de usar hidrogênio, que é muito inflamável e a necessidade de manter a superfície de platina platinizada sempre em boas condições. Assim, usa-se eletrodos de referência secundários ou de trabalho nas celas potenciométricas. Os potenciais desenvolvidos por estes eletrodos em relação ao EPH são bem conhecidos e desta forma, pode-se corrigir os resultados em relação ao EPH quando isto for necessário. Para fins de análise quantitativa, isto geralmente não é necessário. Os eletrodos de referência secundários devem preencher alguns requisitos básicos para exercer sua função com eficiência, tais como:(1) Possuir potencial estável(2) Obedecer a equação de Nernst (reversível)(3) Não ser polarizável quando submetido a baixas correntes(4) Retornar ao potencial de referência após polarização acidental(5) Possuir baixa histerese com ciclo de temperatura. Poucos são os eletrodos que atendem a todos estes requisitos. Neste texto serão abordados alguns detalhes sobre o eletrodo de prata/cloreto de prata (Ag/AgCl) e o eletrodo de calomelano (Hg/Hg2Cl2).

4.1.1 - ELETRODO DE PRATA/CLORETO DE PRATAÉ um eletrodo de 2a classe, onde a prata fica em contato com uma solução saturada de cloreto de

prata (metal em contato com solução saturada de um de seus sais pouco solúvel). A reação de redução que acontece neste eletrodo é:

AgCl(s) + 1e- Ag(s) + Cl-(aq) ; E0 = 0,222 V

Portanto, o potencial fornecido pela equação de Nernst para a meia-cela a 25 oC é: EAg/AgCl = E0Ag/AgCl – 0,0592 log aCl-

Observa-se assim, que este eletrodo é sensível à concentração de Cl-. Na prática, este eletrodo consiste de um fio de prata recoberto com uma camada de AgCl sólido em contato com uma solução saturada em AgCl. Esta solução também contém uma concentração fixa de Cl - (proveniente do KCl) para manter constante o potencial de referência. A Figura 5 apresenta o formato típico deste tipo de eletrodo encontrado no comércio.

Figura 5. Eletrodo de Ag/AgCl

Para manter fixa a concentração de Cl-

usa-se geralmente KCl saturado (cerca de 4,2 M a 25 oC). Isto minimiza o potencial de junção líquido-líquido, Ej

devido à proximidade entre as

mobilidades iônicas do Cl- e do K+, as quais diferem em apenas 4 %. O potencial deste eletrodo em relação ao EPH a 25 oC com KCl saturado é de + 0,199 V e com KCl 3,5 M, +0,205 V. A junção pode ser constituída de vidro poroso (sinterizado), tampão de asbesto (amianto) ou luva de vidro esmerilhado. Este eletrodo não pode ser utilizado em soluções contendo proteínas, devido à reação com o Ag+ que produz produtos insolúveis que provocam o entupimento da junção líquido-líquido.

2.1.2 - ELETRODO DE CALOMELANOEste também é um eletrodo de 2a classe onde se tem mercúrio metálico em contato com solução

saturada de calomelano (Hg2Cl2).Reação: 1/2 Hg2Cl2(s) + 1 e- Hg(l) + Cl-

(aq) ; E0 = 0,222 V

Potencial de meia-cela: EHg2Cl2/Hg = E0Hg2Cl2/Hg – 0,0592 log aCl-

Neste eletrodo também usa-se concentração fixa de solução de KCl, sendo que a 25 oC tem-se os seguintes potenciais em relação ao EPH de acordo com a concentração do KCl: 0,1 M = +0,3356 V; 3,5 M = +0,2550 V; saturado = +0,2444 V. A Figura 6 apresenta uma versão comercial deste eletrodo.

