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1 – APRESENTAÇÃO

Em face da retomada do debate e de proposições legislativas sobre as

restrições ao direito de registro e porte de armas de fogo por parte dos

cidadãos civis, impõe-se a necessidade de uma reflexão mais aprofundada

sobre a eficácia do “Estatuto do Desarmamento”.

Os argumentos aqui expostos são fruto de anos de pesquisas e

provém das mais diversas fontes. A intenção é promover um debate sério e o

mais distante possível do sensacionalismo e do teor emocional que, na maioria

das vezes, cercam esse tema. Eleger as armas de fogo legais como as

principais responsáveis pelos índices de homicídios no Brasil é um engano. “A

medida tem efeito semelhante à do marido traído que tira o sofá da sala para

evitar o adultério da esposa”, como ilustrou a jornalista Ana Amélia Lemos,

antes mesmo da lei ser sancionada pelo Presidente da República. A

criminalidade não vai diminuir enquanto as instituições responsáveis pela

segurança do cidadão continuarem despreparadas e desaparelhadas. As

polícias estão longe de corresponder ao que delas espera a sociedade. O

Judiciário continua moroso. A fiscalização da Receita Federal para controlar o

contrabando é ineficiente nas fronteiras e aeroportos. Enfim, o cenário não é

nada animador.

Porém, mesmo com inúmeras evidências de que o impacto da restrição

do porte e da venda de armas sobre a criminalidade será nulo, ainda há quem

defenda estas idéias. Exemplo são entidades “sem fins lucrativos”, as

chamadas ONGs, como a Viva Rio e o Instituto Sou da Paz. Ambas

organizações enviaram ao Supremo Tribunal Federal, no dia 09 de fevereiro

desse ano, um sumário de argumentos, que acompanham o pedido de “Ação

Direta de Inconstitucionalidade 3112”, com pedido de medida cautelar da Lei

10.826 (Estatuto do Desarmamento). Listamos os principais argumentos já no

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início, e comentamos um a um, justificando o contraponto e acrescentando

novos dados.

Logo a seguir, apresentamos outros cinco capítulos. Neles, estão

subsídios vitais para enriquecer o debate e contribuir de forma efetiva para um

assunto que influenciará diretamente a vida de todos os brasileiros.

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ÍNDICE

1 - ANÁLISE DOS ARGUMENTOS...........................................................................5

2 - ARMAS E CRIMINALIDADE NO BRASIL .......................................................28

Não há relações entre venda de armas legais e crimes letais ......................32

Diminui a venda de armas e aumentam os homicídios ..................................33

3 - A EXPERIÊNCIA INTERNACIONAL NO CONTROLE DE ARMAS ..........36

Estados Unidos......................................................................................................37

Queda dos crimes com armas de fogo .............................................................39

Armas x crimes ......................................................................................................40

As armas e a autoproteção ..................................................................................41

A (i)lógica do desarmamento ...............................................................................42

O estudo de Kellerman.........................................................................................47

Mais armas, menos crimes ..................................................................................50

Inglaterra .................................................................................................................57

Contradições históricas ........................................................................................59

Por que a criminalidade caiu nos EUA? ............................................................60

Modernização.........................................................................................................63

O atraso brasileiro ................................................................................................65

Falhas no sistema prisional ................................................................................67

Penas alternativas: solução mágica?.................................................................68

“Somos todos reféns” ........................................................................................68

Justiça Criminal......................................................................................................69

Buy-back – programas de recompra de armas funcionam? ..........................70

4 - TRÁFICO DE DROGAS E CRIMINALIDADE:

UMA ESTREITA RELAÇÃO ....................................................................................72

Estudos evidenciam relação ................................................................................73

Drogas estão por trás dos crimes contra jovens .............................................74

A força do império das drogas ............................................................................75

5

5 - MITOS SOBRE ARMAS DE FOGO...................................................................80

Mito 1: O cidadão não pode ter uma arma porque a

segurança é dever do Estado. ............................................................................80

Mito 2: As armas legais em posse de cidadãos de

bem são a principal causa da criminalidade.....................................................82

Mito 3: No Brasil, qualquer um pode comprar uma arma de fogo.................83

Mito 4: A venda de armas tem crescido de

modo significativo, e isso tem gerado mais violência......................................84

Mito 5: O Brasil é um país armado.

Existem 20 milhões de armas de fogo no Brasil. ............................................85

Mito 6: Cerca da metade dos assassinatos são cometidos por

pessoas sem antecedentes criminais; 90% dos homicídios

são cometidos por pessoas de bem. ................................................................86

Mito 7: Os países que adotaram o “desarmamento civil”

zeraram a criminalidade. .....................................................................................87

6 - ARTIGOS ................................................................................................................89

O crime e o Senador – Carlos Murgel................................................................89

Violência - Causas e soluções – Luiz Pazos ....................................................93

Aniam contesta números do Iser e do Viva Rio publicados no O Globo......95

A mídia e o lobby do desarmamento – Raimundo Nicioli ...............................98

“Impunidade é o principal problema” – entrevista com o

Senador Iris Resende ........................................................................................105

Quando os liberais mentem sobre armas – Cathy Young ............................107

Nossa luta por um direito básico – Luis Afonso dos Santos ........................114

Posse e porte de arma – Marcos Coimbra......................................................116

Restringir o uso de armas de fogo é dar

um tiro no próprio pé – Erik Sosdelli Camarano.............................................120

Armas e revolução passiva – Olavo de Carvalho ..........................................128

7 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...............................................................132 2 - ANÁLISE DE ARGUMENTOS

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“Entre os anos de 1980 e 2000, o número de homicídios

subiu de 12 por cada 100 mil habitantes para 27 por 100 mil

habitantes, havendo um aumento superior a 200% (...) Devemos

adotar resoluções que possam surtir efeitos imediatos,

principalmente aquelas capazes de reduzir com mais

intensidade os fatores que potencializam a violência, dentre os

quais as armas”.

(pág. 8)

O desarmamento civil é citado como medida fundamental para reduzir

a criminalidade, enfim, salvar vidas. Devemos, em primeiro lugar, dizer que

dificilmente vamos encontrar um cidadão honesto e cumpridor das leis que não

queira reduzir a criminalidade e viver num ambiente de maior segurança e paz.

O problema é que ao dizer que a arma de fogo legalmente adquirida é a

principal causa da criminalidade, os defensores do desarmamento incorrem

num grave e perigoso equívoco que poderá, ao invés de diminuir, agravar

ainda mais a criminalidade letal no Brasil. Afinal, controle de armas é a mesma

coisa que controle da criminalidade?

A resposta é evidentemente não. Podemos ver a questão pelo menos

sob três ângulos. Primeiramente, os defensores do desarmamento civil não

apresentam uma evidência sequer que mostre claramente uma correlação

entre os dois fenômenos, o aumento da circulação de armas legais e aumento

da criminalidade letal; isto por si só serviria para comprometer a seriedade da

tese, pois se a arma legal não é causa do crime, elimina-la não vai ajudar a

reduzir o crime letal.

Em segundo lugar, ao eleger a arma como a causadora dos crimes

letais, os defensores do desarmamento acham uma resposta fácil e

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sensacionalista; presumivelmente ficam mais confortáveis e com a consciência

tranqüila, uma vez que não estão muito preocupados em investigar as

verdadeiras causas dos crimes, abdicando assim de lutar por políticas de

combate e controle efetivo da criminalidade. Ainda que pequem pela

ingenuidade e pelo simplismo, é muito mais cômodo atribuir a culpa a objetos

inanimados do que admitir que os crimes são cometidos por pessoas. E que

essas pessoas são educadas por famílias, que essas famílias vivem em

sociedade, que essa sociedade tem um Estado responsável pela aplicação das

leis e, por conseguinte, pela segurança pública. Ou seja, que o crime tem

outras causas bem mais complexas que envolvem uma ampla rede de fatores

de natureza social, educacional, moral, cultural e até mesmo patológica. E que

essas causas são de natureza humana, produzidas pelos homens.

Finalmente, um terceiro aspecto a ser analisado refere-se ao enorme

preconceito que está por trás da tese do desarmamento civil; o cidadão

honesto e cumpridor das leis que deseja adquirir uma arma legal para a sua

proteção é tido como incapaz de fazê-lo. A suposição é de que os cidadãos

honestos não são suficientemente inteligentes e preparados para a posse legal

de uma arma, mesmo que cumpram com todas as formalidades legais exigidas

para a sua aquisição. Ora, a evolução política das sociedades democráticas ao

longo da história aponta justamente noutro sentido, o do fortalecimento da

noção de responsabilidade civil, com vistas a tornar todos os cidadãos iguais

em direito e em face da lei. Como então podemos admitir que uns julguem

outros como mais ou menos aptos a fazer alguma coisa?

A pertinência da tese do desarmamento civil choca-se de forma

inequívoca com a realidade. Tanto as pesquisas realizadas nos EUA pelo Dr.

John Lott, da Universidade de Chicago, como a experiência concreta da

Inglaterra, França e Austrália, que adotaram o desarmamento civil nos anos 90,

mostram de forma inequívoca que banir as armas não reduz a criminalidade.

Ao contrário, nestes países tivemos no final dos anos 90 e nos primeiros dois

anos do novo milênio uma verdadeira explosão da criminalidade,

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especialmente a juvenil. Nos Estados Unidos, ao contrário, onde foram

adotadas leis menos restritivas, a criminalidade diminuiu de forma acentuada.

A experiência internacional evidencia também que as políticas de

combate à posse e ao uso ilegal de armas produzem resultados altamente

positivos. Essa política tem dois aspectos essenciais: ao retirar armas ilegais

das mãos de pessoas inabilitadas, é bastante provável que menos crimes

sejam cometidos com o uso ilegal de armas, reduzindo-se, desta forma, a

volume das ações criminosas como também sua letalidade. Um segundo ponto

altamente positivo é que ao combater o uso ilegal, estamos ao mesmo tempo

reforçando o poder das leis, uma vez que apenas as pessoas que as cumprem

estão habilitadas a fazê-lo. Com isso, reforçamos a idéia e a prática da

responsabilidade civil, ao invés de discriminarmos os cidadãos de bem,

permitindo apenas que os marginais tenham acesso a uma arma de fogo –

através do contrabando ou outro meio – ao arrepio da lei.

Há uma forte carência, em nosso país, em expor com precisão a

relação entre armas de fogo e esse extraordinário aumento no número de

homicídios. Isso ocorreu devido a uma combinação de fatores – sobretudo à

falência do Estado em combater a expansão do crime organizado e do tráfico

de drogas. Combinando isso à falta de oportunidades de emprego, ao caos no

sistema prisional e judiciário, entre outros, teremos um ambiente propício aos

criminosos, que colabora e até estimula a prática de delitos.

O crescimento da criminalidade e seu avanço para todas as classes

sociais são problemas que, sabidamente, não possuem uma causa isolada ou

única; tampouco o argumento de que armas é sinônimo de mais crimes foi

comprovado. Outros países que enfrentam ou enfrentaram situações similares

tentaram, sem êxito, desarmar a população na esperança de ver o número de

crimes baixar. Na maioria dos casos – vide Inglaterra, Austrália, Canadá,

França, entre outros –, o efeito foi contrário, ou seja, os índices subiram ainda

mais.

9

“O Brasil é, conforme dados da Organização das Nações

Unidas (ONU), o país número 1 em homicídios praticados por

armas de fogo no mundo. São ao todo 46 mil mortes por ano,

sendo uma a cada 13 minutos. O Brasil é responsável por 11%

das mortes por arma de fogo no mundo, possuindo 2,8% da

população mundial”. (pág. 9)

O lobby antiarmas cita freqüentemente a ONU, que atribuiu ao Brasil o

título de “país que mais mata com armas de fogo”. Curiosamente, esquecem

de citar que o Brasil detém ainda vários outros “títulos” que, em conjunto,

explicam porque a violência cresce de forma acelerada em nosso país. Agora,

em 2004, a mesma ONU admitiu a danosa combinação entre o tráfico de

drogas e a criminalidade, que, no Brasil, estão intimamente relacionados e

exercem um papel crucial para o atual contexto. A notícia foi divulgada pela Jife

(Junta Internacional de Fiscalização de Entorpecentes), entidade ligada à ONU,

que incluiu o Brasil entre os países onde há relação estreita entre as drogas e

as altas incidências de crimes. De acordo com o documento, que foi divulgado

no dia 03 de março em Viena, “grande parte dos 30 mil homicídios registrados

anualmente no país pode ser atribuída ao tráfico”.

A íntima relação entre as drogas e a criminalidade é explícita. E nesse

contexto de marginalidade surge grande parte das causas da explosão da

violência, especialmente em grandes cidades, como São Paulo e Rio de

Janeiro.

Para se ter uma idéia, o Brasil já é o segundo maior consumidor de

cocaína do mundo, ficando atrás somente dos Estados Unidos. A informação,

que havia sido publicada no jornal Washington Post em 14 de julho de 2001 e

10

em 04 de julho pela Agência Reuters, foi reafirmada em março de 2002 pelo

analista do Centro Contra Crimes e Narcóticos dos EUA, Kerry Halpin. A

Agência da ONU para o Controle de Drogas e a Prevenção do Crime (UNCPD)

estima que, em 2001, 900 mil brasileiros usaram cocaína e 100 toneladas da

substância em estado puro (15% da produção mundial) passa pelo Brasil.

Desse montante, aproximadamente 40 toneladas são consumidas

internamente. Somado a isso, outro estudo elaborado pela ONU agora, em

2004, confirma a tendência: segundo cálculos da organização, cerca de 30 mil

homicídios cometidos no País anualmente têm a ver com o tráfico de

entorpecentes.

Um relatório elaborado durante a Conferência Nacional dos Bispos do

Brasil (CNBB) em 2000 apontou que o narcotráfico movimenta valores

superiores a R$ 400 bilhões anualmente. As conexões do tráfico com a

sociedade em geral, segundo o documento, ficam mais claras “quando se

levam em conta todas as conseqüências diretas e indiretas. Mesmo pessoas

que nunca consumiram drogas tornam-se vítimas delas quando são assaltadas

por bandidos drogados ou que roubam para comprar drogas”, e conclui que “o

sistema causa mais vítimas do que parece à primeira vista”.

O negócio bilionário transforma favelas em zonas de guerra, corrompe

autoridades e continua destruindo milhares de famílias. No Rio de Janeiro,

segundo dados da Secretaria de Segurança Pública, cerca de 80% dos

detentos com menos de 23 anos foram condenados por tráfico de drogas.

O relatório da Jife também expõe a situação dos meninos de rua e dos

jovens moradores da periferia que são cooptados pelos traficantes. Eles

morrem cedo, seja porque sabem demais, roubaram drogas para usar ou

caíram nas mãos de quadrilhas rivais. "Dizem que eles são como moscas,

porque têm vida curta", explica o padre Júlio Lancellotti, da Pastoral do Menor.

Os garotos são vítimas, mas também fazem vítimas, num ciclo de violência.

"Furto, roubo e assalto à mão armada estão muito ligados à droga." A solução,

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para ele, depende de ação preventiva e políticas públicas sérias, que evitem a

entrada do jovem no mundo do crime. Para a Jife, os países não devem pensar

apenas em repressão, mas em adotar medidas multidisciplinares, que vão

desde prevenção ao consumo de drogas e mudanças na legislação para quem

usa entorpecentes até a criação de oportunidades de empregos.

Como se vê, a própria ONU reconhece, dando foco a essa questão,

que combater o narcotráfico é uma das medidas mais urgentes. Simplesmente

recolher as armas de fogo dos cidadãos que nada contribuem para esse

cenário chega a ser patético.

Outros fatores que contribuem para a posição número 1 do Brasil no

“ranking da criminalidade” traçado pela ONU devem ser lembrados, como

fazemos a seguir.

??Desigualdade de renda: o Brasil é campeão mundial de

desigualdade na distribuição de renda. Com 21 milhões de pessoas

(14 por cento da população) vivendo em indigência e 50 milhões ( 33

por cento da população) abaixo da linha de pobreza, o Brasil ocupa

esta vergonhosa posição ao lado de Serra Leoa, Jamaica, República

Centro Africana, Guatemala e Paraguai.

??Impunidade: o Brasil é certamente o campeão absoluto de

impunidade. Pesquisa do Professor norte-americano Steve Levitt,

mostra que somente dois em cada 100 assassinos são presos no

Brasil, enquanto que nos Estados Unidos, de cada 100 assassinos,

98,5 são condenados. A revista Veja, ao comentar a crescente

participação de menores envolvidos em crimes graves é taxativa: “a

razão mais forte para o fenômeno é a relativa impunidade de que

gozam os menores no Brasil, graças a uma legislação que contempla

mais a sociologia do que a criminologia – O Estatuto da Criança e do

Adolescente. Quando um jovem desses é preso por ter cometido um

delito pesado, já sabe que dificilmente permanecerá mais do que três

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anos detido. Aliás – continua a revista –, o termo ”preso”, a rigor nem

poderia ser utilizado. Menores infratores são julgados em cortes

especiais e internados em instituições como a Febem, das quais é

facílimo fugir. Essa perspectiva de uma pena branda representa um

estímulo e tanto para que eles ousem cada vez mais. E conclui que

“a maioria desses adolescentes não age de forma autônoma, mas a

mando de bandidos adultos, que os usam para fazer o trabalho mais

sujo. Afinal de contas, ao contrário dos marmanjos, a molecada está

praticamente acima da lei. É o estatuto da malandragem“.

??Desemprego: o Brasil ocupa uma das mais destacadas posições

entre os países que apresentam maiores taxas de desemprego

aberto e também desemprego estrutural no mundo. Cerca de 19 por

cento de sua força de trabalho está desempregada atualmente; 53

por cento dos jovens brasileiros estão fora do mercado de trabalho.

Isso sem falar nos milhões de brasileiros que desistirem de procurar

emprego no mercado formal e caíram na informalidade, onde as

remunerações são ainda menores do que no mercado formal e os

direitos sociais inexistentes.

Acidentes de Trânsito: o Brasil é campeão mundial de acidentes de

trânsito, batendo o recorde de 25.513 mortes apenas em 1998. Em 1999,

20.178 mil, em 2000, 20.049 e em 2001, 20.030. Ou seja, em cinco anos,

segundo o Denatran (há cálculos mais pessimistas que estendem esse número

para 35 mil/ano), 85.770 pessoas foram vitimadas nas ruas e estradas do país,

e ninguém cogita – porque dificilmente seria viável – que apenas motoristas

profissionais possam guiar um veículo, ou mesmo a hipótese de proibir o

acesso dos cidadãos aos automóveis. Mesmo com o novo Código de Trânsito,

em vigor desde 1998 com normas mais severas, as estatísticas assustam.

Nesse ano, como se vê, as mortes no trânsito decresceram 24,7%. Porém,

essa redução está diretamente vinculada com a massiva fiscalização que foi

feita naquele ano. Na medida em que vai se relaxando na fiscalização, os

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números estarrecedores de mortes vão subindo (na mesma proporção).

Estamos voltando aos mesmos números de 1997 e perdendo a cada dia todas

as conquistas obtidas com o novo Código, como a obrigatoriedade do uso de

cinto de segurança. Imagine com leis impostas a criminosos.

??Álcool e Trânsito: o Brasil é também campeão na ocorrência de

acidentes de trânsito cujo motivo é o uso indevido de álcool.

Segundo o Programa Nacional de Ação Antidrogas do Ministério da

Justiça, o álcool é responsável por 76.000 acidentes de trânsito a

cada ano; informa ainda que o álcool é responsável direto pela morte

de 3.000 adolescentes brasileiros a cada ano.

??Mortalidade Infantil: o Brasil é ainda um dos campeões mundiais de

mortalidade infantil: a cada hora morreu uma criança com menos de

um ano de idade por falta de cuidados no pré-natal; a cada 7 horas

três crianças morrem por desnutrição infantil; a cada 7 horas morrem

71 brasileiros por falta de assistência médica adequada.

??Êxodo Rural e marginalidade urbana: o Brasil foi também um dos

grandes campeões no exodo rural e do crescimento desordenado

das cidades. Nos últimos trinta anos, as grandes cidades se

tornaram depósitos de pobres e miseráveis, sem emprego ou em

empregos precários, sem saneamento, saúde pública, remédios e

habitação. Hoje, 80 por cento da população vive e sobrevive nas

cidades que, despreparadas para receber a enorme demanda social

por serviços públicos, são um estímulo adicional à criminalidade.

Neste contexto econômico e social, de nada adianta reclamar que a

criminalidade violenta cresce gravemente no Brasil. De fato, ninguém discorda

que os números são graves. É preciso reconhecer, no entanto, que

necessitamos de soluções que enfrentem as verdadeiras causas do aumento

da criminalidade no Brasil.

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“A presença da arma de fogo é fator catalisador da

violência, como demonstra o quadro a seguir.(Homicídios no

Brasil por Estado – 2000/Porcentagem de Homicídios com Uso

de Arma de Fogo, fonte Datasus, com análise do Iser)”

(págs.11 e 12)

A criminalidade aumentou gravemente no Brasil, coincidentemente, a

partir dos anos 90. Este fenômeno não pode ser entendido a partir de um

diagnóstico simplista, que elege, sem nenhuma comprovação, a arma de fogo

como causa determinante dos homicídios.A arma de fogo, em mãos do

cidadão, tem sido vista pela moderna criminologia norte-americana como um

importante instrumento de dissuasão, e, portanto, de defesa, através do qual o

cidadão de bem inibe a ação dos criminosos. Esta tese já está amplamente

comprovada pela queda dos crimes violentos em todos os 32 estados norte-

americanos que estimularam seus habitantes aptos a portarem armas.

Não existe relação entre armas legais, ou seja, armas devidamente

registradas, e os índices de criminalidade. O que existe é uma relação entre

crime organizado, tráfico de drogas e crimes violentos. Exemplo disso é que

um dos Estados legalmente mais armados do País, o Rio Grande do Sul, não

possui taxas de crimes mais altas em relação a Estados como São Paulo e Rio

de Janeiro.

Com sete vezes mais armas legais que São Paulo, o RS apresenta

uma taxa de homicídios 3,8 vezes menor. Basta conferir as tabelas abaixo. A

primeira compara os três Estados mencionados quanto às taxas de homicídios

por 100 mil habitantes. Já a segunda compara o número de armas e de

habitantes/arma legal.

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“Ao contrário do que muitos pensam, grande parte dos

homicídios em território nacional não é cometido por

“bandidos”, mas por pessoas “de bem”, na maioria derivados

de motivos fúteis. Em São Paulo, segundo dados da Secretaria

de Segurança Pública, quase 50% dos homicídios são

cometidos por pessoas sem histórico e por razões banais”.

(pág. 13)

Ao contrário do que afirma o lobby antiarmas, a criminalidade cresce no

Brasil pela ação cada vez mais desinibida do crime organizado, especialmente

das redes de narcotraficantes. Pesquisa realizada pelo Professor José Pastore,

da Universidade de São Paulo, demonstra que 82,6 por cento dos crimes

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cometidos no Estado são praticados por reincidentes, ou seja, por pessoas

com antecedentes criminais. A crescente participação de adolescentes presos

por participarem de assaltos, tentativas de homicídios e homicídios (como já foi

comprovado por vários especialistas e conforme já evidenciou a revista Veja,

em 8 de novembro de 2000) mostra que “a maioria desses adolescentes não

age de forma autônoma, mas a mando de bandidos adultos, que os usam para

fazer o trabalho mais sujo”. Esses menores são presos, em seguida internados

na Febem e, logo adiante, estão novamente nas ruas. O que não se entende é

que, apesar da forma gritante com que esta realidade se apresenta ante

nossos olhos, o lobby antiarmas insiste em colocar o crime organizado e o

banditismo urbano num plano altamente secundário na explicação do crime nas

grandes cidades. Quais os interesses que estão por trás desta curiosa visão?

Mas o erro primário que está por trás da afirmação dos lobbies

antiarmas, como esclarece Luiz Afonso Santos, em seu livro Armas de Fogo,

Cidadania e Banditismo, “consiste em confundir, maliciosamente, homicídios

cometidos com homicídios esclarecidos, que são apenas 50 por cento do total

investigado”. Santos esclarece que “na investigação dos crimes por motivos

fúteis, a polícia tem mais elementos em mãos para trabalhar, por se tratar de

protagonistas, vítimas e autores, com relacionamento conhecido, quando as

informações chegam com maior facilidade”. O mesmo não ocorre com a quase

totalidade dos crimes não apurados – e que por isso não entram na estatística

– “pela falta total de informações pelos mais diversos motivos, e o principal

deles é que são cometidos por bandidos que ou intimidam testemunhas ou

então fazem o serviço sem deixar pistas”.

No Brasil, de acordo com Santos, existe ainda outro agravante: a

legislação brasileira prevê que uma pessoa somente pode ser considerada

como tendo antecedentes criminais após uma condenação definitiva. Ora, no

Brasil, não raro isso demora anos, em razão dos inúmeros recursos cabíveis, o

que não raro faz com que “o indivíduo que praticou dezenas de crimes seja

considerado sem antecedentes criminais”. Não possuímos dados seguros e

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confiáveis de crimes praticados por pessoas com antecedentes criminais, mas

a realidade norte-americana oferece uma boa pista: em 1988, nas 75 maiores

cidades americanas, mais de 89 por cento dos homicidas tinham registros

criminais como adultos.

Outra mentira repetida insistentemente pelo lobby antiarmas (sem a

correspondente apresentação da base de dados de suas “estatísticas) é de que

a ”facilidade com que as pessoas obtêm uma arma de fogo nas grandes

cidades tem transformado brigas em assassinatos, feridos em mortos,

discussões em tragédias, todos os dias”. Não é verdade que é fácil obter

armas legais nas grandes cidades. Para adquiri-las é preciso cumprir a lei, que

é muito rigorosa em suas exigências. Por exemplo, para adquirir uma arma os

candidatos devem apresentar bons antecedentes e ainda comprovar

comportamento social produtivo, de justificar perante a autoridade policial a

necessidade de fazê-lo! Como então, diante disso, afirmar que é “fácil” adquirir

uma arma! A não ser que estejam se referindo ao mercado ilegal. Neste trata-

se de repressão policial e não de desarmar o cidadão de bem que obtém sua

arma por meios legais. Mas, o que mostra que a afirmação do lobby antiarmas

é falaciosa, é o fato de que regiões do país que possuem o maior número de

registro e portes de armas – como o Rio Grande do Sul, com a relação de 10,

86 armas por habitante –, ou seja, onde a população está mais armada,

apresentam os menores índices de criminalidade.

“A auto-defesa, defendida pelas pessoas comuns que

adquirem um revolver legalmente, com a finalidade de se

proteger dos criminosos, é na maioria das vezes um tiro que sai

pela culatra”. (pág.14)

Ao contrário: o cidadão desarmado sempre se insere num contexto de

maior exposição ao crime, decorrente de os bandidos passam a ter a certeza

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de que suas vítimas estão desarmadas e indefesas. A Inglaterra, um exemplo

isolado e fracassado de desarmamento civil, está experimentando o

crescimento acelerado dos crimes violentos de proibir a posse e o porte de

armas em seu território: a ocorrência de roubos e assaltos aumentou em 117

por cento, especialmente os assaltos a residências e, por outro lado, hoje o

numero de armas clandestinas é estimado pela polícia em três milhões, contra

as 200 mil vendidas compulsoriamente pelos cidadãos ingleses ao governo. A

situação atingiu tal gravidade, que em várias cidades a polícia inglesa,

quebrando uma longa tradição histórica, passou a utilizar armas no

patrulhamento a pé.

