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ANTROPOLOGIA

2a edição revisada

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Governo do estado do Maranhão

secretaria de estado da ciência, tecnoloGia,ensino superior e desenvolviMento tecnolóGico

universidade estadual do Maranhão - ueMa

núcleo

 de

 tecnoloGias

 para

 educação

 - ueMa

net

ANTROPOLOGIA

carlos Benedito rodriGues da silva

são luís

2009

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Edição:universidade estadual do Maranhão - ueManúcleo de tecnoloGias para educação - ueManet

Coordenador do UemaNetprof. antonio roBerto coelho serra

Coordenadora PedagógicaMaria de fátiMa serra rios

Coordenadora do Curso Pedagogia, a distância:heloísa cardoso varão santos

Coordenadora de Produção de Material Didático UemaNet:caMila Maria silva nasciMento

Responsável pela Produção de Material Didático UemaNet:cristiane costa peixoto

Professor Conteudista:carlos Benedito rodriGues da silva

Revisão:liliane Moreira liMa

lucirene ferreira lopes

Diagramação:JosiMar de Jesus costa alMeida

luis Macartney sereJo dos santos

tonho leMos Martins

Capa:luciana vasconcelos

Silva, Carlos Benedito Rodrigues da,Antropologia / Carlos Benedito Rodrigues da Silva

(org.). 2. ed. rev. — São Luís: UemaNet, 2010.

123 p.

1. Antropologia. I. Carlos Benedito da Silva II.Título.

CDU: 1:37 

Copyright © UemaNet/UEMA

universidade estadual do Maranhão

núcleo de tecnoloGias para a educação - ueManet

Campus Universitário Paulo VI - São Luís - MAFone-fax: (98) 3257-1195http://www.uemanet.uema.bre-mail: [email protected]

Proibida a reprodução desta publicação, no todo ou emparte, sem a prévia autorização desta instituição.

Governadora do Estado do Maranhãoroseana sarney Murad

Reitor da UEMAprof. José auGusto silva oliveira

Vice-reitor da UEMAprof. Gustavo pereira da costa

Pró-reitor de Administraçãoprof. José Bello salGado neto

Pró-reitor de Planejamentoprof. José GoMes pereira

Pró-reitor de Graduaçãoprof. porfírio candanedo Guerra

Pró-reitor de Pesquisa e Pós-graduaçãoprof. Walter canales sant’ana

Pró-reitora de Extensão e Assuntos Estudantisprofª. vânia lourdes Martins ferreira

Chefe de Gabinete da Reitoriaprof. raiMundo de oliveira rocha filho

Diretora do Centro de Educação, Ciências Exatas e Naturais - CECENprofª. andréa de araúJo

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO

UNIDADE 1

CIÊNCIAS DA NATUREZA E CIÊNCIAS HUMANAS ................... 23

UNIDADE 2

O DESENVOLVIMENTO DA ANTROPOLOGIA: denição, divisões,

objeto e métodos ..................................................... 39

UNIDADE 3

CONCEITUAÇÃO ANTROPOLÓGICA DE RAÇA E CULTURA ......... 79

REFERÊNCIAS .......................................................... 119

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PLANO DE ENSINO

DISCIPLINA: AntropologiaCarga horária: 60 horas

EMENTA

Conceituação, objeto de estudo e objetivos; ciência da natureza e

ciência do homem, a Antropologia no quadro das ciências sociais;

natureza e cultura na Antropologia: cultura e sociedade no Brasil:

diferenciação étnico–cultural e educação; organização políticae econômica; linguagem, mito, religião e magia; a transmissão

cultural; unidade e diversidade; o popular e o erudito.

OBJETIVOS

Geral

¡  O curso proporcionará uma visão inicial do que é antropologiae sua posição entre as demais ciências. Pretende introduzir o

aluno a realizar uma análise antropológica de problemas sociais

e educacionais, partindo de exemplos concretos e sugerindo o

debate de conceitos e teorias.

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Específicos

¡  Denir cultura como fenômeno dinâmico de transformação e

diferenciação das sociedades humanas;

¡ Identicar os principais componentes da cultura e analisar

criticamente as posições etnocêntricas estereotipadas em

relação às minorias étnicas e sociais.

CONTEÚDOS PROGRAMÁTICOS

UNIDADE 1

CIÊNCIAS DA NATUREZA E CIÊNCIAS HUMANAS 

UNIDADE 2

O DESENVOLVIMENTO DA ANTROPOLOGIA: denição, divisões,

objeto e métodos

Desenvolvimento das Escolas Antropológicas

Os Precursores da Etnograa

Métodos da Investigação Antropológica

UNIDADE 3

CONCEITUAÇÃO ANTROPOLÓGICA DE RAÇA E CULTURA

Diferenciação Étnico-Cultural e Educação: a transmissão da

cultura

Dimensão Cultural da Escola

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METODOLOGIA

Os objetivos propostos serão alcançados mediante a realização de

videoaulas e atividades que possibilitem o desenvolvimento reexi-vo da leitura dos fascículos, livros e textos complementares através

de debates, seminários, trabalhos em grupos e individuais.

AVALIAÇÃO

A avaliação será feita em três momentos. O primeiro consistirá nos

trabalhos desenvolvidos junto ao orientador, através da consulta

individual, e dos trabalhos em grupo; o segundo será uma provaescrita; e o terceiro será a realização do seminário temático.

SUGESTÃO DE LEITURAS E REFERÊNCIAS

Dicas de Filmes

 Diferenciação étnico-cultural e Escola

¡  Central do Brasil – Diretor: Walter Sales; Brasil

¡  Mentes Perigosas – Diretor: John N. Smith;USA

¡  Sociedade dos Poetas Mortos (1991) – Diretor: Peter Weeir

 Cultura e Diversidade

¡  Um grito de liberdade (1987) – Diretor: Richard Attenborough;

Reino Unido- 157’

¡  Mistérios da Humanidade – (National Geografhic Society).Documentário sobre a origem do homem e sua evolução: A

descoberta dos fósseis, as marcas deixadas pelo homem e o

início do conhecimento da própria humanidade.

¡  A missão (1986) – Diretor: Roland Joffe; USA – 147’

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¡  Guerra e Paz no Oriente Médio – O documentário analisa as

origens da guerra e as perspectivas de paz para a região. A

obra apresenta a cronologia detalhada do conito (1947/1998)

e interessantes mapas dos países envolvidos.

 Diversidade étnico-cultural no Brasil 

¡  O Quatrilho (1995) – Diretor: Flávio Barreto; Brasil – 120’

¡  Xica da Silva (1995) – Diretor: Cacá Diegues; Brasil – 107’

¡  Gaijin – Os caminhos da liberdade – Diretor:Tizuka Yamasaki

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SUGESTÃO: FILMES

SUGESTÃO: LIVROS

CONES

Orientação para estudo

Ao longo desta apostila, você encontrará alguns ícones utilizados

para facilitar a comunicação com você.

Saiba, abaixo, o que cada um signica.

ATIVIDADES

REFERÊNCIABIBLIOGRÁFICA

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Desde o século XIX, a Antropologia traçou seus caminhos,buscando ampliar a compreensão sobre as diversas formas

de existência e organização social da vida humana. Ao

longo dessa trajetória, criou conceitos, teorias, métodos de

investigação, mergulhou, enm, em seu próprio interior no sentido

de denir-se mais adequadamente em relação à escolha do seu

objeto de estudo.

Em meados do século XX, a Antropologia adquiriu reconhecimento

no campo cientíco, apresentando novas conformações aos estudos

sobre cultura, etnia, raça, relações de parentesco, religiosidade,organização social etc., ocupando espaços em todas as áreas de

conhecimento e exigindo novas posturas também dos estudiosos

das sociedades humanas.

O que apresentamos aqui é o resultado de análises e elaborações

de vários estudiosos que se debruçaram sobre a Antropologia, no

sentido de enfatizar sua importância no processo de conhecimento

da imensa diversidade étnica e cultural humana, em várias partes

do mundo.

A Antropologia não apresenta receitas nem fórmulas mágicas

para a produção do conhecimento, mas dene-se com um corpo

teórico e procedimentos metodológicos próprios, forjados no

contato das diversas gerações de antropólogos, que se formaram

desde o século XIX, com as sociedades mais distanciadas cultural

APRESENTAÇÃO

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e geogracamente em relação ao mundo ocidental. Neste sentido,

a antropologia sugere uma forma de olhar, uma forma de analisar

e interpretar o outro, o diferente, buscando neles as próprias

contradições da identidade do observador. Esse é o caminho

proposto pela Antropologia, como pedagogia de rompimentocom as noções preconceituosas, responsáveis por racismos,

colonizações e genocídios, que ainda permeiam as relações

humanas em várias partes do mundo. Portanto, a Antropologia

tem uma importância fundamental no processo educativo das

novas gerações. Especialmente, quando se pensa a educação em

um país de dimensões territoriais tão amplas e de culturas tão

diversicadas como é o Brasil.

Assim, esperamos com esse programa estar contribuindo para a

formação dos educadores a partir de uma formação antropológica,

relativizadora, que reconheça e enfatize o diferente, não em

termos de comparação entre superioridades e inferioridades, mas

na sua concepção de humanidade, na riqueza de ser diferente.

No primeiro capítulo, situaremos os alunos no processo de

construção do pensamento cientíco, abordando as relações

entre as diversas ciências, tanto as dedicadas ao estudo dos

fenômenos físicos da natureza quanto as ciências dedicadas aos

estudos das sociedades humanas, enfatizando a importância dadenição metodológica no processo de produção do conhecimento

e a denição do homem como conceito e objeto cientíco do

conhecimento. Em seguida, trabalharemos o processo de

construção da Antropologia, com suas denições, divisões, objeto

e métodos de investigação. Na terceira unidade abordaremos

acerca da conceituação antropológica de raça e cultura.

Posteriormente, indicaremos algumas sugestões de atividades,

como forma de avaliação do conhecimento adquirido pelos

alunos ao longo do desenvolvimento do programa. Finalmente,indicaremos as sugestões de leituras, para orientar os alunos em

novas possibilidades de estudos.

  Prof. Dr. Carlos Benedito R. da Silva

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ANTROPOLOGIA: um estudo sobre o homem

Contextualização Histórica do Nascimento da Antropologia

Desde tempos muito antigos, o ser humano nunca deixou de

questionar sobre sua existência. A curiosidade humana sempreesteve aguçada na busca de explicações para o porquê das coisas

acontecerem dessa ou daquela maneira.

Também no campo cientíco, estudiosos de todas as áreas

do conhecimento concordam com o fato de que, em todas as

sociedades, sempre existiram indivíduos que se dedicaram a

pensar sobre as atitudes e comportamentos humanos.

Segundo o antropólogo francês François Laplantine (1999, p. 13), “A

reexão do homem sobre o homem e sua sociedade e a elaboraçãode um saber são, portanto, tão antigos quanto a humanidade, e

se deram na Ásia como na África, na América, na Oceania e na

Europa”.

Sem dúvidas, a curiosidade humana sempre esteve aguçada, mas

uma organização do conhecimento, ou seja, a constituição de uma

INTRODUÇÃO

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antropologia como saber cientíco que elege o homem como seu

objeto de conhecimento, uma “ciência de estudo do homem”, é

relativamente recente na história da humanidade, e só vai ocorrer

no nal do século XVIII. Até então, muita informação se acumulou

desordenadamente, por iniciativas particulares de aventureiros,missionários ou viajantes.

É possível identicar alguns fatos importantes que contribuíram

para a organização do “estudo do homem” e para a formação do

pensamento cientíco ocidental.

Podemos nos remeter ao grego Heródoto, considerado o “pai da

História”, que viveu no século V a.C e fazia observações sobre vários

povos e diferentes costumes, nas regiões onde era possível conhecer

o mundo naquela época (uma vez que os meios de comunicaçãona época não favoreciam esse contato), especialmente os povos

denidos como bárbaros.

Aliás, vocês devem saber que como bárbaros eram classicados

todos aqueles que não eram gregos, porque os gregos se deniam

com “os homens”, “os belos”, e não eram homens apenas

enquanto sinônimo de humanidade, eram o gênero masculino da

espécie. Dizem que os homens gregos se sentiam tão superiores e

importantes, que era degradante para um homem se relacionar

com uma mulher, pois esta era insignicante.

Pois bem, voltando a nossa viagem pelo estudo do homem, Heródo-

to falava, já na época, sobre um conceito dos mais atuais na Antro-

pologia contemporânea, o Etnocentrismo. Dizia ele, observando os

bárbaros, que se fosse dado aos homens, dentre todos os costumes

do mundo, escolher os melhores, eles acabariam escolhendo os seus

próprios costumes, pois estão sempre convencidos de que os seus

são melhores do que os dos outros.

Ora, ao nível pessoal, isso não tem grandes consequências. Uma

pessoa pode não gostar de outra por vários motivos, por ser gorda

ou por ser magra, por ser alta ou baixa. Alguém pode não gostar

de outro porque usa vermelho ou porque come caranguejo, ou

por outro motivo banal. Ou seja, é apenas um pré-conceito que

incomoda mais a quem pratica do que a quem sofre. Mas quando

Heródotohttp://greciantiga.org/img/esc/as-herodotos.jpg

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essa atitude preconceituosa se caracteriza como rejeição a grupos

humanos, impedindo-os de exercitarem suas potencialidades, ou

é utilizada para denir as relações entre as nações do mundo, aí

está a origem dos grandes conitos mundiais de caráter político,

religioso ou econômico. Os telejornais nos informam sobre issodiariamente.

Bem, seguindo nossa viagem, chegamos ao ano 98 depois de Cristo.

Aliás, fazendo um parêntese aqui, vocês devem se dar conta também

de que Cristo é um “divisor de águas” na história da humanidade.

Tudo é demarcado antes e depois de Cristo. Mas, embora essa seja

uma questão instigante para debates, não é disso que quero falar.

Como já falei sobre o grego Heródoto, que viveu antes de Cristo,

vamos falar agora sobre Tácito, um romano que viveu depois de

Cristo e fazia reexões sobre as tribos germânicas, atentando para

seus costumes e caráter em comparação com os romanos.

Vocês devem ter visto nas aulas de história, ou lido em algum lugar,

que os romanos viviam em grandes orgias, especialmente nas épocas

das colheitas. É interessante observar que a maioria das grandes

festas populares ocorrem na época das colheitas. No Maranhão, por

exemplo, tem a festa da juçara no Maracanã, a festa da melancia

em Arari, a festa do abacaxi em Turiaçu (bem, não tenho certeza,

mas se não acontecer, ca como sugestão). Todas essas festas estãorelacionadas com boas safras e fartura de alimentos. Mas, como o

Maranhão ainda não existia naquela época, vamos voltar a Roma.

Eu dizia que os romanos faziam grandes orgias na época das colheitas,

foi inclusive nessa época que inventaram o carnaval, a festa da carne.

Mas, Tácito então observava que, entre esses bárbaros alemães,

o casamento era uma instituição marcada pela austeridade e pela

moral, não havia as orgias como em Roma. Dizia ele, que os alemães

eram tão rígidos em seus costumes que, com raríssimas exceções, se

contentavam com apenas uma mulher para cada homem.

Ora, Tácito estava tomando como referência os costumes do seu

povo, onde homens e mulheres tomavam parte nas orgias. É claro

que isso se dava entre as castas superiores, porque o povo não tinha

acesso ao luxo, como sempre ocorreu na história da humanidade.

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Essa reexão sobre diferentes costumes fornece contribuições

importantes aos estudos sobre o comportamento humano. Isso tem

a ver com o que nós já falamos lá atrás, sobre o etnocentrismo,

tema que será explorado nas próximas unidades do nosso programa.

Seguindo nossa viagem, vamos observar que, depois das observações

de Tácito, existem alguns registros de viajantes, lá pelos séculos

XIII e XIV, como Marco Polo, que saiu da Itália e viajou pela China e

pelo resto da Ásia, por mais de 20 anos, transmitindo uma grande

quantidade de informações sobre povos e costumes até então

desconhecidos pelos italianos. Outros viajantes de outras regiões

do mundo também apresentaram registros importantes sobre os

africanos, sobre o islamismo etc.

Nessa trajetória, chegamos à Idade Média, a Era das grandes invençõese grandes descobertas, que possibilitaram acréscimos importantes

sobre o conhecimento que o homem tinha acerca de si mesmo.

A Idade Média é marcada pela chegada dos portugueses e espanhóis

no Novo Mundo. É marcada, também, pelo fortalecimento da

Igreja Católica, e aí estabelece-se uma disputa acirrada entre a

Ciência e a Religião.

Nessa época, predomina o pensamento religioso como explicação dos

fenômenos da natureza. É o Teocentrismo, “o direito e o poder divinodos reis”. Os reis governam segundo a lei de Deus. O catolicismo tem

ingerência em todas as instâncias e o seu instrumento de controle

é a Santa Inquisição. Todos os que se atrevessem a questionar o

poder da Igreja eram punidos por ela. Muitos pensadores tiveram

que negar seus conhecimentos e suas teorias sobre o universo e

os que não o zeram foram presos e torturados, sendo que alguns

deles chegaram a ser queimados nas chamadas fogueiras “santas”.

Nessa época se desenvolvem também as ideias sobre bruxaria emagia negra, atribuídas especialmente às mulheres. Ocialmente,

quem detinha todo o conhecimento eram os representantes da

igreja católica, que exerciam um poder muito grande sobre o

povo. O próprio rei só era coroado pelos bispos e governava sob

“as graças de Deus”.

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Mas, as mulheres que detinham conhecimentos sobre plantas

medicinais, que faziam partos, benziam etc., desaavam esse

poder e, por isso, eram chamadas de bruxas, seres endemoniados,

que estariam praticando magia negra.

Na verdade, essa era uma forma de afastar qualquer ameaça ao

poder da igreja católica. As pessoas acusadas de bruxaria eram

queimadas vivas em praça pública. Uma das referências mais

conhecidas sobre isso é Joana D’Arc, que foi canonizada e virou

santa no próprio catolicismo.

Bem, apesar da Santa Inquisição, a mente humana continuava

em busca de explicações para os fenômenos da natureza, para o

sentido da vida. Por isso, a Idade Média é também o período das

grandes invenções, como a imprensa criada em 1446 que, mesmona clandestinidade, possibilitou contatos cada vez mais amplos com

as novas ideias sobre o conhecimento do homem e da natureza.

Os relatos de viagens, as descobertas de novos territórios habitados

por povos de costumes diferentes, entre outros fatos, começaram a

pôr em xeque as ideias de um mundo imutável.

No século XVIII, considerado o século das luzes, das grandes ideias,

os lósofos iluministas começam a falar mais intensamente sobre o

homem e o progresso do mundo. Segundo os iluministas franceses,

o mundo estava em constante mudança e mudança para melhor.

“Penso, logo existo” era a célebre frase do lósofo Descartes.

Segundo ele, o homem só deve tomar como certo aquilo que

seja passível de explicação, aquilo que a razão possa explicar e

compreender. Ou seja, a minha existência está condicionada à

minha capacidade de pensar sobre ela. Estavam lançadas as bases

do método cientíco.

O discurso losóco dos iluministas sobre o homem e o progresso do

mundo vai estimular, entre outras coisas, as Revoluções Burguesas,

Revolução Francesa em 1789 e Revolução Industrial em 1750,

trazendo novas questões para a história do pensamento cientíco

ocidental.

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No século XVIII, formulam-se novas ideias que impulsionaram

extraordinariamente o conhecimento cientíco. Uma delas foi a

ideia de natureza como processo. Ou seja, a natureza pode ser

transformada pela ação do tempo, mas também pela ação dos

homens, e isso traz consequências para o destino da humanidade.

A ideia de uma “iluminação” interior, isto é, de uma fonte subjetiva

e imediata de conhecimento inerente à espécie humana, associada

à ideia de natureza em processo, possibilita novas reexões, onde

o homem passa a ser sujeito e objeto de conhecimento do próprio

homem.

A denição do conhecimento como atributo humano não excluía

a ideia do homem como criação divina, pois a fonte subjetiva eimediata de conhecimento de cada ser humano tanto pode ser

uma intuição intelectual de cada pessoa, como pode ser inspiração

divina.

Essa ideia está na base do iluminismo, um movimento intelectual

caracterizado pela atitude crítica em relação à tradição, pela

concepção de uma ordem racional do mundo, pela ideia de

transformação do mundo, pela ideia de transformação dos

homens e de suas culturas expressas no progresso da humanidade,perceptível com ampliação dos horizontes geográcos, pelo

conhecimento de povos com civilização independente da europeia,

como os chineses, ou com culturas consideradas primitivas, como

as de índios das Américas, de povos da África e de povos das ilhas

do Pacíco.

Essas reexões, portanto, consolidam-se como as bases de formação

das Ciências Sociais no século XIX, que têm a sociedade, a cultura, o

homem, seu pensamento, suas relações e realizações como objetos

de estudo.

O questionamento dos iluministas é contra o Teocentrismo. Admite-

se Deus como criador do mundo, mas não como governador da

máquina do mundo, pois este tem leis próprias, denidas pela

ação humana. É claro que os religiosos vão dizer que os homens

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só fazem o que fazem de acordo com a vontade de Deus, mas

esse é um outro debate, e eu não estou aqui para questionar nem

alimentar a fé de ninguém.

Um relato interessante foi apresentado pelo antropólogo Pertti J.Pelto, no livro Iniciação ao Estudo de Antropologia, um dos que

estou usando como base para este programa. Ele arma que:

Até o século XIX, muitos ou a maioria dos eruditosque se ocupavam da diversidade cultural humanae da história cultural haviam aceitado a idadeda Terra tal como a xara o Arcebispo Ussher em1650. O bom Arcebispo calculara, depois do estudocuidadoso das Escrituras, que o mundo havia sidocriado por Deus exatamente 4.004 anos antes donascimento de Cristo, e a essa teoria, o teólogo

Dr. Lightfoot acrescentara a demonstração deque ”céu e terra, centro e circunferência, foramcriados juntos, no mesmo instante... e o homemfoi criado pela Trindade no dia 24 de outubro de4.004 ... a. C., às nove horas da manhã”.

É claro que, na época, essa armação não causou o mesmo espanto

que está causando entre vocês agora, pois ainda estamos falando

de uma época em que o pensamento religioso era predominante.

Nas décadas de 1830 e 1840, no entanto, durante escavações na

França, foram econtradas algumas ferramentas que serviriam para

armar a existência do homem na terra, desde tempos muito maisantigos.

Em 1857, porém, foi encontrado um fóssil considerado um dos

primeiros habitantes da Europa. Por ter sido encontrado às margens

do Rio Neander na Alemanha, este esqueleto fóssil recebeu o nome

de “Homem de Neanderthal”.

Outras descobertas se seguiram a essa, acirrando ainda mais as

discussões entre a ciência e a religião, sobre a antiguidade do

homem na terra.

Em 1859, ao curso de uma longa excursão, Charles Darwin acumula

muitas informações sobre o homem e seu mundo natural, que

resultou na publicação da obra A Origem das Espécies, defendendo

a teoria da seleção natural dos seres vivos.

Fonte: http://images.google.com.br/images?q=capela+cistina

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A partir daí, os princípios básicos da evolução ganham importância

em todos os ramos do conhecimento. A ciência adquire status de

legitimidade para a explicação dos fenômenos do mundo. O estudo

do homem vai avançando, dando origem a conhecimentos cada

vez mais amplos.

