Ângela Ferreira. Portugal dos Pequenitos. Visao, 7 .12. 1995

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    CULTURA E ESPECTACULOSINSTALAESO design inato

    percursos lisboetas para seguir o trabalho de uma artista, ngela Ferreira, demonstram a sua evoluoRUTH ROSENGARTEN

    ngela Ferreira em duas frentes - o sentido inato do designtrabalho de ngela Ferreira tem TIlll-cionado como uma espcie de exegeseas suas fontes. As prprias fontes - queo operam apenas como pontos de partida,s tambm como pontos de refernciaue se repetem no trabalho - no so nembitrrias nem neutras. Artefactos de townips e projectos de alojamento da frica do, instrumentos de lavoura portugueses erquises, os murais de AlmadaNegreiros:todos estes temas se encontra uma queso implcita de identidade, de pertena (seela clara, problemtica ou ambgua) nudada cultura (sul-africana, portuguesa).Enquanto nos seus primeiros trabalhosat altura em que expe as alfaias agriolas, no CAM, em 1990 - a relao entreonte e objecto era a de emprstimo maisu menos linear, com um repensar da relao entre forma e funo. Nos t rabalhosais recentes, a artista elaborou um mtodopesquisa que lhe permite exercer a crtia das prprias fontes. A relao do objectoom as suas fontes , pois, mais elaborada e

    por uma srie de passos concepais. Nesse sentido, a artista toma visvelseu sistema de trabalho fornecendo doentao sobre os processos mentais quelevam da fonte ao objecto. Este tem sido, presente data, um aspecto essencial dou trabalho, envolvendo-o numa estruturade Dezembro de 1995

    conceptual custa de- ou antes: com a fi-nalidade de - des-mistificar o materialque lhe serve comofonte e o objecto escultrico dele resultante. H, na realidade, na obra de ngelaFerreira, um sentido inato de design, umaseduo pelo esttico, de que a artista temconscincia aguda e de que, num rigor conceptual quase puritano, se afasta.

    FUGA DOUTRINACom Emigrao, em que utilizou os painis murais de Almada Negreiros (daGare Martima Rocha Conde de Obidos) como material fonte, a artista iniciou uma pesquisa no s sobre a relao do referentecom o trabalho, mas tambm sobre o prprioModernismo, como discurso simultaneamente esttico e politico. Na instalao agora em mostra no Museu do Chiado, o lequetemporal abrangido pela coleco desta instituio (cem anos - uma histria abreviadado modernismo portugus) o seu ponto departida. (No trabalho de ngela Ferreira oconceito de instalao est presente notanto pela criao de um ambiente mas pela

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    reunio de peas que, no seu conjunto, complexificam a ideia inicial). A ideologia doModernismo, enquanto movimento sagital,avano progressivo, traduzida na metforafsica do vdeo dos dois pares de ps avanando a passo, enquanto a verdade que lidacom o aspecto material do modernismo ga-nha estatuto emblemtico na pea da parede(Uma Sequncia). A outra pea escultrica,O Engenho da Deriva, um comentrio dosdetalhes arquitectnicos do prprio edifcio,um instrumento hipottico que, nos seus movimentos (virtuais) implicitos, pe em marcha a mquina da histria.Do mesmo modo, PortugaL dos Pequeni-tos, uma instalao que consiste em diversas peas individuais. Aqui, ngelaFerreira trabalhou sobre a planta do8parque infantil de Coimbra, impondo-lhe um hipottico sistema de ir! rigao: deste sistema deduz o plano'Q original e, utilizando os espaos emnegativo deixados pelo esquemade irrigao, a artista criou um objecto novo, uma espcie de mapa fsico. Colocado rente ao cho, tomado dinmico pela projeco de tubos, o jogo das fonuas e das coresremete para uma linguagem ldicapresente nos trabalhos iniciais da artista (feitos na frica do Sul, antesda sua vinda para Portugal) e evidencia uma mistura de seriedade e de jogo

    nova na sua obra. O j ogo com a escala(uma caixa de luz reproduz o diagrama esquemtico do parque infantil, desta vez escala do corpo da artista, assemelhando-seassim a um pequeno caixo) integra no sa instalao como o parque que lhe serve defonte, onde a miniaturizao simultaneamente pedaggica e sentimental. Comoacontecia com a obra Emigrao, a instalao lana um olhar implicitamente irnico imagem saudosista que os portugueses tinham de si prprios durante o regime salazarista. O facto do trabalho em si evitarqualquer tipo de doutrinao constitui apenas wna parte do seu f a s c n i o . ~NGELA FERREIRAPortugal dos PequenitosGaleria Mdulo, LisboaUMA ESCALA, UMA SEQUNCIA, O ENGENHO DADERIVA EUM FILME RETARDADOMuseu do Chiado, Lisboa