Antropologia do Cuidar

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO CENTRO DE TEOLOGIA E CIÊNCIAS HUMANAS LICENCIATURA PLENA EM FILOSOFIA FAUSTINO DOS SANTOS INTRODUÇÃO À BIOÉTICA ANTROPOLOGIA DO CUIDAR

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Síntese do livro de TORRALBA ROSELLÓ

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO

CENTRO DE TEOLOGIA E CIÊNCIAS HUMANAS

LICENCIATURA PLENA EM FILOSOFIA

FAUSTINO DOS SANTOS

INTRODUÇÃO À BIOÉTICA

ANTROPOLOGIA DO CUIDAR

Page 2: Antropologia do Cuidar

RECIFE/2012

UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO

CENTRO DE TEOLOGIA E CIÊNCIAS HUMANAS

LICENCIATURA PLENA EM FILOSOFIA

FAUSTINO DOS SANTOS

INTRODUÇÃO À BIOÉTICA

ANTROPOLOGIA DO CUIDAR

Síntese elaborada pelo aluno citado acima sob

orientação do Professor Hermano para obtenção

de nota na disciplina de Introdução à Bioética do

curso de Licenciatura Plena em Filosofia da

Universidade Católica de Pernambuco no semestre

2012.1.

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RECIFE/2012

ANTROPOLOGIA DO CUIDAR1

INTRODUÇÃO

Entendendo a abordagem do livro

O livro Antropologia do Cuidar, que é um livro indicado

prioritariamente para a área de enfermagem, faz, enquanto

questão prática, uma abordagem de antropológica filosófica

uma vez que se considera a ação do cuidar uma ação

essencialmente humana.

Apontada pelo autor como apoiada numa teoria prática do

cuidar, é necessariamente aí que a enfermagem deve buscar

sua essência fundamental, uma vez que o cuidar é a essência

do fazer enfermagem, ou seja, “o cuidar é o conhecimento e a

arte da enfermagem”. Essa afirmação carrega um grande

significado, pois atribuir ao cuidar uma questão estética quando

se refere a arte, é dizer que essa ação é bela e uma atitude que

tem harmonia e equilíbrio, que faz gosto observar uma pessoa

realizando tal ato. Ademais, quando se atribui ao cuidar uma

questão que se diz ligada diretamente ao homem, é dizer que

essa ação também é uma ação ética, dizendo isso, portanto, é 1 Título do livro de FrancescTorralba i Roselló tradução de GuillermeLauritoSumma.

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dizer que essa ação é de grande responsabilidade interpessoal,

ou seja, a pessoa que executa tal ação não está preocupada no

seu bem estar, mas no do outro, com isso existe aauto

realização por fazer os outros realizados, felizes e bem. Além

dessa dimensão pode-se dizer que a tarefa do cuidar está

ligada diretamente com a atitude de reconstituição interior,

imagino ser totalmente pertinente e de recompensa essa

afirmação uma vez que o receptor do cuidado do enfermeiro ou

do cuidador pode passar por um processo de transformação

interior bem como aquele que é o transmissor do cuidado, no

caso o enfermeiro. “Edificar a pessoa doente é tratar de

recompor seu interior, alçar de novo sua identidade pessoal,

ajuda-la a se refazer depois da queda e da frustração que

implica o processo de enfermar”.

DESENVOLVIMENTO

Enfermagem e Antropologia Filosófica elementos constitutivos e

essenciais para uma antropologia do cuidar

Antes de adentrar nas questões que aprofundarão a

conclusão que já se apresenta nos primeiros parágrafos, o autor

se propõe a buscar o paralelo que pode haver entre a

enfermagem e a antropologia filosófica propriamente dita.

Enquanto uma questão na ordem da antropologia filosófica se

buscará elementos que digam respeito prioritariamente às

questões do homem, com isso se define que enquanto questão

nessa ordem o cuidar é visto como elemento constitutivo da

essência humana, já na ordem da enfermagem não é difícil se

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fazer a relação uma vez que a ação da enfermagem há trás

consigo uma pré-disposição para a ação do cuidado ou do

cuidar. Para tanto, enquanto “a enfermagem tem a experiência,

a prática, a antropologia filosófica faz a reflexão teórica

aprofundando e contribuindo para a compreensão da totalidade

do ser”.