Segundo a notícia da agência Reuters, de outubro de 1998: “Você

corre maior risco de ser atacado na Inglaterra do que nos Estados Unidos,

segundo um novo estudo sobre criminalidade apresentado com alguma

consternação na Inglaterra no domingo passado. O trabalho conduzido por um

professor da Universidade de Cambridge e um estatístico do Departamento de

Justiça norte-americano mostra que os índices para crimes sérios, tais como

assaltos, roubos, invasão de domicílios e roubo de automóveis, são todos mais

altos na Inglaterra e País de Gales do que nos EUA” Mais adiante, informa que

“em 1995 – último ano para o qual existem estatísticas completas -

aconteceram 20 assaltos para cada 1000 pessoas na Inglaterra e País de

Gales contra apenas 8,8 nos Estados Unidos. O índice de roubos é hoje 1,4

vezes maior na Inglaterra e País de Gales do que nos EUA e a taxa de

arrombamentos em residências é quase o dobro da americana”. Esse é o

resultado das políticas de desarmamento dos cidadãos que cumprem as leis.

“Não há direito constitucional de portar uma arma”.

(pág. 19)

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O Código Penal nos garante a legítima defesa e a Lei nº 9.437/97, a

posse e o porte de armas de fogo. Legalmente podemos possuir e portar armas

e usá-las contra atacantes, respeitados os limites da lei. A legislação não

impede que nos defendamos. Esta parece ser uma questão clara, mas não é. A

reação da vítima ao agressor não está sendo bem vista pela estratégia do atual

governo no combate à violência.

Como atualmente tudo o que se faz no país passa por uma discussão

sobre os Direitos Humanos, vamos pensar a questão da legítima defesa por

esse aspecto, procurando ver alguma contradição entre a legislação vigente e

a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Vejamos o que dizem alguns

artigos deste documento:

Artigo I – “Todas as pessoas nascem livres e iguais em

dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e

devem agir em relação uma às outras com espírito de

fraternidade”.

Artigo III – “Toda a pessoa tem direito à vida, à

liberdade e à segurança pessoal”.

Artigo XVII – “Toda pessoa tem direito à propriedade,

só ou em sociedade com os outros. Ninguém será

arbitrariamente privado de sua propriedade”.

Artigo XXX – “Nenhuma disposição da presente

Declaração pode ser interpretada como o reconhecimento a

qualquer Estado, grupo ou pessoa, do direito de exercer

qualquer atividade ou praticar qualquer ato destinado à

destruição de quaisquer dos direitos e liberdades aqui

estabelecidos”.

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Se formos analisar a fundo nossa realidade e compará-la ao que prevê

essa Declaração, constataremos que, ao permitir a existência de um

banditismo desenfreado no país e a ocorrência de uma imensa e crescente

quantidade de crimes contra a pessoa, o Estado está violando, com a sua

omissão, o Artigo III. Ao impedir que o cidadão se arme, para garantir sua

defesa, o Estado também está violando artigo XXX, e colaborando para que os

criminosos obtenham êxito na violação dos artigos I e XVII.

Para quem comete crimes, as leis de desarmamento são totalmente

ignoradas. Se analisarmos a questão da violência com objetividade, veremos

que é o banditismo o responsável pela imensa maioria das violações dos

Direitos Humanos da população. E não há como se defender estando

desarmado. Está mais do que provado que os países que permitem aos seus

cidadãos de bem um maior acesso às armas de fogo convive com as menores

taxas de homicídios, preservando assim a vida de milhares de inocentes.

“75% dos crimes são cometidos por armas brasileiras e

de calibre permitido, ou seja, proveniente de nossas fábricas”.

(pág. 15)

O estudo citado para sustentar a afirmação falsa acima enunciada

jamais foi apresentado publicamente. É um estudo fantasma. Todos sabemos

que bandido não compra arma em loja. O jornal O Estado de são Paulo, em 22

de junho de 2000, publicou matéria com o seguinte título: “Venda de armas no

País caí, mas violência cresce”. E afirma categoricamente: “Nos últimos seis

anos, apesar de a violência vir apresentando crescimento visível em capitais e

grandes cidades, a venda de armas de porte (categoria que incluir revolveres e

pistolas) no País caiu 59 por cento, segundo o Exército, que acompanha esse

comércio nos Estados. Essa estatística joga por terra a premissa do governo

federal de que, suspendendo a venda legal de armas por seis meses, como foi

21

anunciado no Plano Nacional de Segurança Pública, a criminalidade será

reduzida”. Em seguida, informa que o número de assassinatos cresceu, entre

1979 e 1998, em 273 por cento!

Estudo encomendado pelo Ministério da Justiça e realizado pelo IBGE

em 1999, que leva o título de “Mortes Violentas – um panorama dos homicídios

no Brasil”, reconhece que é “consensual a escassez de estudos empíricos e de

informações estatísticas que permitam analisar a magnitude e a incidência da

criminalidade no país”, para mais a frente reconhecer que os “registros de

ocorrência apresentam falhas em seu preenchimento”, além de “não serem

padronizados”, o que impedem “qualquer comparação nacional”.

Mas, se como afirma o lobby antiarmas, as armas legais são

“desviadas por empresas de segurança ou até pela polícia”, trata-se de coibir

estas práticas ilegais, jamais penalizar o cidadão de bem que adquire sua arma

legalmente pela prática de um crime – o desvio – praticado por delinqüentes.

“Além de restringir a comercialização e o porte de

armas, a Lei 10.826/03 estabelece uma série de mecanismos de

identificação das armas de fogo e de sua munição, que

viabilizam o rastreamento do seu caminho, permitindo a

localização dos desvios e do tráfico ilegal de armas.” (pág. 17)

Buscando informações técnicas a respeito desse tópico, veremos que,

na prática, de nada adiantará os “mecanismos de identificação” para que armas

ilegais continuem a ser utilizadas por criminosos. Isso porque nos processos

tradicionais de fabricação de canos, a operação de raiamento é realizada por

corte de material utilizando uma ferramenta especial com o perfil das raias que

se pretende obter. Cada ferramenta produz uma certa quantidade de peças

(poucas centenas de canos), tornando-se necessário reafiá-la, num processo

22

executado em retíficas. A reafiação faz com que entre um lote e outro de

canos possam ser identificadas pequenas diferenças, do ponto de vista

microscópico, provocadas por pequenas marcas deixadas no processo de

retífica na ferramenta de raiar. Além disso, eventualmente, ocorre que

pequenos cavacos, produzidos na operação de raiar, sejam arrastados ao

longo do cano gerando as diferentes impressões que diferenciam este canos

dos demais produzidos em um lote.

Estas diferentes impressões de raiamento, quando ocorrem, podem

ajudar um perito, devidamente equipado com um microscópio, a associar um

cano ao projétil por ele disparado. No entanto, deve ser ressaltado que, dentro

de um mesmo lote de canos feitos pela mesma ferramenta, quando não ocorrer

o arraste de cavacos, o que na realidade é um fato acidental do processo, será

gerada uma quantidade de canos absolutamente iguais.

Em processos mais modernos de fabricação, o raiamento é obtido por

deformação a frio num processo chamado de bilhamento. Neste processo uma

ferramenta de metal duro, extremamente polida e com o perfil do raiamento

que se pretende obter, é arrastada ao longo do furo do cano. A ferramenta, por

ser de metal duro, não sofre desgaste perceptível na fabricação de uma série

de canos. Além disso, como não envolve a retirada de material, não gera

cavacos e, conseqüentemente, não há marcas para diferenciar um cano do

outro. Assim sendo, canos de mesmo lote e materiais produzidos pela mesma

ferramenta são absolutamente iguais.

Desta maneira, podemos concluir que, tanto em um processo de

fabricação quanto no outro, serão sempre gerados grupos de canos que irão

produzir impressões nos projéteis, mas que não poderão ser distinguidas umas

das outras, inviabilizando assim completamente o trabalho do perito.

Deve-se levar em conta, ainda, que o fato do fabricante arquivar um

projétil com a impressão do raiamento de cada arma produzida, devido aos

problemas descritos acima, não terá nenhuma utilidade para a perícia, pois um

23

projétil recolhido no ambiente do crime não poderá definir a arma correta que o

disparou. Se a perícia estiver de posse da arma suspeita, então será possível

fazer uma comparação entre o projétil recolhido e um novo projétil a ser

disparado por esta arma, não sendo necessário comparar com o projétil

arquivado no Sinarm. A única situação em que o arquivamento de projéteis

pelo fabricante terá alguma utilidade será na comparação do projétil disparado

pela arma suspeita com o projétil correspondente à esta arma no arquivo do

fabricante. Neste caso, o arquivo do fabricante servirá para comprovar se

houve ou não a troca do cano da arma.

Por todas essas razões, o artigo acima citado não possui nenhuma

utilidade.

“As armas apenas potencializam desfechos fatais a

conflitos necessariamente existentes dentro de qualquer

comunidade”. (pág. 23) – “a restrição ao porte de arma por

pessoas comuns também reduz o risco de morte do próprio

portador e daqueles que estão ao seu lado”. (pág. 30)

No Brasil, não existe estudos de análise de risco que comprovem esta

afirmação. Na experiência internacional, o único estudo existente, realizado nos

Estados Unidos, mostra que as armas salvam inúmeras vezes mais vidas do

que tiram. Ambas afirmações acima, portanto, jamais foram constatadas; são

apenas suposições.

As pessoas acreditam que possuir uma arma lhes assegura melhores

condições para defender suas vidas porque a realidade mostra que isso é

absolutamente verdadeiro. O lobby antiarmas cita uma suposta pesquisa

elaborada pela Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, que nega sua

autoria, para concluir que “um cidadão que possui arma de fogo têm 57 por

cento mais chance de morrer em um assalto do que os cidadãos desarmados”.

24

Não explicam como chegaram a esta conclusão, quais dados foram usados,

como foram coletados, a qual períodos se referem. É mais um estudo

fantasma!

A experiência concreta e os dados e estudos disponíveis mostram o

contrário. Basta lembrarmos a relação entre registros de armas e porte e

número de homicídios, na região Sul, e do Rio Grande do Sul e Santa Catarina,

em particular. Nesta região, temos a maior taxa de registros de armas e portes

do país e um dos menores índices de criminalidade!

No plano internacional temos dois exemplos gritantes: na Inglaterra,

depois do desarmamento, aumentou em 117 por cento o número de assaltos e

roubo à residências, sabidamente desprotegidas. Nos Estados Unidos, estudo

realizado pelo Professor Gary Kleck, da Universidade da Flórida, juntamente

como os criminologistas Don B. Kates e David Kopel, denominado Guns and

Violence in América, comprovou que para cada uma vida perdida são salvas

entre 25 e 75 vidas por uso de armas de fogo.

Outro estudo realizado pelos professores James Wright e Peter Rossi,

denominado Armed and Considered Dangerous: A Survey of Felows and Their

Firearms, patrocinado pelo Departamento de Justiça americano, apontou “o

cidadão armado como o mais efetivo meio de impedimento do crime na nação”.

A pesquisa realizada com mais de 1800 criminosos mostrou que:

??81% afirmaram que procuram saber antes se a vítima está armada;

??74% dos bandidos afirmaram evitar entrar em residências onde

sabem morar cidadãos armados;

??40% disseram que deixaram de cometer crimes por medo de que a

vítima estivesse armada;

??57% afirmaram temer mais o cidadão armado do que a própria

Polícia;

25

?? 56% disseram não abordar vítimas que desconfiem estar armadas.

A razão para este comportamento é simples: a arma na mão de um

cidadão de bem funciona como decisivo instrumento de dissuasão contra o

crime.

Um outro estudo, uma das mais interessantes pesquisas de vitimização

realizadas no Brasil, divulgada pelo Banco Mundial (World Bank) em 2002, é de

autoria de uma equipe de pesquisadores da Universidade de São Paulo – USP,

sob coordenação do professor do Departamento de Ciência Política, Leandro

Piquet Carneiro. Os dados abrangem a Região Metropolitana de São Paulo e

contrastam com levantamentos e conclusões sensacionalistas que apontam

para um quadro de grave “pavor” da população em relação à criminalidade em

todo o país.Dentre as conclusões, está a de que o que predomina de forma

destacada no Brasil o chamado “street crime” e “house crime”. No primeiro

caso, combatê-lo requer a presença mais ostensiva da polícia, ações sociais

preventivas e o exercício da autoridade efetiva e simbólica da justiça criminal;

no segundo, além dos efeitos positivos da maior efetividade da ação policial, é

preciso contar com a possibilidade da dissuasão através da autodefesa. Por

isso, é inimaginável retirar do cidadão o direito de defesa de sua residência e

de sua família.

Ao contrário do que insistem em afirmar os defensores do

desarmamento, os crimes no Brasil não são majoritariamente provocados por

motivos fúteis: 75% deles são “economicamente motivados”, ou seja,

objetivavam alguma vantagem material. Os que possuem outro tipo de

motivação, passionais ou desavenças interpessoais, representam apenas 15 %

dos casos.

A pesquisa também desmente de forma categórica a tese dos

defensores do desarmamento que afirmam ser a arma de fogo a principal

causa da criminalidade no Brasil. Pelos dados, percebe-se que o emprego de

arma de fogo – a pesquisa não detecta se a arma é legal ou não – limita-se a

26

apenas 14,85% dos casos. Se a questão é combater a criminalidade através da

eliminação de objetos usados nos episódios que resultam em crimes, será

preciso antes proibir golpes, tapas, socos, facas, etc.

“O Estatuto terá impacto direto no mercado ilegal de

armas. Diferentemente do mercado de drogas, as armas sempre

têm uma origem legal”. (pág; 32)

Armas legais não fabricam criminosos. É absurda a afirmação de que o

cidadão de bem indireta ou involuntariamente ajuda os criminosos ao comprar

uma arma legal. Essa é uma tese sobretudo preconceituosa, pois supõe que

todos os cidadãos agem sem a plena consciência de suas responsabilidades

civis e legais. Dizer que eles se iludem é chamá-los, no mínimo, de ingênuos

ou irresponsáveis, o que representa uma ofensa inaceitável para uma proposta

que prega a democracia e a participação social.

A venda legal de armas, como já mencionamos, caiu de forma

significativa no Brasil e nem por isso a criminalidade diminuiu. O mercado

ilegal, ao mesmo tempo, tem crescido assustadoramente. Quase diariamente

lemos vemos no noticiário armas de grossos calibres, dignas de guerra, como

também de uso restrito das Polícias e Forças Armadas, em poder dos

criminosos. Para encarar esse problema, são cruciais medidas repressivas por

parte do governo em nossas fronteiras e também internamente. Até porque é

através do mercado ilegal – de armas produzidas no exterior – que o

narcotráfico se abastece de armamento pesado. A maioria dos crimes

esclarecidos é cometida por bandidos reincidentes, que compram armas,

obviamente, no mercado clandestino. Hoje, eles são os maiores responsáveis

pelo aumento de assaltos, seqüestros e outros crimes violentos com armas de

fogo.

27

Existe um mito que o Brasil é um país onde a armas de fogo esta

banalizada. Não é verdade. Os Estados Unidos, a Noruega, o Canadá, a

Finlândia, França, Nova Zelãndia, Austrália, Belgica, Suiça, Itália, Suécia,

Espanha e Irlanda são países mais armados do que o Brasil e possuem taxas

dez ou vinte vezes menores de crimes. Como explicar a diferença? Neles não

existe mercado ilegal? Não existe a possibilidade de que um proprietário de

uma arma legal ser assaltado e sua arma parar na mão de um bandido?

Todos esses países são desenvolvidos ou em desenvolvimento.

Possuem polícias mais eficientes. A impunidade é menor e as comunidades

são mais organizadas e atuantes. Essa é a diferença fundamental. Por

exemplo, a Inglaterra proibiu a venda de armas de fogo em 1997 e existem

hoje no país um mercado ilegal estimado em 3 milhões de armas, como

noticiou o jornal The Guardian.

A lógica é: proibir estimula o mercado ilegal. A opção é: legalizar,

regular e controlar. É preferível o controle do que a ilegalidade.

A maior fabricante de armas curtas do Brasil, a Forjas Taurus, numa

decisão cautelar, não exporta armas para o comércio (mercado civil) do

Paraguai desde outubro de 1999, quando descobriu que esse país estava no

centro das operações do tráfico de armas e de drogas.

Outra medida que, evidentemente, surtiria efeito, é a melhoria no

controle do estoque de armas apreendidas e das adquiridas por empresas de

segurança. Há casos relatados pela Polícia de armas que foram apreendidas e

depois voltaram às ruas várias vezes.

O controle das armas apreendidas pelas forças policiais são deficientes

e não há como responsabilizar o cidadão honesto ou a indústria de armas pela

inépcia ou por falhas na guarda dessas armas pela polícia ou pela falta de

segurança das empresas de segurança privada. A responsabilidade é da

conduta humana e atribuir às armas legais essa responsabilidade é uma

28

acusação leviana. É a mesma lógica hipócrita de querer reduzir os acidentes

de trânsito proibindo a fabricação de automóveis.

Basta analisar cuidadosamente a veracidade das informações

apresentadas pelos defensores do desarmamento civil. Segundo a ONG Viva

Rio, o “número de armas clandestinas fabricadas no País chega a 20 milhões”.

Conforme dados da Forjas Taurus, em 40 anos, foram fabricadas 10

milhões de armas, sendo que 50% dessa produção foi exportada e outros 50%

foram comercializados para as Polícias Civil, Militar e Forças Armadas, como

também para empresas de segurança pública. Ou seja: se essa conta está

correta, 10 milhões de armas a mais foram colocadas no mercado ilegal, o que

é um absurdo.

Dados obtidos através do Sistema Nacional de Armas (Sinarm) indicam

que, em 2002, foram apreendidas 73 vezes mais armas do que no ano de

1990. Existem cálculos da Polícia Federal que apontam a presença de cerca de

47 mil armas somente nas favelas cariocas. Os bandidos do Rio, como já foi

conferido in loco por vários policiais, têm hoje arsenais dignos de guerra.

A pesquisa do Iser que concluiu pela existência de um alto percentual

de armas de fabricação nacional entre as armas apreendidas pela polícia no

Rio de Janeiro é falha. Ela não indica o motivo pelo qual a arma foi apreendida:

uma arma pode ser recolhida por ter registro vencido, porte vencido, não ter

registro ou não ter porte. Estão misturadas nesse lote escolhido pela pesquisa

armas usadas em crimes e armas apreendidas por motivos burocráticos. Além

do mais, se no Brasil são apurados em média apenas 8 % dos crimes

violentos, como dizer que a armas de fabricação nacional está presente nos

demais 92% dos crimes não apurados?

29

2 - ARMAS E CRIMINALIDADE NO BRASIL

A análise da relação entre armas de fogo legais e crimes violentos

enfrenta, conforme já salientamos, uma série de dificuldades, principalmente

resultantes da ausência de informações precisas sobre o envolvimento de

armas de fogo nos crimes. Os dados que dão amparo para a afirmação de que

65% dos casos de homicídios foram cometidos por arma de fogo é proveniente

das informação do Sistema de Informações sobre a Mortalidade (SIM), do

Datasus, do Ministério da Saúde.

Por ser um indicador de saúde, naturalmente não traz mais nenhuma

informação sobre a situação da arma, do agente e sobre as circunstâncias dos

crimes. A primeira dificuldade, portanto, reside no fato de que não sabemos se

as armas empregadas nesses crimes estão em situação regular, são legais,

ou estão em situação irregular. Ou, até mesmo, se são armas de calibre cuja a

venda é permitida para civis no Brasil, ou se são armas com calibres

proibidos.

Por sua vez, os registros efetuados pelas polícias, no caso dos

homicídios, fornecem apenas dados completos sobre um universo muito

pequeno dos crimes, pois se restringem, por razões óbvias, aos crimes

apurados. Segundo estimativas, abrangem apenas 8% do total, uma amostra

muito pequena para qualquer generalização segura sobre um padrão

observável na totalidade dos crimes de homicídio.

Basicamente por causa dessas duas razões, as análises sobre a

possível relação entre armas legais e crimes deve se valer de outras

metodologias, com base em dados agregados.

30

Antes de apresentarmos a análise que aponta a dificuldade de

correlacionar positivamente as armas legais e os crimes violentos, é importante

citar um importante estudo que lança novas luzes sobre a dinâmica dos

homicídios no Brasil. Trata-se da pesquisa “Homicidas e Homicídios:

reflexões sobre a atualidade urbana de São Paulo“, de autoria do jornalista

Bruno Manso.

Ele analisou dados de 876 inquéritos policiais na Região Metropolitana

de São Paulo, entre 1998 e 2000. Segundo o autor, ao contrário do que afirma

o Senador Renan Calheiros, que os homicídios são perpretados por pessoas

de bem por motivos “fúteis”, 76% dos homicídios são “assassinatos”

planejados, portanto, premeditados e envolvem “acertos de contas” entre

bandidos.

Assim, ao contrário do que supõe também o “discurso dos

desarmamentistas”, a maior parte dos homicídios ocorre como uma forma de

os “criminosos” resolverem suas desavenças. De acordo com o estudo, a

premeditação explica-se pelo fato óbvio de que, num ambiente criminoso, onde

não existe a intermediação do Estado, o homicídio planejado se torna a única

forma de resolver as disputas entre os criminosos.

Outra conclusão importante desse estudo, compatível com outras

pesquisas, é que, na dinâmica dos homicídios, atua fortemente o fator drogas.

Ele aponta o envolvimento das drogas em nada menos do que 67% dos casos

analisados.

A seguir, apresentamos as conclusões da análise sobre a relação entre

estoque de armas legais e índices de crimes com base em três metodologias

diferentes.

A primeira delas compara a evolução da venda de armas legais em

São Paulo (capital) e a emissão de portes com as tendências dos crimes de

roubos e furtos. Em seguida, é feito um outro exercício, comparando-se os

31

dados de armas apreendidas pela polícia com as mesmas tendências de

crimes (roubos e furtos).

Os dados da Tabela 1 mostram que a venda de armas legais vem

decrescendo de forma sistemática e consistente em todos os anos da série,

desde 1994. Observando-se os anos extremos da série, vê-se que, em 2002, a

venda correspondeu a um quarto do volume vendido em 1994.

A emissão de portes de armas também teve uma queda expressiva,

conforme podemos verificar nos dados da Tabela 1. Em 2002, foram emitidos

17 vezes menos portes do que em 1994. Em 2002, apenas 3.900 portes foram

autorizados.

Enquanto isso, o volume dos roubos e homicídios apresentou

comportamento ascendente, e, no caso dos homicídios, houve persistência das

ocorrências num patamar elevadíssimo. A taxa de homicídios na Região

Metropolitana de São Paulo é mais do que o dobro da taxa média nacional,

alcançando 65 casos por 100 mil habitantes a cada ano.

32

Em outras palavras, enquanto as vendas de armas legais caíram 76%

e a emissão de portes decresceu 94%, quando comparados os anos 1994 e

2002, os crimes de roubos aumentaram 73% e os homicídios permaneceram

no mesmo patamar, de 50,7 casos por 100 mil habitantes.

A redução da venda de armas e a da emissão de portes não tiveram

nenhuma influência positiva na redução dessas duas modalidades graves de

crimes.

Quando acrescentamos a esse quadro o volume de armas apreendidas

pela polícia – supõe-se em situação irregular – o mesmo fica ainda mais

dramático. Conforme podemos observar, foram apreendidas, entre 1996 e

2002, no Estado de São Paulo, segundo dados da própria polícia, nada menos

do que 244 mil armas de fogo.

Para termos uma idéia da magnitude das apreensões, basta lembrar

que o estoque de armas legais, em São Paulo, no ano 2000, era de exatas 495

mil armas. As apreensões retiraram o equivalente a mais da metade do

estoque de armas legais, e nem por isso a criminalidade (roubos e homicídios)

baixou, ao contrário.

Ou seja, São Paulo vem promovendo uma severa política de

desarmamento civil – através da redução da emissão de registros e de portes e

da imposição de barreiras financeiras através do alto preço desses documentos

– sem afetar a criminalidade. Reduziu drasticamente o estoque de armas em

situação irregular, sem que, da mesma forma, houvesse efeito positivo nos

índices de crimes.

A mesma assimetria na comparação entre a densidade de armas de

fogo e crimes ocorre também no Rio de Janeiro. O Rio de Janeiro vem

implementando uma política de desarmamento há mais de oito anos, tendo,

nesse período, apreendido aproximadamente 80 mil armas. Segundo o Viva

Rio, a média de apreensões/ano é de 10 mil armas.

33

Complementando esse quadro, foi praticamente cessada a emissão

de portes desde 1994 – o total de portes emitidos no Estado alcança pouco

mais de uma centena. Ou seja, a totalidade do estoque de armas em mãos de

civis pode apenas ser mantida nas residências e nos locais de trabalho. As

vendas de armas para o mercado civil, por sua vez, vêm se reduzindo a cada

ano. Entre 1996 e 2002, foram vendidas não mais do que 25 mil armas.

Em resumo, a verdade é que o Rio de Janeiro está se desarmando, e a

criminalidade aumentou nos últimos anos.

Não há relação entre venda de armas legais e crimes letais

Uma outra possibilidade de se avaliar a relação possível entre a

densidade da presença de armas de fogo na sociedade e os crimes é fazer

uma comparação entre a realidade dos estados. É o que fazemos a seguir,

comparando a presença de armas de fogo e os índices de homicídios nos

Estados do Rio de Janeiro, de São Paulo e do Rio Grande do Sul.

O objetivo desta análise é testar a afirmação dos defensores do

“desarmamento” civil no sentido de que a simples presença de mais armas de

fogo em circulação é um bom predicador de crimes violentos. Por esse

argumento, onde existem mais armas, deve haver maior número de crimes.

34

Assim, quando examinamos os dados, observamos uma realidade

bastante diferenciada em termos de estoque de armas legais perante a

ocorrências de homicídios.

No Rio Grande do Sul, estado mais armado do País, temos uma média

de uma arma de fogo para cada 10,86 habitantes. Em São Paulo, uma arma

para cada 29 pessoas, e, no Rio de Janeiro, a menor densidade, uma arma

para cada 74 pessoas.

Isto é, o Rio Grande do Sul tem sete vezes mais armas per capita do

que o Rio de Janeiro e três vezes mais do que São Paulo. Mas, com relação

aos homicídios, possui uma taxa quase quatro vezes menor do que o Rio de

Janeiro e de quatro vezes menor do que São Paulo.

Diminui a venda de armas e aumentam os homicídios

Finalmente, uma última possibilidade de se examinar a correlação

entre armas de fogo e a criminalidade letal é colocar os indicadores num

horizonte temporal mais longo, para que possamos observar uma tendência

histórica.

No Gráfico 1 podemos observar o comportamento das vendas de

armas de fogo leves para o mercado civil (exclui as vendas para as Polícias

Civil e Militar), comparativamente ao comportamento do volume de homicídios

ocorridos no mesmo período.

35

Em 20 anos, os homicídios aumentaram de 10 mil para 40 mil por ano,

enquanto a venda de armas caiu, em média, de 51 mil para 23 mil no mercado

civil.

A análise feita acima evidencia, de forma bastante sólida, a dificuldade

de se fazer uma relação simplista, como é feita pelos adeptos do

desarmamento, entre armas legais e crimes. Não se pode dizer que maior

densidade de armas legais na população significa, necessariamente, maior

volume de crimes.

Igualmente, não se pode afirmar que a simples redução da venda de

armas legais é importante para reduzir os homicídios.

Os dados mostram que a premissa fundamental do “desarmamento” é

falha. Na realidade, conforme evidencia a situação observada no Rio Grande

36

do Sul, a presença de armas pode conviver — e alguns até acreditam explicar

— com baixos índices de crimes letais, comparativamente à realidade nacional.