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Figura 6: eletrodo calomelano

Esta versão com KCl saturado na solução de referência, consiste de um tubo interno contendo uma pasta formada por Hg(l) + Hg2Cl2(s) + KCl(s). Esta pasta faz contato elétrico com o circuito externo através de um fio de

platina. O contato entre a pasta e a solução é feito através de um pequeno orifício situado na base do tubo interno. O eletrodo com KCl saturado é de fácil construção, mas possui as desvantagens de possuir um elevado coeficiente de temperatura (-0,001 V/oC) e exigir um tempo relativamente grande para estabilizar seu potencial após sofrer variação de temperatura (equilíbrio de solubilidade do KCl).

Este eletrodo não pode ser utilizado em temperaturas acima de 70 oC devido à reação de desproporcionamento (reação auto-redox) do cloreto mercuroso, formando mercúrio metálico e cloreto mercúrico (HgII).

Hg2Cl2(s) Hg0(l) + Hg2+

aq + 2 Cl-aq

Existem muitos outros eletrodos que podem ser utilizados como eletrodos de referência em situações particulares. Assim, por exemplo, um eletrodo de vidro sensível ao íon H+ pode ser utilizado como referência em uma solução tamponada, pois desta forma, a variação de pH é desprezível e seu potencial permanece praticamente constante.4.2 - ELETRODOS INDICADORES

Alguns eletrodos indicadores já foram estudados anteriormente no primeiro critério de classificação de eletrodos. Resumindo o que já foi visto tem-se:

4.2.1 - ELETRODOS DE 1a CLASSEEstes podem atuar como eletrodos indicadores do próprio íon metálico do eletrodo. Contudo, na

prática, apenas Ag e Hg se comportam de maneira reversível em relação a seus próprios íons.

4.2.2 - ELETRODOS DE 2a CLASSEEstes podem atuar como indicadores do respectivo ânion do sal pouco solúvel do metal do

eletrodo como:Ag/AgCl sensível ao íon cloreto (Cl-)Ag/Ag2S sensível ao íon sulfeto (S2-)Observe que o eletrodo de Ag/AgCl pode ser utilizado como indicador para Cl- ou como referência em uma cela potenciométrica onde [Cl-] seja constante.

4.2.3 - ELETRODOS METÁLICOS INERTESPodem ser utilizados para determinar a razão entre as atividades de duas espécies envolvidas em

um par redox reversível (Ex.: Fe3+/Fe2+ ; Ce4+/Ce3+), sendo muito empregados para indicação do ponto final em titulações de oxi-redução.

4.2.4 - ELETRODOS DE MEMBRANATambém conhecidos como eletrodos íon seletivos (EIS), possuem vasta aplicação no campo da

potenciometria. O eletrodo de membrana de vidro sensível ao íon H+ é o EIS mais popular devido à sua aplicação na determinação de pH. Atualmente já existem EIS para determinação de diversos tipos de cátions ou ânions. O modo de operação deste eletrodo é diferente dos demais eletrodos já vistos anteriormente. Nos casos anteriores, o potencial desenvolvido no eletrodo indicador como função da concentração do analito era proveniente de uma reação redox na superfície do eletrodo indicador. Nos eletrodos de membrana este potencial é desenvolvido entre as duas faces de uma membrana sensível (Figura 9). Este potencial de membrana “EM”, é produzido devido à diferença entre a atividade do analito na solução da amostra (a1) e a atividade do analito em uma solução de referência interna (a2). Isto acontece segundo um processo é análogo àquele de formação do potencial de junção líquido-líquido, “EJ”. A Figura 7 apresenta um corte da membrana sensível mostrando a solução externa onde fica o analito “M+” com atividade variável (a1), e a solução interna, onde fica o mesmo analito “M+”, com

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atividade fixa (a2). A diferença de potencial entre os dois lados da membrana define seu potencial: EM = E1 – E2 , sendo que seu valor depende apenas de a1, pois a2 possui um valor fixo.

Figura 7. membrana de EISO esquema de uma cela potenciométrica completa com eletrodo de membrana encontra-se representado na Figura 8.

Figura 8: cela potenciométrica com eletrodo de membrana.