Percebe-se que ao longo do livro a questão que se

apresenta prioritariamente são as questões relativas ao cuidado

do ser humano, tanto enquanto agente da ação, quanto do

agente receptor da ação (doente), sobretudo dessa segunda

pessoa que é pessoa vulnerável. Para isso o autor trata de

questões nos diferentes estados da vida enferma da pessoa e

com isso a ação humana do cuidar enquanto contribuinte para

reconstituição física e humana da pessoa pois, “o exercício do

cuidar é uma ação inescapável do ser humano, pois nós somos

cuidado”.

A busca por uma antropologia filosófica no livro se vê na

dimensão da constatação e busca pelo aspecto essencial do

homem que já foi dito anteriormente, pois o homem enquanto

ser de relações ele é necessariamente é um ser de cuidado que

se relaciona e nessa ação de relação envolve tanto o cuidado

de si próprio, o cuidado do outro e o cuidado do meio que

envolve toda natureza que esta em volta e que pode ser usada

como meio de ajuda para a transformação assim como utiliza

diferentes terapias e religiões, ou seja, a natureza como fonte

de bem estar e cura exterior e interior.

Enquanto saber necessariamente teórico, a antropologia

filosófica é também um saber especulativo de caráter quase

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que totalmente racional. Colocando o homem no centro como

aquele que é essencialmente cuidado, “a antropologia filosófica

traz elementos e instrumentos de reflexão teórica sobre o

sentido e a essência da condição humana e sobre várias

multifacetadas dimensões do ser humano no mundo”, ou seja, o

homem é um ser bio-psico-social que interage dentro de cada

ambiente em que vive e se encontra e participa ativa e

dinamicamente do todo social (comunidade), essa questão é

interessante porque como o próprio código de ética para a

enfermagem afirma, o serviço ao gênero humano é primeira

função do enfermeiro e a razão da existência da profissão de

enfermagem, para tanto, é necessário se perceber como

homem, como ser que se relaciona, que sente, que é humano,

enfim, é necessário para exercer a arte do cuidar tão falada e

importante da enfermagem compreender e dar valor a

complexidade que é p ser humano.

A enfermagem como ação prática da condição do homem

que é a práxis cuidadora, em diferentes visões é tida como

singular, pois, é o cuidado um dos conceitos mais poderosos e o

fenômeno essencial do seu ser. A enfermagem não pode

separar fatores como saúde e bem estar da doença ou dos

cuidados de cada forma de expressão cultural ou individual,

elas devem ser tratadas de forma independente, com a atenção

devida, mas de modo relacional. A função da enfermagem é

assistir o indivíduo (pessoa única) em bom ou mau estado de

saúde com a intenção de ajuda-lo na sua recuperação buscando

meios para isso e ajudando na sua independência em tempo

curto. Afirma o Código de Deontologia da Profissão de

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Enfermagem da Associação de Enfermeiras e Enfermeiros do

Canadá: a prática da enfermagem é “uma relação de ajuda

marcada pelo dinamismo e a preocupação pelos demais,

relação cujo interior o profissional de enfermagem ajuda o

cliente a alcançar o melhor estado de saúde possível”.

Com isso, pode-se dizer que a antropologia filosófica

recebe da enfermagem alguns aspectos interessantes, bem

como dá à enfermagem os que faltam nela. Enquanto a

antropologia filosófica reflete sobre o homem na sua condição

humana a enfermagem trata de cuidar da condição humana

nas suas diferentes instancias (pelo acompanhamento

pluridimensional). Enquanto a Enfermagem leva à antropologia

filosófica a experiência, o frescor da vida, a realidade mesma e,

sobretudo, a sensibilidade, a antropologia filosófica leva à

enfermagem elementos e instrumentos de reflexão teórica

sobre o sentido e a essência da condição humana e sobre as

diferentes nuances da reflexão e ação do ser humano no

mundo. E com essas trocas ambas as áreas vão constituindo

elementos importantes para uma boa ação cuidadora tendo em

vista o bem da pessoa humana com cuidados dignos.

Com esse aspecto pluridimensional e multifacetado pode-

se enquadrar a questão que o autor apresenta sobre a ação da

enfermagem de modo interdisciplinar. Esse “modelo

interdisciplinar tem como finalidade uma melhor e amis

personalizada assistência ao doente e isso pressupõe a

coordenação e a interação dos diferentes agentes sanitários

para um único fim que é reestabelecer asaúde do doente”.