Uma análise isenta e objetiva das razões que motivam a explosão dos

crimes nos Estados do Rio de Janeiro e de São Paulo, mas também em várias

capitais do País, deve levar em conta outros fatores sociais, legais e

econômicos. E, principalmente, o desenvolvimento do crime organizado, que

explora o tráfico e o consumo de drogas, responsável por um novo fenômeno:

o banditismo urbano e as “carreiras criminosas”.

No tocante às armas de fogo, é evidente que o Governo deve possuir

um sistema de controle dos registros e dos portes, como, aliás, prevê a Lei nº

9.437 e o Decreto 2.222., em vigor. As leis brasileiras já são suficientemente

severas. Podem, evidentemente, ser melhoradas, mas é preciso ter o cuidado

necessário para que o princípio da legítima defesa não seja afetado.

O famoso Criminologista David Bayley, na abertura de seu livro Police

for the Future, diz com todas as letras: “(...) polícia não consegue prevenir o

crime”. Pela simples razão de que, por mais eficiente que seja, ela não pode

estar, ao mesmo tempo, em todos os lugares. A proteção policial total é um

mito, que vem custando muitas vidas em todo o mundo.

A sociedade e os cidadãos, de várias formas, são vistos hoje pelas

modernas técnicas de prevenção como elementos complementares ao trabalho

da polícia. Através de duas formas básicas: participando na formulação das

estratégias de prevenção e reduzindo as oportunidades de crimes. Mas,em

última instância, quando eles são iminentes, ninguém pode negar-nos o direito

de defesa. Não existe direito de defesa sem os instrumentos para torná-lo uma

possibilidade real.

37

4 - A EXPERIÊNCIA INTERNACIONAL NO CONTROLE

DE ARMAS

No debate sobre o desarmamento no Brasil, com muita freqüência se

recorre aos exemplos dos Estados Unidos e da Inglaterra. A realidade desses

países é evocada tanto como algo que deve ser evitado ou como exemplo a

ser imitado. Em análises comparativas, quando citamos o exemplo de um ou

outro país, precisamos nos cercar de cuidados, para não imaginar que as leis

ou situações existentes em outros contextos legais, sociais, econômicos e

culturais possam ser simplesmente copiadas para o nosso. Por isso,

precisamos sempre levar em conta as diferenças e peculiaridades presentes

nos contextos e cenários que estão sendo cotejados.

Por exemplo, quando se comparam as taxas de crimes violentos e

mesmo de homicídios de vários países com as do Brasil, nota-se que os que

apresentam as menores taxas de crimes violentos são, invariavelmente, e não

por coincidência, os países desenvolvidos. Países que, em relação ao nosso,

apresentam enormes vantagens em termos de crescimento econômico,

distribuição de renda, mercado de trabalho, educação e serviços públicos e,

por último, sistemas de Justiça Criminal – a polícia, a Justiça e o Sistema

Prisional - melhor equipados e mais eficazes.

Este último aspecto é muito importante, pois a eficácia da polícia e da

Justiça está intimamente relacionada com a punição dos crimes e, através do

exemplo, com a disseminação da certeza da punição como elemento de

educação e dissuasão de delitos, mesmo os de baixo poder ofensivo.

A ocorrência de baixo nível de crimes nos países desenvolvidos, como

se verá neste estudo, não se deve à inexistência de armas de fogo (armas

38

leves) em circulação na sociedade, mas à eficácia da imposição da lei e da

ordem, à eficácia da ação do Estado.

Os Estados Unidos, por exemplo, enfrentaram uma forte ascensão da

criminalidade violenta nos anos 70 e 80, provocada, em larga medida, pelo

crescimento do tráfico de drogas (a cocaína e, mais tarde, o crack).

Qual foi a resposta dos norte-americanos?

Basicamente, uma ampla e radical reforma de suas instituições

policiais, através da inovação nos conceitos e as táticas das polícias, do

policiamento comunitário, da implementação de políticas rigorosas de

recuperação da ordem pública (Tolerância Zero), da prevenção situacional do

crime (envolvimento com a comunidade e táticas preventivas), além de

medidas penais mais rigorosas. Os EUA experimentaram, é verdade, um

crescimento importante de sua população prisional, mas estão vencendo a

criminalidade. Paralelamente a todo esse esforço, já são 35 os estados onde é

permitido ao cidadão de bem portar uma arma para sua defesa pessoal.

Faremos, inicialmente, alguns comentários sobre a realidade dos

Estados Unidos e, em seguida, algumas observações sobre a Inglaterra.

Finalmente, para subsidiar ainda mais o debate, transcrevemos um capítulo do

livro Democídio: Criminalidade e Democracia no Brasil, onde a realidade

desses países é debatida em maior profundidade.

Estados Unidos

Quando citamos o exemplo da política dos norte-americanos com

relação às armas de fogo e também seus exemplos de sucesso no combate à

criminalidade, isso não significa que estamos advogando a adoção de tais

políticas no Brasil. Estamos, apenas, utilizando os exemplos concretos para

questionar nossas propostas e testar muitos de seus fundamentos e

promessas.

39

Assim, no caso específico das armas de fogo, o exemplo das políticas

adotadas na maior parte dos estados dos EUA, que permitem a venda e o

porte de armas leves por cidadãos honestos, é muito interessante e ilustrativo.

Hoje, em mais de 35 estados daquele país, um cidadão pode comprar uma

arma de fogo e portá-la em determinadas circunstâncias e locais. São as

chamadas leis não arbitrárias de porte de armas.

Armas e queda dos crimes

Um estudo realizado pelo Economista John Lott da Universidade de

Chicago, já citado, mostrou que, nesses estados, os índices de crimes

violentos são menores do que nos estados que proíbem ou praticam restrições

à venda e ao porte das armas de fogo. Daí o sugestivo título de seu livro: “Mais

armas Menos crimes”. Lott coletou e analisou indicadores em 3054 distritos do

país durante 18 anos e chegou à conclusão de que há uma relação assimétrica

entre armas e crimes.

Os Estados Unidos são provavelmente um dos países onde existe o

maior volume de armas em mãos de cidadãos civis. Existem estimativas que

indicam a existência de um estoque de mais de 200 milhões de armas em

circulação no país, e nem por isso a criminalidade violenta está aumentando.

Ao contrário, desde 1993, todas as taxas de crimes estão em queda:

homicídios, roubos e assaltos com ferimentos, conforme podemos ver na

Tabela 4.

Depois de atingir o pico, em 1980, quando alcançou 10,2 casos por 100

mil habitantes, e manter-se nesse patamar durante toda a década, nos anos

90 a taxa de homicídios apresentou uma trajetória declinante até alcançar, em

2000, 5,6 casos por 100 mil, o mesmo patamar do início dos anos 60.

40

Mais ou menos o mesmo comportamento pode ser observado com

relação às taxas de roubos e de assaltos com agravantes. Os roubos

mantiveram-se entre 208 e 257 casos por 100 mil ao longo dos anos 80; nos

anos 90, começaram a declinar, até alcançar 147 casos por 100 mil; em 2000,

tiveram o menor indicador desde 1969. O mesmo ocorreu com os assaltos com

agravantes: em 2000, a taxa de 329 casos por 100 mil era a menor desde

1985.

Queda dos crimes com armas de fogo

Juntamente com a queda dos homicídios observada ao longo de toda a

década de 90, constatou-se também a diminuição dos homicídios com o

emprego de armas de fogo.

Em 1990, havia 4,7 casos de homicídio com o emprego de arma de

fogo para cada 100 mil habitantes, percentual que caiu para 2,9 casos no final

41

da década, de acordo com o Supplementary Homicide Reports, editado pelo

FBI.

Armas x crimes

O que estes números comprovam? Basicamente que, enquanto

aumentou o estoque de armas de fogo nos Estados Unidos — um crescimento

estimado por certos estudiosos em 3 millhões de novas armas por ano, até

atingir um estoque estimado em mais de 200 milhões de armas em circulação

— a criminalidade caiu.

Essa relação assimétrica entre o volume de armas e os índices de

crimes coloca em dúvida, senão em total descrédito, um dos mais importantes

argumentos dos segmentos que defendem o “desarmamento civil” como

estratégia de controle e de redução dos crimes.

42

Seguindo a lógica do argumento que utiliza a quantidade de armas em

mãos de civis como fator predicador de crimes, teríamos de estar diante de

um crescimento contínuo da criminalidade nos Estados Unidos, ao contrário do

que vem ocorrendo naquele país desde o início dos anos 90. A quantidade de

armas aumenta nos Estados Unidos, a cada ano, enquanto os crimes estão em

queda.

As armas e a autoproteção

Os norte-amercianos compram armas por duas razões básicas: para a

prática de esportes e de caça e, em segudo lugar, para a proteção de suas

casas e famílias. Estima-se que 60% dos proprietários de armas de fogo

praticam caça todos os anos.

Existem estatísticas que mostram o uso defensivo de armas de fogo —

Defensive Use Guns (DGU). Uma delas resulta de pesquisa realizada pelo

Professores Kleck e Gerts, que mostram um uso defensivo de armas entre 1,5

e 4,7 milhões de vezes a cada ano. São situações em que a posse de uma

arma permitiu ao seu portador evitar a ocorrência de um crime. Os críticos da

pesquisa de Kleck e Gerts, como o Professor J. Cook, da Universidade de

Duke (USA), discordam dessa estimativa, admitindo um número menor, de

apenas 570 mil situações.

De qualquer forma, seja qual for o número, é preciso reconhecer que a

posse de uma arma pode ser um fator efetivo de dissuasão de crimes. Esse

aspecto pode ser visto de uma outra forma, através da relação dos criminosos

com seus “alvos”. É o que indica uma pesquisa feita com presos norte-

americanos, que admitiram “preferir” atacar alvos desarmados (pessoas ou

residências).

A seguir, transcrevemos alguns trechos de um dos capítulos do livro

Democídio: Criminalidade e Democracia no Brasil, do economista Luiz

Tadeu Viapiana (2003), onde o autor apresenta uma análise crítica dos

43

pressupostos da tese do desarmamento, das promessas e resultados

concretos dessa política.

A (i)lógica do desarmamento

A relação entre armas e crimes envolve um longo, antigo e complexo

debate. As posições estão, em geral, polarizadas entre os que afirmam haver

uma relação de causa e efeito entre a disponibilidade de armas de fogo e

índices de criminalidade e os que, no outro extremo, dizem que mais armas

representam menos crimes.

Ambas as posições recorrem às estatísticas para comprovar suas

teses, em que pese às dificuldades metodológicas existentes. A mais comum

delas é a comparação entre o número de armas e o número de homicídios por

país (Killias, 1993), embora se saiba que essas estatísticas são muito

imprecisas. Por exemplo, certos países estimam o número de armas supondo

que existe apenas uma arma por residência, quando, na verdade, essa

premissa é mera suposição. Outra dificuldade enfrentada por esse tipo de

levantamento é que as pessoas temem revelar a quantidade de armas em suas

residências. O problema acentua-se nos países que possuem leis restritivas,

pois as pessoas receiam que o governo, de posse das informações, recolha

suas armas. Mas, de qualquer modo, apesar da imprecisão das estimativas

com relação ao estoque de armas, é a comparação entre a quantidade de

armas legais e o número de homicídios o principal argumento utilizado pelos

que se opõem à supressão do direito do cidadão civil de comprar e portar uma

arma de fogo.

Um desses estudos foi elaborado por Martin Killias e compara a

quantidade de armas e a taxa de homicídio em 18 países desenvolvidos,

dentre os quais os Estados Unidos, a Suíça, a Nova Zelândia, o Canadá, a

Austrália, a Inglaterra, o Japão e a França. Os Estados Unidos lideram a lista,

com um estoque de 85 milhões de armas e uma taxa de homicídio de 9,3

44

casos por milhão; seguidos da Suíça, com 43 milhões de armas e apenas 1,5

caso de homicídio por milhão; logo depois vem a Nova Zelândia, com 29

milhões de armas e 2,6 homicídios; em quarto lugar, está o Canadá, com 24

milhões de armas e somente 2,2 homicídios, seguida pela França, com 23

milhões de armas e 4,9 homicídios.

Se adotarmos, na lógica do argumento dos que defendem o

desarmamento civil, a quantidade de armas como predicador da ocorrência de

homicídios, a comparação da quantidade de armas com o número de

homicídios nos vários países mostra uma relação, para dizer o mínimo,

largamente desproporcional.

Diante de tal situação, é muito difícil sustentar a existência de uma

relação direta entre as duas variáveis. A Suíça, por exemplo, possui a metade

das armas existentes nos Estados Unidos e apenas um quinto dos homicídios.

45

A Nova Zelândia possui um estoque mais elevado do que a França (29 milhões

contra 23 milhões) e uma taxa de homicídios quase 50% inferior (2,6 contra

4,9).

Quando os números se referem exclusivamente aos Estados Unidos, a

discrepância é ainda maior, embora muitos dos estudos apresentem também

dificuldades metodológicas. É o caso das comparações que se limitam a

cotejar dados de apenas poucas cidades, ou ainda dos estudos cujos dados

referentes ao estoque de armas disponíveis são insuficientes e requerem

estimativas e, por fim, o fato de que os dados agregados escondem diferenças

marcantes entre os diversos estados e regiões do país. Tal fato é importante

porque as regulamentações existentes em determinados estados podem ser

tangenciadas através da aquisição de armas onde as leis são menos

restritivas.

Nos Estados Unidos, por exemplo, se compararmos o estoque de

armas e as taxas de homicídios em 1973 e 1992, veremos que, enquanto a

quantidade de armas aumentou 110%, a taxa de homicídios diminuiu de 9,4

casos por 100 mil habitantes para 8,5 casos. De acordo com outras fontes, em

1992, havia em todos os EUA, um estoque total de 221,9 milhões de armas

(Kates; Shaffer; Lattimer; Murray; Cassem, 1994). Em 1973, armas eram

empregadas em 68% dos homicídios; em 1992, em 62% dos casos; e, em

2000, em 66% deles. Note-se que, em 2002, segundo o National Crime

Victimization Survey, a taxa de homicídios havia caído para 5,5 casos para

100 mil habitantes, não obstante haver, em relação a 1992, um estoque de

armas ainda maior.

Se incluirmos o Brasil na tabela elaborada por Killias, o resultado será

surpreendente. Vejamos: em 1993, o Brasil apresentava uma taxa de 20,18

casos de homicídio por 100 mil habitantes, sendo que, em 13,8 casos,

tínhamos a presença de uma arma de fogo. Consideremos, ainda, que, em

11,9% das residências, havia uma arma de fogo. Esse percentual, na verdade,

46

refere-se ao estoque de armas registradas no Sinarm em 2002 e estima que

existe uma arma por residência. O percentual final é obtido dividindo-se o

estoque de armas pelo número de famílias brasileiras, considerando uma

média de 4 pessoas por família.

Por esse critério, o Brasil seria, em 1993, um país com menos armas

do que Estados Unidos, Noruega, Canadá, Finlândia, França, Nova Zelândia,

Austrália, Bélgica, Suiça, Itália, Suécia e Espanha, sendo que todos esses

países apresentavam, na mesma época, taxas de homicídios bem inferiores à

brasileira.

Os dados acima mostram ainda a falácia de que o Brasil é um país

onde a posse das armas foi “banalizada” e a de que a criminalidade letal no

nosso país está relacionada com a “grande” ou “enorme” disponibilidade de

armas legais em circulação. O problema entre nós parece estar relacionado

com o tráfico de armas, portanto, com as armas ilegais. Para aprimorar os

controles dos mercados ilegais não são necessários novas leis, mas a

aplicação das leis existentes, já suficientemente drásticas.

Se hoje o Estado não consegue fazer cumprir a Lei, o que nos garante

que uma lei impondo maiores restrições ao registro e ao porte vai ser

obedecida?

Mais do que isso, os bandidos irão cumprir a lei e entregar suas

armas?

A Professora Susan Baker introduziu uma importante novidade na

forma de analisar os dados estatísticos, ao agrupar os dados relativos aos

homicídios e suicídios na comparação entre os países. Ela criou uma

classificação denominada Internacional Intentional Homicide Table,

utilizando os dados de Killias dos anos 1983-86, complementando-os com

indicadores do United Nations Demographic Yearbooks para 1985-95

(Kates; Shaffer; Lattimer; Murray; Cassem, 1994).

47

O resultado de suas comparações mostra que, quando são agrupados

homicídios e suicídios, os Estados Unidos ficam numa posição intermediária na

grade dos 19 países estudados, com uma média de 20,8 casos para cada 100

mil habitantes.

Na frente dos EUA, com médias maiores, estão Romênia, Hungria,

Finlândia, Dinamarca, França, Austrália, Suíça, Bélgica e Alemanha

(Ocidental). Note-se que a maior parte desses países possuem leis de

restrições às armas de fogo para a população civil. Os EUA possuem uma taxa

média equivalente um terço da líder Romênia, onde as armas foram banidas

durante o regime socialista, e à metade da taxa verificada na Hungria, que

também possui leis anti-armas. Na melhor colocação, está o Estado de Israel,

com apenas 9,0 casos por 100 mil habitantes, onde praticamente cada família

possui uma arma em sua residência.

Ora, se a presença de armas de fogo em residências é causa primária

de homicídios e suicídios (mortes intencionais), como acreditam os adeptos do

desarmamento civil, como explicar que, justamente em países europeus onde

existem restrições às armas, as taxas são mais altas?

Diante dessas comparações, em nível internacional e também em nível

interno, não há como se sustentar a existência de uma relação direta entre o

estoque de armas e os índices de homicídios.

Os argumentos “anti-gun” prosseguem com duas outras afirmações-

chave: (a) muitos dos que praticam homicídios são cidadãos honestos e; (b)

muitos dos disparos que resultam em homicídios não são praticados por

bandidos ou doentes mentais mas decorrem de atos passionais que são

cometidos utilizando-se uma arma de fogo destinada originalmente à proteção

da residência. Ou seja, ambas as afirmações dizem respeito à natureza do

crime de homicídio, à motivação e à característica psicológica de seus

agentes. A arma de fogo é apresentada, assim, como sendo uma das “causas

primárias” do homicídio.

48

Esse raciocínio é contestado fortemente por vários estudos realizados

nos Estados Unidos, que se valem de informações recolhidas nos registros do

FBI sobre os homicídios. Eles indicam que 75% dos que cometem homicídio

possuem algum tipo de antecedente criminal. Mais, dados do Bureau of

Criminal Statistics mostram que 76,7% dos presos por homicídio já possuíam

histórico criminal, e, o mais grave, 78% deles estavam sendo processados pelo

mesmo tipo de crime.

Ao contrário do que sugere o argumento “anti-gun”, pelo menos nos

Estados Unidos, a realidade mostra um quadro diverso, no qual a maioria dos

crimes de homicídio parecem resultar ou estar associada a um histórico de

crimes: “...,em 90% dos homicídios domésticos, a polícia tem sido chamada ao

mesmo endereço no mínimo uma vez nos dois anos que precedem o crime”

(Kates; Shaffer; Lattimer; Murray; Cassem, 1994). Outro pesquisador, Murray

Straus, citado por esses autores, afirma taxativamente: “..., a realidade do dia-

a-dia é que cada vez mais os homicídios nas famílias são precedidos por uma

longa história de agressões”.

O estudo de Kellerman

Um dos mais importantes estudos a sustentar as teses “anti-gun” foi

elaborado por um grupo de pesquisadores liderados por Arthur Kellerman,

denominado Gun Ownership as a Risk for Homicide in the Home e

publicado originalmente no New England Journal Medicine, em 1993. É, com

certeza, um dos documentos mais citados em apoio às teses favoráveis ao

desarmamento civil.

O objetivo central do estudo é mostrar que a presença de armas nas

residências, ao invés de oferecer proteção aos que nela residem, aumenta o

risco de crimes violentos. Os autores concluem que “... manter uma arma de

fogo em casa está associado de forma sólida e independente a maiores riscos

de homicídio”. O estudo teve como base uma amostra composta de apenas

49

444 situações de homicídios ocorridos nos lares das vítimas. Além disso,

contou com um grupo de controle de 388 residências próximas, do mesmo

sexo, raça e faixa de idade. O estudo valeu-se das informações de parentes

das vítimas e das famílias “de controle” para checar se as pessoas possuíam

armas em suas casas e se apresentavam problemas com álcool ou drogas.

Depois dessa checagem, concentra-se em demonstrar que os homicídios

estavam associados à posse de armas de fogo.

A crítica desferida contra o estudo de Kelermann et alii foi dura e

certeira. John Lott, o autor de More Guns Less Crimes afirmou que havia dois

problemas metodológicos que comprometiam definitivamente as conclusões do

estudo: foi omitido o dado decisivo de que, em apenas oito dos 444 casos,

foi possível esclarecer que a arma envolvida no crime era mantida dentro

da residência. Pode-se presumir, portanto, que a quase-totalidade das armas

utilizadas provinham de outros lugares, prejudicando diretamente a correlação

defendida pelos autores. A outra crítica desferida por Lott diz respeito à

metodologia utilizada na pesquisa, que desconsiderou o motivo pelos quais as

pessoas compraram armas, presumivelmente para se proteger. Pode-se supor

que essas pessoas já se sentiam submetidas a uma situação de maior risco,

na iminência de sofrerem algum tipo de ataque. Ele conjectura que essa

propensão pode ter como como origem o envolvimento das pessoas da

amostra com atividades ilegais desconhecidas do grupo de controle.

O fato, conclui Lott, “(...) de que todas ou praticamente todas as

vítimas de homicídio foram mortas por armas de fogo levadas para dentro de

seus lares pelas mãos de um intruso faz com que tudo isso fique mais

plausível”, alertando para o defeito fortemente comprometedor do resultado a

que chegaram Kellerman et alii. Na mesma linha de Lott, é direcionada a crítica

da Historiadora Joyce Lee Malcolm, em Guns and Violence.

É importante mencionar ainda uma outra crítica feita à amostra do

estudo de Kellerman et alii por Kates; Shaffer; Lattimer; Murray; Cassem

50

(1994). Eles alertam para o fato de que a amostra final utilizada na análise

correspondia a apenas 71,2% do total dos 444 casos inicialmente agrupados.

Segundo eles, a maior parte dos homicídios nos Estados Unidos são

praticados por pessoas com antecendentes criminais, grande parte delas

respondendo por crime idêntico, e grande parte dos crimes ocorrem em

famílias que apresentam histórico de agressões ou de envolvimento com

atividades ilegais, drogas ou álcool. Se essas afirmações estão corretas,

estamos mais próximos de uma relação direta entre homicídios e “carreiras

criminosas” do que propriamente entre homicídios e cidadãos honestos

armados, como sugere o argumento “anti-gun”. Fica difícil chegar a uma

conclusão definitiva sobre esse tema devido à inexistência de estudos

específicos sobre a natureza e o perfil dos homicídios em uma amostra

representativa do conjunto do país. Os estudos de caso são restritos a uma

cidade ou a um grupo de cidades ou condados e estão longe de fornecer uma

amostra que espelhe a realidade nacional.

Em seu livro, Malcolm sugere duas formas bastante simples de

verificar o impacto das armas de fogo na criminalidade. A primeira delas é

observar o crescimento do estoque de armas e compará-lo com os indicadores

de crimes letais. Se a suposição de que as armas são “causas primárias” de

crimes, mais armas necessariamente significaria mais crimes. Não é, todavia, o

que ocorre nos Estados Unidos. Ela informa que entre os anos de 1973 e 1992,

o volume de armas dobrou nos lares norte-americanos, um aumento de 102%,

enquanto a taxa de homicídios, que era de 9,4 casos por 100 mil habitantes em

1973, diminuiu para 8,3 casos em 1992. O número de homicídios cometidos

com o uso de armas de fogo permaneceu estável. O argumento de Malcolm é

corroborado integralmente por estatísticas mais recentes, que mostram uma

queda ainda maior dos homicídios no país; em 1999, os homicídios com o

emprego de armas de fogo (handguns) foram de 2,9 casos por 100 mil

habitantes, a menor taxa desde 1976.

51

A outra forma de diagnosticar o impacto das armas de fogo na

criminalidade é verificar o efeito das leis que permitem o porte discreto nos 34

estados norte-americanos onde são praticadas, comparativamente aos estados

que adotam restrições. Isso é o que fez o Economista John Lott em seu livro

More Guns Less Crimes.

Mais armas menos crimes

O livro de Lott foi, sem dúvida, o mais duro golpe contra a tese que

iguala armas legais a mais crimes. Até hoje, poucas e esparsas foram as

contestações às suas principais conclusões. A reação, em geral, foi a de

ignorar a interessante análise elaborada pelo professor da Universidade de

Chicago. O que se explica, em grande parte, pelo sectarismo que domina o

debate sobre o papel das armas de fogo na sociedade. O fato é que,

decorridos alguns anos da publicação original de seu livro, suas principais

teses resistem sólidas.

Lott coletou dados sobre os crimes violentos em 3054 distritos de

vários estados norte-americanos para um período de 18 anos, de 1977 a 1995.

Numa primeira fase, Lott agrupou os dados sobre crimes do período 1977-92 e

verificou qual o impacto que teve a adoção de leis que permitiam o uso discreto

de armas de fogo em 31 estados, comparando-os com os índices observados

nos estados que proibiam o porte de armas. O objetivo era medir o impacto das

leis de direito ao porte sobre a criminalidade. É importante esclarecer que, em

geral, as leis que autorizam o porte contêm exigências a serem cumpridas

pelos candidatos, tais como não apresentar antecedentes criminais, restrições

de idade de 18 ou 21 anos, diversas taxas, treinamento e ausência de doenças

mentais. Nos Estados de Vermont e Idaho, não são exigidas licenças, mas leis

criminalizam o porte de armas por adolescentes.

A pesquisa de Lott cercou-se de vários cuidados metodológicos a fim

de evitar a distorção dos resultados em suas comparações. Ele adotou várias

52

estratégias de “controle”, procurando evitar que diferenças demográficas,

econômicas e sociais interferissem em seu modelo. Isto porque o que lhe

interessava era determinar especificamente em que medida as leis de direito

ao porte discreto influenciam a criminalidade.

Da mesma forma, contornou o fato de que dados classificados por

estados escondem diferenças importantes, quando coletados por distritos.

Esse ponto é extremamente relevante, pois existem estados com distritos que

possuem altas taxas de homicídios ao lado de distritos com taxas próximas ou

mesmo de índice de homicídios zero. Se tomasse os indicadores agregados

por estados, essas diferenças ficariam diluídas nas médias, contaminando suas

conclusões. Lott também se preocupou em isolar das variações nos crimes os

efeitos provocados pelo índice de prisões e condenações. Enfim, ele adotou

uma série de procedimentos metodológicos que lhe permitissem

“descontaminar” sua comparação fundamental – o efeito das leis de porte de

armas sobre os crimes – da influência de outras variáveis.

Sua conclusão é contundente: “(...) os índices de crimes violentos

foram mais altos nos estados que apresentavam leis mais rígidas, seguidos

pelos estados que permitiam às autoridades locais um discernimento nas

permissões de porte de armas, e mais baixos nos estados que não

apresentavam leis não arbitrárias”, ou seja, onde o porte é automático,

independentemente de autorização da autoridade local.

Em termos percentuais, os crimes violentos são 81% mais altos nos

estados que possuem leis arbitrárias. No caso dos homicídios, os estados que

repudiam o porte de armas de fogo de uso discreto possuíam índices 127%

mais altos que os estados com leis mais liberais quanto ao porte de armas de

uso discreto. A diferença cai para os casos de crimes contra a propriedade:

24%. A explicação para essa pequena diferença é que restrições às armas

incidiriam mais sobre o universo de crimes violentos, tanto do ponto de vista da

consumação do crime, quanto nos casos em que é evitado.

