ANEURISMA INFLAMATORIO DAAOR- TAABDOMINAL...

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ANEURISMA INFLAMATORIO DA AOR- TA ABDOMINAL Telmo Pedro Bonamigo, * Lucio Roberto Siliprandi, ** Gilberto de Napoli. *** as autores relatam sua experiencia com 12 aneurismas da aor- ta abdominal tratados no per/odo de 1973 a 1988, com carac- ter/sticas do tipo inflamat6rio. Discutem as peculiaridades de diagn6stico, ctrnico e laborato- rial, a necessidade de manejo cirurgico mais complexo, bem como as complicar;oes e os resultados. Unitermos: Aneurisma inflamat6rio da aorta abdominal. Aneurisma da aorta abdominal. Trabalho realizado na Unidade de Pesquisa do Instituto de Cardiolo- gia, (Chefe Dr. Fernando Luchese), e na Disciplina de Angiologia da FFFCMPA, (Prof. Haroldo D. Paiva), e Servi~o de Cirurgia Vascular da Santa Casa de Porto Alegre, Rio Grande do SuI. * Prof. Adj, de Angiologia e Cirurgia Vascular da Funda~ao Facul- dade Federal de Ciencias Mi:dicas de Porto Alegre. Cirurgiao Vascular no Instituto de Cardiologia, Hospital Moinhos de Vento e Hospital Sao Francisco de P. Alegre. ** Residente em Cirurgia Vascular. *** Prof. Adj. do Depto. de Anatomia Patol6gica da FFFCMPA. o aneurism a inflamat6rio da aorta abdominal consiste em uma varia vel patol6gica de etiologia desconhecida. Tern, no entanto, algumas caracteristicas que permitem seu diagn6stico clinico pre-operat6rio em percentual ra- zoave!. Ha alguns achados radiograficos, de ultrassono- grafia e mais recentemente, de tomografia cornputado- rizada, que confirmam seu diagn6stico no periodo pre- operat6rio. Os achados cirurgicos a laparotomia s~o constantes e se resumem basicamente na presenl;a de massa aneurismatica, com parede de coloral;ao esbran- quil;ada, endurecida eespessa, com aspecto de porcela- na. Costumam haver importantes aderencias as estrutu- rasvizinhas. A quarta porl;ao do duodeno ea veia renal esquerda, principalmente, estao aderidas de tal forma, que sua mobilizal;ao pode acompanhar-se de complica- l;oes cirurgicas serias. A prirneira descril;ao do termo aneurism a "inflamat6- rio" se deve a WALKER e co!. (12) em 1972, que relata- ram urn estudo retrospectivo de 187 aneurismectomias realizadas no periodo de 1958a 1969. Em 19 pacientes (100/0) os autores encontraram uma parede da aorta ab- dominal excessivamente espessa com intensas aderen- cias perianeurismaticas. Em 1978, GOLDSTONE e co!.(5) relataram uma revi- saD similar com 200 pacientes operados com diagn6stico de aneurisma da aorta abdominal, entre os quais, 10 pa- cientes (5 %) preenchiam os criterios diagn6sticos descri- tos por WALKER e cols. Dentro da mesma linha, surgi- ram duas importantes comunical;oes em 1985. PEN- NEL e co!. (10) relataram a experiencia da Clinica Ma- yo, com revisao de 2816 pacientes submetidos a trata- mento cirurgico de aneurism a da aorta abdominal, no periodo de 1955-1985, entre os quais 127 pacientes (4,5 %) tinham aneurismas que foram diagnosticados como sendo inflamat6rios. Observaram que a acuracia diagn6stica da ultrassonografia pode atingir 13,5% e da tomografia computadorizada 50% para 0 diagn6stico pre-operat6rio. Constataram que, neste grupo especial de pacientes, a velocidade de sedimental;ao globular (VSG) estava aumentada em 73% dos casos, que 0 em a- grecimento significativo ocorreu em 20% dos casos e que a dor abdominal significativa era uma das manifes- ta~oes clinicas em 66%. Com rela~ao a mortalidade ci- rurgica, observaram que neste grupo era de 7,9% contra 2,4%, na populal;ao dos pacientes operados por aneu- risma sem caracteristicas do tipo inflamat6rio. CRA WFORD e cols., em 1988 (3), relataram 30 casos operados com diagn6stico da forma aguda do aneuris- ma inflamat6rio. Somente urn dos doentes foi operado na vigencia da ruptura. Tres outros foram operados ele- tivamente. Os 26 pacientes restantes foram operados de urgencia. Os autores discutem aspectos etiol6gicos, de manejo clinico cirurgico desta entidade clinica. Especula sobre a importancia de fatores etiol6gicos como 0 trauma, tromboflebite, pancreatite, diverticulite, vasculite, ab- cesso abdominal, celulite bacteriana em 10%, terapeuti- ca por metisergide em altas doses em 12%, neoplasia em 8% e causas desconhecidas em 68% dos casos. Nos ultimos anos surgiram outros trabalhos na literatu- ra discutindo a associal;ao do aneurism a de aorta abdo- 17

