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    ANDR MENDES PINI

    ANTECEDENTES DA GUERRA DO PARAGUAI: A MISSO

    SARAIVA E A CONSTRUO DA ALIANA COM A ARGENTINA

    Monografia apresentada como requisito parcial para a obteno do ttulo de

    Especialista em Relaes Internacionais pela Universidade de Braslia

    Universidade de Braslia

    Professor Orientador: Antonio Carlos Lessa

    Braslia

    2012

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    RESUMO

    As relaes entre Brasil e Argentina transitaram da rivalidade

    aliana em menos de duas dcadas durante o sculo XIX, o que s pode ser

    compreendido por meio da anlise conjuntural das vicissitudes do Sistema

    regional platino, formado, historicamente, por dois polos de poder, Brasil e

    Argentina . O desequilbrio na balana de poder representado pela poltica de

    Solano Lopez no Paraguai, que visava se tornar um polo de poder, e cooptar o

    Uruguai sua esfera de influncia, consolidou a aliana entre Brasil e

    Argentina na manuteno do status quo platino. As lgicas de consolidaodos Estados Nacionais da regio engendraram rupturas estabilidade do

    sistema, gerando o maior conflito que a Amrica do Sul presenciaria em sua

    histria.

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    ABSTRACT

    The Relations between Brazil and Argentina shifted from

    rivalry to an alliance in less than two decades during the nineteenth century,

    which can only be understood through a conjectural analysis of the

    vicissitudes of the south american regional system , historically formed by

    two poles of power, Brazil and Argentina. The imbalance in the balance

    of political power represented by the paraguayan Solano Lopez , who aimed

    to become a center of power, and to co-opt Uruguay to its sphere of

    influence, cemented the alliance between Brazil and Argentina in maintaining

    the platinum status quo . The logic of consolidation of national states in the

    region engendered disruptions to the stability of the system, generating the

    greatest conflict that South America would present in its history.

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    Sumrio

    1. INTRODUO ...................................................................................................... 5

    2. DA RIVALIDADE ALIANA: ROSAS, URQUIZA E MITRE................... 7

    2.1 O Imobilismo e a ascenso de Rosas .................................................................. 8

    2.2 A interveno contra Rosas ................................................................................ 9

    2.3 A diviso argentina e o governo Mitre ............................................................. 10

    3. A INSTABILIDADE NO PRATA: URUGUAI E PARAGUAI...................... 13

    3.1 O Uruguai ......................................................................................................... 13

    3.2 O Paraguai ........................................................................................................ 15

    3.2.1 Solano Lpez ............................................................................................. 17

    4. O DESENVOLVIMENTO DO CONFLITO E AS ARTICULAESDIPLOMTICAS .................................................................................................... 19

    4.1 O ano de 1862 ................................................................................................... 19

    4.2 O subsistema platino ........................................................................................ 20

    4.3 A Misso Saraiva .............................................................................................. 21

    4.4 A declarao de Guerra e a Trplice Aliana.................................................... 25

    5. CONCLUSO ...................................................................................................... 27

    6. BIBLIOGRAFIA .................................................................................................. 29

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    1. INTRODUO

    O sculo XIX proporciona um interessante leque de temas paraque historiadores e pesquisadores se debrucem, e o Brasil novecentista

    exerce atrao especial queles que se interessam pela formao da

    sociedade ptria em um contexto de fervorosos debates polticos e

    sociais. A poltica externa do Imprio objeto de extensos estudos

    historiogrficos, que levam em conta desde a atuao individual das

    figuras mais proeminentes do perodo, at a atuao do Brasil imperial

    em si, na busca de satisfazer seu interesse nacional dentro de umaconjuntura sistmica regional, na qual se destaca, sobretudo, a regio

    platina.

    O presente trabalho abordar a histria da poltica exterior do

    Brasil em meados do sculo XIX (1852-1865) ao analisar os eixos da

    atuao diplomtica brasileira no perodo posterior Guerra contra Oribe

    e Rosas, e antecedente Guerra do Paraguai, focando no processo de

    construo e consolidao da aliana com a Argentina, consolidada com

    a Misso Saraiva. A anlise da construo da aliana acometer o

    perodo marcado pelo intervencionista brasileiro no Prata e pelo

    antagonismo acirrado entre Brasil e Argentina, at a formao da Trplice

    Aliana, em que os pases se tornaram aliados em um confronto contra o

    Paraguai.

    De modo sucinto, a principal causa da Guerra refere-se

    ruptura engendrada pela poltica de Solano Lpez ao status quo do

    subsistema platino, que contrariou interesses do Brasil e da Argentina,

    levando-os a uma coalizo anti-paraguaia momentnea. De modo

    convergente, buscar-se- entender, superficialmente, a conjuntura sub-

    sistmica da formao dos Estados-Nacionais da regio platina durante o

    perodo em questo, que tornou pases historicamente rivais desde sua

    independncia em aliados contra um inimigo comum.Para isso, deve-se

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    levar em conta a relevncia dos conflitos internos pelos quais a Argentina

    passou e que chegaram a ameaar a unidade do pas, considerando o grau

    de influncia que eles tiveram na sua posio em relao Guerra contrao Paraguai e indita aliana com o Brasil.

    Pretende-se, portanto, contextualizar, primeiramente, o

    momento histrico da regio platina, para posteriormente se identificar os

    marcos histricos que conduziram Trplice Aliana por meio da anlise

    da trajetria diplomtica de Brasil e Argentina no perodo, avaliando-se,

    simultaneamente, o eventual grau de efemeridade dessa coalizo. Em

    sntese, a proposta dessa monografia o desenvolvimento de um trabalho

    pautado na identificao dos principais fatores que movimentaram o sub-

    sistema platino e favoreceram a consolidao da aliana entre Brasil e

    Argentina, contra um Paraguai revisionista e disposto a romper a

    correlao de foras que estabilizavam a regio, assim como analisar,

    concomitantemente, os marcos da construo da Trplice Aliana sob a

    tica da Misso Saraiva.