53

O resultado do estudo de Lott coloca por terra pelo menos dois dos

argumentos mais importantes dos adeptos do desarmamento civil: a tese mais

genérica de que mais armas significam maiores riscos e maiores índices de

crimes, especialmente de crimes violentos, como também a tese mais

específica de que a simples posse de uma arma submete seu proprietário a

uma maior probabilidade de ser vítima de um crime letal.

Ao contrário, a posse de uma arma por um cidadão habilitado pode re-

presentar um poderoso efeito de dissuasão de crimes. Ele lembra que

“(...) criminosos, na maioria homens jovens, preferem alvos que darão menor

trabalho”. E surpreende novamente com outro dado intrigante: embora o uso

defensivo de armas seja quase totalmente ignorado pela mídia, os norte-

americanos usam armas defensivamente cerca de dois milhões de vezes por

ano, cinco vezes mais que o uso de armas para cometer crimes.

Uma explicação para a ignorância desses fatos pela população,

segundo John Lott, provém da má qualidade das informações divulgadas pela

mídia. “Esse menosprezo ocorre porque o assassinato de uma pessoa inocente

é mais notícia do que uma vítima empunhar uma arma e fazer o atacante fugir,

evitando o crime. Ao contrário das investidas que não se consumam, os

acontecimentos ruins proporcionam fotografias emocionalmente eletrizantes”.

Munido de pesquisas, cita que, em 98% dos casos, o simples brandir

de uma arma é suficiente para abortar um crime. “Menos de um em mil usos

defensivos de armas resulta na morte do atacante. No noticiário mundial,

ficamos sabendo de crimes como esses tiroteios em escolas públicas. Jamais

ouvimos – e deveríamos – comentários sobre o número muito maior de vidas

salvas”.

A propósito, em artigo publicado no Wall Strett Journal (27.03.98),

Lott apresenta um surpreendente e desconcertante argumento: “(...) desde que

os conhecidos tiroteios públicos começaram, no outono de 1997, 32 alunos e

três professores foram mortos em algum tipo de tiroteio em escolas primárias

54

ou secundárias, representando a taxa anual de uma morte para cada quatro

milhões de estudantes, incluindo mortes por gangues, roubos, acidentes, bem

como ataques iguais àquele de Columbine”, escreve, alertando, porém, para a

necessidade de termos algum senso de proporção. “Durante esse mesmo

período, 53 estudantes morreram jogando futebol na escola.”

Além dos argumentos apresentados por Lott, outros pesquisadores têm

sustentado objeções quanto aos possíveis efeitos do controle de armas sobre a

criminalidade. É o caso do Promotor do Colorado, David B. Kopel, que

publicou o estudo Trust the People: the case against gun control, através do

Instituto Cato. No trabalho, toca em dois pontos muito interessantes e que

deveriam merecer a reflexão de todos os que se dedicam ao tema da

criminalidade. Um deles se refere à falsidade da presunção de que proibir as

armas legais reduz a possibilidade de os criminosos obterem armas. Na

verdade, esse argumento repousa numa suposição irreal, pois subentende que

existe uma relação automática entre a edição de leis e o comportamento social

de adesão a elas. O cumprimento das leis depende, em primeiro lugar, da

capacidade de fiscalização por parte das autoridades e, em segundo lugar, da

adesão das pessoas que, por ela provocadas, modificam o seu

comportamento. Pergunta-se: é possível esperar que delinqüentes ajam dessa

forma? É possível imaginar que a polícia tenha capacidade de fiscalizar de

forma adequada o cumprimento de leis desse tipo?

A segunda objeção de Kopel está relacionada à falácia da supressão

dos mercados ilegais. Para corroborar sua opinião de que leis restritivas não

impedem o acesso dos criminosos às armas, ele cita uma pesquisa do National

Institute of Justice (EUA), realizada entre uma amostra de presos: 90% deles

declararam ser capazes de obter uma arma ilegal; muitos disseram ter

condições de fazê-lo em apenas algumas horas; três quartos dos homens

entrevistados disseram não haver “nenhum problema” ou “somente um

pequeno problema” para obter uma arma a despeito de eventuais barreiras

legais.

55

No mesmo sentido, o Professor de Stanford John Kaplan afirma que

“(...) no momento em que os cidadão de bem não puderem ter armas, somente

os bandidos terão armas” (Kopel, 1988). Ele lembra que, nos casos de

criminalização de comportamentos que as pessoas não consideram como

impróprios, as leis perdem o respeito da sociedade. É o caso das leis que

restringem o consumo de álcool, de maconha e de controle de armas. A

despeito delas, muitas pessoas desrespeitam-nas, uns porque são criminosos,

e outros porque acham que elas não se coadunam com seu comportamento,

gosto ou estilo de vida.

Independentemente do mérito da questão, pois o tipo de

comportamento social citado sempre envolve critérios subjetivos de avaliação,

não podemos deixar de reconhecer a lógica do argumento de Kaplan. No caso,

uma lei de desarmamento poderia criar dezenas de milhares de “foras da lei”,

na realidade cidadãos honestos que se recusam a entregar suas armas às

autoridades. Qual o poder que teria o Estado de forçá-los a adotar tal atitude?

Foi exatamente isso que ocorreu em Illinois e em Nova Iorque. Em Illinois, uma

pesquisa feita em 1979 mostrou que 73% dos proprietários de armas não

cumpriram a lei que as proibiu em seu território. Em Nova Iorque, o número de

armas que foram colocadas na ilegalidade é estimado em 2 milhões. Uma

reduzidíssima parte delas foi entregue às autoridades, não mais do que 10%.

O temor dos norte-americanos com as leis de regulação de armas de

fogo decorre dos múltiplos exemplos de criação de leis obrigando o registro de

armas e que, mais tarde, serviram para a prática de confisco. Foi o que

ocorreu, conforme lembra Kates, na Grécia, na Irlanda, na Jamaica e em

Washington. O mesmo ocorre com as leis que conferem às autoridades a

decisão de emitir a licença (licensing) para que o cidadão possa portar uma

arma. Kopel lembra pesquisas que revelam a oposição dos norte-americanos a

esse tipo de lei (69%), pois não concordam que a polícia decida quem pode e

quem não pode possuir uma arma. Segundo eles, esse tipo de lei favorece as

56

discriminações, como ocorreu, por exemplo, em Saint Louis, onde o direito de

porte é negado aos homossexuais, aos que não votam e às esposas sem

autorização de seus maridos. Outras polícias adotam critérios discricionários

com base em raça, sexo, filiação política ou ainda juízos subjetivos sobre

armas destinadas à caça. Em Nova Iorque, a polícia não concede licença para

motoristas de táxi a menos que eles carreguem U$ 2.000 em dinheiro vivo

(cash).

Na realidade, não se pode dizer que os estudos acima citados ou as

conclusões da pesquisa de John Lott conduzem à formulação de uma teoria

sobre a relação entre armas e crimes; ao contrário de certos estudiosos

brasileiros que acreditam na existência de uma relação causal entre os dois

fenômenos (Cano, 2002). Enquanto Lott faria o que se conhece como

“metodologia descritiva”, no Brasil os “anti-guns” buscam construir uma

“metodologia prescritiva”. Ou seja, a partir de suas conclusões para uma

determinada amostra, procuram estabelecer “leis” ou “comportamentos”

universais, válidos para qualquer situação. Na sua visão, para evitar que suas

“prescrições” se transformem em realidade, é preciso “proibir as armas”.

No Brasil, com freqüência, cometem-se erros grosseiros, como é o

caso do argumento de que as armas apreendidas pela polícia no Rio de

Janeiro são de procedência nacional e seriam, por isso, as mais utilizadas nos

crimes. A partir desse pressuposto, infere-se que o meio principal de

abastecimento de armas dos criminosos seria uma conexão entre o mercado

legal e o ilegal. Independentemente da qualidade questionável dos dados

(amostra aleatória, sem especificação dos critérios), existem vários erros

lógicos nessas conclusões.

Primeiro: não fica claro se as armas apreendidas estavam envolvidas

em crimes, ou se estavam apenas em situação irregular (falta de registro, porte

sem validade, etc.); segundo, se estavam em posse de criminosos e/ou

envolvidas em crimes, como foram parar em tais mãos? Os criminosos não as

57

teriam apropriado através de assaltos? Nesse caso, o próprio crime seria o

elemento de conexão entre o mercado legal e o ilegal, e não a simples posse

de uma arma legal. Finalmente, como podemos afirmar que existe uma

conexão de caráter geral – as armas apreendidas com histórico legal e o crime

– sobre uma base ínfima de apuração de crimes. E os crimes não apurados,

com que armas foram cometidos?

Mais grave, a teoria com base nesse tipo “amostra” não tem como ser

“falseada”, ou seja, testada através de uma comparação com um grupo

homogêneo de proprietários de armas legais, cujas armas não foram parar em

mãos de criminosos, uma vez que, no estudo de Cano, tal amostra e estratégia

de controle inexiste. Como é possível afirmar, então, que uma amostra com tais

características teria, num determinado tempo, o mesmo desfecho do observado

na amostra de armas apreendidas?

Sem o teste de “falseabilidade”, conforme ensina Popper, não existe

teoria científica. Como lembra Blaug, “(...) uma teoria científica somente é

testada quando um cientista especifica com antecedência as condições

observáveis que poderiam falsear a teoria”. Mais adiante, complementa: “(...)

se a teoria for bem-sucedida ao resistir à falsificação e se conseguir prever os

resultados com sucesso (...) será considerada altamente confirmada (...) ou

seja, como Popper prefere, ‘bem corroborada’” (Blaug, 1999). Nenhum desses

requisitos é observado no estudo de Cano acima citado.

Esse é apenas um exemplo das imprecisões presentes em muitas

pesquisas feitas no Brasil, que pecam invariavelmente pela ambigüidade e por

permitirem um amplo número de explicações alternativas, não raro conflitantes.

É basicamente por essa razão que, entre nós, esse debate tende a se

perpetuar sem a possibilidade de acordo entre as partes envolvidas. O que

pode-se esperar é que novas pesquisas sejam feitas e que maiores cuidados

sejam adotados, para evitar a construção de “teorias” com base em análise de

amostras restritas e indicadores de pouca confiabilidade.

58

Inglaterra

A Inglaterra é um dos países mais lembrados, pelos defensores do

desarmamento, como um exemplo de sucesso dessa política. Pelos críticos, é

citada como exemplo do fracasso do desarmamento. Afinal, quem está com a

razão? A experiência dos britânicos é positiva ou negativa?

Para analisar com isenção o resultado do desarmento civil na

Inglaterra, é preciso, em primeiro lugar, levar em conta que, historicamente, a

taxa de homicídios é baixa nesse país, uma das menores do mundo, em torno

de 1 ou 1,5 caso de homicídio por 100 mil habitantes. Ao contrário de outros

tipos de crimes, como assaltos e roubos, que vêm aumentando de forma

dramática nos últimos anos.

Ter em mente essa premisa é fundamental para que não se atribua

essa realidade histórica ao “desarmamento”. Os homicídios eram baixos antes

do desarmamento civil e continuaram baixos, como mostra, exaustivamente,

em seu livro Guns and Violence, a Historiadora Joyce Malcolmm.

Feito esse esclarecimento, podemos ir adiante e analisar a evolução

dos outros tipos de crimes.

Comparativamente, você corre maior risco de ser atacado na Inglaterra

do que nos Estados Unidos, onde existem mais armas nas mãos dos cidadãos

de bem. Essa situação vem sendo constatada há pelo menos uma década.

Coincidentemente, ao mesmo tempo em que as leis restritivas às armas de

fogo pelo Governo britânico entraram em vigor. Diversos trabalhos foram

elaborados para evidenciar o erro de desarmar a população.

Segundo o estudo da Professora da Universidade de Harvard Joyce

Lee Malcolmm “(...) os governantes criam cidadãos passivos e abandonados,

logo em seguida retira deles a possibilidade de se defenderem. Esta falha não

59

pode ser mais flagrante”. Segundo ela, em vários séculos de civilização, jamais

os homicídios com armas de fogo aumentaram tanto quanto no final do século

20.

Malcolm também faz comparações que nos fazem pensar sobre outros

aspectos dessa discussão. “Você sabia que a água é 19 vezes mais perigosa

para uma criança do que uma arma? Em 1996, 805 crianças morreram

acidentalmente afogadas e 42 morreram em acidentes envolvendo armas de

fogo”. Os acidentes de carro, segundo seus estudos, também são 57 vezes

mais perigosos para uma pessoa do que a simples presença das armas de

fogo.

Em comparação aos Estados Unidos, a acadêmica de Harvard não

poupa estatísticas. “Nos EUA, onde em mais de 50% das casa há armas,

apenas 13% dos ladrões agem quando os residentes estão em casa. Em

comparação, na Inglaterra, onde os cidadãos estão desarmados, 50% dos

ladrões entram nas casas enquanto os moradores estão dentro.”

Outro ponto crucial nesse debate diz respeito aos elementos que cada

pessoa dispõe quando parte para a discussão sobre esse delicado tema.

Fornecer essas “ferramentas” é o que se propõe o site Guns and Crime

(www.gunsandcrime.org). A justificativa dos idealizadoras do projeto é que,

sem informação, não há condições de um debate sério e competente. Veja-se,

abaixo, um trecho do conteúdo divulgado no site:

“Armas tornam mais fácil matar e ferir pessoas. Portanto, é óbvio que

para um observador desavisado, a redução de armas irá reduzir a

predominância de mortes e ferimentos. Entretanto, se a pessoa faz um esforço

para considerar todos os fatos relevantes sobre a questão das armas, as

coisas não são tão óbvias. E existem muitos fatos técnicos relacionados aos

custos e benefícios, como tantos outros, no que diz respeito ao porte de armas

pelos cidadãos.”

60

Contradições históricas

Ao longo da história, encontramos muitas evidências de que o controle

de armas não é nenhuma garantia para que os crimes diminuam. “Entre 1900

e 1930, o número de porte de armas permaneceu estável, e os assassinatos

diminuíram; entre 1937 e 1963, quando o número de portes aumentou em

250%, as ocorrências de homicídios caíram 35,7%; entre 1968 e 1985, os

portes aumentaram novamente em 250%, e os homicídios diminuíram em

cerca de 10%”, garante Sean Gabb, em artigo para a revista Free Life de

novembro de 1991. Para ele, “(...) nenhum estudo ou experiência comprova

que o livre acesso às armas e o aumento de crimes não estão

necessariamente relacionados”. Conclui que, no máximo, “(...) a lei pode

apenas controlar as armas que a polícia sabe que existem”.

61

Homicídos e estupros estão em ascensão na Grã-Bretanha, informou o

jornal The Sunday Times em 11 outubro de 1998, que divulgou o estudo em

uma manchete na primeira página. A reportagem diz que a Inglaterra pode ter

leis sobre armas mais severas, mas os EUA têm sentenças de prisão mais

rigorosas.

“É opinião corrente que o crime nos EUA é o maior do mundo,

enquanto a Inglaterra é um oásis de paz e tranqüilidade. Bem, essa opinião

está errada” disse o The Sunday Times em editorial. “Precisamos

urgentemente rever nossas premissas sobre lei e ordem”. Em 1995, por

exemplo, aconteceram 20 assaltos para cada 1.000 pessoas na Inglaterra e no

País de Gales contra apenas 8,8 nos Estados Unidos. O índice de roubos é

hoje 1,4 ve maior na Inglaterra e no País de Gales do que nos EUA e a taxa de

arrombamentos em residências é quase o dobro da norte-americana.

Por que a criminalidade caiu nos EUA?

Esse é um tema também muito controverso. No entanto, vários

especialistas concordam em apontar três fatores que desempenharam um

papel muito importante na redução da criminalidade do país. Eles dividem

esses fatores em dois grandes grupos: os contextuais e as políticas

adotadas.

No primeiro grupo, estão:

— transformações demográficas — as tendências demográficas

recentes aparecem como uma das explicações para a redução dos

crimes. A queda dos crimes estaria associada, ainda que parcialmente,

à diminuição da população entre 18 e 24 anos no conjunto da

população. Ao mesmo tempo, estaria também relacionada com o

crescimento do grupo formado por adultos e “sêniors” no conjunto da

população;

62

— cultura da droga — todos concordam que o crescimento do

mercado das drogas, primeiro a cocaína e depois o crack, teve um

papel relevante na disseminação de crimes violentos, especialmente

entre jovens e nas grandes cidades do país. Gangues envolvidas com

drogas resolviam suas desavenças — controle de mercados e

pagamentos — através da violência. O combate às gangues ligadas às

drogas, nas grandes cidades, pela polícia e a percepção de que as

drogas, especialmente o crack, impunha conseqüência devastadoras

para a saúde dos usuários, foram dois fatores fundamentais para o

controle da situação, contribuindo para a queda dos homicídios;

— mercado de trabalho — a melhora na situação econômica do país,

particularmente no mercado de trabalho, é apontada como uma das

causas da redução dos crimes, principalmente os crimes contra a

propriedade. O que teria influenciado as taxas de crimes seria a

melhora nos níveis salariais, tornando menos atrativo o engajamento

nos chamados “crimes economicamente motivados”. O Economista

Jeffrey Grogger, da Universidade da Califórnia, estima que a cada 10%

de incremento no salário real obtém-se uma redução de 10% nos

crimes economicamente motivados.

No segundo grupo, estão os fatores relacionados com as políticas

implementadas principalmente pela polícia e pela Justiça:

— mais prisões — desde 1980, a população prisional dos EUA mais

do que dobrou. Embora polêmica, especialmente devido ao alto custo

das prisões (U$ 40 bilhões/ano), a verdade é que a maioria dos

especialistas concorda que a detenção de criminosos tem um efeito

direto nas taxas de crimes. Richard Rosenfeld, da Universidade de

Missouri, calcula que um quarto da queda nos crimes violentos pode

ser atribuída ao fato de que há mais gente nas prisões;

63

— combate às armas ilegais — foi desenvolvido um grande esforço

envolvendo várias esferas de governo, a polícia e a própria

comunidade no sentido de combate à circulação de armas ilegais e

maior controle, mediante uma licença especial, dos dealers de armas.

Hoje, existem 35 estados norte-americanos onde vigoram leis que

permitem a propriedade e o porte de armas; isso não significa,

entretanto, que qualquer pessoa possa comprar ou portar uma arma.

Como vimos, em graus variados, vigoram nesses estados várias

exigências para a expedição do registro e do porte, tais como idade

mínima, inexistência de antecedentes criminais e treinamento teórico e

prático;

— mudanças na polícia — as mudanças nas polícias norte-

americanas talvez tenham sido a mais importante mudança nas

políticas de combate ao crime implementadas no país. Três mudanças

têm sido apontadas como fundamentais: o aumento do número de

policiais, estratégias mais agressivas e “policiamento comunitário”.

De um modo geral, concorda-se que estratégias mais agressivas, como

a Tolerância Zero ou Broken Windows, resultam na imposição mais severa de

sanções aos pequenos crimes, que, uma vez não combatidos, podem evoluir

para crimes mais graves. As estatísticas mostram que os crimes declinaram de

forma mais expressiva nas cidades que adotaram tal estratégia, e menos nas

demais. O exemplo mais notório dessa política é a Cidade de Nova Iorque,

onde, em 10 anos, os crimes violentos sofreram uma queda de 70%.

Uma outra estratégia largamente usada no país é o policiamento

comunitário. Ele consiste basicamente na aproximação e na integração da

polícia com a comunidade e na adoção da metodologia do Problem Solving,

ou seja, na orientação do trabalho dos policiais a partir das necessidades e dos

problemas da comunidade. A diminuição dos crimes, nesse caso, seria

resultado da construção de comunidades mais seguras e mais integradas.

64

Modernização

Juntamente com a adoção de novas práticas, conceitos e táticas, a

mudança na polícia norte-americana envolveu um amplo processo de

modernização tecnológica. Hoje, como informa o estudo Police Departments

in Large Cities 1990-2000, coordenado por Brian Reaves e Matthew Hicjman,

estatísticos do BJS, a quantidade de policiais que utilizam computadores no

trabalho de campo aumentou de 73% para 92% no país, durante a década. Os

sistemas de identificação digital, usados para identificar as pessoas durante

uma batida policial, por exemplo, alcançam hoje 97% dos departamentos de

polícia das cidades com mais de 250 mil habitantes.O atendimento de

emergência pelo 911, por sua vez, está disponível para 97% das áreas

cobertas por esses departamentos de polícia. A qualificação não ocorreu

apenas nos suportes tecnológicos, mas envolveu também programas e

medidas de estímulo à educação formal dos policiais. O resultado é que, em

2000, 37% dos policiais dessas cidades possuíam curso superior, contra

apenas 19% em 1990.

Informações sobre os crimes

Um dos principais aspectos das mudanças

implementadas no sistema de segurança nos Estados

Unidos, desde os anos 70, refere-se ao estudo dos

padrões e das tendências dos crimes. A produção de

informações detalhadas sobre os crimes e a análise do

comportamento da criminalidade têm sido uma poderosa

ferramenta no planejamento de ações e táticas

preventivas. O mais sofisticado desses sistemas é o

Compstat, da Cidade de Nova Iorque, onde as

informações sobre os delitos são atualizadas

65

praticamente todos os dias, permitindo um

acompanhamento quase em tempo real das tendências

dos delitos.

Nos EUA, todos os anos, são elaborados dois

grandes relatórios contendo informações sobre os crimes

cometidos no país.

O Uniform Crime Reports (UCR), do Federal

Bureau of Investigations (FBI). O UCR foi criado em 1929

e coleta informações reportadas à polícia, cobrindo um

amplo leque de crimes, dentre os quais homicídios,

roubos, assaltos com agravantes, furtos e roubos de

veículo. As agência policiais usadas como fonte das

informações incluidas no Relatório cobriam, em 1994, a

quase-totalidade da população norte-americana (96% do

total). As informações sobre os crimes são distribuídas

pelo total do país, estado, cidade e bairro, permitindo, a

partir dessa desagregação, a confecção de mapas de

crimes, através dos quais podem-se detectar tendências e

padrões. Recentemente, o UCR conta com o suporte de

um banco de dados, chamado de National Incident-Based

Reporting System (NIBRS), que fornece informações

detalhadas sobre 22 categorias diferentes de crimes.

Desde 1973, existe uma outra importante fonte de

informações sobre os delitos cometidos no país. Trata-se

da National Crime Victimization Survey (NCVS), uma

pesquisa de abrangência nacional realizada todos os

anos e que coleta, através de entrevistas, informações

detalhadas sobre a incidência dos crimes, como estupro,

violência sexual, roubos, assaltos graves ou simples (sem

66

violência), roubos em residências, furtos e furto de

veículos. A NCVS não faz levantamentos sobre

homicídios e commercial crimes, até porque, no caso dos

homicídios, este é um tipo de crime com pouca

subnotificação. O objetivo principal desse programa de

pesquisas de vitimização é detectar os delitos não

registrados na polícia e que, portanto, não são incluídos

nos relatórios provenientes da polícia. Duas vezes por

ano, são realizadas entrevistas em aproximadamente 45

mil residências, envolvendo um total de 160 mil

entrevistados com mais de 12 anos de idade. A NCVS é

um programa do Bureau of Justice Statistics (BJS). Na

Inglaterra, existe um programa similar denominado British

Crime Survey (BCS).

Com base nas estatísticas produzidas por esses

dois programas de abrangência nacional e

complementares, os analistas e pesquisadores têm

disponível uma série de dados que lher permitem

observar detalhadamente o comportamento das taxas dos

crimes, bem como suas principais características e

padrões. Os estudos produzidos com base nesses

documentos oficiais fornecem uma base mais sólida para

a formulação de políticas e estratégias preventivas.

O atraso brasileiro

No Brasil, infelizmente, a realidade é bastente diversa. Para se ter uma

idéia do nosso atraso em relação à coleta e a análise de informações, basta

lembrar que se estima que metade de nossas delegacias ainda não possuem

computadores instalados, e ainda não temos disponível nenhuma base de

67

dados que reúna todas as informações sobre os crimes cometidos no País. Os

dados informados pelo Ministério da Justiça, recolhidos nos estados, referem-

se apenas às capitais e são estruturados com base em metodologias e critérios

diferentes entre si, portanto, imprestáveis sequer para uma simples

comparação.

Se os dados provenientes da polícia são precários, as informações

provenientes das pesquisas de vitimização são igualmente problemáticos. As

únicas nove pesquisas de vitimização feitas no Brasil contemplam realidades

locais, regionais ou apenas se restringem a algumas capitais, onde a

criminalidade é, como se sabe, bastante diferenciada. O resultado é que não

temos ainda entre nós uma base de dados que nos permita analisar e

diagnosticar, com segurança, a real presença do crime na sociedade. Não

tendo esse quadro claro, é evidente que, em muitos casos, nos deixamos

influenciar por análises parciais ou incompletas.

Na ausência de análises com base em dados confiáveis, abre-se um

enorme espaço para o sensacionalismo e a demagogia. E, mais grave de tudo,

a polícia e as políticas públicas continuam a ser pensadas com base em dados

ruins ou na base do feeling da autoridade de plantão. Sequer temos condições

de avaliar a eficácia das poucas iniciativas adotadas na área. Apenas um

exemplo: nos últimos dois anos do Governo FHC foram gastos

aproximadamente R$ 1 bilhão de reais no sistema de segurança pública

através do Fundo Nacional de Segurança Pública. Qual são os resultados

concretos de tal política? Produziram melhorias nos indicadores de crimes ou

não?

Para encarar com realismo e eficácia a estruturação de políticas

consistentes de combate ao crime e melhoria das condições de segurança

pública no Brasil, é preciso começar por fazer corretamente o dever de casa:

criar um programa nacional de informações sobre os crimes, reunindo, num

sistema de abrangência nacional, tanto os crimes registrados na polícia como

68

os crimes relatados pela sociedade através de pesquisas de vitimização. Sem

um programa desse porte, os recursos públicos alocados na segurança pública

não poderão passar por uma avaliação criteriosa de custo/benefício, assim

como não poderemos analisar, com segurança, a eficácia das políticas públicas

nesse setor.

Falhas no sistema prisional

O sistema prisional brasileiro passa por uma situação dramática:

faltam vagas, tecnologia e recursos humanos adequados às necessidades de

segurança. Para os presos, as condições quanto à higiene, alimentação e

assistência médica são péssimas, motivo de freqüentes rebeliões e mortes

dentro das cadeias. Para qualquer padrão civilizado de aplicação da Justiça, é

necessário investimentos para oferecer um mínimo de condições para evitar

que a aplicação da pena de privação de liberdade seja transformada em tortura

permanente, ou que os presos fujam das prisões.

É equivocada a idéia de que temos uma superpopulação carcerária

porque no Brasil há muitos presos. A média de presos no País é 115 para cada

69

100 mil habitantes, uma taxa abaixo da do Chile (205/100 mil), do Uruguai

(190/100 mil) e do Reino Unido (125/100 mil). Nos Estados Unidos, essa

relação é de 680 presos para cada 100 mil habitantes.

O que falta no Brasil é uma política constante de investimento na

ampliação e na modernização das prisões.

Penas alternativas: solução mágica?

Sempre que debatemos a crise do sistema prisional, a idéia de aplicar

penas alternativas para crimes mais leves é proposta como solução mágica

para o problema. Mas a análise do público-alvo dessas penas mostra que sua

adoção dificilmente diminuiria a pressão sobre o sistema prisional.

Em São Paulo, por exemplo, que tem a maior população de presos do

País, apenas 13% da população carcerária (6.200 presos aproximadamente)

teria chance de ser contemplada. São os condenados por furto, estelionato,

porte ilegal de arma e uso de drogas. Muitos foram condenados por mais de

um crime ou usaram violência em suas ações criminosas – e isso os excluiria

dos benefícios das penas alternativas, restringindo ainda mais o número de

beneficiados pela medida. Segundo a Coordenadoria dos Estabelecimentos

Penitenciários de São Paulo, há 14.901 presos sem incidência penal

conhecida. Assim, pode-se supor que as penas alternativas teriam baixo

impacto na população carcerária.