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ANEURISMA INFLAMATORIO DA AOR-TA ABDOMINAL

Telmo Pedro Bonamigo, *Lucio Roberto Siliprandi, **Gilberto de Napoli. ***

as autores relatam sua experiencia com 12 aneurismas da aor-ta abdominal tratados no per/odo de 1973 a 1988, com carac-ter/sticas do tipo inflamat6rio.Discutem as peculiaridades de diagn6stico, ctrnico e laborato-rial, a necessidade de manejo cirurgico mais complexo, bemcomo as complicar;oes e os resultados.

Unitermos: Aneurisma inflamat6rio da aorta abdominal.Aneurisma da aorta abdominal.

Trabalho realizado na Unidade de Pesquisa do Instituto de Cardiolo-gia, (Chefe Dr. Fernando Luchese), e na Disciplina de Angiologia daFFFCMPA, (Prof. Haroldo D. Paiva), e Servi~o de Cirurgia Vascularda Santa Casa de Porto Alegre, Rio Grande do SuI.

* Prof. Adj, de Angiologia e Cirurgia Vascular da Funda~ao Facul-dade Federal de Ciencias Mi:dicas de Porto Alegre. CirurgiaoVascular no Instituto de Cardiologia, Hospital Moinhos de Ventoe Hospital Sao Francisco de P. Alegre.