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1UNIDADE

OBJETIVO DESTA UNIDADE:

Situar os alunos nocontexto histórico dastransformações que

originaram o surgimentoda Antropologia comoCiência, dedicadaao conhecimento dosaspectos biológicose culturais da vidahumana, possibilitandoa compreensão dassuas principais divisõese procedimentosmetodológicos.

CIÊNCIAS DA NATUREZA E CIÊNCIASHUMANAS

Para compreender as diferenças entre os estudos das

Ciências Naturais e das Ciências Sociais, precisamos

nos ater aos procedimentos metodológicos empregados

nesses dois campos de produção cientíca. É preciso

compreender a produção cientíca, a partir das relações

estabelecidas entre o pesquisador e o grupo estudado.

Um exemplo que, por nos ser bem próximo, serve para ilustrar:quando um cientista natural, principalmente das áreas da

Biologia ou da Agronomia (embora os biólogos e agrônomos

também atuem no campo das Ciências Humanas) estuda

as formas de reprodução dos caranguejos que habitam os

manguezais do Maranhão, ou os campos de babaçu das regiões

agrícolas do interior do Estado, os pesquisadores não interagem

necessariamente com o caranguejo ou com a palmeira de

babaçu. A relação com esses objetos de conhecimento não

interfere necessariamente neles, no sentido de uma troca de

sentimentos, estes continuarão sendo caranguejo e palmeira

de babaçu como antes.

Quando, porém, os cientistas sociais, principalmente antro-

pólogos, estudam as manifestações do bumba-meu-boi, dos

terreiros das religiões tradicionais de origens africanas, ou

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PEDAGOGIA24

as situações relacionadas ao trabalho das quebradeiras de coco

babaçu dos campos rurais maranhenses, o objeto de conhecimento

é o ser humano em suas várias dimensões.

Neste caso, sujeito e objeto se inuenciam reciprocamente.Durante o processo de conhecimento, estarão em jogo trocas

constantes de afetividades, valores e saberes. É possível ao

pesquisador, como diz Bronislaw Malinowsky, “pôr-se no lugar

do outro”, familiarizar-se com seus códigos de comunicação,

com suas linguagens e decifrá-las, a partir do reconhecimento do

investigado, não mais como objeto passivo de investigação, mas

como ator, sujeito e protagonista de sua própria história.

Outro aspecto importante na demarcação dessas diferentes

formas de abordagem cientíca é que os fenômenos da naturezasão repetitivos e podem, em certas condições, ser reproduzidos

em laboratórios.

Tanto as pesquisas sobre a reprodução dos caranguejos como sobre

as palmeiras de babaçu podem ser realizadas em laboratório, os

fatos e os fenômenos observados se mantêm na natureza, podem

ser reproduzidos sempre que desejarmos, ou quando for necessário.

Nos estudos sobre bumba-meu-boi, sobre religiosidade afro-

brasileira, ou sobre quebradeiras de coco, as situações não podemser reproduzidas nem congeladas para serem analisadas.

Mesmo que as pessoas realizem novamente a festa, como acontece

a cada ano, o ritual religioso, como acontece periodicamente,

de acordo com os respectivos calendários de cada terreiro, ou o

trabalho na lavoura, como acontece diariamente, as situações não

se reproduzirão da mesma maneira, os elementos componentes

daquele universo já não serão os mesmos, haverá certamente

outras pessoas, com situações diferentes, pode faltar dinheiro paraque a festa aconteça do mesmo jeito, o material para decoração

já não será o mesmo. Enm, vários motivos podem interferir,

fazendo com que um mesmo evento aconteça de forma diferente

a cada ano. Tudo isso precisa ser levado em conta para uma análise

coerente da situação observada.

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 1 25

Uma diferença marcante, portanto, é que a reconstituição

possibilita comparações aproximativas entre os rituais, festas

etc., ocorridos em períodos diversos. Ou seja, sempre é possível

comparar as festas ou rituais de um ano com as de outro, as festas

de uma região com as de outras etc. Porém, mesmo sendo rituais

ou festas semelhantes, nunca serão da mesma maneira, seja de

uma região para outra ou de um ano para outro.

Por outro lado, a reprodução de uma mesma experiência por

várias vezes possibilita o estudo objetivo tendente à exatidão.

Ou seja, nas Ciências Naturais, a objetividade e a comprovação

das hipóteses são determinadas pelas possibilidades de quantas

reproduções forem necessárias de um mesmo experimento. Isso

signica que as experiências com animais ou insetos, as análisesdo DNA, do cérebro ou do sangue, para descobrir doenças ou

para conhecer as potencialidades humanas, sempre serão feitas

da mesma forma e com os mesmos elementos, porque esses testes

podem ser isolados em laboratório.

Nas Ciências Sociais, a objetividade é dada pela delidade do

pesquisador às informações prestadas pelo sujeito da observação,

ou seja, quem organiza ou participa de uma atividade cultural

ou religiosa, quem vivencia determinadas experiências em seucotidiano ao longo de várias décadas, pode falar delas com

mais conhecimento. O pesquisador é apenas um tradutor desse

conhecimento em linguagem cientíca, mas para essa tradução

ser reconhecida como legítima, ele precisa respeitar o que o

informante está lhe dizendo e, a partir daí, comparar e analisar as

informações com as teorias.

O procedimento tradicional de pesquisa e apresentação de

resultados, tanto nas Ciências da Natureza quanto nas CiênciasHumanas, exige a adoção de critérios e procedimentos rigorosos,

em termos teórico-metodológicos, pois essa é uma condição

fundamental, não para comparar as ciências entre si, mas para

denir e diferenciar a análise e o conhecimento cientíco em

relação às especulações do senso comum.

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 1 27

observadas se tornaram objeto de estranhamento porque eram

distintas do conhecido, do familiar. As culturas diferentes foram

consideradas exóticas, isto é, estranhas para as concepções de

mundo dos europeus.

O contraste entre o familiar, o doméstico, o próprio, o característico-

do-nós e o estranho -próprio do outro- dá visibilidade à questão da

diversidade, colocando o desao de sua explicação.

A diferença, além de estranheza, provoca insegurança, porquanto

abala a certeza da ordem social. A tendência é a elaboração

de análises carregadas de noções pré-conceituosas, denindo o

diferente como inferior.

Recusa-se, desse ponto de vista, a reconhecer a concepção dooutro porque ele é diferente.

Assim ocorreu quando os gregos, em contato com os povos da Ásia

Menor, lhes deniram como bárbaros, considerando a diferença de

seus costumes. “Bárbaro”, para os gregos e romanos, transformou-

se em categoria classicatória dos povos estrangeiros, com

costumes diferentes, sem a civilização greco-romana e, por isso

mesmo, selvagens, incultos, grosseiros, desumanos.

O termo “bárbaro”, além de passar a ideia de não civilizado, passatambém a ideia de não humano, o que demonstra uma relação

recíproca entre civilização e humanidade. Nesse caso, a diferença

de grau de civilização implicaria diferença de grau de humanização,

consequentemente, os europeus atribuíram a si mesmos um grau

mais elevado de civilização em relação aos outros povos.

Até hoje, muitos de nós acreditamos na inferioridade dos negros,

dos índios, das mulheres e dos latinos, em relação aos homens

brancos europeus. Muitos de nós acreditamos que as religiões de

origens africanas são coisas do demônio, que nos causam medo,

quando, na verdade, foram os europeus que inventaram isso,

para fortalecer sua ideologia de dominação colonizadora e para

assegurar seu domínio sobre as riquezas econômicas e culturais

das regiões onde se instalaram.

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PEDAGOGIA28

As bases da hierarquia das diferenças encontram, desde então,

fundamentos na classicação de povos como bárbaros, embora

já se registrasse também a emergência de um pensamento mais

isento, fundante do relativismo das diferenças culturais.

Heródoto, o historiador grego comentado na introdução, ao

mesmo tempo em que registrava o estranhamento dos gregos ao

matriarcado, ou seja, a predominância das mulheres na transmissão

da herança familiar, registrou também sua conclusão de que todos

os povos, sem exceção, consideram seus costumes e suas crenças

melhores que os dos demais povos. Heródoto tem a percepção de

que o sentimento de autoavaliação na situação de comparação

entre culturas, se transforma em critério parcial, implicando

desvalorização do outro. Considera, todavia, a autovalorização

como um sentimento universal.

Passados vários séculos das aventurosas navegações dos gregos

do tempo de Heródoto pelo Mar Mediterrâneo, os espanhóis e

os portugueses descobriam as terras americanas, navegando

mares desconhecidos. A curiosidade e o espanto são mutuamente

expressos, revelando a rejeição pelo diferente, que é traduzido

por uma relação de inferioridade, atribuindo a esses povos uma

condição de selvageria e negando-lhes os atributos de humanidade,

questionando se o selvagem teria uma alma, como os “civilizados”europeus.

Essas noções preconceituosas estão reetidas no debate entre o

dominicano Las Casas e o jurista Sepulvera no século XVI, relatado

por François Laplantine (1999, p.38-49):

Àqueles que pretendem que os índios são bárbaros,responderemos que essas pessoas têm aldeias,vilas, cidades, reis, senhores e uma ordem políticaque, em alguns reinos, é melhor que a nossa. [...]

esses povos igualavam ou até superavam muitasnações do mundo conhecidas como policiadas erazoáveis, e não eram inferiores a nenhuma delas.Assim, igualavam-se aos gregos e aos romanos, eaté, em alguns de seus costumes, os superavam.Eles superavam também a Inglaterra, a França, ealgumas de nossas regiões da Espanha. [...] Poisa maioria dessas nações do mundo, senão todas,foram muito pervertidas, irracionais e depravadas,

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 1 29

e deram mostra de muito menos prudência esagacidade em sua forma de se governarem eexercerem as virtudes morais. Nós mesmos fomospiores, no tempo de nossos ancestrais e sobre todaa extensão de nossa Espanha, pela barbárie denosso modo de vida e pela depravação de nossos

costumes (Las Casas).

Aqueles que superam os outros em prudência erazão, mesmo que não sejam superiores em forçafísica, aqueles são, por natureza, os senhores;ao contrário, porém, os preguiçosos, os espíritoslentos, mesmo que tenham as forças físicas paracumprir todas as tarefas necessárias, são pornatureza servos. E é justo, e útil que sejam servos,e vemos isso sancionado pela própria lei divina.Tais são as nações bárbaras e desumanas, estranhasà vida civil e aos costumes pacícos. E será semprejusto e conforme o direito natural que essas pessoasestejam submetidas ao império de príncipes e

de nações mais cultas e humanas, de modo que,graças à virtude destas e à prudência de suas leis,eles abandonem a barbárie e se conformem a umavida mais humana e ao culto da virtude. E se elesrecusarem esse império, pode-se impô-lo pelo meiodas armas e essa guerra será justa, bem como odeclara o direito natural que os homens honrados,inteligentes, virtuosos e humanos dominem aquelesque não têm essas virtudes (Sepulvera).

Também o Diário de descoberta da América de Cristóvão Colombo,

as cartas de Hernan Cortez e as crônicas de narrações dos índios

sobre a conquista, recolhidas e publicadas por Leon-Portilla,

registram a curiosidade e a estranheza que a diferença provocava

entre índios e europeus.

Uns e outros ressaltam as diferenças físicas e culturais, mas lidam

de modo diverso com essa questão. Os espanhóis consideram

os índios ignorantes e, de acordo com o parecer do Almirante

da esquadra de Colombo, “não tinham nenhuma religião”. Os

espanhóis decidiram conquistar as terras dos índios, decidiram

que os índios deveriam ser convertidos em cristãos e serviçais.

O modo como descrevem os instrumentos indígenas e os seus

costumes denota uma clara relação de dominação e uma clara

desvalorização do outro, fundada na apreciação unilateral e auto-

centrada da diferença.

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PEDAGOGIA30

Os índios consideram os espanhóis ameaçadores, perigosos. O

modo como descrevem os instrumentos dos civilizados, os navios,

os cavalos que nunca tinham visto antes e o estrépito com que

chegaram evidencia medo, estranheza, perplexidade, respeito e

expectativa de violência.

Para os índios, isto era sobrenatural, por isso mesmo associaram

os espanhóis a deuses.

O eixo superioridade/inferioridade é antagônico na visão que

espanhóis e índios têm, um em relação ao outro. Para os espanhóis,

os índios são prováveis escravos, para os índios os espanhóis são

prováveis deuses. Esse modo de lidar com a diferença marcou o

devir da história da colonização das Américas e das relações decontato entre colonizadores e índios.

[...] cheguei às margens do grande mar e vi andarpelo meio do mar uma serra ou morro grande,que andava de um lugar para outro até chegar àsmargens” (Relato indígena da Conquista, p. 34).

[...] espécie de torres ou pequenos morros quevinham utuando sobre o mar. Neles vinhampessoas estranhas de carnes muito brancas, maisque as nossas carnes, todas têm barbas longas eos seus cabelos vão até as orelhas (Relato indígena

da Conquista in Leon-Portilla 1985, p. 31).

[...] vêm os cervos que trazem os homens em seuslombos.Com seus calções de algodão, com seusescudos de couro, com suas lanças de ferro. Suasespadas pendem dos pescoções de seus cervos.Estes têm cascavéis, estão encascavelados, vêmtrazendo cascavéis. Fazem estrépito as cascavéis,repercutem as cascavéis.Esses cavalos, esses cervos bufam, rugem. Suammares: o suor destilha deles como água. E aespuma de seus focinhos cai ao solo gotejando. Écomo água ensaboada com amole: gotas gordas aescorrer.

Quando correm fazem estrondo: fazem estrépito,sente-se o barulho, como se caíssem pedra nochão. Logo a terra ca revolvida, logo a terraenche-se de buracos onde eles puseram sua pata.Por isso, a terra só ca dilacerada onde puserammão ou pata (Relato Indígena registrado porSAHAGRIN in LEON-PORTILLA, 1985, p. 20).

Caravelashttp://www.lepanto.com.br/

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 1 31

Foi uma cilada muito bem feita e conseguimos mataruns quinhentos índios mais bravos e mais corajosos[...] A única perda que tivemos aquele dia foi umaégua, cujo cavaleiro caiu, e que saiu em corridasem rumo, indo parar no meio dos nossos inimigosque a echaram. Mesmo ferida ela veio até nosso

acampamento, mas acabou morrendo, o que nosdeu grande tristeza, pois os cavalos e éguas eramo grande sustentáculo de nossas vitórias (CORTEZ,1986, p. 93).

Antes do amanhecer do dia seguinte tornei asair com cavalos, peões e índios e queimei dezpovoados, onde havia mais de três mil casas. Comotrazíamos a bandeira da cruz e lutávamos por nossafé e por serviços de vossa sacra majestade, emsua real ventura nos deu Deus tanta vitória, postoque matamos muitos sem que nenhum dos nossossofresse dano (CORTEZ, 1986, p. 33).

A diversidade observada pelos conquistadores em uma postura

comparativa, fortalecia o fator da desigualdade e da inferioridade.

Não conseguiam apreender a originalidade da diferença. Não

conseguiram pensá-la como simples expressão da diversidade, como

evidência da pluralidade, como possibilidade de multiplicidade. Só

muito mais tarde, já no nal do século XIX, essas ideias começaram

a mudar.

A fase da curiosidade contribuiu com o desenvolvimento de umavolumosa literalidade etnográca, ainda que desarticulada.

Começou a ser superada pelo iluminismo, inaugurando-se a

fase aproximativa da diferença na busca de comparação. Com

a expansão europeia, ampliou-se o contato com a diferença.

Muitas descrições etnográcas, motivadas pela curiosidade, foram

produzidas por viajantes, missionários e administradores coloniais.

No século XVIII, com os questionamentos apresentados pelos

iluministas, superou-se a fase da curiosidade, das conclusõesprecipitadas, tiradas das relações entre cultura europeia e cultura

dos outros povos. É o começo da etnologia comparativa, ou seja,

o estudo mais detalhado dos costumes, com vistas a encontrar

uma explicação para certas correspondências de práticas culturais

entre povos de culturas diferentes.

AldeiasMicrosoft Ofce

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PEDAGOGIA32

Procurava-se fazer a analogia, entre usos e costumes de povos

indígenas, com usos e costumes dos povos registrados na Bíblia

e nas obras de escritores da antiguidade clássica. A questão de

fundo era a explicação da cultura europeia em confronto com

as culturas dos povos “selvagens”. Emerge, na fase iluminista, opropósito de se buscar uma explicação das semelhanças entre usos

e costumes de diferentes povos indígenas, em diferentes regiões

da terra, tendo-se como postulado a unidade do gênero humano.

Partindo-se dessa concepção, tradições de povos indígenas seriam

evidências de etapas anteriores, vestígios da mais recuada

antiguidade, anterior à própria antiguidade clássica.

Desenvolve-se o conceito de civilização como conceito explicativo,

na perspectiva da civilização como aperfeiçoamento natural

do homem. Os iluministas consideravam as culturas dos povos

indígenas como expressão de um momento civilizatório, um

estágio de evolução, uma etapa civilizatória regulada pelas leis da

natureza – um estágio anterior ao desenvolvimento da sociedade

europeia em que viviam.

Surge o conceito de “homem natural”, isto é, do homem em

estado natural, numa civilização entre selvagens, bárbaros e

civilizados, fundada na concepção de unidade histórica do homem

e de suas culturas. Estavam construídas as bases conceituais quepossibilitam, mais tarde, o desenvolvimento do evolucionismo.

Será preciso esperar o século XVIII, para entrarmos na modernidade,

conforme mostra Michel Foucault (1966), e só então se pode

apreender as condições históricas e culturais, para a constituição

de um projeto antropológico, com um saber que não resulte

apenas de reexão ou contemplação, mas de observação empírica

sobre a existência concreta do homem, sobre suas instituições,

linguagens, comportamentos e relações de produção. Um saber,

enm, que possibilite a construção de novos conceitos, começando

pelo próprio conceito de homem, enquanto objeto e sujeito do

conhecimento.

A partir do século XVIII, portanto, a problemática comparativa

entre as culturas dos povos indígenas, a Bíblia e a Antiguidade

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 1 33

Clássica, cedem lugar à problematização das origens da vida e da

cultura. Rompem-se com os limites antropocêntricos, amplia-se a

ideia de origem, superando-se a rigidez das teorias criacionistas

então vigentes.

Curiosidade. É tão forte que estamos dispostos até a perder

o paraíso, pelo gozo efêmero de ver aquilo que ainda não foi

visto. É assim que a nossa estória começa, num dos mais antigos

mitos religiosos. Preferimos morder o fruto do conhecimento,

com o risco de perder o Paraíso, pela alegria de um outro

gozo: saber...

Ali está, diante de nós, a coisa fascinante. Mas não nos bastaver o que está de fora. É preciso entrar dentro, conhecer

os seus segredos, tomar posse de suas entranhas. Não é isto

que acontece com a própria experiência sexual? Os judeus,

no Antigo Testamento, empregavam uma única palavra para

designar o ato de conhecer e o ato de fazer amor. “E Adão

conheceu a sua mulher, e ela cou grávida...” É assim mesmo

que acontece no conhecimento. Primeiro, o enamoramento.

Quem não está de amores com um objeto não pode conhecê-

lo. Depois vêm os movimentos exploratórios, a penetração,

o conhecimento do bom que estava oculto, experiência de

prazer maior ainda.

O fascínio do giro das estrelas, dos descaminhos dos cometas, a

beleza dos cristais, joias simétricas – ah! Quem fez a natureza

deve ser um joalheiro para fazer coisas tão lindas assim, e

também um grande geômetra para traçar nos céus os caminhos

matemáticos dos astros; quem sabe um músico, que toca

músicas inaudíveis aos ouvidos comuns, e somente perceptíveis

aos que conhecem as harmonias dos números! – os ímãs, seresparapsicológicos, que puxam o ferro sem tocar, todos os corpos

do espaço, grandes ímãs, se puxando uns aos outros, atração

universal, amor universal, as marés que balançam aos ritmos da

lua e do sol, as plantas, mistérios, também ao ritmo da luz, suas

harmonias com as abelhas, a loucura, os sonhos, esta fantástica

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PEDAGOGIA34

loteria que se chama genética, os animais arranjados em ordem

de complexidade crescente, tudo sugerindo que uns foram

surgindo dos outros, Darwin, a inação, que bicho é este, que

ninguém consegue domar?, nossa permanente intranquilidade,

seres invisíveis, os deuses, a agressividade, o sadismo, porque será que há pessoas que sentem prazer no sofrimento dos

outros?, as massas, boiadas estouradas, sem limites e sem moral,

“Hei Hitler!”, e as pessoas lutam para deixar de fumar e não

conseguem e, de repente, sem nenhum esforço, algo acontece

por dentro, e param de um estalo...

Não há limites para os mistérios. Alguns parecem pequenos, e

moram nas coisas simples do cotidiano. E nisto o cientista tem

algo que o liga ao poeta. Porque um poeta é isto, alguém que

consegue ver beleza em coisa que todo mundo pensa ser boba

e sem sentido. Por favor, leia Adélia Prado, mulher comum que

os deuses, brincalhões, dotaram desta graça incompreensível de

poder transgurar o banal em coisa bela, aquilo de que ninguém

gosta em coisa erótica.

Como no seu poema sobre limpar peixes com o seu marido. O

cientista é a pessoa que é capaz de ver, nas coisas insignicantes,

grandes enigmas a serem desvendados, e o seu mundo se enche

de mistérios. Moram em nós mesmos, nos gestos que fazemos,nas doenças que temos, em nossos sonhos e pesadelos, ódios e

amores; na nossa casa, no jardim, pela rua... Outros parecem

enormes e têm a ver com o início do universo, as profundezas do

espaço, as funduras da matéria. Mas tudo é parte de um mesmo

universo maravilhoso, espantoso, que nos faz tremer de gozo e de

terror, quando nos abrimos para o seu fascínio e penetramos os

seus segredos. Há o mistério das coisas, há o mistério das pessoas,

universos inteiros dentro do corpo, mundos bizarros que aoram

nas alucinações dos psicóticos, e que nos arranham vez por outra,dormindo ou acordados, as funduras marinhas da Cecília Meireles,

as orestas do Rilke, Édipos, Narcisos, pessoas grandes por fora

onde moram crianças órfãs. Grandes solidões que buscavam a

presença de outras, os mundos da cultura e da sociedade, das festas

populares e das grandes celebrações coletivas e, repentinamente,

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 1 35

nos damos conta de que os enigmas coletivos da Via Láctea são

pequenos demais comparados com aqueles das pessoas que vemos

todo dia. Só que nossos olhares caram baços, e não percebemos

o maravilhoso ao nosso lado. Se fôssemos tomados pelo fascínio,

então pararíamos para ver e veríamos coisa de que nunca havíamossuspeitado.