“Somos todos reféns”

No dia 07 de fevereiro de 2001, a revista Veja publicou uma

reportagem especial intitulada Somos todos reféns, assinada pelos

Jornalistas Alexandre Secco e Sérgio Ruiz Luz. O tema central, a impunidade

no Brasil, é exemplificado através de casos de seqüestradores, homicidas,

traficantes e outros bandidos que estão soltos “em razão da inépcia da polícia e

da Justiça”.

70

“Se o risco de ser preso for alto, o bandido pensa duas vezes antes de

agir. Quando o risco é baixo, a audácia e a violência aumentam”, declarou aos

repórteres o Coronel Reformado da Polícia Militar de São Paulo José Vicente

da Silva Filho, um dos mais conceituados estudiosos brasileiros de temas

ligados à criminalidade. A conclusão é que, no País, as “operações” dos

bandidos têm sido altamente lucrativas.

O Quadro 1, mostra a diferença entre as taxas de solução de crimes

violentos no Brasil e nos Estados Unidos, fato que explicaria o por quê do

avanço da criminalidade nas grandes cidades brasileiras. Observe-se a

seguinte conta: para cada 100 crimes violentos cometidos, apenas um

criminoso ficará atrás das grades pelo tempo integral da pena. “Essa

impunidade estimula a delinqüência” admitiu, na época, o Ministro Celso de

Mello, do Supremo Tribunal Federal. “E o cidadão honesto fica perplexo e

indignado diante da indiferença do Estado, incapaz de punir os que transgridem

as leis.”

O Quadro 2, compara as sanções mais comuns para as infrações

praticadas no Brasil e nos Estados Unidos. Elas levam em conta os desvios de

conduta do cidadão comum.

71

Examinando a lista das punições efetivamente aplicadas nos dois

países, vê-se que ambas as leis prevêem sanções muito severas para essas

infrações, porém, na prática, as punições aplicadas são mais suaves nos EUA

e muito mais suaves ainda no Brasil.

Justiça Criminal

O Brasil necessita de uma ampla e profunda reforma do Judiciário,

para torná-lo mais ágil em suas decisões e um fator de redução da impunidade.

Pelo menos dois problemas têm influência negativa no desempenho da

Justiça Criminal. O primeiro deles: o Brasil é um dos campeões mundiais de

recursos judiciais. Das sentenças criminais de primeira instância em São Paulo,

por exemplo, 95% sofrem recursos a tribunais superiores. Recorrer de decisões

é um direito constitucional, mas o sistema brasileiro contribui para que os

recursos tornem o julgamento definitivo ainda mais demorado. O segundo,

mais grave, é a incapacidade do sistema de cumprir decisões judiciais e

prender criminosos condenados. Em São Paulo, 127 mil mandados de prisão

esperam cumprimento. Como o estado tem cerca de 100 mil presos nas

penitenciárias, distritos e “cadeiões”, há mais condenados na rua do que nas

prisões.

72

Buy-back – programas de recompra de armas funcionam?

Essa idéia não é nova. Contando com recursos federais de U$ 15

milhões ( quinze milhões de dólares), durante a Administração Clinton, foram

feitas várias experiências de buy-back em várias cidades, dentre as quais

Boston.

Uma avaliação feita pelo Professor e Criminologista David Kennedy, da

Universidade de Harvard, mostrou o fracasso do programa.

No total, foram recompradas apenas 21 mil armas, sendo que 75% do

total eram armas fabricadas antes de 1968, “(...) podendo ser

classificadas como peças de museu”.

Por causa de fracassos, é assim que o famoso criminologista Lawrence

Shermann classifica os programas de recompra de armas de fogo: “a maneira

menos eficiente de gastar dinheiro em segurança.”

Leia, a seguir, a notícia divulgada no The Boston Globe.

73

4 - TRÁFICO DE DROGAS E CRIMINALIDADE:

UMA ESTREITA RELAÇÃO

Um elemento decisivo no contexto e nos fatores que estimulam a

criminalidade reside na proliferação da distribuição e do consumo de drogas

ilícitas, principalmente da maconha e da cocaína, mais disseminadas no Brasil

do que outras drogas. Uma pesquisa recente do Governo Federal, feita através

de levantamento domiciliar, revela que 19,4% da população — o que significa

um em cada cinco brasileiros — já consumiu drogas psicotrópicas uma vez na

vida. São 32 milhões de pessoas. A pesquisa indicou que a maconha é a

terceira droga mais consumida no País, com 6,9%, perdendo apenas para o

álcool (68,7%) e o tabaco (41,2%). A cocaína foi usada por 2,3% dos

entrevistados (O Estado de S. Paulo, 20.06.2002). Uma reportagem da Agência

Reuters, em abril de 2001, chamou atenção para a situação de consumo de

cocaína no Brasil, estimando que o Brasil é o segundo maior consumidor do

produto no mundo, ficando atrás apenas dos Estados Unidos.

Vale lembrar que, há uma década, o Brasil era um mero ponto de

passagem da trilha da droga que ia dos Andes para os apartamentos de luxo

de Nova Iorque e Londres. Agora, tornou-se também um dos principais

consumidores. O tráfico transformou periferias e favelas em zonas de guerra,

corrompeu autoridades e destruiu famílias. No Rio de Janeiro, 80% dos presos

com menos de 23 anos eram ligados ao tráfico. Para estudiosos, um número

ainda maior morre em conseqüência desse conflito.

Há escassez de estudos no Brasil sobre a relação entre drogas e

criminalidade. Porém, com base na literatura internacional, especialmente nos

estudos realizados nos Estados Unidos, podemos dizer que essa relação é

íntima e que impõe elevados custos sociais nas relações de vizinhança e nas

comunidades, criando ambientes onde as atividades criminosas afetam

74

diretamente os não-usuários. As drogas ainda são responsáveis por acidentes

provocados por “overdoses”, acidentes de trânsito e pela baixa produtividade

dos trabalhadores usuários e pelo absenteísmo, pelo abuso e pela violência

doméstica contra crianças, dentre outros.

Estudos evidenciam relação

O número de homicídios envolvendo jovens delinqüentes e suas

experiências com drogas, atividades ilegais, gangues e armas ilegais foram

objeto de estudo de Henry Borwnstein, Professor da Universidade de Baltimore

e membro do Instituto de Desenvolvimento e Pesquisa Nacional de Nova York,

em conjunto com três pesquisadoras do mesmo Instituto (Susan M. Crimmins,

Judith A. Ryder e Raquel Marie Warley) e Barry J. Spunt, Acadêmico da John

Jay College, da City University of New York.

Baseado em 414 entrevistas com pessoas de idades que variaram de

12 a 21 anos, nos anos de 1995 e 1996, o estudo chegou a importantes

conclusões. Dentre elas, a de que 60% dos entrevistados envolvidos em

homicídios (83 jovens no total) estavam envolvidos com o tráfico de drogas;

78% dessa amostra bebiam freqüentemente, e 75% fumavam maconha. Entre

os envolvidos com roubos e assaltos, não foi diferente: das 260 pessoas que já

haviam praticado algum ou ambos delitos, cerca de 80% bebiam e entre 61% e

70% colaboravam para o tráfico de drogas.

Quando em grupos, 67% dos jovens homicidas ouvidos pelos

pesquisadores vendiam drogas em conjunto e 88% faziam uso das mesmas.

Entre os 115 assaltantes, 71%, paralelamente, comercializavam substâncias

ilícitas.

A pesquisa confirma, mais uma vez, a estreita relação entre drogas e

criminalidade, seja no Brasil, seja em Nova York, seja em qualquer outra parte

do mundo. Armas ilegais, no caso, funcionam apenas como instrumentos que

aumentam o sucesso de delitos, quando na mão de marginais.

75

Drogas estão por trás dos crimes contra jovens

Veja o que revela O Estado de S. Paulo (03.10.2002):

“Dezenas de casos envolvendo jovens são atendidos

todos os meses pela Terceira Equipe Especial de Investigações

de Crimes contra a Criança e o Adolescente do Departamento

de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) de São Paulo, que

engloba 29 delegacias da zona sul. A maioria é de homicídios

e, segundo o Delegado Paulo de Tarso Roggiero, cerca de

90% relacionam-se às drogas.” “O resto são casos de

vingança, ciúme, traição”, diz, destacando que a banalização

das armas faz com que “(...) se resolva com tiros o que

antigamente se resolvia no braço”.

O delegado revela que as mortes de jovens em São Paulo são

praticamente diárias, e há dias em que há três ou quatro assassinatos. “Tem

mês que temos 40, 50 casos. Parece relação de contabilidade” afirma. Ele

lembra que há um código moral paralelo ao Estado. “Como no mundo do crime

você não pode cobrar as dívidas ilegais na Justiça, você cobra com a vida.” O

drama aumenta levando-se em conta a conclusão da OMS de que, para cada

jovem morto pela violência, 20 a 40 têm ferimentos que requerem tratamento

hospitalar.

A solução para o problema, segundo de Roggiero, é dar mais

educação, emprego, lazer e perspectivas de vida para as pessoas,

principalmente as que vivem na periferia. O Promotor de Justiça da Infância e

da Juventude Wilson Tafner concorda com a necessidade de investimentos em

políticas públicas na periferia. “Números da Febem mostram que 21% dos

internos com endereço na capital vinham de cinco bairros da capital: Cidade

Ademar, Jardim Ângela, Jabaquara, Sapopemba e Itaquera, que estão entre os

que têm níveis de políticas públicas primárias mais baixos.”

76

Drogas, desagregação familiar e consumismo são outros fatores

citados pelo promotor como combustíveis para a delinqüência juvenil. “Há duas

circunstâncias muito flagrantes: a idade dos garotos assassinados está cada

vez mais baixa, assim como são cada vez menores as faixas etárias envolvidas

em atividades criminosas.”

Infanticídio

A violência contra crianças também assusta. Além das mortes, muitas

vezes nem sequer computadas, milhões delas são vítimas de abusos e

negligência, sem contar que mais de 130 milhões – 60% meninas – com idade

entre 6 e 11 anos, ainda não estão na escola.

Um exemplo é o caso de uma tentativa de infanticídio ocorrida em

Santo André, no mês passado. Logo após dar à luz, a mãe, de 16 anos, que

tinha escondido a gravidez, tentou afogar o bebê num vaso sanitário da

maternidade.

Segundo o Conselho Tutelar, os médicos só descobriram que a criança

ainda estava viva no necrotério, pois ela estava com hipotermia. A mãe

responde a inquérito policial e a recém-nascida está num abrigo, com seqüelas

causadas pela falta de oxigênio no cérebro.

A força do império das drogas

A explosão da criminalidade violenta no País segue a trajetória de

crescimento das operações do tráfico de drogas, da disputa por territórios e

pontos de venda e do uso da violência na disputa de poder entre as quadrilhas.

No entanto, apesar da insistência das denúncias, da eloqüência dos

números e da manifesta impotência do Estado para conter a escalada de

violência que acompanha a proliferação das drogas, somente agora é que o

Brasil parece ter acordado para a gravidade do problema.

77

Leia a seguir os principais trechos da reportagem especial da revista

Veja (28.04.2002):

— tráfico e mortes

“No fim dos anos 70, o Brasil só ouvia falar de

narcotráfico quando desviava o olhar para a vizinha Colômbia,

então sob o império dos cartéis das drogas. Nesse época, a

cada 24 horas treze pessoas eram mortas por arma de fogo no

Brasil. Hoje, entre o raiar do sol e as primeiras luzes do dia

seguinte, 85 pessoas são assassinadas a tiros. É possível

afirmar com segurança que sessenta dessas mortes estão, de

algum modo, associadas ao comércio de drogas, que

movimenta 400 bilhões de dólares no mundo, dos quais 15

bilhões no Brasil”;

— drogas e contrabando de armas

“Hoje, o Brasil é o maior importador mundial da cocaína

produzida na Bolívia e um dos pólos do contrabando de armas

fabricadas na China, Estados Unidos, Israel, Áustria, Bélgica e

outros países. Drogas, armas e o alto grau de letalidade

decorrente dessa equação têm feito a diferença nas

estatísticas de violência no Brasil”;

— mortes nas favelas

“A incidência de mortes intencionais nas favelas das

mais violentas capitais brasileiras é seis vezes maior que a de

outras regiões dessas cidades. Um dos grandes desafios do

combate ao tráfico é, por isso, cortar os canais de entrada de

drogas e armas no país”;

78

— armas de grosso calibre

“Ou seja, em doze anos, o índice de armamento ilegal

encontrado pelas polícias estaduais e pela Polícia Federal

aumentou 73 vezes”. “(...) Hoje, estima-se que, só nas favelas

do Rio, existam 47 mil armas em poder dos soldados do tráfico,

sendo que 30% — cerca de 14.000 — são fuzis, metralhadoras

e submetralhadoras, material mais que suficiente para

abastecer duas brigadas de exército”;

— reflexão

“(...) é unanimidade nacional a exigência de um

combate implacável ao crime organizado, que, como se viu, é

um dos mais importantes vetores da expansão do crime

violento no Brasil. Combatê-lo exige uma ação em várias

frentes: controle das fronteiras, na melhoria das leis penais, no

combate à lavagem de dinheiro, na apreensão de armas ilegais

e na identificação e prisão das quadrilhas do tráfico de drogas”.

A limitação do direito de porte de uma arma para o cidadão honesto e

de bem não terá efeito algum sobre o crime organizado. Apenas tornará esse

cidadão ainda mais vulnerável à ação dos criminosos. Como diz o ditado:

“Quando o cidadão de bem não tiver mais o direito de ter uma arma, apenas os

bandidos terão armas”.

A notícia a seguir, publicada em Zero Hora (24.06.2003), traduz

perfeitamente as raízes do problema no País. Na maioria das vezes, a iniciação

dos jovens no mundo das drogas ocorre na faixa dos 10 anos de idade, quando

deveriam estar estudando e em fase de formação de caráter. O que esperar

dessa geração?

79

“Usuário de entorpecentes é cada vez mais

jovem”

“De acordo com dados divulgados no dia 23 de

junho de 2003 pela Secretaria Nacional Antidrogas,

crianças começam a consumir entorpecentes por volta de

nove a 10 anos. Os especialistas também estão

alarmados com o consumo de bebidas alcóolicas.

“ ‘Antes, a nossa preocupação era com jovens de

16 a 21 anos. Hoje, infelizmente, crianças com 10 anos já

bebem’, disse a Presidente do Conselho de

Entorpecentes do Distrito Federal, Cândida Rosilda de

Melo Oliveira, durante evento que abriu a Semana

Nacional Antidrogas ontem no Palácio do Planalto.

“Dados da Escola Paulista de Medicina mostram

que 25% dos jovens brasileiros já experimentaram algum

tipo de droga. O problema tem mobilizado setores do

governo, como a Secretaria Nacional de Direitos

Humanos.

“O Secretário Nilmário Miranda defende medidas

inclusive contra as chamadas drogas lícitas, com controle

mais rígido sobre a propaganda nos meios de

comunicação. Para ele, é preciso deixar de associar

bebida a comportamentos positivos e sadios, como ocorre

nas atuais propagandas exibidas na TV.

“Nilmário Miranda explica que somente programas

de geração de renda, inclusão social e educação podem

contribuir para reduzir o número de usuários.

80

“De acordo com a Diretora de Prevenção e

Tratamento da Secretaria Antidrogas, Paulina Vieira,

dados comprovam que o consumo de drogas no Brasil,

em comparação com outros países, é relativamente baixo.

Mas, segundo ela, enquanto nos outros países o consumo

tende a baixar, no Brasil existe uma tendência de

crescimento e precocidade de consumo.

“O Chefe do Gabinete de Segurança Institucional

da Presidência da República, Ministro Jorge Armando

Félix, destacou o papel da família no combate ao

problema, tema da Semana Antidrogas (‘Quando a família

chega perto, a droga fica longe’).

“ ‘As famílias precisam vencer o preconceito e

buscar informação, evitar castigar e condenar e procurar

saber o nível de compromisso do filho com as drogas.

Depois, é preciso buscar especialistas’, disse Miranda.”

81

5 - MITOS SOBRE ARMAS DE FOGO

Mito 1: O cidadão não pode ter uma arma porque a segurança é

dever do Estado.

Desde a fundação do Estado Moderno, conforme lembra um de seus

principais teóricos e formuladores, o inglês John Locke, o homem delegou

poderes ao Estado, para, em seu nome, fazer as leis e zelar pelo seu

cumprimento. Desde então, com poucas exceções, vem se consolidando no

Ocidente a idéia de que cabe ao Estado promover a segurança dos cidadãos.

Ela é vista não apenas como um direito fundamental da cidadania, mas como

uma liberdade essencial ao desenvolvimento humano: a primeira das

liberdades, a de viver em paz.

Ao delegar ao Estado o poder para zelar pela segurança, entretanto, o

homem não o fez de forma absoluta. Tratou de preservar seu direito de legítima

defesa, porque o Estado, por razões várias, não lhe garante a plena segurança.

Por essa razão básica, ninguém discorda desse preceito filosófico e de Direito,

presente nas leis de praticamente todas as nações do planeta, inclusive no art.

5º da nossa Constituição Federal. O cidadão tem o direito de se defender, por

todos os meios, quando sua vida está ameaçada. Essa é a função essencial de

uma arma de fogo: um meio de defesa contra agressões externas e de

dissuadir a prática de ações criminosas.

Pode-se ainda evocar um argumento muito simples contra a falácia de

que todos os cidadãos devem entregar sua segurança pessoal exclusivamente

ao Estado. Hoje, é consenso entre os criminalistas que a polícia não consegue

sozinha nem prevenir nem mesmo apurar todos os crimes cometidos. Existem

estudos que questionam até mesmo a eficácia dos métodos tradicionais de

promover a segurança pública, como o patrulhamento das ruas, as respostas

82

dos chamados de emergência e as várias práticas de policiamento comunitário

(Bayley; David, 1994).

No Brasil, a polícia esclarece muito pouco dos crimes. Apenas 8% dos

homicídios e um índices ainda menor para os roubos e furtos. Grande parte

dos crimes sequer é notificado, conforme mostram as pesquisas de

vitimização. Nos Estados Unidos, 67% dos homicídios e 45% dos crimes mais

graves contra as pessoas são esclarecidos; na Inglaterra, 35%; no Canadá,

45% e na Austrália, 30% (Bayley; David, 1994).

Além de não conseguir prevenir os crimes, a polícia dos países

desenvolvidos, e de forma muito mais acentuada a polícia brasileira, não

consegue apurar os crimes cometidos.

Como é possível imaginar que a segurança da cidadania deve ser

entregue exclusivamente à polícia?

Na verdade, a comunidade vem sendo crescentemente incorporada

como agente ativo na construção de um ambiente mais seguro, através da

participação direta nos programas de policiamento comunitário, na adoção de

comportamentos defensivos e de redução de riscos, programas educativos

contra as drogas, etc. A participação dos cidadãos tem a finalidade de reforçar

e aumentar a capacidade de atuação da polícia e de prevenção dos crimes.

Quando se defende o direito de auto-proteção não se está,

obviamente, dizendo que as pessoas devem fazer justiça com as próprias

mãos, substituindo o papel das instituições e da lei. O que se prega é que em

situações extremas, nas quais a polícia e o Estado estão ausentes, a auto-

proteção é um direito inalienável do cidadão. Um direito natural, que nem

mesmo o Estado pode retirar-lhe.

83

Mito 2: As armas legais em posse de cidadãos de bem são a principal causa da criminalidade.

Atribuir às armas a causa da criminalidade é um grave erro. Os crimes

são praticados em conseqüência de decisões humanas. Decorrem de

desequilíbrios entre os fatores que incentivam um comportamento social de

respeito à lei e à ordem e os fatores que estimulam os delitos. Entre os últimos

estão a impunidade, a vulnerabilidade das populações urbanas que vivem nas

favelas e periferias, a disseminação das drogas, a falta de oportunidades de

emprego, baixos salários e mercado informal, a subcultura de consumo e o

reduzido capital social das comunidades pobres e abandonadas pelo poder

público. Essas são algumas das causas estruturais da criminalidade urbana no

Brasil.

Uma outra causa muito importante é a baixa eficácia do sistema de

Justiça Criminal formado pela polícia, pela Justiça e pelo sistema prisional.

Baixa eficácia significa fraca capacidade de prevenir, de apurar, de punir e de

manter os responsáveis pelos crimes detidos. A baixa eficácia dos agentes

responsáveis por zelar e fazer cumprir as leis é, seguramente, um dos mais

poderosos incentivos à prática de crimes no Brasil.

A arma é apenas um objeto, como é um automóvel. E não passa pela

cabeça de alguém culpar o automóvel pelos acidentes. Ou responsabilizar a

bebida porque pessoas abusam no consumo e colaboram para a ocorrência de

acidentes. Seria hipocrisia, para dizer o mínimo, advogar que para reduzir os

acidentes de trânsito, devêssemos proibir a fabricação de automóveis.

Aliás, no final dos anos 20, os Estados Unidos proibiram a bebida — a

Lei Seca — e o resultado foi o aumento do consumo, o contrabando e o

crescimento do crime organizado!

Imputar às armas de fogo a responsabilidade pelo aumento da

criminalidade no Brasil, além de implicar a supressão do direito fundamental da

legítima defesa, nos conduzirá ao caminho trágico da permissividade social,

84

onde as pessoas deixam de ser responsáveis por seus atos, que passam a ser

atribuídos a objetos inanimados, como se os mesmos tivessem o dom da ação

própria.

Mito 3: No Brasil, qualquer um pode comprar uma arma de fogo.

Não é verdade. Como vimos neste trabalho, o Brasil possui uma das

leis mais restritivas do mundo, a Lei nº 9.437, regulamentada pelo Decreto Lei

nº 2.222, que criou o Sistema Nacional de Armas e Munições.

Por essa lei, para obter o porte de uma arma de fogo o cidadão deve

comprovar idoneidade, através de certidões de antecedentes criminais

fornecidas pelas Justiças Federal, Estadual, Militar e Eleitoral; não pode estar

respondendo a inquérito policial ou a processo criminal por infrações penais

cometidas com violência, ameaça ou contra incolumidade pública; comprovar

comportamento social produtivo; comprovar efetiva necessidade, em razão de

atividades profissionais cuja natureza lhe exponha a risco; comprovar

capacidade técnica para manuseio de arma e aptidão psicológica atestadas por

instrutor da Polícia Federal ou Civil.

Antes de tudo isso, o pedido do registro será liminarmente negado,

caso o candidato tiver qualquer assentamento nos registros de ocorrências

policiais ou antecedentes criminais.

Por tudo isso, constitui desinformação ou leviandade afirmar que, em

nosso país, a venda legal ocorre sem controle rigoroso.

Mito 4: A venda de armas tem crescido de modo significativo, e isso tem gerado mais violência.

Na verdade, a venda legal de armas tem caído de forma significativa no

nosso país. De 1994 até 2002, a queda foi de aproximadamente 80%.

Enquanto isso, a taxa de homicídios tem crescido de forma continuada,

especialmente em São Paulo e no Rio de Janeiro, os estados mais violentos do

85

País, coincidentemente, os estados onde crescem também de forma dramática

a disseminação das drogas, a segregação urbana e a violência juvenil.

O Rio de Janeiro ostenta a vergonhosa taxa de ao redor de 50

homicídios por cada grupo de 100 mil habitantes e têm apenas 104 portes de

armas concedidos, isto mesmo, 104. Enquanto isso, no Rio Grande do Sul, que

têm uma das menores taxas de homicídios do Brasil, 13/100 mil habitantes,

tem mais de 40 mil portes concedidos.

Se a arma legal é o problema, como explicar a diferença entre as duas

realidades?

Os norte-americanos tem mais de 200 milhões de armas de fogo,

compram anualmente mais 2 milhões e possuem um das menores taxas de

homicídio do mundo, de 5,5 casos por cada 100 mil habitantes.

Como afirmar então que a arma é a causa da criminalidade?

Nessa questão, o que diferencia essencialmente o Brasil dos EUA é a

impunidade que grassa em nosso país.

Steven Levitt e Rodrigo Reis Soares, da Universidade de Harvard,

afirmam que:

“(...) em termos de instrumentos ao alcance das

autoridades, a falta de punição, corrente no atual sistema de

Justiça Criminal, é provavelmente o fator mais importante na

explicação do elevado nível de criminalidade no Brasil. A idéia

popular de que o criminoso comum não responde a incentivos

racionais, e, portanto, o efeito da punição sobre a criminalidade

é relativamente pequeno, é categoricamente falsa”.

Segundo os economistas, estudos feitos nos Estados Unidos mostram

que cada prisioneiro a mais no sistema leva à diminuição de 15 crimes sérios

86

ao ano, enquanto cada policial adicional elimina entre 20 e 30 crimes sérios. E

concluem que o criminoso reage à probabilidade da severidade do castigo. Mas

qual é a realidade do Brasil? Em São Paulo, por exemplo, apenas 1,7% dos

homicídios leva a alguma condenação. Os professores concluem que “(...)

praticamente toda a distância entre os níveis de criminalidade observados em

São Paulo e nos Estados Unidos pode ser explicada por diferenças no nível e

na probabilidade da punição”.

Mito 5: O Brasil é um país armado. Existem 20 milhões de armas de fogo no Brasil.

Existem hoje registrada no Sinarm aproximadamente 5 milhões de

armas legais. Essa é uma informação pública. Para obtê-la basta telefonar para

o órgão. Logo, a afirmação de que existem, no País, 20 milhões de armas ou é

uma estimativa, ou é um mero palpite. Se for uma estimativa, é preciso que

sejam apresentadas as bases de sua formulação, quais os números que a

sustentam.

A inconsistência desse número salta aos olhos. O Brasil possui hoje

cerca de 170 milhões de habitantes, aproximadamente 40 milhões de famílias.

Se tivéssemos um estoque de 20 milhões de armas, teríamos uma arma para

cada duas famílias, em média. Todavia pesquisas de vitimização realizadas em

São Paulo e em outras capitais mostram que a presença de armas não passa

de 6% (ILANUD-GSI –Presidência da República). O que resulta em número

muito distantes dos 20 milhões, citados pelos “desarmamentistas”.

Outro estudo, elaborado pelo Professor Martin Killias, que busca apurar

o ranking dos países com maior número de armas leves em circulação, coloca

o Brasil numa posição intermediária, atrás dos Estados Unidos, da Noruega, do

Canadá, da Finlândia, da França, da Nova Zelândia, da Austrália, da Bélgica,

da Suiça, da Itália, da Suécia e da Espanha. Todos esses países, com mais

armas, apresentavam, em 1993, taxas bem menores do que a brasileira.

87

Na realidade, nimguém pode dizer ao certo quantas armas ilegais

existem no Brasil. De qualquer forma, seja qual for o tamanho do mercado

ilegal, somente o controle do contrabando e a aplicação efetiva das leis no País

podem evitar que a presença das armas de fogo ilegais aumente.

Mito 6: Cerca da metade dos assassinatos são cometidos por pessoas sem antecedentes criminais; 90% dos homicídios são cometidos por pessoas de bem.

Essa frase, insistentemente repetida pelo Senador Renan Calheiros, é

uma acusação direta ao povo brasileiro. Por ela, o problema não são os

bandidos, os criminosos e os narcotraficantes, mas os homens de bem, que

cumprem as leis e que, em acessos de fúria, resolvem matar-se uns aos

outros.