** Residente em Cirurgia Vascular.*** Prof. Adj. do Depto. de Anatomia Patol6gica da FFFCMPA.

o aneurism a inflamat6rio da aorta abdominal consisteem uma varia vel patol6gica de etiologia desconhecida.Tern, no entanto, algumas caracteristicas que permitemseu diagn6stico clinico pre-operat6rio em percentual ra-zoave!. Ha alguns achados radiograficos, de ultrassono-grafia e mais recentemente, de tomografia cornputado-rizada, que confirmam seu diagn6stico no periodo pre-operat6rio. Os achados cirurgicos a laparotomia s~oconstantes e se resumem basicamente na presenl;a demassa aneurismatica, com parede de coloral;ao esbran-quil;ada, endurecida e espessa, com aspecto de porcela-na. Costumam haver importantes aderencias as estrutu-ras vizinhas. A quarta porl;ao do duodeno e a veia renalesquerda, principalmente, estao aderidas de tal forma,que sua mobilizal;ao pode acompanhar-se de complica-l;oes cirurgicas serias.A prirneira descril;ao do termo aneurism a "inflamat6-rio" se deve a WALKER e co!. (12) em 1972, que relata-ram urn estudo retrospectivo de 187 aneurismectomiasrealizadas no periodo de 1958 a 1969. Em 19 pacientes(100/0) os autores encontraram uma parede da aorta ab-dominal excessivamente espessa com intensas aderen-cias perianeurismaticas.Em 1978, GOLDSTONE e co!. (5) relataram uma revi-saD similar com 200 pacientes operados com diagn6sticode aneurisma da aorta abdominal, entre os quais, 10 pa-cientes (5 %) preenchiam os criterios diagn6sticos descri-tos por WALKER e cols. Dentro da mesma linha, surgi-ram duas importantes comunical;oes em 1985. PEN-NEL e co!. (10) relataram a experiencia da Clinica Ma-yo, com revisao de 2816 pacientes submetidos a trata-mento cirurgico de aneurism a da aorta abdominal, noperiodo de 1955-1985, entre os quais 127 pacientes(4,5 %) tinham aneurismas que foram diagnosticadoscomo sendo inflamat6rios. Observaram que a acuraciadiagn6stica da ultrassonografia pode atingir 13,5% e datomografia computadorizada 50% para 0 diagn6sticopre-operat6rio. Constataram que, neste grupo especialde pacientes, a velocidade de sedimental;ao globular(VSG) estava aumentada em 73% dos casos, que 0 em a-grecimento significativo ocorreu em 20% dos casos eque a dor abdominal significativa era uma das manifes-ta~oes clinicas em 66%. Com rela~ao a mortalidade ci-rurgica, observaram que neste grupo era de 7,9% contra2,4%, na populal;ao dos pacientes operados por aneu-risma sem caracteristicas do tipo inflamat6rio.CRA WFORD e cols., em 1988 (3), relataram 30 casosoperados com diagn6stico da forma aguda do aneuris-ma inflamat6rio. Somente urn dos doentes foi operadona vigencia da ruptura. Tres outros foram operados ele-tivamente. Os 26 pacientes restantes foram operados deurgencia.Os autores discutem aspectos etiol6gicos, de manejoclinico cirurgico desta entidade clinica. Especula sobrea importancia de fatores etiol6gicos como 0 trauma,tromboflebite, pancreatite, diverticulite, vasculite, ab-cesso abdominal, celulite bacteriana em 10%, terapeuti-ca por metisergide em altas doses em 12%, neoplasia em8% e causas desconhecidas em 68% dos casos.Nos ultimos anos surgiram outros trabalhos na literatu-ra discutindo a associal;ao do aneurism a de aorta abdo-

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minal com fibrose retroperitoneal (4, 7, 9).BASKEVILLE e col. (2) em 1983 dentro de outra linhade pensamento, questionam 0 termo aneurisma infla-matorio e divulgam 0 termo fibrose periaortica, partin-do do principio de que 0 fenomeno primario seria a fi-brose, com 0 conseqiiente aparecimento posterior da di-latal;ao aneurismiltica.Este e urn assunto que ainda esta por merecer urn amploestudo, aprofundado e prospectivo dos inumeros gru-pos cirurgicos com voca~ao para 0 manejo dos doentescom aneurism a da aorta abdominal.o objetivo do presente trabalho e apresentar 12 casos deaneurisma da aorta abdominal que preenchiam os as-pectos diagnosticos do tipo inflamatorio, bem como dis-cutir a sua incidencia, suas peculiaridades clinicas e ex i-gencia de manejo cirurgico ma'is cuidadoso.

No periodo de 1973 a maio de 1988, foram opera-dos pelo autor principal, 211 pacientes com diagnosticode aneurism a de aorta abdominal. Cento e sessenta edois foram operados eletivamente. Destes, em 12 haviaevidencia, a inspel;ao, de todas as caracteristicas doaneurism a do tipo inflamatorio. Os restantes 150 foramrotulados como aneurism as do tipo usual. Quanto a ida-de dos pacientes, operados com aneurism a inflamato-rio, verificamos uma idade media de 64 anos (43-78anos), situada urn pouco abaixo da media etaria dos pa-cientes operados eletivamente (66, 4 anos) e dos doentesoperados por ruptura (69 anos). Com relal;ao as doen-~as associadas, em quatro pacientes havia hipertensaoarterial sistemica. Outros quatro tin ham evidencia clini-ca e eletrocardiografica de cardiopatia isquemica. Setepacientes tin ham doen~a pulmonar oclusiva cronica.Outras patologias associadas foram: diverticulite edoenp oclusiva arterial do segmento femoro-popliteo.Urn paciente ja fora submetido a tentativa de ressec~aodo aneurisma em outro servi~o, mas 0 cirurgiao optoupor suspender a opera~ao face as dificuidades tecnicasencontradas.