O eletrodo de vidro sensível ao íon H+ é um dos eletrodos de membrana mais empregados na prática. Neste caso, uma membrana de vidro separa a solução externa de uma solução interna de HCl. Um eletrodo de Ag/AgCl serve como referência interna, pois sendo fixa a concentração de Cl-, seu potencial permanece constante durante as medidas. Deve-se observar, que o eletrodo de vidro comercial, geralmente já possui o eletrodo de referência externa adaptado ao mesmo corpo de vidro (Figura 9). O eletrodo de referência externa pode ser um eletrodo de Ag/AgCl ou de calomelano. O eletrodo que forma uma cela completa em um mesmo corpo de vidro é denominado eletrodo combinado.

4.2.4.1 - PROPRIEDADES DAS MEMBRANAS USADAS EM ELETRODOS ÍON SELETIVOSa) Possuir solubilidade muito baixa na solução do analito. Exemplos: - vidros de sílica

- resinas poliméricas- compostos iônicos inorgânicos pouco solúveis (Ex. haletos de prata)

b) Possuir condutividade elétrica, mesmo que seja baixa- condutividade geralmente provocada pela mobilidade de íons de carga unitária dentro da

membrana.c) Possuir reatividade seletiva em relação ao analito de interesse através dos processos:

- troca iônica- cristalização- complexação

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Figura 9: eletrodo de vidro combinado.

Tipos de Membranas- Cristalinas

- Cristal simples como LaF3 para fluoreto- Policristalinas como Ag2S para sulfetos e Ag+

- Não-cristalinas- Vidro: Ex.: H+, Na+, etc- Líquida: Ex.: membrana com solução de trocadores iônicos para Ca2+

- Líquido imobilizado em polímero. Ex.: PVC para Ca2+ e NO3-

4.2.4.2 MEMBRANA CRISTALINA COM CRISTAL SIMPLESEx.: EIS para fluoreto: Neste eletrodo, um monocristal de LaF3, dopado com EuF2 para aumentar a condutividade, é utilizado como membrana. O íon fluoreto atua como transportador de carga devido à sua mobilidade dentro do cristal. A ionização do LaF3 nas faces opostas da membrana cria uma diferença de potencial, sendo esta, proporcional à diferença entre as concentrações de F- em contato com as duas faces. O esquema abaixo ilustra este comportamento:

solução interna F-aq + LaF2

+(s) LaF3(s) | interior do cristal | LaF3(s) LaF2

+(s) + F

-aq solução externa

A face da membrana em contato com solução mais concentrada em F- torna-se menos positiva devido ao maior deslocamento do equilíbrio de ionização no sentido de formação do LaF3 que é neutro. Desta forma, a “face mais diluída” fica positiva em relação à “face mais concentrada”. A concentração de F - na face interna da membrana é fixa (geralmente com NaF 0,1 M). Esta solução também contém concentração fixa de Cl- para manter constante o potencial do eletrodo de Ag/AgCl que atua como referência interna. A figura 10 mostra um esquema deste EIS.Temperatura operacional: 0 - 80 oCLimite inferior de resposta linear: 10-6 M ou 0,02 mg L-1 em F-

Equação: Eind = L - 0,0592 log aF- ou Eind = L + 0,0592 pFonde L é o somatório de todos os potenciais envolvidos na cela, exceto aquele relacionado ao potencial de membrana (EM). O valor de L é praticamente constante.

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Figura 10. EIS para fluoreto

4.2.4.3 - MEMBRANA POLICRISTALINAEx. EIS baseados em sais de prataConstituídos de haletos de prata misturados com Ag2SO Ag2S aumenta a condutividade da membrana devido à mobilidade do íon Ag+ dentro de sua estrutura cristalina. A membrana possui resposta seletiva para o respectivo haleto de prata, para o íon Ag + e também para o íon S2-