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    2. DA RIVALIDADE ALIANA: ROSAS, URQUIZA E MITRE

    O sculo XIX presenciou a formao da sociedade ptria emum contexto de profundas mudanas polticas e sociais, tendo o Brasil

    chegado s vsperas do conflito em questo com seu Estado Nacional

    praticamente consolidado e seu territrio j esboado quase totalmente,

    diferentemente do que ocorreu com os vizinhos do Cone Sul. As relaes

    com a Argentina so, historicamente, prioridade para o Brasil, devido

    relevncia que os vizinhos tm na participao comercial, poltica,

    econmica e cultural. Candeas (2005) defende a tese de que as relaesentre Brasil e Argentina transitaram da "Instabilidade estrutural" no

    sculo XIX at a "Estabilidade estrutural pela integrao" hodierna, e

    salienta que nas relaes dezenovescas predominava-se a rivalidade, em

    uma conjuntura de relativa dependncia estrutural da Inglaterra.

    O marco temporal delimitado para estudo refere-se aos anos de

    1852 a 1865, perodo Intervencionista da poltica externa brasileira,

    segundo definio de Cervo (2008), em que o pas reestrutura sua ordem

    no incio do Segundo Reinado, reorganiza seu Conselho de Estado,

    responsvel pela conduo uniforme da poltica exterior, e reprime as

    Revoltas internas ocorridas no perodo regencial, que criavam uma

    situao de imobilismo na conduo da poltica externa, devido

    principalmente revolta Farroupilha no Rio Grande do Sul. (CERVO,

    2008) A partir de ento, o Brasil percebe a ameaa representada pelo

    projeto expansionista do porteo Rosas, que visava recriar o antigoVice-Reino do Prata, e declara guerra Argentina e aos blancos

    uruguaios, apoiados pelo caudilho argentino.

    Para obter-se melhor compreenso acerca da aliana entre

    Brasil e Argentina na Guerra do Paraguai, deve-se analisar brevemente o

    perodo imediatamente anterior, em que flagrante a rivalidade

    argentino-brasileira, devido poltica expansionista de Rosas. Seguida

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    interveno brasileira contra o caudilho argentino, essencial

    compreender os efeitos da Guerra Civil Argentina, que culminou na

    separao de Buenos Aires da Confederao Argentina, e fortaleceu asprovncias de Entre Rios e Corrientes, que mantiveram sua fora poltica

    e militar sob a liderana de Urquiza, mesmo posteriormente Unificao

    em 1862. A Argentina enfraquecia-se no contexto sistmico platino, e o

    constante temor acerca da possvel aliana de Urquiza com o Paraguai foi

    balizador da diplomaciaporteanas vsperas da Guerra do Paraguai.

    2.1 O Imobi lismo e a ascenso de Rosas

    patente na literatura acerca do perodo regencial brasileiro a

    desorientao provocada na poltica externa por fatores como o

    desmantelamento do Conselho de Estado e as instabilidades internas

    pelas quais o Imprio passava, sendo exemplo emblemtico a Revoluo

    Farroupilha no Rio Grande do Sul.(CERVO, 2008)

    Perodo denominado por Amado Cervo como o "Imobilismo" da

    poltica exterior imperial, a Regncia, em meio s discusses sobre a

    centralizao ou descentralizao do aparato estatal, optou por medidas

    descentralizadoras, consolidadas no Ato Adicional de 1834, simblico

    fruto do trauma causado pela concentrao dos poderes na mo de Dom

    Pedro I, via o poder Moderador, legitimado pela Constituio Imperial de

    1824. A descentralizao poltica Imperial proferiu maior autonomia sprovncias do pas, deslocando e descentralizando a disputa poltica pelo

    poder. Essa medida provocou diversas revoltas, como a Sabinada, e a

    mais impactante de todas, a Farroupilha. (FAUSTO, 1994)

    A revolta da Farroupilha tinha forte cunho separatista, e, originou-

    se, preponderantemente, devido insatisfao de estancieiros gachos

    com a autonomia na poltica fiscal adotada por algumas provncias aps o

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    Ato Adicional, que tornava o charque gacho mais caro do que os

    uruguaios, comercializados em navios de bandeira inglesa. A revolta

    trouxe graves consequncias poltica externa imperial, que ficouimpossibilitada de atuar na regio da Bacia do Prata, uma vez que os

    farrapos bloqueavam o acesso regio. Somado a isso, h o fato de o

    Exrcito ter tido seus poderes esmaecidos em detrimento da recm criada

    Guarda Nacional, alm de o Conselho de Estado ter sido fechado,

    originando a poltica exterior pouco ativa do perodo. (FAUSTO, 1994)

    Nesse cenrio em que o Brasil volta-se a problemas internos,

    abre-se um vcuo de poder nas relaes internacionais do subcontinente

    sul-americano, possibilitando a ascenso argentina sob Juan Manuel de

    Rosas, porteo que adotara uma poltica expansionista visando a

    recriao do antigo Vice-Reino do Prata, um projeto que entrava

    enormemente em conflito com os interesses imperiais, por causar

    empecilhos livre-navegao no Prata, desestabilizar a balana de poder

    platina e objetivar submeter Paraguai e Uruguai ao jugo argentino.

