ANIMAIS q Barack Obama com Bo, o seu cão de água ......mergulhando no mar para o apanhar. Também...

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esti- los ANIMAIS POR Fátima Mariano As 11 raças caninas autóctones são cada vez menos procuradas, com uma queda de 60% entre 2015 e 2018. Razões? Não estão na moda e são sobretudo cães de trabalho. OS CÃES DE RAÇAS PORTUGUESAS NÃO CABEM NESTE PAÍS Cão do Barrocal Algarvio Foi reconhecida como a 11.ª raça portuguesa apenas em 2016. No Algarve, é conhecido também como cão felpudo ou cão abandeirado. Durante muito tempo foi utilizado na caça menor (coelhos, perdizes, etc.). São também bons cães de guarda e de companhia, graças à sua docilidade. Na sua origem, os cães das 11 raças por- tuguesas tinham uma função exclu- sivamente utilitária. Guardavam e conduziam os rebanhos e manadas, auxiliavam os pescadores e os caçado- res ou defendiam as grandes proprie- dades. Atividades que estão em declí- nio ou que se transformaram de tal forma que já dispensam o trabalho destes animais. Segundo Francisco Salvador Janeiro, da Comissão de Raças Portuguesas do Clube Português de Canicultura (CPC), a queda na procura começou por volta de 2012. Entre esse ano e 2015, registou-se uma diminuição de 30%. Nos três anos seguintes, a redu- ção foi de 60%. Na origem deste cená- rio não está o preço de cada exemplar, assegura, mas o facto de não serem ra- ças da moda (a atual é o buldogue fran- cês) e, como já se disse, tratar-se de cães essencialmente de trabalho. “Hoje em dia, temos os sistemas de alarme. Há cada vez mais restrições à caça e já há poucos rebanhos. Tudo isto dificulta o desenvolvimento das nossas raças”, realça Francisco Salva- dor Janeiro. No entanto, tal não signi- fica que estes cães não sejam bons ani- mais de companhia. O podengo por- tuguês, com grande aptidão para a caça, é um bom exemplo. Mas há mais um motivo para a redução da procu- ra: na sua maioria, os cães de raças por- tuguesas são de grande porte e vive- OS 11 MAGNÍFICOS Criado em 1932, o Livro de Origens Português é o registo genealógico para a identificação dos cães de raça pura existentes em Portugal. Ao cer- tificado genealógico emitido pelo Clube Português de Canicultura, no qual constam os nomes dos ante- passados do cão até à terceira gera- ção inclusive, chama-se Pedigree. Cão da Serra de Aires Originário da freguesia de Santo Alei- xo, concelho de Monforte, era utilizado na guarda e condução de rebanhos. A grande resistência às variações tér- micas permite-lhe percorrer longas distâncias na planície alentejana. Cão de Fila de São Miguel Autóctone da ilha açoriana homóni- ma, é também conhecido por Cão de Vacas, por ser sobretudo utilizado na guarda e condução de vacas leitei- ras. Animal muito inteligente, pode ser agressivo com estranhos mas é dócil com o dono. É um bom cão de guarda e de proteção pessoal. As unidades cinotécnicas da PSP e da GNR possuem cães desta raça. Cão da Serra da Estrela Devido ao grande porte, era utilizado para defender os rebanhos dos ata- ques dos lobos. Existe em duas va- riedades: a de pelo curto, a preferida dos pastores, e a de pelo comprido, a mais divulgada. Tem um instinto de proteção muito desenvolvido, quer em relação aos donos, quer aos ani- mais que guarda. Cão de Castro Laboreiro Cão de guarda e de pastoreio, é origi- nário da vila de Castro Laboreiro, con- celho de Melgaço. Tem uma resistên- cia física que lhe permite percorrer grandes distâncias e é muito indepen- dente. Não será o mais indicado para se ter num apartamento, mas é um bom cão de guarda de propriedades. Rafeiro do Alentejo Era sobretudo utilizado na guarda e condução de rebanhos pelas planí- cies alentejanas, rumo às montanhas do norte do país, onde ficavam durante o verão. É um bom cão de guarda, com um grande sentido territorial e muito alerta durante a noite. Pode também ser empregue como cão de caça grossa. Podengo Português Também conhecido por Cão Coe- lheiro, graças à aptidão para a caça, principalmente de animais que se es- condem em tocas. Existem poden- gos de porte pequeno, médio e gran- de. Os dois primeiros são considera- dos bons cães de companhia e de guarda; o terceiro é sobretudo utiliza- do na caça grossa. Perdigueiro Português A realeza e a nobreza utilizavam-no na caça ao faisão. De temperamento tranquilo, é também um bom animal de companhia. É muito fácil de trei- nar, mas precisa de bastante exercí- cio físico para se manter equilibrado física e psicologicamente. Cão de Água Português Originários do Algarve, chegou a existir em todo o litoral português. Ajudavam os pescadores a recupera- rem o peixe que escapava das redes, mergulhando no mar para o apanhar. Também transportavam mensagens e objetos entre os barcos e a costa. Além disso, é um bom animal de companhia. A popularidade da raça cresceu depois de o antigo presiden- te americano Barack Obama ter Bo e Sunny. Barbado da Terceira Esta raça terá evoluído dos cães le- vados pelos primeiros povoadores do arquipélago dos Açores. Inicial- mente utilizado como cão de guarda e condução de gado, é também um bom animal de companhia. Contudo, precisa de bastante estímulo físico, não devendo ficar muito tempo sozi- nho e fechado em casa. Cão de Gado Transmontano É, por excelência, um animal de guar- da e de proteção de gado ovino e ca- prino, principalmente dos ataques dos lobos. É manso, mas precisa de se lhe conquistar a confiança primei- ro. Pode ser um bom animal de com- panhia, mas não para estar fechado num apartamento. Precisa de espaço para se movimentar à vontade. -se cada vez mais em apartamentos. Embora negue que as raças caninas portuguesas estejam em perigo, o CPC admite que “estão em crise”, à seme- lhança do que acontece com raças es- trangeiras que tenham as mesmas ca- racterísticas. Apesar dos esforços dos clubes de criadores para promover as raças nacionais, nomeadamente atra- vés da presença em feiras e exposições, “a maior parte já não cria”. Francisco Salvador Janeiro lamenta a pouca atenção que por vezes é dada a estes animais. “Estas nossas raças de- viam estar nos livros escolares. Elas fa- zem parte da cultura do país. Devemos estar orgulhosos do que elas represen- tam”, defende. m Barack Obama com Bo, o seu cão de água português, em 2009, no relvado da Casa Branca q LARRY DOWNING/REUTERS 46 31.03.2019 Notícias Magazine 47 Notícias Magazine 31.03.2019