Ex.: membrana com AgI + Ag2S 1:1 => resposta seletiva para I-, Ag+ e S2-

4.2.4.4 - MEMBRANA LÍQUIDAEste tipo de membrana, consiste basicamente de um suporte sólido poroso, impregnado com o

líquido que forma a membrana. Geralmente este líquido é um solvente orgânico imiscível em água. Neste solvente orgânico, encontra-se dissolvido um trocador iônico capaz de realizar as reações de equilíbrio com o analito presente em ambos os lados da membrana. Pode-se também manter o líquido orgânico contendo o trocador iônico, dissolvido em uma matriz de cloreto de polivinila. Ex.: EIS para Ca2+

Neste caso utiliza-se um diester do ácido fosfórico como trocador iônico para o Ca2+ dissolvido em solvente orgânico. O grupamento alifático deste composto pode conter de 8 a 16 átomos de carbono, sendo 9 átomos mais usual.

O equilíbrio que ocorre em ambos os lados da membrana encontra-se representado abaixo.Ca2+

(aq) + 2 (C10H21O)2POO-(org) Ca[(C10H21O)2POO]2 (org)

Considerando-se a presença do analito (Ca2+) presente em ambos os lados desta membrana pode-se prever sua polaridade. O esquema abaixo ilustra o comportamento desta membrana quando a maior concentração de Ca2+ está presente do lado esquerdo e quando a maior concentração de Ca2+ está presente do lado direito.1) Maior concentração de Ca2+ presente do lado esquerdo da membrana. Equilíbrio da esquerda

deslocado no sentido de reduzir a concentração de (RO)2POO- na superfície esquerda da membrana (R=C10H21). Equilíbrio da direita deslocado no sentido de aumentar a concentração de (RO)2POO- na superfície direita da membrana.

Ca2+(aq) +| 2 (RO)2POO-

(org) Ca[(RO)2POO]2 (org) memb. Ca[(RO)2POO]2 (org) 2 (RO)2POO-(org)| + Ca2+

(aq)

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positivo negativo

Resultado final => lado esquerdo positivo e lado direito negativo.(b) Maior concentração de Ca2+ presente do lado direito da membrana. Dedução análoga ao caso anterior resultando lado esquerdo negativo e lado direito positivo.A figura 11 ilustra a configuração física deste eletrodo e sua Equação Nernst é: Eind = L - (0,0592/2) pCa

Figura 11: EIS de membrana líquida para Ca2+

4.2.4.5 - SISTEMAS DE ELETRODOS SENSÍVEIS A MOLÉCULAS - Sondas para gases dissolvidos (Ex.: CO2, NH3, NO2, etc.)

- Sondas para gases: utilizados para determinação de gases dissolvidos ou íons que possam ser convertidos em gases. A figura 12 mostra uma sonda para CO2 dissolvido.

Figura 12. Sonda para CO2 dissolvidoA membrana mais externa é do tipo gás-permeável e pode ser classificada em dois tipos:2) Microporosas. Ex. PTFE formando um polímero poroso hidrofóbico que permite a passagem de

gases mas não deixa passar a solução aquosa. Sua espessura típica é 0,1 mm e a passagem do gás ocorre pelo processo e efusão.

3) Homegêneas. Ex. borracha de silicone formando um sólido onde o gás apresenta uma certa solubilidade. Sua espessura típica é 0,01-0,03 mm e a passagem do gás ocorre pelo processo de dissolução.

MECANISMO DE RESPOSTANo caso da sonda para CO2 tem-se o seguinte equilíbrio entre os lados opostos (interno e externo)

da membrana microporosa : CO2(aq ext.) CO2(g) CO2(aq int.)

(poros da membrana)Simplificando tem-se: CO2(aq ext.) CO2(aq int.)

Assim, na solução interna situada entre a membrana de vidro e a membrana microporosa tem-se um filme de solução onde ocorre o equilíbrio:

CO2(aq int.) + H2O(l) HCO3-(aq int.) + H+

(aq int)

O equilíbrio global pode ser obtido a partir do somatório destes dois equilíbrios:

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CO2(aq ext.) CO2(aq int.)