    2.2 A interveno contr a Rosas

    O Brasil encontrava-se isolado perante os vizinhos platinos,

    correndo o risco de ter seu territrio amputado devido s revoltas

    separatistas internas, que, no caso da Farroupilha, misturava-se com o

    contexto externo, uma vez que os rebeldes farroupilhas buscavam nopartido Colorado uruguaio apoio s reivindicaes emancipatrias,

    enquanto Rosas flertava com o partidoBlanco.

    Somente aps a reestruturao poltica promovida pelo Partido

    Conservador, assim como a negociao e fim da Farroupilha, que foi

    possvel ao pas retomar a poltica intervencionista no Prata, em um

    perodo caracterizado por uma poltica de potncia perifrica regional,

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    exercida, sobretudo, no Prata. (CERVO, 2002). Exalta-se no perodo,

    sobremaneira, a influncia exercida pelos interesses farroupilhas na

    regio, e a defesa do Imprio dessas reivindicaes, sob o temor de novasrevoltas separatistas.

    O apaziguamento interno propiciou que o Imprio voltasse seus

    olhares conjuntura que o rodeava na bacia do Prata, e o que se percebeu

    foi um cenrio incmodo. Oribe, do partido Blancouruguaio empreendia

    uma poltica que ia de encontro com os interesses gachos, e contava

    com o apoio de Rosas na argentina. A soluo encontrada pelo governo

    imperial, sob a chancelaria de Paulino Jos Soares de Sousa, foi a

    deposio de ambos os governos via interveno militar.

    Apesar de o caudilho argentino ter previamente demonstrado sua

    fora militar, derrotando esquadras europeias e francesas na dcada

    anterior, grandes potncias militares de ento, o Brasil levou a cabo a

    interveno com sucesso, cooptando os pases sul-americanos a

    manterem-se neutros, e utilizando a diplomacia imperial, na figura de

    Dom Pedro II, para manter a neutralidade europeia. (CERVO, 2002)

    Primeiramente deps-se Oribe no Uruguai, levando ao poder

    Rivera, do partido Colorado, cuja filosofia liberal, aberta ao comrcio

    exterior, agradava ao Brasil; e, posteriormente, derrotou-se Rosas, com o

    auxlio de tropas interioranas das regies de Entre-Ros e Corrientes,

    encabeadas pelo lder Urquiza, que foi ento conduzido ao poder. A

    deposio de Rosas, todavia, engendraria uma profunda ciso naArgentina, que resultaria na separao de Buenos Aires do resto do pas.

    2.3 A diviso argent ina e o governo M itre

    A Guerra do Prata alterou a configurao sistmica do Cone Sul

    na medida em que um dos polos de poder fragmentou-se. A Argentina,

    que desde sua independncia presenciara conflitos entre Federalistas e

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    Unitaristas, manteve-se formalmente dividida ao longo de 10 anos, entre

    1852 e 1862, sendo que Urquiza controlava a Confederao Argentina,

    com sede em Paran, enquanto Buenos Aires no aceitara submeter-se aojugo interiorano e manteve-se sob a liderana de Bartolom Mitre,

    elaborando uma Constituio prpria, o que resultou em permanentes

    atritos entre as duas unidades polticas.(DORATIOTO, 1991)

    O ano de 1862 marcou, na Argentina, a Unificao definitiva do

    pas, aps uma srie de conflitos militares, no qual Urquiza venceu o

    campo militar, porm, a supremacia poltica ficou com Mitre, que se

    tornou o Presidente argentino. A ascenso de Mitre permitiu a

    implementao de um programa de modernizao, que iniciou a

    transformao da Argentina em uma economia moderna, integrada ao

    mercado internacional, atraindo outros lderes provinciais a aderir ao

    projeto unitrio e submeterem-se ordem centralizadora, estimulados

    pela possibilidade de progresso material. (ISECKSOHN, 2008)

    Porm, Bartolom Mitre, ao longo de seu governo, no teve

    autonomia plena, no podendo simplesmente alijar os interesses das

    provncias de Entre-Ros e Corrientes, considerando-os na conduo de

    sua poltica externa, recorrentemente, ao longo dos anos, e,

    principalmente, na sua postura inicial cautelosa frente Guerra do

    Paraguai e ao apoio aos Coloradosno Uruguai (MENEZES, 1998).

    O receio porteo de adotar atitudes mais proeminentes ocorreu

    devido resistncia federalista que se manteve nas provncias, e que ospossibilitavam negociar acordos diretamente com os Blancosuruguaios,

    por exemplo, para escoar sua produo via Montevidu, evitando assim a

    dependncia de Buenos Aires, e tambm oscilar pendularmente entre o

    Imprio e o Paraguai na busca por acordos de defesa e assistncia

    recproca contra Buenos Aires. (DORATIOTO, 1991)

    O temor de Mitre demonstrou-se, posteriormente, devidamente

    sensato, tendo em vista as pretenses iniciais de Solano Lopez de contar

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    com Urquiza ao seu lado na Guerra do Paraguai, o que, ressalta-se,

    acabou no se concretizando; e, aps o incio das hostilidades, a revolta

    federalista que obrigou Mitre a abandonar o comando das tropas daTrplice Aliana.

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    3. A INSTABILIDADE NO PRATA: URUGUAI E PARAGUAI

    Dentre os conflitos sul-americanos, aquele que mais recebeu aateno de historiadores, e, consequentemente, gerou um polmico

    debate historiogrfico foi a Guerra do Paraguai, ocorrida de 1864 a 1870.

    O conflito engajou o Imprio brasileiro em uma aliana com a Argentina

    e o Uruguai para combater o Paraguai de Solano Lpez, configurando-se

    como o maior conflito que o continente sul-americano tem notcia, e que

    viria a afetar, poltica e economicamente, os pases envolvidos, de forma

    drstica, causando, inclusive, a dbcle do pas guarani.