Diz mais o Senador Calheiros: que a maior parte dos crimes de morte

são cometidos em brigas de bares e acidentes de trânsito por motivos fúteis.

Essa afirmação é uma agressão à inteligência, uma vez que todas as

evidências jornalísticas apontam uma dinâmica dos crimes violentos marcada

pela presença do banditismo urbano e pelo crime organizado das drogas.

Além do mais, o argumento não resiste a um simples questionamento

lógico: como explicar as diferenças entre as taxas de homicídios entre estados,

cidades, bairros e ruas? Não existem bares nos estados que apresentam

baixos índices de homicídios? Não ocorrem acidentes de trânsito nesses

lugares?

Um estudo recente, realizado com dados de homicídios ocorridos na

capital paulista, mostra que 76% dos homicídios são “planejados”, isto é,

premeditados e ocorrem entre “criminosos”. É a forma que o crime encontra

para acertar suas “desavenças”.

88

Outra pesquisa, feita pelo Professor José Pastore, da Universidade de

São Paulo, apurou que 82,6% dos crimes cometidos no estado foram

praticados por reincidentes. O mesmo estudo mostra que os crimes estão

tomando um caráter sofisticado e aperfeiçoado, pois, em cada 10 homicídios,

quatro são decorrentes de roubos a banco, e três por seqüestro ou de caráter

proposital.

Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, em 29 de março de

1999, o então Comandante da PM, Coronel Rui César Melo, já afirmava que

“(...) o Estado está refém de 200 mil bandidos” e que “(...) a polícia e a Justiça

sabem quem são essas pessoas, das quais apenas 70 mil estão presas”.

Como culpar os cidadãos de bem por essa realidade?

Mito 7: Os países que adotaram o “desarmamento civil” zeraram a

criminalidade.

O mito de que o “desarmamento civil” zerou a criminalidade onde foi

aplicado é um dos principais argumentos, repetidos à exaustão na mídia pelos

defensores dessa política, sem maiores questionamentos. Com ele, tenta-se

convencer a opinião pública de que retirar armas legais é medida fundamental

para reduzir a criminalidade.

Entretanto, quando deixamos de lado as intenções políticas e os

preconceitos e observamos a experiência concreta, a realidade é bem outra.

Vamos citar apenas três referências. A primeira delas, já referida neste estudo,

é o trabalho do Economista John Lott, que revelou a existência de taxas

menores de crimes nos estados norte-americanos que adotam leis menos

restritivas de porte de armas e taxas mais altas nos estados que adotam

restrições. Uma relação inversa entre armas e crimes.

A segunda referência importante é o estudo da Historiadora Joyce

Malcommem Guns and Violence. Ela mostra que, na Inglaterra, ao longo da

89

história, a criminalidade vem aumentando ao lado da adoção de crescentes

controles na venda e no porte de armas. Desde a década de 20 do século

passado, a trajetória do crime, salvo pequenas interregnos, é ascendente, em

paralelo à adoção de restrições, até a proibição da venda de armas em 1997.

Finalmente, a pá de cal veio com a revelação, publicada pela BBC, de

Londres, dos dados comparativos entre o biênio 1997-98 e 2001-02. No país

do desamamento civil, após a medida, os crimes com armas de fogo

cresceram de exatos 4.903 para 9.974. Ou seja, duplicaram.

O ex-policial Colin Greenwood, autor de um livro sobre o tema, disse

que o desarmamento “é irrelevante”. Segundo ele, a medida é “(...) tão

infeciente que o crime hoje atingiu o nível mais alto jamais atingido desde que

se começou a registrá-lo”. E conclui: “(...) o crime com armas de mão explodiu

desde que elas foram proibidas”.

Para o especialista, o Brasil vai “(...) perder tempo se aprovar leis mais

rígidas sobre armas”.

90

6 - ARTIGOS

Os artigos reproduzidos neste capítulo foram escritos e publicados em

vários veículos desde 1999. São uma pequena amostra da riqueza e

diversidade de argumentos evocados na defesa do direito dos cidadãos

honestos à auto-proteção.

No debate sobre o direito de acesso às armas de fogo legais envolve

um conjunto de temas correlatos, tais como o arcabouço institucional

regulatório, as dinâmicas e causas da criminalidade violenta e a crise do

sistema de segurança pública no Brasil. É natural, pois, que nesses artigos,

esses temas compareçam com assídua freqüência.

Através do artigo de Cathy Young, publicado originalmente no site

www.saloon.com, podemos ver que a demagogia e o exagero sobre o papel

das armas de fogo não é um privilégio do Brasil. Também nos EUA, certos

setores da mídia contribuem para amplificar o medo e o suposto mal

proveniente das armas, sem tratar com igual cuidado e destaque o pepelo que

exercem na dissuasão dos crimes.

O crime e o Senador

*Carlos Murgel

No dia último dia 29, o Jornal do Brasil publicou um longo artigo do

senador Renan Calheiros intitulado O perigo que nos ronda, para expor sua

posição sobre projeto-de-lei que trata do registro e porte de armas de fogo em

tramitação no Senado Federal. Com todo o respeito que merece o ilustre

senador e ex-ministro da Justiça, não podemos deixar de registrar nossa

91

discordância de seus argumentos e suas críticas à indústria brasileira de

armas.

Devemos, inicialmente, esclarecer que a indústria de armas, como os

demais segmentos sociais envolvidos, foi convidada oficialmente para

participar de audiências públicas no Senado Federal, que contaram inclusive

com a sua participação. Nestas ocasiões, manifestamos nossas posições com

absoluta clareza e transparência. Estamos participando ativamente do debate

público sobre este importante tema através dos jornais e publicações

especializadas, como é aliás nosso dever como cidadãos. Nessa atitude

participativa nada há que possa merecer qualquer censura, a não ser de quem

imagine seja possível fazer um debate democrático e produtivo sem a

controvérsia e a livre manifestação de todas as opiniões existentes. Ficamos

surpresos quando um eminente senador, de inegável formação democrática,

busque desqualificar uma opinião contrária à sua como ilegítima e viciada do

lobby.

Dito isto, vamos à essência de seus argumentos. O primeiro reparo diz

respeito à afirmação de que o “substitutivo liberalizante aprovado no Senado

representa “um retrocesso inaceitável” e que ele “regulariza 20 milhões de

armas ilegais”. Retrocesso em relação a quê? À lei atualmente em vigor ou ao

projeto-de-lei em tramitação cuja autoria é do ex-senador José Arruda? É

preciso lembrar que o Brasil já possui uma lei que regula o registro e o porte de

armas, aliás, uma das mais rigorosas do mundo. A lei 9.437, regulamentada

pelo decreto 2.222, ambos de 1977, estabelece criteriosamente várias e

severas exigências para a obtenção do registro e do porte. Quando

promulgada, ela previu um prazo de seis meses para que o proprietário de uma

arma não registrada fizesse o devido registro. Infelizmente esta lei não foi e

não está sendo aplicada como deveria, tendo o senador inclusive, enquanto

ministro, tido a oportunidade de assim fazê-lo e não o fez. O substitutivo

aprovado na Comissão de Relações Exteriores, ao contrário do que afirma o

92

ilustre senador Renan Calheiros, é bem mais severo, pois amplia as restrições

atuais através da proibição do porte.

Quanto à alegação de que o substitutivo do senador Pedro Piva vai

“legalizar 20 milhões de armas ilegais”, gostaríamos de indagar de onde o

senador Calheiros tirou este número, a nosso juízo, completamente irreal.

Basta lembrar de que em mais de 60 anos de existência, as duas maiores

fábricas de armas curtas do Brasil – Taurus e Rossi – produziram não mais do

que 5 milhões de armas destinadas às polícias estaduais, civis e militares, à

polícia federal e rodoviária, ao exército, às empresas de segurança privada e

aos cidadãos. De onde vieram então as outras 15 milhões de armas? Do

contrabando? Se isto é verdade, teríamos no Brasil uma família armada em

cada cinco, o que é um exagero que não encontra qualquer respaldo em

estudos ou estatísticas até hoje conhecidos. Além do mais, seja qual for o

número de armas ilegais, não entendemos como alguém possa defender que

elas não sejam legalizadas. O que se deseja então é mantê-las ilegais?

A exemplo deste número fantasioso, o senador Calheiros comete outro

grave deslize quando afirma, como fez na reunião da Comissão de Relações

Exteriores do Senado Federal, que anualmente morrem 3 milhões de pessoas

por arma de fogo, sem dizer que neste número, retirado de um estudo da ONU,

incluem-se como small arms, fuzis de assalto, metralhadoras, morteiros,

granadas de mão, armas anti-aéreas e anti-tanques e mísseis portáteis. A lei

que estamos debatendo nada tem a ver com este tipo de arma. Não é correto

induzir a opinião pública a imaginar que as armas curtas de calibre permitido

pela legislação em vigor em nosso país, sejam semelhantes às envolvidas em

conflitos e guerras de larga escala.

O senador voltou a repetir em seu artigo o argumento de que a arma

está na “raiz do crime sem causa”. A tentativa de colocar a arma legal como

sendo a principal causa da criminalidade no Brasil não resiste a um exame

mais acurado. Como explicar que o Rio Grande do Sul, onde tem-se o maior

93

número de portes de arma do país, 40 mil, detenha uma das menores taxas de

homicídio, 14 por 100 mil habitantes, enquanto o Rio de Janeiro tenha apenas

104 portes concedidos e uma das maiores taxas de homicídio do mundo, 47

por 100 mil habitantes? Quem mais mata no Rio de Janeiro e em São Paulo,

onde é mais grave o avanço da criminalidade violenta, é o crime e o banditismo

profissional, organizado em torno do núcleo propagador da violência formado

pelas quadrilhas de narcotraficantes. Tal é a gravidade da situação que a

revista Newsweek (28/05), revela que o volume de drogas apreendidas no

Brasil elevou-se de 10 milhões de gramas em 1995 para 170 milhões em 1999.

A revista informou ainda que “70 por cento da violência é creditada à posse ou

uso de drogas”. Estamos vivendo, em nosso país um dramático crescimento

das ações do narcotráfico, que já se fala em “colombianização” do Brasil. Uma

pesquisa, realizada durante o último Rock in Rio revelou o lado mais dramático

deste processo: 47 por cento dos jovens disseram ter experimentado algum

tipo de droga e 16 por cento admitiram já ter usado cocaína.

Mas, se o senador quiser ir além de nossas fronteiras, podemos citar o

exemplo dos EUA, onde os estados mais liberais com relação ao registro e

porte apresentam 23 por cento menos crimes do que os estados que praticam

restrições. Podemos também citar a Inglaterra, onde ao contrário do que afirma

o ilustre senador, temos uma indesmentível evidência da ineficácia do

desarmamento civil. O crime aumentou 80 por cento após o desarmamento.

Hoje a polícia inglesa voltou a utilizar armas e as autoridades estudam rever as

leis restritivas.

O problema da criminalidade no Brasil é grave e precisamos de

medidas firmes para combatê-lo. No entanto, não podemos confundir combate

ao crime com a extinção do direito de defesa da cidadania A vingar a proposta

do senador Calheiros teremos, em breve, duas classes de pessoas: os ricos

que poderão pagar pela segurança privada e os pobres e desarmados que

contarão apenas com a ação do estado para se defender dos criminosos.

Depois disso tudo, temos a obrigação de indagar: a quem interessa desarmar o

94

povo brasileiro? Aos que desejam a privatização da segurança? Aos que

desejam entronizar em nosso país as armas produzidas no exterior? Aos que

desejam tornar o cidadão dócil e receptivo á dominação totalitária?

*Carlos Murgel é Diretor-presidente da Forjas Taurus e Presidente da Associação Nacional de Armas e Munições-ANIAM.

Violência - Causas e soluções

Luiz Pazos*

Não existem povos violentos, mas sim entornos econômicos e jurídicos

que promovem ou inibem a violência. Entre os principais incentivos à violência

estão:

1 - Ausência de títulos de propriedade. É difícil fazer justiça quando não

se sabe quem é o dono.

2 - Políticas governamentais que expropriam e dividem a riqueza dos

que trabalham e produzem. Quando os governos são os primeiros a

violar a propriedade, os cidadãos seguem o exemplo.

3 - Doutrinas que justificam tirar a propriedade de quem possui muito.

Quando um sacerdote ou um político culpa aos ricos pela pobreza e

pede para dividir ou expropriar, se está promovendo e justificando a

violência. País nenhum tem reduzido a pobreza através de

expropriações de terras, de fábricas ou de dinheiro contra os ricos.

4.- Impunidade dos violentos. No Japão, 90% dos delinqüentes são

arrestados e julgados, e. obrigados a devolver o que roubaram. No

México são menos de 10%.

95

Sempre haverá violência. O objetivo deve ser sua redução para sua

mínima expressão. Para isso é necessário:

1 - Títulos de propriedade que permitam identificar o que é de cada um

e um governo que garanta o pouco dos pobres e o muito dos ricos.

2 - Punição dos delinqüentes. O mais importante não é que existam

penas altas, mas sim que sejam cumpridas. Os altos índices de

violência no México são uma conseqüência do alto grau de

impunidade.

3 - Direitos humanos das vítimas. As leis e os órgãos estatais devem

proteger os direitos humanos das vítimas, antes do que os dos

delinqüentes.

4 - Justiça rápida. Os governos se orgulham por propor uma justiça

gratuita. Falso, no México é oficialmente gratuita, mas se você quiser

uma justiça gratuita e rápida, muitas vezes será necessário dar

dinheiro aos funcionários.

5 - Reorientar os fins do Estado. Os governos devem reduzir sua

ingerência na economia e aumentá-la na prevenção do crime e na

administração da justiça. A pobreza diminui onde há paz, justiça e

respeito dos direitos de propriedade.

6 - Premiar o trabalho e a honestidade. A violência e a insegurança

aumentam quando é mais difícil ser honesto do que delinqüente.

Custa mais cumprir a lei do que violá-la.

7 - Facilitar a criação de empresas para criar mais opções de emprego.

A economia cresce quando tornar-se um empreendedor é dado a

todos. Deve gratificar mais criar riqueza do que tirá-la de outrem. Não

só a poupança e o investimento são fundamentais para o

crescimento, mas também o são a paz e a segurança. Se um

96

governo não garante o patrimônio de seus habitantes, não há

crescimento econômico.

* Professor de Economia Política no México.

Aniam contesta números do Iser e do Viva Rio publicados no O

Globo

A Associação Nacional das Indústrias de Armas e Munições (Aniam)

associa-se a todos os setores da sociedade brasileira que combatem o

contrabando, um dos mais graves problemas da economia ilegal. Cada produto

ilegalmente vendido no nosso país significa menos empregos e impostos.

A ação mais severa de nossas autoridades no combate ao

contrabando, à fraude, ao roubo de cargas e comércio ilegal, sem dúvida,

ajudaria a reduzir seus efeitos nocivos sobre a economia nacional. Neste

sentido, a matéria publicada no jornal O Globo no último domingo (18 de

novembro), sob o título “Efeito bumerangue alimenta violência na cidade”,

alerta para um aspecto importante: o contrabando, no caso, de armas e

munições.

Para esclarecer melhor a questão abordada na matéria – a exportação

de armas para o Paraguai, seu retorno ilegal para o Brasil e as taxas de

criminalidade no Rio de Janeiro – nos permitimos fazer as seguintes

observações sobre o conteúdo da reportagem e omissões que podem induzir o

leitor a uma compreensão equivocada da realidade:

1. A tese sustentada pela matéria, de que existe uma correlação entre

exportações de armas de fogo para o Paraguai e o aumento das

97

taxas de homicídios no Rio de Janeiro, não é verdadeira. E isto pode

ser comprovado ao observarmos com atenção os números

publicados: em 1995, segundo o jornal, a taxa de homicídios no Rio

de Janeiro era de 55 por 100 mil habitantes, ao mesmo tempo em

que as exportações para o Paraguai alcançaram a cifra de US$

2,740 mil (dois milhões e setecentos e quarenta mil dólares). Em

1995, a taxa de homicídios elevou-se para 59 por 100 mil habitantes,

uma elevação de apenas 7,2% na taxa, enquanto que as

exportações aumentaram aproximadamente cinco vezes, alcançando

US$ 9.460 (nove milhões e quatrocentos e sessenta mil dólares)!

Para que a tese seja verdadeira, o mesmo comportamento deveria ser

observado no período seguinte, de 1995 a 2000. No entanto, não é o que

ocorre: as exportações foram 90 vezes menores em 2000 do que em 1995,

enquanto que a taxa de homicídios caiu apenas 16%.

E o mais grave: entre 1998 e 2000, o valor das exportações caiu 13

vezes, reduzindo-se de US$ 1,407 mil (um milhão e quatrocentos e sete mil

dólares) para US$ 105 mil (cento e cinco mil dólares), sendo que a taxa de

homicídios permaneceu estacionada em 40 por 100 mil habitantes nos três

anos considerados.

Ora, como podemos levar a sério esta tese, se não existe um

comportamento padrão, ou no mínimo, relativamente uniforme entre as duas

variáveis consideradas – exportações para o Paraguai e taxa de homicídios no

Rio de Janeiro? Se alguma tendência existisse, essa regularidade não valeria

para os últimos três anos da amostra. Realmente, isso pode ser qualquer coisa,

menos seriedade e honestidade intelectual no tratamento da informação.

Além dos fatos acima citados, deve-se lembrar que a “tese” exposta

pela matéria desconsidera completamente outros fatores que sabidamente

interferem nas taxas de criminalidade, que já foram repetidas à exaustão:

98

efetividade da ação policial, impunidade, intensificação da ação do crime

organizado e do tráfico de drogas, deterioração e segregação social, etc.

2. A informação de que a indústria brasileira de armas exportou US$ 1

bilhão (um bilhão de dólares) entre 1989 e 2000, refere-se

provavelmente ao total das exportações, incluindo neste número as

vendas de tanques, foguetes e outros armamentos pesados, sem

relação com as armas leves e munições produzidas pela Taurus e

CBC, as duas empresas líderes destes segmentos e as mais

representativas em vendas para o exterior. A omissão é grave

porque dá ao leitor a falsa idéia de que a venda de armas curtas e

munições atingiu esta expressiva cifra.

3. A matéria deixa de informar que a Taurus e a CBC, as duas maiores

fabricantes de armas leves e de munições, respectivamente – por

decisão das próprias empresas – deixaram de exportar para o

comércio do Paraguai desde agosto de 1999. Atualmente, as vendas

para aquele país estão restritas aos órgãos governamentais.

4. Mas, afinal, cabe indagar: o que deseja o jornal O Globo com este

tipo de matéria que utiliza números contestáveis e contém graves

omissões? São duas as possibilidades, ambas graves: a primeira é

desviar a atenção para as armas legais, ao invés de focá-la nas

verdadeiras causas da criminalidade. Sabemos que os cidadãos que

compram armas legais não são os responsáveis pela altas taxas do

crime no Rio de Janeiro. Esta é uma inversão que transforma a

vítima em culpado e o verdadeiro culpado, o bandido, em inocente.

O segundo propósito é “requentar” o tema do desarmamento civil com o

objetivo de dar-lhe importância na agenda política nacional, no momento

em que assume o novo ministro da Justiça. O Congresso Nacional vem

dando demonstrações inequívocas de que esta tese não será acolhida,

porque os parlamentares, majoritariamente, não aceitam subtrair do

99

cidadão brasileiro honesto e cumpridor das leis o direito de exercer a

legítima defesa, direito esse consagrado na Constituição Federal e na

tradição jurídica do país.

5. Sobre a legislação estadual recentemente aprovada no Rio de

Janeiro, trata-se de mera cópia da Lei Federal, com o acréscimo de

exigências para o registro e porte. É mais uma lei inócua, porque

inconstitucional. A referida lei contém alguns dispositivos que beiram

ao ridículo, entre os quais “a exigência de que o interessado em

comprar uma arma apresente uma declaração de três vizinhos de

que ele tem boa conduta e ainda justifique a necessidade de possuir

uma arma”. Ou seja, quem vai dizer como você deve se defender é o

seu vizinho!

Essa carta foi enviada para a redação do jornal O Globo no dia 20/11/2002.

A mídia e o lobby do desarmamento

Por Raimundo Nicioli

O projeto de desarmamento civil levado adiante pelo Viva Rio, ISER,

Instituto Sou da Paz e determinadas lideranças políticas tem hoje penetração

cada vez maior dentro do imaginário da sociedade.Mas será que tal quadro

reflete a realidade das coisas? Será que as recentes campanhas dos

campeões do desarmamento espelham uma luta destemida contra o “terrível”

lobby das armas? Será prudente confiar nossa segurança em suas teorias,

disseminadas aos quatro ventos por jornais,rádios e televisões? Este pequeno

ensaio,que pretende explorar estas questões,manifesta perplexidades,e sem

querer dar a palavra final, visa dar partida a um sadio embate de idéias.

100

Antes de ir adiante porem, uma explicação : não se trata aqui de

converter outros ao gosto ou uso de armas, visto que muitos não tem por elas

atração alguma,mas sim alertar para a presença de manipuladores

profissionais que planejam fazer mudanças drásticas na sociedade sem o

devido aval; e não menos importante, para a maneira subreptícia como age a

imprensa em geral,alijando às sombras, e portanto para fora do quadro de

referência,dados que contrariam as teses desarmamentistas,modus operandi

notável também em outros tópicos freqüentemente ocupando as notícias,como

por exemplo o ambientalismo,o tratado de Kyoto e o aquecimento global.

O plano para o controle de armas leves (revólveres, pistolas,

espingardas e carabinas), small arms em inglês, que vem ganhando ímpeto

desde 1995 é fruto de um esforço conjunto da ONU, do governo japonês e do

governo canadense. A partir daí, organizações satélites como a UNESCO, o

ILANUD e a específica IANSA sediada em Londres vem fazendo continuados

esforços no sentido de promover o controle absoluto de armas leves no mundo.

Em atividade no Brasil temos representando a UNESCO o Sr. Jorge Werthein e

o ILANUD o Sr. Túlio Kahn. No Rio de Janeiro respondem pelo Viva Rio os Srs.

Rubem Cesar Fernandes e Antonio Rangel Bandeira, e pelo ISER o Sr. Ignacio

Cano. Em São Paulo pontifica o Instituto Sou da Paz do Sr. Denis Mizne. No

Brasil este projeto vem sendo cumprido à risca por estas entidades, que com o

concurso da mídia, tem conseguindo impor suas agendas e interpretações sem

oposição ou questionamento. Praticamente estas pessoas respondem pela

quase totalidade dos artigos escritos sobre o assunto na imprensa brasileira.

No campo político o Deputado Carlos Minc é um dos principais

defensores da idéia, e o sociólogo Luis Eduardo Soares representa mais do

que ninguém a mentalidade fortemente anti armas presente no meio

intelectual/universitário.

Mas uma contradição central se impõe: um projeto desta

magnitude,que visa extinguir a posse privada de armas de fogo por civis no

101

País,não deveria ser efetuado sem que antes fosse debatido profundamente

pela sociedade. E esta não tem condições para se posicionar com coerência

sem antes ter sido informada dos pormenores da questão, seus

desdobramentos e possíveis conseqüências. No Rio de Janeiro vigora já uma

lei do Deputado Carlos Minc que coloca, alem dos entraves burocráticos de

praxe, outros de natureza fiscal (taxas) e até social,como o insólito atestado de

boa conduta do proponente à compra de armas firmado por três vizinhos, lei

essa proposta, votada, aprovada e sancionada sem que nenhuma discussão

mais ampla tivesse ocorrido.

Concorre para o sucesso da empreitada, a recorrente manifestação de

“preocupação” com o bem estar das pessoas e a menção de determinadas

“estatísticas”,que os marqueteiros do desarmamento,rápidos qual um raio

sacam do bolso assim que avistam um microfone e uma camera,

transmutando-se no ato em “experts” a discorrer para incautos e crédulos

ouvintes sobre o perigo das armas,e estimulando-os ao mesmo tempo a se

desfazer delas, no que são providencialmente ajudados por um exército de

formadores de opinião, presentes nos mais variados setores de atividade —

jornais, programas de rádio, cadernos culturais,novelas,talk shows,

noticiários,programas de auditório e principalmente campanhas publicitárias

específicas, como a relativamente recente “Arma - ou ela ou eu “ da W Brasil,

estrelada por Fernanda Torres e Malu Mader.

Para um observador atento, tal unanimidade nelsonrodrigueana deveria

soar mal, motivar descrença ,indagações e criticas,mas tais manifestações

aparentemente são raras, se comparadas à avalanche de

editoriais,declarações e artigos pró-desarmamento. Por sua vez, a classe

intelectual nas universidades e demais instituições de ensino ao invés de

procurar analisar dados e fatos com isenção e objetividade científica, renega

seu papel esclarecedor e parte para a mais descarada propaganda anti-armas.

102

O que se vê hoje portanto é uma militância antiarmas trabalhando sob

orientação expressa de corporações burocráticas transnacionais,apoiada por

uma imprensa que, com raras exceções parece ter se esquecido de seu

papel,e um corpo intelectual que nada acrescenta de significativo.

Completando o quadro, para o cidadão que decida contribuir no affaire,

simplesmente não há canais de expressão disponíveis, à exceção de umas

poucas e editadas cartas que os jornais,de vez em quando consentem em

publicar.

O Viva Rio é uma das organizações integrantes do vasto cartel de

ONGs denominado IANSA - International Action Network on Small Arms, que

congrega mais de 150 organizações não governamentais trabalhando sob a

batuta da ONU, todas voltadas ao mesmo propósito,o controle( proibição) de

armas leves. É significante notar aqui a presença do admirável mundo novo, no

qual burocracias não eleitas passam a interferir na vida de milhões de pessoas,

sem que se possa responsabilizá-las pelas conseqüências de suas ações, pois

que se colocam fora de alcance, ao largo de qualquer controle possível.

Entrando na página da IANSA www.iansa.org pode-se verificar seus programas

e intenções e também notícias sobre as campanhas levadas a cabo aqui pelo

Viva Rio.

No trabalho de Rubem Cesar Fernandes “Urban Violence and Civic

Action- The Experience of Viva Rio” disponível na Web em PDF (em inglês) lê-

se à página 17 sob o título “Wide Visibility”: — “O Viva Rio seria impensável

sem a mídia. De 1994 a 1997 foram publicados milhares de artigos, uma média

de mais de três por dia. Diretores dos quatro maiores jornais do Rio de Janeiro

- A Gazeta Mercantil , O Dia , O Jornal do Brasil e O Globo fazem parte do

conselho administrativo da entidade. Um almoço mensal com os editores e

colunistas de várias representações da imprensa nacional e estrangeira

trabalhando no Rio de Janeiro, aproximadamente 25 pessoas, criaram o hábito

de discutir o background para os artigos que são assuntos de imprensa na

cidade (sic). Com este almoço, oferecido pelo dono de um restaurante que é

103

membro do Conselho, importantes personalidades são colocadas em contato

direto com os intermediários da imprensa, aqueles que escrevem as notícias

diárias. Assim, através de um processo de repetição, é criado um circuito

qualificado para o diálogo, o que, no final das contas estabelece uma certa

familiaridade interpretativa com as editorias de notícia”.

Não é de admirar portanto a evidência freqüente , para não dizer

permanente do Viva Rio na mídia .

Este relato, vindo de dentro da organização, deveria por si só fornecer

motivo mais do que suficiente para abalar a credibilidade do movimento, que

através uma facilitada e constante presença nos meios de comunicação é

capaz de bloquear criticas e arrefecer desconfianças. O processo natural de

expressão na imprensa livre, que é proporcionar à diferentes pessoas a chance

de manifestar diversos pontos de vista é substituído por outro,unanimista e

artificial, o que por sua vez cria perfeitas condições para o completo domínio

daqueles mesmos que a imprensa professa informar. Vez por outra aparece

uma carta ou artigo divergente, mas isto é estrategicamente calculado para dar

aparência de pluralismo ao processo, que na realidade se distingue por ser de

um dirigismo atroz. Poucas são as notas destoantes na sinfonia do

desarmamento e os exemplos podem ser encontrados em profusão.