Quanto ao quadro clinico todos os pacientes tinhamcomo queixa mais importante a dor abdominal, de loca-lizal;ao epigastrica predominante e de dor lorn bar. Doisdoentes tinham dor que se estendia a regiao escrotal eperineal. Outra caracteristica importante e que 0 aneu-risma, ao ser palpado, despertava intensa dor, diferentedos demais doentes, em que 0 exame e praticamente in-dolor. A maior parte dos doentes tinha tido emagreci-mento discreto, mas em quatro, 0 emagrecimento forade 6,8, 15,20 Kg nos ultimos 6 meses.

Em alguns doentes havia suspeita clinica de doen~aneoplasica associada, 0 que nao se comprovou pelosexames e pela laparotomia. E de salientar que, em doisdoentes, 0 diagnostico foi feito por urologista, em fun-~ao da dor lorn bar que apresentavam, como manifesta-~ao clinica inicial. Seis pacientes foram submetidos a ul-trassonografia abdominal que comprovou a presen~a doaneurisma. A aortografia foi realizada em dois pacien-

tes porque se pensou que iria adicionar elementos de im-portancia diagnostica. A VSG foi verificada em doisdoentes somente e os resultados foram de 11 a 127mmna 1~ hora. A suspeita clinica de aneurisma de aorta ab-dominal inflamatorio foi levantada, em bases clinicas,em cinco doentes pelo emagrecimento e dor importanteassociada ao aneurisma. Urn paciente foi operado comsuspeita clinica de ruptura tamponada do aneurisma eos demais foram operados com diagnostico de aneuris-ma sintomatico, comprovando-se a presen~a de aneuris-ma inflamatorio durante a opera~ao. Apesaf das difi-culdades tecnicas do procedimento, de maior ou menorgrau, em todos foi possivel concluir 0 procedimento,sem complica~6es cirurgicas trans-operatorias. A veiarenal esquerda foi ligada em tres doentes, 0 que permi-tiu urn acesso mais segura para clampeamento aortico.Foi feito clampeamento supra-renal em duas outrasoportunidades para simplificar 0 procedimento.

o aneurism a era menor de 6cm em urn caso, entre6-10cm em oito casos e maior que 10cm em dois casos.A quantidade de sangue administrada no trans-operatorio variou de 500ml a 4500ml. Nos seis primeiroscasos operados a media de sangue administrado foi de2100ml e nos ultimos casos a media foi de 1250ml. Atecnica cirurgica utilizada consistiu no implante de pro-tese de Dacron. Anastomose proximal foi colocada logoabaixo das renais e as anastomoses distais foram coloca-das antes da bifurca~ao aortica em dois casos, nas arte-rias femorais em tres casos e nas arterias iliacas em trescasos. 0 tempo de cirurgia variou de 120 minutos ate300 minutos, com media de 200 minutos. 0 tempo deoclusao aortic a medio foi de 48 minutos, com limites de22 a 100 minutos. Quanto a hidrata~ao, os pacientes re-ceberam em media 2180ml de Ringer lactado e 900ml desolu~ao glicosada 5070, durante 0 procedimento. Todosos pacientes receberam 250ml de manitol, desde 0 iniciodo procedimento. 0 volume urinario medio trans-operatorio, foi de 168mllhora, com limites de 50ml e310ml por hora.

As complica~6es pos-operatorias se resumem a he-morragia digestiva em urn paciente com ulcera gastricaassociada. Neste paciente foi necessario transfusao de1000ml sangue total. Outro paciente foi submetido a es-plenectomia tardia, por trauma cirurgico que passou de-sapercebido. Urn paciente, que, ja havia sido submetidoa laparotomia em outro servi~o, apresentou peritonitesecundaria a tres perfura~6es do jejuno, interpretadascomo devidas a embolia ateromatosa. Foi submetido avarios procedimentos de peritoniostomia, vindo a fale-cer no 422 dia de pos-operatorio, por insuficiencia mul-tipla organica, com dano progressivo renal, pulmonar epiora metabolica dependente da infec~ao.