    Deve-se, destarte, contextualizar a instabilidade na regio platina,

    que convergiu o interesse nacional brasileiro e argentino sob o mesma

    paradigma de atuao. Para isso, necessrio analisar brevemente o

    perodo, principalmente no que se refere aos processos polticos no

    Uruguai, com os conflitos entre Blancos e Colorados, e no Paraguai,

    com a ascenso de Solano Lpez.

    3.1 O Uruguai

    A trajetria das rivalidades na Bacia do Rio da Prata longa e

    exerce protagonismo no contexto diplomtico desde a poca colonial, em

    que Portugal e Espanha disputaram o controle fluvial da regio,

    importante ponto de escoamento da produo colonial, explorao de

    metais preciosos, e acesso a territrios por via fluvial. Aps as

    Independncias de Brasil e Argentina, os conflitos regionais

    recrudesceram, at que, como consequncia da Guerra da Cisplatina em

    1824, o Uruguai foi criado, mediante atuao da diplomacia britnica,

    como forma de assegurar a estabilidade sistmica, porm, esse novo

    Estado viria a exercer papel preponderante nos futuros conflitos da

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    regio, sendo um ponto de convergncia das contradies platinas.

    (DORATIOTO, 1991)

    Aps o malogro brasileiro na Guerra da Cisplatina, o Imprio

    percebeu que a manuteno da independncia uruguaia seria fulcral ao

    equilbrio de poder da regio, principalmente porque a Argentina

    ressentiu-se acerca da criao do Uruguai. Nossos vizinhos consideravam

    que o Estado-tampo do Uruguai foi uma amputao de seu territrio, e,

    ao longo do sculo XIX, flertaria por diversas vezes, em especial com o

    partido Blanco, na tentativa de anexar o Uruguai, ou, ao menos, mant-lo

    sob sua rbita de influncia direta, o que, evidentemente, era contrrio

    aos interesses brasileiros. (MENEZES, 1998)

    O Uruguai sofreria com a disputa pelo poder por duas faces,

    Blancose Colorados, na chamada Grande Guerra, que duraria cerca de

    10 anos. (FAUSTO, 1994) A Guerra Civil uruguaia em determinado

    momento teve os Colorados controlando Montevidu, no chamado

    "Governo de Defensa", enquanto os Blancos cercavam a cidade e

    instauravam outro governo, alcunhado Cerrito, na situao denominada

    de "Nova Tria". Ao longo do sculo XIX, a alternncia no poder entre

    esses grupos determinaria a poltica exterior uruguaia, tendo em vista que

    cada partido possua alianas diferentes, diferentemente do que ocorria

    no Brasil, em que, apesar das divergncias entre conservadores e liberais,

    em termos de poltica externa, no existia partidos. Com efeito, o partido

    Blanco possua afinidades com os Federalistas argentinos, e sua

    ascenso, majoritariamente, contrariava os interesses brasileiros na

    regio, redundando em instabilidade, enquanto os Colorados

    aproximavam-se mais dos ideais Unitaristas argentinos, indo ao encontro

    dos interesses brasileiros. (MENEZES, 1998)

    A poltica de defesa dos interesses brasileiros no Uruguai

    intensificou-se aps a Interveno de Rosas na Guerra Civil uruguaia,

    favorvel aos Blancos, o que contrariava os interesses do Imprio,

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    principalmente por representar uma ameaa aos estancieiros gachos nas

    regies de fronteira. No era interessante ao Brasil um eventual

    descontentamento do Rio Grande do Sul, principalmente aps o fim daFarroupilha, e, devido a isso, o Brasil decide intervir contra o governo de

    Oribe, aps assinada a lei Eusbio de Queiroz.

    A interveno foi bem-sucedida, e colocou no poder Rivera, do

    partido Colorado, convergente com os interesses brasileiros, como a livre

    navegao no Rio da Prata, assinando 5 tratados desiguais com o Imprio

    . Posteriormente, o Brasil seguiu para a Argentina a fim de derrubar Juan

    Manuel de Rosas, contando com o apoio dos caudilhos interioranos de

    Entre-Ros e Corrientes, principalmente de Urquiza, que sucederia Rosas

    em 1852 aps sua morte na Batalha de Monte Caceros. (DORATIOTO,

    1991)

    No entanto, os tratados desiguais impostos pelo Imprio ao

    Paraguai acabaram por enfraquecer o governo Colorado, que logo perdeu

    espao, novamente, para os Blancos, que assumiram novamente o

    governo com Bernardo Berro e Anastasio Aguirre na dcada de 1860.

    3.2 O Paraguai

    O Paraguai foi um dos pioneiros na busca pela independncia,

    porm, diferentemente da maioria dos pases sul-americanos, que

    desvencilharam-se de monarquias europeias, o Paraguai declarou

    independncia em relao a Buenos Aires em 1811, obrigando-o a adotar

    uma poltica isolacionista na Amrica do Sul, baseada na explorao da

    erva-mate, madeira e tabaco, majoritariamente, pelo Estado.