Mas, em tudo isto, é preciso não esquecer de uma coisa: ciência

é coisa humilde, pois se sabe que a verdade é inatingível. Nunca

lidamos com a coisa mesma, que sempre nos escapa. Aquilo que

temos são apenas modelos provisórios, coisas que construímos

por meio de símbolos, para entrar um pouco no desconhecido

(MARCELINO, 1988. p.13.14.15)

Considerando o que foi dito até agora, formem grupos com cinco

pessoas para discutir as seguintes questões:

Como ponto básico, podemos dizer, numa formulação

que será ampliada nos próximos capítulos, que o social

(e cultural) é tudo aquilo que independe da natureza

interna (genética ou quadro genético) ou externa

(fatores ambientais, naturais) (DAMATTA, 2000, p. 45).

Quais os fatores que elevam a antropologia ao status de

ciência e quais os elementos principais que caracterizam

a mesma enquanto uma ciência social?

Discuta sobre os principais fatos históricos que

contribuíram para o surgimento da antropologia.

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PEDAGOGIA36

Como é possível diferenciar as ciências humanas e as

sociais das ciências exatas e naturais?

Concluídas as discussões, cada grupo deve fazer uma explanação

do resultado da atividade.

1492: A CONQUISTA DO PARASO (1992)

SinopSe: depardieu interpreta cristóvão coloMBo, uM intrépido naveGador 

que descoBre uMa nova rota para cheGar às  índias, poréM não deixa de estar  suJeito às traições e carnificinas que  suas viaGens trariaM coMo 

consequência. o filMe trata das duas priMeiras viaGens que se tornaraM 

uM Marco na vida desse alMirante e nos leva à terceira e últiMa etapa 

da desluMBrante aventura. Bravura e ceGueira, triunfo e desespero e a 

arroGância do velho Mundo, eM contraste à inocência do novo Mundo,

sucedeM, nessa ordeM, uMa história Guiada por poder e paixão extreMados.

é a conquista do paraíso, o coMeço de uMa nova era.

Direção: ridley scott

Gênero: aventura

elenco: Gérard depardieu, arMand assante, siGourney Weaver, loren 

dean, ánGela Molina, fernando rey, Michael Wincott, tchéky karyo,

kevin  dunn, frank  lanGella, Mark  MarGolis, kario  saleM, Billy  l.

sullivan, John heffernan, arnold vosloo.

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 1 37

EM NOME DA ROSA (1986)

SINOPSE: eM 1327, uM MonGe franciscano teM a aJuda de uM noviço na 

investiGação de uMa série de estranhas Mortes eM uM Mosteiro no norte 

da itália, durante a idade Média.DIREÇÃO: Jean-Jacques annaud

GÊNERO: draMa, policial, suspense, thriller

ELENCO: sean connery, christian slater, f. Murray aBrahaM, valentina 

varGas, ron perlMan, Michael lonsdale, WilliaM hickey, elya Baskin,

feodor  chaliapin  Jr., helMut q ualtinGer, volker  prechtel, Michael 

haBeck, urs althaus.

LUTERO (2003)

SINOPSE: a BioGrafia de Martinho lutero (interpretado no filMe por 

Joseph fiennes), aleMão fundador da iGreJa protestante. devido aos 

aBusos da  iGreJa católica no século xvi, coM Grande exploração de 

seus fiéis, lutero lutou por uMa iGreJa Mais liMpa e voltada para deus,

seM a corrupção dos poderosos católicos da época

DIREÇÃO: eric till

GÊNERO: BioGrafia/draMa

ELENCO: alfred Molina, Joseph fiennes, Jonathan firth, claire cox

A RAINHA MARGOT (1994)

SINOPSE: aGosto de 1572: MarGuerite de valois, irMã do  iMaturo rei 

carlos i, é Bela, JoveM e católica. na frança, trava-se uMa sanGrenta 

Guerra  reliGiosa. para  iMpor  a  paz  e  reforçar  o  doMínio  da  frança,

a Mãe, catarina de Médicis, casa-a à força coM henrique de navarra,

protestante huGuenote e o futuro rei henrique iv. na soMBra, catarina de Médicis continua a exercer o poder ordenando assaltos, envenenando 

e  instiGando ao  incesto. Mas a noite de 24 de aGosto que ficou para 

seMpre para  a  história  coMo  o Massacre  de  s. BartoloMeu, aproxiMa-

se... sacrificada às razões de estado, a rainha MarGot vai, no entanto,

conhecer o aMor coM uM outro huGuenote, o senhor de la Mole.

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PEDAGOGIA38

DIREÇÃO: patrice chéreau

GÊNERO: draMa

ELENCO:  isaBelle  adJani, daniel  auteuil, Jean-huGues  anGlade,

vincent  perez, virna  lisi, doMinique  Blanc, pascal  GreGGory,claudio aMendola, MiGuel Bosé, asia arGento, Julien rassaM, thoMas 

kretschMann.

APOCALyPTO (2006)

SINOPSE: uM  hoMeM  é  capturado  para  ser  sacrificado, eM  noMe  da 

prosperidade do  iMpério Maia. ele conseGue fuGir e tenta voltar para 

casa o Mais rápido possível, para salvar sua faMília.

DIREÇÃO: Mel GiBson

GÊNERO: aventura

ELENCO: 

rudy  younGBlood  (JaGuar  paW), dalia  hernandez  (seven),

Jonathan  BreWer  (Blunted), Morris  BirdyelloWhead  (flint  sky),

carlos eMilios Baez (turtles run), raMirez aMilcar (culr nose), israel 

contreras  (sMoke froG), israel rios (cocoa leaf), Maria  isaBel diaz 

(soGra), iazua  larios  (sky  floWer), raoul  truJillo  (zero  Wolf),

Gerard taracena  (Middle  eye), rodolfo  palacios  (snake  ink), Mayra serBulo, espiridion acosta cache.

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2UNIDADE

OBJETIVOS DESTA UNIDADE:

Mostrar a trajetóriade construção da

Antropologia desdeo século XIX, suasdenições e divisões,levando a compreendertambém o que osantropólogos estudam(objeto de estudo).

Abrir as portas daschamadas escolasdo pensamentoantropológico,

conhecendo seusprincipais pensadores eseus conceitos, visandocompreender suastendências e formasde abordagem sobre asculturas humanas.

O DESENVOLVIMENTO DA ANTROPO-LOGIA: definição, divisões, objeto e métodos

Oconceito de cultura é o conceito chave da explicação,

ou da interpretação antropológica, e, como tal, é a

chave mestra de investigação em todas as áreas e

especializações da Antropologia, pois é em torno desse conceito

que a Antropologia vai construir suas teorias e métodos de

pesquisa.Antes, porém, de iniciar esse percurso, é conveniente remover

algumas pedras do caminho, facilitando o entendimento dos

desdobramentos e implicações das novas dimensões que o conceito

de cultura vai incorporando, desde a criação da Antropologia, no

m do século XIX.

Pretendemos situar as limitações iniciais com que a Antropologia

dene seu objeto, para ampliar as áreas de estudo, o que

chamamos de “olhar antropológico”.

Definindo o objeto da Antropologia

A Antropologia dene como objeto original de suas investigações,

os povos sem escrita, as sociedades tribais da África e das

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PEDAGOGIA40

Américas, denidas como “sociedades primitivas”, que transmitem

o conhecimento através da fala.

Pensando em termos comparativos, a História tradicionalmente

se ocupava do estudo do desenvolvimento das sociedades,investigando sua documentação, sua memória escrita. A

Antropologia, por sua vez, se ocupou das sociedades longínquas,

isto é, com assentamento em lugares distantes. Esses povos

possuíam tecnologia simples em relação às sociedades europeias,

pouca amplitude de contatos sociais, população e território de

dimensões mais restritas, mesmo em termos de especialização

das atividades e funções sociais. Cabia à Antropologia realizar o

esforço de estudar suas tradições, usos e costumes.

Assim, a reexão antropológica toma primeiramente, como objetode estudo, as sociedades chamadas “simples”, distanciadas e

diferenciadas das sociedades europeias.

 Para os pioneiros da Antropologia, as sociedades “simples” eram

tomadas como situação de laboratório, como expressão – no

presente – de estágios anteriores de sua própria sociedade, das

sociedades “complexas”, associadas à civilização ocidental.

No entanto, a Antropologia não permanece presa a essa

comparação da diferença entre sociedades “simples” e sociedades

“civilizadas”. Começa a enfocar a diferença no interior das

próprias sociedades, buscando novas formas de abordagens dos

grupos sociais diferenciados, mesmo que esses grupos pertençam

à sociedade urbano-industrial contemporânea, mas sejam

culturalmente distanciados na forma de viver.

Sua especicidade cientíca, como campo de conhecimento, não

se restringe ao estudo de sociedades indígenas, ou de camponeses.

Abrange as múltiplas dimensões do ser humano em sociedade.

A tendência atual, na Antropologia, é deslocar o foco da discussão

da especicidade do objeto para a especicidade de sua prática.

Ou seja, o importante não é mais quem é estudado, mas a maneira

como se estuda.

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 2   41

Ao longo de sua trajetória cientíca, a Antropologia acumulou

muitas informações sobre populações de diversas partes do mundo.

O aperfeiçoamento de seus métodos e técnicas de investigação

permitiu a elaboração dessas informações em diferentes esquemas

de análise, sob diferentes enfoques e múltiplas dimensões. Isto levouao surgimento de campos especializados do saber antropológico,

com abordagens, corpo teórico e técnicas de pesquisa próprios.

Já não é mais possível a um antropólogo deter o conhecimento

ampliado que caracterizava os antropólogos dos séculos XIX,

dominando os vários ramos do saber antropológico, dando conta das

diversas tendências e aberturas, tanto no campo da Antropologia

Física, quanto no campo da Antropologia Cultural.

Atualmente, os antropólogos ligados à Antropologia Físicaaproximam-se das áreas da Biologia, Paleontologia ou Genética,

enquanto que o antropólogo (ou etnólogo) que se aplica ao estudo

da Antropologia Cultural ou Social tem formação básica na área

das Ciências Sociais.

No Brasil, a Antropologia Social já apresenta várias especialidades:

Etnologia Indígena, Antropologia Rural, Antropologia das

Populações Afro-Brasileiras, Antropologia Urbana. Cada um

desses campos especializados tende, por sua vez, a comportar

níveis cada vez mais amplos de especialização.

Existe, hoje, uma vasta produção sobre Etnologia Indígena, por

exemplo, possibilitando ao antropólogo tornar-se um especialista

no conhecimento dos povos indígenas das várias regiões do país.

Na Antropologia Rural, por sua vez, a tematização contempla

trabalhadores rurais, migrantes, sem-terras, comportando, todos

esses temas, níveis correspondentes de especialização.

A Antropologia das Populações Afro-Brasilerias dispõe, também, deamplos estudos que enfocam questões de raça, etnicidade, gênero,

identidade, comunidades quilombolas etc.. Novas abordagens

estimulam discussões, abrindo outras perspectivas teóricas.

A Antropologia Urbana vem se ocupando da vida social nas grandes

cidades, enfocando, especialmente, a diversidade cultural. Há,

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PEDAGOGIA42

ainda, outras tendências de especialização temática, como religião,

família, gênero, infância, velhice, homossexualismo, saúde etc.

Para constituir-se de um corpo teórico e metodológico que a

qualica como ciência dedicada ao estudo das diversidades eespecicidades das culturas humanas, a Antropologia seguiu uma

trajetória, ampliando suas reexões, questionando seus próprios

conceitos, desde as concepções teóricas do Evolucionismo do

século XIX até dias atuais.

Definição e Divisões da Antropologia

O desenvolvimento do estudo dos grupos humanos, portanto,

se deu desde os primeiros contatos entre os povos do mundo.

O esforço de sistematização sobre esse conhecimento tem sido

historicamente estimulado cada vez que nos defrontamos com

outros seres humanos diferentes de nós.

Ao observarmos as diferenças do outro, ou seja, os grupos com

os quais não temos contatos próximos, acabamos nos olhando e

nos observando também, o que nos leva a nos conhecer melhor,

na medida em que percebemos mais claramente o que é comum

entre nós e o que nos distingue do outro. As situações comuns

partilhadas por um grupo, além de particularizá-lo em relação aos

outros, permite denir o seu pertencimento a uma comunidade.

A Antropologia procura decifrar e compreender as populações

humanas, no âmbito das suas diferentes formas de viver

em sociedade. Numa formulação bastante ampla e geral, a

Antropologia estuda o homem e suas realizações; numa formulação

mais aproximativa, a Antropologia estuda a sociedade como umsistema de símbolos e signicados. Uma das características das

populações humanas, e talvez a mais importante, é sua diversidade.

Sendo uma das ciências que têm o homem como objeto de

conhecimento, a antropologia procura responder a questão central

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 2   43

do signicado da diferença, visando abarcar a totalidade da vida

humana em termos biológicos e culturais. O nome antropologia,

deriva de duas palavras gregas. Anthropos, que signica homem

e Logos, ou mais precisamente Logia, cujo signicado remete a

estudo, ciência ou conhecimento. Daí a denição da Antropologiacomo “Ciência de Estudo do Homem”.

Certamente, a antropologia não é a única ciência que estuda o

homem, muitas outras disciplinas cientícas podem ser arroladas

nesse mesmo quadro, como a Sociologia, a Psicologia, a Genética,

dentre outras.

O que caracteriza a Antropologia e a distingue das demais ciências

é o seu objetivo de estudar o homem em todas as suas dimensões.

A unidade da Antropologia, diz o antropólogo Melville Herskovits:

Está no fato importantíssimo de que a Antropologia,centrando sua atenção no homem, leva em contatodos os aspectos da existência humana, biológicae cultural, passada e presente, combinando essesdiversos materiais numa abordagem integrada doproblema da existência humana. Diversamente dasdisciplinas que tratam de aspectos mais restritosdo ser humano, a Antropologia frisa o princípio deque a vida não se vive por categorias mas é umacorrente contínua (HERSKOVITS, 1978, p.16).

Ao mesmo tempo que se propõe a ser uma disciplina especializada,

a Antropologia tem um projeto abrangente, envolvendo temas de

estudo de outras áreas, como a biologia, a geograa, a psicologia,

a sociologia etc.

Para dar conta de uma proposta tão abrangente, alguns

antropólogos estabeleceram uma divisão da Antropologia em duas

grandes áreas: Antropologia Física e Antropologia Cultural.

Antropologia Geral

Antropologia Física

Antropologia Cultural

Etnologia

Linguística

Arqueologia

EtnograaAntropologiaSocial

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PEDAGOGIA44

A Antropologia Física dedicou-se ao estudo dos aspectos biológicos

do homem. Essa área procurou estudar os processos evolutivos da

espécie humana, adotando procedimentos das Ciências Naturais

para detectar as origens, semelhanças e diferenças entre os homens.

A partir desses procedimentos, desenvolveram-se estudos

das raças, caracterizando o homem em raças diferentes,

apresentando estágios de desenvolvimento diferenciados de

acordo com as características biológicas. Esses conhecimentos

contribuíram signicativamente para a classicação dos povos em

raças superiores e inferiores, resultando, entre outras coisas, no

extermínio dos povos indígenas da América e na escravização dos

povos negros da África.

A Antropologia Cultural se propõe ao estudo do homem comoser cultural, analisando as múltiplas dimensões do ser humano

em sociedade, seus comportamentos e sua produção material. O

estudo da cultura aborda as dimensões simbólicas da ação social.

Toda sociedade possui sua cultura, um sistema de signos que podem

ser analisados, como componentes de um modo de comunicação.

A cultura consiste em estruturas de signicado socialmente

estabelecidas, fornecendo a cada indivíduo do grupo um mapa,

uma referência para situar-se, em relação a sua sociedade e em

relação aos outros indivíduos ou grupos.

Toda cultura implica uma tradição social e historicamente

construída, com regras e normas elaboradas e vivenciadas

coletivamente. Ou seja, dentro de uma mesma cultura, as pessoas

falam a mesma língua, compartilham situações comuns de família,

religiosidade, trabalho, vestimenta, festas etc.. Ao mesmo tempo,

dentro de uma mesma cultura, é possível haver variações nas

formas de se relacionar com essas coisas.

As formas de trabalhar, de rezar, de se casar etc. podem ser

diferentes, mas as instituições, casamento, trabalho e religião

continuarão existindo. Alguém pode até mudar o jeito de se vestir,

mas nunca deixa de usar roupa, porque essa é uma convenção

estabelecida pela cultura.

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 2   45

É no plano da cultura que se torna possível reetir o homem

como criação do próprio homem. Para responder à natureza,

desenvolveu a capacidade de modicar-se, pensando e produzindo

diferentes possibilidades de respostas, projetando a compreensão

da diversidade e da pluralidade por meio da conversa com o outro.

Se o ser humano não tem a mesma capacidade orgânica dos outros

animais, de criar uma couraça ou pelos no corpo para se proteger

do frio, se não tem a mesma agilidade de um uma onça ou de uma

cobra, se não pode carregar a casa nas costas, como as tartarugas,

se não pode permanecer muito tempo embaixo da água, como os

peixes, ele é dotado de um cérebro muito complexo, que lhe dá

capacidade para produzir abrigos e equipamentos, permitindo-lhe

sobreviver a todas essas situações e a todas as transformações da

natureza.

A forma como esses equipamentos são produzidos vai ser dada

pela cultura e é diferente, de acordo com a época, o povo e a

região onde são produzidos. Por isso, os povos de cada cultura

vivem de formas diferentes, têm casas diferentes, se alimentam

de coisas diferentes. Essa é uma das características da diversidade

cultural humana, campo de estudo da Antropologia.

A Antropologia Cultural é subdivida em Etnologia, Linguística e

Arqueologia, e ainda, a Etnologia recebe outra divisão: Etnograa

e Antropologia Social.

Linguística é o estudo cientíco da linguagem. Estuda a

linguagem como patrimônio cultural de uma sociedade, possibilita

compreender como os indivíduos expressam seus valores, suas

preocupações e justicam seu universo social tanto através da

literatura escrita como da tradição oral.

A Arqueologia é associada à Antropologia Física, pois revelaaspectos do passado de uma cultura material. Ou seja, possibilita

o conhecimento sobre uma cultura já extinta, através da análise

de objetos e inscrições mediante escavações em moradias antigas

como monumentos, objetos de artes, ferramentas e outros

materiais produzidos pela ação humana.

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PEDAGOGIA46

Etnologia é também chamada Antropologia Social ou Cultural.

Ocupa-se do estudo comparativo da cultura, procurando identicar

semelhanças e diferenças entre os povos. Analisa o desenvolvimento

das relações internas de uma cultura, e também as relações entre

as culturas. Etnograa é uma das etapas do estudo antropológico,dedicada à descrição dos costumes, da cultura e das formas de vida

dos povos e dos problemas teóricos da análise sobre os costumes

humanos.

Atualmente, cada uma dessas áreas tornou-se uma disciplina

isolada, com um corpo teórico próprio. A Antropologia Física

relaciona-se mais aos estudos de genética, paleontologia e

biologia. A arqueologia relaciona-se com a geograa e a história.

No campo dedicado ao estudo das Culturas, existe uma identicaçãomaior entre Antropologia Cultural, Antropologia Social, Etnologia

e Etnograa, que podem se dedicar ao mesmo objeto de estudo,

recebendo distinções de acordo com a nacionalidade. Ou seja, a

Antropologia Social vem de uma tradição britânica, inuenciada

pelos etnólogos franceses, enquanto a Antropologia Cultural vem

da tradição norte-americana, desenvolvida nos estudos sobre

comportamentos culturais dos diversos povo daquela sociedade.

  DESENVOLVIMENTO DAS ESCOLAS ANTROPOLÓGICAS

Abordagem Evolucionista

A Antropologia surge como ciência no nal do século XIX, no

momento de intensa efervescência intelectual em toda a Europa.O conceito de progresso, desenvolvido pelos humanistas do século

XVIII, ao universalizar-se, pavimentou solidamente a estrada por

onde caminharia mais tarde, sem maiores tropeços, o conceito de

evolução.

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 2   47

Charles Darwin, a partir dos avanços de seus precedentes no

campo da Biologia, realizou a síntese das ideias sobre evolução

e desenvolveu sua tese explicativa da origem das espécies. A

generalização teórica da evolução das espécies permitia não só

explicar a diversidade dos seres vivos, como problematizar seuaparecimento, desaparecimento e os processos biológicos que

permitem a variabilidade de formas orgânicas.

A teoria evolucionista signicou uma revolução teórica sem

precedentes no século XIX, colocando em xeque as categorias

xas do pensamento medieval, confrontando-se com as teses do

criacionismo e fornecendo, sem dúvidas, uma base lógica para a

superação das explicações teológicas sobre os eventos biológicos

e culturais do universo.

A repercussão do abalo dessas explicações evolucionistas sobre o

sentido da vida e da morte gerava insegurança, e se associava à

dimensão psicológica da vaidade ferida do homem, em perder sua

posição de rei e senhor da criação para tornar-se simplesmente

uma entre as múltiplas possibilidades de resultado do processo

evolutivo.

É no contexto desses embates ideológicos que os primeiros

antropólogos se esforçavam por estabelecer a ciência da cultura,

atribuindo-se como tarefa inicial a reconstrução do esquemaevolucionista da cultura, para explicar a diversidade cultural do

homem.

Tylor, pioneiro da ciência antropológica, formulou o primeiro

conceito cientíco de cultura, como “conjunto complexo que

inclui conhecimento, crenças, arte, moral, lei, costumes e

quaisquer outras capacidades, e hábitos adquiridos pelo homem

como membro da sociedade”.

O conceito, como proposição descritiva, fornece suporte dereferência para o estudo etnográco das diversas culturas, a partir

dos seus componentes (conhecimentos, crenças, arte, moral, lei,

costumes). Como generalização empírica, toda cultura presente,

passada e futura é conceituada como conjunto complexo. Patenteia

a possibilidade de descrição e de comparação.

Charles Darwinhttp://bbsnews.net/bbsn_images_2005_summer/undated_charles_darwin.jpg

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PEDAGOGIA48

O que é cultura? O conceito procura responder a essa questão,

explicando-a como fenômeno distinto, como realidade empírica

passível de descrição, de análise e de explicação.

Na comparação entre as diferentes culturas, os antropólogosevolucionistas pretendiam reconstruir, inspirados no evolucionismo

biológico, os estágios de evolução cultural da humanidade, até

chegar ao estágio de evolução da sociedade europeia, considerada

o topo do desenvolvimento cultural.

O conceito de sobreviência, associado ao conceito de evolução

e ao conceito de cultura, fornece o esquema explicativo para

os estudos preconceituosos, denindo os grupos humanos

em estágios de desenvolvimento do mais primitivo ao mais

civilizado.

Como a linha evolutiva se associa à inviabilidade do progresso,

toda cultura deve passar pela mesma sucessão de fases, ou

estágios de desenvolvimento, na sua marcha evolutiva entre

a selvageria, a barbárie e a civilização.

Utilizando observações e registros de viajantes e missionários,

os antropólogos procuravam comparar componentes das

diversas culturas, para estabelecer a sua fase de evolução,com base no estado de desenvolvimento dos meios de

produção, da religião, da organização social, enm, de todos

os componentes do conjunto.

Utilizando o conceito de cultura e o método positivista de estudo,

esses antropólogos analisaram um formidável volume de dados

culturais de diferentes povos. No campo das representações

sociais, por exemplo, Taylor conclui que a manifestação religiosa

mais primitiva é a crença de que almas e espíritos animam todasas coisas e todos os seres vivos do universo. Denominou esse

estágio religioso “primitivo” de animismo e propôs a seguinte

escala evolutiva religiosa: animismo>idolatria>politeísmo>

monoteísmo.