CO2(aq int.) + H2O(l) HCO3-

(aq int.) + H+(aq int)

CO2(aq ext.) + H2O(l) HCO3-

(aq int.) + H+(aq int) equilíbrio global

A [H+](aq int) presente neste equilíbrio é detectada pela membrana de vidro e depende da [CO2](aq ext.)

A constante de equilíbrio para esta reação fica: K = [H+](aq int) [HCO3

-](aq int.) / [CO2](aq ext.)

=> [H+](aq int) / [CO2](aq ext.) = K / [HCO3-](aq int.)

Como a [HCO3-](aq int.) adicionada à solução interna é relativamente elevada em relação às demais espécies

presentes no equilíbrio pode-se escrever:K / [HCO3

-](aq int.) = constante = Kg

=>[H+](aq int) = Kg [CO2](aq ext.)

ou seja: o potencial da cela depende basicamente da [CO2](aq ext.), e isto é justamente o objetivo desta sonda.Interferentes: Neste caso, qualquer espécie química que altere o pH do meio é um interferente. Ex. NH3, SO2, NO2, etc. Pois: NH3 + H2O NH4

+ + OH-

SO2 + H2O HSO3- + H+

Este tipo de problema pode ser contornado substituindo-se a membrana interna seletiva para H+ por outra membrana seletiva para a espécie de interesse.Exemplo: Com membrana seletiva para o íon nitrato (NO3

-) pode-se detectar NO2 dissolvido sem interferência do pH. O equilíbrio aquoso do NO2 é:

2 NO2(aq) + H2O(l) NO2-

(aq) + NO3-

(aq) + 2 H+(aq)

5.0 - ATIVIDADE vs CONCENTRAÇÃOA relação entre concentração e atividade é dada pela fórmula: ax = [X] gx

onde: ax = atividade da espécie X [X] = concentração de X

gx = coeficiente de atividade de X na solução em que este se encontraEm soluções com baixa força iônica o valor de gx é próximo da unidade e, sendo assim, a

atividade fica praticamente igual à concentração. Contudo, em soluções com força iônica alta, o valor de gx é diferente da unidade e a concentração fica diferente da atividade.

Os eletrodos potenciométricos são sensíveis à atividade do analito, e sendo assim, em soluções com alta força iônica existe uma discrepância entre o valor da concentração e da atividade. A figura 13 apresenta duas curvas de calibração genéricas para um cátion X+ sobrepostas no mesmo gráfico. As curva “M” e “N” foram feitas com a mesma concentração de X+, contudo a curva “M” foi feita em solução com baixa força iônica e a curva “N” em solução com alta força iônica. Observa-se que a curva “M” apresenta sinais potenciométricos maiores em relação à curava “N”. Isto acontece devido à redução no valor de gX

para a curva “N” mantendo-se a mesma concentração de X+ nos padrões de calibração. Deve-se lembrar que resposta potenciométrica para cátions obedece a equação de Nernst escrita da seguinte forma:

Ecela = K + (0,0592/n) log aX (para cátions)Onde K é uma constante que envolve todos os potenciais fixos da cela e aX corresponde à atividade do analito X+.

Page 12: apostila potenciometria

Resumos de potenciometria - Prof Edgard 12

log X

Ecela

M

N

Figura 13. Potencial cela vs logX, sendo X um cátion genérico.

Uma forma de contornar este problema para amostras onde a força iônica não seja elevada demais, consiste no emprego de um tampão de força iônica. Este método consiste em se adicionar um eletrólito inerte tanto nas amostras como nos padrões de calibração do eletrodo. Desta forma, tem-se a mesma força iônica tanto para os padrões como para as amostras. Isto faz com que gx também fique igual entre amostras e padrões. Assim, os sinais potenciométricos obtidos com os padrões de concentração conhecida serão os mesmos para as amostras onde a concentração do analito é desconhecida. Isto minimiza os erros associados às diferenças entre as forças iônicas dos padrões e das amostras.