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Criou-se socialmente um grande receio entre a relação da

ciência com a sabedoria, mas é bem verdade que a

enfermagem possui sim relações e precisa do conhecimento

humano, pois não haveria ciência caso não existisse sabedoria

humana. Outro aspecto interessante dentro dessa questão

interdisciplinar diz respeito a arte de ser cuidador que entra em

conflito muitas vezes com as habilidades técnicas, (portanto se

trataria de uma questão de vocação inata em conflito com o

conhecimento adquirido?) pois o autor aponta que o cuidar não

se trata necessariamente da mera técnica, mas se trata de uma

arte, existem pessoas que cuidam com gosto e outras que

demonstram habilidades mas são totalmente frias, desprovidas

de “humanidade”. Parece que ao autor concorda que o

exercício do cuidar é mais uma arte que a mera técnica embora

a arte necessite de aparatos técnicos como meios psicológicos,

anatômicos, antropológicos além de culturais e religiosos

favoráveis à fomentar o exercício do cuidar como uma arte.

Para tanto, “cuidar da saúde é um exercício que

transcende, ou deve transcender, o marco da biologia e da

corporeidade do indivíduo e requer a atenção e o

desenvolvimento de outras dimensões constitutivas do ser

humano”. A dimensão do cuidar muitas vezes entra em choque

com a dimensão do curar, embora ambos sejam importantes na

enfermagem, o mais importante é fazer com que o indivíduo se

recupere e garanta condições autonômicas para continuar sua

vida.

Enquanto questionamento sobre o que é antropologia, é

importante ressaltar que toda e qualquer questão antropológica

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gira em torno da pergunta o que é o homem?. Embora a

questão nos pareça simples quando analisamos o homem pela

sua exterioridade, ela não é tão simples assim, essa questão na

perspectiva filosófica foi e é a questão que norteia várias

teorias com o intuito de responder precisamente o que é o

homem, na antiguidade a resposta era dada que o homem é

sua razão, depois que o homem é o ser criado por Deus e,

portanto, deveria ser submisso ao seu criador, despois o

homem se dá conta que pela sua capacidade de razão ele

poderia ser superior a qualquer coisa, ele passou a ser

subjetivamente o centro da questão. Portanto, é importante

deixar claro que o homem é um ser de várias significações, e

nenhuma teoria poderá dizer, ela só o que o homem uma vez

que o homem é um ser ainda em construção e em processo de

descoberta de si mesmo.

Abordando a essa questão em diferentes perspectivas, o

autor apresenta em síntese que a antropologia filosófica é um

discurso filosófico, crítico e dialógico em torno da condição

humana, cujo fim é dizer mais precisamente sobre qual a

condição humana e quais as diferentes expressões e

modalidades do viver humano.

Em meio a essa busca de resposta sobre o que homem

realmente é percebe-se que ele é um ser vulnerável, pois uma

característica do ser humano é justamente a vulnerabilidade,

pois ele esta sujeito à doença, ao fracasso, ao perigo, ao mal,

ao bem, enfim, o ato de estar vivo pressupõe a

vulnerabilidadedo ponto de vista somático, social, econômico,

físico. Sendo isso específico do ser humano, também a busca

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pela proteção por conta dessa vida vulnerável é presente, e por

isso, quando vemos ao que esta prestes a cair sobre nós a

nossa ação imediata é se proteger.

Enquanto vulnerabilidade ontológica o homem é

vulnerável pela sua finitude, ele não é absoluto, eterno, nem

autossuficiente. Na dimensão ética o homem está sujeito a cair

moralmente, fracassar dentro e pela sua finitude. A natureza

também é vulnerável, sobretudo às transformações e

interferências humanas. A sociedade é vulnerável por que está

sujeita as desigualdades, violência, enfim, existem diferentes

formas de estar vulnerável que se fosse discorrer passaria

muito tempo e não chegaríamos a um fim e essa não é nossa

intenção.

Levando essas questões ao âmbito em questão o autor faz

uma abordagem de diferentes tipos de antropologias, a saber,

antropologia da doença, do sofrimento, da morte e por fim

chega na antropologia do cuidar. Não querendo fazer grandes

aprofundamentos nas antropologias que tem uma conotação

não muito boa para o homem, faço o paralelo sob dois

aspectos: as antropologias da doença do sofrimento, da morte

têm a dimensão da vulnerabilidade, já a do cuidar é parte

essencial do elemento constitutivo da natureza humana.