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 2   49

Realizando estudos sobre parentesco como fundamento da

organização social e política, Morgan, outro importante

antropólogo evolucionista, concluiu que a sequência evolutiva

da organização familiar foi a seguinte: promiscuidade>

matriarcado>patriarcado. Seus estudos comparativos sobre

meios de produção levaram-no a concluir que, no estágio

selvagem, o homem vive de caça, pesca e coleta. No estágio

bárbaro, o homem cria a agricultura, instrumentos, máquinas

e indústrias.

O PROGRESSO TÉCNICO DA HUMANIDADE, SEGUNDO A VISÃO EVO-

LUCIONISTA, PODE SER ESQUEMATIZADO NO SEGUINTE QUADRO:

Na rigidez do esquema, as culturas dos chamados povos primitivos

seriam, na atualidade, expressão de estágios e graus de evolução

anteriores à civilização. Sob esse mesmo enfoque, a permanência de

aspectos culturais primitivos mais avançados (como superstição nas

culturas europeias) seria explicada pelo conceito de sobrevivência.

O evolucionismo deu importante contribuição ao conhecimento

antropológico, ressaltando a importância da cultura, como

fenômeno observável, analisável, interpretável, o que lhe confere

o estatuto de objeto de estudo cientíco.

ESTÁGIO GRAU DESENVOLVIMENTO

Selvagem

Baixo

Médio

Alto

Invenção da linguagem

Uso do machado

Invenção do arco e da echa

Bárbaro

Baixo

Médio

Alto

Invenção da cerâmica

Pastoreio, agricultura, irrigação

Domesticação do ferro

Civilização

Baixo

Médio

Alto

Invenção da escrita

Invenção da pólvora, da bússola, do papel,da imprensa

Invenção da máquina, da indústria

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 2   51

As diferenças de progresso cultural são mostras empíricas de

estágios tardios, indo da mais ou menos arcaica às mais ou menos

civilizadas.

Todavia, os termos dessas concepções deram margem aentendimentos equivocados, levando à universalização da

inferência da superioridade das sociedades mais civilizadas e da

inferioridade dos mais arcaicos ou primitivos, transpondo-se a

explicação de modo desordenado, sem nenhuma análise crítica do

campo biológico para o campo social.

A ideologia etnocêntrica da superioridade das culturas europeias

se disseminou como verdade. O etnocentrismo, como princípio

classicatório das culturas, relegou todos os povos não europeus

a planos inferiores. O etnocentrismo tomou a forma de racismo,ideologia perversa que legitima a violência de homens contra

homens, a privação da igualdade de direitos baseada na diferença

de cor, na diferença de origem racial, como se a condição de

humanidade fosse redutível a traços fenotípicos e os homens

fossem uns mais humanos, e outros menos.

O caráter apriorístico dos esquemas evolucionistas acabaram por

despertar reserva, uma vez que eram elaborados com base em

dados fragmentados, coletados sem critério, provenientes de

fontes as mais diversas. A ambição por descobrir “leis” universais

de desenvolvimento humano passou a ser questionada. A validade

da pesquisa de gabinete também começou a ser avaliada

criticamente, e seus resultados contestados.

Ao eleger as sociedades civilizadas como ápice da evolução, e

as sociedades “arcaicas” ou “primitivas” como polo inferior, o

evolucionismo forneceu justicativa teórica ao colonialismo que

pretendia estender as vantagens da civilização aos povos que ainda

não haviam alcançado esse estágio, denido por eles mesmos,como “superior”.

Ao denir como objeto as sociedades fora da esfera da civilização, a

Antropologia se manifestava a serviço do colonialismo, ela própria

profundamente impregnada da ideologia eurocêntrica, segundo a

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PEDAGOGIA52

qual os povos civilizados europeus constituíam a referência para

comparar outros povos.

  OS PRECURSORES DA ETNOGRAFIA

Boas e Malinowski

Se existiam, no nal do século XIX, homens (geralmente missionários

e administradores) que possuíam um excelente conhecimento das

populações no meio das quais viviam – é o caso de Codrington,

que publica em 1891 uma obra sobre os melanésios; de Spencer e

Gillen, que relatam, em 1899, suas observações sobre os aborígines

australianos; ou de Junod, que escreve A Vida de uma Tribo Sul-

africana (1898), a etnograa propriamente dita só começa a existir

a partir do momento no qual se percebe que o pesquisador deve,

ele mesmo, efetuar no campo sua própria pesquisa, e que esse

trabalho de observação direta é parte integrante da pesquisa.

A revolução que ocorrerá na Antropologia durante o primeiro terço

do século XX é considerável, ela põe m à repartição das tarefas,

até então habitualmente divididas entre o observador colonial

(viajante, missionário, administrador e o pesquisador erudito) que,

tendo permanecido na metrópole, recebe, analisa e interpreta as

informações fornecidas por estes.

O pesquisador compreende, a partir desse momento, que ele deve

deixar seu gabinete de trabalho para ir compartilhar a intimidade

dos que devem ser considerados não mais como informadores a

serem questionados, e sim como hóspedes que o recebem e mestres

que o ensinam. Ele aprende, então, como aluno atento, não apenas

a viver entre eles, mas a viver como eles, a falar sua língua e a

pensar nessa língua, a sentir suas próprias emoções dentro dele

mesmo. Tratam-se de condições de estudo radicalmente diferentes

das que conheciam o viajante do século XVIII e até o missionário

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 2   53

ou o administrador do século XIX, residindo geralmente fora da

sociedade indígena e obtendo informações por intermédio de

tradutores e informadores.

Em suma, a Antropologia se torna pela primeira vez uma atividadeao ar livre, levada, como diz Malinowski, “ao vivo”, em uma

“natureza imensa, viagem e aberta”.

Esse trabalho de campo, longe de ser visto como um modo de

conhecimento secundário, servindo para ilustrar uma tese, é

considerado como a própria fonte de pesquisa. Orientou a partir

desse momento a abordagem da nova geração de etnólogos que,

desde os primeiros anos do século XX, realizou estadias prolongadas

entre as populações do mundo inteiro.

Em 1906 e 1908, Radcliffe-Brown estuda os habitantes das ilhas

Andaman. Em 1909 e 1910, Seligman dirige uma missão no Sudão.

Alguns anos mais tarde, Malinowski volta para a Grã-Bretanha,

impregnado do pensamento e dos sistemas de valores que lhe

revelou a população de um minúsculo arquipélago melanésio, ou

seja, as Ilhas Trobriand no Pacíco Sul, a partir de onde escreveu

seu clássico “Os Argonautas do Pacíco Ocidental”.

A partir daí, os trabalhos etnográcos e a publicação das obras

que deles resultam seguem em um ritmo ininterrupto. Em 1901,

Rivers, um dos fundadores da antropologia inglesa, estuda os

Todas, da Índia; após a Primeira Guerra Mundial, Evans-Pritchard

estuda os Azandés (trad. Franc. 1972) e os Nuer (trad. Franc.

1968); Nadel, os Nupes da Nigéria; Fortes, os Tallensi; Margaret

Mead, os insulares da Nova Guiné etc.

Como não é nosso propósito aqui examinar toda a contribuição

desses diferentes pesquisadores na elaboração da etnograa e daetnologia contemporâneas, focaremos a atenção sobre dois entre

eles, considerados dos mais importantes, um americano de origem

alemã: Franz Boas; o outro, polonês naturalizado inglês: Bronislaw

Malinowski, os quais passamos a estudar a partir de agora.

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PEDAGOGIA54

Frans Boas (1858-1942)

Boas é considerado um dos mais importantes antropólogos

no processo de construção da antropologia. A partir de seusensinamentos, assistimos a uma verdadeira virada metodológica

na prática da antropologia. Suas contribuições foram das mais

signicativas para o desenvolvimento dos trabalhos de campo.

Iniciadas a partir dos últimos anos do século XIX (em particular

entre os povos Kwakiutl e Chibook de Colúmbia Britânica),

suas pesquisas eram conduzidas a partir de um ponto de vista

rigorosamente minucioso.

No campo, ensina Boas, tudo deve ser anotado, desde os materiais

constitutivos das casas até as notas das melodias cantadas pelos

Esquimós, e isso detalhadamente, no detalhe do detalhe. Tudo

deve ser objeto da descrição mais meticulosa, da retranscrição

mais el (por exemplo, as diferentes versões de um mito, ou

diversos ingredientes entrando na composição de um alimento).

Frans Boas foi o primeiro a formular, com seus colaboradores, uma

crítica mais radical e mais elaborada sobre as noções de origem e

de reconstituição dos estágios propostas pelos evolucionistas. Elemostra que um costume só tem signicado se for relacionado ao

contexto particular no qual está inserido.

Lewis Henri Morgan, que foi responsável pela divulgação dos

esquemas evolucionistas para as culturas humanas e, muito antes

dele, Montesquieu já tinha aberto o caminho a essa pesquisa cujo

objeto é a totalidade das relações sociais e dos elementos que a

constituem.

Mas, a diferença é que, a partir de Boas, entende-se que, paracompreender o lugar particular ocupado por um costume, não se

pode mais conar em suposições ou em armações produzidas

através de relatos de missionários, ou de administradores coloniais.

Só é possível ao antropólogo elaborar uma monograa, isto é, dar

conta cienticamente de uma microssociedade, apreendida em

Frans Boashttp://www.webpages.

uidaho.edu/~rfrey/images/220/Franz%20

Boas.jpg

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 2   55

sua totalidade e considerada em sua autonomia teórica, a partir

do contato direto com essa sociedade.

Com Frans Boas, começa a surgir, portanto, a etnograa como

exercício prossional, que não se limita mais à simples coleta demateriais à maneira dos antiquários, mas procura detectar o que

faz a unidade da cultura que se expressa através desses diferentes

materiais. Para ele, não há objeto nobre nem objeto indigno da

ciência. As piadas de um contador são tão importantes quanto

a mitologia que expressa o patrimônio do grupo. Em especial, a

maneira pela qual as sociedades tradicionais, indígenas, africanas,

camponesas ou quilombolas classicam suas atividades cotidianas,

mentais e sociais, deve ser levada em consideração. Boas anuncia,

assim, a constituição do que hoje chamamos de “etnociência”.

Ele foi um dos primeiros a mostrar para o etnólogo, não apenas

a importância, mas também a necessidade do acesso à língua da

cultura na qual trabalha. As tradições que estuda não poderiam

ser-lhe traduzidas. Ele próprio deve recolhê-las, na língua falada

pelos seus interlocutores.

A inuência de Boas foi considerável para o reconhecimento da

Antropologia como ciência de estudo das culturas humanas. Foi o

grande pedagogo que formou a primeira geração de antropólogos

americanos na primeira metade do século XX.

Malinowski (1884-1942)

Malinowski dominou incontestavelmente a cena antropológica de

1922, ano de publicação de sua primeira obra, Os Argonautas do

Pacíco Ocidental, até sua morte, em 1942.

Foi um dos primeiros a conduzir cienticamente uma experiência

etnográca, a viver com as populações que estudava e a recolher

seus materiais a partir do próprio idioma falado no grupo,

radicalizou essa compreensão por dentro e, para isso, procurou

romper ao máximo os contatos com o mundo europeu.

Malinowski 

http://www.n-a-u.org/ 

MALINOWSKI4.JPG

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PEDAGOGIA56

Fez duas estadias sucessivas nas ilhas Trobriand e ninguém, antes

dele, tinha se esforçado em penetrar tanto na mentalidade dos

outros e procurar traduzir o que sentem os homens e as mulheres

que pertencem a uma cultura que não é nossa.

Boas procurava estabelecer repertórios exaustivos, e muitos entre

seus seguidores nos Estados Unidos procuraram denir correlações

entre o maior número possível de variações. Malinowski considera

esse trabalho uma aberração. Convém, pelo contrário, segundo

ele, mostrar que a partir de um único costume, ou mesmo de um

único objeto (por exemplo a canoa trobriandesa), aparentemente

muito simples, aparece o perl do conjunto de uma sociedade.

Malinowski considera que uma sociedade deve ser estudada

enquanto uma totalidade, tal como funciona no momento mesmoonde a observamos.

Nessa história sobre a antropologia, podemos fazer uma breve

comparação entre James Frazer e Malinowski, com dois dos mais

inportantes pensadores da antropologia, desde o seu surgimento

no campo cientíco.

Frazer adota uma abordagem rigorosamente inversa, ou seja, seu

trabalho consiste em analisar de uma forma intensiva e contínua

uma microssociedade sem referir-se a sua história. EnquantoFrazer procurava responder à pergunta: “Como nossa sociedade

chegou a se tornar o que é?” e respondia escrevendo O Ramo de

Ouro, Malinowski se pergunta o que é uma sociedade dada em

si mesma e o que a torna viável para os que a ela pertencem,

observando-a no presente, através da interação dos aspectos que

a constituem.

Frazer, quando questionado por que ele próprio, não observava as

sociedades a partir das quais tinha construído sua obra. Respondia:

“Deus me livre”! ou seja, Frazer era um homem de gabinete,que escreveu 14 volumes de uma obra das mais importantes da

Antropologia, sobre magia e religião entre sociedades primitivas,

sem nunca ter tido contato com elas.

Com Malinowski, a Antropologia se torna uma “ciência” da

tradução do pensamento e da cultura do outro, do diferente,

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 2   57

em termos de sua própria especicidade. Assim, vira as costas

ao empreendimento evolucionista de reconstituição das origens

da civilização, e se dedica ao estudo das lógicas particulares

características de cada cultura.

O que o leitor aprende ao ler Os Argonautas, é que os costumes dos

Trobriandeses, tão profundamente diferentes dos nossos, têm uma

signicação e uma coerência, são sistemas lógicos perfeitamente

elaborados.

Atualmente, todos os etnólogos estão convencidos de que as

sociedades diferentes da nossa, são sociedades humanas tanto

quanto a nossa, e que os homens e mulheres que nelas vivem

são adultos que se comportam diferentemente de nós, e não

“primitivos”, autômatos atrasados, que pararam em uma épocadistante e vivem presos a tradições estúpidas.

A m de pensar essa coerência interna das culturas, Malinowski

elabora uma teoria (o funcionalismo) que tem seu modelo nas

ciências da natureza. Segundo ele, o indivíduo sente um certo

número de necessidades, e cada cultura tem precisamente a função

de satisfazer, a sua maneira, essas necessidades fundamentais.

Cada uma realiza isso elaborando instituições (econômicas,

políticas, jurídicas, educativas...), fornecendo respostas coletivas

organizadas, que constituem, cada uma a seu modo, soluçõesoriginais para atender a essas necessidades.

Uma outra característica do pensamento desse pesquisador é sua

preocupação em abrir as fronteiras disciplinares, propondo os

estudos sobre o homem através da tripla articulação do social,

do psicológico e do biológico. Convém, em primeiro lugar, para

Malinowski, localizar a relação estreita do social e do biológico;

o que decorre do ponto anterior, já que, para ele, uma sociedade

funciona como um organismo, onde as relações biológicas devem

ser consideradas, não apenas como o modelo explicativo, quepermite pensar as relações sociais, mas como o seu próprio

fundamento.

Além disso, uma verdadeira ciência da sociedade inclui o estudo

das motivações psicológicas, dos comportamentos, o estudo

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 2   59

Essa exigência de conduzir um projeto cientíco sem renunciar à

sensibilidade artística é que dene a etnologia.

Malinowski ensinou a muitos, não apenas a olhar, mas a escrever,

restituindo às cenas da vida cotidiana seu relevo e sua cor.“Um historiador”, escreve Raymond Firth, “pode ser surdo, um

jurista pode ser cego, um lósofo pode a rigor ser surdo e cego,

mas é preciso que o antropólogo entenda o que as pessoas dizem

e veja o que fazem”.

Ora, a grande força de Malinowski foi ter conseguido fazer ver e

ouvir aos seus leitores aquilo que ele mesmo tinha visto, ouvido,

sentido.

Abordagem Funcionalista

No início do século XX, o movimento de contestação ao

evolucionismo, feito por antropólogos insatisfeitos com o

encaminhamento teórico-metodológico da disciplina, centrou-

se em torno de dois núcleos argumentativos: os antropólogos

evolucionistas lidavam com dados colhidos por outros. Era essenciale indispensável que os antropólogos colhessem, eles próprios,

os dados; tornava-se cienticamente necessário aos estudos

antropológicos o deslocamento metodológico da investigação de

gabinete para pesquisa de campo.

O conceito de cultura se desenvolve no sentido teórico de pensar a

cultura como sistema composto de unidade (traços culturais) que

interagem uns com os outros, formando combinações e sínteses.

Decifrar o funcionamento dos sistemas passa a ser o desao da

Antropologia.

Desenvolve-se, então, o conceito de função e o método

funcionalista, que podem ser denidos como “metodologia de

exploração da interdependência”, para compreender como as

sociedades funcionam.

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PEDAGOGIA60

Uma característica do funcionalismo é a preocupação em mostrar

que as sociedades humanas e suas respectivas culturas existem

como um corpo orgânico, constituído de partes interdependentes. As

partes não podem ser plenamente compreendidas separadamente do

todo, e o todo deve ser compreendido em termos de suas partes, suasrelações uma com a outra e com o sistema sociocultural em conjunto.

A cultura é concebida como um todo integrado, cujos traços

estão funcionalmente relacionados. Avança-se, portanto, da ideia

evolucionista da cultura como todo complexo, cuja relação entre

seus elementos não é questionada, para a ideia funcionalista de

cultura como sistema vivo e dinâmico, cujos elementos são inter-

relacionados, preenchendo cada qual uma função especíca no

esquema integral.

A Antropologia, ao invés da preocupação com as origens e evolução

das culturas, passou a preocupar-se em responder às questões de

como funcionam os sistemas culturais e de que forma chegaram, em

sua diversidade, a ser o que são.

Malinowsky procura dar uma resposta a essas questões, elaborando

a teoria funcionalista da cultura. Seguindo o modelo das ciências

da natureza, na perspectiva de que a cultura determina e causa a

cultura, Malinowsky parte do pressuposto que os indivíduos sentem,

em qualquer tempo, em qualquer lugar, dadas necessidades, e que

em diferentes tempos, em diferentes lugares os homens elaboram

coletivamente suas respostas a essas necessidades.

De acordo com Malinowski, cada cultura tem como função sistemática

satisfazer essas necessidades fundamentais, e cada uma o faz à sua

própria maneira.

Vejamos os quadros ilustrativos?

NECESSIDADES BÁSICAS RESPOSTAS CULTURAIS

Metabolismo AbastecimentoReprodução ParentescoBem-estar corporal AbrigoSeguridade ProteçãoMovimento AtividadesCrescimento ExercitaçãoSaúde Higiene

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 2   61

Nenhum sistema cultural é superior ou inferior ao outro, pois

responde adequadamente às necessidades da sociedade que o

desenvolveu, de acordo com seus interesses.

O fato de desenvolver suas próprias respostas culturais torna

todos os grupos humanos culturalmente diferenciados, iguais em

capacidade. As diferenças de desenvolvimento material e técnico

foram esvaziadas do conteúdo hierarquizante que o evolucionismo

lhes atribuía. São abordadas como dados de signicação relativa,

em conformidade com a função que desempenha no sistema

cultural de que é parte.

Outros antropólogos funcionalistas contribuíram sobremaneirapara a compreensão das instituições sociais como respostas

organizativas. Radacliffe-Brown, por exemplo, contribuiu para a

abordagem dos sistemas culturais como sistemas de integração

social. O conceito de organização social é tomado como chave de

explicação do sistema cultural.

Os antropólogos funcionalistas universalizam a etnograa como

prática antropológica, demonstrando a pesquisa de campo

como ponto de partida para análise e explicações cientícas dosprocessos culturais.

Somente a pesquisa de campo permite a compreensão da

lógica particular da cultura que está sendo estudada. Parte-se,

portanto, do princípio de que cada cultura tem sua própria lógica

característica, o que desloca a questão do relativismo cultural a

NECESSIDADES BÁSICAS RESPOSTAS ORGANIZATIVASProdução, uso, manutenção e

renovação dos utensílios e bens de

consumo.

Economia

Codicação das normas decomportamento e sanções relativas.

Controle social

Conhecimento e transmissão da

tradição.Educação

Autoridade e poder para cada

instituiçãoOrganização política

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 2   63

construído a partir da realidade. Aparece, assim, a diferença entre

duas noções tão próximas que, muitas vezes, têm sido confundidas,

quero dizer, a de estrutura social e a de relação social.

O conceito de cultura como linguagem, em sentido amplo, é abase do estruturalismo antropológico. Com Lévi-Strauss, o método

estruturalista passou a ter relevância, tornando-se foco de um

debate de alto nível, no plano do conhecimento. A abordagem

estruturalista focaliza, assim, os códigos culturais, os princípios

conceituais, os sistemas simbólicos; procura apreender as regras.

Sua pretensão é buscar nos processos mentais a fonte de seus

códigos, é pesquisar as propriedades lógicas da própria mente

humana.

A análise estruturalista procura decifrar o sentido simbólico dasregras básicas que codicam relações sociais de diversos sistemas

particulares do sistema cultural, como o sistema de parentesco, o

sistema mitológico, o sistema ritual.

Partindo do real (realidade empírica das relações sociais concretas),

o antropólogo estruturalista decompõe a cultura que estuda em

suas unidades signicativas, e recompõe esse real, iluminando a

sua lógica simbólica.

A análise estruturalista se preocupa com a “ordem pensada”,

estando interessada nos padrões formais da cultura, no modo como

os elementos se relacionam uns como os outros, para formar um

sistema e, em outro nível, na forma como os sistemas simbólicos

de uma cultura se relacionam logicamente.

Para os estruturalistas, quando se decifra a natureza formal

dos sistemas culturais, qualquer forma de relação lógica entre

fenômenos culturais é passível de entendimento, pois pode ser

também decifrada, uma vez que é uma produção mental, e a

mente funciona da mesma forma. O estruturalismo considera

que a mente opera de forma inconsciente, o que, para além de

seu repertório de formas, permite ao homem criar a diversidade

cultural.

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PEDAGOGIA64

Se o mundo da experiência fornece a base empírica à análise

estruturalista, não é a experiência em si que se pretende explicar,

mas a racionalidade básica a ela subjacente, a lógica que rege os

fenômenos nela envolvidos e que a tornam congruente.

Um dos problemas do estruturalismo, que o torna alvo de muitas

críticas, é o fato de que não há como se ter acesso à estrutura

inconsciente de uma cultura. Vale dizer que as “estruturas

elementares”, a “estrutura da mente”, os “princípios estruturais”

são inferências, isto é, são construções hipotéticas, construções

teóricas “puras” – não há como serem comprovadas. São modelos

explicativos.

Uma crítica bastante pertinente ao estruturalismo é o carátersincrônico de suas análises, ou seja, sua pouca consideração à

história em termos da dialética que existe em seu movimento, a

falta de critérios precisos na escolha dos modelos.

Outras Divisões da Antropologia

Além dessas divisões já apresentadas sucintamente existem outrasmais atualizadas, a exemplo da Antropologia Biológica, que se

interessa também pelos estudos de genética das populações, além

de anatomia comparada das raças, cor de pele, crânios, medições

comparativas de esqueletos etc.