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esti- los ANIMAISPOR Fátima Mariano

As 11 raças caninas autóctones são cada vez menos procuradas, com uma queda de 60% entre 2015 e 2018. Razões? Não estão na moda e são sobretudo cães de trabalho.

OS CÃES DE RAÇAS PORTUGUESAS NÃO CABEM NESTE PAÍS

Cão do Barrocal Algarvio Foi reconhecida como a 11.ª raça portuguesa apenas em 2016. No Algarve, é conhecido também como cão felpudo ou cão abandeirado. Durante muito tempo foi utilizado na caça menor (coelhos, perdizes, etc.). São também bons cães de guarda e de companhia, graças à sua docilidade.

Na sua origem, os cães das 11 raças por-tuguesas tinham uma função exclu-sivamente utilitária. Guardavam e conduziam os rebanhos e manadas, auxiliavam os pescadores e os caçado-res ou defendiam as grandes proprie-dades. Atividades que estão em declí-nio ou que se transformaram de tal forma que já dispensam o trabalho destes animais.

Segundo Francisco Salvador Janeiro, da Comissão de Raças Portuguesas do Clube Português de Canicultura (CPC), a queda na procura começou por volta de 2012. Entre esse ano e 2015, registou-se uma diminuição de 30%. Nos três anos seguintes, a redu-ção foi de 60%. Na origem deste cená-

rio não está o preço de cada exemplar, assegura, mas o facto de não serem ra-ças da moda (a atual é o buldogue fran-cês) e, como já se disse, tratar-se de cães essencialmente de trabalho.

“Hoje em dia, temos os sistemas de alarme. Há cada vez mais restrições à caça e já há poucos rebanhos. Tudo isto dificulta o desenvolvimento das nossas raças”, realça Francisco Salva-dor Janeiro. No entanto, tal não signi-fica que estes cães não sejam bons ani-mais de companhia. O podengo por-tuguês, com grande aptidão para a caça, é um bom exemplo. Mas há mais um motivo para a redução da procu-ra: na sua maioria, os cães de raças por-tuguesas são de grande porte e vive-

OS 11 MAGNÍFICOS

Criado em 1932, o Livro de Origens Português é o registo genealógico para a identificação dos cães de raça pura existentes em Portugal. Ao cer-tificado genealógico emitido pelo Clube Português de Canicultura, no qual constam os nomes dos ante-passados do cão até à terceira gera-ção inclusive, chama-se Pedigree.