Com rela~ao ao seguimento clinico dos pacientesha controle de 11 deles por periodo varia vel de 6 anos ~2 meses. Urn dos pacientes, no quinto mes, passou aapresentar quadro de dor abdominal, sugestivo de is-quemia mesenterica. Negou-se a submeter-se a estudoangiografico diagnostico e evoluiu para trombose me-senterica no 72 mes, com obito. Quanto aos sintomas,referidos pelos pacientes, e interessante observar a me-lhora das queixas dolorosas e a volta de ganho ponderalque apresentaram no periodo pos-operatorio.

A etiologia do aneurism a inflamat6rio e desconhe-cida. Segundo alguns auto res 0 processo inicial seria 0aneurisma a6rtico, e a rea<;ao peria6rtica seria secunda-ria. Chegou-se a especular que haveria uma Passagem desangue atraves da parede a6rtica, mas por outro lado,nao foi demonstrada a deposi<;ao de hemosiderina naparede inflamat6ria. Tecnicas imunol6gicas tambemnao demonstraram fibrinogenio no tecido perianeuris-matico (12). Embora se desconhe<;a a etiologia do aneu-risma inflamat6rio, a tromboflebite, a pancreatite, di-verticulite, apendicite, abcessos intra-abdominais, esta-riam relacionados em 10% dos casos, e terapeutica commetisetgide em 80/0 e causas desconhecidas em 68%, se-gundo CRAWFORD e col. (3). Ha auto res (10, 12), quevalorizam a eleva<;ao da VSG, como urn indice significa-tivo de suspeita diagn6stica do aneurism a inflamat6rio.Embora nao seja especifica, foi constatada sua eleva<;aoacima de 40mm em quatro dos 10 casos em que foi de-terminado na serie de WALKER e col. (12). Nenhumdos pacientes operados por GOLDSTONE e col. (5) ti-veram a determina<;ao da VSG, ja que varios pacientesforam operados na expectativa de expansao aguda emesmo ruptura contida.

Ja PENNEL e col. (10) relataram a eleva<;ao daVSG em 73% dos pacientes tratados. Em nosso mate-rial, a VSG foi ~erificada somente em dois casos, embo-ra houvesse suspeita clinica da forma inflamat6ria doaneurisma, antes da opera<;ao em cinco pacientes. Seus

valores fcram, respectivamente, de 11 e 127mm. Comrela<;ao ao diagn6stico do aneurism a tipo inflamat6riono periodo pre-operat6rio, ele foi feito em 16,5% na se-rie de PENNEL, e em 33% na serie de CRAWFORD ede 20% em nossa serie. Na maioria dos pacientes, no en-tanto, 0 diagn6stico foi feito somente por laparotomia.Para facilitar 0 diagn6stico pre-operat6rio tern side da-da enfase 11 tomografia computadorizada por RAMI-REZ ~ col. (11) desde 1972. Estes autores observaramque sendo a tomografia capaz de evidenciar diferen<;asde densidade dos tecidos situados na cavidade abdomi-nal, pode ela ser de grande utilidade neste diagn6stico.Assim, no aneurisma do tipo inflamat6rio verifica-se apresen<;a de uma por<;ao maior ou menor de tecidos mo-les, envolvendo a aorta calcificada. Is to se constitui emprecioso elemento diagn6stico pois a parede ampliadapelo processo inflamat6rio e de facil identifica<;ao na to-mografia. E de se observar que a ruptura do aneurismae 0 hematoma, que surge em torno dele, determinamuma densidade peria6rtica distinta. Assim, 0 valor deatenua<;ao do sangue fresco retroperitoneal e de 50-60H, enquanto no aneurism a inflamat6rio 0 valor de ate-nua<;ao dos tecidos peria6rticos e de 30 H. segundo RA-MIREZ (11).