A Antropologia Biológica, investigando as variações das

características biológicas do homem, no espaço e no tempo,

comprovou a unidade da espécie humana, isto é, as diferenças de

cor de pele, de textura de cabelo e outros detalhes não implicam

maior ou menor capacidade de cérebro, ou alguma diferença de

ordem qualitativa. Assim, o homem, do ponto de vista biológico,

possui os mesmos atributos, as mesmas características distintas

que tornam a natureza dos indivíduos da espécie Homo sapiens

absolutamente idêntica, para além das variedades fenotípicas.

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 2   65

Essas pesquisas se orientam para descobrir fósseis da espécie

humana, principalmente na África, Ásia e Europa. Os fósseis pré-

históricos são chamados fósseis hominídeos, isto é, apresentam

anidades e aproximações com a forma humana moderna,

evidenciando estágios remotos de desenvolvimento evolutivo da

espécie humana.

O desenvolvimento da Genética permitiu à Antropologia Biológica

desenvolver pesquisas de genética das populações, objetivando

estabelecer distinção entre o inato e o adquirido, bem como a

interação entre um e outro.

A Antropologia Psicológica se dedica ao estudo dos processos e

do funcionamento do psiquismo humano. O estudo dos compor-tamentos individuais, conscientes e inconscientes, pode revelar

a totalidade de uma cultura, objeto especíco de denição da

antropologia como ciência.

A abordagem do outro como sujeito possibilita a análise

antropológica voltada para a intersubjetividade. O antropólogo,

para compreender o outro, necessariamente, despe-se de seus

valores, se transformando em estrangeiro, disposto a um olhar

distanciado de si mesmo e de sua própria cultura, aberto ao pontode vista e a lógica do outro.

  MÉTODOS DA INVESTIGAÇÃO ANTROPOLÓGICA

O termo metodologia refere-se ao conjunto de técnicas usadas poruma disciplina particular, com o objetivo de analisar os dados, a

m de se chegar a um conhecimento. Neste caso, a metodologia

antropológica corresponderia ao que se denomina de métodos e

técnicas em pesquisa antropológica.

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PEDAGOGIA66

O trabalho de campo é, sem dúvida, umaatividade preferida dos antropólogos, pois apesquisa em todos os subcampos da antropologia éfrequentemente empreendida em lugares remotos,terras distantes – na África, no Ártico, no PacícoSul. A primeira viagem prática de um antropólogo-particularmente se visar a uma sociedade primitiva,longe das cidades e civilização – é consideradacomo um rito de iniciação, depois do qual ele‘jamais é o mesmo’. Podemos dizer, na verdade,que os poucos antropólogos que se concentram napesquisa de gabinete e evitaram os riscos e rigoresdo trabalho de campo são vistos com superioridadepelos seus colegas. A auréola romântica em tornodo trabalho de campo por vezes obscurece o fato deque o antropólogo recolhe informações no campopara um penoso trabalho posterior no gabinete – nolaboratório e na biblioteca. Para cada mês passadona África, nos mares do Sul ou nas selvas da NovaGuiné, o antropólogo habitualmente passa muitosoutros analisando e redigindo as suas descobertas

(PELTO,1984, p. 46).

Sem dúvida, toda pesquisa de campo implica, indiretamente,

sempre em uma alteração do curso dos acontecimentos. A

simples presença de um etnólogo numa aldeia indígena, ou em

uma comunidade rural ou urbana, já provoca modicações na

vida dos integrantes do grupo.

Aqueles que negam às ciências do comportamento a condição

de ciência, armam que elas não são capazes de controlar os

seus experimentos ou observá-los, já que os cientistas sociaistrabalham diretamente com as manifestações simbólicas dos

grupos humanos.

É necessário enfatizar que os cientistas sociais passam por uma

formação especializada, tomam conhecimento de todo um

patrimônio de conquistas da disciplina, participam de pesquisas

e destinam grande parte de sua vida à produção do conhecimento

sobre as diversidades do comportamento humano.

O cientista social pode perguntar qualquer coisa ao seu objeto de

pesquisa e obterá informações, ao passo que o cientista naturalpouco pode obter de sua cobaia; o laboratório do antropólogo é

a própria sociedade rural ou urbana, o grupo religioso, o grupo

cultural, uma fábrica, enm, é o próprio local dinâmico, vivo,

onde se pode observar, analisar e vericar como realmente as

coisas acontecem.

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 2   67

Em suma, o que podemos concluir sobre esses aspectos

metodológicos é que, embora a ciência ou o conhecimento

cientíco seja único, cada ciência tem o seu objeto formal. A

cada uma delas, vão interessar aspectos particulares do universo.

Se o seu objeto de estudo é peculiar, peculiares deverão ser osmétodos de pesquisa, as técnicas empregadas e o instrumento

utilizado. Segundo o antropólogo britânico John Beattie:

O progresso nas Ciências Naturais frequentementesubentende o estabelecimento de situações experi-mentais em laboratório e, então, vê-se o que acon-tece, conrma, ou não, a hipótese previamenteestabelecida. Usualmente, os cientistas sociais nãopodem testar as suas hipóteses a respeito das insti-tuições humanas do mesmo modo. Seu laboratórioé a própria sociedade e, quando se lida com sereshumanos, outras considerações, além do desejode conhecimento, tal como o bem-estar geral, ospadrões legais e morais, o interesse nacional, pre-cisam ter primazia. Por esta razão, raramente épossível nas ciências sociais estabelecer situaçõesexperimentais segundo o modelo da ciência natu-ral. Menos possível ainda é lograr que tais situaçõessejam repetidas sob condições que, para todos osobjetivos práticos, sejam idênticas, como fazem oscientistas naturais (BEATTI, 1977, p. 94).

Os métodos e técnicas adotados na pesquisa antropológica estão

relacionados com a orientação teórica adotada. Assim, no caso

de uma pesquisa de caráter evolucionista, as técnicas a serem

utilizadas podem ser tomadas de empréstimo à arqueologia

histórica, mas não bastam. Usa-se o que se denominou de método

comparativo, isto é, toma-se o maior número de informações

sobre o tema no tempo e no espaço e procede-se à comparação,

para daí tirar as inferências.

Admitindo-se a unidade psíquica do homem (isto é, admitindo-se

que o homem biológica e psicologicamente é idêntico em todos oslugares e durante largo período de tempo), tomam-se as observações

do padrão de vida do nativo contemporâneo para serem aplicadas

na reconstituição de uma cultura desaparecida. Aí está um

exemplo de procedimento metodológico na Antropologia. Como se

percebe, há pressupostos teóricos, há postulados metodológicos e

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PEDAGOGIA68

há um conjunto de técnicas (entrevistas, observação participante,

história de vida etc.).

No início do século XX, o funcionalismo introduziu novos

posicionamentos metodológicos na antropologia, com a proposta

da observação participante, podendo-se falar em um método

funcionalista. Este, por exemplo, ao contrário do método

histórico-cultural, acha que é possível se estudar uma população

sem conhecimento de sua história, de seus contatos culturais

anteriores etc.

No caso, trata-se de uma visão sistêmica sincrônica onde se

objetiva estudar o funcionamento e a razão de sua lógica interior,

como se procurássemos conhecer a “linguagem da cultura”, no

momento em que ela se manifesta.

A diferença maior não está na coleta de dados, esta praticamente é

idêntica para quantos se metam na tarefa de registrar informações

sobre um determinado campo de pesquisa. Mas a diferença está,

principalmente, no que se escolhe ou se deva recolher.

O chamado método histórico-cultural, utilizado principalmente

pelos discípulos de Frans Boas, visava coletar o máximo de

informações sobre os contatos entre povos, a análise de sua

tradição oral, dos artefatos que permitissem inferir possíveiscontatos de cultura, o estudo dos mitos etc. Enm, há variações

metodológicas que vão inuir na escolha do que investigar na

vida dos povos. Porém, o elenco das técnicas utilizadas é mais ou

menos o mesmo para todos que enveredam no trabalho de campo.

Dizia Melville Herskovits, que o êxito da obra do etnólogo

depende, em grande parte, de sua sensibilidade. É verdade. No

entanto, requer também muita habilidade porque sua pesquisa é

bastante difusa e complexa. Exige certa ecleticidade. Não basta

que o pesquisador social seja sensível ao que necessita perguntarou hábil no que deve observar. É mister que ele tenha disciplina

bastante, para colher e registrar com precisão suas observações.

Quando o antropólogo parte para um estudo de comunidade em

que lhe interessa não só um aspecto determinado da cultura da

população estudada, mas, ao contrário, uma visão panorâmica de

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 2   69

toda a cultura, podemos imaginar como ele ca assoberbado com

a quantidade de informações que tem de registrar e com tudo o

que tem de observar.

A observação participante foi aprendida pelos etnólogos na prática

de trabalho de campo. Não foi nos livros que eles aprenderam a

realizar pesquisa junto aos nativos, a pôr em prática o que veio se

chamar observação participante.

O propósito deste método é obter dados através da observação do

comportamento dos indivíduos, no contato direto com os grupos

ao qual pertencem.

A observação participante exige do pesquisador dedicação

exclusiva. Ele passa a morar com o grupo a ser observado. Alimenta-

se da mesma comida do grupo. Canta com eles, reza, observatodos os movimentos, chega a assimilar sua maneira de viver e

passa a amá-los. Dá-se um envolvimento grande entre pesquisador

e pesquisados.

Há casos em que pesquisadores foram adotados pelos nativos.

Tudo isso se explica, pois este, para realizar sua pesquisa, precisa

permanecer longo período com a população que quer estudar,

meses a o, distante de tudo o que sua própria cultura lhe poderia

oferecer. Em contrapartida, começa a compreender melhor a

maneira de pensar da população e, inconscientemente, passa asentir-se parte da população nativa. Podemos nos valer, ainda uma

vez, do testemunho do professor Roberto da Matta:

De fato, o trabalho de campo em antropologiasocial tem como uma de suas características umprofundo envolvimento do pesquisador com o seuobjeto de estudo que, nesta área das ciênciassociais, não é um documento distante ou uma friafrequência estatística, mas um conjunto de pessoas,identidades e relações caoticamente percebidaspelo investigador nos seus primeiros momentosde trabalho. É a partir deste conjunto nebuloso

que o antropólogo procura inventar uma formae com ela iluminar suas hipóteses de teorias. Emantropologia social, então, o pesquisador produzseus próprios documentos, cria os seus dados emuitas vezes inventa suas técnicas de trabalho. Datal sorte que a prática do seu ofício, conforme jásugeriu o brilhante Rodney Needham (1963), muitose assemelha ao ato de enxergar (ou ao ato devoltar a ver).

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PEDAGOGIA70

Na minha própria experiência de campo,não poderei jamais esquecer da sensação desufocamento, sentida nos primeiros meses deconvivência intensiva com os índios, quando mesentia distante dos problemas teóricos que meconduziram à aldeia e cada vez mais tomava partena vida cotidiana das aldeias Apinayé. De tal modoque participar intensamente da vida diária daaldeia correspondia, num sentido muito concreto,perder de vista as técnicas, os modelos e as aldeiasde diagrama que havia estudado no meu gabineteno Museu Nacional.Tudo isso conduz a uma imensa diculdade nomomento de transformar essa experiência concretae maçante em dados sociológicos. Pois que talginástica depende não só dos objetivos básicos dopesquisador (inclusive do que estava preparadoou não para ver) como também das diculdadesinerentes a toda e qualquer descrição literária

quando o autor procura traduzir experiências totaise que o atingiram globalmente como ser humano,através de um meio único e linear como a escrita,por mais licenças poéticas que possa dispor paraatingir os seus objetivos (DA MATTA, 1987, p. 56).

Da Matta enfatiza a importância do envolvimento do observador

participante como uma prática assumida. A antropologia não nega

tal envolvimento. Ao contrário, há razões para defendê-lo. Basta

lembrar que este aparente subjetivismo pode levar – e tem levado

– os antropólogos a se aproximarem o suciente da realidade das

populações que estuda.

Conhecer não deixa de ser uma forma de possuir. Acontece com

o observador participante uma espécie de “êxtase” diante da

cultura que passa a viver e que desconhecia. Fica maravilhado,

ca deslumbrado. Nessa sua tarefa de observação – é bom lembrar

que se trata de alguém que foi treinado para tal – o antropólogo

observa com todos os seus sentidos, com todo o seu ser.

O longo período que passa na localidade lhe permite, também,sentir a dinâmica da vida local diante do mundo todo. Conhece as

festas. Ouve histórias. Conhece os mitos e as lendas. Descobre os

gostos e os apetites dos seus observados.

Na antropologia, principalmente devido à sua postura metodológica,

mais do que em qualquer disciplina cientíca, está presente

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 2   71

a dúvida metódica. Nesta disciplina não há lugar para posições

fechadas. Cada pesquisador tem a oportunidade de, sozinho,

sentir a força das teorias na pesquisa de campo, na observação

participante.

Esta técnica de pesquisa que, como foi dito, caracteriza a

antropologia, comporta várias outras técnicas. Técnica de registro

de dados, técnicas de observação e outras. Assim, durante o

trabalho de observação participante, o pesquisador pode realizar

entrevistas estruturadas ou não, pode fazer um diário de pesquisas,

pode registrar suas observações em chas, pode recolher artefatos,

efetuar gravações em tas magnéticas, obter fotos e rodar lmes

super 8’ etc.. Porém, pode fazer muito mais ainda, basta apelar

para a própria imaginação e aproveitar as circunstânciais.

A entrevista é um elemento importantíssimo em qualquer ciência

social. No caso da antropologia, pode acontecer de o pesquisador

desconhecer o idioma falado.

Neste caso, terá oportunidade de estudar com os seus novos amigos

este novo idioma. Aliás, foi assim que os estudos de linguística

tiveram grande incremento.

Precisando os antropólogos de aprender muitos idiomas para o seutrabalho de campo, muitos deles organizaram gramáticas dessas

línguas e registraram o seu vocabulário. Esta contribuição não

foi nada desprezível. Podemos dizer que foi este procedimento

que despertou o interesse pelos etnográcos, como ocorre com a

antropologia moderna.

No caso de o antropólogo não dominar o idioma, ou enquanto isso

não acontece, ele precisa munir-se de um intérprete. Claro que

isso exige dele, antropólogo, muito cuidado e reserva nos dadosque assim obtém. Com o tempo, já é mais fácil o trabalho, porque

começa a entender o idioma. Não é só o problema do intérprete

que exige a atenção do pesquisador. O informante, geralmente,

alguém que se afeiçoa mais ao pesquisador, merece também

cuidados especiais.

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PEDAGOGIA72

Há que se vericar se o mesmo não distorce as informações com o

objetivo de agradar o pesquisador. O pagamento a informantes pode

não ser aconselhável. Contudo, ele poderá ser feito, desde que o

pesquisador leve isso em consideração e ltre as informações.

Todos sabemos que, em qualquer cultura, existem informações quesão dadas com prazer, outras que são fornecidas com relutânciae outras que não são dadas. Estas últimas devem ser, com jeito,arrancadas. Isto quer dizer que os informantes não podem fornecê-las e o pesquisador, no caso, pouco poderia fazer com o uso daentrevista. Ademais, sempre é necessário o pesquisador procedera uma vericação posterior de toda e qualquer informação – umaespécie de prova.

A entrevista parece uma técnica muito simples, até o momento

em que o estudante começa a pô-la em prática. O iniciante sente,muito cedo, que realizar entrevista é também uma arte. Requerclareza de objetivos e sensibilidade para conduzi-la num clima desimpatia e benevolência. Há muitas modalidades de entrevista.

Quanto à entrevista repetida, presta-se a medir as mudanças socias,

repetindo a mesma entrevista em mais de uma oportunidade. Não

vamos discutir o valor do procedimento, mas este tem sido pouco

utilizado na antropologia. De resto, em se tratando de entrevista,

o antropólogo parece ter preferência pela entrevista livre, quer

organizada ou não.

Só ultimamente se nota certas tendências, na antropologia, ao

uso de questionário. Nossa disciplina não tem tradição neste

campo. Talvez se explique isto devido às populações estudadas,

normalmente, pela antropologia – populações ágrafas. O que pode

explicar também é a própria opção da antropologia por um método

compreensivo de coleta de dados.

Em face disso, assumem importância ímpar as técnicas de registroe documentação utilizadas pelo pesquisador de campo. Sua

pesquisa começa muito antes de partir para o campo. Principia nas

bibliotecas e nas livrarias. Colhido o material indispensável, que

possa trazer alguma contribuição ao estudo que vai empreender,

parte para o campo.

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 2   73

A essa altura já deve ter tomado conhecimento de tudo que se

escreveu sobre o assunto que pretende estudar. Já deve ter feito

seu projeto de pesquisa e arrolado todo o suporte nanceiro que

lhe permita levar a cabo o trabalho. Pode fazer parte de sua

bagagem uma gama de instrumentos úteis. Entre eles, máquinafotográca, lmes, gravador e tas magnéticas, papel, chas,

alguns livros indispensáveis etc.

Nem sempre o pesquisador pode acompanhar suas pesquisas com

o gravador. O informante pode car inibido ou recusar-se, mesmo,

a conceder as informações solicitadas.

Daí a necessidade de muito treinamento na técnica de registro

posterior. Ouvida a informação (muitas vezes trata-se de um

bilhão de informações), o pesquisador recolhe-se e passa aanotar tudo o que se lembra. Pode fazê-lo sem uma ordem

preestabelecida, se não dispuser de tempo. Mas é de bom alvitre

não acumular informações desordenadas. Informações desse tipo,

quando acumuladas, perdem seu valor. Necessário se faz que ele

as organize em chas e por assunto, de modo a lhe permitir o

manuseio e o remanejamento das mesmas.

Além das chas, o pesquisador poderá manter um diário de pesquisa

ou diário de campo, onde vai registrando as observações e as

impressões de caráter geral sobre o encaminhamento da pesquisa.

Trata-se de um instrumento valioso que poderá servir de preventivo

aos momentos de desânimo e de tédio. Não se pense que a pesquisa

antropológica de campo acontece de forma agradável, do começo

ao m. Há momento de crise. O antropólogo é acometido de um

cansaço sentimental, digamos. Sente um aperto no coração e uma

tendência quase irresistível a destruir tudo o que realizou e jogar

fora todas as suas anotações.

À medida que as anotações vão crescendo e a documentação setorna mais substanciosa, o pesquisador vai sentindo a diculdade

de organizar todo o material e preparar seu relatório de pesquisa.

A coisa se torna mais dramática, acreditamos, em face da própria

visão globalizante de nossa disciplina. Não devemos tratar de

aspectos técnicos de elaboração de monograa. Ademais, o

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PEDAGOGIA74

assunto é visto nas cadeiras de métodos e técnicas de pesquisa,

bem como na cadeira de monograa.

Por último, uma consideração importante. Muitos dos antropólogos

brasileiros não terão ou não tiveram a oportunidade de levaravante pesquisa de campo no interior das selvas ou junto a povos

primitivos em outros países. Em razão disso, o que foi dito sobre

as técnicas de pesquisa pode parecer sem sentido.

Mas, o campo de estudo dos antropólogos não consiste apenas

de aldeias indígenas. Há uma innidade de temas importantes a

pesquisar nos nossos quintais. As favelas e palatas se proliferam

nas grandes cidades. O menor abandonado está solto nas ruas.

As prisões estão abarrotadas, a violência está em toda parte,

grupos especícos se organizam e se manifestam constantemente,com suas formas de expressar as identidades, a cultura popular é

altamente diversicada nas várias regiões do país, a universidade

pede diagnósticos e modicações, a juventude cresce em

sobressalto.

Enm, há muitos problemas urbanos, que estão a exigir a

dedicação e o estudo por parte de pesquisadores sociais,

inclusive do antropólogo. O antropólogo pode perfeitamente

dar a sua contribuição teórica e metodológica nas pesquisas

interdisciplinares. O importante é que o trabalho seja realizado

com seriedade.

Em suma, a regra básica do procedimento metodológico deve ser a

ética cientíca, a honestidade, enm. É desnecessário dizer que a

credibilidade cientíca repousa no rigor metodológico apenas em

parte. De nada adiantaria este rigor, caso viesse a faltar honestidade

por parte da comunidade cientíca. Honestidade não quer dizer

necessidade de patrulhas de qualquer natureza. Ela deve decorrer

do treinamento e da formação universitária. Se nosso estudanteaprender, durante sua permanência na universidade, esta ética

cientíca, a ciência crescerá em seus propósitos educativos e

libertadores.

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 2   75

Como uma área importante de conhecimento sobre as culturas

humanas a Antropologia apresenta duas questões importantes: a

compreensão de cada cultura como um sistema, um conjunto de

manifestações práticas e espirituais, de trabalhar, produzir, pensar,organizar a vida social etc., e uma busca de compreensão sobre

de que modo esses sistemas, em sua variedade e diversidade,

chegaram a ser o que são.

A tarefa a que a Antropologia se propõe, desde seu surgimento,

como ciência, é a de explicar as semelhanças e as diferenças

culturais, a manutenção e a mudança cultural através do tempo.

A Antropologia procura decifrar e compreender as populações

humanas, no âmbito das suas diferentes formas de viverem sociedade. Numa formulação bastante ampla e geral, a

Antropologia estuda o homem e suas realizações; numa formulação

mais aproximativa, a Antropologia estuda a sociedade como um

sistema de símbolos e signicados. Como já assinalamos, uma das

características das populações humanas é sua diversidade.

A Antropologia, uma das ciências que têm o homem como objeto de

conhecimento, procura responder a questão central do signicado

da diferença, abordando o homem, desde o seu surgimento, comoser biológico e como ser cultural.

Seguindo orientações diversas, apresentadas pela própria busca

do acúmulo de informações sobre os diferentes aspectos da

vida humana, especialmente a partir dos primeiros contatos dos

viajantes europeus com os povos não ocidentais, a antropologia foi

dividida em grandes áreas, visando abarcar a totalidade da vida

humana em termos biológicos e culturais.

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PEDAGOGIA76

Funcionalismo, enquanto escola antropológica possui

pressupostos teóricos relevantes no estudo da cultura.

Portanto, qual a contribuição desta escola no estudo da

cultura e do homem como ser social?

Por que a Etnograa é o método por excelência da

antropologia?

Elabore um quadro sistemático com as escolas

antropológicas, seus principais pensadores e ideias.

DANÇA COM LOBOS (1990)

SINOPSE: durante a Guerra civil, uM JoveM soldado (kevin costner)

pratica uMa ato ousado, é considerado herói e vai servir por sua escolha 

eM  uM  luGar  coM  forte  predoMinância  do  povo  sioux. coM  o  teMpo 

ele assiMila os costuMes dos nativos, acontecendo uMa aculturação às 

avessas.

DIREÇÃO: kevin costner

GÊNERO: draMa

ELENCO: 

kevin  costner, Mary  Mcdonnell, GrahaM  Greene, rodney 

a. Grant, floyd  “red  croW” WesterMan, tantoo  cardinal, roBert 

pastorelli, charles rocket, Maury chaykin, JiMMy herMan, nathan lee 

chasinG horse, Michael spears, Jason r. lone hill, tony pierce, toM 

everett.