As dimensões da antropologia do cuidar são várias, mas a

princípio a ação do cuidar inclui o valor da receptividade, e isso

integra certa passividade, ou seja, exige daquele que cuida

receptividade a aquele sujeito vulnerável o que significa que

você esta aberto para responder às suas necessidades pois o

principal responsável pela ação de cuidar não é quem cuida,

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mas quem é cuidado. Essa dimensão da interpessoalidade

constitui uma das dimensões fundamentais da natureza

humana enquanto ser que é essencialmente cuidado, não

unicamente do cuidado pessoal, pois o homem é um ser para o

outro, a minha ação e o meu pensamento está fora de mim

mesmo, e quando se trata da tarefa de cuidar o contato físico é

importantíssimo não um cuidado físico de qualquer modo, mas

de modo singular, mas se trata de além de estar-com-ele, ser-

com-ele na dimensão mais profunda, existencial e humana que

possa dar margem essa expressão.

O autor diz que esse cuidado de tipo singular deve ser

personalizador pois exige de quem cuida um conhecimento da

pessoa, a circunstancia em que a pessoa vive, a sua biologia, a

sua biologia, se trata de fazer uma elevação da questão

biossomática para o âmbito espiritual-simbólico.

Enquanto arte, o cuidado é profundo e de grande

importância, não se trata de meras repetições técnicas, se trata

de algo que é feito com a alma, por entrega aquilo que é feito,

no caso o cuidado que se tem com a pessoa vulnerável. Embora

a arte no sentido etimológico pressuponha três aspectos que

são a técnica, a intuição e a sensibilidade, ela não se limita no

simples dizer algo, ela acarreta ação, essa ação, portanto não

necessariamente técnica. O dizer algo é importantíssimo, mas

existe também a dimensão do dizer sem ser com palavras

como fazem os artistas, na arte do cuidar a linguagem não-

verbal, isto é, o gesto, o olhar, o silêncio, ocupa um lugar

transcendental no ato de cuidar.

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O cuidar, nas suas várias nuances deve ter a intenção de

reconstituir a estrutura, recompor o ser humano globalmente,

deve ajudar a reequilibrar todas as dimensões da sua vida. Esse

processo do cuidar deve ser circunstancial, ou seja, deve ser a

partir da circunstancia de cada sujeito.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por uma dimensão ética do cuidar

Toda essa dimensão da antropologia do cuidar que

envolve aspectos inclusive de uma estética do cuidar, pois uma

vez que leva em seu seio uma alta dose de beleza e bondade,

se converte, por fim, numa ética do cuidar uma vez que o que

está como prioridade em todos os aspectos dessa dimensão do

cuidar está o respeito à vida.

Essa dimensão da ética do cuidar está atrelada ao ato de

edificação, não das coisas, mas do ser individual humano. Um

ser humano em estado de vulnerabilidade se encontra em

condições deploráveis e muitas vezes vergonhosas de

sofrimento, dor, assédio, enfim, mas a arte de cuidar se

convertendo numa ética do cuidar tem a tarefa importante de

reconstituição da dignidade humana, e mais que isso, da vida

humana, pois uma vida sem dignidade, à margem, não é vida. É

uma edificação da pessoa humana a partir de suas fundações. É

uma ação que é carregada de responsabilidade e

corresponsabilidade, cuidar eticamente de alguém é exercer a

responsabilidade ética, é preocupar-se com o outro ser e

assumir esse dever como moralmente meu e não como uma

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simples proximidade com o outro. O processo de cuidar e de

acompanhar supera os limites da técnica e contem elementos

profundamente éticos que poderão garantir a autonomia e a

liberdade da pessoa vulnerável.

Assim, portanto, o cuidar é além de tudo o que foi dito,

uma reconstituição da vida, é uma forma de interação

interpessoal, da qual se articula a transmissão de determinados

valores éticos, como o valor da esperança. Essa esperança, que

é uma virtude, é o “valor fundamental para canalizar o futuro e

superar as situações-limite, os danos da vulnerabilidade”, é um

ato da existência pessoal, é a espera da possibilidade de bem, é

o eco interior que diz que existe algo que nos fará triunfar do

perigo.

REFERÊNCIA

TORRALBA ROSELLÓ, Francesc. Antropologia do Cuidar /

FrancecTorralba i Rosseló; organização literária e apresentação

de Vera Regina Waldow; tradução de GuillermeLauritoSumma –

Petrópolis, RJ: Vozes, 2009 – (Série Enfermagem).