CRAWFORD e col. em 1985 (3), relatam que a to-mografia sugeriu 0 diagn6stico em 10 dos 30 pacientescom aneurisma inflamat6rio. Refere, por outro ladeque a urograria excretora permitiu sugerir 0 diagn6sticoem sete casos. PENNEL e col. descreveram a acuraciadiagn6stica comparativa dos varios metodos diagn6sti-

'!" - ,.,....- .'-::.'.-

cos para 0 aneurism a inflamat6rio. Assim, para a tomo-grafia, seria de 500/0 enquanto na urografia excretora se-ria de 31,4070. Aqui, os sinais radiol6gicos verificadosseriam 0 desvio medial do ureter em 170/0 e a obstruc;aoureteral em 180/0. Do ponto de vista clinico, os auto.ressan unanimes em relatar que a caracteristica maior dospacientes com aneurisma inflamat6rio e apresentaremdol', geralmente constante, de media intensidade, acom-panhada de sensibilidade a palpac;ao. 0 emagrecimentotem sido verificado com freqiiencia.

Com relac;ao a incidencia dos aneurismas inflama-t6rios em relac;ao aos nao inflamat6rios, verifica-se naliteratura urn percentual variavel de 2,5 ate 100/0. Assim,WALKER em 1979 verificou um percentual de 100/0, en-quanta na serie de GOLDSTONE, em 1978, os aneuris-mas inflamat6rios atingiram 50/0. Ja na serie de PEN-NEL e co!. 0 percentual de aneurism as inflamat6rios foide 4,50/0. (Tabela I)

AUTOR ANO ANEURISMAS NOMERODE PERCENTUAL MORTALIDADEOPERADOS ANEURISMAS INCID£NCIA

INFLAMAT()RIOS

WALt:ERu 1971 '87 •• lOfJ. ..<,

GOLDSTONE! 197' 100 10 ,.. 10'1.

PENNEL10 1988 1816 127 4,5% 7,9or~

CRAWFORD) •••• - 30 - ,..BONAMIGO '918 111 " S,6Oft 1,3Oft

Do ponto vista da patologia, 0 aneurisma do tipoinflamat6rio tem diferenc;as muito significativas em re-lac;ao aos demais. Os autores sao unanimes em relatarque 0 aneurism a inflamat6rio caracteriza-se POl' apre-sentar uma parede espessa, endurecida, esbranquic;actacomo se fosse de porcelana. Na tentativa de isolar 0 pe-ritoneo parietal posterior da parede aneurismaticaconstata-se ausencia de plano de clivagem e desperta-seum sangramento profuso. Da mesma forma, nao haplano de clivagem entre 0 aneurism a e as estruturas ad-jacentes. Costuma haver uma firme aderencia entre aparede do aneurisma e a quarta porc;ao do duodeno eveia renal esquerda, principalmente. A maio ria dos au-tores alerta para as dificuldades tecnicas no manejo ci-hlrgico destes doentes. Esta, pode ser express a pelo san-gramento maior verificado nesta cirurgia, quando com-parado a cirurgia do aneurisma nao inflamat6rio.GOLDSTONE e col. relataram, em sua serie de 10doentes, a transfusao de 8,2 unidades de sangue totalem media, variando de 4-18 unidades, comparados coma transfusao de 4,7 unidades em media, na cirurgia doaneurism a nao inflamat6rio operados no mesmo perio-do (ate 1972). Em nosso material a quantidade de san-gue transfundida foi de tres unidades em media, com Ii-mites de 500ml e 4500ml, de sangue to~al. E interessante

observar que, nos selS primeiros casos, a media trans-fundida foi de 2100ml e nos ultimos seis casos, a quanti-dade de sangue total transfundida foi de 1250ml, emmedia. Isto expressa a melhoria dos cuidados tecnicos eo manejo cirurgico mais apurado. No mesmo periodo, amedia de sangue transfundido em doentes, com aneuris-ma do tipo nao inflamat6rio, foi de 1230ml.