O ÚLTIMO SAMURAI (2003)

SINOPSE: eM 1870 é enviado ao Japão o capitão nathan alGren (toM 

cruise), uM conceituado Militar norte-aMericano. a Missão de alGren 

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 2   77

é treinar as tropas do iMperador MeiJi (shichinosuke nakaMura), para 

que elas possaM eliMinar os últiMos saMurais que ainda viveM na reGião.

poréM, após ser capturado pelo iniMiGo, alGren aprende coM katsuMoto 

(ken  WatanaBe) o  códiGo  de  honra  dos  saMurais  e  passa  a  ficar  eM 

dúvida soBre que lado apoiar.

DIREÇÃO: edWard zWick 

GÊNERO: aventura

ELENCO: toM cruise, ken WatanaBe, Billy connolly, tony GoldWyn,

Masato  harada, Masashi  odate, John  koyoMa, tiMothy  spall,

shichinosuke nakaMura, toGo iGaWa, shin koyaMada, hiroyuki sanada,

shun suGata, seizo fukuMoto, WilliaM atherton.

A VILA (2004)

SINOPSE: eM  1897 uMa  vila  parece  ser  o  local  ideal  para  viver:

tranquila, isolada  e  coM  os  Moradores  vivendo  eM  harMonia. poréM 

este local perfeito passa por Mudanças quando os haBitantes descoBreM 

que o Bosque que o cerca esconde uMa raça de Misteriosas e periGosas 

criaturas, por  eles  chaMados  de  “aquelas  de  q ueM  não  falaMos”.

o Medo de ser a próxiMa vítiMa destas criaturas faz coM que nenhuM 

haBitante da vila se arrisque a entrar no Bosque. apesar dos constantes 

avisos de edWard Walker (WilliaM hurt), o líder local, e de sua Mãe (siGourney Weaver), o  JoveM lucius hunt  (Joaquin phoenix) teM uM 

Grande deseJo de ultrapassar os liMites da vida ruMo ao desconhecido.

lucius é apaixonado por ivy Walker (Bryce dallas hoWard), uMa JoveM 

ceGa que taMBéM atrai a atenção do desequiliBrado noah percy (adrien 

Brody). o aMor de noah terMina por colocar a vida de ivy eM periGo,

fazendo coM que verdades seJaM reveladas e o caos toMe conta da vila.

DIREÇÃO: M. niGht shyaMalan

GÊNERO: suspense

ELENCO: Bryce dallas hoWard, Joaquin phoenix, adrien Brody, WilliaM 

hurt, siGourney  Weaver, Brendan  Gleeson, cherry  Jones, celia 

Weston, John  christopher  Jones, frank  collision, Jayne atkinson,

Judy Greer, fran kranz, Michael pitt, Jesse eisenBerG.

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PEDAGOGIA78

A LETRA ESCARLATE (1995)

SINOPSE: eM 1666 eM Massachussetts, Bay colony, uMa Bela Mulher 

(deMi  Moore) casada  coM  uM  Médico  (roBert  duvall) cheGa  na 

localidade  na  frente  do  Marido, coM  a  incuMBência  de  providenciar 

uM lar para o casal. Mas ela fica apaixonada por uM reverendo (Gary 

oldMan), que  teM  por  ela  os  MesMos  sentiMentos. no  entanto, eles 

repriMeM tais eMoções pelo fato dela ser casada, Mas quando ela supõe 

que seu Marido foi Morto pelos índios ela se sente livre e acaBa ficando 

Grávida do reverendo. Mas, coMo apesar de ficar presa e socialMente 

MarGinalizada ela  se  recusa a dizer o noMe  do pai da  criança, passa 

então a portar uM “a” de adúltera Bordado eM cores verMelhas eM suas 

roupas, coMo síMBolo de sua verGonha perante a sociedade local.

DIREÇÃO: roland Joffé

GÊNERO: draMa

ELENCO: deMi Moore, Gary oldMan, roBert duvall, lisa Jolliff-andoh,

edWard  hardWicke, roBert  prosky, roy  dotrice, Joan  ploWriGht,

MalcolM storry.

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3UNIDADE

OBJETIVOS DESTA UNIDADE:

Abordar dois conceitos-chaves na Antropologia.

Primeiramente oetnocentrismo, comovisão de mundo ondeas visões, ideias evalores de um gruposão tomados comopadrão de referênciapara todas as coisas, e,neste sentido, discutiras consequências dessapostura para as relaçõesentre as culturas

humanas. Ao mesmotempo, enfocaremosas concepções dorelativismo, comoproposta de análise maisampla, reconhecendoas várias possibilidadesde expressão dadiversidade culturalentre os povos, ou seja,cada cultura sendoanalisada a partir das

suas especicidades.Trataremos decompreender o processode construção dosconceitos de raça ecultura.

Analisaremos os entraves e consequências da utilização

do conceito de raça como categoria de classicação

biológica do homem, levando ao fortalecimento

do racismo com prática de extermínio de vários povos nahistória da humanidade. Abordaremos também os esforços

de denição de cultura, como conceito explicativo da

diversidade e das especicidades dos grupos humanos. Ainda

neste capítulo, analisaremos os componentes da cultura

como linguagem, religiosidade, entre outros, enfocando os

processos de diferenciação étnica e cultural, bem como as

formas de transmissão da cultura no processo educativo.

Uma das mais caras fantasias dos brancos é comprovarcienticamente a teoria da sua superioridade racial, o

que tem levado o etnocentrismo a contaminar a própria

objetividade da ciência.

CONCEITUAÇÃO ANTROPOLÓGICA DERAÇA E CULTURA

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 3   81

e as empregamos para caracterizar cinco grupos humanos bem

conhecidos:

¡  europeus do norte;

¡  europeus do centro;

¡  africanos

¡  australianos;

¡  mongólicos;

Observemos, pelas conexões na Figura 1, que:

¡  africanos e australianos não diferem quanto à cor da pele, mas

apresentam a textura dos cabelos completamente diferentes;

¡  europeus do norte e europeus do centro têm a mesma cor da

pele, mas têm índices cefálicos diferentes;

¡  europeus do norte e africanos têm a cor da pele diferente,

mas são iguais quanto ao índice cefálico.

As diculdades para delimitação das raças tornam-se maiores

quando se tentam fazer classicações raciais em função de mar-

cadores genéticos no sangue (tipos de sangue). Na verdade, as

diferenças são relativas, isto é, se expressam em termos de maior

ou menor frequência de genes num grupo ou noutro.

COR DA PELE ÍNDICE CEFÁLICO TEXTURA DOS CABELOS

COR DA PELE ÍNDICE CEFÁLICO TEXTURA DOS CABELOS

EUROPEU DO NORTE EUROPEU DO CENTRO AFRICANO AUSTRALIANO MONGÓLICO

   D   I   F   E

   R   E   N    T   E

   S

     I      G      U     A     I     S

Figura 1 - Classicação Racial

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PEDAGOGIA82

Desse modo, tanto pela antropologia física como pela genética de

populações, através de estudos de frequências gênicas, é impossível

delimitar as raças. As variações entre as raças são contínuas e

superciais, não permitindo separá-las biologicamente.

Se não é possível delimitar biologicamente as raças, sua denição

terá, necessariamente, que ser imprecisa.

Embora apóstolos da precisão e da objetividade, os cientistas

curvam-se diante da realidade dos fatos e denem raça do seguinte

modo: “Raças são populações mais ou menos isoladas, que diferem

de outras populações da mesma espécie pela frequência de

características hereditárias”.

Observemos que a denição permite chamar de raça a qualqueragrupamento humano que apresente características hereditárias,

com frequências diferentes de outros grupos. As características

hereditárias, cujas frequências variam de uma raça para outra,

não são especícas em qualidade e não têm aplicação universal.

Além disso, essas características dependem do isolamento, cujo

grau também é variável (mais ou menos isoladas), e tanto pode ser

geográco como social, religioso, político, econômico etc.

O ponto fundamental do conceito de raça é o fato de que as

populações, em cujas características se elaboram as classicaçõesraciais, pertencem à mesma espécie. Em outras palavras, o mais

fundamental aspecto biológico das raças está naquilo que as une e

não naquilo que as separa.

Quando o homem deixou a vida nômade e se organizou em

sociedades primitivas, os grupos raciais já existiam.

Os primeiros conitos humanos não surgiram por causas religiosas

ou raciais, mas por disputas econômicas, entre pastores e

agricultores e, mais tarde, também, entre grupos de agricultores,

em disputas pela canalização da água dos rios, para benefício

agrícola.

Não é sem razão que a mais antiga referência, a discriminação

racial, data de aproximadamente 2000 a.C., e consta de um marco

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 3   83

erigido acima da segunda catarata do Nilo, proibindo qualquer

negro de atravessar além daquele limite, salvo com o propósito

de comércio ou de compras. Fica óbvio que a discriminação era

fundamentalmente de ordem econômico-política, usando a raça

como referencial.

Alguns povos antigos praticaram uma forma de preconceito coletivo,

que não era necessariamente racial. Os gregos consideravam

bárbaros todos os povos não-gregos. Aristóteles chegou mesmo a

propor a hipótese da existência do escravo nato, admitindo que

alguns já nascem para escravo e outros para senhor.

Por outro lado, os persas consideravam-se superiores ao resto

da humanidade, e assim também pensavam sobre si mesmos os

germanos, os normandos, os romanos e os bárbaros das estepesda Ásia. Porém, esses relatos, assim como o antagonismo entre

hebreus e samaritanos, entre cristãos e muçulmanos etc., não são

vistos pelos estudiosos como exemplos de racismo. De modo geral,

existe coerência de opiniões, reconhecendo que, antes do século

XV, as divisões antagônicas da humanidade não eram originadas

por idelogias racistas.

Após o surgimento do homem como espécie, não havia produção

organizada de alimentos, e os bandos nômades de homens e

mulheres primitivos perambulavam para alimentar-se. Os grupos

eram pequenos e isolados, porém se misturavam quando um deles

decrescia, tendendo, pois, ao desaparecimento.

Seguindo essa vida de bandos nômades, a humanidade passou

cerca de 9/10 de sua existência. Somente há 10.000 anos, quando

as mulheres descobriram que podiam cultivar a terra para produzir

alimentos (revolução agrícola), é que os bandos tornaram-se

sedentários e agricultores.

Para alguns geneticistas, a primeira onda de mistura de povos

acompanhou os agricultores que difundiram o emprego do arado,

instrumento utilizado no preparo da terra para o cultivo. Partindo

do Oriente Próximo, o uso de arado propagou-se para a Europa,

Arábia, Irã, Índia, China e regiões nordeste e leste da África.

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PEDAGOGIA84

Mais tarde, os bárbaros (pastores) que habitavam as estepes da

Ásia domesticaram o cavalo, inventaram o carro de guerra e, com

essas inovações, espalharam-se com assustadora rapidez pela

Europa, Ásia Ocidental, Índia e China, proporcionando mais uma

onda de mistura entre povos.

Posteriormente, os bárbaros das estepes descobriram o ferro e

a fabricação de armas. Com esse novo poder bélico, marcaram

a História com invasões, conquistas e misturas tribais, durante o

período do domínio de persas no Irã; listeus, hebreus e arameus

na Síria e na Palestina; frígios e dórios na Grécia.

Durante os séculos seguintes, os bárbaros das estepes aperfeiçoaram

o controle do cavalo, inventando os estribos e, consequentemente,

criando a cavalaria de guerra por volta do ano 850 a.C.

Com o poder das cavalarias, irromperam hordas de bárbaros

invasores e rapidamente devastaram a Europa e a Ásia, promovendo

nova onda de mistura entre os povos.

O testemunho genético dessas misturas é encontrado, hoje,

através do estudo da distribuição geográca dos grupos sanguíneos

nas populações da Europa. O sentido da diminuição da frequência

do tipo de sangue B é o mesmo das migrações de conquistas dos

bárbaros, tendo nas estepes da Ásia as frequências mais elevadas.

Não se esgota com os bárbaros a história das misturas dos povos

na Europa. A história dos grandes impérios e suas conquistas é

também a história das misturas entre povos e raças.

Os egípcios, cuja expansão territorial máxima ocorreu em 1479

a.C., dominaram fenícios, cananeus, hititas e assírios, entre

outros. Por sua vez, os egípcios da época eram descritos como de

estatura baixa, morenos, cabelos e olhos pretos, nariz levemente

aquilino, apresentando evidências de miscigenação com negróides,

semitas e asiáticos.

As sucessivas dominações da região Mesopotâmia, por diversos

impérios, deixaram o saldo de várias misturas nos povos da região.

No ano 3000 a.C., a Mesopotâmia foi ocupada pelos sumérios e

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 3   85

subsequentemente conquistada pelos amonitas, cassitas, assírios,

caldeus, persas e, nalmente, gregos, em 330 a.C.

Os gregos, além da conquista, estimulavam o casamento de seus

soldados com as mulheres dos povos conquistados. O próprioAlexandre Magno desposou duas princesas aquemênidas e celebrou

o casamento de mais de 10.000 de seus soldados segundo o rito

persa.

Finalmente, a expansão do império romano acrescentou mais

mistura à população europeia, já historicamente misturada.

Por motivos culturais e religiosos, os judeus proclamam seu

isolamento reprodutivo, mesmo depois da grande diáspora que os

distribuiu em grupos por vários países.

Todavia, estudos antropológicos demonstram semelhanças entre

judeus e não-judeus vivendo na mesma região, e os geneticistas,

através de cálculos de frequências gênicas, concluíram que existe

mistura racial entre os judeus a uma taxa média de 1% de genes

por geração.

A descoberta das Américas, as navegações para as Índias e a

colonização da África criaram as condições apropriadas para o

desenvolvimento de uma ideologia sobre preconceitos de raça ede cor.

Todavia, além desses fatos, as mudanças sociais e econômicas

ocorridas na Europa, à época, foram até mais favorecedoras

do nascimento do racismo. O processo de industrialização e a

inquietude social que ele gerou exigiram da organização capitalista

da sociedade uma nova perspectiva para seus membros.

Tanto na França como na Inglaterra, no m do século XVIII e início

do XIX, a palavra raça passou a mudar de signicado. Enquantoisso, nas colônias do Novo Mundo, colonizadores europeus e seus

descendentes acreditavam na subumanidade dos nativos, mesmo

depois da bula papal emitida em 1537 por Paulo III, declarando os

selvagens como homens verdadeiros e possuidores de alma.

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PEDAGOGIA86

Na metade do século XIX (1855), Gobineau, que mais tarde veio

a ser considerado o “pai do racismo”, publicou na Europa o seu

trabalho intitulado “Ensaio sobre as desigualdades das raças”. O

trabalho de Gobineau explorava fundamentos biológicos para as

diferenças raciais, tendo encontrado ampla receptividade entre acomunidade cientíca.

Não menos inuente na formação de uma concepção racista da

sociedade, foi a obra de Charles Kingsley, que, segundo alguns,

chegou a criar uma losoa racial no século XIX.

Durante as décadas de 1850 a 1870, as ideias de raça e racismo

se consolidam na Europa. A partir dessa época, generalizou-se

a crença de que certos povos, por questão de raça, não tinham

a capacidade para progredir como tantos outros, e os europeuspassaram a reconhecer grandes diferenças entre os brancos e as

outras raças, denindo-os como superiores.

Ao m do século XIX, na Inglaterra, já existiam inquestionáveis

evidências de hostilidades aos negros.

O trabalho de Darwin intitulado “Origens das Espécies”, impôs

grande desao às ideias racistas através da teoria da evolução,

a qual não apenas afetava a crença na origem separada de cada

espécie, mas também admitia que as raças não eram permanentese podiam mudar com o tempo.

Não tardou, todavia, para que os acadêmicos criassem o

“darwinismo social”, admitindo que o preconceito racial

favorecia a evolução, porque, bloqueando as possibilidades de

misturas, estaria se preservando a “qualidade da raça superior”.

O surgimento do “darwinismo social”, à época, demonstra, mais

uma vez, que até a elaboração das explicações cientícas são

inuenciadas pelas ideias predominantes na sociedade.

Ainda estão bem vivas na memória da humanidade as trágicas

consequências da doutrina racial nazista.

Alimentados por lendas e mitos, mas, principalmente, pela

necessidade de certa forma de hegemonia que compensasse a

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 3   87

ausência de unidade territorial e política, os germanos nórdicos

vinham, há séculos, cultivando a autogloricação através da

pureza do sangue e da superioridade da raça. Essa tradição fanática

exacerbou-se sob a forma de patriotismo, com a unicação da

Alemanha no m do século XIX, e degenerou com as teorias racistasda época.

Na obsessão pela superioridade racial, os alemães deformaram a

teoria da seleção natural de Darwin e admitiram que a eles caberia

o direito de selecionar os mais aptos para a sobrevivência. Em meio

a tamanha insensatez, Adolf Hitler bradava: “A raça germânica é

superior a todos as outras e a luta contra o estrangeiro, contra

o judeu, contra o eslavo, contra as raças inferiores é uma luta

sagrada”

Por todos esses fatos, percebe-se não ter sido difícil para os

dirigentes do III Reich conduzirem os nazistas aos extremos da

violência contra outros povos. Sob o pretexto de sanear a raça,

os alemães arvoraram-se na prática da procriação dirigida e do

extermínio dos inferiores.

É importante não esquecer como o preconceito racial de alguns

pode gerar a violência e a morte de muitos.

O racismo não desapareceu com o progresso dos povos. No mundoatual, observam-se formas variadas de racismos, que vão desde

sua institucionalização, por força de lei, até as formas mais sutis

de novos disfarces.

Nem mesmo o revolucionário avanço da genética, nas últimas

décadas, ou o progresso tecno-cientíco da atualidade conseguiram

desmobilizar o racismo.

Mesmo que a crença geral nos fundamentos biológicos para o

racismo tenha experimentado algum esvaziamento, novas formas

de concepção do “outro” estão surgindo. O “outro” é aquele que

é estranho, diferente não apenas na aparência, mas também nos

valores, crenças, estilo de vida, posição social etc. (como veremos

com o etnocentrismo).

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 3   89

Para compreender essas armações, é preciso levar em conta as

referências à grande dispersão da espécie humana sobre a Terra,

ocorrida antes do surgimento das raças.

Assim, em toda parte passível de habitação terrestre, duranteos milênios posteriores ao povoamento geral, grupos humanos

caram sob o efeito dos climas locais, dando origem às raças.

Mesmo que esses grupos humanos cassem absolutamente isolados

uns dos outros, eles jamais seriam “puros” em relação uns aos

outros, porque todos provêm de origem genética comum.

Mesmo se admitirmos que alguns grupos cassem absolutamente

isolados durante milênios e milênios, no passado e no futuro, a

expectativa, dentro do que se conhece em biologia, é que eles setransformariam em espécies diferentes e não em “raças puras”.

Isso é dito para demonstrar que a ideia de raça pura é preconcei-

tuosa, mesmo quando imaginamos modelos improváveis de isola-

mento. Em outras palavras, é impossível uma raça ser ou tornar-se

pura, pois a espécie humana só se prolifera através dos intercru-

zamentos, e, através deles, todos os povos trocam características

genéticas.

Basta recordar que 70% dos genes são iguais em todas as raçase que os 30% que variam o fazem sem perda das características

básicas. Além disso, a história registra que a ocorrência de mistura

entre povos e raças foi a regra geral nos últimos milênios.

AS DEFINIÇÕES SOBRE CULTURA

Caminhando um pouco mais no entendimento das concepções de

etnocentrismo e relativismo, para compreender as diferenças entre

os povos humanos, estamos avançando no esforço de denição do

que é cultura. O conceito de cultura vai incorporando, em seu

processo de desenvolvimento, o movimento dinâmico dessas

concepções nas teorias antropológicas.

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PEDAGOGIA90

A primeira diculdade diz respeito a diferentes usos do termo e a

diferentes níveis de abstração envolvidos na discussão do conceito

de cultura.

A palavra cultura, na linguagem corrente, possui muitos sentidos,muitas acepções. O uso e o abuso do termo, em seu signicado mais

amplo ou mais restrito, recomenda um esforço de compreensão

sobre a amplitude do seu campo semântico, de modo que distinga

a análise antropológica das análises que o senso comum associa à

palavra cultura.

Aurélio Buarque de Holanda, no seu Dicionário da Língua Portuguesa,

registra para o verbete cultura os seguintes signicados:

“Cultura: (do lat. Cultura) S. F.

1. ato, efeito ou modo de cultivar;

2. cultivo;

3. o complexo dos padrões de comportamento, das crenças,

das instituições e de outros valores espirituais e materiais

transmitidos coletivamente e característicos de uma sociedade:

civilização; a cultura ocidental; a cultura dos esquimós;

4. o desenvolvimento de um grupo social, uma nação etc., que éfruto do esforço coletivo pelo aprimoramento desses valores;

civilização, progresso. “A Grécia do séc. V a.C atingiu o mais

alto grau de cultura de sua época”;

5. atividade e desenvolvimento intelectuais, saber, ilustração:

Ministério da Educação e Cultura; a cultura do espírito.

6. apuro, esmero, elegância;

7. criação de certos animais, em particular os microscópicos:

cultura de carpas; cultivo de germes; “Cultura física.

Desenvolvimento sistemático do corpo humano por meio de

ginástica e desportos”.

A primeira informação se refere à origem etimológica da palavra

cultura, proveniente da língua latina. A seguir, o dicionário de

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PEDAGOGIA92

e progresso, uma equivalência do senso comum que, na verdade,

é problemática, porque pode levar à falsa ideia de que cultura

se restringe a civilização, que, por sua vez, remete à ideia de

progresso, termo usualmente associado a desenvolvimento

material e técnico.

As diversas acepções da palavra cultura registradas por Aurélio

se referem a um ou mais aspectos particulares da cultura de um

povo, mas não chegam a construir o sentido antropológico do

conceito de cultura, nem mesmo no item três, que apresenta uma

proposição descritiva pretensamente generalizante.

Antes de abordar o conceito antropológico de cultura, é desejável

pavimentar o caminho, chamando atenção para diferentes níveisde abstração que o sentido antropológico do termo cultura se

reveste. Quando se pensa antropologicamente o que é cultura,

tem-se a humanidade como referência.

O conceito antropológico de cultura aborda a humanidade como

totalidade, cuja distinção se caracteriza pela capacidade de criar

e desenvolver modos extraordinariamente diversos de ser e de

existir em sociedade, como coletividades particulares.

A totalidade (humanidade) envolve as diversas coletividadesexistentes nas várias regiões do mundo, em épocas diferentes

ou contemporâneas. Cada modo particular de ser e de existir,

característico de uma coletividade, constitui uma realidade

particular e especíca. O conceito antropológico de cultura é,

no nível da totalidade (como valor e experiência humana), uma

generalização teórica que abrange as diversidades culturais da

humanidade e que, por isso mesmo, constitui suporte teórico de

referência para o conhecimento de qualquer coletividade humana.

O conceito de cultura é o conceito fundamental de toda análise eexplicação antropológica.

Aqui nos aproximamos da segunda diculdade: os paradoxos

implícitos na unidade da espécie humana e sua extraordinária

diversidade cultural. A humanidade é uma só, mas suas expressões

empíricas são muito diversas.