    (MENEZES, 1998)

    O isolamento paraguaio abriu espao para a consolidao e

    perpetuao de um regime ditatorial extremamente centralizado,

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    comandado pelo "Ditador Perptuo", Jos Gaspar Rodrguez de Francia,

    que aos poucos eliminou sua oposio, expulsou a igreja e cooptou

    setores sociais de acordo com seus interesses, o que explica, em grandeparte, a ausncia do fenmeno do caudilhismo no pas, muito presente na

    maioria das incipientes Repblicas hispnicas. Nota-se que no perodo j

    existia uma latente rivalidade entre o Brasil e o Paraguai, devido a

    questes fronteirias, nas quais o Paraguai recorria ao Tratado de Santo

    Ildefonso de 1777, enquanto o Brasil defendia os critrios baseados na

    ocupao efetiva, utis possidetis. (DORATIOTO, 1991)

    Aps a morte de Francia, Carlos Antonio Lpez assumiu o poder

    no Paraguai, mantendo o modelo autoritrio herdado de seu antecessor,

    sem poder legislativo nem constituio, e mantendo tambm o

    monoplio da maior parte das atividades privadas do pas. Todavia, a

    poltica isolacionista paraguaia arrefeceu-se medida em que a poltica

    externa platina comeava a trazer consequncias e ameaas Repblica

    guarani. (DORATIOTO, 1991)

    A ascenso de Rosas na Argentina e seu projeto que visava

    recriar o Vice-Reino do Rio da Prata representava uma ameaa

    independncia paraguaia e empecilhos livre-navegao e ao comrcio

    exterior via o Rio Paran, o que aproximou o governo de Carlos Lopez

    do Imprio. O Brasil reconheceu o Paraguai em 1842, e mediou o

    reconhecimento do pas na Europa, porm, isso no impediu que se

    perpetuasse a controvrsia acerca de limites territoriais entre os dois

    pases, redundando na aproximao paraguaia Confederao Argentina

    de Urquiza na dcada de 50.

    O contencioso acerca dos limites territoriais entre Paraguai e

    Brasil ganhava maiores propores medida em que no se chegava a

    um consenso, resultando em uma poltica guarani de impedimento da

    navegao no Rio Paraguai, condicionada a um tratado de limites sob os

    moldes paraguaios. A navegao naquele rio era essencial para o acesso

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    ao Mato Grosso, e devido a isso houve grande empenho do Imprio para

    resolver a questo, enviando alguns de seus mais renomados diplomatas

    para resolver a querela, como o Visconde de Rio Branco. (DORATIOTO,1991) Na Misso Paranhos no Prata, Rio Branco conseguiu cooptar

    Uruguai e a Confederao Argentina a pleitearem tambm a livre

    navegao, o que um marco do incio da aproximao entre os pases

    da Trplice Aliana e da postura defensiva do Paraguai frente aos

    vizinhos do Cone Sul. (BARRIO, 2010).

    Percebe-se que at ento o Cone Sul possua dois polos de poder,

    representados por Argentina e Brasil, sob os quais Uruguai e Paraguai

    orbitavam, de modo a construir um sistema de poder equilibrado, o que

    mudaria aps a ascenso do filho de Carlos Lpez.

    3.2.1 Solano Lpez

    Francisco Solano Lpez ascendeu presidncia paraguaia no ano

    de 1862, aprofundando o autoritarismo no pas guarani, e buscando uma

    maior autonomia em relao Argentina e Brasil. A inteno de Solano

    Lpez era se tornar um polo de atrao que cooptasse o Uruguai e

    projetasse sua influncia no subsistema regional platino.

    As dificuldades econmicas vividas pelo Paraguai geravam a

    necessidade de se buscar uma sada para o mar, alm de esquadrinhar

    recursos que impulsionassem o desenvolvimento, convergindo em um

    projeto expansionista, que visava, inclusive, abranger Entre-Ros e

    Corrientes na Argentina, alm do Uruguai e certas partes do territrio sul

    brasileiro, em busca de seu Lebensraum. (BANDEIRA, 2003;

    DORATIOTO, 1991)

    A alterao da correlao de foras sistmicas do Cone Sul pelas

    ambies pessoais de Solano Lpez, tornariam convergentes os interesses

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    argentinos e brasileiros frente ameaa representada pelo Paraguai

    expansionista. (ISECKSOHN, 2008)

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    4. O DESENVOLVIMENTO DO CONFLITO E AS ARTICULAESDIPLOMTICAS

    imprescindvel analisar tambm as articulaes diplomticas

    que precederam a Guerra do Paraguai para que se obtenha

    aprofundamento na anlise da consolidao formal da Trplice Aliana.

    A misso diplomtica essencial para a criao de um ambiente de

    cooperao e confiana entre Brasil e Argentina foi a misso em Puntas

    del Rosrio, na qual o enviado imperial, Jos Antonio Saraiva reuniu-se

    com Rufino de Elizalde, Chanceler argentino, e Edward Thornton,

    enviado britnico, para buscar uma soluo pacfica Guerra Civil

    uruguaia.(DORATIOTO, 1991). Em que pese o malogro da Misso

    Saraiva na busca pela conciliao entre Blancos e Colorados,

    consolidava-se, enfim, o clima de confiana entre Brasil e Argentina.

    Aps o incio das hostilidades, a Argentina ainda mantinha

    postura neutralista, apoiando apenas moralmente e diplomaticamente as

    investidas brasileiras contra o Paraguai. Deve-se, destarte, discorrer sobrea consolidao da Trplice Aliana, tendo em vista tambm as relaes

    entre Mitre e Urquiza, que possibilitaram a participao efetiva da

    Argentina na Guerra, em aliana ao Brasil e ao Uruguai colorado.

    4.1 O ano de 1862

    O ano de 1862 marcante no que se refere trajetria das

    rivalidades na Bacia do Prata, tendo em vista que nesse ano todo o

    panorama que desencadearia a Guerra do Paraguai foi

    configurado.(DORATIOTO, 1991)

    Nesse ano, assumiria o poder Solano Lopez no Paraguai,

    alterando as formas de relacionamento com os vizinhos, devido ao seu

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    descontentamento com as constantes interferncias argentinas e

    brasileiras na poltica interna uruguaia, e sua pretenso em expandir a

    influncia paraguaia. A questo lindeira que arruinara a relao com oBrasil tambm voltava pauta, devido ao fim da moratria de 6 anos na

    discusso sobre o tema, estipulada anteriormente, no governo de Carlos

    Lopez.