Quinta feira, 9 de Julho de 2002 aproximadamente 22:15 h. A CBN

realizava uma entrevista com uma certa Sra. Jessica,do Viva Rio. Falava-se

sobre a cerimonia de destruição de armas que tinha tido lugar horas antes no

Palácio Guanabara.Um ancora extremamente gentil e solicito, que segundo

suas próprias palavras, fazia o papel de advogado do diabo, colocava a

entrevistada no melhor dos mundos,fazendo as perguntas certas para o seu

melhor desempenho. Evidentemente o que era para lhe ser perguntado não

foi, numa entrevista de quase 15 minutos de duração.

Sexta feira, 10 de Julho, dia seguinte ao exorcismo programado pela

ONU - O GLOBO funcionando com a precisão de uma máquina bem regulada

104

faz publicar o artigo “Destruindo Armas”,do Sr. Antônio Rangel Bandeira,

também do Viva Rio,discorrendo sobre o citado evento e procurando

substancia-lo com argumentações variadas. Em um dado momento porem,eis

que o articulista cai do cavalo ao comandar em seu auxílio ninguém menos do

que o Dr. Arthur Kellerman, autor de um dos trabalhos mais criticados sobre o

assunto nos Estados Unidos.

Os membros da classe acadêmica sabem que todo o trabalho científico

para ser considerado válido para publicação num jornal ou revista

especializada, tem de passar pelo processo de “peer review”, no qual outros

membros da comunidade científica avaliam a metodologia,as fontes e

estatísticas utilizadas.Neste caso, o Dr. Kellerman se recusou a fornecer as

credenciais solicitadas, mas seu trabalho, não revisto por seus pares da

comunidade científica foi mesmo assim publicado no New England Journal of

Medicine.Verificou-se depois, que era uma peça de propaganda anti-armas

travestida de monografia científica, o que deixou o CDC - Centers for Disease

Control, órgão governamental financiador do trabalho em maus lençóis, em

virtude do que a cessão de “grants” para trabalhos de engenharia social e

comportamental disfarçados de literatura médica foram suspensos pelo

congresso. Mas o Sr. A troca de correspondencias que se seguiu vai anexada

como um mini dossiê, para que se tenha idéia de quem “observa” a imprensa...

Na verdade, temos configurado aqui um verdadeiro estelionato. Uma

espécie de estelionato intelectual — Insiste-se em oferecer algo que não pode

ser garantido com certeza absoluta — a proteção policial, em troca da

desistência da auto defesa pela ausência forçada dos meios para concretiza-la,

e da supressão de informações que a provam possível, e segundo atestam

vários trabalhos de eminentes scholars americanos,eficaz em um grande

numero de casos.

Trabalhos que, ao contrário do do Dr. Kellerman são devidamente

“peer reviwed”, mas infelizmente tornados indisponíveis ao publico pela

105

omissão de nossa imprensa. Assim ,autores como Don Kates, John Lott, Daniel

Polsby e outros quedam suprimidos do horizonte visível.

Um exemplo mais recente é o livro da professora americana de História

do Bentley College, Massachussets, E. Unidos Joyce Lee Malcolm,”Guns and

Violence — The English Experience “ - Harvard University Press, onde é

descrita e analisada a situação na Inglaterra após o desarmamento.

Em função do desconhecimento destas obras é praticamente

impossível que o grande publico possa compreender o que se passa diante de

seus olhos. Na medida em que um vasto e complexo conglomerado de fatos e

números é substituído por outro de recorte simplificado,vemos então subir ao

pódio aqueles que de súbito ganharam o privilegio de disseminar suas

teorias,passando a representar a “verdade”.

Mais ainda, alia-se a isto algo mais sutil — a indução à baixa da guarda

defensiva pela confusão de duas situações ou conceitos diferentes: o da não

agressão,benéfico, salutar e em sintonia com valores civilizatorios mais

elevados, e o da submissão,negativo e potencialmente letal, o que deixa

inevitavelmente os proponentes do desarmamento civil completo bem perto da

divisa do moralmente condenável.

Em função do fato notório que, desde o início do período de influencia

dessas pessoas e organizações na segurança publica,a taxa de criminalidade e

a sensação de insegurança só fizeram aumentar, pergunto se não seria

plausível considera-las antes parte do problema do que da solução.

Para concluir, penso que a reversão deste quadro só será possível se

os políticos, intelectuais e organizadores das entidades envolvidas derem

passos objetivos no sentido de realmente dialogar com toda a sociedade num

cenário de absoluta transparência, no qual todos esses segmentos em conjunto

com a mídia em todas as suas expressões, fixem como meta a busca da

verdade, e acima de tudo que, sondando seus corações verifiquem se, diante

106

de tudo o que foi dito aqui, ainda se consideram moral e eticamente

respaldados para propor à sociedade mudanças tão radicais, com

conseqüências tão imprevisíveis quanto perigosas.

Publicado originalmente no site www.midiasemmascara.com.br.

“Impunidade é o principal problema”

“Bom Dia Brasil: O senhor é a favor de que o cidadão comum tenha

direito a portar uma arma?

Íris Rezende: A comissão não foi constituída para discutir um item,

mas para discutir uma política nacional de segurança pública, que envolve a

questão de armas. Muitas vezes voltamos nossa atenção para a questão das

armas e esquecemos o instrumento principal da segurança pública, que é o

policial. Este está esquecido, mal remunerado, sem condições de trabalho.

Podemos proibir armas, podemos aprovar leis e mais leis, mas nada adiantará

se não investirmos, com recursos dos governos federal, estadual e municipal,

no policial, para que ele tenha condições de trabalho e condições dignas de

vida. O policial hoje não tem condições de manter um filho na universidade.

Este homem, em determinado momento, desesperado, parte para a corrupção.

Bom Dia Brasil: Vai dar tempo de votar tudo antes que os

parlamentares saiam para as eleições?

Íris Rezende: Sim. Pela primeira vez, todas as lideranças do

Congresso se reuniram e criaram uma comissão para cuidar da segurança

pública. Foi um grande passo. Em 60 dias, essa comissão levará a apreciação

do Congresso, porque é constituída de profundos conhecedores do assunto.

Bom Dia Brasil: E existe uma urgência também, não é?

107

Íris Rezende: Essas propostas serão, sim, colocadas em regime de

urgência. Logo, elas serão aprovadas antes que outras matérias sejam

apreciadas pelo Congresso.

Bom Dia Brasil: Voltando à questão do controle de armas, o senhor é

a favor de que se mantenham armas em casa e do porte de armas?

Íris Rezende: Sou a favor que ser proíba a posse de armas por parte

de quem quer que seja, quando o estado conseguir desarmar o bandido. Não é

justo que se preocupe com o pai de família que tem uma arma em casa,

enquanto o bandido continua por aí desafiando o governo com armas muito

mais sofisticadas. Primeiramente, precisamos desarmar os bandidos e depois

se preocupar com quem tem uma arma em casa, e punir o pai que, por

negligência, deixa a arma ao alcance de crianças.

Bom Dia Brasil: O senhor tem arma?

Íris Rezende: Tenho, porque me sinto inseguro diante da fragilidade do

poder público ao oferecer a segurança ao cidadão hoje no Brasil. Mas nunca a

usei. Nem porte de arma eu tenho. O ladrão muitas vezes não entra na sua

casa por temer que ali haja uma arma. No dia em que desarmarem o bandido,

não haverá motivo para permitirem a posse de arma. Mas essa comissão vai

cuidar de tudo: de arma, contrabando, reformas de alguns itens do código

penal. A impunidade é a principal causa da criminalidade no Brasil.”

A entrevista com o senador Íris Rezende foi ao ar no programa “Bom Dia Brasil”, da emissora Rede Globo, em janeiro de 2002, época em

que estava sendo implantada a Comissão Especial para discutir a questão da segurança pública no Congresso Nacional. Íris presidiu a

comissão.

108

Quando os liberais mentem sobre armas

Cathy Young

O assassinato, a tiros, da pequena Kayla Rolland, de 6 anos, por um

colega da primeira série no distrito de Mount Morris, Michigan, em fevereiro de

2000, trouxe uma série de reclamações sobre o flagelo das armas, revivendo a

choradeira de “quantas crianças ainda precisam morrer?”. Na versão-padrão

que chega à mídia, o debate sobre as armas torna-se uma questão puramente

de moralidade. As forças do bem tentam proteger a nós, e especialmente às

crianças, de uma pestilência criada pelo homem, que cobra um cruel tributo de

nossa terra; as forças do mal exploram o caso atávico de amor que os

americanos têm com as armas, meramente por interesse político e/ou

monetário. Mas será que é assim tão simples?

Há poucas dúvidas de que o tão criticado lobby das armas tenha

adotado uma retórica extrema, se opondo a restrições sensíveis para a maioria

dos americanos (incluindo donos de armas), como prazos de espera e

verificações obrigatórias dos antecedentes de quem quer comprar armas. Mas

é igualmente verdadeiro que muitos membros das classes falantes sentem uma

aversão tão visceral pelas armas que estão inclinados a aceitar argumentos

duvidosos contra as armas e a descartar qualquer evidência de que, vire essa

boca pra lá, Charlton Heston [NT: o Moisés de “Os Dez Mandamentos” é um

dos mais ativos líderes da National Rifle Association] possa às vezes ter

alguma razão.

Apenas para registro, não faço parte da National Rifle Association e a

única arma que tive na vida era de brinquedo. Apesar de meu lado político

tender, geralmente, para o lado libertário, não compro o peixe que defende que

cidadãos armados são uma salvaguarda contra governos tirânicos. Nem tenho

problemas com algumas das leis sobre armas defendidas pelo presidente

Clinton.

109

Certamente parece fazer sentido querer fechar as brechas que

permitem que os compradores que vão a mostras de armas escapem de ter

seus antecedentes verificados. Obrigar os fabricantes de armas a colocar

travas para segurança de crianças nos gatilhos de novas armas pode ser uma

boa idéia (dependendo de quanto essas travas possam atrapalhar um adulto se

for necessário usar a arma para auto-defesa em uma situação de emergência),

apesar de não resolver o problema dos milhões de armas mais antigas que já

existem. Mas é claro que o movimento anti-armas vai muito além da defesa

dessas medidas tão modestas, e muitas vezes coloca a histeria e a vontade de

impor sua razão no lugar de uma discussão séria e razoável.

Dito assim, parece que ninguém em seu perfeito juízo poderia

questionar o massacre causado pelas armas nos EUA e que nenhuma

sociedade em seu perfeito juízo poderia tolerá-lo. Em 1997, houve 21.259

mortes causadas por pistolas e 11.177 mortes com outras armas de fogo nos

Estados Unidos; as taxas de homicídios por aqui são entre três e 12 vezes

maiores do que em países industrializados que aplicam controles severos às

armas. Caso encerrado? Nem tanto.

Considere, por exemplo, o fato de que nossas taxas de homicídios sem

armas são maiores que as taxas de homicídio em muitas nações. Em 1990, a

taxa de assassinatos e de homicídios culposos nos EUA foi de 9,3 mortes a

cada 100 mil habitantes, e as armas de fogo foram usadas em algo como dois

terços dessas mortes. Mesmo se tivéssemos de alguma forma nos livrado não

só das pistolas, mas de todas as armas de fogo, e mesmo que,

improvavelmente, nenhum dos assassinos que usaram armas de fogo tivesse

usado outro tipo de instrumento, ainda assim teríamos 3,1 assassinatos para

cada 100 mil habitantes –maior que a taxa de homicídios naquele ano no

Canadá (2,1 por 100 mil), na Suécia (1,4) ou no Japão (0,5). Obviamente, há

algo errado além do acesso às armas. Além disso, mais de três quartos dos

crimes violentos que não o homicídio nos EUA são cometidos sem armas de

fogo.

110

Considere, também, países onde as armas são comuns e o crime é

raro. Os gurus anti-armas costumam ignorar a Suíça, que ostenta a população

mais pesadamente armada do mundo, bem como uma cultura florescente de

armas (campeonatos de tiro para crianças entre 12 e 16 anos de idade são por

lá uma tradição popular) e uma das menores taxas de crime no mundo inteiro.

Em 1997, a Suíça teve 1,2 assassinatos para cada 100 mil habitantes –quase o

mesmo que a Grã-Bretanha, muitas vezes incensada como um caso de

sucesso no controle de armas. Israel, onde a maior parte dos adultos ou está

em serviço militar ativo ou está na reserva, e onde quase todas as casas têm

armas, também tem uma taxa baixa de assassinatos [NT: fora de tempos de

guerra; o artigo foi escrito antes da atual Intifada, iniciada no final de 2000] ,

parelha com as da maior parte da Europa Ocidental.

Mas isso não é tudo. Mais da metade das mortes com armas de fogo

nos EUA (coisa de 55%, segundo as últimas estatísticas) não é homicídio, mas

suicídio. Então, por isso, não precisamos nos preocupar se as pessoas

meramente atiram em si próprias ao invés de atirar nos outros? Não é isso.

Mas, neste caso, culpar as armas pelas mortes é algo especialmente dúbio.

Curiosamente, quando se fala em suicídios, não vemos muitas comparações

com todos aqueles países que tão sabiamente mantêm as armas fora das

mãos dos habitantes –talvez porque os EUA, loucos por armas, não

apareceriam assim tão mal na comparação. Em 1996, a taxa de suicídios por

100 mil habitantes era de 11,8 nos EUA, 13,4 no Canadá, 17,9 no Japão, 20,9

na França e 25 na Finlândia.

A bobagem em que muita gente inteligente afunda quando fala sobre

armas é resumida em um relato recente publicado no New England Journal of

Medicine, que liga a compra de armas ao risco elevado de suicídio. Na primeira

semana após a compra, descobriu o estudo, compradores de armas atiraram

em si próprios a 57 vezes a taxa da população em geral.

111

“Essas descobertas são horripilantes, e devem levar mesmo os mais

ardentes inimigos do controle de armas a pensar duas vezes”, pregou o

Minneapolis Star-Tribune. Queria saber como é que os editores e

pesquisadores pensam que funciona a relação de causa-efeito: o sujeito sai,

compra uma arma, e daí uns dias depois ele se chateia com alguma coisa e

mete uma bala na cabeça? Não precisa ser formado em medicina, nem em

jornalismo, para descobrir que a maior parte dessas pessoas provavelmente

compra uma arma porque já pretende se matar. Claro, pode-se argumentar que

a disponibilidade de poder de fogo dá meios perigosamente convenientes para

autodestruição, mas como se pode ver pelas comparações com outros países,

a falta de acesso não é impedimento.

Então vem a demagogia sobre as crianças, para a qual a morte sem

sentido de Kayla deu amplas oportunidades. “Armas de fogo mataram 4.223

crianças americanas com menos de 19 anos em 1997”, escreveu Clarence

Page no Chicago Tribune, esquecendo de mencionar que menos de 700

dessas vítimas eram menores de 17 anos. Claro que o número ainda é trágico

–apesar de ser tão trágico quanto saber que, no mesmo ano, cerca de 700

outras crianças foram massacrados com facas, objetos sem ponta ou mesmo

com as mãos, enquanto mais de 2.000 crianças com menos de 15 anos

morreram em batidas de automóvel e quase 1.000 se afogaram. E, claro, não

devemos ser indiferentes ao assassinato ou suicídio entre adolescentes mais

velhos. Mas por que tentar igualar tiroteios entre membros de gangue com 18

anos de idade ao assassinato de uma criança de 6 anos?

Apesar de as declarações exageradas sobre os males das armas

serem tratadas com respeito, a mesma atenção não é dispensada aos

incômodos fatos que sugerem que o argumento das armas como um meio de

autodefesa e prevenção de crimes pode ser mais do que um mito da NRA.

John R. Lott, economista e pesquisador-sênior da Escola de Direito de Yale,

publicou estudos segundo os quais as leis estaduais que deixam cidadãos sem

registro criminal obterem licença velada levam a menores taxas de crimes

112

violentos –inclusive assassinato. [NT: a pesquisa foi publicada no Brasil no livro

“Mais armas, menos crimes? – Entendendo o Crime e as Leis de Controle de

Armas de Fogo” –Makron Books, 1999]

A pesquisa de Lott pode ter falhas, mas seus críticos ainda estão por

apontá-las; ao invés disso, eles recorrem a ataques ad hominem, focalizados

nas bolsas que Lott recebeu de fundações ligadas à direita política e a falsas

insinuações de laços financeiros com fabricantes de armas. A maior parte da

mídia comercial e dos gurus do assunto, enquanto isso, simplesmente ignora

Lott e zomba da idéia de que armas podem ter benefícios.

Os defensores do controle de armas afirmam que mais de 2% dos

homicídios usando armas são em defesa própria, e citam estudos que

pretendem mostrar que ter uma arma em casa é mais perigoso para o dono do

que para o intruso. Os que apóiam o direito de ter armas respondem que esses

estudos omitem casos em que um civil impede um crime, e talvez escapa da

morte ou de ferimentos graves, atirando para cima ou meramente sacando uma

arma (certamente, seria um pouco cruel exigir um bandido morto como prova

de efetiva proteção pessoal). As estimativas sobre a freqüência de tais

incidentes variam muito, entre 84 mil e 3,6 milhões por ano. Obviamente, os

grupos pró-armas preferem os números maiores, e suas declarações merecem

ser tratadas com cautela. Mas o outro lado deve ser tratado da mesma forma.

Lott afirma que o viés anti-armas faz com que a mídia subvalorize

evidências dramáticas de que as armas podem salvar vidas. Seu exemplo mais

surpreendente vem, dentre todos os possíveis, de duas das ondas de tiroteios

em escolas de segundo grau nos últimos anos. Em Pearl, Missouri, e em

Edinboro, Pennsylvannia, cidadãos armados –o diretor assistente Joel Myrick e

o dono de restaurante James Strand– desarmaram os atiradores apontando a

arma para eles antes que a polícia chegasse; ainda assim, as poucas

reportagens que mencionaram seu papel normalmente deixavam de mencionar

113

seu uso de armas, dizendo simplesmente que eles “subjugaram” os atacantes

ou os “persuadiram” a se render.

Pode-se achar que dar crédito às armas por salvar vidas nesses casos

é como recompensar um incendiário por ajudar a apagar o fogo. Afinal, se não

fosse pelas armas, não haveria tiroteios e nem necessidade para o heroísmo

de Myrick e Strand. Mas esse tipo de resposta presume que podemos chegar a

uma situação em que não haja mais armas.

Vamos supor que uma proibição completa das armas de fogo,

defendida por alguns grupos de controle das armas como o Violence Policy

Center, tenha chance de ser aprovada. Atualmente, ela tem virtualmente

nenhum apoio político e sofre a oposição de uma sólida maioria do público em

pesquisas de opinião, mas vamos imaginar que uma onda de sérios crimes à

mão armada mude o debate político. O que ocorreria com as 65 milhões de

armas que os americanos já têm? Alguns donos de armas respeitadores da lei

iriam, sem dúvida, entregar as suas, mas muitos ou a maioria não iriam. Os

defensores da proibição das armas apoiariam, então, batidas de casa em casa

para confiscar armas de cidadãos que não quisessem entregá-las? Mesmo

muitos dos que são contra as armas teriam calafrios com a idéia.

Além disso, a sociedade americana não é muito boa nessa história de

manter seus habitantes longe de coisas ilegais. Pense na proibição das drogas.

A proibição das armas pode acabar sendo ainda mais difícil de cumprir, já que

grande parte da população seria filosoficamente contra ela. Uma Guerra às

Armas provavelmente seria um desastre de liberdades civis como a Guerra às

Drogas, sem ser muito mais eficiente.

Alguém duvida que, numa era em que os adolescentes podem

encontrar instruções detalhadas na internet sobre como fazer bombas, a

fabricação subterrânea de armas rapidamente surgiria? Ou que alguns oficiais

de polícia e militares ficariam tentados a vender suas armas no mercado

negro? Ou que parte das outras 130 milhões de armas de propriedade privada

114

iam passar a ser procuradas? Ou que os mesmos cidadãos em cujas mãos as

armas são mais perigosas iam muito provavelmente ignorar a proibição?

Slogans da NRA como “Armas não matam pessoas, pessoas matam

pessoas” e “Se as armas forem proibidas por lei, só os foras-da-lei terão

armas” podem ser vistos como piada, mas há alguma verdade neles também –

como a tragédia da morte de Kayla Rolland deve nos lembrar. O menino que

atirou em Kayla, como sabemos, havia sido jogado por sua mãe, uma usuária

de drogas, em uma pensão onde armas eram rotineiramente trocadas por

drogas. Sendo uma criança raivosa e negligenciada, ele havia antes

apunhalado outro coleguinha com um lápis. (Quem pode dizer que Kayla

poderia estar viva se ele tivesse achado um canivete em casa, em vez de uma

arma roubada?) Apesar das leis draconianas sobre drogas, a casa onde o

menino vivia estava inundada de drogas ilegais. Não vejo nenhuma razão para

acreditar que alguma lei sobre armas impediria as armas ilegais.

Sem minimizar o horror de cada morte violenta, é útil lembrar que as

fatalidades com armas de fogo têm em geral caído rapidamente, apesar de o

noticiário alimentar a percepção de uma crise cada vez mais grave. Essa

queda pode ter ocorrido em parte por causa das leis mais severas sobre

armas, como as verificações de antecedentes que evitaram que milhares de

criminosos condenados comprassem armas – apesar de isso provavelmente

ter tido muito mais a ver com o declínio geral na ocorrência de crimes violentos.

Algumas novas medidas, particularmente as relacionadas à segurança

das armas, podem salvar mais vidas. Mas essas medidas devem ser

abordadas com humildade, sem nenhuma ilusão de que podemos resolver o

problema da violência nos EUA só com a vontade de agir em conjunto contra

as armas – e sem demonizar as armas de fogo ou seus donos.

Originalmente publicado em 13 de março de 2000. Tradução: Marcelo Soares

115

NT: O termo liberal possui, nos Estados Unidos, um significado político diferente daquele normalmente utilizado no Brasil. Naquele país, os liberais são, em geral, identificados com o pensamento dos democratas e com uma visão alinhada à esquerda do espectro político.

Nossa luta por um direito básico

Luis Afonso dos Santos

Quem não é dado ao exercício da futurologia, dificilmente poderia

imaginar, digamos, em 1994, que estaríamos hoje numa encarniçada luta pela

preservação do elementar direito de podermos possuir e portar uma arma para

nos defender e à nossa família. Pode parecer um pesadelo, mas é a crua

realidade que os cidadãos brasileiros enfrentam no governo FHC.

Sob o pretexto de um utópico “monopólio da violência” pelo Estado e

de uma delirante “cultura da paz”, estamos sob a permanente ameaça da

cassação de um direito que é garantido milenarmente aos seres humanos, pelo

simples fato de ser algo natural e inerente a todas as espécies animais, o

instinto de autopreservação, e isso ocorre, paradoxalmente, no momento em

que o pretenso monopólio da violência no país está sendo assumido, não pelo

Estado legal, mas pelo banditismo desenfreado que nos ataca em cada

esquina. “...as leis que proíbem o porte de armas, (...) apenas desarmam o

cidadão pacifico, enquanto que deixam a arma nas mãos do criminoso, muito

habituado a violar as convenções mais sacras para respeitar aquelas que são

somente arbitrárias.

”A proibição da posse e do porte de armas de fogo por cidadãos é algo

que se insere no campo das leis tirânicas de Estados absolutistas e

coletivistas, nos quais os direitos e as liberdades individuais contam pouco ou

nada. A disposição de governantes autoritários para a proibição de armas

ressurge de quando em quando, conforme preocupação demonstrada já em

1794 pelo grande filósofo do Direito, Cesare Beccaria, no clássico Dos Delitos

e das Penas. O raciocínio do filósofo é o mesmo que o de qualquer cidadão

116

brasileiro aturdido como o disparate oficial: “as leis que proíbem o porte de

armas, (...) apenas desarmam o cidadão pacifico, enquanto que deixam a arma

nas mãos do criminoso, muito habituado a violar as convenções mais sacras

para respeitar aquelas que são somente arbitrárias”.

Usando como cenário a insegurança da população, causada,

ironicamente, por sua própria inércia, o Governo preparou o terreno para a

proibição da venda e para o confisco, através de um marketing elaborado de

modo que a brutal violência contra os direitos individuais fosse entendida pela

opinião pública como benévola, e alicerçou sua propaganda em duas mentiras

básicas: 1) a desqualificação das armas como instrumento de defesa, pela

afirmação de que o cidadão não sabe usa-las e 2) a desqualificação da

cidadania, acusando, de forma torpe e injuriosa, o cidadão, e não o bandido,

como o responsável pela grande maioria dos homicídios cometidos no país”.

Nos EUA, onde há cerca de 7,6 armas por cada 10 habitantes e, a

partir de 87, em 32 dos 50 estados norte-americanos, adotou-se o porte não

discricionário, estimulando o cidadão a portar armas nas ruas, houve uma

redução dos homicídios pela metade, em oposição, na Inglaterra, onde as

armas da população foram banidas em 96, através da proibição da posse, do

porte e ainda pela compra pelo governo do arsenal em poder da população

(200.000 armas), existem atualmente, cerca de três milhões de armas

clandestinas, fazendo com que pela primeira vez neste século, em virtude do

aumento da criminalidade e dos ataques armados, o patrulhamento a pé

passasse a ser feito por policiais armados em diversas cidades inglesas”.

Para desmenti-lo existem dois exemplos externos, diametralmente

opostos, os EUA e a Inglaterra. No primeiro país, onde há cerca de 7,6 armas

por cada 10 habitantes e, a partir de 87, em 32 dos 50 estados norte-

americanos, adotou-se o porte não discricionário, estimulando o cidadão a

portar armas nas ruas, houve uma redução dos homicídios pela metade, em

oposição, na Inglaterra, onde as armas da população foram banidas em 96,

117

através da proibição da posse, do porte e ainda pela compra pelo governo do

arsenal em poder da população (200.000 armas), existem atualmente, cerca de

três milhões de armas clandestinas, fazendo com que pela primeira vez neste

século, em virtude do aumento da criminalidade e dos ataques armados, o

patrulhamento a pé passasse a ser feito por policiais armados em diversas

cidades inglesas.

Estes dois exemplos, mais o do Estado de São Paulo, onde a emissão

de portes de armas caiu de 69 mil em 94 para cerca de 1.000 em 99,

corroboram não somente tese tricentenária de Cesare Beccaria, de que a

proibição do porte só é respeitada por quem não comete crimes, como a mais

recente, de John Lott, “Mais armas, menos crimes” (sem a interrogação

“politicamente correta” da edição brasileira).

Posse e porte de arma

Marcos Coimbra

Mais uma cerimônia de cunho fascista foi realizada no Aterro do

Flamengo, sob o comando do Sr. Rubem César Fernandes, responsável

aparente pela ONG Viva Rio, com a participação do ex-governador Garotinho,

quando teriam sido incineradas cerca de 4.000 armas de fogo. Como fiéis

hoplófobos (pessoas possuidoras de aversão a armas de fogo), tentam iludir a

opinião pública do Estado e do País, procurando fazer crer que a

responsabilidade pela violência vivenciada atualmente é do objeto e não dos

corações e mentes de marginais.