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 3   93

A humanidade é composta por todos os humanos, mas os humanos

podem ser árabes, chineses, brasileiros, guajajaras, canelas. Os

árabes, os chineses, os brasileiros, os guajajaras, os canelas têm

em comum o fato de terem sua cultura particular. Ter cultura

própria torna todos esses homens iguais na sua humanidade, na suacapacidade de simbolizar. Ter cultura é universal como experiência

humana, todavia, cada realidade cultural particular é única.

As culturas possuem a qualidade paradoxal de seremestáveis, de se perpetuarem, ao mesmo tempo quesão dinâmicas, que envolvem constantes processosde mudança (LAPLANTINE, 1999, p. 62).

As culturas condicionam os indivíduos de sua coletividade, mas

estes não têm consciência plena de ação cultural. A cultura

transcende à capacidade de apreensão de cada indivíduo.

O estudo cientíco de uma cultura abarca um processo de

compreensão do povo que a detém, de entendimento das opções

feitas para organizar sua vida social. Cada cultura especíca

é uma conguração particular, expressando nas ações de seus

indivíduos e grupos a diversidade cultural em suas múltiplas

possibilidades.

Esse processo de conhecimento do outro, esse empenho em decifraras diferentes formas de viver em sociedade e de compreendê-

las é um modo de conhecer nossa própria realidade cultural. No

esforço de conhecer o outro, nos conhecemos também, pois é

reconhecendo no outro o ser, ou o não-ser, que reconhecemos em

nós mesmo o que somos e o que não somos.

Observando, por exemplo, a relação de respeito que os grupos

indígenas têm com suas crianças, é que reconhecemos, mais

facilmente, que esse valor não é fundamental em nossa cultura. Do

mesmo modo, observando a ausência de divisão e hierarquizaçãosociais em muitas sociedades indígenas, reconhecemos, com mais

clareza, a divisão de classes em nossa organização social. O outro

é o nosso espelho. Ao olhá-lo, vemo-nos melhor, pois reete nossa

própria imagem invertida, como já o dissemos.

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PEDAGOGIA94

Esse jogo de espelhos, que a diversidade cultural promove, faz

da reexão antropológica uma ampla vertente de humanismo. O

enfoque cientíco da Antropologia, ao propor o estudo do homem

por inteiro, confere-lhe o estatuto de ciência sintetizadora,

na medida em que proporciona às outras ciências sociais e àschamadas humanidades um marco de referência mais abrangente,

de síntese da experiência humana.

Pela diversidade de seus materiais, certa complexidade e rigor dos

seus métodos e técnicas, a Antropologia amplia a perspectiva de

uma abordagem integrativa do homem, sua unidade biológica e

imensa diversidade cultural.

Como ferramenta teórica de construção do conhecimento

antropológico, o processo de construção do conceito de culturareete o movimento de constituição da Antropologia, ao mesmo

tempo como ciência social e como vertente de humanismo.

A distinção entre as ciências decorre, basicamente, do modo como

os cientistas pensam, concebem, denem, problematizam seu

objeto de conhecimento, bem como dos conceitos e categorias

com que se propõem abordá-lo, analisá-lo, sistematizá-lo, explicá-

lo ou interpretá-lo.

Como já tivemos oportunidade de ver anteriormente, aAntropologia, tendo como objeto o homem, distingue-se das

outras ciências que também estudam o homem por apresentar

como questão central a diversidade cultural.

Já ressaltamos que, ao longo de sua trajetória como ciência, a

Antropologia vem tentando resolver o paradoxo da unidade

biológica do homem, que contrasta com a imensa variedade

cultural que a espécie humana foi capaz de produzir, num espaço

de tempo. Esse dilema permanece como tema e problema daAntropologia, estimulando a investigação do homem e de sua

diversidade cultural.

Todo campo de conhecimento, porém, assenta as bases teóricas

de investigação em dado conceito que constitui a pedra de toque

de toda produção do saber que lhe é próprio.

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 3   95

A iniciação cientíca, no campo da Antropologia, leva-nos a idas e

vindas sobre algumas concepções fundamentais, com as quais estão

sendo feitas todas as construções do conhecimento antropológico.

Aprender Antropologia é envolver-se na compreensão da

diversidade cultural humana. Por isso mesmo, quando estudamosAntropologia, estamos o tempo todo lidando com as concepções

de cultura e diversidade.

Etnocentrismo e Relativismo

As diferentes culturas não existem isoladas no espaço e no tempo.

Indivíduos de culturas diferentes estabelecem contatos entre si, ao

longo da história da humanidade. A situação de contato apresenta,

então, uma possibilidade de trocas, entre portadores de diferentes

culturas que são estimulados a lidar com sua diversidade.

Ao estabelecer a relação de contato, cada sociedade ou grupo

social tende a tomar a sua cultura, os valores da sociedade a que

pertence, como referência da explicação que constrói sobre a

diversidade. O observador, estranhando o outro, o que é de fora,

é levado a pensar a diversidade e tende a associar e a xar adiferença percebida naquele que não pertence a seu grupo.

Em tal perspectiva, a relação de contato se congura sob o enfoque

da diversidade cultural, numa relação entre nós (os do grupo social

e cultural a que se pertence) e os outros (aqueles de fora, que não

fazem parte do nós e, portanto, não pertencem a nosso grupo).

A percepção da diferença nos permite a distinção entre nós e os

outros. A diferença apreendida é olhada e pensada por nós como

esquisita, exótica, intolerável.

As diferenças podem nos surpreender, escandalizar-nos, horrorizar-

nos, ou até nos encantar. As diferenças étnico-culturais tendem

a nos provocar tensão, desconança, medo e pânico que se

expressam em repulsa, nojo, irritação, intolerância, aversão.

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PEDAGOGIA96

Ao usar os valores da sociedade a que se pertence para formular

julgamentos sobre o outro, confere-se à cultura particular

o caráter universal de referência. A esse modo de lidar com a

diferença, de estabelecer relação com o outro, é que chamamos

de etnocentrismo.

A diferença nos incomoda, ela nos descentra, porque afeta nossas

certezas, nossa segurança e nossa identidade. Nós procuramos

resolver o incômodo atribuindo-a ao outro, localizando-a no outro,

responsabilizando o outro pela “desordem”, pelo “desequilíbrio”

que ela traz à nossa visão de mundo, aos nossos valores, aos nossos

conceitos.

Antes do contato, tem-se um conceito de homem, de humano, de

humanidade, fundado na própria tradição cultural. O outro temmodos de ser, de pensar, de fazer e de sentir que contrariam,

confundem as nossas referências.

O problema que a diferença apresenta é imediatamente reduzido

a uma questão de pertencimento e, como o outro não pertence ao

nosso grupo social, à nossa cultura, o problema é o outro. Temos

diculdade em pensar o contrário. Recusamo-nos a perceber que,

a partir dessa mesma lógica, o outro pode igualmente nos explicar.

Nós somos também o outro, vistos a partir do ângulo do grupo

a que não pertencemos. A postura etnocêntrica implica não ver

o outro como igual. O outro é diferente, não é igual, e, neste

sentido, é sempre considerado inferior.

Diferença étnico-cultural não signica necessariamente desigual-

dade ou inferioridade. Quando, porém, pensamos a diferença

como atributo do outro e nos tomamos como centro de referência,

qualicamos o outro como desigual, produzimos a desigualdade e

a inferioridade.

Duvida-se, até, se o outro é humano mesmo, ou se é tão humano

quanto nós achamos que somos. Foi o que ocorreu quando a

América foi descoberta. Os europeus viam os índios como seres

exóticos. Tão diferentes, seriam homens? Pertenciam à mesma

espécie? Pareciam homens mais falavam língua esquisita. Andavam

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 3   97

nus (não tinham pudor), eram pagãos (não tinham Deus). Pareciam

homens, mas com costumes tão diferentes. Seriam humanos?

O índio não foi o primeiro a expor a questão da diferença, pois os

europeus já tinham contato com africanos e com asiáticos, desdea antiguidade. O índio era a realidade incômoda, com a qual o

europeu defrontava e com a qual era preciso lidar. Na Europa

os índios e a América passavam a ser a novidade. O assunto era

palpitante, as opiniões se dividiam. A igreja, preocupada em

expandir seu raio de inuência, interessada em assegurar sua

participação no projeto colonial com a tarefa missionária de

conversão dos gentios, usando sua autoridade, decretou que os

índios tinham alma, logo eram humanos.

Se os índios fossem negados como humanos, não teriam alma. Nãotendo almas para converter, não haveria motivo para a participação

da Igreja na colonização. Por isso, foi promulgada a bula papal

que declarava que o índio tinha alma, ou seja, de acordo com as

concepções da época, que o índio era gente.

Segundo Everardo Rocha, doutor em Antropologia Social e professor

da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC/RJ

(1991, p.7).

Etnocentrismo é uma visão de mundo onde o nossopróprio grupo é tomado como centro de tudo, etodos os outros são pensados e sentidos através dosnossos valores, nossos modelos, nossas deniçõesdo que é a existência. No plano intelectual, podeser visto como a diculdade de pensarmos adiferença; no plano afetivo, como sentimento deestranheza, medo, hostilidade etc..

O etnocentrismo resulta de uma visão de mundo baseada em

valores de um grupo, para denir os outros. Pode emergir tanto na

relação de uma sociedade com outra sociedade, como na relaçãode um grupo com outro grupo no interior de uma mesma sociedade.

Tanto num caso como no outro, o etnocentrismo se expressa na

opinião, no conceito prévio que se forma sobre o outro, sem maior

conhecimento.

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PEDAGOGIA98

É um pré-conceito étnico-cultural. Ideologicamente se congura

como ideia preconcebida do outro, cuja formulação não leva em

conta a sua realidade difenciada. Na prática, o etnocentrismo é

um critério parcial de inclusão e exclusão.

Em qualquer de suas expressões, o etnocentrismo envolve certo

conteúdo de narcisismo autoritário. Todo grupo, toda sociedade,

constrói uma ideia positiva de si mesmo, uma autoimagem

reforçada e estimulante da autoestima, todos os povos são mais

ou menos etnocêntricos.

Em duas de suas expressões mais hostis, o etnocentrismo

historicamente vem dando suporte a extremada violência contra o

outro: o racismo e a intolerância religiosa.

A intolerância religiosa tem estado na base de conitos armados

entre grupos étnicos, tanto no passado como no presente.

É o caso, por exemplo, dos conitos ocorridos na Irlanda do

Norte, entre católicos e protestantes e na guerra da Bósnia, entre

muçulmanos e cristãos, e no Brasil atual, onde os evangélicos

desqualicam as práticas religiosas de matrizes africanas com

os mesmos argumentos e atitudes que os nazistas alemães

desqualicaram os judeus.

O racismo é, talvez, a mais insidiosa e resistente forma de

etnocentrismo. O nazismo é um etnocentrismo exacerbado.

Fundado numa ideologia racista de superioridade da raça ariana,

o nazismo promoveu o genocídio dos judeus. Todavia, o racismo

tem historicamente escolhido, como alvo preferencial, os negros.

(Enfocaremos mais tarde as noções de raça como conceito

cientíco).

Na expansão colonial europeia, é o racismo que vai justicar a

escravidão do negro. Em nossos dias, o racismo continua motivando

conitos em várias partes do mundo. Na África do Sul, o racismo

ganhou contornos críticos, como nos Estados Unidos. Conitos

raciais emergem periodicamente, com duração e amplitude

maiores ou menores, mas com violência semelhante.

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 3   99

No Brasil, o racismo assume feição cambiante dissimulada, mas

não menos cruel.

Relativismo Cultural

No sentido antropológico, a concepção que vai se contrapor à

rigidez das posturas etnocêntricas é o relativismo.

O relativismo cultural propõe o diálogo, o reconhecimento do

outro. Busca-se compreender o outro por meio de seus próprios

valores. Busca-se conhecer a lógica interna da sua cultura, dos

seus modelos e denições de ser no mundo.

O relativismo cultural postula uma concepção aberta da diferença,

propondo uma perspectiva descentrada do olhar. É uma visão de

mundo sensível a outras formas de viver em sociedade, a novas

alternativas de ser e estar no mundo, a outros referenciais, a

outras experiências de vida humana associativa.

Toda cultura se explica em termos de sua própria lógica. As

soluções culturais, símbolos e signicados que uma sociedade

criou ao longo da sua história são compreensíveis quando referidas

à lógica do próprio sistema que as produziu.

A relativização é uma condição preliminar do pensamento

antropológico. O antropólogo estuda as culturas humanas, partindo

do pressuposto de que são equivalentes como valor e como

experiência. A diversidade de modos de ser e existir em sociedade

revela a possibilidade de uma innidade de modelos, de tramas.

O relativismo permite ao antropólogo libertar-se das limitações

de sua visão de mundo para a compreensão de outros sistemas de

pensamento, de outros modos de relação e de representação.

Com o relativismo, os antropólogos estão mais em condições de

compreender o outro, na medida em que se tornam capazes de um

processo reexivo, tendo como objeto a própria cultura. Sendo o

outro o objeto intelectual da pesquisa antropológica, a superação

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PEDAGOGIA100

do etnocentrismo se exibe como a condição fundamental de

conhecimento.

O olhar antropológico implica no estranhamento do familiar, do

próximo, do conhecido. O processo de relativização envolve pensaro outro e sua cultura, nos termos de suas próprias referências.

Todavia, o relativismo cultural não se esgota na constatação de que

cada cultura possui seus critérios de classicação e de avaliação,

ou na posição analítica do conhecimento de dentro para fora, ou

na posição “neutra” de que não há superioridade ou inferioridade

entre as diferentes culturas.

No desenvolvimento histórico dessas relações entre culturas,

processos de denominação marcaram e orientaram contatosentre os povos que as detêm, produzindo relações desiguais e

hierarquizações. Nenhuma cultura é superior ou inferior a outra,

mas os processos históricos que relacionam umas às outras

produziram desigualdades que não podem ser ignoradas.

A concepção de relativismo cultural vem incorporando a reexão

sobre as culturas, as hierarquias historicamente produzidas,

reconhecendo as desigualdades que afetam os povos, na relação

de dominação entre realidades culturais diferentes.

Sob tal enfoque, o relativismo não se limita ao reconhecimento

da relatividade de critérios culturais, ao entendimento de que

cada cultura particular tem sua lógica interna, que é necessário

conhecer, para que se possa compreendê-la.

Além do distanciamento do olhar, o relativismo envolve

um comprometimento com o outro. O reconhecimento das

desigualdades, nessa perspectiva de relativização, impõe a

participação nos esforços de superação dos processos de dominação.

Tomemos como exemplo as sociedades indígenas sobreviventes

em nosso País. O relativismo cultural implica o reconhecimento

de que cada grupo indígena possui cultura e de que cada uma

dessas culturas indígenas tem seu modo particular de conceber

o mundo, de organizar a sua vida social, de dar sentido a sua

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 3   101

existência. Cada cultura indígena possui suas próprias tradições,

seus costumes, suas práticas, suas regras, seus códigos, seus

processos de simbolização.

A relativização das culturas indígenas, contudo, não se restringeao reconhecimento de que índio tem cultura, ou de que a cultura

indígena deve ser avaliada conforme seus próprios critérios.

Envolve também o reconhecimento do processo de hierarquização

dessas culturas em relação a nossa e da sua situação de

desigualdade, resultantes do processo histórico de dominação dos

povos indígenas, desde o início da colonização do Brasil.

Envolve nosso comprometimento com os esforços de superação

das desigualdades, reetidos nos direitos especícos que a

Constituição de 88 lhes reconhece: o direito à terra, o direito asua cultura, o direito à diferença com respeito e dignidade.

  DIFERENCIAÇÃO ÉTNICO-CULTURAL E EDUCAÇÃO: atrasmissão da cultura

 

O Estudo da cultura envolve, necessariamente, um estudo da

sociedade como um sistema de símbolos e signicados, como

sistema de comunicação.

Por sua vez, o enfoque da cultura como construção histórica, como

produção social, implica sua abordagem como uma dimensão do

processo social. A cultura, ao mesmo tempo que é produção social,

produz a sociedade, constituindo um plano independente da

vida social, com sua própria dinâmica, envolvendo seus próprios

mecanismos de comunicação e de transmissão.

Os processos de transmissão da cultura dão suporte ao processo

de socialização. É através da cultura que uma sociedade socializa

seus membros.

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PEDAGOGIA102

O processo de socialização do ser humano se dá a partir do

seu nascimento. A família, biológica ou adotiva, é a instituição

social responsável pela transmissão do discurso cultural e de

suas estruturas básicas de signicação. O aprendizado de como

ser membro de uma sociedade tem como referência um processoeducativo socialmente denido.

Enquanto processo cultural, a socialização é concebida como

processo de construção da pessoa. Marcel Mauss, um eminente

antropólogo francês, entre muitas de suas importantes

contribuições à teoria da cultura, foi o primeiro a desenvolver a

noção de pessoa. Desde então, a construção da pessoa tem sido

um tema recorrente na Antropologia pela sua centralidade nos

processos de identidade e de transmissão da cultura.

Toda cultura dene seus processos de construção social da pessoa.

A família é o foco de construção da pessoa, na sua identidade

social e na sua expressão linguística. Assim, em cada sociedade

ou grupo étnico, o processo de denição da pessoa passa por

etapas especícas, possibilitando o seu reconhecimento enquanto

membro pertencente ao grupo, desde as primeiras etapas da vida.

Considerando as dimensões do mundo, com toda a diversidade

de povos e culturas, podemos imaginar que essas situações se

dão das formas mais diversicadas possíveis, ainda que se possa

encontrar alguma correspondência, mesmo em sociedades que

nunca mantiveram nenhuma forma de contato.

Na nossa sociedade, o processo de socialização se dá inicialmente

na família, e depois na escola formal.

A família é a referência principal de modelagem do indivíduo, pois

é ali que ele vai receber os primeiros ensinamentos da sua cultura

desde o nascimento, pois o próprio parto é denido culturalmente,

os primeiros contatos com a mãe ou com outras pessoas da família,

situação que também varia de acordo com a cultura do grupo.Na família, desde a fase da infância, o indivíduo vai aprender os

princípios básicos da socialização, ouvir histórias, aprender as

lendas, os costumes, valores etc., que vão lhe dar suporte moral

para se tornar membro dessa cultura até a fase adulta, onde terá

também a responsabilidade de repassá-la a outros.

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 3   103

A educação escolar desempenha também um papel crucial

na construção social da pessoa. A escola é a instituição social

destinada à preparação para a vida pública, para o trabalho, para

a maturidade. Cabe socialmente à escola preparar o indivíduo,

masculino ou feminino, para assumir a posição concreta de adulto,

econômica e socialmente produtivo dentro da sociedade.

A escola é, enquanto instituição social de transmissão da cultura,

parte da sociedade e da cultura. Em seu interior, os diversos

processos de identicação continuam operantes, ela reproduz

a representação social do mundo e as representações sociais de

pessoa.

Neste sentido, os educadores têm um papel crucial no processo

de formação do indivíduo. Precisam estar familiarizados com

as concepções pedagógicas e metodológicas mais atualizadas,

devendo com isso estar qualicados para orientar a formação dos

alunos na direção da superação dos preconceitos e discriminações,

estimulando a convivência harmoniosa e o respeito às diversidades

étnicas e culturais, de gênero, crenças etc.

Essa dimensão da educação escolar incide decisivamente no

processo pedagógico, e pode ser responsável pelo sucesso ou

insucesso dos grupos humanos no processo escolar.

 DIMENSÃO CULTURAL DA ESCOLA

A passagem da vida familiar para a vida escolar é uma experiência

marcante para a grande maioria das crianças. A criança se percebe

e adquire consciência de si, a partir das relações que estabelececom a realidade do meio familiar. Suas referências, seus valores,

sua visão de mundo, permitem-lhe uma representação de mundo

e de si, cujos focos de signicação são compartilhados. Essas re-

ferências e os vínculos que constroem permitem a certeza do seu

enraizamento cultural.

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 3   105

Os seus quadros de referência e os de seus pares apresentam, ou

não, pontos de convergência e, para muitas crianças, apresentam

uma dolorosa divergência com os quadros dominantes de referência.

A sala de aula é, também, um palco de conitos. As diferençasraciais, as diferenças de origem regional ou de origem urbano-

rural, enm, as diferenças étnico-culturais, conguram conitos

de valores de pertencimento, interferindo no reconhecimento

recíproco entre os colegas de classe, podendo assumir feição

limite de processos de rejeição, de discriminação.

Os dados estatísticos, no Brasil, têm revelado, nas últimas décadas,

que o não reconhecimento da diferenciação étnico-cultural é uma

das causas do insucesso escolar.

As representações coletivas sobre capacidades intelectuais de

negros e índios apontam na direção de que a tendência do insucesso

escolar se explica pela diferença em si. A competência intelectual

de índios e negros é tradicionalmente depreciada.

Os índios são considerados incapazes de civilização. O discurso

social sobre o índio, passa a ideia de que ele possui uma mentalidade

primitiva, pré-lógica, ingênua, infantil. Se o índio é socialmente

considerado selvagem, incapaz de civilização, ca implícita sua

incapacidade também para a escolarização.

Essas explicações são preconceituosas, etnocêntricas, fundadas na

lógica do evolucionismo vulgar, das teorias racistas de explicação

da diversidade de caracteres físicos dos humanos.

Da mesma forma, os negros são considerados como intelectualmente

inferiores. As teorias racistas do Conde Gobineau, diplomata

francês no Brasil, durante o segundo império, foram muito

divulgadas e se tornaram populares. Para Gobineau, os negros

eram sicamente bem dotados, portanto, apropriados ao trabalho

pesado, que requeria esforço físico. Sobre tais concepções se

assentam representações positivas de dotes físicos do negro, ter

boa voz, bons dentes, mais resistência física, mais potência sexual,

mais sensualidade, mais ritmo, bom ouvido.

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PEDAGOGIA106

O pressuposto é que, por ter essas qualidades, o negro se destaca

no futebol, na música, na dança. Não se leva em conta que são

práticas culturais populares que os negros sempre puderam

realizar, desde o contexto da escravidão.

No que se refere a qualidades intelectuais, todavia, o negro,

segundo Gobineau, é pouco dotado. Sobre tal concepção se

assentam representações negativas da inteligência do negro,

considerando-os “rudes”, com diculdade para aprender.

O problema, na verdade, não se coloca na diferença em si,

negros e índios têm as mesmas capacidades ou incapacidades

de aprendizagem que os brancos possuem. A diculdade de

aprendizagem é engendrada em nível do distanciamento social e

cultural que o meio escolar lhes impõe.Crianças negras e índias não se veem reetidas no material

dedático-pedagógico adotado pelo sistema escolar. Aos problemas

e às diculdades que todos os alunos enfrentam, somam-se

a hostilidade, a discriminação, o desprezo, a humilhação, o

desenraizamento cultural, a opressão que tornam a escolaridade

uma experiência dolorosa, traumática.

A diferenciação étnico-cultural, como fator de insucesso escolar,

coloca o desao de se pensar a forma como o sistema educacional

trata brancos, negros e índios no Brasil.

Educação dos Negros

Pelo preconceito de ter preconceito, muitos professores não

explicam o seu pensamento sobre as crianças negras com que se

relacionam na sala de aula, ao longo de sua vida prossional. Mas,

certamente, esse pensamento se constitui numa mediação da

relação pedagógica com as crianças negras.