    No mesmo ano, a Argentina reunificava-se sob o portenho

    Bartolom Mitre, o que melindrou a diplomacia paraguaia, devido ao

    temor de uma Argentina forte e unificada representar uma ameaa

    integridade do Paraguai. No mesmo ano, Bernardo Berro, do partido

    Blanco, assumia o poder no Uruguai, flertando eventuais alianas com

    Solano Lopez e desagradando tanto ao Brasil quanto recm-unificada

    Argentina.

    Por fim, em 1862 houve a ascenso do Partido Progressista no

    Brasil sob a presidncia de Zacarias de Gis e Vasconcelos no Gabinete

    dos Ministros, que se viu enfraquecido aps a Questo Christie, e passou

    a considerar uma interveno contra os Blancosuruguaios uma forma de

    resguardar os interesses brasileiros, alm de demonstrar o poder de seu

    governo.

    4.2 O subsistema platino

    Solano Lopez, ao assumir o poder, optou, inicialmente, pela

    neutralidade no subcontinente. Essa poltica conferiu-lhe certo poder debarganha, podendo se tornar um aliado em potencial tanto ao Brasil

    quanto Argentina, enquanto esses estivessem isolados um do outro, o

    que estabeleceria certo equilbrio regional, e colocaria fim hegemonia

    do Imprio no Cone Sul. (DORATIOTO, 1991) Porm, ao empreender

    uma poltica que visava aproximar-se do Uruguai e se contrapor ao apoio

    brasileiro e porteo aos Colorados, Lopez aproximou-se do Partido

    Blanco, estabelecendo uma aliana para aproximar os dois pases, e ,alm

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    de promover o comrcio, estabelecer um tratado defensivo e ofensivo

    entre eles. (MENEZES, 1998)

    A poltica paraguaia alterou substancialmente a dinmica do

    subsistema platino, que transitava da bipolaridade brasileiro-argentina a

    uma incipiente multipolaridade, que abrangeria o Paraguai como um ator

    relevante, capaz de cooptar o Uruguai sua rbita de influncia. A

    ameaa aostatus quoplatino representada pela poltica expansionista de

    Solano Lopez fez convergir os interesses nacionais de Brasil e Argentina,

    ambos inimigos do partido Blanco, que passaram a buscar, inicialmente,

    solues diplomticas querela. (ISECKSOHN, 2008)

    4.3 A M isso Saraiva

    O governo Blancono Uruguai, primeiramente sob o mandato de

    Berro, e, posteriormente, sob Aguirre, passou a contrariar os interesses

    brasileiros, taxando estancieiros gachos, violando os tratados firmados

    na dcada anterior, desrespeitando os limites territoriais anteriormentedemarcados, e causando conflitos acerca da livre-navegao na regio.

    Argentina tambm interessava uma derrocada do governo Blanco, que

    ameaava a unidade do pas, ao manter estreitas relaes com os

    caudilhos federalistas, passando a incentivar e dar suporte ao grupo

    Colorado. (MENEZES, 1998)

    O estopim para a interveno se deu medida em que o governo

    liberal no Imprio era contestado, principalmente no parlamento, quantoa seu pulso firme e a sua capacidade de manuteno dos interesses

    brasileiros. (MENEZES, 1998) A indenizao paga Inglaterra aps a

    Questo Christie foi extremamente impopular perante a opinio pblica

    do Brasil, suscitando questionamentos acerca da fora do partido liberal.

    Quando chegaram ao Rio de Janeiro notcias referentes aos constantes

    assassinatos de estancieiros gachos em terras uruguaias, houve forte

    mobilizao popular contra os uruguaios, e cresceu no governo o temor

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    da insatisfao gacha redundar em um afloramento das iniciativas

    secessionistas farroupilhas novamente. (DORATIOTO, 1991;

    ISECKSOHN, 2008; MENEZES, 1998) Estava legitimada a intervenocontra Anastasio Aguirre, garantida pelo devido apoio da opinio

    pblica e conveniente tanto aos interesses nacionais quanto aos interesses

    do gabinete liberal.

    O gabinete de Zacarias utilizou-se, todavia, de negociaes

    diplomticas prvias eventual interveno. A diplomacia ptria j

    compreendera h algumas dcadas que quaisquer polticas mais incisivas

    no Prata deveriam ser legitimadas perante os aliados da ocasio, caso

    contrrio, o Imprio, filho nico dentre as Repblicas sul-americanas,

    estaria prontamente isolado no contexto regional.(MENEZES, 1998)

    Apesar disso, percebe-se a desinformao de Zacarias de Gis acerca da

    postura paraguaia quanto eventual interveno no Uruguai,

    demonstrada em recorrentes discursos ao senado, subestimando o

    ultimato dado por Solano Lopez, e, discute-se ainda, no ciente dessa

    ameaa paraguaia.(MENEZES, 1998)

    Aps informar a Argentina acerca de suas articulaes

    diplomticas, o Imprio enviou Jos Antonio Saraiva ao Uruguai, no dia

    6 de maio de 1864, para dar o devido ultimato ao governo Blanco,

    enquanto arregimentava e distribua suas tropas na fronteira, sob as

    ordens do Almirante Tamandar. (MENEZES, 1998) A cautela brasileira

    no trato da questo advinha tambm do fato de as relaes diplomticas

    com a Inglaterra estarem rompidas, devido Questo Christie. O Imprio

    no desejava transparecer que uma eventual interveno no Uruguai

    possusse fins anexionistas.(DORATIOTO, 1991)

    Saraiva percebeu, de imediato, que o grande empecilho no trato

    de sua misso diplomtica era a guerra civil que se desenrolava no

    Uruguai, estabelecendo como objetivo inicial a resoluo, ao menos

    temporria, daquele conflito, para posteriormente negociar as

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    reivindicaes imperiais. Nesse contexto que Argentina e Inglaterra,

    ambas interessadas no fim do conflito uruguaio, decidem participar das

    negociaes diplomticas.