Cão da Serra de Aires Originário da freguesia de Santo Alei-xo, concelho de Monforte, era utilizado na guarda e condução de rebanhos. A grande resistência às variações tér-micas permite-lhe percorrer longas distâncias na planície alentejana.

Cão de Fila de São Miguel Autóctone da ilha açoriana homóni-ma, é também conhecido por Cão de Vacas, por ser sobretudo utilizado na guarda e condução de vacas leitei-ras. Animal muito inteligente, pode ser agressivo com estranhos mas é dócil com o dono. É um bom cão de guarda e de proteção pessoal. As unidades cinotécnicas da PSP e da GNR possuem cães desta raça.

Cão da Serra da Estrela Devido ao grande porte, era utilizado para defender os rebanhos dos ata-ques dos lobos. Existe em duas va-riedades: a de pelo curto, a preferida dos pastores, e a de pelo comprido, a mais divulgada. Tem um instinto de proteção muito desenvolvido, quer em relação aos donos, quer aos ani-mais que guarda.

Cão de Castro Laboreiro Cão de guarda e de pastoreio, é origi-nário da vila de Castro Laboreiro, con-celho de Melgaço. Tem uma resistên-cia física que lhe permite percorrer grandes distâncias e é muito indepen-dente. Não será o mais indicado para se ter num apartamento, mas é um bom cão de guarda de propriedades.

Rafeiro do Alentejo Era sobretudo utilizado na guarda e condução de rebanhos pelas planí-cies alentejanas, rumo às montanhas do norte do país, onde ficavam durante o verão. É um bom cão de guarda, com um grande sentido territorial e muito alerta durante a noite. Pode também ser empregue como cão de caça grossa.

Podengo Português Também conhecido por Cão Coe-lheiro, graças à aptidão para a caça, principalmente de animais que se es-condem em tocas. Existem poden-gos de porte pequeno, médio e gran-de. Os dois primeiros são considera-dos bons cães de companhia e de guarda; o terceiro é sobretudo utiliza-do na caça grossa.

Perdigueiro Português A realeza e a nobreza utilizavam-no na caça ao faisão. De temperamento tranquilo, é também um bom animal de companhia. É muito fácil de trei-nar, mas precisa de bastante exercí-cio físico para se manter equilibrado física e psicologicamente.

Cão de Água Português Originários do Algarve, chegou a existir em todo o litoral português. Ajudavam os pescadores a recupera-rem o peixe que escapava das redes, mergulhando no mar para o apanhar. Também transportavam mensagens e objetos entre os barcos e a costa. Além disso, é um bom animal de companhia. A popularidade da raça cresceu depois de o antigo presiden-te americano Barack Obama ter Bo e Sunny.

Barbado da Terceira Esta raça terá evoluído dos cães le-vados pelos primeiros povoadores do arquipélago dos Açores. Inicial-mente utilizado como cão de guarda e condução de gado, é também um bom animal de companhia. Contudo, precisa de bastante estímulo físico, não devendo ficar muito tempo sozi-nho e fechado em casa.

Cão de Gado Transmontano É, por excelência, um animal de guar-da e de proteção de gado ovino e ca-prino, principalmente dos ataques dos lobos. É manso, mas precisa de se lhe conquistar a confiança primei-ro. Pode ser um bom animal de com-panhia, mas não para estar fechado num apartamento. Precisa de espaço para se movimentar à vontade.

-se cada vez mais em apartamentos. Embora negue que as raças caninas

portuguesas estejam em perigo, o CPC admite que “estão em crise”, à seme-lhança do que acontece com raças es-trangeiras que tenham as mesmas ca-racterísticas. Apesar dos esforços dos clubes de criadores para promover as raças nacionais, nomeadamente atra-vés da presença em feiras e exposições, “a maior parte já não cria”.

Francisco Salvador Janeiro lamenta a pouca atenção que por vezes é dada a estes animais. “Estas nossas raças de-viam estar nos livros escolares. Elas fa-zem parte da cultura do país. Devemos estar orgulhosos do que elas represen-tam”, defende. ●m

Barack Obama com Bo, o seu cão de água português, em 2009, no relvado da Casa Branca

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