Com relac;ao a mortalidade, verifica-se um percen-tual varia vel. PENNEL e cols. (10) relatam 7,90/0, en-quanta CRAWFORD refere 30/0. HI. GOLDSTONE re-fere 100/0 de mortalidade, em sua serie de 10 doentes,tendo como causa a perfurac;ao duodenal (5). Em nossaserie a mortalidade foi de 8,30/0. Na literatura verifica-sediscrepancia na mortalidade, constatada POl' varios au-tores (3,5,10) eo indice referido POl' Walker (12). Naanalise desta serie verifica-se que urn dos pacientes mor-reu POl' sangramento trans-operat6rio e outro teve suaoperac;ao limitada a laparotomia, tendo ocorrido seu6bito aos 28 dias da oporac;ao. Em dois outros doenteshouve infecc;ao em tomo do enxerto, possivelmente pre-disposta POl' hematoma, ou dependente de contamina-c;ao a partir de perfurac;ao duodenal que tivesse passadodesapercebida, uma vez que 0 autor nao faz referencia amesma. E de se ressaltar que esta experiencia foi relata-da em 1972 e, a partir dai, foi grande a evoluc;ao em ter-mos de manejo e cuidado dos doentes criticos, entre osquais devem ser enquadrados os pacientes com aneuris-ma inflamat6rio da aorta abdominal.

Com relac;ao aos detalhes tecnicos, e importante ob-servar que, se 0 cirurgiao nao e afeito ao manejo destequadro, podera aumentar a morbilidade e mesmo amortalidade para seus pacientes. Isto decorre basica-mente pela lesao duodenal POl' desgarro e conseqiientecontaminac;ao. POl' outro lado, pode ocorrer lesao deveia renal e veia cava, com perda sangiiinea exagerada echoque he!J1orragico que predispoe a isquemia miocar-dica. Finalmente, a lesao do ureter e um dos acidentespossiveis quando nao se tomam os cuidados devidos.Alguns autores como PENNEL e col., temendo a lesaoureteral pela continuidade com 0 ureter, recomendam acateterizac;ao do ureter em manobra pre-operat6ria.Felizmente nao tivemos qualquer dano ureteral, mas co-nhecemos casos em que isto ocorreu com conseqiienciasdesagradaveis para 0 paciente. Alguns cirurgioes, frenteao aneurism a inflamat6rio, deveriam refletir antes deprosseguir 0 procedimento. Deveriam executa-Io comseguranc;a ou evitar a sua ressecc;ao com risco aumenta-do, encaminhando 0 paciente a colega com experienciamaior para tratamento definitivo.

E prudente evitar manobras como 0 afastamento deestruturas adjacentes que estao aderidas. E importantetentar obter um ponto de reparo para promover 0 clam-peamento acima do aneurisma. Quando is to for difitil,ou secciona-se deliberadamente a veia renal esquerda, 0que realizamos em tres oportunidades em nosso mate-rial, ou segue-se a orientac;ao tecnica proposta POl'CRAWFORD e cols. (3). Estes sugerem 0 clampeamen-to supra-celiaco da aorta abdominal, permitindo a con-tinuidade da cirurgia com relativa tranqiiilidade.Conseguindo-se a oclusao vascular proximal parte-separa a incisao direta da parede aneurismatica, com cui-dade de evitar manuseio da parede duodenal. Atocontinuo, implanta-se 0 enxerto tendo-se 0 cuidado de

CIR. VASC.ANG.4(4): 17,21, 1988

usar fio montado em agulhas mais longas, porque a pa-rede do aneurism a e muito espessa, 0 que gera dificulda-des tecnicas. Finalmente, seria importante destacar doist6picos: 0 usa de medica<;ao cortic6ide, como forma dediminuir os sin tom as §]gicos e quem sabe diminuir osriscos cirurgicos, para 0 paciente ser operado fora doperiodo de dor intensa e com processo inflamat6rio emfase de acalmia. Nao temos experiencia com este esque-ma terapeutico. 0 segundo item que foge ao enfoque dopresente trabalho seria discutir a fibrose retroperito-neal.

Concluindo, 0 aneurisma inflamat6rio da aorta ab-dominal merece de toda a equipe cirurgica urn cuidadoespecial. A prudencia maior, a humildade necessaria e afirmeza cirurgica sao qualidades exigidas de quem sedispoe e propoe a trata-lo.

The authors relate their experience with 12 AbdominalAortic Aneurysm treated in the period of 1973 to 1988, withcharacteristics of the "inflamatory" kind.

They discuss the peculiarities of the clinical and laborato-rial diagnosis and the necessity of more complex managementas well as the complications and the results.

AneurysmAorta

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