    A Misso Saraiva ocorreu a bordo de navio ingls, enviado a

    Puntas del Rosrio, Uruguai, com representao inglesa de Edward

    Thornton, fim de garantir a neutralidade da mediao e a garantia da

    independncia do territrio uruguaio. A participao apaziguadora do

    representante ingls na mediao do conflito um dos argumentos-chave

    na contra-argumentao teoria revisionista, na qual a Trplice Aliana

    havia sido uma manobra imperialista inglesa fim de resguardar seus

    interesses financeiros e comerciais na regio.

    Rufino de Elizalde, chanceler argentino, tambm foi enviado, sob

    s ordens de Mitre, alinhando-se s posturas brasileiras, representadas

    pelo conselheiro Saraiva, tendo o objetivo de solucionar a ento Guerra

    Civil uruguaia, de modo a, apoiada na presena inglesa, manter-se

    informado acerca das intenes brasileiras. Saraiva, inicialmente, ficou

    surpreso com a presena de Thornton e Elizalde, porm, percebeu,

    posteriormente, que aquilo poderia trazer frutos positivos caso a paz

    fosse alcanada, e legitimaria uma eventual ao de fora brasileira caso

    se malograsse a resoluo por meios pacficos. (MENEZES, 1998)

    Percebe-se que, inicialmente, o Paraguai de Solano Lopez no foi

    procurado no trato da questo, nem oficialmente informada acerca da

    Misso Saraiva. (MENEZES, 1998) Com efeito, corrobora-se a ideia deque Argentina e Brasil assumiam o nus poltico e militar em um sistema

    internacional que julgavam ser protagonistas. Isso refora a teoria que a

    Guerra do Paraguai se desenrola quando Solano Lopez, melindrado com

    a posio secundria do Paraguai no subsistema regional do Cone Sul,

    adota uma postura que desequilibraria o sistema.

    A Misso oficialmente posicionou-se no sentido de ser uma

    mediadora entre as partes conflitantes, e logrou, inicialmente, que fosse

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    declarado armistcio no conflito, passando a negociar ento a

    incorporao de membros do partido Colorado no governo Blanco, por

    meio do dilogo entre os dois partidos. Saraiva e Thornton trataram dasquestes junto a Flores, enquanto Elizalde ficou encarregado de ouvir as

    reivindicaes blancas, junto a seus representantes, Castellanos e Lamas.

    (DORATIOTO, 1991; MENEZES, 1998)

    Em um primeiro momento, Anastasio Aguirre acenou

    positivamente para a proposta de incorporar colorados a seu governo,

    porm, aps consultar a cpula militar Blanca, o ento Presidente

    uruguaio foi obrigado a recha-la. (MENEZES, 1998) Sentido-se

    pressionado, o governoBlancocontatou o Paraguai, at ento alijado das

    negociaes, para participar da mediao, constrangendo a todos,

    inclusive aos negociadores paraguaios, que continuaram afastados das

    conversas j encaminhadas, devido a decises do prprio governo

    Blanco, que se encontrava dividido. (MENEZES, 1998).

    As negociaes com Aguirre seguiram, porm, ficara explcito na

    conduta blanca a primazia dada aos interesses poltico-partidrios, em

    detrimento do bem-estar coletivo da nao. (MENEZES, 1998) Aps

    sugesto dos mediadores e intensas negociaes, Aguirre chegou a

    modificar seu ministrio, porm, diferentemente do que havia sugerido

    Thornton, nomeou polticos to radicais quanto os anteriores na averso

    aos Colorados, deixando claro, posteriormente, sua inflexibilidade no

    trato da questo. Era o fim do armistcio e da negociao diplomtica do

    conflito. (DORATIOTO, 1991)

    A Misso Saraiva fracassara no objetivo de pacificar o Uruguai,

    no entanto, tornar-se-ia o baluarte da construo da confiana mtua

    entre Brasil e Argentina, aps a lealdade e cordialidade demonstrada na

    relao entre Elizalde e Saraiva. (MENEZES, 1998) Flores, o terceiro

    elemento da Trplice Aliana, tambm ganhara prestigio perante os

    vizinhos no trato conciliador Misso Saraiva. Nas palavras do ento

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    diplomata brasileiro, "A Trplice Aliana foi construda em Puntas del

    Rosrio", e Mitre, apesar de ainda manter, inicialmente, postura

    essencialmente neutralista, deu o beneplcito ao Brasil para intervir noUruguai, seguro das reais intenes do Imprio. (DORATIOTO, 1991)

    As relaes entre Brasil e Paraguai j se encontravam deterioradas

    devido intransigncia de ambas as partes na negociao de um Tratado

    de Limites definitivo, e abalou-se mais ainda, aps o Blancos

    manipularem a amadora diplomacia paraguaia, informando-os que o

    Imprio possua deliberadas intenes de anexar o Uruguai, gerando

    protestos formais por parte do Paraguai. (DORATIOTO, 1991) A

    interveno brasileira no Uruguai seria o marco da runa das relaes

    bilaterais entre os pases, e o estopim para a declarao de guerra por

    parte do Paraguai.