É necessário estabelecer a diferenciação entre posse e porte legal de

arma. Foi recentemente aprovado anteprojeto pelo Senado que caracteriza

como crime hediondo a posse ilegal de arma de fogo, tornando o crime

inafiançável. É oportuno lembrar que, se um cidadão matar alguém, poderá ser

118

solto e aguardar o julgamento em liberdade, enquanto aquele que for apanhado

com uma arma de fogo, talvez a caminho do conserto, a critério da autoridade

repressora, ficará preso. Convenhamos que é algo desproporcional. Os

narcotraficantes vão morrer de rir com mais uma acusação contra eles, que

cometem o mais hediondo dos crimes, qual seja o de tentar viciar nossos filhos.

O cidadão honesto, cumpridor das leis, terá receio de portar arma e ficará sem

condições de defender sua família, a mercê da quantidade de drogas ingerida

pelo assaltante e do seu humor.

O porte de arma de fogo pressupõe a premissa de ser legal. Isto é, o

cidadão possui o direito de portá-la. Encontramos inúmeras profissões que

garantem o direito ao porte, como magistrados, militares, policiais, promotores,

procuradores, defensores públicos e outros, em serviço ou não. Outras

profissões, como a de vigilante, permitem o porte em serviço. E ainda existem

os seguranças de empresas particulares, contratados por clientes de alto poder

aquisitivo, que também têm o direito de andar armados, com espingardas

Puma 38, metralhadoras UZI, revólveres Magnum, pistolas Glock e outros

artefatos pesados, fazendo a segurança, por exemplo, dos proprietários da

rede de comunicação que é a inimiga número um das armas de fogo no país.

Faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço. Muitos dos próprios

hoplófobos, em surdina, interditam “stands” e praticam o tiro de defesa,

escondidos, com instrutores estrangeiros. Além disto, sua segurança é oficial,

possuindo vários guarda-costas até para os filhos e netos, andando em carros

oficiais, com placa fria, às nossas expensas.

Assim, existem no Brasil milhões de cidadãos que possuem o direito

legal deportar armas de fogo e vão continuar a usá-las. Além disto, na exceção,

há algumas pessoas que solicitam a autorização para portar arma legalmente e

são submetidos a um verdadeiro 13º trabalho de Hércules para conseguí-lo. Há

necessidade de possuir domicílio fixo, certidões negativas até da Justiça Militar

e da Justiça Eleitoral, além das corriqueiras, investigação social, aprovação em

teste psicotécnico, prova de tiro, segurança no “stand”, conhecimento do

119

manuseio e necessidade comprovada. Será que os hoplófobos já viram,

alguma vez, o estrago provocado por uma navalha ou pela popular “peixeira”,

utilizada normalmente no Nordeste? É melhor não divulgar, pois algum

tresloucado sicário a serviço da IANSA-International Action Network of Small

Arms, uma rede de 186 ONGs criada para atuar como uma central de

coordenação da campanha internacional de desarmamento, pode também

querer a proibição da utilização de facas e outros perigosos “vetores de

violência” pelos “irresponsáveis” cidadãos brasileiros.

Outra falácia é a de que o “clamor público” exige a proibição da

propriedade e do porte pelos cidadãos. Em todas as recentes pesquisas, o

povo brasileiro pronunciou-se maciçamente contra o desarmamento civil,

apesar da verdadeira “lavagem cerebral” e da rica propaganda feita pelos

hoplófobos, com a conivência de algumas pessoas de boa fé e de outras, nem

tanto, mais interessadas em faturar um bom dinheiro na campanha mentirosa.

Até o programa de TV de um popular apresentador, numa pesquisa em que se

votava em um número a favor do desarmamento e em outro contra, apesar da

histérica propaganda do hoplófobo e da “dificuldade” em conseguir acesso ao

telefone a favor do direito natural de o cidadão possuir arma de fogo,

apresentou um empate técnico, fato que provocou a ira do cidadão, que,

apesar de seu discurso, saiu do seu programa em um carro blindado, protegido

por seguranças armados até os dentes. Faça o que eu digo...

Outro argumento falacioso é o de que o desarmamento civil diminuiria

a violência. No Brasil, a deputada federal e juíza Denise Frossard já desmentiu

a falsa tese. Estudos realizados nos EUA(FBI- Uniform Crime Report) mostram

que apenas 0,2% das armas produzidas e vendidas legalmente acabam sendo

usadas em algum tipo de crime, durante sua vida útil. Segundo o porta voz do

FBI, Sr. Paul Bresson: “muitas vezes o emprego defensivo das armas de fogo

não é crime e, por isso, não são levados a nosso conhecimento, nem entram

em nossos relatórios”. Na maior parte dos casos, o portador, quando atacado,

ameaça, engatilha ou apenas mostra a arma e o marginal foge. Se o portador

120

agiu legalmente, nenhum crime foi cometido. Assim, a polícia registra

homicídios, estupros, roubos e assaltos, não o morador que afugentou um

marginal. Outras pesquisas do Prof. Gary Kleck, da Universidade da Flórida,

mostram cerca de 2,5 milhões de usos defensivos a cada ano nos EUA. Esses

dados reforçam o argumento de que o valor de proteção das armas de fogo, de

longe ultrapassa o número de crimes com armas (232 mil, em 1997), segundo

dados do Departamento de Justiça. Os grupos de direitos civis que apoiam o

uso de armas nos EUA utilizam esses números para mostrar que mais

restrições à posse de armas podem reduzir o número de vezes em que uma

vida é salva ou um crime evitado.

No Reino Unido, após o banimento das armas curtas, a própria polícia

reconhece que isto em nada contribuiu para melhorar a situação, existindo

ainda de 400 mil a 1 milhão de armas de fogo ilegais. O próprio Comitê de

Assuntos Internos está planejando uma revisão na legislação de armas de

fogo, em futuro próximo e o Sr. Bill Harriman, membro do Comitê Consultivo

em armas de fogo afirma que: “a legislação focou o cidadão honesto que

participa de clubes de tiro, quando deveria ser direcionada a armas possuídas

ilegalmente”.

Ninguém tem moral, capacidade, direito ou legitimidade para rasgar a

Constituição, impedindo o direito natural à autodefesa do cidadão.

Email: [email protected] Site: www.brasilsoberano.com.br

Professor Titular de Economia junto à Universidade Candido Mendes, Professor na UERJ e Conselheiro da ESG.

121

Restringir o uso de armas de fogo é dar um tiro no próprio pé

Erik Sosdelli Camarano

As manifestações do Presidente da República sobre a necessidade de

desarmar a população brasileira — em entrevista no programa Roda Viva, no

final de abril passado — deram início a uma seqüência equivocada de eventos

que pode ter efeitos exatamente opostos aos que se deseja obter.

Na volta de sua viagem à Inglaterra, Fernando Henrique declarou ser

possível pensar em proibir a venda de armas para porte civil no Brasil,

seguindo o exemplo britânico. Em Brasília, o governador Joaquim Roriz

(PMDB) sancionou no início de maio a lei que proíbe a venda de armas de fogo

no Distrito Federal. O deputado federal Luiz Antônio de Medeiros (PFL-SP), por

sua vez, enviou em fins de abril à Câmara dos Deputados um projeto de lei

restringindo a comercialização de armas de fogo no país. O ministro da Justiça,

Renan Calheiros, já encaminhou ao presidente uma minuta, ao que tudo indica

elaborada com a Casa Militar da Presidência, proibindo a venda de armas em

todo o país.

O senso comum acredita, de boa fé, que a restrição da comercialização

e do porte de armas de fogo terá o efeito de diminuir a criminalidade no Brasil.

Nas palavras do próprio deputado Medeiros: “È preciso desarmar as pessoas

que estão morrendo atingidas por armas de fogo por causa de assuntos

banais, como por exemplo, uma briga de trânsito”. Com a aprovação de uma

medida como a que está sendo proposta, de acordo com Medeiros, “com

certeza o índice de criminalidade vai diminuir bastante no Brasil”.

Na verdade, toda a discussão a respeito da relação entre o

desarmamento da população e os índices de criminalidade é recheada de

preconceitos de ambas as partes. De um lado, os produtores de armas e

munições se defendem com argumentos baseados na liberdade do cidadão e

no efeito danoso da proibição sobre os empregos no setor. De outro lado,

122

setores ligados aos direitos civis, grupos humanitários e a imprensa em geral,

via de regra, defendem a idéia de que uma população armada agrava a

criminalidade, com citações de casos anedóticos como aqueles mencionados

pelo deputado.

No entanto, qualquer argumento consistente contra ou a favor do

desarmamento deve estar baseado em um mínimo de estatísticas com

qualidade necessária para colocar a discussão em bases nacionais.

Precisamos fazer um esforço sério para desvencilhar-nos dos preconceitos

sobre o assunto e investir um mínimo de tempo no estudo dos argumentos pró

e contra a legislação rígida de controle às armas no país.

Em primeiro lugar, o argumento do impacto nos empregos. Na medida

em que há uma indústria de armamentos instalada no país (representada por

cinco fábricas: Taurus, Imbel, Rossi, CBC e Boito), a eliminação da

possibilidade de comercialização teria um impacto dramático sobre o setor,

com o possível fechamento destas fábricas e de toda a rede de

comercialização de armamentos e munições hoje existente no país. Em um

momento de crise conjuntural da economia, medidas governamentais que

impliquem a destruição de empregos deveriam, pelo menos, ser evitadas.

O Estado do Rio Grande do Sul é um dos maiores perdedores, na

medida em que concentra as atividades no setor. Segundo dados atualizados

do Cadastro Industrial da Fiergs, há cerca de 1,6 mil empregos diretos na

indústria de armas gaúcha, o que daria, em uma estimativa conservadora,

cerca de 6 a 7 mil empregos indiretos no conjunto da cadeia — vale lembrar

que esta indústria, por ser muito especializada, tem um grau de multiplicação

de empregos mais baixo do que as coqueluches do momento, como as

montadoras de automóveis. Mesmo assim, a destruição de empregos que

resultaria de uma medida como a que está sendo proposta justifica a

preocupação do ponto de vista econômico e social, No entanto, a decisão final

só deve ser tomada a partir de uma análise comparativa dos custos (em termos

123

da perda de empregos) e benefícios (medidos pela redução da criminalidade)

resultantes da legislação. Vamos então ao segundo ponto.

A questão central que deve ser colocada é a seguinte: a

comercialização e a concessão de porte de armas impedem os crimes

violentos? Ou simplesmente aumentam as chances de os cidadãos causarem

danos uns aos outros, como no argumento do deputado Medeiros? O uso de

um pouco de racionalidade econômica pode contribuir para situar o debate,

permitindo assim que passemos além das motivações de fundo emocional,

político ou religioso, e possamos pelo menos organizar as idéias sobre o tema.

Uma maneira de tornar os argumentos ainda mais interessantes

consiste em observar a sociedade mais armada do mundo, os Estados Unidos,

duramente criticada na comunidade internacional por seu perfil cowboy no que

diz respeito a armas e munições. Entretanto, como o exame dos dados

mostrará a evidência empírica norte-americana lança luz neste debate e

permite conclusões que seriam consideradas no mínimo improváveis pelo

senso comum. Vamos aos números.

Primeiro argumento fundamental: a noção de dissuasão. Os

criminosos se comportam racionalmente. O “cálculo econômico do bandido”

deve comparar o ganho esperado de sua investida aos custos de ser pego em

flagrante, medidos pela probabilidade de ser preso e pelo tamanho da pena em

caso de condenação. Em seu raciocínio, o ganho potencial de um ataque deve

ser ponderado ainda pela probabilidade de a vítima reagir ao assalto e, ao

faze-lo, portar uma arma de fogo. Os criminosos procuram presas mais

vulneráveis. Os economistas chamam isto, adequadamente, de “efeito

substituição”. Maiores taxas de capturas e condenações diminuem os crimes

embora haja evidências de que o efeito é muito pequeno. Além disso, os

criminosos também se mudam de locais nos quais a taxa de dissuasão

aumenta.

124

Mas os criminosos respondem a algo além das ações da polícia e dos

tribunais: à ação privada dos cidadãos. Permitir o porte de arma a pessoas

comuns reduz os crimes violentos; no caso americano, o número de reduções

coincide muito com o número de licenças emitidas. Assassinatos em massa por

franco-atiradores em lugares públicos também diminuem quando cidadãos de

bem podem portar armas de fogo.

Os criminosos são motivados pela autopreservação. Logo, a posse de

armas pode ser uma barreira ao crime. Dados do Canadá e da Inglaterra, no

quais a legislação de controle de armas é muito rígida, mostram uma incidência

de 50% de hot burglaires (invasão de residência com os moradores dentro), ao

passo que, nos Estados Unidos, esta taxa é de apenas 13%. A diferença não é

acidental.

Claro que, entre os diversos fatores influenciando a criminalidade, as

taxas de captura e condenação são os mais importantes. No entanto, a

concessão não discricionária de porte de armas de fogo também é importante,

sendo ainda o método mais efetivo em termos de custo. Os custos de contratar

mais policiais para combater o crime são muito mais elevados e, no caso

americano, os benefícios líquidos por dólar gasto são quatro vezes menores do

que os benefícios da legislação que concede porte de armas. Permitir que

cidadãos sem incidentes criminais em sua ficha policial e mentalmente

capacitados portem armas dissuade a prática de crimes violentos e tem apenas

um efeito estatisticamente insignificante na taxa de mortes acidentais. Nas

estimativas de John R. Lott Jr., professor de direito e economia na

Universidade de Chicago, se todos os estados norte-americanos tivessem

adotado medidas autorizando o porte de armas, cerca de 1,5 mil assassinatos

e 4 mil estupros poderiam ter sido evitados no período 1992-1998.

De todos os métodos estudados por economistas até o momento, o

porte legal de armas parece ser a alternativa mais eficiente em termos de

125

custo-benefício. Além do mais, os acidentes e os suicídios não são alterados

pela existência de licenças para porte de armas.

Segundo argumento fundamental: a ocorrência de acidentes. Um

forte argumento dos que são contra a comercialização e porte de armas de

fogo é a possibilidade de acidentes causados pelo uso indevido destas armas,

especialmente por crianças, como no dramático caso recente da Columbine

High School, do Colorado. Apesar do destaque na mídia, este tipo de evento é

a exceção e não a regra. Nos Estados Unidos, em 1995, houve 1,4 mil

acidentes fatais com armas de fogo. Uma parcela pequena destes casos

envolveu crianças: 30 com menos de 4 anos e outro 170 na faixa de 5 a14

anos de idade. Comparativamente, 2,9 mil crianças morreram em acidentes de

carro, 950 morreram afogadas e mais de 1 mil por queimaduras e incêndio.

Mais crianças morrem por ano em acidentes de bicicleta do que de todos os

tipos de acidentes com armas de fogo.

O medo de que os cidadãos passem a resolver discussões de trânsito

e outras disputas corriqueiras a bala também não tem fundamento: no 31

estados americanos que têm leis ditas “não discricionárias” de porte de armas,

algumas delas com décadas de vigência, há apenas um incidente

documentado de tiroteio após o acidente de carro com uma arma legalmente

portada, e mesmo assim envolvendo legítima defesa.

Na Flórida, entre 1/10/1987, quando entrou em vigor a lei do porte de

armas, e o final de 1996, mais de 380 mil licenças haviam sido emitidas e

somente 78 haviam sido revogadas por causa de crimes cometidos por seus

proprietários (a maioria não envolvia a arma sob a licença). No Oregon, o

condado de Multnomah emitiu 11.140 licenças entre janeiro de 1990 e outubro

de 1994, tendo apenas 5 licenciados envolvidos em tiroteios, nenhum deles

fatal. Fatos semelhantes ocorreram nos estados, de Nevada, Virgínia e Texas.

As estatísticas mostram que, em 98% das vezes nas quais uma arma é

utilizada defensivamente, basta brandi-la no ar para espantar a agressão:

126

entregadores de pizza se livram de assaltantes, taxistas se protegem de roubos

na madrugada, lojas são protegidas contra assaltantes; mas estes eventos não

chegam aos jornais. A mídia se concentra em eventos dramáticos, que são por

si atípicos e, em geral, envolvem mortes.

O debate não se resume ao ponto de salvar ou não vidas. A questão

consiste em saber quantas das mortes acidentais poderiam ser evitadas sob

um conjunto diferente de regras, comparativamente ao que a população

perderia em termos de sua capacidade de se defender por conta própria.

Terceiro argumento fundamental: externalidade. Há um efeito sobre

terceiros — uma externalidade — decorrente do porte de armas: do mesmo

modo que os moradores armados desencorajam a atividade noturna do

arrombamento de residências, a possibilidade do porte discreto de armas de

fogo cria uma situação de risco potencia para os criminosos que tende a

reduzir os ataques aos cidadãos. Por isso é importante o porte discreto de

armas, pois isso impede que os criminosos discriminem entre quem usa e

quem não usa armas de fogo, diminuindo a rentabilidade dos assaltos. Em dez

penitenciárias estaduais norte-americanas, 56% dos criminosos declararam

que prefeririam não atacar vítimas que soubessem estarem armadas.

Este é o chamado “efeito-auréola”: mesmo cidadãos que não têm

qualquer intenção de um dia portar armas de fogo são beneficiados pelo porte

de seus vizinhos, na medida em que isso cria um efeito de reduzir a

rentabilidade dos crimes cometidos na área, afastando os criminosos. O “efeito-

auréola” se estende mesmo àqueles que não têm o perfil de um potencial

usuário de arma de fogo: permitir que os mais velhos usem armas de fogo

aumenta a segurança das crianças na área e espanta os criminosos para

outras localidades.

A evidência empírica norte-americana também reforça o fato de que a

criminalidade diminui mais depressa se estados vizinhos também adotam a lei

de porte de armas, ao mesmo tempo que os benefícios são maiores quanto

127

maior o número de armas no estado. As taxas nacionais de criminalidade têm

caído na mesma proporção que a expansão da posse de armas. Além disso, os

estados nos quais a taxa de criminalidade caiu mais depressa são também

aqueles nos quais a posse de armas cresceu mais rápido.

Muitas noções do senso comum caem com os argumentos levantados.

Nas áreas urbanas, que têm menor taxa de armamento de população, a

criminalidade é mais elevada. Os centros urbanos são potencialmente os

maiores beneficiários de uma legislação pró-armas de fogo, mas se opõem

sistematicamente a ela. A redução da criminalidade tende a ser tanto maior

quanto mais violenta a cidade, maior e mais concentrada sua população, além

da presença de grupos minoritários. O motivo é claro: é nestas áreas que o

cidadão depende mais de si mesmo para sua segurança. Outro resultado

importante: um pequeno número de pessoas usará a licença para o porte de

armas de modo inadequado, mas os ganhos são muito maiores do que estas

preocupações.

Quarto argumento fundamental: ineficácia da legislação. A lei

federal norte-americana que restringe a venda de armas, batizada de lei Brady,

não exerceu nenhum efeito perceptível sobre a criminalidade. Na verdade, a

redução da criminalidade começou em 1991, período que coincide com a

aprovação de legislação autorizando o porte discreto de armas em diversos

estados norte-americanos, ao passo que a lei federal foi aprovada somente em

março de 1994.

Pior ainda, os dados do Relatório Padronizado de Criminalidade dos

EUA mostram que não houve qualquer avanço estatisticamente perceptível na

redução da criminalidade como efeito da lei Brady, mas houve

demonstravelmente, uma elevação de 4% nas taxas de estupro e assaltos com

agressão das vítimas, comparativamente ao que seria verificado na ausência

da lei. Além do mais, logo antes da aprovação da lei, a venda de armas

cresceu exponencialmente, tal qual a fila em posto de gasolina antes do

128

aumento do combustível. Além da reduzida eficácia da lei Brady, também há

pouco benefício de restrições adicionais, tais como exigência de treinamento

ou de limites de idade na concessão do porte de armas.

A questão do porte de armas remete ao ponto crucial que consiste em

determinar até que ponto, dada a absoluta inépcia do governo em eliminar

outras formas genéricas de contrabando, uma lei que elimine a venda de armas

no país, ou que impeça o porte legal de armas por cidadãos que respeitam as

leis, teria simplesmente o efeito de mudar o equilíbrio relativo de forças entre

criminosos e a população em geral, a favor dos primeiros.

Conclusões. O banimento completo de armas de fogo a partir de uma

situação n qual a venda já era permitida, como é o caso do Brasil, terá

certamente o efeito de elevar a taxa de criminalidade no curto prazo, porque o

fim do porte legal de armas terá um efeito apenas de impedir a posse

legalizada por cidadãos que respeitam as leis, mudando a correlação de forças

a favor dos criminosos.

Além do mais, a abolição da comercialização de armas de fogo terá

efeitos desiguais sobre diferentes camadas da população, já que as taxas de

criminalidade são também diferentes: os criminosos têm maior vantagem no

uso da força contra vítimas mais frágeis, como as mulheres e os idosos. As

diferenças entre homens e mulheres são evidentes pelos dados da Resenha

Nacional de Vitimização pelo Crime do Departamento de Justiça americano

(1979-87); a probabilidade de danos sérios causados a mulheres como

resultado de um ataque é 2,5 vezes maior para mulheres que não oferecem

resistência do que para aquelas que resistem com uma arma. Para os homens,

a chance de serem feridos é quatro vezes maior ao resistirem a ataques sem

arma do que com uma arma de fogo. Resumo: o melhor conselho é resistir com

uma arma, mas, se não houver arma, é melhor não resistir do que tentar faze-

lo desarmado.

129

Ao que tudo indica, impedir o porte de armas por cidadãos que

respeitam as leis não diminui a violência e a criminalidade, apenas deixa as

vítimas mais vulneráveis ao ataques dos criminosos. Mas as pessoas têm

visões pré-estabelecidas de ambos os lados do debate e é apenas através do

estudo dos resultados empíricos sobre a capacidade de dissuasão e a partir da

falta de evidência de que os detentores de porte legal de arma cometam crimes

que podemos, pelo menos, diminuir o ímpeto daqueles que são contra o porte

de armas.

A pergunta final é uma só: será que permitir a posse de armas por

cidadãos que respeitam as leis salvará vidas na população? A resposta é sim,

salvará. O governo federal embarcou, assim, em um discurso populista,

balizado pelo senso comum, cujo efeito prático será o mesmo de dar um tiro no

próprio pé. Tomara que eu esteja errado.

Erik Sosdelli Camarano, Diretor de Pesquisa e Informação da Pólo RS Agência de Desenvolvimento.

Armas e revolução passiva

Olavo de Carvalho

Se os meios de produção constituem o critério econômico da divisão de

classes, o fator que assegura a uma classe o seu papel dominante na

sociedade não é a posse deles, e sim a dos meios de destruição. Eis porque as

revoluções que têm por meta nominal a mudança da estrutura econômica não

tomam nunca por alvo prioritário a conquista das fábricas e dos bancos, mas

sim a das instalações militares. Não a da riqueza, mas a das armas que as

garantem. Nenhum materialista histórico esteve jamais embriagado de

economicismo a ponto de negar essa obviedade.

130

Se nos períodos de paz e normalidade a riqueza financeira é um meio

importante de conquistar e conservar o poder, nos de desordem e violência só

um tipo de riqueza importa: a posse das armas. Nessas horas, mais pode o

pobre armado do que o rico desarmado.

A lei confere o monopólio da posse de armas a certas categorias de

cidadãos representa, portanto, nada menos que uma revolução, o

estabelecimento de um novo critério de estratificação social, de uma nova

divisão de classes. Doravante, o povo brasileiro estará dividido em duas castas

— os armados e os desarmados. Ao mais mínimo abalo da ordem cotidiana,

essa distinção se mostrará decisiva, na prática, do que aquela que separa os

pobres e os ricos, os letrados e os iletrados, os famosos e os anônimos.

Eis porque nenhuma inteligência sã pode aceitar discutir, a sério, se a

lei de proibição da venda de armas ajudará ou não a reduzir a criminalidade.

Ela não tem rigorosamente nada a ver com a diminuição da criminalidade, e é

impossível que seus autores, todos versados em Marx, Gramsci e até Weber,

não saibam disso. O combate à criminalidade é apenas o pretexto publicitário

para fazer o povo aceitar, com plena inconsciência de seus efeitos, a mutação

mais profunda e violenta que a sociedade brasileira já sofreu ao longo de toda

sua história. Que transformação tão drástica possa ser impingida pacificamente

ao país enquanto os olhos da opinião pública estão desviados para discussões

laterais — eis a manifestação vivente da “revolução passiva” preconizada por

Gramsci, entre cujos seguidores se encontram o governador Anthony

Garotinho, o Dr. Carlos Minc, os próceres todos da campanha “Rio Desarme-

se” e, “last but not least”, o Sr. Presidente da República.

E, se coisa de tal monta não foi assinalada por nenhum observador

num país que detém o recorde mundial de cientistas sociais “per capita”, é

porque estes se dividem em duas categorias: os que são capazes de percebe-

la e os que, por deseja-la ardentemente, torcem para que ninguém mais. A

revolução passiva é dita passiva precisamente porque não dói nem chama a

131

atenção, mas vai penetrando insensivelmente, centímetro a centímetro, como a

lâmina num tecido previamente anestesiado. A divisão do país entre os

armados e os desarmados pressupõe uma outra, anterior, que a condiciona: a

divisão dos brasileiros entre os gramscianos e os otários.

Entre os primeiros, o mais “soft” e, portanto, o menos desonesto é o Sr.

Presidente da República, o qual, numa mensagem para os raros entendedores,

reconheceu, como instrumento para combate ao banditismo, a nova lei é

apenas “simbólica”. Evidentemente, não ocorreu a nenhum dos demais lhe

perguntar porque uma lei simbólica tinha sido encaminhada ao Congresso em

regime de urgência nem se, considerada como instrumento para alguma

finalidade totalmente diversa, a nova lei não teria algum efeito menos simbólico

e mais direto.

Que essa finalidade nada tem a ver com o controle do banditismo é a

coisa mais óbvia do mundo. Cassar uma autorização só afeta quem precisa

dela, e nenhum quadrilheiro esperou jamais autorização do Estado para usar

armas. Ademais, todas as armas em posse do crime organizado já são ilegais,

sendo inócuo colocar fora da lei o que nunca esteve dentro dela. Mas o efeito

nulo que a proibição terá sobre todos os grupos que, por sua natureza, já

atuam fora da lei (inclusive os bandos de guerrilheiros rurais) contrasta

dramaticamente com a profundidade e a amplitude da mudança que ela

desencadeará sobre a vida de todos os demais brasileiros, de todos os

brasileiros que querem viver dentro da lei.

Essa maneira pode-se enunciar da maneira mais simples: aprovada a

nova lei, haverá uma nova sociedade no Brasil, com novos dominadores e

novos dominados. O mais rico dos brasileiros poderá contratar um segurança,

mas não se defender dele se ele decidir, de repente, passar para o lado dos

seqüestradores. O dinheiro será impotente, o prestígio será indefeso, a

autoridade moral se tornará o discurso risivelmente inofensivo dos profetas

132

desarmados: o único meio de acesso ao poder será ingressar na polícia, nas

Forças Armadas ou numa quadrilha de traficantes.

E a nova classe dominante não terá somente o monopólio dos meios

de matar, mas o também da seleção de seus próprios membros: quem aceita

ou rejeita um candidato a policial é a polícia; um candidato a quadrilheiro, a

quadrilha. Por sua constituição mesma como monopolista (e monopolista da

única força decisiva), a classe dos novos senhores será mais fechada, mais

exclusivista e mais corporativista do que todas as suas antecessoras. E, o que

é infinitamente mais grave, não haverá entre quem tem e quem não tem poder

os graus intermediários que hoje matizam as diferenças hierárquicas: ao

contrário do que acontece com o dinheiro, o poder político e a fama, que

podem vir em quantidades maiores ou menores, entre o armado e o

desarmado nenhum meio termo é concebível.

Olavo de Carvalho é jornalista e escritor.

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