Esse pensamento assume muitas formas de expressão: “a maioria

dos negros tem recalque, é complexado”, por isso não consegue

ter bom rendimento escolar; “negro não pensa no futuro”; “o

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 3   107

negro se discrimina”; “negro foi libertado, teve chances, mas não

progrediu”; “problema do negro é econômico”; “negro é bom de

futebol e de samba”; “negro é feiticeiro”; “a maioria dos negros

é de marginal”. A lista não se encerraria aqui, pois o repertório de

representações estigmatizantes do negro é amplo e variado.

Analisando esse conjunto de representações sob o enfoque de suas

implicações pedagógicas, percebe-se que a ideia resultante é de

que o negro é responsável pela sua posição social de inferiorização.

Isto é, o próprio negro se discrimina, o próprio negro constrói seu

destino.

Sabemos, todavia, que a discriminação racial é, necessariamente,

racista. Logo, a discriminação, o “recalque”, o “complexo”, são

contruídos socialmente, ou seja, são produzidos pela sociedade.

No interior da escola, quando o negro sofre discriminação, isto

não é problema só dele, é um problema da escola, é um problema

pedagógico que deve ser enfrentado.

Quando se reduz o problema da questão racial a uma questão

de classe, a um problema econômico, pretende-se escamotear o

racismo. Sabemos que a maioria das crianças negras que vão à

escola pública pertencem às famílias mais pobres e que as famílias

negras são, em sua maioria, pobres porque a integração do negro

na sociedade de classe se fez sob a determinação do legado da

escravidão.

Sem acesso à escola, sem qualicação para o trabalho, com o

estigma da escravidão e do racismo, ao trabalhador negro coube o

último lugar na escala social.

O problema da educação dos negros coloca-se, portanto, como

um problema real, como um problema educacional que demanda

soluções especícas, para além das necessárias soluções

educacionais para uma escola pública de qualidade, é um problema

central à questão da democratização da educação.

É oportuno, sob tal perspectiva, enfocar o problema sob dupla

dimensão: a dimensão da educação familiar e a dimensão

da educação escolar. As famílias negras enfrentam grandes

diculdades em educar seus lhos no seio de uma sociedade racista

que culturalmente escamoteia seu racismo.

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PEDAGOGIA108

Em sua grande maioria, as famílias negras tendem a preparar, de

modo equivocado, seus lhos para enfrentar o racismo. Vivendo

numa sociedade etnocêntrica, as famílias internalizam os valores

dominantes, impregnados de preconceito.

Vivendo num mundo de brancos, mesmo resistindo, os negros são

levados a interiorizar os valores culturais brancos, incluindo os

valores estéticos que culturalmente orientam a preferência no

sentido dos caracteres fenotípicos brancos. O negro é levado a

introjetar sua própria imagem sob o ponto de vista do branco.

Caracteres físicos como cor da pele, textura do cabelo, forma do

nariz e dos lábios, são confrontados com o padrão branco. Mesmo

quando a criança negra é estimulada a se ver como bonita, sua

beleza é colocada em confronto como padrão de beleza dominante,

em situação de desvantagem.

Há três orientações educacionais culturalmente engendradas

no interior de famílias negras, sob pressão do meio branco, que

reforçam a indução da desvantagem racial no que respeita à

estética étnica:

1. reforçar o imaginário da sensualidade;

2. exacerbar a noção de limpeza corporal;

3. estimular a autorrepressão sob a forma de submissão a

alisamento dos cabelos ou sob a forma do corpo reprimido,

contido.

Mesmo recebendo orientações na família, sobre o fortalecimento

da autoestima, a criança negra, quando experimenta situaçõesnegativas, seja na escola ou fora dela, discrimina a orientação

recebida em casa e passa a acreditar que a beleza ou a feiura

negra são desvantajosamente valorizadas em relação à beleza ou

à feiura branca.

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 3   109

No que diz respeito à relação com o mundo, as alternativas de

padronização cultural mais frequentes no meio negro em relação

à cor são: a reprodução do racismo dominante, no uso da cor

como forma de repressão e humilhação das crianças pelos adultos;

evitação de estigma da cor pela via de relações clientelísticas,

do branqueamento social, da invisibilidade pela postura discreta

e submissa; conformismo; enfrentamento do preconceito; e luta

pela cidadania.

No que diz respeito à vida familiar, em muitos casos, a tradição

cultural, pela via da religiosidade, das práticas culturais

associativas dá à criança negra as referências positivas para se

perceber no mundo. Todavia, a dominação social e a polaridade

racial conguram a impropriedade dessas referências, diluindona insegurança a identidade negra, fragmentando-a no ser-no-

mundo, no confronto com as práticas racistas. A passagem da vida

familiar para o meio social mais amplo é, para a criança negra,

uma experiência dolorosa. A fragmentação da consciência negra é

uma das mais perversas faces da discriminação racial.

De modo geral, a escola, na perspectiva de reprodução social,

não se coloca como seu o problema da discriminação e educação

dos negros. Uma educação que se pretende democrática, de

qualidade, co-responsável pela libertação, não pode se eximir dasua responsabilidade em relação à problemática etnico-racial.

A educação dos negros não pode ser pensada como paralelismo ou fora

da sociedade. O negro é membro da sociedade e, como tal, tem direito

e deve estar incluído democraticamente no processo educacional.

A educação dos negros sob o enfoque crítico, relativizador e

transformador das relações raciais, tanto em nível prático como

ideológico, através dos movimentos sociais, especialmente do

movimento negro, emerge da própria sociedade que constitui.

A abertura da escola à parceria do movimento negro, confere um

sentido político a sua ação pedagógica, no sentido da educação

para a cidadania, na perspectiva da superação dos preconceitos e

da discriminação racial.

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PEDAGOGIA110

A sociabilidade racista introjetada produz a subordinação

aquiescente do negro. Ele aceita a dominação, acaba por se

ver sob a ótica racista, procurando nos interstícios das relações

raciais, formas individuais de compreensão social, pela diminuição

das desvantagens de ser negro.

Pensando-se como o branco pensa, em conformidade com os

valores dominantes, o negro não se dispõe a se organizar pela

liação racial, não se dispõe a se expor como membro de raça,

alinhando-se ao discurso dominante de que é o próprio negro que

tem preconceito e que, dividido e desorganizado, reproduz os

mecanismos racistas de dominação.

A atuação do movimento negro, ainda que pontual e intermitente,

tem sido propulsora de ganhos reais no sentido da democratização

das relações raciais no Brasil.

No plano social mais amplo, o movimento conseguiu, na Consti-

tuição de 1988, a prescrição da prática do racismo como crime

inaançável (Art. 5, inciso XLII); a proteção das manifestações das

culturas afro-brasileiras (Art. 215, parag 1º); o tombamento, como

patrimônio cultural brasileiro, dos documentos e sítios dos anti-

gos quilombos (Art. 216, inciso V, parag. 5º); reconhecimento da

propriedade denitiva da terra aos remanescentes das comunida-

des dos quilombos que nela permanecem (Art. 68 das Disposições

Transitórias).

O reconhecimento de direitos especícos foi um passo importante

da sociedade no sentido da democratização das relações raciais e

esse passo foi uma conquista do movimento negro.

Em diversos Estados, o Movimento Negro vem conseguindo atuar no

âmbito da educação escolar em projetos relacionados a currículo,

programas, livro didático, formação de professores. Em todo País,

a luta dos movimentos negros pela democratização da educação

vem alcançando resultados. Mas esse é o começo de uma longacaminhada marcada por avanços e recuos.

Lidar com as diferenças numa sociedade e cultura etnocêntricas

é muito difícil. A questão da identidade é, por isso, uma questão

crucial. A compreensão de que nós, brasileiros, somos plurais,

somos diferentes e que na nossa diversidade temos objetivos

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 3   111

comuns, objetivos que se realizam como de interesse comum se as

nossas diferenças são consideradas, é uma tradição epistemológica

de educação e diversidade que precisamos construir.

Um grande começo é, sem dúvida, a abertura da escola à expressão

da cultura afro-brasileira, do modo como os negros se põem no

mundo, o modo de ser negro na situação de pluralidade étnico-

cultural com negros e com outros étnicos. Essa abertura implica

um esforço de reconstituição da ação pedagógica no sentido de

descontaminá-la do racismo, do branqueamento, da opressão.

No que respeita à diferença racial, a educação escolar tem se

demonstrado uma educação de exclusão de negros e de formação

de morenos.

A necessidade de superação desses entraves à formação do negrono processo educacional, em termos de fortalecimento da auto-

estima e de reconhecimento de cidadania, nos acena em direção

à importância da parceria entre as escolas e os movimentos

populares, como oportunidade de trocas e enriquecimento mútuo.

As escolas precisam do saber dos movimentos para enfrentar

o desao de sua democratização e os movimentos precisam da

escola para construção de uma modelagem conceitual, aberta

a múltiplas referências, a múltiplos saberes, garantindo aos

afro-brasileiros reconhecerem-se nela como atores sendo, noprocesso pedagógico, uns com os outros ensinando, aprendendo,

construindo, pois conhecer é apreender diferenças, diversidades,

identidades, no processo social, encontrando-se o sentido desse

processo, embora vivendo-o de modo diferençado.

Outras Minorias Sociais

Da mesma forma que negros e índios, a pesquisa antropológica no Brasil

se estende ao conhecimento de outros grupos que revelam formas

especícas de organização social, denidos como minorias étnicas

ou sociais. Esses grupos estão situados tanto no que se dene como

sociedades tradicionais como em espaços da modernidade, ou seja,

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PEDAGOGIA112

segmentos rurais ou urbanos, que constroem sua identidade a partir do

autorreconhecimento como pertencente a este ou àquele grupo.

Existe uma grande quantidade de “outros”, no Brasil, que são

denidos etnocêntrica e preconceituosamente, a partir dos padrõesvalorativos da sociedade dominante. As formas de organização

desses grupos são objeto legítimo da análise antropológica,

a partir de cujas pesquisas pode-se desvendar muito de suas

especicidades e diferenciações, bem como de suas articulações

internas e com a sociedade envolvente.

São trabalhadores rurais de diversas categorias: sem terra,

lavradores, pescadores, quebradeiras de coco-babaçu etc.; são

grupos urbanos de roqueiros, regueiros, blocos carnavalescos,

imigrantes, mulheres, homossexuais, quilombolas etc.; grupos deculturas tradicionais, religiosos, componentes da cultura popular,

enm, tantos e tantos outros e outras, que enfrentam situações

de discriminação em seu dia a dia, que reivindicam direitos de

participação social e reconhecimento de cidadania.

A denição desses grupos como minoria étnica ou social está

relacionada ao não reconhecimento da sua importância no processo

de formação da sociedade. No entanto, são indivíduos, pessoas,

que se organizam enquanto grupo especíco, visando fortalecer

suas identidades e adquirir visibilidade como protagonistas da

história.

Na verdade, são homens e mulheres que, independentemente das

suas características étnicas, sociais, ou sexuais, estão presentes,

atuando nos diversos setores da sociedade, contribuindo, enm,

com a dinâmica das transformações socioculturais, portanto,

devem ser respeitados em sua condição de membro de uma

sociedade humana, com os mesmos direitos de cidadania que

dizem respeito a todos.

Cabe à educação, contribuir de forma coerente para a superação

dos preconceitos que envolvem as relações da sociedade com esses

indivíduos, mostrando que as desigualdades são consequências

das contradições da sociedade de classes, e não por qualquer

incapacidade do indivíduo. É preciso enfatizar que a hierarquização

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 3   113

dos povos em categorias sociais é fundamentada em interesses

políticos e econômicos que ferem a democracia e a dignidade

humana. No caso da sexualidade, é preciso ressaltar que a opção

sexual é uma escolha que não compromete em nada a sua condição

de ser humano.

Enm, cabe aos educadores e educadoras enfatizar, a partir das

concepções antropológicas, que em uma mesma espécie, todos os

indivíduos têm as mesmas potencialidades para produzir trabalho,

saberes e conhecimentos, para repoduzir-se biologicamente, etc.,

o único empecilho para o desenvolvimento dessas potencialidades

é de ordem social, fundamentada em racismos, sexismos e

preconceitos, que devem ser extirpados das relações humanas

baseadas em princípios democráticos.

As escolas precisam do saber dos movimentos para enfrentar

o desao de sua democratização e os movimentos precisam da

escola para sua construção.

“Ao receber a missão de ir pregar junto aos selvagens, um pastor

se preparou durante dias para vir ao Brasil e iniciar, no Xingu, seutrabalho de evangelização e catequese. Muito generoso, comprou

para os selvagens espelhos, pentes etc.: modesto, comprou para si

próprio apenas um moderníssimo relógio digital capaz de ascender

luzes, alarmes, fazer contas, marcar segundos, cronometrar e até

dizer a hora sempre absolutamente certa, infalível. ...Tempos

depois, fez-se amigo de um índio muito jovem que o acompanhava

a todos os lugares... e mostrava-se admirado do colorido e estranho

objeto que o pastor trazia no pulso ... um dia, por m, vencido por

insistentes pedidos, o pastor perdeu seu relógio dando-o, meio sem

jeito e a contragosto, ao jovem índio.

... Dias depois, o índio chamou-o apressadamente para mostrar-lhe,

muito feliz, seu trabalho. Apontando seguidamente o galho superior

de uma árvore altíssima nas cercanias da aldeia, o índio fez o

pastor divisar, não sem diculdade, um belo ornamento de penas e

contas coloridas, tendo no centro o relógio. ... Quase indistinguível

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PEDAGOGIA114

em meio às penas e contas e, ainda por cima pendurado a vários

metros de altura, o relógio, agora mínimo e sem nenhuma função,

contemplava o sorriso inevitavelmente amarelo no rosto do pastor.

Passados mais alguns meses, o pastor foi de volta para casa. Sua

tarefa seguinte era entregar seus relatórios aos superiores e,

naquela manhã, dar uma última revisada na comunicação que iria

apresentar em um congresso sobre evangelização, falando sobre

‘A catequese e os selvagens’. Na hora de sair, como que buscando

inspiração de última hora, examinou detalhadamente as paredes

do seu escritório. Nelas, arcos, echas, tacapes, bordunas, cocares

e até uma auta formavam uma bela decoração. Rústica e sóbria

ao mesmo tempo, trazia-lhe estranhas lembranças. Com o pé

na porta, ainda pensou e sorriu para si mesmo. Engraçado o queaquele índio foi fazer com o meu relógio (ROCHA, Everardo. O QUE

É ETNOCENTRISMO. p. 11-12)

Discuta e analise o conteúdo do texto acima, à luz

dos conceitos de Cultura, relativismo cultural e

etnocentrismo.

Utilizando os instrumentos teóricos da antropologia,

escolha uma escola, faça um relato etnográco sobre

o cotidiano dos alunos e professores, em seguida faça

uma reexão acerca do preconceito em sala de aula.

Pesquise o conteúdo dos livros didáticos, e analise

de que maneira esse conteúdo utilizado no ensino

fundamental contribui com o reforço ou superação das

práticas e atitudes discriminatórias e preconceituosas

em relação aos diferentes.

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PEDAGOGIA116

TEMPO DE MATAR (1996)

SINOPSE: eM canton, no Mississipi, dois Brancos espancaM e estupraM 

uMa Menina neGra de dez anos. eles são presos, Mas quando estão sendo 

levados ao triBunal para tereM o valor da sua fiança decretada o pai da Garota (saMuel l. Jackson) decide fazer Justiça coM as próprias Mãos e 

Mata os dois na frente de diversas testeMunhas, aléM de acidentalMente 

ferir  seriaMente  uM  policial. ele  é  preso  rapidaMente, Mas  a  cidade 

se  torna  uM  Barril  de  pólvora  e, aléM  do  Mais, a  defesa  teM  de  se 

defrontar coM uM Juiz que não perMite que no JulGaMento se Mencione 

a razão que fez o pai coMeter o duplo hoMicídio, pois o JulGaMento é 

de assassinato e não de estupro.

DIREÇÃO: Joel schuMacher

GÊNERO: draMa

ELENCO: MattheW McconauGhey, sandra Bullock, saMuel l. Jackson,

kevin spacey, oliver platt, charles dutton, Brenda ficker, donald 

sutherland, kiefer sutherland, patrick McGoohan, ashley Judd, to-

nea steWart, rae’ven kelly, darrin Mitchell, laconte McGreW, devin 

lloyd, John diehl, chris cooper, nicky katt, douG hutchison, kurt-

Wood sMith.

A OUTRA HISTÓRIA AMERICANA (1998)

SINOPSE: derek  (edWard  norton) Busca  vazão  para  suas  aGruras 

tornando-se líder de uMa GanGue de racistas. a violência o leva a uM 

assassinato, e ele é preso pelo criMe. três anos Mais tarde, ele sai da 

prisão, e  teM  que  convencer  seu  irMão  (edWard  furlonG), que  está 

prestes a assuMir a liderança do Grupo, a não trilhar o MesMo caMinho.

DIREÇÃO: tony kaye

GÊNERO: draMa

ELENCO: edWard norton, edWard furlonG, Beverly d’anGelo, Jennifer 

lien, ethan suplee, fairuza Balk, avery Brooks, elliott Gould, stacy 

keach.

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ANTROPOLOGIA | UNIDADE 3   117

ILHA DAS FLORES (1989)

SINOPSE: docuMentário. ilha  das  flores  Mostra  pessoas  que  se 

aliMentaM dos restos de aliMentos servidos aos porcos. uM toMate é 

plantado, colhido, transportado  e  vendido  nuM  superMercado, Mas apodrece e acaBa no lixo. acaBa? não. ilha das flores seGue-o até 

seu verdadeiro final, entre aniMais, lixo, Mulheres e crianças. e então 

fica clara a diferença que existe entre toMates, porcos e seres huManos.

DIREÇÃO: JorGe furtado

GÊNERO: docuMenário

ELENCO: paulo José (narração), ciça reckzieGel (dona anete)

GUERRA DE CANUDOS (1997)

SINOPSE: eM 1893, antônio conselheiro (uM Monarquista assuMido) e 

seus seGuidores coMeçaM a tornar uM siMples MoviMento eM alGo Grande 

deMais para a repúBlica, que acaBara de ser proclaMada e decidira por 

enviar vários destacaMentos Militares para destruí-los. os seGuidores 

de  antônio  conselheiro  apenas  defendiaM  seus  lares, Mas  a  nova 

ordeM não podia aceitar que huMildes Moradores do sertão da Bahia desafiasseM a repúBlica. assiM, eM  1897, esforços são reunidos para 

destruir os sertaneJos. estes fatos são vistos pela ótica de uMa faMília,

que teM opiniões conflitantes soBre conselheiro.

DIREÇÃO: sérGio rezende

GÊNERO: draMa 

ELENCO:  José  Wilker, paulo  Betti, cláudia aBreu, Marieta  severo,

selton Mello, roBerto BoMteMpo, José de aBreu, tonico pereira, tuca 

andrada, eliezer de alMeida, denise WeinBerG, ernani Moraes, JorGe 

neves, dandara ohana Guerra, Murilo Grossi.

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PEDAGOGIA118

PLATOON (1986)

SINOPSE: chris (charlie sheen) é uM JoveM recruta recéM-cheGado a 

uM Batalhão aMericano, eM Meio à Guerra do vietnã. idealista, chris 

foi uM voluntário para lutar na Guerra pois acredita que deve defender seu país, assiM coMo fez seu avô e seu pai eM Guerras anteriores. Mas 

aos poucos, coM a convivência dos deMais recrutas e dos oficiais que o 

cercaM, ele vai perdendo sua inocência e passa a experiMentar de perto 

toda a violência e loucura de uMa carnificina seM sentido.

DIREÇÃO: oliver stone

GÊNERO: Guerra

ELENCO: toM BerenGer, WilleM dafoe, charlie sheen, forest Whitak-

er, francesco q uinn, John c. McGinley, richard edson, kevin dillon,

reGGie Johnson, keith david, Johnny depp, david neidorf, Mark Moses,

chris pedersen, tony todd, corkey ford, dale dye, oliver stone.

MACUNAMA (1969)

SINOPSE: MacunaíMa  é  uM  herói  preGuiçoso, safado  e  seM  nenhuM 

caráter. ele  nasceu  na  selva  e, de  preto, virou  Branco. depois  de 

adulto, deixa o sertão eM coMpanhia dos irMãos. MacunaíMa vive várias aventuras na cidade, conhecendo e aMando Guerrilheiras e prostitutas,

enfrentando  vilões  Milionários, policiais, personaGens  de  todos  os 

tipos.

DIREÇÃO: JOAQUIM PEDRO DE ANDRADE

GÊNERO: coMédia

ELENCO: Grande  otelo, paulo  José, dina  sfat, Milton  Gonçalves,

Jardel  filho, rodolfo arena, Joana  foMM, MyriaM Muniz, Maria do rosário, huGo carvana, Wilza carla, zezé Macedo, Maria lúcia dahl.

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AZEVÊDO, Eliane. Raça: conceito e preconceito. São Paulo: Editora

Ática S. A, 1987.

BANDEIRA, Maria de Lourdes. Antropologia, I, II, III, e IV. Cuiabá:

EdUFMT, 2000.

BEATTIE, John. Introdução à antropologia cultural.  2. ed. São

Paulo: Companhia Editora Nacional, 1977.

BOAS. Frans. Antropologia cultural. Rio de Janeiro: Jorge Zahar

Editor, 2004.

BRACE, C. Loring. Os Estágios da evolução humana.  Rio de

Janeiro: Zahar Editores, 1970.

CAVALLEIRO, Eliane. Racismo e antiracismo na educação: 

repensando nossa escola. São Paulo: Summus, 2001.

DA MATTA, Roberto. Relativizando: uma Introdução à AntropologiaSocial. 6. ed. Rio de Janeiro: Rocco, 1987.

GOLDENBERG. Mirian; ESTERCI, Neide e FRY, Peter. (Org.). Fazendo

antropologia no Brasil. Rio de Janeiro: DP&A, 2001.

REFERÊNCIAS

ANTROPOLOGIA | REFERÊNCIAS   119

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UemaNet - Núcleo de Tecnologias para EducaçãoInformações para estudo

Central de Atendimento0800-280-2731

Siteswww.uema.br

www.uemanet.uema.br

http://ava.uemanet.uema.br

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universidade estadual do Maranhão – ueMa

núcleo de tecnoloGias para educação – ueManet

Caro Estudante,

No sentido de melhorar a qualidade do material didático, gostaríamos que vocêrespondesse às questões abaixo com presteza e discernimento. Após, destaque afolha da apostila e entregue ao seu Tutor. Não é necessário assinar.

Município: ______________________________ Polo: ______________________

Turma: _________ Data: _____/ _____/__________

Responda as questões abaixo de forma única e objetiva

[O] - ótimo, [B] – bom, [R] - regular, [I] - insuciente

1 Qualidade gráfca [O] [B] [R] [I]

1.1 Encadernação gráca1.2 Formatação da apostila1.3 Ícones apresentados são informativos1.4 Tamanho da fonte (letra)1.5 Tipo de fonte está visível (Arial, Times New Roman...)1.6 Qualidade de ilustração

2 Conteúdo [O] [B] [R] [I]2.1 Coesão

2.2 Coerência2.3 Contextualizado com a realidade e prática2.4 Organização