    4.4 A declarao de Guerra e a Trpl ice Al iana

    O Paraguai fora um pas isolado at 1846, governado porsucessivos ditadores, que detinham praticamente o monoplio das

    atividades econmicas e o controle absoluto do aparato estatal. Essa

    introspeco resultou em uma errnea percepo de seu poderio nacional,

    e em uma aguda incapacidade de compreender a realidade internacional,

    sobrevalorizando sua capacidade militar. (DORATIOTO, 1991)

    Na iminncia de uma interveno brasileira no Uruguai, Solano

    Lopez dera ultimato ao Imprio, qualificando a invaso brasileira comouma declarao de guerra ao Paraguai, devido percepo de que aquilo

    afrontaria o equilbrio de poder no Prata. (ISECKSOHN, 2008) O Brasil

    desdenha da ameaa paraguaia e inicia as articulaes diplomticas com

    o Colorados, para realizar uma interveno precisa e rpida, sem saber

    que o Paraguai, ao mesmo tempo, preparava-se para entrar em guerra.

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    Seguida invaso do Uruguai levada a cabo pelo Brasil, Solano

    Lopez capturou o navio brasileiro Marqus de Olinda, que seguia para o

    Mato Grosso, por considerar a interveno brasileira uma declarao deguerra tcita, mobilizando a opinio pblica imperial contra os

    paraguaios. (DORATIOTO, 1991)

    Solano Lopez, em meio a informaes imprecisas, e, sem contar

    com um corpo diplomtico profissionalizado, invade o Mato Grosso, em

    uma manobra irresponsvel, baseada em clculos equivocados acerca da

    correlao de foras militares e polticas no Prata. (DORATIOTO, 1991)

    Lopez contava com a resistncia blanca para enfraquecer as tropas

    imperiais, que, sabidamente, eram reunidas e mobilizadas com muita

    dificuldade pelo Brasil, e, tambm, presumia que Urquiza ficasse a seu

    lado no conflito que se iniciara.

    O que ocorreu, de fato, foi uma rpida capitulao blanca, aps

    misso diplomtica encabeada pelo Visconde de Rio Branco, e um

    repdio generalizado invaso de Corrientes por parte das tropas

    paraguaias que marchavam rumo ao Uruguai, colocando a Argentina

    oficialmente na Guerra, e consolidando, de fato, a Trplice Aliana.

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    5. CONCLUSO

    A Guerra do Paraguai repercutiu na consolidao dos Estados nacionais daArgentina e do Uruguai, representando tambm o apogeu da capacidade militar e

    diplomtica do Imprio, embora tenha contribudo para o acirramento das

    contradies do Estado Monrquico brasileiro, que viriam a enfraquec-lo.

    (DORATIOTO, 1991) O fim da Guerra do Paraguai completaria um ciclo histrico, a

    partir do qual a Argentina, consolidada como Estado Nacional, passaria a disputar

    com o Brasil, definitivamente, a hegemonia na Bacia do Prata. (BANDEIRA, 2003)

    As causas da Guerra do Paraguai so fruto de debate fervoroso na

    historiografia, porm, os mais recentes trabalhos j descartaram a tese de que a

    Trplice Aliana foi um instrumento britnico para sobrepujar o desenvolvimento de

    um supostamente prspero Paraguai, tendo em vista os contatos comerciais entre

    Paraguai e o Reino Unido, as tentativas por meios diplomticos de se evitar o

    conflito, evidenciados na atuao de Thornton; e tambm a ausncia, sequer, de

    relaes diplomticas formais entre Brasil e Reino Unido no perodo. Variveis

    econmicas, porm, devem ser includas no processo de compreenso sobre os

    motivos que geraram o conflito, como a necessidade de estruturao de Estados

    nacionais viveis, que unificassem espaos econmicos e garantissem a circulao de

    capitais e mercadorias. (BANDEIRA, 2003)

    No entanto, o quadro das relaes internacionais na conjuntura do perodo

    analisado fornece uma viso sistmica mais densa e completa acerca dos fatores

    decisivos que engendraram o conflito. Historicamente, o Cone Sul representava um

    subsistema regional bipolar, tendo Brasil e Argentina como polos de poder,

    preponderantemente, oscilando em eventuais hegemonias conjunturais, como a de

    Rosas, enquanto o Brasil sofria com os problemas internos, e o imediatamente

    posterior sua queda, enquanto a Argentina esteve dividida, abrindo espao para a

    ascenso brasileira.

    Paraguai e Uruguai representavam o equilbrio de poder no subsistema

    regional platino, aproximando-se de um dos polos de poder, de forma pendular, com

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    o intuito de resguardar seu interesses e garantir a estabilizao sistmica. Com efeito,

    era interesse brasileiro a manuteno das independncias paraguaias e uruguaias,

    para que no se criasse um rival republicano demasiadamente poderoso na Amricado Sul.

    Na medida em que o Paraguai, sob o governo de Solano Lopez, cooptando o

    Uruguai, ameaou ostatus quoregional, almejando se tornar novo polo de atrao, e

    ameaando a unificao argentina, alm de contrariar os interesses nacionais

    brasileiros, fez convergir a ao de Brasil e Argentina sob o mesmo paradigma de

    atuao, de forma a conter aquele que ameaava a estabilidade regional.

    Com efeito, defende-se que a poltica exterior imperial agiu com destreza e

    pragmatismo na confeco de alianas que, mesmo efmeras, garantissem a vitria

    brasileira, sem suscitar desconfianas acerca de pretenses expansionistas por parte

    dos vizinhos e da Europa, como ficou evidenciado na Misso Saraiva em Puntas del

    Rosrio.

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